A Composição de Canções Como Estratégia

Embed Size (px)

DESCRIPTION

A Composição de Canções Como Estratégia

Citation preview

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    43

    A COMPOSIO DE CANES COMO ESTRATGIA TERAPUTICA EM MUSICOTERAPIA: UMA REVISO INTEGRATIVA DA LITERATURA EM

    LNGUA INGLESA

    THE SONGWRITING AS THERAPEUTIC STRATEGY IN MUSIC THERAPY: A INTEGRATIVE REVIEW OF ENGLISH LANGUAGE LITERATURE

    Maria Anastcia Manzano1 / Gustavo Schulz Gattino2

    Resumo - As investigaes sobre o uso da composio de canes em musicoterapia vem crescendo nos ltimos anos. Objetivando esclarecer no que consiste a tcnica, em quais reas utilizada e quais os principais resultados encontrados at agora foi realizada uma reviso integrativa sobre a composio de canes de pacientes em tratamento musicoterpico na literatura em lngua inglesa. Para tanto foram consultados 5 portais de busca online e selecionados 18 artigos completos de 9 peridicos cientficos com autoria de 14 pesquisadores. Os artigos selecionados apresentavam o termo songwriting como o tema do trabalho e relacionavam essa tcnica com a produo de pacientes/clientes de musicoterapia. Dentre os principais resultados destacou-se o favorecimento da manifestao de sentimentos e emoes, a satisfao em construir algo prprio, a conquista de recontar com liberdade suas experincias. O processo teraputico de composio de canes apresentou-se como um recurso muito til dentro das tcnicas de musicoterapia. Palavras-Chave processo teraputico de composio de canes, musicoterapia, reviso sistemtica.

    Abstract - Investigations about the use of songwriting in music therapy are increasing in recent years. In order to clarify what is the technique, in which areas is used and what are the main findings so far was performed a integrative review on songwriting by patients in music therapy treatment in English language. For both were consulted 5 online search portals and selected 18 full articles from 9 scientific journals with authorship of 14 researchers. Selected articles presented the term songwriting as the topic of work and related this technique with the production of music therapy patients. Among the main results highlighted the favoritism of the manifestation of feelings and emotions, satisfaction in building something own, the conquest of recount their experiences with freedom. The therapeutic process of songwriting introduced himself as a very useful feature within music therapy techniques.

    Keywords: therapeutic songwriting process, music therapy, integrative review.

    1 Especialista em Musicoterapia pela Faculdade Hlio Rocha, Salvador, BA. Currculo Lattes:

    http://lattes.cnpq.br/9874076348234605. Contato: [email protected] 2 Docente do curso de Licenciatura em Msica da Universidade do Estado de Santa Catarina

    (UDESC), Florianpolis, SC. Currculo Lattes: http://lattes.cnpq.br/4761296298954336 . Contato: [email protected]

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    44

    Introduo

    Uma maneira de expressar sentimentos, comunicar mensagens e contar

    histrias importantes por meio de canes. Essa prtica nos d a

    oportunidade de celebrarmos as vidas, nossas perdas e preservar a nossa

    histria (Wigram; Baker, 2005 apud HEATH; LINGS, 2012). A utilizao da

    composio de canes como estratgia teraputica no nova, porm s

    recentemente, em 2005, com a publicao do livro Songwriting: Methods,

    techiniques and clinical applications for music therapy clinicians, educators and

    students, dos musicoteraputas Tony Wigran e Felicity Baker, esse

    procedimento comeou a ser reconhecido como uma tcnica teraputica

    (HEATH; LINGS, 2012).

    As questes formuladas para este trabalho (as quais representam os

    objetivos deste artigo) so as seguintes: como a composio de canes

    usada como abordagem teraputica? E da mesma forma, quais so os

    temas,reas de atuao e resultados encontrados nesses trabalhos sobre

    composio de canes em musicoterapia?

    Metodologia

    De acordo com a proposta de reviso integrativa (SOUZA et al., 2010),

    foram seguidos as seguintes etapas na elaborao desta reviso: incluso da

    identificao do plano de pesquisa e organizao da questo a ser trabalhada

    (descritos na introduo); coleta de dados, identificao, reunio e organizao

    da literatura referente questo proposta e anlise preliminar dos artigos;

    extrao e a organizao das informao a partir dos textos selecionados;

    sntese das ideias encontradas e anlise a partir das questes centrais

    elaborada; e por fim, avaliao da fora das evidncias, apresentao do

    resultado da questo de pesquisa e recomendaes baseadas nos resultados.

    A reviso integrativa metodologia que proporciona a sntese de conhecimento

    e a incorporao da aplicabilidade de resultados de estudos significativos na

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    45

    prtica. A diferena da reviso integrativa em relao reviso sistemtica a

    flexibilidade nos critrios de seleo e na incluso de artigos (SOUZA et al.,

    2010). A reviso integrativa permite a incluso de trabalhos tericos e prticos

    na mesma reviso, onde mais importante tratar o tema de forma abrangente.

    Alm disso, a seleo de trabalhos na reviso integrativa no est diretamente

    relacionada ao rigor metodolgico seguido pelos estudos para realizar um

    determinado delineamento (desenho de pesquisa).Este tipo de reviso tornou-

    se mais apropriada para o presente artigo em funo da proposta generalista

    deste manuscrito (em funo do nmero reduzido de revises sobre o tema),

    bem como pela complexidade e heterogeneidade das publicaes existentes

    sobre o tema.

    Dentro da reviso integrativa foram pesquisados peridicos e bases de

    dados a partir da descrio abaixo:

    1) Portal de Peridicos da Capes: descritores songwriting no campo

    assunto e music therapy em outro campo assunto.

    2) Peridico Voices: songwriting no campo de busca abstract.

    3) Portal de peridicos cientficos Taylor and Francis online: songwriting

    nos campos resume e em keywords, concomitantemente.

    4) Journal of Music Therapy: songwiting no campo search

    5) Music Therapy Perspectives: songwriting no campo search

    Quanto ao critrio de incluso foram selecionados artigos em lngua

    inglesa em que o termo "songwriting" apresentava-se como o tema do trabalho

    e que relacionassem essa tcnica com a produo de pacientes/clientes de

    musicoterapia. Os trabalhos selecionados contemplaram o termo songwriting

    no campo do resumo e palavras chave, quando estas existiam, a partir do ano

    2005. Foram excludos os artigos que no acatassem essa regra, bem como

    aqueles em que o texto no estava disponvel na ntegra. Tambm no

    entraram nessa reviso, aqueles em que songwriting fazia referncia a

    produes de terapeutas ou de estudantes, assim como aqueles trabalhos em

    que o termo aparecia citado apenas como um exemplo, dentro de outras

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    46

    tcnicas teraputicas. O limite temporal inferior foi o ano de 2005, quando foi

    publicado o livro Songwriting mencionado na introduo.

    A busca foi realizada entre os dias 21 a 24 de junho de 2014.

    Resultados e discusso

    Os resultados sero apresentados dentro de suas categorias. A primeira

    refere-se aos dados bibliomtricos e a segunda ao contedo.

    Resultados Bibliomtricos

    a) Quanto busca

    A busca pelos sites apresentados resultou na seguinte distribuio de

    trabalhos: 1) Journal of Music Therapy: 6 artigos de 55 sugeridos; 2) Portal de

    peridicos cientficos Taylor and Francis online: 5 artigos de 10 sugeridos; 3)

    Peridicos Capes: 5 artigos de 15 sugeridos; 4) Peridico Voices: um nico

    artigo apresentado; 5) Music Therapy Perspectives: 1 artigo em 94 sugeridos.

    A grande diferena entre os artigos escolhidos e sugeridos ocorreu

    devido ao maior direcionamento das buscas.

    No total foram selecionados 18 artigos.

    b) Quanto aos autores

    Participaram da autoria dos trabalhos selecionados 14 autores, sendo

    que a autora que tem mais participaes Felicity Baker, da Universidade de

    Melbourne, Austrlia, com 8 trabalhos (57% dos artigos).

    H 10 trabalhos com apenas um autor, 7 trabalhos com dois autores e1

    trabalhos com trs.

    c) Quanto aos peridicos

    Foram selecionados artigos de 9 peridicos cientficos a seguir (os

    nmeros entre parntesis representam a quantidade de artigos em cada

    peridico):Journal of Music Therapy (6); The Arts in Psychotherapy (3); Nordic

    Journal of Music Therapy (2); Musicae Scientiae (2); Music Therapy

    Perspectives (1);Voices: A World Frum for Music Therapy (1); Arts& Health: an

    International Journal for Research, Policyand Practice (1);Journal of Creative in

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    47

    Mental Health (1); Mortality: Promoting the disciplinary study of death and dying

    (1).

    d) Quanto ao ano de publicao

    Foi estabelecido como limite inferior o ano de 2005. Do total de artigos

    selecionados, 77,8% (14 trabalhos) foram realizados aps 2011 (inclusive).

    Resultados qualitativos

    a) Caracterizao da composio de canes como abordagem

    teraputica.

    Segundo Baker (apud BAKER e MacDONALD, 2013) a composio

    teraputica uma interveno em musicoterapia atravs da qual os clientes

    criam canes significativas para si a fim de superar os desafios impostos por

    suas condies de sade e bem estar.

    Baker e Wigran (2005 apud HEATH; LINGS, 2012, p. 107) definem a

    composio de canes como o processo de criao, notao e/ou gravao

    da letra e da msica com uma relao teraputica endereada s

    necessidades psicossociais, emocionais, cognitivas e de comunicao dos

    clientes.

    Baker e Wigram (2005 apud ROBERTS, 2006) ainda sugerem que a

    composio de canes usada para ajudar as pessoas a refletir sobre o

    passado, o presente e o futuro, para fazer contato com processos do

    inconsciente, para enfrentar dificuldades no mbito de relaes interpessoais,

    projetando seus sentimentos na msica.

    Baseada em trabalhos de vrios musicoterapeutas, Roberts e McFerran

    (2013) desenvolveram um procedimento de 7 passos para a composio de

    canes: 1) introduzir a ideia de composio de canes, 2) tempestade de

    ideias para a(s) cano(es), 3) determinao da estrutura da cano, 4)

    composio da letra, 5) composio do acompanhamento, 6) finalizao da

    msica e gravao da(s) cano(es), 7) produo do CD e do material

    impresso com as letras das canes.

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    48

    Apesar dos sete passos recomendados, o processo de criao de

    canes pode se desenvolver de diferentes maneiras, tais como: compor

    primeiro a letra e depois a msica, inverter essa ordem, produzir

    simultaneamente a letra e a msica. Tambm so consideradas as canes

    originais, tanto letra quanto msica so criaes prprias dos participantes das

    sesses; composio de novas letras para substituir j existentes, incluindo a

    produo de pardias; colagem de canes, onde as letras da cano so

    escolhidas a partir de cano j existente e de trecho de livros, poemas,

    palavras e frases, utilizados como base para compor uma nova cano

    (ROBERTS; McFERRAN, 2013).

    Ansdell (1995 apud SILVERMAN, 2013) caracteriza, dentro da prtica da

    composio de canes, a cano em si como o produto da terapia enquanto

    que todo o processo de construo, discusso, dilogo sobre a cano, o

    processo teraputico.

    A composio de canes estimula pensamentos e sentimentos numa

    maior amplitude que apenas cantar msicas j conhecidas. OCallaghan (1997

    apud HONG; CHOI, 2011) apresenta 10 aspectos relacionados com a terapia

    de composio de canes: 1) expresso criativa da linguagem e da msica; 2)

    em geral menos ameaador que outras terapias; 3) fornece vrias

    oportunidades de buscar a felicidade; 4) a compreenso da letra reforada

    por acompanhar melodias; 5) a escolha do processo criativo que contemple a

    linguagem e a expresso musical; 6) oportunidades para aconselhamento; 7) a

    melodia pode dar conforto imediato; 8) o processo produo lingustico /

    musical e de expressar suas emoes; 9) o processo de expressar sentimentos

    e pensamentos produzindo suas prprias letras para canes conhecidas e 10)

    ajuda o participante a sentir-se orgulhoso da cano por ele criada.

    b) Temas, reas de atuao e resultados

    Quanto aos temas das composies, Baker e Mac Donald (2013)

    experimentaram trs tipos de composio de canes: a composio de

    cano original, a composio de uma letra e a composio de uma pardia.

    Trabalhando com um grupo de estudantes, com idade mdia de 25 anos, e de

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    49

    aposentados, com idade mdia de 75 anos, a criao da cano original foi

    mais significativa que as outras duas para relatar satisfao, senso de

    realizao e senso do self3. Os autores sugerem que a composio de canes

    originais capacita as pessoas a colocar mais de si mesmas na cano, tanto na

    letra quanto na melodia, fazendo emergir um maior senso do self com essa

    experincia. O trabalho mostrou ainda que, a experincia de composio de

    canes e letras foi estatisticamente mais significativa para os estudantes do

    que para os aposentados sugerindo que o estgio da vida dos primeiros seja

    mais criativo. Os autores mediram as experincias de fluxo dos participantes.

    Para mensurar o fluxo Baker e Mac Donald (2013) utilizaram protocolos

    padres e os resultados levaram a concluso de que as experincias de fluxo

    esto diretamente conectadas com o grau de significado da experincia da

    pessoa.

    Baker e Mac Donald (2014) sugeriram trs diferentes temas para a

    composio: uma experincia positiva, uma experincia negativa e uma

    experincia neutra. Os participantes foram entrevistados logo aps a criao e

    aps seis semanas, sobre suas experincias. Os autores organizaram os

    resultados em cinco principais temas: preocupaes artsticas, expectativas

    iniciais, escutar respostas para criar sua cano, explorando o self e a relao

    com o terapeuta. Os autores concluram que a experincia de composio de

    canes um meio agradvel para explorar o self, melhorar o humor e ter

    satisfao com a produo criativa.

    Estudos com uma comunidade de idosos aposentados tambm foram

    realizados por Baker e Ballantyne (2013) e mostraram que a composio de

    canes proporcionou uma sensao de realizao, significao e

    engajamento nas criaes, vivenciando uma maior conexo entre os membros

    da comunidade.

    Num programa de atividades orientadas para a composio de canes

    Hong e Choi (2011) objetivaram avaliar as funes cognitivas de idosos com

    3 Segundo o Dicionrio eletrnico Houaiss da Lngua Portuguesa, self significa indivduo, tal

    como se revela e se conhece, representado em sua prpria conscincia.

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    50

    demncia, internos de uma instituio. Teste especfico para medir a condio

    cognitiva (Mini Mental State Examination MMSE) foi aplicado duas semanas

    antes e uma semana aps o programa com 16 semanas de durao, em grupo

    experimental e controle. O programa consistiu em trs etapas: 1) a preparao

    para a atividade de composio; 2) a composio de canes em si e 3) o

    reforo das canes compostas. Os resultados mostraram que o grupo

    experimental obteve uma melhora geral de 26% em relao ao incio do

    tratamento, nos parmetros de orientao espao/temporal, memria, ateno

    e clculo, funo da linguagem e compreenso e julgamento. J o grupo

    controle decaiu em 6% na avaliao do MMSE. Os autores destacam que o

    programa de musicoterapia proposto realmente ajuda nas questes de

    memria, orientao e linguagem.

    Um outro lado da demncia, a condio dos cuidadores de pessoas com

    a doena de Alzheimer e outras demncias, foi apresentado num estudo

    realizado por Klein e Silverman (2012). Mesmo chamando a ateno para a

    condio de pesquisa piloto, com apenas 7 participantes em cada grupo e

    apresentao apenas de dados descritivos, os autores encontraram resultados

    que valem a pena ser discutidos. O objetivo do trabalho foi avaliar duas

    situaes de ensino de habilidades de enfrentamento para esses cuidadores. A

    primeira tratava-se de uma ao psicopedaggica onde um grupo de

    discusso, orientado por perguntas pr-estabelecidas (tais como: Voc j

    vivenciou uma situao de estresse? Como voc lidou com isso? O que

    autocuidado quer dizer para voc? dentre outras), material educativo e

    apresentaes visuais no intuito de orientar sobre habilidades de

    enfrentamento. Na situao de musicoterapia os participantes fizeram audio

    da cano "With love from me to you" (Com amor de mim para voc), de

    Lennon e McCartney, que serviu de base para a composio da cano "With

    love from me to me" (Com amor de mim para mim). Nas duas situaes os

    participantes foram convidados a responder a pergunta Voc acha que essa

    sesso te ajudou? Onde tambm era solicitado um feedback dos trabalhos.

    Tanto a anlise de temas e a anlise de contagem de palavras das repostas

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    51

    mostraram uma concordncia entre as duas situaes, porm s no grupo de

    Musicoterapia ocorreram manifestaes de diverso e agradecimento pessoa

    que conduzia as atividades. Houve comentrios tambm sobre a organizao

    dos trabalhos em musicoterapia, a que os autores atriburam novidade da

    interveno.

    A composio de canes mostrou-se como a interveno mais

    satisfatria para crianas e adolescentes em luto (ROBERTS, 2006). Este

    processo pode provocar reaes poderosas e profundas nestes clientes. A

    autora trabalhou em seu mestrado com essa populao partindo do

    pressuposto de que proporcionar oportunidades para que as crianas em luto

    possam expressar seus pensamentos e sentimentos e resolverem seus

    problemas, uma forma til para superar a perda (Neimeyer, 1999, apud

    ROBERTS; Mc FERRAN, 2013). O trabalho pautou-se ento na anlise de

    contedo das letras escritas pelas crianas (7 a 12 anos) em sesses

    individuais de musicoterapia, para determinar se elas iriam utilizar a

    oportunidade de abordar a sua perda, por meio do um modo criativo e

    expressivo da composio musical. Uma anlise indutiva levou formao de

    13 categorias que revelaram que essas crianas escreveram canes usando

    uma linguagem egocntrica e com conceitos concretos. Uma anlise posterior

    indicou que essas canes continham mensagens sobre: as prprias crianas

    (categorias questes, desejos e vontades); as experincias de vida das

    crianas (categorias aes, sentimentos, lugares, eventos, morte, tempo,

    sentidos) e as relaes das crianas (categorias pessoas, animais e coisas). As

    crianas frequentemente escreveram sobre as emoes desencadeadas pelo

    luto, tais como, tristeza, raiva, culpa, injustia e abandono. Mas sentimentos de

    alegria tambm apareceram quando expressavam que o ente querido poderia

    estar no paraso e feliz. A importncia da famlia e dos amigos, como fonte de

    segurana e conforto tambm ficou evidenciada (ROBERTS; McFERRAN,

    2013).

    Ainda com relao ao tema luto e terapias de fim de vida, Heath e Lings

    (2012) relatam algumas experincias marcantes onde a tcnica da composio

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    52

    de canes promoveu relaes teraputicas profundas e reveladoras tanto

    para os pacientes quanto para os terapeutas. O primeiro caso trata de um

    homem nos seus cinquenta anos com um cncer raro e terminal que conseguiu

    expressar seus sentimentos, como se despedir da famlia, atravs das canes

    que comps. O segundo caso apresentado de uma jovem, internada, com

    personalidade borderlinee com histrico de vrias tentativas de suicdio. Neste

    caso a prtica de composio de canes inspirou a jovem a aprender a tocar

    violo, alm de dar suporte sua recuperao para retorno ao lar. Os autores

    ainda apresentam casos onde a composio de canes foi utilizada no incio

    do acompanhamento mdico, sensibilizando e motivando uma paciente em

    estado terminal, que se encantou com sua produo. A tcnica tambm foi uma

    forma de clarear sentimentos contraditrios e a confuso causada pelo regime

    de tratamentos invasivos, mudanas na imagem corporal e restries impostas

    pela fadiga e diminuio da mobilidade em uma paciente tambm em situao

    terminal. H uma situao em que a cano criada por uma paciente terminal

    serviu como um resgate de sua vida saudvel, o que a deixou mais tranquila, e

    tambm como um conforto para o luto da famlia. A cano deixada para a

    famlia tambm foi o caso de um pai com tumor cerebral que comps uma

    cano de ninar para sua filha de 10 meses.

    A diferena de gnero na composio de canes foi estudada por

    Baker, Kennelly e Tamplin (2005), em homens e mulheres com leses

    cerebrais traumticas. Os resultados mostraram diferenas interessantes entre

    os dois grupos. O tema que mais apareceu nas letras das canes das

    mulheres referia-se a comunicar mensagens enquanto que entre os homens

    prevaleceram letras de autorreflexo. Segundo as autoras os resultados

    sugerem que os homens so mais focados em si mesmos que as mulheres

    enquanto que estas mostraram em suas letras um maior equilbrio entre si

    mesmas e os outros. Ambos expressaram sentimentos de solido e

    isolamento, felicidade, falta de liberdade, frustaes e raiva. Reflexes sobre o

    que os fazem felizes foram mais frequentes nas letras masculinas. Mais uma

    vez as autoras sugerem que expressar emoes foi prioridades nas canes.

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    53

    Trabalhando com um grupo de pacientes psiquitricos num programa de

    reabilitao, Thomson (2009) explorou as metforas dentro da musicoterapia.

    Aps um primeiro momento de tempestade de ideias (brainstorming), a autora

    explorava o significado das palavras e expresses sugeridas pelos pacientes. A

    construo da cano evoluiu por meio da identificao e mapeamento dos

    temas e do agrupamento das ideias. As frases recebiam contribuies de

    diferentes pacientes. O grupo foi incentivado pela terapeuta a escolher e definir

    o estilo da composio. Uma vez definida a cano o grupo cantou repetidas

    vezes para acertos finais e para que a cano se tornasse familiar. Uma

    metfora muito significativa que apareceu numa das canes referia-se ao Sol

    representando as pessoas e as oportunidades que alguns pacientes tiveram

    para participar do programa de recuperao. A escolha da tonalidade de d

    maior fez o som da melodia fluir naturalmente, satisfazendo-os e enfatizando o

    que queriam dizer. A autora conclui seu trabalho afirmando que atravs da

    representao e projetando as experincias simbolicamente com palavras e

    msica, as construes pessoais resistentes puderam ser acessadas. Assim, o

    uso de metforas na terapia de composio de canes em grupo permite a

    cada participante a reconstruo, com liberdade, das suas narrativas.

    A composio de canes uma interveno comumente usada na

    musicoterapia psiquitrica, principalmente na rea de dependncia qumica

    (SILVERMAN, 2007, 2009 apud SILVERMAN 2012). Silverman apresenta

    vrios trabalhos sobre o efeito da composio de canes em grupos de

    pacientes, em estudos randomizados. Dentre os temas trabalhados esto as

    estratgias de enfrentamento, a relao entre paciente e terapeuta, a

    depresso, o bem estar, e as percepes sobre o tratamento (SILVERMAN

    2011, 2012, 2013). So temas que, segundo o autor, quando trabalhados,

    auxiliam o sucesso do tratamento.

    Silverman (2011) quis determinar o efeito da composio de canes no

    conhecimento de estratgias de enfrentamento e na aliana de trabalho, ou

    seja, na relao entre paciente e terapeuta. Trabalhando com dois grupos, um

    que recebeu sesses de musicoterapia com a tcnica da composio de

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    54

    canes e o grupo controle que recebeu apenas uma abordagem

    psicopedaggica, os resultados mostraram que a musicoterapia pode ser to

    eficaz quanto a psicopedagogia para reforar as estratgias de enfrentamento.

    Assim para o autor, parece que a Musicoterapia pode ser um meio eficaz de

    reforar o material psicopedaggico. Por exemplo, as mesmas informaes

    poderiam ser apresentadas com uma variedade de formatos durante uma

    pesquisa ou prtica clnica. A composio de canes permitiu a criatividade e

    inovao e pode ser especialmente til para ensinar ou reiterar a informao a

    ser aprendida pelos pacientes psiquitricos (SILVERMAN, 2011).

    Silverman (2013) apresenta ento uma nova modalidade de

    musicoterapia denominada psicopedaggica que se refere ao de

    compartilhar informaes e atitudes que esclaream melhor a doena aos

    internos de uma instituio psiquitrica; so conhecimentos e habilidades que

    tais pacientes podem utilizar aps receber alta. Trabalhando uma nica sesso

    de musicoterapia em trs grupos (A: utilizou a composio de canes dentro

    da abordagem de Musicoterapia Psicopedaggica; B: utilizou apenas a

    abordagem musicoteraputica, sem trabalhar a composio e C: aplicou um

    jogo de bingo musical) para investigar qual tratamento seria mais eficaz contra

    a depresso, para melhoria do bem estar e para percepes do tratamento. O

    tema sugerido nos grupos A e B foi a vida aps a alta e o musicoterapeuta

    responsvel trabalhava questes como: Quais os medicamentos que eu estou

    tomando? Como devo tomar os medicamentos? Quem pode me ajudar quando

    eu estiver vivendo na comunidade? O pesquisador utilizou escalas de medida

    de depresso e bem estar para quantificar a evoluo dos pacientes. Os

    resultados mostraram que os escores de depresso tenderam a ser menores

    na condio de composies e mais altos na condio de Psicopedagogia

    apenas. No que diz respeito s percepes de tratamento, os participantes na

    condio de composies tenderam a ter pouco mais disponibilidade e

    felicidade, enquanto os participantes na condio de Psicopedagogia

    apresentaram avaliaes ligeiramente inferiores de prazer e conforto. Embora

    as diferenas entre grupos no chegassem a serem estatisticamente

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    55

    relevantes para a qualidade de vida, depresso ou percepes de tratamento,

    os resultados descritivos tenderam a ser positivos e apoiaram o uso da

    musicoterapia, principalmente a composio de canes, para aumentar os

    aspectos de bem-estar nesses pacientes.

    No trabalho com pacientes dependentes qumicos, Silverman (2012)

    verificou que a musicoterapia com a interveno de composio de canes foi

    estatisticamente significante para a motivao e a disposio para o tratamento

    de dependentes qumicos em uma unidade de reabilitao dentro de um

    hospital. Analisando o contedo das letras criadas o autor agrupou os temas

    em 6 categorias: ao, emoes e sentimentos, mudanas, reflexes,

    admisso e responsabilidade. O levantamento desses temas na proposta de

    composio de canes pode ser um mtodo eficiente para trazer luz e

    abordar temas centrais para preveno de recada e potencialmente aumentar

    a motivao dentro do contexto criativo da composio com base clnica.

    Partindo da ideia de que a composio de canes permite a

    manifestao de emoes e que provm uma resposta (feedback) rpida ao

    terapeuta, Jones (2005) tambm trabalhou com dependentes qumicos

    comparando as tcnicas de anlise lrica e composio de canes para

    mudanas emocionais. Na anlise lrica clientes frequentando um grupo

    receberam uma cpia da letra de canes ("Here I GoAgain" executada por

    Whitesnake de autoria de Coverdale e Marsden, 1994 e "Victim of the Game"

    executada por Garth Brooks, de autoria de Sanderse Brooks, 1993) e foram

    orientados a identificar versos na cano que tivessem relaes com seu

    passado, o presente e a esperana para o futuro. Na situao de composio

    de canes a musicoterapeuta pesquisadora utilizou como base a cano

    Yesterday (Lennon e McCartney, 1965), alterando a palavra ontem (yesterday)

    por hoje e amanh, afim de que os participantes pudessem falar sobre o seu

    passado, presente e expectativas para o futuro. Aps compostas as canes

    eram apresentadas ao grupo. Foram realizados pr e ps testes que indicaram

    que as tcnicas utilizadas foram eficientes para aumentar os sentimentos

    relacionados a alegria e diminuir os sentimentos relacionados tristeza, culpa,

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    56

    e ainda as tcnicas empregadas potencializaram a disponibilidade dos

    participantes para as mudanas. Embora no tenham resultado em diferenas

    estatisticamente significativas a autora encontrou uma tendncia de que a

    composio de canes mais eficiente uma vez que permite uma maior

    expresso de sentimentos.

    Uma grande pesquisa foi realizada por Felicity Baker com 45

    musicoterapeutas de 11 pases. A autora realizou entrevistas semiestruturadas,

    pessoalmente ou via Skype, a fim de conhecer vrios aspectos do pensamento

    e da prtica da composio de canes desses profissionais. Os temas que

    emergiram aps a anlise das entrevistas foram: fatores ambientais,

    socioculturais e individuais que impactam o processo teraputico de

    composio de canes; relao terapeuta-participante, habilidades do

    musicoterapeuta e msica. Os resultados foram apresentados em vrios

    artigos publicados, dos quais abordaremos alguns abaixo.

    Num dos trabalhos (BAKER, 2013a) o objetivo foi expandir o

    conhecimento sobre o papel da apresentao pblica das canes criadas

    pelos pacientes. O trabalho examinou as expectativas dos musicoterapeutas

    sobre o valor da apresentao pblica das canes. A opinio e o relato das

    experincias dos musicoterapeutas participantes da pesquisa foram agrupadas

    em 3 grandes temas: O primeiro agrupa as ideias de que a apresentao afeta

    o bem estar do paciente. Neste tema esto includos: os participantes so

    vulnerveis quando apresentam suas prprias composies; a apresentao

    da cano criada uma parte importante do processo teraputico; a

    apresentao aumenta o orgulho e a sensao de pertencimento; a

    apresentao favorece uma experincia mente e crebro. A autora apresenta

    uma importante discusso sobre as precaues que se deve tomar com

    relao apresentao. Para esse primeiro tema ela chama a ateno para o

    fato de alguns pacientes se sentirem julgados, que no tenham estrutura

    (recursos internos) para o contexto da apresentao, no se tem certeza do

    apoio que o paciente receber na apresentao (por exemplo, o pblico

    desconhecido). O segundo tema refere-se relao entre o paciente e o

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    57

    pblico. Neste caso o pblico pode ter uma boa relao com o paciente e

    entender bem suas experincias. Tambm h um efeito positivo em conectar o

    paciente com a comunidade. A ateno neste caso refere-se ao no

    estabelecimento de uma boa relao paciente-pblico, sendo que o primeiro

    no bem compreendido. O terceiro tema destacado o fato da apresentao

    ser afetada pelo contexto e pela preparao do paciente. A preparao

    extremamente necessria e deve contemplar o contexto que a apresentao

    vai ocorrer. Os membros do grupo teraputico apoiam o paciente e a

    apresentao junto com msicos profissionais podem trazer experincias

    positivas. Neste caso as precaues referem-se ao preparo insuficiente, falta

    de estrutura do paciente para suportar crticas e a falta de assistncia do grupo

    de apoio. Para finalizar a autora sugere que alguns musicoterapeutas valorizam

    as oportunidades de apresentao de seus pacientes, quando as condies

    so favorveis ao sucesso.

    Compreender o impacto do meio ambiente no processo teraputico de

    composio de canes e na musicoterapia de uma forma geral tambm foi um

    dos objetivos de Baker em sua pesquisa (BAKER 2013b). Neste caso a autora

    quis saber quais fatores ambientais contribuem e quais restringem a prtica em

    questo. A anlise dos dados revelou quatro categorias principais relacionadas

    aos fatores ambientais: estruturas organizacionais, cultura organizacional,

    espao fsico e espao privado. Dentro da estrutura organizacional esto

    questes relacionadas parte financeira, horrios, durao das sesses,

    durao e a orientao do programa de atendimento, a hierarquia dos servios

    e as regras de participao. A categoria cultura organizacional refere-se ao

    respeito pela musicoterapia e a cultura musical dos funcionrios. Dentro do

    tema espao fsico esto agrupados assuntos como a esttica do espao, o

    rudo de fundo, o lugar destinado pratica musicoterapeutica, seu tamanho e

    suas instalaes. E finalmente o espao privado foi dividido em presena e a

    dependncia da famlia e a terapia individual ou familiar; presena dos

    funcionrios da instituio e a presena de outras pessoas. A autora conclui

    que os musicoterapeutas deparam-se com uma infinidade de fatores

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    58

    ambientais que iro moldar as abordagens em musicoterapia e a eficcia da

    sua prtica com seus pacientes. Existem fatores ambientais negativos que os

    profissionais podem minimizar, tais como, interrupes, privacidade e a cultura

    dos funcionrios, no entanto muitos aspectos do seu ambiente de trabalho,

    particularmente nas estruturas organizacionais, so imutveis.

    Baker (2013c) tambm mostrou interesse em saber o que acontecia com

    as canes depois de criadas, se o terapeuta entregava ou no uma cpia da

    cano (gravada ou escrita) ao paciente e as opinies sobre essa deciso. Os

    resultados das entrevistas com os 45 musicoterapeutas clnicos trouxeram trs

    ideias principais, que a autora chamou de temas. O primeiro diz respeito ao

    terapeuta compartilhar as canes com os pacientes criando assim

    oportunidades para estender os benefcios teraputicos da experincia de

    composio, bem como causar impacto sobre a relao teraputica: o

    terapeuta investe tempo em produzir uma cpia da cano para o participante.

    Os participantes recebem as msicas como se fossem presentes. Ao fazer

    isso, os participantes reconhecem que o terapeuta tem escutado suas histrias

    e valoriza-os. Alm disso, a criao de msica pode simbolizar uma

    experincia compartilhada entre o terapeuta e os pacientes e um produto

    tangvel desse processo de colaborao. O segundo tema diz respeito

    propriamente aos pacientes e suas canes. Quando estes possuem cpias de

    suas criaes, experimentam um sentimento de realizao e melhora da

    autoestima. Compositores so reconhecidos como quem tem um talento

    especial e, portanto, a criao de uma msica tem valor cultural. As canes

    servem como prova de sucesso na conquista de desafios. H, entretanto, que

    se considerar que junto com estes benefcios teraputicos, h um risco de que

    o paciente, ao escutar repetidamente sua cano, possa levar a perseverana

    na emoo ou histria expressada tornando-se emocionalmente preso. O

    ltimo tema se refere aos pacientes compartilharem suas canes com outras

    pessoas. Isso cria oportunidade para construir relacionamentos em diferentes

    contextos. Algumas experincias podem ser difceis de compartilhar com

    palavras, assim, com uma cano, outras pessoas podem compreender melhor

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    59

    as experincias do pacientes, eliminando a necessidade de uma verbalizao

    direta. Mais uma vez a autora chama a ateno da anlise cuidadosa do

    terapeuta dos riscos e benefcios que o compartilhamento das canes dos

    pacientes pode trazer ao seu tratamento.

    Os fatores sociais influenciam na composio de canes de pacientes

    de musicoterapia e tambm foram estudados nesta pesquisa de Felicity Baker

    (BAKER, 2014). Os resultados levaram a autora a sugerir sete principais

    fatores, sendo: 1) os diversos papis das msicas em diferentes grupos scio

    culturais; 2) conhecimento e habilidade do terapeuta em tocar canes

    multiculturais; 3) a relao entre a heterogeneidade cultural e a

    homogeneidade dos membros de um grupo; 4) a linguagem, a comunicao e

    o significado; 5) a diversidade sociocultural e a relao teraputica; 6) as

    crenas religiosas; 7) questes de gnero e de geraes na cultura e na

    religio. Com discusso desses resultados a autora salienta que as culturas

    religiosas influenciam a relao teraputica e que a criao de canes com

    fins teraputicos uma ideia que no pertence a alguns grupos, ou seja, para

    esses grupos scio-culturais trata-se de uma interveno culturalmente

    inadequada. Assim sendo necessrio que o musicoterapeuta seja sensvel e

    no viole nenhum valor religioso ou norma cultural. Mas em culturas onde a

    composio de canes integra a vida diria, essa tcnica bem aceita.

    Aps a apresentao dos trabalhos podemos sistematizar as reas e os

    principais resultados encontrados.

    No que diz respeito s reas de atuao onde aplicado o processo

    teraputico de composio de canes nossa reviso revelou trabalhos tanto

    em pesquisa quanto na prtica clnica. Na pesquisa tiveram destaques os

    trabalhos de Baker (2013 a, b, c, 2014, Baker, Kennelly e Tamplin, 2005) onde

    o prprio processo foi alvo de estudos.

    Quanto aos trabalhos sobre prticas clnicas trs foram as principais

    reas reveladas:

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    60

    1) Gerontologia nas subreas: idosos em comunidade (BAKER;

    BALLANTYNE, 2013), idosos com demncia (HONG; CHOI, 2011) e

    ateno aos cuidadores (KLEIN; SILVERMAN, 21012)

    2) Luto e fim da vida nas subreas: luto em crianas e adolescentes

    (ROBERTS, 2005, ROBERTS; MC FERRAN, 2013) e pacientes

    terminais (HEATH; LINGS, 2012).

    3) Psiquiatria nas subreas dependentes qumicos (JONES, 2005,

    SILVERMAN, 2012), depresso (SILVERMAN 2013) e estratgias de

    enfrentamento (SILVERMAN, 2011).

    Quanto aos resultados descritos nos trabalhos apresentados ficou evidente

    que a possibilidade de expressar sentimentos e emoes o principal

    resultado buscado pelos musicoterapeutas em seus clientes: proporcionar a

    sensao de realizao, de satisfao, de sucesso, de ser capaz, de

    autoconhecimento. Tambm foram relatadas as questes de engajamento, de

    compromisso com o tratamento e diminuio da depresso. Um resultado

    interessante foi o efeito em treinamentos e esclarecimentos sobre a doena e

    as estratgias de enfrentamento. Canes com mensagens de esperana,

    felicidade, agradecimento, superao do luto, sentimentos de despedida e

    sobre a prpria vida so criadas. A potencializao para mudanas e a rpida

    resposta dentro do tratamento, assim como preveno de recadas em

    pacientes com dependncia qumica e aumento geral do bem estar tambm

    foram destacados. A composio de canes originais pode capacitar as

    pessoas a colocar mais de si mesmas quando comparadas abordagens

    psicoterpicas, assim como o favorecimento da ludicidade na criao. Quando

    em grupos, as canes podem ser um forte instrumento para conexo e

    colaborao mutua. Melhora da memria, da orientao espao temporal e da

    linguagem so resultados muito teis para os tratamentos. Os pacientes

    adquirem uma liberdade para recontar suas narrativas, assim como a

    diminuio da resistncia expresso de experincias. O uso de metforas

    enriquece o discurso do paciente.

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    61

    Consideraes finais

    Os trabalhos aqui apresentados nos trazem uma viso tanto das

    possibilidades dessa tcnica quanto dos cuidados que devemos ter ao

    emprega-las. Por isso a recomendao que seja utilizada por um

    musicoterapeuta visto que o profissional que vai saber interpretar tanto as

    letras quanto os elementos prprios da msica, elementos estes que no esto

    expressos em palavras. Percebemos tambm a partir desta reviso que,

    embora no seja novo, um aumento expressivo de relatos sobre a tcnica

    apareceram nos ltimos quatro anos, assim como a existncia de grupos

    estabelecidos que utilizam a composio de canes, como o grupo de Felicity

    Baker na Austrlia e de Michael J. Silverman nos Estados Unidos.

    Esta reviso, embora ampla, apresentou algumas limitaes quanto busca

    dos artigos na ntegra, visto que mesmo com as facilidades do Portal de

    Peridicos da Capes e dos sistemas de busca de vrias editoras, no

    conseguimos recuperar alguns arquivos que enriqueceriam ainda mais nosso

    relato. Nossos critrios de incluso e excluso se fizeram necessrios para

    poder dar ao trabalho uma maior unidade e integridade.

    Acreditamos que, por ser um tema to interessante e promissor, o

    processo teraputico de composio de canes deva ser incentivado tanto na

    prtica clnica quanto no campo da pesquisa. Uma ferramenta muito valiosa

    para o desenvolvimento humano a partir da criatividade alimentada por

    sentimentos e emoes.

    Referncias BAKER, F. An investigation of the sociocultural factors impacting on the therapeutic songwriting process. Nordic Journal of Music Therapyv. 23, n. 2, p. 123-151, 2014. http://dx.doi.org/10.1080/08098131.2013.783094 BAKER, F. The enviromental conditions that support or constrain the terapeutic songwritting process. The Arts in Psychotherapy, v. 40, p. 230-238, 2013b. http://dx.doi.org/10.1016/j.aip.2013.02.001

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    62

    BAKER, F. BALLANTYNE, J. You've got to accentuate the positive: Group songwriting to promote a life of enjoyment, engagement and meaning in aging Australians. Nordic Journal of Music Therapy, v. 22, n. 1, p. 7 24, 2013. BAKER, F. Front and center stage: participants performing songs created during music therapy. The Arts in Psychotherapy, v. 40, p. 20-28, 2013a. http://dx.doi.org/10.1016/j.aip.2012.09.004 BAKER, F. KENELLY, J. TAMPLIN, J. Themes within songs written by people with traumaitc brain injury: Gender diferences. Journal of Music Therapy, v. 42, n. 2, p. 111-122, 2005. http://jmt.oxfordjournals.org/ BAKER, F. MacDONALD, A. R Flow, identity, achievement, satisfaction and ownership during therapeutic songwriting experiences with university students and retirees. Musicae Scientiae, v. 17, n. 2, p. 131 146, 2013. DOI: 10.1177/1029864913476287 BAKER, F. MacDONALD, A. R. Experiences of creating personally meaningful songs within a therapeutic contexto. :. Arts & Health: An International Journal for Research, Policy and Practice. v.6, n. 2, p. 143 161, 2014. BAKER, F. The ongoing life of participant composed songs within and beyond the clinical setting. Musicae Scientiae, v. 17, n. 1, p. 40-56, 2013c. DOI: 10.1177/1029864912471674 HEATH, B. LINGS, J. Creative songwriting in therapy at the end of life and in bereavement. Mortality, v. 17, n. 2, p. 106-118, 2012. http://dx.doi.org/10.1080/13576275.2012.673381 HONG, I. S. CHOI, M. J. Songwriting oriented activities improve the congitive functions of the aged with dementia. The Arts in Psichotherapy, v. 38, p. 221-228, 2011. DOI:10.1016/j.aip.2011.07.002 JONES, J. D. A comparison of songwriting and lyric analisys techiniques to evoque emotional change in a single session whith people who are chemically dependente. Journal of music Therapy, v. 42, n. 2, p. 94-110, 2005. http://jmt.oxfordjournals.org/

  • Revista Brasileira de Musicoterapia - Ano XVII n 18 ANO 2015. p. 43 a 63.

    63

    KLEIN, C. M. SILVERMAN, M. J. With love from me to me: songwriting to teach coping skilld to caregivers of those with Alzheimers and other dementias. Journal of Creativity in Mental Health, v. 4, n. 2, p. 153-164, 2012. http://dx.doi.org/10.1080/15401383.2012.685010 ROBERTS, M. Transitions from clinical experiences to clinical questions and then research. Voices A world frum for music therapy, v. 6, n. 3, 2006. https://voices.no/index.php/voices/rt/printerFriendly/280/205 ROBERTS, M. McFERRAN, K. A mixed methods analysis of songs written by bereaved preadolescents in individual music therapy. Journal of Music Therapy, v. 50, n. 1, p. 2552, 2013. http://jmt.oxfordjournals.org/ SOUZA, M. T.; SILVA, M. D.; CARVALHO, R. Reviso integrativa: o que e como fazer. Einstein (So Paulo), vol.8, n.1, 2010. SILVERMAN, M. J. Effects of group songwriting on motivation and rediness for treatement on patientes in detoxification: a ramdomized wait-list effectiveness study. Journal of Music Therapy, v. 49, n. 4, p. 414-429, 2012. http://jmt.oxfordjournals.org/ SILVERMAN, M. J. Effects of group songwriting on depression and quality of life in acute psychaitric impacientes: A ramdomized three group effectiveness study. Nordic Journal of Music Therapy, v. 22, n. 2, p. 131-148, 2013. http://dx.doi.org/10.1080/08098131.2012.709268 SILVERMAN, M. J. The effect of songwriting on knowledge of coping skills and working aliance in psychiatric patients: A randomized clinical effectiveness study. Journal of Music Therapy, v. 48, n.1, p. 103-122, 2011. http://jmt.oxfordjournals.org/ THOMPSON, S. Themes and metaphors in songwriting with clientes participating in a Psychiatric Rehabilitation Program. Music Therapy Perspectives, v. 27, n. 4-10, 2009. http://mtp.oxfordjournals.org/

    Recebido em 20/06/2014

    Aprovado em 23/12/2014