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* ABSTRACT: This paper addresses a brief review of the main issues that have been studied on Organizational Culture. The focus is on questions to which academic research- ers and organizational consultants have drawn their at- tention. It puts on the same title some different points of view and raises some questions about ideological con- tents of the studies mentioned. The study is anchored to the north-american findings research produced from 1979 on, containing a set of 148 articles and 15 books together. * KEY WORDS: Organizational culture, organiza- tional simbolism, ideology, analysis of organizations. NOTAS E COMENTÁRIOS CULTURA ORGANIZACIONAL GRANDES TEMAS EM DEBATE* Maria Ester de Freitas Professora do Departamento de Administração da Universidade Federal de Uberlândia. Mestre em Administração de Empresas pela EAESP/FGV. * RESUMO: Este texto reconstitui a bibliografia norte- americana, a partir de 1979, situando os tópicos que rece- beram maior destaque por parte de acadêmicos e consul- tores organizacionais. Agrupa sob um mesmo título várias opiniões, indicando diversos aspectos investigados em pesquisas empíricas. Detalha conceitos e levanta algumas interrogações sobre os conteúdos ideológicos implícitos nos estudos citados. * PALAVRAS CHAVE: Cultura organizacional, sim- bolismo organizacional, ideologia, análise organizacional. * Este texto é uma síntese da Dissertação de Mestrado da au- tora, com o mesmo título, defendida na EAESP/FGV em 30.10.89. Jul./Set. 1991 73 São Paulo, 31 (3): 73-82 Revista de Administração de Empresas Cultura organizacional grandes temas em debate

CULTURA ORGANIZACIONAL GRANDES TEMAS EM DEBATE*

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Page 1: CULTURA ORGANIZACIONAL GRANDES TEMAS EM DEBATE*

* ABSTRACT: This paper addresses a brief review ofthe main issues that have been studied on OrganizationalCulture.

The focus is on questions to which academic research-ers and organizational consultants have drawn their at-tention. It puts on the same title some different points ofview and raises some questions about ideological con-tents of the studies mentioned.

The study is anchored to the north-american findingsresearch produced from 1979 on, containing a set of 148articles and 15 books together.

* KEY WORDS: Organizational culture, organiza-tional simbolism, ideology, analysis of organizations.

NOTAS E COMENTÁRIOS

CULTURA ORGANIZACIONALGRANDES TEMAS EM DEBATE*

• Maria Ester de FreitasProfessora do Departamento de Administração daUniversidade Federal de Uberlândia. Mestre emAdministração de Empresas pela EAESP/FGV.

* RESUMO: Este texto reconstitui a bibliografia norte-americana, a partir de 1979, situando os tópicos que rece-beram maior destaque por parte de acadêmicos e consul-tores organizacionais. Agrupa sob um mesmo título váriasopiniões, indicando diversos aspectos investigados empesquisas empíricas. Detalha conceitos e levanta algumasinterrogações sobre os conteúdos ideológicos implícitos nosestudos citados.

* PALAVRAS CHAVE: Cultura organizacional, sim-bolismo organizacional, ideologia, análise organizacional.

* Este texto é uma síntese da Dissertação de Mestrado da au-tora, com o mesmo título, defendida na EAESP/FGV em 30.10.89.

Jul./Set. 1991 73São Paulo, 31 (3): 73-82Revista de Administração de Empresas

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1. Ver Administrative ScienceOuarterly, 23(3), set. 1983; eOrganizational Dynamics, 12,aut. 1983.

2. Vide Fortune, jun/82, outl83 e mai/84; Business Week,outl80, dez/82. mai/84 e outl86; The New York Times, 07112/83.

3.Vide, entre outros: JAQUES,Elliot. The Changing Culture ofa Factory. Londres, Tavistock,1951; McGREGOR, Douglas.The Human Side of Enterprise.New York, McGraw-Hill, 1960;BARNARD,Chester. The Func-tions of the Executive. Cam-bridge, Harvard Press, 1938;SELZNICK, Philip. Leadershipin Administration. New York,Harper & Row, 1957; HARRI-SON, George. "UnderstandingYour Organization's Charac-ter". HaNard Business Review,mai/jun, 1972; KATZ, D. &KAHN, R. The Psychology ofOrganizations. New York, JohnWiley & Sons, 1966; WATSON,Thomas. A Business and itsBeliefs - the ideas that helpedbuilt IBM. New York, Colum-bia Univ. Press/McGraw-Hill,1963.

4. Vide, entre outros: DEAL, T.& KENNEDY,A. Corporate Cul-ture: the rites and rituais ofthe corporate life. Massa-chusets, Addison-Wesley,1982; PETERS,T. & WATER-MAN Jr. In Search of Excel-lence. New York, Harper &Row, 1982; GORDEN, W."Organizational Imperativesand Cultural Modifiers". Busi-ness Horizons, 27, mailjun,1984; KANTER, R. TheChange Masters. New York,Simon & Schuster, 1983.

5. ALVESSON, Mats. Organi-zation Theory and TechnocraticConsciousness-Rationality,Ideology and Oua/ity Work.New York, Walter de Gruyter,1987.

6. SCHEIN, Edgard. "Comingto a New Awareness of Organ-izational Culture". Sloan Man-agement Review, Winter,1984; e SHEIN, Edgard. "HowCulture Forms, Develops andChanges". In KILMANN, R. etalii. Gaining Control of theCorporate Culture, San Fran-cisco, Jossey-Bass, 1985.

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INTRODUÇÃO

Teoria das Organizações vem dandoênfase crescente ao tema Cultura Or-ganizacional. Embora presente na li-

teratura anterior à década de 80, a maior in-cidência de pesquisas, conferências, cursos,publicações etc. começa a ocorrer a partir de1983, quando as revistas Administrative Sei-ence Quarterly e Organizational Dynamics dedi-caram edições especiais ao assunto'.

Curiosamente, a discussão sobre a CulturaOrganizacional vem ocorrendo não apenasnos limites da academia, mas também naspáginas da grande imprensa'.

Por que o grande interesse pela questãocultural nas organizações cresceu só nos anosoitenta, se ela já estava presente na produçãoacadêmica anterior'? E interessante notar que,já na primeira metade deste século, o Sr. TomWatson pregava os valores e crenças da IBM;que, em 1913, a J.c.Penny formulou o seucredo, onde enfatizava que uma vitória rápidaera menos importante que a construção deuma lealdade a longo prazo; que o credo daJohnson & Johnson data de 1940.

Poucos são os autores que se arriscaram aexplicar a razão desse interesse súbito. Nestespoucos', a argumentação mais comumenteencontrada relaciona-se ao recente declínio daprodutividade norte-americana e ao ganho decompetitividade dos japoneses. O milagre ja-ponês tem inspirado vários best-sellers e mui-tas organizações têm contratado serviços deconsultoria para aplicar as técnicas que fazemo sucesso japonês. Esse tipo de transposiçãotem levantado as diferenças entre as duas so-ciedades, onde o Japão aparece como maishomogêneo, com visão holística e ênfase nocoletivo.

Numa explicação diferente, Mats Alves-sons admite que a popularidade do tema podeser atribuída em parte ao milagre japonês,porém não reconhece que os problemas pu-ramente econômicos possam explicar oporquê do grande interesse pelos aspectosculturais e simbólicos nas organizações.Apoiado no pressuposto de que a Teoria dasOrganizações tem sido influenciada ideologi-camente pela perspectiva gerencial, sugere

Aque as pesquisas realizadas nessa área são,em grande parte, respostas a problemas práti-cos identificados pelas gerências. Para Alves-son, o desenvolvimento acelerado dos últimosdez ou vinte anos tem resultado num ptocessode quebra da uniformidade e cõesão dos pa-drões culturais. Essas tendências têm pro-duzido uma fragmentação e heterogeneidade,onde a interação social aparece comoproblemática, evidenciando a necessidade deaperfeiçoamento do conteúdo das ideologiase! ou dos fundamentos em que elas estãobaseadas. A cultura organizacional surge comoum contra-ataque aos problemas de desinte-gração da sociedade, como uma soluçãoatraente, enfatizando as idéias comuns, for-mas de pensar, valores, padrões e maneirasde trabalhar. Assim, a cultura organizacionalfornece a resposta a essas tendências de desa-gregação social pela quebra dos padrões cul-turais, reproduzindo uma ordem particular,via consenso e solidariedade entre os mem-bros da organização.

Compartilhamos da opinião de Alvesson evemos a cultura organizacional como umpoderoso mecanismo de controle, que visa aconformar condutas, homogeneizar maneirasde pensar e viver a organização, introjetandouma imagem positiva dela, onde todos sãoiguais, escamoteando as diferenças e conflitosinerentes a um sistema que guarda um anta-gonismo e anulando a reflexão.

Neste trabalho, pretendemos apresentar,mais ou menos sucintamente, os tópicos quetêm recebido maior atenção de pesquisadoresacadêmicos e consultores organizacionais. Ospontos escolhidos foram baseados no levan-tamento da bibliografia norte-americana, prin-cipalmente, de 1979 a 1989, sendo utilizados148 artigos e quinze livros. Não pretendemosfazer uma avaliação crítica dos diversos sub-temas - ainda que façamos alguns comen-tários esporádicos sobre um ou outro tópico- mas visamos a apresentar a maneira comoo assunto vem sendo debatido.

A QUESTÃO CONCEITUAL

A discussão em torno da cultura organiza-cional vem seguindo uma base de conceitosfornecida pela Antropologia Cultural, ondeexistem diversas correntes teóricas, que privi-legiam aspectos diferentes de um mesmofenômeno.

Para efeitos deste trabalho, adotamos o con-ceito apresentado por Schein", que considera-mos um dos mais ricos na literatura consul-tada. A Cultura Organizacional é o modelodos pressupostos básicos, que um dado grupoinventou, descobriu ou desenvolveu no

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processo de aprendizagem, para lidar com osproblemas de adaptação externa e integraçãointerna. Uma vez que os pressupostos tenhamfuncionado bem o suficiente para serem con-siderados válidos, eles são ensinados aos de-mais -membros da organização como a ma-neira certa de se perceber, pensar e sentir emrelação àqueles problemas.

ALGUNS ELEMENTOS DA CULTURAORGANIZACIONAL

A descrição dos elementos que constituema cultura organizacional, a forma como elesfuncionam e, ainda, as mudanças que eles pro-vocam no comportamento são maneiras dedar ao assunto um tratamento mais concretoe de mais fácil identificação. Nesse sentido, ébastante comum encontrarmos a cultura sendoconceituada a partir dos- seus próprios ele-mentos.

Verificamosque, no todo ou em parte, esseselementos fornecem uma interpretação paraos membros da organização, onde a passagemdos significados se dá como uma coisa aceita.A linguagem é funcionalizada, restando aaceitação do que é oferecido como é ofere-cido. De certa forma, isso sugere a presençade um componente hipnótico, através do qualas mensagens e comportamentos convenien-tes são objeto de aplauso e adesão, levando ànaturalização do seu conteúdo e à transmissãoespontânea aos demais membros. Tanto aadesão como a reprodução demonstram nãoa liberdade dos indivíduos de os aceitar ounão, mas a eficiência do controle embutido.

Os elementos mais freqüentemente citadossão:

a) Valores: definições a respeito do que é im-portante para se atingir o sucesso. Observa-seque, em geral, as empresas definem algunspoucos valores, que resistem ao teste dotempo, os quais são constantemente enfati-zados. Ainda que elas tendam a personalizaros seus valores, podemos verificar que elesguardam algumas características comuns:importância do consumidor, padrão de de-sempenho excelente, qualidade e inovação,importância da motivação intrínseca etc.

b) Crenças e pressupostos: geralmente usa-dos como sinônimos para expressar aquilo queé tido como verdade na organização. Quandoum grupo ou organização resolve seus proble-mas coletivos, esse processo inclui algumavisão de mundo, algum mapa cognitivo,algumas hipóteses sobre a realidade e anatureza humana. Se o sucesso ocorre, aquelavisão de mundo passa a ser considerada

válida. Os pressupostos tendem a tornar-seinconscientes e inquestionáveis.

c) Ritos, rituais e cerimônias: são exemplosde atividades planejadas que têm con-seqüências práticas e expressivas, tornando acultura mais tangível e coesa. Exemplos des-sas atividades constituem grande parte do queé desenvolvido pelos Departamentos de Re-cursos Humanos; como nos casos de ad-missão, promoção, integração, demissão etc.

d) Estórias e mitos: enquanto as estórias sãonarrativas de eventos ocorridos que informamsobre a organização, os mitos referem-se aestórias consistentes com os valores organi-zacionais, porém sem sustentação nos fatos.Ambos elementos preenchem funções específi-cas, tais como: mapas, símbolos, scripts etc.

e) Tabus: demarcam as áreas de proibições,orientando o comportamento com ênfase nonão-permitido. A literatura consultada não dámaior atenção ao assunto, preferindo deter-seem casos de tragédias organizacionais e suge-rindo formas de se lidar com elas.

f) Heróis: personagens que incorporam osvalores e condensam a força da organização;Fala-se dos heróis natos e dos criados. Ecomum as organizações chamadas culturasfortes exibirem os seus heróis natos, como:Tom Watson, da IBM; [ohn Rockefeller, daStandard Oil; Henry Ford, da Ford, entreoutros.

g) Normas: as regras que defendem o com-portamento que é esperado, aceito esan-cionado pelo grupo, podendo estar escritasou não.

h) Processo de comunicação: inclui uma redede relações e papéis informais que compor-tam padres, fofoqueiros, conspiradores, con-tadores de estórias etc. Ele desenvolve funçõesimportantes como a de transformar o corri-queiro em algo brilhante, podendo ser usadona administração da cultura.

DESENVOLVI~ENTO, MANUTENÇÃO EIDENTIFICAÇAO DA CULTURA

Esses aspectos estão diretamente relaciona-dos ao que os autores entendem por cultura.Escolhemos as proposições de Schein" e DyerJr.8 sobre o desenvolvimento e manutenção, eas análises de Vijay Sathe?e Deal e Kennedy'"sobre a identificação cultural.

Schein propõe um modelo dinâmico paraa análise da formação da Cultura. Considera

7. SCHEIN, Edgard. "How Cu1-tu re Forms, Develops andChanges". Op. cit.

8. DYER JR., W. G. "The Cycleof Cultural Evolution in Organi-zations. In: KILMANN, R. et alii.Op. cit.

9. SATHE, Vijay. "How to De-cipher and Change CorporateCulture" in KILMANN, R. et alii.Op. cit.

10. DEAL, T. & KENNEDY, A.Op cit.

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algumas definições que as organizações fazempara manejar os seus ambientes interno e ex-terno, e que incluem:

a) senso de missão, razão de ser de sua exis-tência;b) alguns objetivos concretos derivados damissão;c) sentido de realização através de estruturase processos;d) sentido de acompanhamento; ee) sentido de reparo.

Para que essas definições funcionem, todogrupo deve ter:

1. linguagem comum e categorias conceituaiscompartilhadas;2. algum modo de definir suas fronteiras eselecionar seus membros;3. alguma forma de alocar autoridade e status;4. normas para lidar com as relações inter-pessoais e íntimas;5. critérios de recompensas e punições; e6. alguma forma de lidar com o não-adminis-trável.

Trabalhando com a hipótese segundo aqual a cultura é transmitida basicamente apartir dos mecanismos de redução de an-siedade/dor e de reforço/recompensa, Scheinacredita que a pergunta sobre se "toda organi-zação tem uma cultura" pode ser respondidaem termos de oportunidade ou não para quea aprendizagem entre os seus membrosocorra. Ou, ainda, a cultura é diretamente pro-porcional à estabilidade do grupo, ao tempoque ele tem de convivência e à intensidadeda aprendizagem gerada.

Quanto ao desenvolvimento cultural, estárelacionado com o estágio de desenvolvimentoda própria organização. Usando a noção deciclo de vida, Schein atribui a seguinte cor-respondência:

1. Fase de crescimentoa) Nascimento e estágios iniciais de organi-zação, onde existe a dominação do fundadorou da família dominante. A cultura é umacompetência distinta e fonte de identificação,uma espécie de cimento que mantém os mem-bros unidos. E dada uma forte ênfase à so-cialização como uma evidência compartilhada.b) Sucessão. A organização se torna umcampo de batalha entre os conservadores e osprogressistas. Sucessores potenciais são julga-dos de acordo com a sua capacidade de mu-dar alguns elementos da cultura presente.

2. Fase intermediária, com o desenvolvimento

de novos produtos, integração vertical, ex-pansão geográfica, aquisições, fusões etc. Sur-gem subculturas, crises de identidade, perdade objetivos-chave, valores e pressupostos.Oportunidade para mudança cultural.

3. Maturidade, com a estabilidade de merca-dos, falta de motivação para mudança. A cul-tura toma-se restritiva às inovações, passandoa ser valorizada como uma fonte de auto-es-tima e defesa, preserva a glória do passado.Nesta fase, também pode ocorrer uma opçãode transformação, via mudança cultural, ouuma opção de destruição, onde ocorre mu-dança cultural nos níveis básicos, através dasubstituição massiva de pessoas-chave.

Em Dyer [r. encontramos um modelo deevolução cultural que considera, basicamente,o processo de resolução de crises e o papeldas lideranças. Esse modelo é definido a par-tir de seis etapas:

a) se a crise percebida coloca em questio-namento as habilidades e práticas das lide-ranças atuais;b) se a percepção é acompanhada de umaruptura nos padrões simbólicos, crenças epressupostos;c) se as novas lideranças emergem com umconjunto de novos pressupostos para resolvera crise;d) existência de conflitos entre proponentesda antiga e nova liderança;e) se a crise é resolvida e se os novos líderessão apontados como os responsáveis, estes,então, estabelecem-se como a nova elite cul-tural;f) a cultura da nova liderança é sustentadapela introdução de novos modelos, até que ociclo recomece em a).

Vijay Sathe compartilha as idéias de Scheinsobre os níveis de definição da cultura e comoesta se forma, comentando que uma melhorcompreensão se dá quando se examinam osaspectos de conteúdo (pressupostos dos fun-dadores e líderes seguintes, bem como as ex-periências atuais de resolução de problemase aprendizagem) e força (quão importantessão os pressupostos, quão largamente sãocompartilhados e a clareza de que alguns sãomais importantes que outros).

Para decifrar a cultura, Sathe propõe:

1. inferir o seu conteúdo (as falas, as manei-ras de fazer as coisas, os sentimentos com-partilhados);2. atentar para as qualificações e status dosinvestigadores (vantagens e desvantagens da

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observação dos antigos e recém-admitidos naorganização);3. estimar a força da cultura, observando aproporção em que seus membros comparti-lham manifestações, tais como: atributosfísicos, slogans, práticas, expressões de sen-timentos etc.

Já Deal e Kennedy sugerem dois tipos deanálise: externa e interna. Na primeira:a) observa-se o ambiente físico que sugerequão orgulhosa uma organização é de siprópria;b) lê-se o que a companhia fala sobre si e suacultura;c) testa-se como a companhia recebe osestranhos;d) entrevistam-se pessoas a respeito dahistória da companhia, como foi o seu começo,que tipo de pessoas trabalha ali, quem vaiavante, a que se atribui o sucesso.

o aspecto interno envolve entenderquestões como: o sistema de carreiras; quantotempo, principalmente na administraçãomédia, as pessoas ficam num determinadocargo; qual o conteúdo dos discursos e memo-randos; as anedotas e estórias que circulamna rede cultural. Aqui também podem ser de-tectados alguns males culturais - foco nocurto prazo, explosões emocionais, fragmen-tação e inconsistências etc.

ALGUMAS TIPOLOGlAS

a) Charles Handy e Roger Harrison", consi-deram a distribuição de poder dentro dasorganizações.• cultura de poder (pequenas empresas -centralização);• cultura de papéis (organizações exces-sivamente bucrocratizadas);• cultura de tarefa (ênfase na competência eperícia);• cultura de pessoa (centrada nos indivíduos).

b) Deal e Kennedy" avaliam a relação riscodo investimento e a velocidade do feed-backdo mercado.• cultura macho (alto risco/rápido feed-back);• cultura trabalho duro/diverte muito (baixorisco/rápido feed-back);• cultura apostar sua companhia (alto risco/lento feed-back);• cultura processo (baixo risco/lento feed-back).

c) Sethia e Von Clinow" enfatizam a preocu-pação por pessoas ou por performance (inspi-rados no Grid Gerencial), manejando o sistemade recompensas.

• cultura apática - nem pessoas, nem per-formance;• cultura cuidadosa - pessoas;• cultura exigente - performance;• cultura integrativa - pessoas e performance.

d) R.DonnelyI4 observa a relação com o usodo planejamento.• cultura excelente: usa planejamento;• cultura fuzzy: mudança constante - des-continuidade negativa;• cultura awful: crises constantes.

CARÁTER ÚNICO

É possível que duas ou mais organizaçõestenham a mesma cultura?

[ay Barney " analisa a questão da pers-pectiva da influência da cultura na perform-ance. Se a cultura pode ser entendida comouma fonte de vantagem competitiva, entãoela deve ser: a)passível de avaliação quantita-tiva; b) ser rara; e, c) ser imitável, apenas im-perfeitamente. Caso ela possa ser imitada per-feitamente, a vantagem estaria eliminada empouco tempo.

Outra é a opinião de Joanne Martin e seuscolaboradores" para quem o assunto é para-doxal. Considerando que a cultura se expressaatravés de manifestações particulares, elesanalisaram o caso das estórias organizacio-nais e perceberam que em muitas delas exis-tia uma grande semelhança de conteúdo.

Já Akin e Hopelaín" desenvolveram umaanálise partindo da existência de uma culturade produtividade, cujos elementos sãocomuns, independente do tipo de organizaçãoonde ela exista. Os autores pesquisaram trêsorganizações bastante distintas em termos detecnologia, natureza da atividade, localização,tamanho, qualificações exigidas etc., e con-cluíram que o tipo de cultura era notadamentesimilar.

MÚLTIPLAS CULTURAS

Pode uma organização ter mais de umacultura?

Para Kilmann e equipe", os administra-dores que partilham o pressuposto X, de Me-Gregor, tendem a admitir a existência de ape-nas uma cultura -'- a de cima para baixo -ao contrário dos que endossam o pressupostoY, onde várias culturas ou subculturas sãoadmissíveis numa organização.

Meryl Louis'? assume que existem poten-cialmente várias culturas nos locais detrabalho. Deve-se considerar as raízes, ou lu-gares onde primeiramente os entendimentossão compartilhados e a extensão que a pene-

11.HANDY, Charles. ComoCompreender as Organizações.Rio de Janeiro, Zahar, 1978; eHANDY, Charles. Deuses daAdministração. S.Paulo,Vértice, 1987. Veja também:HARRISON,R. "UnderstandingYour Organization's Charac-ter". Harvard Business Review,mai/jun, 1972; e HARRISSON,R. "How to Describe Your Or-ganization". Harvard BusinessReview, setlout. 1972.

12. DEAL, T. & KENNEDY, A.Op.cit.

13. SETHIA, N. & VON GLI-NOW, M.A. "Arriving at FourCultures by Managing the Re-ward System". In: KILMANN,R. et ali i. Op cit.

14. DONNELY, R. "The Inter-relationship of Planning WithCorporate Culture on Creationof Shared Values". ManagerialPlanning,32, mai-jun. 1984.

15. BARNEY, Jay. "Organiza-tional Cultures: Can it be aSource of Sustained Competi-tive Advantage?" Academy ofManangement Review, 11(6),1986.

16. MARTIN, Joanne et alii."The Uniqueness Paradox inOrganizational Stories". Ad-ministrative Science Ouarterly,28(3), set. 1983.

17. AKIN, G. & HOPELAIN, D."Finding the Culture ofProductivity". OrganizationalOynamics, 14, Winter, 1986.

18. KILMANN, R. et alii. "FiveSteps in Understanding andChanging Culture". In: KIL-MANN, R. et alii. Op.cit.

19. LOUIS, Meryl. "SourcingWorkplace Cultures: Why,When and How".ln: KILMANN,R. et alii. Op, cit.; e, também,LOUIS, Meryl. "An Investiga-tor's Guide to Workplacc Cul-ture". In: FROST, P. et alii.Organizational Culture, Cali-fórnia, Sage, 1985.

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20. Vide: DAVIS, Tim. "Man-aging Culture at the Bottom".In: KILMANN, R. et alii. Gain-ing Control of the: CorporateCulture. Op.cit.; WALKER, C.R.& GUEST, R.H. The Man ontne Assemb/y Une. Cambridge,Harvard Press, 1952; AMSA,P. "Organizational Culture andWork Group Behaviour: anEmpirical Study". Journa/ ofManagement Studies, 23(3),mai. 1986; NICHOLSON, N. &JOHNS, G. "The Absence Cul-ture and the PsychologicalContract - Who's in Control ofAbsence?" Academy of Man-agement Review, 1lX.3), 1985;e KILMANN, R. "Five Steps forClosing Culture-Gaps". In: KIL-MANN, R. et alii. Gaining Con-tro/ of the Corporate Cu/ture.Op.cit.

21. Vide: SCHEIN, E. "Comingto a New Awareness of Organ-izational Cultu re". S/oanManangement Review, Winter,1984; SCHEIN, E. "The Role ofthe Founder in Creating Organ-izational Culture". Organiza-tiona/ Dynamics, Summer,1983; e SCHEIN, E. "How Cul-ture Forms, Develops andChanges". Op. cit. Outros au-tores: ANZIZU, J.M. de. "Cul-tura Organizativa: su Inciden-cia en el Funcionamiento y De-sarrolo de la Empresa". A/ta Di-tecion, (120), 1985; PETTI-GREW,A. "On Studying Organ-izational Cultures". Administra-tive Science Ouarter/y, 24, dec.1979.

22. MARTIN, J. et alii. "Found-ers and Elusiveness of a Cul-tural Legacy". In: FROST, P. etalii. Op cit.; e, também:MEYERSON,D. & MARTIN, J."Cultural Change: an Integra-tion of Three Different Views".Journa/ of Management Stud-ies, 24(6), nov, 1987.

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tração desses entendimentos atinge. É neces-sário verificar não apenas os conteúdos, ogrupo e o relacionamento entre eles, mas tam-bém pensar na difusão e extensão dos conteú-dos, na homogeneidade e consistência dosentendimentos e na estabilidade deles notempo.

A QUESTÃO DA CONTRACULTURA

Não assumindo o termo "contracultura",mas resistências à cultura dominante, algu-mas poucas referências foram encontradas.A maior parte delas prende-se a diagnósticose a recomendações corretivas para as situaçõesdetectadas. Algumas pesquisas foram realiza-das enfatizando a problemática do absen-teísmo ou ausência nos locais de trabalho".

Será apenas uma coincidência a falta depesquisas sobre o assunto, como no caso dostabus?

A INFLUÊNCIA DOS FUNDADORES

A importância dos fundadores no estabele-cimento da cultura é um dos poucos temassobre o qual há consenso de opiniões, bemcomo uma grande semelhança nos argumen-tos de diversos pesquisadores".

Uma opinião contrária é a de Joanne Mar-

tin e sua equipe", para quem os estudosorganizacionais sobre a criação da culturaoferecem uma promessa sedutora para osfundadores, qual seja, a de que eles podemcriar uma cultura à sua imagem, valores,pressupostos e visão de mundo. A pers-pectiva pessoal pode ser transformadanum legado compartilhado que sobrevi-verá à sua morte ou à sua saída da organi-zação.

Para esses estudiosos o resultado de pes-quisas relacionadas com o assunto sugeremque esses pressupostos têm sido erroneamen-te colocados. Tal supersimplificação encobreo conflito interno e a diferenciação,características de organizações complexascomo as atuais - eles admitem a existênciade múltiplas culturas.

Ainda que reconhecendo o papel do fun-dador, o crédito a ele atribuído tem sido su-perestimado. Deve-se considerar a saliênciado papel de líder, que faz com que ele figurecomo destaque na memória das pessoas, oque tende a causar suposições de responsa-bilidades; além disso, os fatores contextuaistambém têm sua importância na influênciado conteúdo que é compartilhado. Nessesentido, o fundador é também fundido numsistema moldado por forças que estão alémde seu controle individual.

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o PAPEL DA ADMINISTRAÇÃO DE RECURSOSHUMANOS

Nenhum setor ou departamento isolado re-cebeu, na literatura consultada, tanta im-portância e destaque quanto o responsávelpelos recursos humanos". Tido como o ver-dadeiro guardião da cultura, ele exercefunções estratégicas, que promovem aaceitação, consolidação, manutenção e mu-dança culturais.

As atribuições típicas desse órgão ganhamum novo brilho quando vistas à luz da análisecultural, passando a ser o canal de repasse,que materializa a sua consistência interna,através de:• definição de perfis compatíveis com os valo-res que orientarão o recrutamento e a seleção;• desenho de programas de treinamento e dedesenvolvimento, que passam a enfatizar ahistória da organização, incluindo depoimentodos heróis, e filmes que fazem o primeiro tra-balho de socialização;• elaboração dos sistemas de compensação ede status, que visam a premiar não somente acompetência, mas a lealdade;• definição de carreiras e critérios deavaliação, buscando reforçar a filosofia,crenças e mitos existentes;• recuperação de "desviantes", esclarecendoe aconselhando quanto às normas vigentes;• preparação de solenidades para celebrarheróis e destacar o comportamento exemplar;• veiculação de estórias que revigoram osvalores, prioridades e mitos eleitos;• definição e interpretação de mensagens ade-quadas, através da imprensa interna.

Com relação ao treinamento, nenhuma evi-dência é mais forte que a proliferação deuniversidades criadas pelas próprias empre-sas, tais como: Universidade Disney, Univer-sidade Dana, e a famosa Universidade doHamburger.

CULTURA E PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO

A grande discussão sobre a existência e oreconhecimento de culturas organizacionais,principalmente na perspectiva funcionalista,ganha uma significação não somente comouma categoria de análise organizacional, mas,sobretudo, como um instrumento a ser me-lhor aproveitado na condução dos negócios.Diversos trabalhos na área de consultoria ena formulação de modelos visam a integraroutros sistemas organizacionais a fim deampliar e viabilizar novas alternativas desucesso. Nessas abordagens, ora a cultura

aparece como mais um subsistema que se ligaà estrutura, estratégia, sistemas políticos etécnicos, ora como uma superestrutura quedetermina todos os demais componentes,englobando-os e fazendo o trabalho de síntese.

Como superestrutura, a cultura não parecetão fácil de ser manipulada e mesmo os con-sultores tidos como experts no assunto admi-tem a dificuldade de mudá-la, embora afir-mem que isso possa ocorrer no longo prazo.

Por que levantamos a questão da mudançacultural nesse tópico?

Ora, reconhecer que as organizações "são"ou "têm" culturas e que estas são imutáveis,implicaria em reconhecer que os administra-dores se defrontam com algo que lhes fogeao controle. Ou, pior ainda, em admitir que osucesso ou fracasso de uma organização podeestar na dependência de um fator impre-visível. Uma vez que uma das mais relevan-tes funções dos administradores é procuraraumentar a previsibilidade do sistema quecomandam, o reconhecimento da cultura comoimutável seria acompanhado de uma fortedissonância cognitiva. É, pois, necessário queos teóricos dêem respostas práticas e úteis, eé nesse sentido que a ligação com oplanejamento estratégico é feita.

Escolhemos os trabalhos de Desphandé eParasuraman" que fazem a ponte dos mode-los teóricos de planejamento, como os con-ceitos de ciclo de vida e análise de portfólio(BCG),com a tipologia cultural desenvolvidapor Deal e Kennedy, citada anteriormente.

Segundo a análise do ciclo de vida, todoproduto e toda organização atravessam asseguintes fases: desenvolvimento e introduçãono mercado, crescimento, maturidade e de-clínio. O modelo do BCG cria uma tipologiapara classificar a carteira de negócios de umadada organização considerando duasvariáveis: taxa de crescimento do mercado efatia relativa de mercado. O resultado é umamatriz 2 x 2, em que os negócios se classifi-cam em: crianças-problemas, estrelas, vacasleiteiras e abacaxi ou pepino. A tipologia deDeal e Kennedy é definida a partir do graude risco do negócio e da velocidade de feed-back recebida, gerando os tipos: cultura ma-cho, aposte na sua companhia, trabalharduro/divertir muito e cultura processo.

A correspondência entre o ciclo de vida donegócio e o BCGé a seguinte:introdução - crianças problemas;crescimento - estrelas;maturidade - vacas leiteiras; edeclínio - abacaxi ou pepino.

A ligação entre o ciclo de vida e o tipo cul-tural pode ser assim colocada:

23.Vide, entre outros: MAR-TlN, H. "Managing SpecializedCorporate Culture"; SETHIA, N.& VON GLlNOW, "Arriving atFour Cultures by ManagingReward System", ambos inKILMANN, R. et alii. GainingContro/ of the Corporate Cu/-ture. Op.cit.; POSNER et alii."Shared Values Make a Differ-ence: an Empirical Test of Cor-porate Culture". Human Re-source Management, 24(3),Fali, 1985; ALBERT, M. & SIL-VERMAN, M. "Making Man-agement Phylosofay a CulturalReality, part.2: Design HumanResource Program Accord-ingly". Personne/, (61), mar-abro 1984; ULRICH, W. "HRMand Culture: History, Ritual andMyth". Human Resource Man-agement, 23(2), Summer,1984; WILKINS, A. "The Cre-ating of Company Cultures: theRoles of Stories and HumanResource System". HumanResource Management, 23(1),Spring, 1984; SOLBERG, S."Human Resource Manage-ment in Action: Changing Cu1-ture Through Ceremony - anexample from GM". HumanResource Management, 24(3),Fali, 1985; PASCALE, R. "Fit-ting New Employees Into theCorporate Culture". Fortune,maio28, 1984.

24. DESHPANDE, R. & PARA-SURAMAN, A. "Linking Corpo-rate Culture to Strategic Plan-ning". Business Horizons, 29,mai-jun, 1986.

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25. SCHWARTZ, H. & DAVIS,S. "Matching Corporate Cul-ture and Business Strategy".Organizational Dynamics,Summer, 1981.

26. GORDON, G. "The Interre-lationship of Corporate Cultureto Industry Sector and Corpo-rate Performance". In: KIL-MANN, R. et alii. Gaining Con-tra/ of me Corporate Cu/ture.Op.cit.

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introdução - cultura macho (alto risco e rápidofeedback);crescimento - apostar na sua companhia (altorisco e lento feedback);maturidade - trabalho duro/diverte muito(baixo risco e rápido feedback); edeclínio - cultura processo (baixo risco e lentofeedback).

A junção de todas essas características éfeita através do Contingency Model of StrategicPlanning, que, a exemplo do BCG, consistenuma matriz 2x2 e tipifica a partir das taxasde crescimento do mercado e participaçãoda firma no mercado. O resultado é a com-patibilidade entre o estágio da organização eas culturas correspondentes mais adequadasa cada fase.

Também o trabalho de Schwartz e Davis"apresenta detalhes sobre a combinação daestratégia e da cultura.

A CULTURA CAUSA IMPACTO NAPERFORMANCE!

Enquanto conhecimento humano, as Teo-rias das Organizações e da Administração têmse pautado por uma produção viesada, as-sumindo a perspectiva das gerências, repro-duzindo a sua ideologia produtivista e cons-

truindo modelos teóricos-práticos que natu-ralizam seus valores, interesses e lógica.

E, pois, com base nesses pressupostos queentendemos o debate dos diversos pesquisa-dores a respeito da relação entre cultura eperformance. Supomos que grande parte dapesquisa gerada foi motivada pela crençasegundo a qual a cultura cria impactos positi-vos (na visão gerencial) na organização; quea cultura é manejável no sentido de produzira otimização de resultados. Entendemos, comoevidência dessa crença, a quantidade de best-sellers e a proliferação de empresas e pacotesde consultoria especializados no assunto.

Alguns autores não crêem que exista umainfluência da cultura no desempenho da or-ganização; no entanto, em termos de ex-pressão quantitativa, é maior a produção dosque defendem a posição contrária, incluindo-se os autores de best-eellers mencionados an-teriormente.

As pesquisas realizadas por George Cor-don", envolvendo mais de 50.000 respostasde executivos de empresas estáveis, dinâmi-cas e financeiras, concluíram que, sendo a cul-tura definida pelos administradores a partirde uma visão estratégica em consonância como seu meio ambiente, ela é, sem dúvida, umavariável que gera forte impacto no desem-

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penho organizacional.Esta é, também, a opinião de Daniel Deni-

son'", rebatendo a afirmativa de algunspesquisadores sobre a não-evidência de re-lação positiva e mensurável entre cultura eperformance organizacional.

MUDANÇA CULTURAL

Não é consenso entre os pesquisadores quea cultura possa mudar. Até os que defendema condição de mudança assumem que oprocesso não é simples, não é barato e não sefaz sem causar traumas. Existe uma con-cordância implícita a respeito de a cultura serconectada a outros elementos organizacionaisque também sofrerão alterações caso haja umamudança cultural, como a estratégia, aestrutura, habilidades, sistema de recompen-sas, entre outros".

O que se entende por mudança cultural éa definição de um novo rumo, uma nova ma-neira de fazer as coisas, alicerçada em novosvalores, símbolos e rituais. É a AT&T se as-sumir num mercado competitivo; é a PepsiCo. decidir que ser o segundo lugar no rank-ing não é mais o bastante.

Deal e Kennedy-? comentam que a mu-dança cultural é a parte mais difícil de umatransformação cultural e que esse fato é, emgeral, subestimado não só em relação aotempo, mas também em relação aos custosenvolvidos. Para eles, pelo menos, em cincosituações a mudança deve ser consideradapela alta administração:

a) quando estão ocorrendo mudanças funda-mentais no ambiente (caso AT&T);b) quando a indústria é altamente competiti-va e o ambiente é mutável (Digital, Intel etc.):c) quando a companhia é medíocre e vemacumulando resultados cada vez piores;d) quando a companhia está em vias de tor-nar-se uma grande corporação (entrar para alista das 1000 da Fortune é um critério);e) quando a companhia está crescendo rapi-damente e uma massa enorme de trabalha-dores está sendo absorvida.

Os autores sugerem alguns passos para aadministração da mudança:

111) reconhecer que o consenso dos pares seráa questão de maior influência para a aceitaçãoe boa vontade com o processo;211) exprimir e enfatizar a confiança (mãodupla) em todos os assuntos relacionados coma mudança;3l!) pensar na mudança como a construção dehabilidades e concentrar no treinamento umaparte importante do processo;

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4l!) dar tempo para que as pessoas se acos-tumem e consolidem a mudança; e511) encorajar as pessoas a se adaptarem à idéiade que a mudança faz parte do mundo realque as rodeia.

É necessário, ainda, incluir o comprome-timento dos heróis, o reconhecimento do ini-migo externo; fazer dos rituais de transiçãoos pivôs da mudança; treinar novos valores epadrões comportamentais; não perder de vistaque a mudança foi promovida pelos insiders;construir símbolos tangíveis da nova direçãoe insistir que a segurança do emprego estáassegurada no processo de transição.

Sobre as dificuldades e conseqüências damudança cultural, Terrence Deal'" levantaalguns pontos interessantes com base em suasobservações em diversas empresas - inclu-indo a AT&T. Ele diz que mudanças dessanatureza provocam sentimentos de perda edor. Diante de situações em que os indivíduosexperimentam a perda de sentido e que geramdesconforto psicológico, eles tendem a reagir,ou agarrando-se ao passado ou envolvendo-se com o presente de forma a negar a perda.A mudança cultural provoca essas reações, àmedida que os símbolos criados para darsentido à vida foram quebrados, negados ousubstituídos. O autor descreve alguns de-poimentos de indivíduos confusos, abalados,tristes e vazios, após mudanças nas organi-zações em que trabalhavam.

Em se tratando de algo reconhecidamentedifícil de mudar, e quando mudado, provo-cando sentimentos de desorientação coletiva,a cultura organizacional dá o seu próprio tes-temunho a respeito da extensão em que elaafeta as pessoas numa organização, de quãointernalizados podem ser os seus controles ede como o envolvimento organizacional in-vade outras instâncias privadas do indivíduo.

CONTEXTO NACIONAL E ORGANIZAÇOESTRANSNACIONAIS

Vivemos o mundo das grandes organi-zações, sem barreiras geográficas. E verdadetambém que essas organizações carregamconsigo uma matriz sócio-cultural que foi ges-tada em seus países de origem.

Até que ponto um dado contexto culturalé fator limitante da ação dessas organizações?Que informações extras são necessárias sobreesse contexto? Como essas informações sãoutilizadas para aumentar a compatibilidadeentre as culturas dessas organizações e as dospaíses que as hospedam?

O trabalho desenvolvido por Geert Hofs-tede'" é um dos mais ricos sobre essas

27. DENISON, D. "BringingCorporate Culture to the Bot-tom Une". Organizationa/ Dy-namics, 13, Aut. 1984.

28. Grande parte da literaturadedica-se a descrever casos demudanças bem-sucedidas.Nesse sentido, ver o artigo deDYER JR., sobre a GM, Levi-Strauss, NCR e The BalfourCo.; de TUNSTALL, sobre aAT&T; de GORDON, sobre aHome Ufe Insurance; e o deSATHE sobre a CummingsEngine. Todos publicados emKILMANN, R. et alii. GainingContro/ of the Corporate Cu/-ture. Op. cit. Uma experiênciade fracasso é descrita porREYNOLDS, P. Across theBoard. Out. 1986. Dúvidas sãolevantadas nos artigos da Busi-ness Week, de 27.10.85 e de14.05.84.

29. DEAL, T. & KENNEDY, A.Op.cit.

30. DEAL,T. "Cultural Change:Opportunity, Silent Killer, orMetamorphosis?" In: KIL-MANN, R. et alii. Gaining Con-tro/ of the Corporate Cu/ture.Op. cit.

31. O autor tem vários artigospublicados sobre o tema,porém as idéias centrais de-senvolvidas encontram-se reu-nidas no livro Cu/fure Canse-quences: /ntemationa/ Difter-ences in Work-Re/ated Va/ues.Beverly Hills, Sage Publ. 1980.

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questões e um dos mais regularmente cita-dos. Interessado na interação de valores or-ganizacionais e nacionais, ele realizou umaampla pesquisa, envolvendo 40 países,durante quase quinze anos. Dela resultou aidentificação de quatro dimensões de valoresque, segundo ele, explicam cerca de 50% dasdiferenças entre os padrões de valores re-lacionados com o trabalho.

Vejamos as dimensões:

a) Distância de poder: extensão na qual a so-ciedade aceita o fato de que o poder é dis-tribuído desigualmente nas organizações e naprópria sociedade, onde existem privilégios ea autoridade pessoal absoluta é aceita.

b) Evitar incertezas: extensão na qual a so-ciedade se sente ameaçada por situações in-certas e ambíguas. As sociedades apresentamdiferentes coeficientes de aversão ao risco.

c) Individualismo versus coletivismo: a ma-neira como o indivíduo está ligado à estruturasocial; se esse laço é mais rígido ou maisflexível, no sentido de oferecer oportunidadespara a exibiçãode comportamentos individua-listas. Basicamente, a idéia do nós em con-traposição ao eu.

d) Masculino versus feminino: extensão naqual a sociedade privilegia a realização, he-roísmo, determinação pessoal e sucesso ma-terial, em oposição à preferência por relaciona-mentos, modéstia, cuidado com os outros,qualidade de vida etc.

Considerando que as organizações desen-volvem suas próprias culturas e sistemas pre-dominantes de valores, Hofstede admite queas subsidiárias estrangeiras de empresasmultinacionais acabam por desenvolver umacultura híbrida. No caso de multinacionaisbem integradas, com uma cultura forte, pode-se verificar uma grande similaridade entre osseus membros: "ele é um típico homem Shellmesmo que seja japonês".

Isolando as dimensões distância de podere evitar incertezas, o pesquisador apresentauma classificação dos diversos países deacordo com índices "alto" e ''baixo'' para cadadimensão, formando uma matriz. Para cadaquadrante é sugerido um modelo específicode controle, compatível com o que está im-plícito na mente das pessoas sobre o que elasacreditam que uma organização possa ser.

As dimensões individualismo x coleti-vismo e masculino x feminino também elas-

32. Citado em DEAL, T. & KEN- sificam os países pesquisados. O pressupostoNEDY, A. Op. cit, p. 115. de Hofstede é que essas dimensões afetam

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diretamente o autoconceito dos indivíduos.Uma das implicações dessa pesquisa é que

as organizações transnacionais podem preverdeterminados problemas de ordem culturallocal, e a eles responder antecipadamente como desenho de estruturas de controle, explíci-tas ou não, de forma a conquistar a aceitaçãoe a lealdade mais facilmente. Significatambémum maior domínio sobre possíveis reivindi-cações dos grupos internos, maior previsibili-dade do tipo de satisfações que podem ofere-cer para abafar essas reivindicações, oumesmo evitar que elas aflorem.

CONCLUSÕESProcuramos dar uma visão geral sobre onde

o debate a respeito da cultura organizacionaltem se concentrado, usando basicamente aprodução acadêmica norte-americana, poruma questão de acesso.

O contato com diferentes abordagens re-forçou o nosso pressuposto, segundo o qual acultura exerce funções de controle extrema-mente sofisticadas. E são essas funções, quepreenchem de uma maneira soft, que têm tor-nado o assunto tão atraente para os teóricos eos práticos da administração.

O desenvolvimento e a sedimentação deuma cultura organizacional "forte e coesa"busca restaurar perdas psicológicas nos in-divíduos que nela trabalham, repondo umquadro de valores, crenças e pressupostos, ori-entador de um comportamento coletivo con-veniente aos seus objetivos.

A maneira sutil como uma organização cul-tural "forte/excelente" se une em torno deformas específicas de pensar e agir, criandode si uma imagem positiva e onipotente, con-forma o indivíduo às normas estabelecidas,conquistando-lhe a adesão e lealdade na suareprodução. E nessa conquista do afetivo queela marca sua diferença enquanto forma decontrole. E por admiração e por amor, muitos"sacrifícios" são justificados, até porque setorna honra fazer parte dessa organização.Nesse sentido o hino da IBM32é bem ilustra-tivo:

EVER ONWARD - EVER ONWARD

That's the spirit that brought us fame!We're big, but bigger we will beWe can'i fail for alI can seeThat to serve humanity has been our aimOur products are now known in every zoneOur reputation sparkles like agemWe've fought our way through and newFields we're sure to conquer tooForever onward IBM ", Q

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