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8/18/2019 Segmentacao Comportamento
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SEGMENTAÇÃO DEMERCADO E
COMPORTAMENTODO CONSUMIDOR
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA | PÓS GRADUAÇÃO
JULIANA MAGALHÃES
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CULTURA E CONSUMO
Imagem ebook de cultura
A cultura engloba elementos ambientais que influ-
enciam todo um coletivo de consumidores.
CULTURA ECONSUMO
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Para comercializar com êxito um produto é necessário com-
preender os fatores culturais que afetam o processo, já que a
conduta de compra das pessoas é influenciada pelos valores cul-
turais que inter-atuam com as necessidades emocionais, isto é,
os indivíduos realizam as compras no ambiente social da sua cul-
tura.
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FILME 1.1 Comportamento do consumo das gerações
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Os meios mais habituais de transmissão da cultura são:
• A família, através de uma série de valores e costumes.
• As instituições educativas e religiosas que inculcam o que é corre-
to e ético.
• Os meios de comunicação, que diariamente emitem uma multitu-de de sinais através da publicidade sobre o que é socialmente
bem visto e aceito.
A CULTURA: CARACTERÍSTICAS
A Cultura é inventada. Não surgiu do nada, foi criada por uma
inter-relação de indivíduos que põem em comum ideias e habilida-des determinadas. Esta invenção consta de três elementos interde-
pendentes:
• Um sistema ideológico ou componente mental constituído por
crenças, valores, costumes que o homem aceita ao definir o corre-
to ou o incorreto;
• Um sistema tecnológico: habilidades, artes e ofícios que lhe permi-
tem fabricar bens materiais;
• Um sistema organizativo para coordenar eficientemente a conduta
de um indivíduo com os demais.
A Cultura é aprendida. Não inclui respostas e predisposições he-
reditárias. Devido ao fato de, na sua maioria, o comportamento hu-
mano ser mais aprendido que inato, a cultura afeta uma ampla
gama de comportamentos. É transmitida inconscientemente, especi-
almente nos primeiros anos de vida. Pode também ser transmitida
por influências externas que provêm das amizades, da midia...
Distinguem-se três tipos de aprendizagem cultural:
• Formal, inculca-se na infância no ambiente familiar;
• Informal, aprende-se pela observação e inter-relação com o ambi-
ente;
• Técnico, vem dos ensinamentos dos professores no ambiente aca-
dêmico.
A Cultura é partilhada socialmente. É um fenômeno de grupo,entendendo como tal desde a sociedade até à família. Para que
seja partilhada socialmente é necessário que seja aceite pela maio-
ria da sociedade. Isto implica que os indivíduos que não possuem
certos aspectos culturais podem assumir o risco de serem rejeita-
dos.
A Cultura é diferenciadora. As culturas partilham certas seme-
lhanças, mas também podem ter grandes diferenças, o que dá lu-
gar à diversidade cultural. Isto leva a que existam diferenças signifi-cativas no comportamento dos consumidores dos distintos países.
A Cultura é adaptativa. Altera-se de uma maneira gradual e
constante, em algumas sociedades muito lentamente, e noutras
com grande rapidez.
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A Cultura é organizada e integrada. Toda a cultura é coerente.
Comportamo-nos, pensamos e sentimos de uma maneira consisten-
te com a de outros membros de uma mesma cultura porque parece
“natural” ou “correto” fazê-lo.
A Cultura tem um carácter prescritivo. É constituída por normas
e diretrizes da sociedade que determinam qual é o comportamento
apropriado segundo as circunstâncias, logo constituem padrões de
conduta que se não forem cumpridos acarretam “sanções” e “casti-
gos”.
A cultura é dinâmica e é alterada ao longo do tempo.
PARA REFLETIR
NEWISM
Por que os consumidores cobiçam tudo que é novo mais do que
nunca. E, por que isso significa o céu ou o inferno para as marcas.
DEFINIÇÃO
O “novo” nunca esteve mais na moda. Para aqueles que cresce-
ram em uma EXPECTATION ECONOMY (ECONOMIA DA EXPECTA-
TIVA), exigindo o melhor do melhor, o conceito do que é “novo” se
tornou positivo. O mundo inteiro está lançando produtos e serviços
novos (e ainda melhores) que podem ser testados com facilidade
(especialmente online) com poucos – ou nenhum – risco. Em sínte-
se: novo significa interessante, novo significa legal, novo signifca
(mais) experiências, o primeiro, novo significa... bem, “novo”! ;-) E,
é hora de prosseguir e atender a paixão que seus clientes têm pelo
NEWISM.
Seis fatores que dão uma importância ainda maior ao NEWISM
(ver próxima página).
O QUE NEWISM NÃO É (E A INEVITÁVELCONTRATENDÊNCIA)
Agora, o NEWISM não é “apenas” uma inovação tradicional de
produtos. O “novo e melhor” de ontem foi superado por uma explo-são realmente inovadora e criativa que tomou conta do mundo todo.
Ele também não é apenas uma loucura emocionante, ambientalmen-
te incorreta e insana que substitui os produtos (veja o fator 6).
Por último, mas não menos importante, ele não significa que
toda a atenção do consumidor seja concentrada no que é novo. Ain-
da haverá um valor inestimável nas marcas tradicionais, conhecidas
por entregar constância, qualidade comprovada e legado. Ainda ha-
verá valor nas histórias de marcas envolventes e bem contadas. Ain-
da haverá valor no conforto, na tradição, no local, na curadoria de
produtos já existentes, na personalização e em qualquer uma das
dimensões já vistas dos Trend Briefings anteriores. Lembre-se, ne-
nhuma tendência é válida para todos os consumidores a todo mo-
mento, e o “novo” nem sempre invalida o que é antigo.
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INTERATIVA 1.1 newism
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IMPLICAÇÕES
O NEWISM é a destruição criativa, hipercompetição, globalismo,
consumo anabolizado e uma celebração da inovação, tudo em uma
tendência só. Para as marcas, sejam elas novas ou já estabeleci-
das, ele se resume a capturar e manter a atenção dos consumido-res. Como o intervalo de atenção dos consumidores pode ser cada
vez mais curto, as recompensas ao se investir nele podem ser ins-
tantâneas e enormes. E, na verdade você não tem muitas escolhas
se não aplicar e se engajar ;-) Precisa (ainda mais) de ideias? Faça
um brainstorm com alguns dos nossos Trend Briefings recentes ou
indicações da Springwise e veja os conceitos, produtos, serviços e
campanhas novos que você pode usar. Enquanto isso, enquanto
você adota o NEWISM, já estamos trabalhando no nosso NOVO
Trend Briefing ;-)
Essa tendência gera ou pode gerar algum impacto na sua área
de atuação profissional? Explique.
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ECONOMIA ECONSUMO - TEORIARACIONAL-
ECONÔMICA
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ECONOMIA E CONSUMO - TEORIARACIONAL-ECONÔMICA
Explica o comportamento de procura de informação em fun-
ção dos custos/benefícios
• O comportamento de procura do consumidor persegue um pre-ço mínimo.
• A quantidade ótima fica determinada quando o benefício margi-
nal esperado se iguala ao custo marginal esperado. (Stigler,
1961)
A teoria econômica, apesar de tudo, não descreve como seformam as preferências de um produto ou marca, nem como se
alteram em função da experiência.
A base desta teoria apoia-se na consideração do indivíduo
como ser racional, apoia-se nas políticas comerciais de ofertas,
saldos, promoções.
VERDADE SOBRE RELATIVIDADE
Porque Tudo é Relativo - Mesmo quando não deveria ser Do Livro: Previsivelmente Irracional
Dan Ariely – Previsivelmente Irracional
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Nossas decisões são relativas. Estamos sempre fazendo compa-
rações. A maneira como as opções são apresentadas e complexida-
de em compará-las influenciam nossa escolha.
Dadas 3 opções:
• A
• B (diferente de A, mas também interessante)
• A- (similar a A, mas um pouco inferior)
Quase sempre escolhemos A, por ser fácil de comparar com A-
e ser nitidamente superior. Por exemplo, se tivermos que escolher
entre férias em Paris (com café da manhã) e Roma (com café da ma-
nhã). É difícil decidir certo?
Se colocarmos uma 3ª opção: férias em Roma (sem café da ma-
nhã) aumenta a escolha das pessoas por Roma (com café da ma-
nhã). Se for feito com Paris, acontece o mesmo.
Isso é irracional. Esta 3ª opção ligeiramente inferior não deveria
influenciar a escolha das pessoas por Roma ou Paris.
Isso ocorre até mesmo na escolha de parceiros. Apresentados o
rosto A e um rosto B, e uma 3ª opção com o rosto A um pouco dis-
torcido, aumenta a preferência pelo rosto A. Quando a Williams-So-
noma lançou sua máquina standard de fazer pão, as vendas foram
ruins. Após lançarem a versão deluxe (maior e mais cara), a versão
standard disparou nas vendas pois dava impressão de ser barata.
Outro experimento demonstrou que ao invés de adquirir uma caneta
de 25$, a maioria prefere dirigir até outra loja à 15min de distância e
comprar uma de 18$, economizando 7$.
No entanto, se fosse um terno de $455, a maioria não iria até ou-
tra loja para economizar os mesmos 7$. Não faz sentido!
Vejamos Sam, um vendedor de TVs. Ele nos mostra 3 opções:
• 36' Panasonic por $690
• 42' Toshiba por $850
• 50' Philips por $1,480
QUAL VOCÊ ESCOLHERIA?Sam sabe que as pessoas tem dificuldade em comparar as op-
ções. Quem consegue dizer se a Panasonic de $690 é melhor do
que a Philips de $ 1.480? Mas Sam sabe que dadas 3 opções, as
pessoas geralmente escolhem a do meio. Qual ele coloca no meio?
A que deseja vender.
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Repare nos círculos pretos. Não parecem ser do mesmo tama-
nho, mas são. O círculo cercado por grandes, parece menor. Quan-
do cercado por círculos pequenos, parece maior. Depende dos cír-
culos cinzas em volta.
Relativamos o mundo físico - torradeiras, bicicletas, animais, res-
taurantes, esposas - e também coisas mais efêmeras: emoções,
atittudes, pontos de vista.
Não sabemos nem o que queremos de nossas vidas - até conhe-
cermos alguém que esteja fazendo aquilo que achamos que deverí-
amos fazer.
A boa notícia é que às vezes podemos controlar os "círculos" em
volta, ficando próximos de círculos menores e aumentar nossa felici-
dade relativa. Quanto mais temos, mais queremos. A única cura é
quebrar o ciclo da relatividade.
Achamos fácil gastar $3.000 para melhorar os bancos de um
carro que compramos por $25.000, mas difícil gastar isso com um
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novo sofá (mesmo quando passamos mais tempo em casa do que
no carro).
Uma forma de evitar desperdiçar dinheiro é pensar de forma
mais aberta, comparar esse valor de $3.000 com outras coisas que
poderíam ser adquiridas como livros, viagens ou experiências.
Imagine que você está entra em uma empresa, ganhando umsalário de $ 70.000 ao ano. Está feliz?
Agora, pense que você descobre ser o menor salário da empre-
sa, que todos ganham até $ 100.000 ao ano.
QUÃO FELIZ VOCÊ ESTÁ?
Agora imagine que você ganha $ 65.000 mas é o maior salário
da empresa, onde o piso é $ 45.000
Em qual estaria mais feliz? Embora ganhando menos, provavel-
mente na segunda opção.
Nossa felicidade não depende só do que temos, mas do que te-
mos em relação ao que os outros têm.
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Um lanche em um prato pequeno, parece maior e dá a sensação de que você comeu
mais, do que em um prato grande.
Relatividade é a tendência de estimar o valor das coisas de acordo como elas se compa-
ram com outros itens.
Isso afeta diretamente nossa felicidade e a inveja (que pode nos incentivar a fazer coisas
ruins).
Mudamos para uma casa maior, em uma vizinhança melhor - esperando sermos mais feli-
zes. Mas logo nos adaptamos e começamos a fazer comparações com o que estiver disponí-
vel onde estamos.
Nossa felicidade depende, não só do que temos, mas do que não temos e que for de fácil
comparação.
PERGUNTA:
Você tende a concordar ou discordar sobre nosso processo de decisões de consumo não
ser exatamente racional? Justifique com um exemplo da sua experiência prática.
SOCIOLOGIA DO CONSUMO
Sociedade, cultura e consumo
‘Sociedade de consumo’ é diretamente relacionado às sociedades contemporâneas; no
entanto, consumir é uma atividade presente em toda e qualquer sociedade humana
Para os autores Frederic Jameson, Zygman Bauman e Jean Baudrillar
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O SIGNO É A MERCADORIA
O materialismo e a superficialidade associados ao consumo, difi-
cultam e misturam conceituação e análise sociológica com moralida-
de e crítica social;
A crítica social sobressai-se em relação à fundamentação empíri-ca e sociológica.
Para os autores Don Slater, Daniel Miller, Grant McCracken, Co-
lin Campbell, Pierre Bourdieu, Mary Douglas
Representam o interesse sociológico em relação ao consumo
surgido na década de 80;
Investigam como o consumo se conecta com outras esferas da
experiência humana e em que medida ele funciona como uma ‘jane-
la’ para o entendimento de múltiplos processos sociais e culturais
Origens Históricas Da Sociedade De Consumo
• Discussões variam entre o séc. XVI e o séc. XVIII
• Revolução do Consumo e Comercial precede a Revolução Industri-
al – existência prévia de uma demanda adequada para a produ-
ção“as pessoas são, por definição, insaciáveis”
“existe uma propensão natural a consumir”
Passagem do consumo familiar para o consumo individual
Antes: Escolhas individuais subordinadas aos códigos sociais e
morais do grupo ao qual pertenciam.
Hoje: Liberdade de escolha, autonomia na decisão, ausência de
instituições e de códigos sociais e morais com poder para decidir
pelo indivíduo; multiplicidade de grupos, tribos urbanas e indivídu-
os criando as suas próprias modas
Transformação do consumo de pátina para o consumo de moda
• Pátina
= Marca do tempo deixada nos objetos, utilizados pela mesma
família há gerações
= Ciclo de vida mais longo do objeto
Consumo de moda: império do efêmero – mecanismo social ex-
pressivo de uma temporalidade de curta duração, pela valorização
do novo e do individual
Sociedade De Consumo: Características Sociológicas
Colin Campbell (A ética romântica e o espírito do consumismo mo-derno)
QUAL A ORIGEM DA INSACIABILIDADEDOS CONSUMIDORES?
Mudança na concepção das fontes de prazer. Em torno do sécu-
lo XVII, teríamos passado do hedonismo tradicional (sensações, ex-
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periências) para o hedonismo moderno (emoções, imaginação, pra-
zer imaginativo).
“Os consumidores buscam nas mercadorias o prazer das experi-
ências auto-ilusivas que constroem com suas “significações associa-
das”
Mas... como sabemos que a realidade sempre fica aquém daimaginação, cada compra nos leva a uma nova desilusão. Por isso,
sempre queremos achar novos produtos que sirvam como objetos
de desejo a serem repostos.
PARA REFLETIR
UM MAPA INICIAL DA BASE DA PIRÂMIDEBRASILEIRA
Rodrigo Bisognin Castilhos
Imagine-se o leitor saindo de sua casa de classe média (ou
alta), localizada em um bairro nobre de uma grande cidade brasilei-
ra, junto com a faxineira, rumo ao bairro em que ela reside. A inten-
ção? Investigar o consumo no cotidiano de famílias pobres.
Virá à tona talvez um receio de como você será recebido, ao
lado de uma curiosidade sobre o que vai encontrar em campo. À
medida que o ônibus avança, você é alertado pela companheira de
viagem –“Olha, eu sou bastante pobre, viu?”– e a ansiedade aumen-
ta.
Quando o segundo ônibus inicia a subida do morro, você come-
ça a enxergar o cenário com que pretende conviver nos próximos
meses: um bairro popular, de casas populares, habitado em sua
maioria por famílias de trabalhadores, semiqualificados ou sem qua-
lificação, atuantes nos mais diversos setores, além de trabalhadores
informais, aposentados, desempregados e alguns criminosos, deque provavelmente só ouviu falar.
Foi assim que iniciei e conduzi o presente estudo, de cunho et-
nográfico. Busquei compreender como indivíduos situados nos es-
tratos mais baixos da hierarquia social brasileira se relacionam en-
tre si – e com o mundo – por meio da aquisição e do uso dos mais
variados bens e serviços, bem como em que medida facetas de
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“O consumo na sociedade contemporânea oferece o significadoe a identidade que todos nós buscamos”
FILME 2.1 Trechos do filme de consumo de Becky Bloom
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sua identidade social –tradicionalmente definidas pela sociologia
segundo a posição nas relações de produção– são construídas, re-
forçadas, expressas e rechaçadas a partir do consumo, que aqui é
visto como processo essencialmente cultural.
Então, subi o morro para acompanhar o cotidiano de seis famíli-
as situadas em um bairro periférico de Porto Alegre, pelo período
de cinco meses e meio, entre julho e dezembro de 2006. Entre astécnicas de coleta aplicadas usei entrevistas em profundidade, ob-
servação sistemática e participante de diversos eventos do dia-a-
dia e ocasiões especiais, além de coleta de material documental e
fotográfico. Para que conheça o resultado, convido o leitor a vir co-
migo. Da minha casa até lá pego dois ônibus, num percurso que
dura mais ou menos 50 minutos. Vamos?
A CASA, “TEMPLO DO CONSUMO”
O primeiro dos bens valorizados por meus informantes é a casa.
Constitui o lugar por excelência da família e é para onde se direcio-
na a maior parte do investimento de uma família de baixa renda. Ter
uma casa significa “ter pelo menos alguma coisa” e estar protegido
contra a ameaça de desabrigo, que é o que os distancia da condi-
ção de miseráveis. A posse da casa apresenta alguns matizes, que
vão desde a condição ideal da casa própria e escriturada até a sem-
pre provisória situação do aluguel. Tão provisório, porém, quanto
morar em uma casa alugada é morar em uma casa onde faltem “coi-
sas” ou cujas peças estejam ainda inacabadas –algo comum entre
meus informantes–, o que faz da casa um local em constante trans-
formação.
O espaço da casa se mostrou bastante territorializado, refletindo
as relações familiares. A negociação de espaços pode gerar algum
tipo de tensão, especialmente em casas menores e com membros
jovens, a ponto de casar e formar um novo núcleo. A solução fre-
quentemente passa pela construção de um novo cômodo nos limi-
tes do próprio terreno, um “puxadinho”. Nesse caso, a relação entre
o núcleo principal e o que acaba de se formar pode ser mais ou me-nos independente de acordo com o número de espaços que são uti-
lizados em comum entre os dois núcleos familiares. Contudo, a pro-
ximidade física mantém a unidade familiar e atualiza seus sistemas
de obrigação, contribuindo para a reprodução cultural do morro.
O último aspecto relacionado à casa diz respeito à permeabilida-
de das fronteiras entre esta e a rua no ambiente de convívio e socia-
bilidade que se estabelece no morro. Apesar de casa e rua continu-
arem a ser dois domínios com características bastante marcadas,pude perceber aspectos da casa se espraiando para a rua, como o
local de lazer das crianças e as múltiplas formas de socialização
que ocorrem em frente às casas, bem como elementos da rua que
as invadem, por conta das portas e janelas abertas e do constante
trânsito de vizinhos. O caráter tênue dessas fronteiras tem reflexos
importantes no consumo, alimentando o ciclo da inveja entre os mo-
radores e conferindo publicidade a grande parte do consumo da
casa, que pode ser definida assim:• Produtos eletrônicos. Parecem ter o papel privilegiado de colocar
os pobres em contato com a modernidade e a sociedade de con-
sumo. Dentre esses bens, o mais amplamente difundido é o apare-
lho de televisão, presente na totalidade dos lares. Os aparelhos
maiores e mais modernos, especialmente aqueles de 29 polega-
das, parecem mais valorizados que os demais, conferindo certo
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status aos possuidores, sendo, em grande parte das vezes, manti-
dos estrategicamente à vista dos vizinhos. Os aparelhos de DVD,
por sua vez, começam a fazer parte da vida de alguns moradores
do morro. Com penetração ainda baixa entre eles, esse produto
parece trazer algum traço de distinção para os proprietários. Mui-
tos filmes, sempre pirateados, circulam entre vizinhos e a preferên-
cia recai sobre os gêneros de ação, comédia, suspense e terror.O aparelho de videogame e o microcomputador são dois bens
bastante valorizados, especialmente pelos mais jovens. Este pare-
ce ser o mais novo objeto de desejo dos pobres e passa a ocupar
um lugar físico e simbólico privilegiado nos lares e no cotidiano
das famílias onde se faz presente. Na prática, o computador modi-
fica o dia-a-dia de seus proprietários e, quando têm acesso à inter-
net, possibilita o contato com um mundo virtual, que no caso de
meus informantes acaba por refletir e reforçar os mecanismos soci-
ais que ocorrem no âmbito local.
• Eletrodomésticos e mobiliário. A compra e o uso dos aparelhos
eletrodomésticos, especialmente os da chamada linha branca, es-
tão intimamente ligados aos papéis femininos na casa. Equipa-
mentos como fogão e geladeira são considerados “básicos” pelos
informantes e sua ausência é inconcebível. Já a máquina de lavar
roupas se apresentou como uma evolução em relação ao “tanqui-
nho”, conferindo certa distinção às proprietárias, bem como tor-nando mais eficiente a realização de suas tarefas domésticas. Os
móveis são fundamentais na maneira como os indivíduos organi-
zam sua intimidade familiar e definem o nível de conforto de uma
casa. Dividem-se entre comprados novos, comprados usados ou
recebidos como doação. Os primeiros são mais valorizados e na-
turalmente recebem mais cuidados por parte das donas de casa.
Já os móveis antigos e recebidos como doação são concebidos
como provisórios e causam um desconforto diário a seus proprie-
tários por atestarem de maneira implacável sua incapacidade de
prosperar. A aquisição de móveis está intimamente ligada à noção
nativa de “melhorar de vida”.
• Vestuário. Mostrou-se um importante meio pelo qual os indivíduos
mais jovens conseguem camuflar sua identidade de pobre. Ao
mesmo tempo em que andar bem vestido os coloca em conformi-dade com outras esferas sociais quando estão fora do morro, a
boa roupa assume um caráter distintivo no seio de sua classe
quando usada em determinadas ocasiões no morro. No caso dos
informantes mais velhos, pareceu-me haver uma consciência da
ineficácia do item vestuário em alçá-los a uma condição melhor, o
que faz com que tal categoria seja priorizada apenas por seus fi-
lhos. Para essas mães e pais, priorizar o vestuário dos filhos em
detrimento de seu próprio é um ato que afirma seus papéis e obri-gações no seio da família. A roupa comprada parece ter mais va-
lor justamente por estar ligada a um momento que se inscreve na
memória dos indivíduos como positivo, no qual eles se afirmam
como consumidores e se afastam de uma suposta condição de
pobreza a que se liga a roupa recebida como doação. O vestuário
pode servir, ainda, como elemento de afirmação de uma identida-
de de morador da periferia, o que ocorre quando as roupas liga-
das ao movimento hip-hop são utilizadas entre os jovens. Nessecaso, ao contrário da roupa que camufla, os pobres julgam possu-
ir maior legitimidade do que os ditos playboys para usá-las.
• Alimentação. Se a principal função do vestuário é tentar ludibriar,
mesmo que com pouca eficácia, as fronteiras sociais, os alimen-
tos se mostraram o principal veículo de afirmação de uma identi-
dade pobre por parte de meus informantes. A categoria alimenta-
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ção apareceu como intimamente ligada à condição de classe. Em
primeiro lugar, o consumo abundante de comida serve para afir-
mar diariamente uma posição distante da necessidade, que os
distingue dos “pobres-pobres”. Em segundo lugar, essa fartura di-
ária os opõe aos ricos, que também “passam fome” por conta de
preocupações estéticas. Assim, a “comida de pobre” é exaltada
positivamente pela fartura, seja de comida à mesa, seja de ingredi-entes em seu preparo, como sal, óleo e açúcar. Outra fina distin-
ção opõe aqueles que realizam compras nos chamados “saco-
lões” – cesta básica com produtos mais baratos– e aqueles que
compram diretamente das prateleiras dos minimercados espalha-
dos pelo morro ou das grandes redes varejistas da cidade. Uma
segunda função igualmente relevante da categoria alimentação é
a de reforçar os laços familiares e o papel de cada um dos mem-
bros da família. Ao pai cabe trazer comida para dentro de casa ou
prover o sustento da família (papel que é encampado pela mãe
nas famílias comandadas por mulheres). Já à mãe compete pri-
mordialmente o preparo da comida, que, muito mais do que ali-
mentar, deve agradar ao marido e aos filhos, a quem cabe de-
monstrar esse agrado, repetindo o prato e elogiando, em um ciclo
de reciprocidade que, mais do que o corpo, alimenta as relações
familiares e reforça o sentimento de união e amor entre seus mem-
bros.
Por fim, meus informantes se apropriavam de maneira bastante
característica de seus bens. Seja personalizando-os em seus aspec-
tos físicos, por meio de adesivos ou elementos decorativos, seja no
próprio uso desses objetos – realizado sempre de acordo com seus
pressupostos, recriando e adicionando utilidades e significados –, o
consumo de produtos de massa assumia contornos próprios entre
os moradores do morro.
O CRÉDITO
O crédito se revelou um elemento central no dia-a-dia de consu-
mo dos pobres urbanos aqui pesquisados. Todo tipo de bem é pas-
sível de ser adquirido com o uso do crédito. Mais que isso, a maio-
ria desses bens somente pode ser adquirida por meio da utilização
desse serviço financeiro. O crédito é visto como uma maneira de an-
tecipar o consumo, mas também como uma forma de realizar uma
espécie de poupança invertida, em que contrair uma dívida para
comprar determinado bem força os indivíduos a controlar seu orça-
mento de modo a honrar as parcelas do crediário.
Outra dimensão do crédito se refere ao sistema de obrigações
que ele gera na dinâmica das relações entre uma comunidade po-
bre. Esse sistema se manifesta de maneira bastante clara no comér-cio local, onde o comerciante é visto como natural ofertante de cré-
dito e sua recusa gera uma atitude negativa com relação ao estabe-
lecimento. Já quando o comerciante oferece a possibilidade do adi-
antamento do consumo para seus clientes, estes o vêem como al-
guém que os auxilia, portanto alguém com quem eles possuem
uma dívida não somente financeira, mas moral. Nesse caso, a con-
trapartida vem na forma da fidelidade ao estabelecimento, o que,
em um círculo virtuoso do relacionamento comercial, pode levar ao
aumento do crédito à medida que as obrigações vão sendo cumpri-das.
O acesso ao crédito é, ainda, considerado um ativo valorizado
tanto no que se refere ao comércio local como no mundo institucio-
nalizado dos serviços financeiros. Tal como uma posse, o crédito
pode ser emprestado e repassado a vizinhos, amigos e parentes.
Quanto mais próximas são as partes, menos tenso e arriscado se
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torna o empréstimo do nome. Quando alguém “tira” um bem para
outro, a pessoa que recebeu essa dádiva passa a ter uma obriga-
ção que extrapola o simples pagamento em dia dos carnês, a qual
se inscreve no próprio bem adquirido. Tal como um presente, o bem
passa a carregar a marca da confiança que o amigo ou parente lhe
depositou. Assim, o empréstimo do nome e o devido pagamento
por parte de quem adquiriu o bem acabam por estreitar os laços deconfiança e amizade entre vizinhos e parentes.
A DISTINÇÃO PELA POSSE
É efetivamente pela posse de bens que os pobres se distin-
guem uns dos outros. Em outras palavras, é pelo consumo, não
pelo trabalho, que a sintonia fina da distinção se expressa entre es-ses pobres urbanos. Assim, a primeira grande classificação presen-
te no imaginário desses indivíduos é a oposição entre os pobres,
que não podem “ter as coisas”, e os ricos, “que têm tudo” e não pre-
cisam se preocupar com o final do mês. Sempre acompanhada da
auto-identificação como pobre, vem a ressalva que diz que não são
“pobrespobres”, porque pelo menos têm algumas coisas e têm “o
que comer”. Nesse esquema classificatório a constelação de bens
– quantidade e qualidade – é a principal balizadora da identidadesocial desses indivíduos. Contudo, os bens em si são elementos
neutros e o que importa é sua valorização e o espaço que eles ocu-
pam nas relações sociais em determinado campo, de forma que
existem certos bens que se mostram comunicadores privilegiados
de melhor condição de vida, justamente por serem entendidos uni-
vocamente pelos pobres como bens posicionais. Esses bens são
exatamente aqueles cuja simples posse, variação no estilo ou quali-
dade fazem com que os pobres aqui investigados primeiramente se
auto identifiquem como diferentes e, em segundo lugar, sejam vis-
tos como tais. São eles: o automóvel, por seu alto custo de aquisi-
ção e manutenção; a propriedade, o tamanho e os acabamentos in-
terno e externo das casas, que quando presentes fazem com que
esta se destaque em meio à combinação de tijolos e cimento, am-
plamente presente no morro; o microcomputador e o aparelho deDVD, pela ainda baixa penetração desses bens; e o televisor de 29
polegadas.
Outra categoria analisada que concorre para o estabelecimento
de classificações entre os pobres é o vestuário. Como foi dito, o ves-
tuário pode camuflar as diferenças entre classes sociais nos encon-
tros entre elas. Contudo, ele parece mais eficiente no sentido de co-
municar certa prosperidade em relação aos próprios moradores do
morro, especialmente entre os jovens. Por último, a alimentação semostra um poderoso elemento de afirmação de uma identidade po-
bre. A fartura, ao mesmo tempo que se afasta da necessidade e a
nega, diferenciando os pobres dos “pobres-pobres”, reafirma a dife-
rença entre aqueles que comem pouco, seja para manter um pa-
drão estético, seja por arrogância, segundo eles.
De maneira geral, a posse de bens não implica mobilidade soci-
al, algo que os pobres sabem ser muito difícil, mas sim melhorar a
vida em relação aos pares. Na maioria dos casos, então, a lógicadistintiva é dirigida para dentro da própria classe, onde o vizinho, e
não “os ricos”, é o espelho, estabelecendo como parâmetro um pa-
drão material igualável e superável e, por isso mesmo, mais suportá-
vel no dia-a-dia.
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A DISTINÇÃO PELO USO ECOMPORTAMENTO
Para Bourdieu, mais importante do que a posse em si, é o
uso que os indivíduos são capazes de fazer desses bens. Assim,
a já referida inveja não ocorre apenas quando um possui mais
(ou melhores) bens que o outro, mas quando se comporta de for-
ma diferente daquilo que é tido como o padrão do morro. Ser
educado –no sentido de polidez formal–, discreto e “não se me-
ter na vida dos outros” são condutas que diferenciam alguns mo-
radores, especialmente os que se mostram menos conformados
com sua condição e insatisfeitos com seu local de moradia.
Contraditoriamente, mesmo esses informantes mais “polidos”
adotam práticas que chamo de excessivas, como o excesso decomida no prato, de bebida no copo, de volume nas falas, nos
rádios e televisores, e de aplicação de desodorantes e outros
cosméticos. Essas práticas, ao que parece, servem antes para
afirmar uma identidade social do que propriamente como instru-
mento de distinção, na medida em que, em alguns casos, as pes-
soas parecem conscientes da associação entre pobres e exces-
so, como pude constatar em um dos grandes momentos do iní-
cio de meu trabalho de campo, o primeiro jantar de que partici-
pei:
Durante o jantar na casa da Sílvia eu me servi de meio copo
de Coca-Cola. Quando Sílvia enxergou meu copo, olhou para os
filhos e disse: “Só isso, olha o que ele se serviu! Aqui em casa
eles tão acostumados a se servir até as bordas”, quando Carlo
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arrematou, com um misto de humor e ironia: “É que ele é fino, ora”.
(Diário de Campo, 8 ago. 2006)
Da mesma forma, os contatos de fora do morro parecem ser
bastante valorizados. Ter amigos ou conhecidos de fora não signifi-
ca uma aproximação com outras classes, mas antes um meio de es-
tar em contato com outros códigos e influências que permitem alar-
gar a visão de mundo, de maneira a distinguir-se dos demais. Nocaso da “elite do morro”, além de se relacionarem prioritariamente
entre si, no morro, eles buscam ampliar sua rede de relacionamen-
tos sempre para fora desse local. Por isso, seus filhos estão matricu-
lados em escolas públicas ou particulares “de fora”, onde fazem no-
vos amigos, seu lazer é preferencialmente dentro de casa ou fora
dos limites do morro, assim como são de fora as amizades nas
quais eles parecem investir mais, como atesta a esposa da família
mais afluente que tive a oportunidade de conhecer:
Com certeza o que mais a gente quer é sair daqui. As crianças
têm que conviver com outro tipo de gente. Porque as crianças da-
qui, tudo bem, o meu filho tem uns três ou quatro amiguinhos, mas
eu não vou deixar brincar com todos. (Sandra)
Da mesma forma que os relacionamentos de fora trazem algum
tipo de reconhecimento para os moradores do morro, sua associa-
ção com essa reconhecida elite, sabidamente fechada, traz consigoa satisfação pessoal de fazer parte desse grupo selecionado. Essa
elite, por sua vez, busca manter-se no topo da hierarquia do morro
por meio de festas e ritos comensais em que a abundância se faz
presente. Contudo, não é apenas a elite que promove esses ritos
coletivos onde reina a fartura. O cheiro de churrasco presente cada
domingo é bastante revelador. Quem promove um churrasco é cer-
tamente mais valorizado do que aquele que propõe uma divisão
dos gastos. A oferta de uma refeição, nesse caso, dispara o ciclo
de dons e contradons entre vizinhos, que, embora eu não tenha me
proposto investigar a fundo, parece ser outro aspecto presente e
marcante das relações entre os iguais.
SAIBA MAIS SOBRE COMO O CONSUMOINFLUI NO STATUS
Quando pessoas de diferentes classes sociais interagem no
meio urbano, as linhas de demarcação entre essas classes se tor-
nam vagas e transitórias, e o consumo passa a ser o meio pelo qual
as camadas superiores se diferenciam das inferiores de maneira ge-
ral. É o que sustenta Veblen (1980), estudioso do assunto que, ao
lado de Simmel (1904) e Bourdieu (1979), serve como ponto de par-tida do autor deste artigo em sua análise de aspectos da sociedade
de consumo pós-moderna. Em outras palavras, segundo esse racio-
cínio, é pelo que consomem que as pessoas são comparadas e di-
ferenciadas.
Para Simmel, há duas lógicas que guiam a busca por status nos
grupos sociais: a lógica da imitação e a lógica da diferenciação. Im-
pelidos pela lógica da imitação, os grupos tenderiam a buscar sta-
tus consumindo as roupas dos grupos imediatamente superiores, e
estes, para se diferenciar dos grupos inferiores, consumiriam novas
modas.
Bourdieu também vê o consumo sob o prisma da busca pela dis-
tinção na hierarquia social, porém enfatiza mais o uso que os indiví-
duos fazem dos bens do que sua simples posse –especialmente
dos bens culturais. De acordo com ele, o uso é determinado a partir
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de uma combinação de três tipos de capital: econômico (recursos
financeiros), social (recursos de relacionamento) e cultural (origem
social e educação formal). A essa combinação ele dá o nome de
“capital simbólico”.
Os três autores citados são naturalmente passíveis de críticas,
alerta o pesquisador Rodrigo Castilhos, por tentarem reduzir as moti-
vações do consumo à lógica da emulação. Mas, segundo ele, nãohá como negar o fato de que a maneira de consumir e os significa-
dos dos bens variam na escala social e que, no seio de uma mes-
ma classe, podem existir diferenças sutis no consumo que espe-
lhem as nuances dentro de determinada classe.
SAIBA MAIS SOBRE O POBRE BRASILEIRO
Em 1983, um marcante estudo sobre classes conduzido por Co-
leman nos Estados Unidos descreveu a evolução do comportamen-
to de consumo de três grandes segmentos sociais norte-america-
nos–a classe trabalhadora, a classe média e a classe alta. Segundo
esse autor, a classe trabalhadora norte-americana se revelou orien-
tada para a família e com uma visão de mundo caracterizada como
“paroquial”, que se refletiria em um pensamento de horizonte estrei-
to e na preferência por marcas nacionais. E os pobres brasileiros?
Quem são eles e o que pensam, afinal?
Estudos de Zaluar (2000) e Sarti (2005) mostraram que os brasi-
leiros da base da pirâmide socioeconômica, ao menos os analisa-
dos por eles, gostam de se identificar como “trabalhadores”, em
oposição à noção de “vagabundo” ou de “bandido”. Com re lação à
família, eles encontraram a existência de papéis claramente defini-
dos, cabendo ao homem o papel de provedor e à mulher o controle
do orçamento da casa e sobre as prioridades de consumo, que in-
variavelmente recaem sobre a compra de alimentos . Além disso, a
família pobre brasileiras e constrói em cima de uma hierarquia tradi-
cional , com ascendência dos homens sobre as mulheres e dos
pais sobre os filhos, em que as obrigações familiares estar iam aci-ma dos interesses individuais de seus membros, denotando uma
precedência do todo sobre as partes.
É significativa também a importância das relações de vizinhan-
ça no bairro onde moram como um elemento fundamental para a re-
produção de uma cultura de classe entre os pobres.
O “vizinho torna-se seu espelho”, que serve de parâmetro para
a elaboração de sua identidade social, num processo no qual solida-
riedade e rivalidade caminham juntas. Outro estudo, de Matoso
(2005), revelou que “ter nome”, como uma metáfora para o acesso
ao crédito, revelou-se importante símbolo de status ent re os infor-
mantes da favela da Rocinha, no Rio de Janeiro –mas não há como
afirmar que isso pode ser generalizado em relação ao pobre brasilei-
ro. O “nome” é considerado uma dádiva e pode ser até “empresta-
do”. A “estrutura das obrigações” não permite que os indivíduos se
neguem a “emprestar o nome” para amigos ou parentes que neces-
sitem de crédito formal ou no varejo. Os resultados dessa pesquisaainda indicam que os consumidores pobres buscam no consumo
formas de se destacar entre os iguais.
Rodrigo Bisognin Castilhos é coordenador do curso de adminis-
tração de empresas da Faculdade de Integração do Ensino Superi-
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or do Cone Sul – Fisul, de Garibaldi, além de professor da institui-
ção. É pesquisador da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
PERGUNTA:
Quais os aprendizados da pesquisa poderiam ser usados para
melhorar a competitividade mercadológica das empresas em geral?
1- INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo explorar as profundas mudan-
ças que o contexto digital e a Era Pós-Moderna imprimem às mar-cas, afetando o trabalho do profissional de pesquisa e estudos rela-
cionados a comunicação, e ajudar a “entender qual seria a contribu-
ição autêntica da pesquisa para as atividades de branding no cená-
rio atual”.
O trabalho começa com uma discussão teórica analisando os
eventos de multiplicação dos discursos e o consequente enfraqueci-
mento das grandes narrativas – das verdades absolutas - e das refe-
rências impostas pelas tradicionais instituições sociais próprios daEra Digital.
Depois, discute a fragilização da identidade e a formação de tri-
bos urbanas - expressão cunhada pelo sociólogo Michel Maffesoli e
as implicações culturais e sociais em termos de valores que esta
nova realidade traz para as marcas e os comportamentos de consu-
mo.
É a busca de entendimento das marcas e do consumidor por
meio de um caminho que foi utilizado no passado e que por muito
tempo deixou de ser considerado na pesquisa de mercado: encon-
trar referenciais teóricos na academia que possam estabelecer um
arcabouço mais amplo para o entendimento da sociedade e em
consequência a compreensão do consumidor nos seus aspectos
mais estruturais.A análise e a contextualização teórica servem de pano de fundo
para o entendimento dos dados primários que irão indicar de forma
empírica como acontecimentos relevantes da atualidade afetam o
consumo e acabam imprimindo um papel social e mercadológico
totalmente novo para as marcas.
A busca de recomendações e contribuições baseadas na com-
preensão do que ocorre com os consumidores é um desafio para
os profissionais de marketing e pesquisa. As mudanças que vêm
ocorrendo nos últimos tempos, especialmente com o crescimento
das modernas ferramentas digitais, têm colocado um cenário muito
complexo e diferente para o entendimento do relacionamento dos
consumidores com as marcas. Em geral, como os projetos de pes-
quisa de mercado são construídos a partir de hipóteses específicas
e buscam auxílio para decisões bastante pontuais, acabam tendo
dificuldades em contribuir para o entendimento dos movimentos es-
truturais que possam orientar qual seria o melhor caminho ou a solu-ção para uma melhor performance das marcas.
Estas enfrentam um processo de comoditização muito grande,
independente de categoria. A luta pela busca de diferenciação pa-
rece não preencher suas necessidades a médio e longo prazo. Exi-
ge-se uma busca constante de inovação no sentido de manter o
chamado “posicionamento”.
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Os meios de comunicação a que os consumidores estão expos-
tos mostram-se cada vez mais complexos, emaranhados e múlti-
plos, com muitas intersecções. Um cenário que pode ser descrito
metaforicamente como uma grande “nuvem” de informações que
dificulta a comunicação da sua mensagem e o destaque da sua
marca.
Neste contexto a marca perde parte da autoridade que tinha nopassado. O consumidor também passa a ser produtor de conteúdo
e o diálogo acontece em uma via de mão dupla. Este pode se trans-
formar em advogado da marca, construindo e reforçando pontos po-
sitivos, ou então criticar atitudes, mesmo aquelas fora do âmbito di-
retamente relacionado à marca.
Cada vez mais se torna difícil a manutenção de marcas grandes
no mercado e os níveis de lealdade são bastante fluidos. Começam
a se consolidar movimentos ligados a causas diferenciadas, uma
busca do diferente, uma segmentação extrema e até uma comunica-
ção quase que um a um, possibilitada pelo desenvolvimento das re-
des sociais e pela comunicação móvel individual.
Como este processo de fragmentação pode ser otimizado no
sentido de atender as expectativas de crescimento das marcas,
seja em termos de volume, rentabilidade ou ainda de perenidade no
mercado?Que aspectos sociológicos e antropológicos estão na base des-
tes movimentos que propiciam a extrema fragmentação, a dificulda-
de de um discurso mais massivo e a efemeridade dos grupos soci-
ais?
Considerando-que se trata de uma tendência sem volta, bastan-
te concreta e estabelecida, acreditamos ser importante buscar na
sociologia e na antropologia algum referencial que possa agregar
aos conhecimentos vindos de pesquisas sobre marcas pela
Millward Brown um entendimento do consumidor na pós-modernida-
de.
2- O CONTEXTO SOCIAL PÓS-MODERNOA busca da compreensão do contexto social atual, palco de
transformações importantes que levaram ao termo “pós-modernida-
de”, é fundamental para entender o mercado e o comportamento
do consumidor em relação às marcas.
A pós-modernidade remete à crise de características importan-
tes da modernidade. Gilles Lipovetsky (2005) em “Era do vazio” nostraz diversas reflexões interessantes sobre essa transição de perío-
dos e coloca que estamos em uma era pós-moralista. Antes, tínha-
mos instituições como a Família, a Igreja, o Partido, a Ideologia do-
minando a cena social e servindo como sentido irrefutável para nos-
sa existência, ou seja, éramos submissos a referências fixas, a ver-
dades/ valores que se pretendiam universais, como, por exemplo “a
mulher devia sacrificar-se pelo marido e pelos filhos”, “o homem de-
via sacrificar-se pela família, pela pátria e pelo trabalho”.
Nos dias atuais, há o surgimento de um novo tipo de cultura,
que rejeita essas medidas rígidas. Há uma ruptura em relação à no-
ção de “verdades absolutas”. A Pós-Modernidade consagrou a pos-
sibilidade de viver sem sentido, ou seja, de não crer na existência
de um único e categórico sentido, mas de apostar na construção
permanente de sentidos múltiplos, provisórios, individuais, grupais,
ou simplesmente fictícios (LIPOVETSKY, 2005:12). A moral rigorosa
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cede lugar à valorização comunicativa.
Isso significa que agora temos maior li-
berdade de criar novos conteúdos e es-
tes são constantemente atualizados; por-
tanto, temos uma atmosfera cultural que
tem como essência o efêmero. Disto deri-
va a expressão “pós-tudo” – tudo mudapela comunicação, pela interação, pela
múltipla escolha.
Vattimo (1992), já na década de 90,
apontava que a dissolução de pontos de
vistas centrais acontece em decorrência
da proliferação dos meios de comunica-
ção, como os jornais, o rádio, a televisão
e, entendemos, que principalmente doadvento dos meios digitais, caracteriza-
dos pela dinâmica reticular de distribui-
ção e difusão midiática, em oposição à
lógica piramidal das mídias analógicas -
qualquer pessoa hoje pode atuar como
emissora no processo comunicativo. So-
mos então expostos a um imenso volu-
me de informações/ discursos e diferen-
tes visões de mundo, o que acaba nos
levando a questionar os padrões que
nos são impostos.
Algumas das tendências da cultura
pós-moderna, importantes para nossa
reflexão sobre as marcas são: busca da
qualidade de vida (não há mais crença
na revolução e no progresso típica da
modernidade - todos querem viver o mo-
mento atual, aqui e agora), dilatação da
infância/juventude, culto à participação
e à expressão, reabilitação do local (em
contraposição aos últimos valores moder-nos), orientação por motivações e dese-
jos, valorização do lúdico, humanização/
sensibilidade, diversificação, socializa-
ção, flexibilização.
3- A FORMAÇÃO DAS
TRIBOS URBANAS - DAIDENTIDADE ÀSIDENTIFICAÇÕES
A multiplicação de discursos e o en-
fraquecimento de referências fixas (anco-
ragens socialmente definidas), anterior-
mente discutidos, acabam afetando a
construção da identidade individual, demodo a torná-la móvel, múltipla. Não ha-
veria um “eu” coerente, pois cada indiví-
duo poderia assumir identidades diver-
sas em diferentes momentos. Daí vem a
idéia de multivíduos – diversos “eus” em
um mesmo sujeito. Na medida em que
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os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam,
somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cam-
biante de identidades possíveis, com cada uma das quais podería-
mos nos identificar - ao menos temporariamente (HALL, 2004:13).
Em resposta à saturação da lógica de identidade e do conceito
de indivíduo, do progresso linear e seguro, há um fortalecimento da
realidade das tribos urbanas. Segundo Maffesoli (MAFFESOLI,2007:100), face à anemia existencial suscitada por um social dema-
siado racionalizado, as tribos urbanas acentuam a urgência de uma
socialidade empática: partilha das emoções, partilha dos afetos. O
universalismo do sujeito, da razão daria lugar a afetos locais, parti-
culares, situados. As tribos não teriam como fim um projeto, seu sen-
tido estaria relacionado ao prazer do “estar junto”, de usufruir o mun-
do tal como ele é. Apesar de este movimento ser originado das ge-
rações jovens, deve-se considerar que há um processo disseminató-rio da figura da “eterna criança” que se expande na sociedade. O
tribalismo remeteria à importância do sentimento de pertencimento
a um lugar, grupo, como base da vida social. Neste contexto, as
marcas teriam importância fundamental no que se refere a partilhar
sentidos, emoções. A “relação comercial”, mais do que troca de
bens, apontaria então para o que Maffesoli (2007) chama de “comér-
cio de idéias” e “comércio amoroso”.
LIPOVETSKY (2005) discute o fortalecimento do narcisismo naera pós-moderna, já que estamos menos submissos a imposições
do mundo externo e temos mais possibilidades de fazer escolhas e
aumentar as prioridades da vida privada; porém, o autor fala de um
narcisimo grupal - haveria uma necessidade de se unir com os idên-
ticos.
Na prática, algumas destas considerações teóricas podem ser
constatadas com alguma frequência quando analisamos os relacio-
namentos, as ligações com grupos familiares, as relações de traba-
lho e relações sociais. Resultados de pesquisa qualitativa usando
como ferramenta o Idea Blog1 deixaram estes conceitos bastante
evidentes. Seja através de fotos ou de textos postados na discus-
são, há a valorização do convívio em grupo mas estes não se funda-
mentam em uma causa mais perene ou estrutural. Demonstram as
várias facetas do indivíduo que se forma e se desagrupa dependen-
do do momento e dos objetivos mais imediatos. O agrupamento
não se dá com base em uma motivação estrutural clara. Estão jun-
tos pelo prazer de estarem juntos.
Podemos dizer que os grupos são “instantes” de identificação
que se desfazem na medida em que não existe um eixo estrutural
que os sustente e a estrutura social na pós modernidade tem facilita-do a configuração dos relacionamentos nesta linha.
Neste cenário como é possivel para as marcas estabelecer um
maior vínculo com esse novo consumidor, que é tão regido pelo efê-
mero, pelas mudanças rápidas e pelo momento?
4- DESAFIOS PARA AS MARCAS NA PÓS-MODERNIDADE
A proposta do nosso trabalho é chegar a uma sistematização
dos grandes desafios que as marcas enfrentam e analisar quais são
os grandes paradigmas que devem ser redefinidos e reconceitua-
dos. Estamos conscientes da complexidade do tema, cientes de
que não vamos chegar a desvendar em profundidade a questão e
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d ã l ã d fi i i d fi d i ã b bj i b
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entendemos que não temos a solução definitiva para os desafios.
Buscamos entregar uma contribuição para um novo pensamento e
conhecimento do que é o consumidor de hoje resgatando que este
é
1 O Idea Blog é uma pesquisa qualitativa da empresa Millward
Brown que ocorre por meio do ambiente online, onde os participan-
tes compartilham suas idéias, podendo postar conteúdos multimí-dia. A investigação teve como amostra 30 jovens de 18-25 anos de
todo o Brasil, tendo duração de 8 dias (01/12/2011 a 08/12/2011)
resultado de um processo de transformação das estruturas sociais,
culturais e econômicas que o mundo vem enfrentando.
Considerando-se o contexto social definido por Lipovetsky
(2005) e Maffesoli (2007) e os grandes desafios encontrados pelas
marcas, destacamos alguns pontos que podem servir como base
para a construção de um trabalho de marketing mais adequado àpós- modernidade:
• A atuação das marcas deve ultrapassar os limites dos beneficios
básicos e funcionais da categoria para buscar uma diferenciação
e possibilidade de identificação com um grupo que se alinha com
a “causa” da marca. Esta deve estar ancorada numa base estrutu-
ral de valores que se configura como sendo a “essência” da mar-
ca e que se manifesta de maneira consistente na complexa e vari-
ada rede de pontos de contato com o consumidor.
• A interatividade é a base das grandes mudanças nos paradigmas
de comunicação das marcas com os consumidores. Em conse-
quência deve- se reconceituar a base dos planos de mídia tradici-
onais cuja métrica básica é o público alvo ou o consumidor final
(atual ou potencial). Os grupos alvo são cada vez mais fragmenta-
dos, a comunicação busca como objetivos a cobertura que se es-
barra na “autoridade” e vontade do consumidor. O consumidor dei-
xa de ser o fim do processo de comunicação e passa a ser o
meio, com pouca certeza dos resultados.
• Com base na interatividade as marcas precisam construir um rela-
cionamento significativo com o consumidor com a entrega de algo
que seja relevante. A contribuição relevante da marca deve serconsistente com a sua proposta de posicionamento, ancorada
nos valores essenciais que fundamentam a existência da marca.
Em outras palavras, a comunicação das marcas deve ter como
objetivos a construção de um grupo de fãs que se caracterizem por
serem seguidores incondicionais seja às suas propostas básicas de
produto como também aos valores culturais e emocionais embuti-dos na marca. Sua atuação deve ultrapassar as “fronteiras” das pro-
postas relacionadas tão somente aos benefícios intrínsecos do pro-
duto.
5- AS FANPAGES COMO FERRAMENTASDE RELACIONAMENTO
Estudos da Millward Brown analisando a performance das fanpa-
ges demonstram claramente a importância destes grupos e os resul-
tados que representam para o desempenho das marcas. As fanpa-
ges conseguem estabelecer um vínculo maior com o consumidor,
gerando um relacionamento que pode ultrapassar os limites do pro-
duto em si; entregar serviços como lazer e entretenimento; estimular
26
t i d id i t ã E t é t t ã d li ã
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o protagonismo do consumidor e a interação com as marcas; pro-
mover uma comunicação direcionada e adaptada a valores locais;
promover experiências, reforçando, em última instância, a produção
de significado da marca para o consumidor. As fanpages, portanto,
atuam gerando engagement, lealdade, mais que publicidade/ visibi-
lidade da marca e vendas a curto prazo.
Por meio de uma análise da base de dados do BrandZ, que in-clui marcas de produtos de consumo de massa, serviços e bens de
consumo duráveis, é possível verificar que a relação do consumidor
com a marca é mais sólida entre aqueles que participam de sua
fanpage e que os fãs da marca representam um maior share of
wallet. Ser fã da marca significa maior lealdade e muito possivelmen-
te maior participação nas compras da categoria.
Esta é uma constatação quando se compara a ligação com a
marca entre os fãs e os não fãs. Mas será que as marcas têm apro-
veitado de forma adequada a possibilidades de interatividade e co-
nexão das redes sociais?
Por meio da pesquisa qualitativa referida anteriormente (Idea-
Blog - nota 1) procuramos verificar como as marcas aparecem no
discurso; como os consumidores se relacionam com as fanpages ese de fato as marcas desempenham um papel significativo no cená-
rio dos relacionamentos virtuais.
Na exploração espontânea os resultados são de certa forma
frustrantes. Os participantes das redes sociais praticamente não
mencionam marcas com um papel ativo no cotidiano das suas vi-
das e nas atividades sociais. As marcas não se mostram com uma
função significativa e relevante para os internautas.
Posts de imagens/fotos e textuais mostram as marcas com pa-
pel mais passivo, quase que um cenário das suas atividades.
As fanpages não aparecem de forma espontânea, com exceção
de algumas que muitas vezes se confundem com os sites oficiais
das marcas.
Quando estimulados, os entrevistados reagem de forma pouco
engajada:“São até úteis.. Mas não costumo acessar sempre”.
“Não lembro de algo que deu certo, pois até o momento nada
me chamou tanta atenção a ponto de curtir alguma marca no meu
facebook”.
27
“( ) devo admitir que não é esse o meu objetivo(ainda) com o Portanto percebemos que apesar de as fanpages se mostra
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(...) devo admitir que não é esse o meu objetivo(ainda) com o
uso do Facebook”.
“Uso mais meu facebook para conversar com amigos, postar fo-
tos e jogar. Não sou muito ligada às marcas que aparecem por lá...”
Os consumidores parecem até ter interesse em “curtir” a marca,embora não o façam. Porém, as fanpages não chamam atenção o
suficiente do consumidor a ponto de estimular o ingresso do consu-
midor nas fanpages. Em alguns casos, o usuário acaba até “curtin-
do” alguma marca, sem depois estabelecer uma interação maior
com a página. Um dos entrevistados declara: “até já curti algumas,
mas depois de um tempo esqueci... não acho nada úteis”.
Observamos também que uso das fanpages é mais funcional,
sem promover uma relação mais forte com o consumidor. Muitos
dos entrevistados dizem que as páginas que costumam “curtir” são
aquelas de compras coletivas, ou então, aquelas que comunicam
descontos, promoções, sorteios, tais como Peixe Urbano, Grupom e
ClickOn.
Portanto, as fanpages, como vêm se apresentando, parecem
não conseguir estabelecer uma conexão muito forte com o consumi-
dor. Algumas das principais críticas é que não se percebe tanta dife-renciação entre o site oficial e as fanpages e, além disso, estas não
possuem conteúdos que consigam captar a atenção do consumi-
dor. Um dos entrevistados declara que o que mais faz com que ele
se sinta interessado pela marca é “o modo com que se comunica e
relaciona com o cliente, usuário”. E cita a Nike como exemplo: “tem
vídeos incríveis e um site bem interativo”.
Portanto, percebemos que, apesar de as fanpages se mostra-
rem como ferramentas importantes para estabelecer um maior vín-
culo das marcas com o consumidor, elas não vêm sendo tão explo-
radas em todas as suas potencialidades. Sua utilização está bem
mais relacionada à chamada web 1.0, em que apenas há produção
de conteúdo pelas empresas, ou seja, o internauta pertence ao pa-
pel de mero espectador ("read-only web"), não se adequando à reali-
dade atual da web, em que o usuário pode interagir, criar conteúdo.
Uma análise das performances da fanpages feitas pela Millward
Brown estabelece 5 atributos básicos para o seu sucesso, conside-
rando-se a natureza do público e as características do meio: a avali-
ação geral, a probabilidade de recomendar a amigos, a probabilida-
de de revisitar, e o interesse e atenção para os posts e noticias. Es-
tes atributos combinados podem gerar impacto na atratividade da
marca, trazendo resultados no equity da marca e no envolvimentodo consumidor com a marca.
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FanIndex
Rang
Avaliação Geral
"MuitoFavorável"
Disposição para
recomendar
"Muito
provável"
Atenção para os
post das marcas
"Presta atençãoas marcas e lê
regularmente"
Possibilitar de
revisitar
"Muito
Provável"
Você consegue se lembrar de uma marca que esteja preparada 6 Possibilidades para adequar estratégias das marcas ao con
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Você consegue se lembrar de uma marca que esteja preparada
para o consumidor pós-moderno?
Um exemplo de fanpage bem sucedida na atualidade é a da
Smirnoff, que figura na quarta posição em número de acessos, de
acordo com ranking divulgado pela Socialbakers Social Media Re-
port (Nov/ 2011). Com o objetivo de inovar experiências em “bala-
das”, a marca lançou a campanha “Nigthlife Exchange”, que temcomo principal idéia um intercâmbio do melhor da noite de 14 paí-
ses. Por meio da fanpages, os internautas davam sugestões de
como seria a “balada perfeita” em seu país (poderia ser um tipo es-
pecífico de música, um drinque concebido localmente ou uma ten-
dência de moda de uma determinada parte do mundo). Aí, seriam
escolhidas as melhores idéias, que serviriam como base para repre-
sentar a “balada” brasileira em outro país. E o Brasil receberia a fes-
ta de outro país.A fanpage da Smirnoff conseguiu desta forma, chamar a aten-
ção do consumidor, promover, de maneira lúdica, a interatividade, o
relacionamento, estimular o protagonismo do consumidor e, ainda,
valorizar as peculiaridades locais, por meio de uma ação intimamen-
te relacionada à proposta da marca. Além disso, a marca se empe-
nhou em trazer constantes novidades para que a atenção não se di-
luísse e para que o consumidor mantivesse seu interesse.
A estratégia das marcas para alavancar a performance das
fanpages, a nosso ver, deve considerar o raciocínio inverso ao que
vem sendo utilizado: o que a marca pode fazer ou que serviços a
marca deve prestar ao consumidor, ao invés de tentar descobrir o
que a mídia social pode fazer pela marca.
6- Possibilidades para adequar estratégias das marcas ao con-
sumidor pós- moderno
A partir do estudo teórico realizado, foram levantados alguns ca-
minhos - já identificados e trabalhados – para o estabelecimento de
um vínculo mais sólido (ou menos perecível) com o consumidorque, a nosso ver, são bastante adequados à nova lógica da socieda-
de atual.
• Trabalhar marca dentro do conceito de Branding. Fazer com que
a marca atue como manifestação e representação de símbolos e
valores culturais de interesse, praticados ou aspiracionais ao públi-
co, atuando como produtora de sentido para o consumidor. Traba-
lho de branding onde a marca se relaciona com o consumidor e
atende aos interesses de TODOS os públicos (stakeholders) damarca além dos consumidores finais. Os acionistas, os funcionári-
os, a comunidade local e a sociedade em geral são alguns exem-
plos. No contexto atual, temos um consumidor mais crítico, que
tem acesso a muita informação, e requer uma atuação das empre-
sas que vá além do mercado. Além disso, é preciso que a comuni-
cação da marca seja coerente em todos os públicos que se relaci-
onam com a empresa – a marca como produtora de significado
deve mostrar consistência.
• Promover uma “experiência” com a marca envolvendo os 5 senti-
dos. LINDSTROM (2007) defende que para criar uma marca forte,
é preciso acionar os cinco sentidos. A visão e a audição não bas-
tariam para impressionar o consumidor. O toque, o odor e o sabor
são cruciais na construção de uma marca verdadeiramente rele-
vante. Tal prática vai ao encontro da valorização do aspecto emo-
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cional da atualidade que pode ser potencializado pelas marcas (2008) detalha que as marcas que conseguiram se apropriar de
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cional da atualidade, que pode ser potencializado pelas marcas
ao explorar os cinco sentidos. O consumidor hoje busca mais do
que o produto em si, a experiência que a compra pode proporcio-
nar. A proliferação de lojas conceito é um reflexo dessa tendência,
já que estas se mostram como uma ferramenta que permite a ex-
ploração dos sentidos na comunicação da marca. Exemplos clás-
sicos são a Apple Store e a FAO SCHWARZ em Nova York. No Bra-
sil, algumas lojas conceito representativas são a Casa Natura,
que, apesar de não se configurar como um local de compra, per-
mite que o consumidor interaja com seus produtos, tendo sido pla-
nejada para ser uma experiência sensorial da marca e remeter à
sua missão de proporcionar bem-estar; e a loja conceito da Ha-
vaianas, que contém elementos lúdicos e permite que o consumi-
dor customize seus chinelos.
• Gerar relacionamento/ lazer/ entretenimento/ humor através de ser-viços prestados pela marca, que podem não ser restritos aos be-
nefícios do produto, mas devem estar relacionados a seu valor es-
sencial, permitindo o que LIPOVETSKY (2005) chama de “consu-
mo da própria existência”. O hotel australiano Art Series Hotel
Group, por exemplo, que se propõe como cool e ligado a arte, fez
uma promoção em que se um hóspede conseguisse achar um de-
terminado quadro de um artista renomado, poderia roubá-lo, e, se
não fosse pego, ficaria com este.
• Estimular o protagonismo do Consumidor. A Four Food, por exem-
plo, é um restaurante em Nova York em que você pode criar seu
próprio sanduíche. Se ele for adotado por outros consumidores, o
“criador” ganha royalties sobre as vendas (fonte: site Sebrae).
• Adaptar as marcas a valores locais, seja pela comunicação ou por
outros elementos do mix. Nigel Hollis em seu livro “Global Brands”
(2008) detalha que as marcas que conseguiram se apropriar de
valores culturais locais tem melhor performance. O comercial “O
Gigante de Jonnhie Walker”, por exemplo, foi desenvolvida especi-
ficamente para o Brasil. A comunicação mostra “o despertar do
gigante” associados aos valores brasileiros dentro do conceito da
campanha “Keep Walking” que a marca vem construindo global-
mente há alguns anos.
E dentre estas várias possibilidades utilizar todas as potenciali-
dades que o mundo digital e especialmente as redes sociais po-
dem trazer para a marca, indo ao encontro das necessidades soci-
oculturais do consumidor pós-moderno.
7- CONCLUSÕES
O contexto social da atualidade é palco de profundas transfor-
mações que acabam afetando o consumo e o comportamento do
consumidor em relação às marcas. Identificamos que na pós-moder-
nidade as pessoas são expostas a inúmeros discursos, a verdades
absolutas, e as regras estabelecidas pelas grandes instituições ago-
ra são colocadas em cheque. Neste cenário, consagrou-se a possi-bilidade de construção de sentidos múltiplos, provisórios.
Como consequência, o indivíduo se torna “multivíduo”, ou seja,
acaba construindo seu “eu” em torno de referências múltiplas e mui-
tas vezes contraditórias. Com a saturação da noção de indivíduo,
ocorre o fenômeno das tribos urbanas. E neste contexto, as marcas
exercem grande importância na partilha de sentido entre os grupos.
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Apesar disso, na prática, verificou-se que o vínculo do consumidor que as novas tendências sociais sejam levadas em conta para me-
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Apesar disso, na prática, verificou se que o vínculo do consumidor
com as marcas mostra-se frágil.
Com base em tendências da pós-modernidade já mencionadas,
como busca da qualidade de vida (não há mais crença na revolu-
ção e no progresso, todos querem viver o momento atual, aqui e
agora), dilatação da infância/juventude, culto à participação e à ex-
pressão, reabilitação do local (em contraposição aos últimos valo-res modernos), orientação por motivações e desejos, valorização
do lúdico, humanização/sensibilidade, diversificação, socialização,
flexibilização, apontamos alguns caminhos já trabalhados para que
a relação do consumidor com a marca se fortaleça, tais como: traba-
lhar marca dentro do conceito de Branding; envolver o consumidor
considerando-se os cinco sentidos e promover uma “experiência”
com a marca; gerar relacionamento/ lazer/ entretenimento/ humor
através de serviços prestados pela marca; estimular o protagonis-mo do consumidor; adaptar as marcas a valores locais; usar a web
e as redes sociais para estimular a interação com o consumidor.
As fanpages mostram-se como uma ferramenta bastante interes-
sante para estimular um vínculo mais forte do consumidor com a
marca, ao abranger diversos dos pontos mencionados acima sobre
as tendências identificadas para a comunicação. Porém, observa-
se que esse instrumento precisa ser mais bem explorado, para que
atinja o consumidor: as marcas não vêm se utilizando de todas assuas potencialidades.
Por fim, entendemos que o novo cenário social faz com que o
consumo e as marcas exerçam um papel muito importante, desem-
penhando funções diferentes das de outrora. É essencial que o com-
portamento do consumidor pós-moderno seja bem compreendido e
que as novas tendências sociais sejam levadas em conta para me
lhor direcionar as atividades das marcas.
PSICOLOGIA DO CONSUMO
O processo de compra não é mais visto apenas como uma sériede fatores racionais.
Na hora da escolha, o consumidor desenvolve cada vez mais
uma relação afetiva e de identificação com os produtos.
Quatro teorias da personalidade destacam-se no estudo do com-
portamento do consumidor: a teoria psicanalítica, a teoria junguia-
na, a teoria neofreudiana e a teoria de traços.
A teoria psicanalítica de Freud fornece a base para o estudo da
pesquisa motivacional, partindo da premissa que as forças huma-
nas são amplamente inconscientes por natureza e servem para moti-
var muitas ações do consumidor.
A teoria junguiana enfoca tipos de personalidade. Os quatro pa-
res de tipos de personalidade mais pesquisados no estudo do com-
portamento do consumidor são sentimento-intuição, pensamento-e-
moção, extroversão-introversão e julgamento-percepção. Estes qua-tro pares de dimensão refletem características de personalidade dis-
tintas, que influenciam as atitudes do consumidor em relação ao am-
biente à sua volta.
A teoria neofreudiana tende a enfatizar o papel fundamental dos
relacionamentos sociais na formação e desenvolvimento da perso-
nalidade.
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A teoria dos traços acredita que os indivíduos possuem traços memórias. Carrey se deita em uma cama e, a seu lado, o ajudante
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psicológicos inatos em grau maior ou menor, dentre outros: inova-
ção, busca pela novidade, necessidade de cognição, e, materialis-
mo. Estes traços podem ser medidos por escalas planejadas espe-
cificamente, ou inventários, que são simples de serem usados e de
serem medidos, e, que por isso, são comumente utilizados pelos
pesquisadores que estudam a personalidade dos consumidores
(SCHIFFMAN; KANUK, 2000).
PARA REFLETIR
NEUROMARKETING
DOSSIÊ CONSUMIDOR 3.0: MENTESQUE NÃO MENTEM
Fonte: Mundo do Marketing
Nada parece mais complexo no ser humano do que sua mente.
Abrigo de recordações, usina de ideias e caldeirão de emoções,
seu funcionamento é enigmático, e realizam-se cada vez mais pes-quisas para decifrar seus segredos com o objetivo de aumentar o
prazer, diminuir a dor ou, até, alterar a memória. É isso que aconte-
ce, por exemplo, no filme Brilho Eterno de uma Mente sem Lembran-
ças. Os personagens protagonizados por Kate Winslet e Jim Carrey
vivem uma paixão intensa e, quando esta acaba, querem limpar
todo o rastro dos momentos compartilhados. Primeiro ela e logo em
seguida ele contratam os serviços de um especialista em apagar
y , , j
do especialista observa, na tela do computador, os dados que che-
gam do cérebro do personagem e vai eliminando, uma a uma, as
imagens da ex-namorada.
A cena pertence à ficção, mas o uso de avançados equipamen-
tos tecnológicos com o objetivo de traçar um mapa da mente já é
realidade em laboratórios de diferentes partes do mundo. Uma ex-periência que durou três anos, envolveu cerca de 200 pesquisado-
res e mais de 2 mil voluntários e custou aproximadamente US$ 7 mi-
lhões foi comandada pelo especialista de marketing Martin Linds-
trom. A maioria dos participantes era proveniente dos Estados Uni-
dos, Inglaterra, Alemanha, Japão e China. O objetivo foi entender
como o inconsciente influencia o comportamento do consumidor e
o resultado da pesquisa foi o livro Buyology, algo como “compralo-
gia”, lançado no Brasil como A Lógica do Consumo – Verdades eMentiras sobre Por que Compramos (ed. Nova Fronteira). Na entre-
vista a seguir, concedida com exclusividade a HSM Management,
Lindstrom descreve os resultados do estudo e explica por que o
neuromarketing pode ajudar a reverter o índice de 80% de fracasso
nos lançamentos.
Alguns falam que está havendo uma transformação profunda na
maneira de pensar dos consumidores nos últimos anos. O sr. con-
corda com isso? Sim, os consumidores de minha geração, ou seja,os que têm por volta de 40 anos, incorporaram um novo “marcador
somático”. O que é isso?
É como um sinalizador no cérebro, que serve para conectar
uma experiência ou emoção a uma reação específica. Ocorre algo
similar ao que aconteceu durante a Segunda Guerra Mundial.
Quem sofreu com a escassez de alimentos e aprendeu a armazená-
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los durante o conflito manteve, mesmo depois de assinado o armistí- do se eles perderem o emprego. É o que fez a coreana Hyundai, cu-
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cio, o hábito de fazer provisões –para o caso de estourar uma nova
guerra. Minha geração nos Estados Unidos não foi afetada por tal
experiência e não tinha esse marcador somático. No entanto, no últi-
mo ano e meio, a derrocada de ícones considerados estáveis,
como o banco Lehman Brothers, produziu nessa geração um forte
choque, que não será esquecido, e modificou seu comportamento
de compra. Tais pessoas já não gastarão tanto dinheiro como o fazi-
am no final de 2007. Talvez aconteça algo semelhante com quem
viveu tempos turbulentos em economias emergentes. E, na prática,
isso significa que, antes de comprar um produto, é provável que as
pessoas procurem ofertas especiais e descontos. Como padrão,
além disso, os consumidores buscarão retorno funcional e conexão
emocional com a marca.
Mas como ficaram as emoções dos consumidores nessa histó-ria? Aumentou o sentimento de culpa? O medo?
O medo. É lamentável, mas o medo está se transformando no
impulsionador primário de muitas marcas e vem sendo incluído de
várias formas nas campanhas publicitárias nos mercados norte-
americanos e europeus. Por exemplo, anúncios que dizem “Se você
não comprar esta marca, terá problemas” ou “Se não usar este pro-
duto, perderá popularidade”. Muitos setores de atividade, entre eles
o farmacêutico, o de brinquedos e o de seguros, recorrem ao medode maneira estratégica. E ainda há o medo de perder o emprego ou
de falir, no caso dos empreendedores. O problema não é falta de
dinheiro para comprar, mas o medo.
O que as empresas têm de fazer é adotar estratégias que rever-
tam essa situação. Por exemplo, nos Estados Unidos, algumas mon-
tadoras vêm garantindo aos clientes que seu dinheiro será devolvi-
p p g q y
jas vendas aumentaram mais de 10% em 2009, indo totalmente con-
tra a corrente do mercado automobilístico. E, diferentemente do que
alguns acreditavam, até esta nossa conversa, nenhum automóvel foi
devolvido.
Imagino que as marcas de luxo fiquem mais vulneráveis nessa
situação, ao menos nas economias maduras. Mas algumas marcasde luxo parecem não sentir o impacto, como Hermès. Por quê?
No caso de Hermès, as carteiras, por exemplo, contam com
grandes listas de espera de clientes. Eles esperam entre dois e três
anos para receber uma carteira da grife. Quem já esperou todo
esse tempo não vai cancelar o pedido. A Louis Vuitton, por sua vez,
fez várias coisas inteligentes. Em primeiro lugar, empreendeu uma
grande aposta no mercado chinês, país que não sofreu tanto quan-
to outros, na linha do que aconteceu com vocês no Brasil, e ondeainda há um gap de consumo a satisfazer. Em segundo, uma publi-
cidade muito sagaz, no mundo inteiro, promovendo valores do pas-
sado, que remetem, justamente, a segurança. Em momentos instá-
veis, as pessoas não querem ouvir falar do futuro; preferem o passa-
do, quando tudo parecia seguro.
Então, os anúncios da Louis Vuitton são protagonizados por ce-
lebridades que já não estão na moda, como o ator Sean Connery,
cuja época de esplendor foi a década de 1960. A empresa passou
a seguinte mensagem: “A Louis Vuitton pode ser uma marca muito
cara, mas estará com você para sempre, de modo que é um investi-
mento para os próximos 20 anos; qualquer outra marca poderá de-
saparecer ou sair de moda”. O mesmo tipo de publicidade adotou a
Boots, marca de botas inglesa, que vem aumentando suas vendas
direto.
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Seu último livro, Buyology no original em inglês, foi baseado em o último modelo de telefone da Nokia, porque suas decisões são im-
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um extenso experimento de neuromarketing. Em que consiste esse
tipo de pesquisa?
Enquanto as pesquisas tradicionais se caracterizam por pergun-
tas a consumidores e participantes de focus groups, o neuromarke-
ting se propõe analisar a parte não consciente do cérebro. Como já
se provou que pelo menos 85% de nossas decisões são tomadasna zona inconsciente do cérebro, as pesquisas tradicionais não cap-
tam suas razões de ser. As pessoas costumam ter dificuldades para
explicar por que compraram uma camisa de determinada marca ou
pulsionadas por emoções, que elas nem percebem –ou, quando
percebem, acham que é bobagem falar delas.
E como o neuromarketing capta a atividade cerebral?
Principalmente por meio de um aparelho de ressonância magné-
tica, uma espécie de scanner do cérebro, normalmente usado para
detectar tumores. Com esse equipamento é possível examinar o cé-
rebro de uma amostra de consumidores, identificar as regiões asso-
ciadas a certos comportamentos e detectar o que sentem quando
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E como o neuromarketing cap-ta a atividade cerebral?
pensam em determinadas marcas e produtos. Em outras palavras, Como foi detectada a relação entre religião e marcas?
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o neuromarketing representa uma nova geração de pesquisas, em
que a ciência cruza com o marketing.
Mas como exatamente se descobrem no cérebro quais são as
emoções associadas a uma marca?
Por uma série de estudos anteriores. Já sabemos, por exemplo,
que o medo e a amígdala cerebral estão estreitamente associados.
Então, pense o seguinte: algumas pessoas veem um anúncio publi-
citário e dizem que gostam dele, mas não sabem por quê. Aí vamos
escanear seu cérebro, detectamos que nessas pessoas se ativa –
ou há maior fluxo sanguíneo– a região da amígdala quando veem o
anúncio, o que significa que o anúncio as perturba. Graças ao mai-
or conhecimento do cérebro e das regiões associadas a alguns ti-
pos de pensamento, captamos emoções que as pessoas não con-
seguem expressar verbalmente.
Que resultados dessa pesquisa de neuromarketing mais o sur-
preenderam?
Eu citaria três resultados particularmente. Fiquei muito surpreso
em ver que as advertências nos maços de cigarros não funcionam.
Algumas dizem, de maneira drástica e direta, que fumar é prejudici-
al à saúde e causa essa ou aquela doença, mas não conseguem o
efeito desejado nas pessoas. Vou além. Essas advertências, ao con-trário, incentivam as pessoas a fumar. Também me surpreendeu
comprovar que o sentido mais importante para criar marcas e comu-
nicar não é a visão, e sim a audição. E outra grande surpresa foi a
forte conexão que há entre religião e marcas.
As zonas do cérebro que são ativadas nas pessoas religiosas
quando recordam suas experiências nessa área são as mesmas
que se ativam no cérebro dos consumidores quando pensam em
suas marcas preferidas. Para detalhar as características desse vín-
culo entre religião e marcas, entrevistei líderes de várias religiões,
especialmente a católica, a protestante, a budista e a islâmica. Que-ria entender os pilares sobre os quais se baseiam, e descobri que
são os mesmos em todas: rituais, visão forte e poderosa, um inimi-
go claro, apelo aos sentidos e narração de histórias estupendas.
Cada vez mais, as marcas são desenvolvidas a partir desses ele-
mentos também. Pense no seguinte: a maioria das religiões tem
uma missão bem definida, como alcançar o estado de graça ou cer-
to objetivo espiritual. A maior parte das empresas também tem uma
missão bem definida, como a de Steve Jobs para a Apple em mea-
dos da década de 1980, quando ele disse “O homem é o criador
da mudança no mundo. Como tal, deveria sobrepor-se aos sistemas
e estruturas, e não estar subordinado a eles”. Cerca de 20 anos e
alguns milhões de iPods mais tarde, a empresa ainda persegue
essa missão, é ou não é? Outra comparação: as religiões se concen-
tram em exercer o poder sobre o inimigo, o que co