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A “estratégia democrática e popular” e um inventário da esquerda revolucionária The “democratic and popular strategy”and an inventory of the revolutionary left Caio Martins, Fernando Correa Prado, Isabel Mansur Figueiredo, Stefano Motta, Victor Neves de Souza* Resumo Este texto parte da hipótese inicial de que vivemos hoje o encerramento de um ciclo histórico, o do Partido dos Trabalhadores (PT), e de sua estratégia para a re- volução brasileira: a estratégia democrática e popular. Na busca por apreender a estratégia correspondente a um determinado ciclo, procuramos rastreá-la a par- tir da teoria social que necessariamente a informa, e que encontra sua expressão unitária e coerente na obra de certos intelectuais. Neste sentido, focamos no estudo das obras de Caio Prado Jr., Florestan Fernandes e Carlos Nelson Couti- nho como um primeiro passo no sentido da realização de um inventário referen- te à transição do ciclo do PCB – correspondente à estratégia nacional e demo- crática – ao ciclo do PT – estratégia democrática e popular. Busca-se também apontar como a obra de Ruy Mauro Marini pretendeu contribuir para a consti- tuição de uma estratégia socialista da revolução brasileira. Palavras-chave: revolução brasileira; estratégia democrática e popular; ciclo his- tórico do PT. Abstract This text starts from the initial hypothesis that we live today the closing of a histor- ical cycle, the Workers’ Party (PT), and its strategy for the Brazilian revolution: the Democratic and Popular Strategy. Seeking to grasp the strategy corresponding to a given cycle, we tried to research its bases on the social theory terrain, which finds its coherent expression in the work of some intellectuals. In this sense, we focus on the study of the works of Caio Prado Jr., Florestan Fernandes and Carlos Nelson Coutinho as a first step towards the realization of an inventory related to the tran- sition from the PCB cycle – corresponding to national and democratic strategy – to the PT cycle – democratic and popular strategy. We also sought to point out how the work of Ruy Mauro Marini was an attempt to contribute to the establishment of a socialist strategy of the Brazilian revolution. Key words: Brazilian revolution; democratic and popular strategy; PT (WP) histori- cal cycle. * Caio Martins, Isabel Mansur, Stefano Motta e Victor Neves são doutorandos na Escola de Serviço Social da UFRJ. Fernando Correa Prado é professor no Instituto Latino-americano de Economia, Sociedade e Política da UNILA.

A Estratégia Democrática e Popular

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Este texto parte da hipótese inicial de que vivemos hoje o encerramento de umciclo histórico, o do Partido dos Trabalhadores (PT), e de sua estratégia para a revoluçãobrasileira: a estratégia democrática e popular. Na busca por apreender aestratégia correspondente a um determinado ciclo, procuramos rastreá-la a partir da teoria social que necessariamente a informa, e que encontra sua expressão unitária e coerente na obra de certos intelectuais. Neste sentido, focamos noestudo das obras de Caio Prado Jr., Florestan Fernandes e Carlos Nelson Coutinho como um primeiro passo no sentido da realização de um inventário referente à transição do ciclo do PCB – correspondente à estratégia nacional e democrática – ao ciclo do PT – estratégia democrática e popular. Busca-se também apontar como a obra de Ruy Mauro Marini pretendeu contribuir para a constituiçãode uma estratégia socialista da revolução brasileira.

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  • A estratgia democrtica e popular e um inventrio da esquerda revolucionriaThe democratic and popular strategyand an inventory of the

    revolutionary left

    Caio Martins, Fernando Correa Prado, Isabel Mansur Figueiredo, Stefano Motta,

    Victor Neves de Souza*

    Resumo

    Este texto parte da hiptese inicial de que vivemos hoje o encerramento de um

    ciclo histrico, o do Partido dos Trabalhadores (PT), e de sua estratgia para a re

    voluo brasileira: a estratgia democrtica e popular. Na busca por apreender a

    estratgia correspondente a um determinado ciclo, procuramos rastrela a par

    tir da teoria social que necessariamente a informa, e que encontra sua expresso

    unitria e coerente na obra de certos intelectuais. Neste sentido, focamos no

    estu do das obras de Caio Prado Jr., Florestan Fernandes e Carlos Nelson Couti

    nho como um primeiro passo no sentido da realizao de um inventrio referen

    te transio do ciclo do PCB correspondente estratgia nacional e demo

    crtica ao ciclo do PT estratgia democrtica e popular. Buscase tambm

    apontar como a obra de Ruy Mauro Marini pretendeu contribuir para a consti

    tuio de uma estratgia socialista da revoluo brasileira.

    Palavraschave: revoluo brasileira; estratgia democrtica e popular; ciclo his

    trico do PT.

    Abstract

    This text starts from the initial hypothesis that we live today the closing of a histor-

    ical cycle, the Workers Party (PT), and its strategy for the Brazilian revolution: the

    Democratic and Popular Strategy. Seeking to grasp the strategy corresponding to a

    given cycle, we tried to research its bases on the social theory terrain, which finds its

    coherent expression in the work of some intellectuals. In this sense, we focus on the

    study of the works of Caio Prado Jr., Florestan Fernandes and Carlos Nelson

    Coutinho as a first step towards the realization of an inventory related to the tran-

    sition from the PCB cycle corresponding to national and democratic strategy to

    the PT cycle democratic and popular strategy. We also sought to point out how the

    work of Ruy Mauro Marini was an attempt to contribute to the establishment of a

    socialist strategy of the Brazilian revolution.

    Key words: Brazilian revolution; democratic and popular strategy; PT (WP) histori-

    cal cycle.

    * Caio Martins, Isabel Mansur, Stefano Motta e Victor Neves so doutorandos na Escola de Servio Social da UFRJ. Fernando Correa Prado professor no Instituto Latinoamericano de Economia, Sociedade e Poltica da UNILA.

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    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    A estratgia democrtica e popular e um inventrio da esquerda revolucionria

    1) Introduo para uma autoavaliao da esquerda brasileira no sculo XXI

    O debate sobre a revoluo dos mais ricos no campo da esquerda, tendo

    se constitudo em controvrsia perene. O trabalho terico e a atuao prtica de

    Marx e Engels representam marco definitivo na superao de tendncias golpis

    tas, isolacionistas ou iluministas marcantes na atuao anterior de setores re

    volucionrios, tendo alado a polmica central a outro patamar. A oscilao po

    lar, desde ento, costuma se dar entre reformas e revoluo como dois corolrios

    possveis e no necessariamente incompatveis do prse em luta da classe

    trabalhadora.

    O tema remonta, em sua vertente comunista, ao processo de constituio

    da classe trabalhadora enquanto classe para si, ou seja: enquanto sujeito hist

    rico portador da emancipao humana como possibilidade, com projeto socie

    trio prprio e autnomo. Este processo encontra, no plano histricouniversal,

    trs balizas fundamentais: a revoluo europeia de 1848 (a Primavera dos Po

    vos), quando a classe trabalhadora se antagoniza burguesia e rompese defi

    nitivamente o terceiro estado feudal; a Comuna de Paris de 1871, quando pela

    primeira vez a classe trabalhadora toma o poder em suas mos e inicia a imple

    mentao de um conjunto de medidas tendentes emancipao humana; a Re

    voluo de Outubro de 1917, a partir da qual a classe trabalhadora consegue efe

    tivar, pela primeira vez na histria, um Estado de transio socialista. Neste ponto,

    necessrio lembrar que o processo de constituio da classe enquanto classe

    para si no linear nem muito menos se desenrola unidirecionalmente: encon

    tra culminaes e depresses a depender do prprio evolver das condies eco

    nmicas, polticas e sociais em cada formao nacional, bem como da capaci

    dade de resistncia e atuao da classe trabalhadora atravs de suas formas

    organizativas. Os marcos estabelecidos aqui assinalam, portanto, nveis de cul

    minao ou pontos mximos de conscincia, o que no significa que a classe

    neles permanea ou a eles retorne necessariamente.

    No Brasil este processo est muito estreitamente relacionado ao prprio

    surgimento da classe trabalhadora no contexto de transio de formao colo

    nial a formao propriamente capitalista. Ele tem como balizas fundantes a eclo

    so do movimento operrio organizado nas primeiras dcadas do sculo XX e

    sua culminao na fundao do Partido Comunista Seo Brasileira da Interna

    cional Comunista em 1922. Desde pelo menos 1922, portanto, est posto o deba

    te sobre a revoluo brasileira, que se expressou em vertentes diferenciadas. Se

    tambm aqui, por um lado, esto presentes os polos reformas e revoluo, por

    outro lado possvel encontrar, em cada ciclo histrico, certas composies ou

    configuraes estratgicas que pautam todas as demais posies sobre o assunto

    em uma poca dada em certa formao social. Quer sejam favorveis, quer sejam

    contrrias a estas configuraeschave, todas as demais posies so foradas a

    se situar em relao a estas. Tais configuraes estratgicas se mostram como ni

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    Caio Martins; Fernando Prado; Isabel Figueiredo; Stefano Motta; Victor Souza

    cas e inescapveis em cada ciclo, e partimos da hiptese de que isso est relacio

    nado ao fato de que elas articulam, em torno do objetivo da revoluo (e no caso

    brasileiro, da revoluo brasileira), vises sociais de mundo unitrias e coerentes

    a partir das quais conquistam posio dirigente face classe trabalhadora.

    Mas como apreender a estratgia correspondente a um determinado ciclo

    histrico? necessrio, para isso, recorrer teoria, ao reflexo unitrio e coerente,

    no plano do pensamento, da realidade sobre a qual se busca intervir e que infor

    ma a estratgia. necessrio estudar as expresses mais coerentes de determi

    nada interpretao do real, o que ocorre nas obras de certos intelectuais ativos

    em dado momento. Na escolha dos autores a serem estudados, devese levar em

    conta a importncia histrica da obra em questo. Esta importncia est relacio

    nada: de uma parte, sua aproximao da unidade e da coerncia de uma viso

    de mundo, reproduzindo, no plano da teoria, o movimento social real experimen

    tado empiricamente pela classe e interpretando a realidade; de outra parte, pr

    pria prxis social da classe trabalhadora e ao lugar que a referida obra tenha ocu

    pado no evolver do comportamento desta classe e dos rumos tomados por suas

    formas de organizao poltica ou seja, seleo real operada historicamente

    pela prpria classe, atravs de seus instrumentos de ao poltica.

    Um ciclo histrico necessariamente associado constituio da classe

    como sujeito poltico e, portanto, inseparvel do movimento de sua conscincia.

    A conscincia de classe no um mero saber de si como classe, seno uma cons

    cincia prtica necessria, isto , implica que a classe superou sua serialidade,

    fundiuse contra uma ameaa e assumiu para si tarefas polticas prticas que se

    confrontam antagonicamente com a classe dominante1. A conscincia de clas

    se se expressa nos instrumentos polticos, nas suas prticas organizativas que

    emergem como forma de enfrentar os problemas colocados pelo real. Da que a

    noo de ciclo histrico nos remete ao ascenso e descenso da classe trabalhado

    ra como sujeito poltico, da construo de seus instrumentos de luta (instncias

    coletivas) e do seu esgotamento como alternativa. Associada criao de instru

    mentos coletivos que universalizam as lutas particulares, est a elaborao de

    uma estratgia poltica que, em seu grau mximo de conscincia, tem por objeti

    vo a superao da sociedade capitalista.

    Podese, assim, falar de estratgia predominante em cada ciclo histrico.

    Uma estratgia referese forma pela qual a classe atravs dos instrumentos

    coletivos construdos para a luta interpreta, combina, organiza e dirige os di

    versos enfrentamentos particulares no sentido geral da revoluo. No Brasil,

    ntida a existncia de dois grandes ciclos. O primeiro se refere ao ciclo do PCB ou

    da estratgia nacional e democrtica. Pretendiase enfrentar os restos feudais e

    1 Para o estudo do movimento da conscincia de classe, especialmente no Brasil, ver Iasi (2006)

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    A estratgia democrtica e popular e um inventrio da esquerda revolucionria

    o imperialismo no Brasil que supostamente travavam o desenvolvimento aut

    nomo do capitalismo no pas e, aliandose burguesia nacional, acelerar o

    desenvolvimento capitalista e criar as bases para uma segunda etapa a revolu

    o socialista. O ciclo do PT ou da estratgia democrtica e popular pautase no

    processo de alargamento da democracia, compreendido como a ampliao pro

    gressiva de um conjunto de direitos e de participao poltica, atravs da presso

    dos movimentos sociais e da ocupao dos espaos no Estado, que se chocariam

    contra os interesses de nossa classe dominante. desse choque que emergiria a

    necessidade do socialismo.

    Nesse sentido, temos envidado esforos no estudo das obras de Caio Prado

    Jr., Florestan Fernandes e Carlos Nelson Coutinho como um primeiro passo no

    caminho da realizao de um inventrio referente transio do ciclo do PCB ao

    ciclo do PT. De outro lado, tomamos a teoria marxista da dependncia como in

    terlocutor necessrio (apesar de usualmente posto de lado ou refutado sem o

    devido embasamento ou talvez por isso mesmo!), na medida em que quis teo

    rizar uma estratgia socialista em plena transio entre os dois ciclos aqui apre

    sentados.

    Este texto antes de tudo a expresso de um trabalho em pleno andamen

    to2. Cabe ressaltar, finalmente, o carter sumrio da exposio em funo da

    abrangncia da temtica, mas que pode ser compensada pela leitura das obras a

    que fazemos referncia.

    2) Caio Prado Jnior e a Revoluo Brasileira

    Caio Prado (1966) foi um dos principais intelectuais a avaliar criticamente

    o projeto hegemnico da esquerda brasileira (PCB) aps a derrota histrica ex

    pressa no golpe de 1964. Em seu livro A revoluo brasileira, articulou suas prin

    cipais teses sobre o Brasil numa contraposio veemente aos paradigmas que

    fundamentaram o modelo de revoluo democrticoburguesa do partido e da

    Internacional Comunista. Sua contribuio parece ser, portanto, fundamental

    para o pensamento revolucionrio brasileiro e para lanar luz ao novo ciclo es

    tratgico que futuramente se consolidaria.

    Diante do diagnstico apresentado pelo campo do PCB sobre a fase anti

    feudal e antiimperialista da revoluo brasileira, Caio Prado afirmou que, como

    fruto das caractersticas perenes herdadas da sociedade colonial brasileira, as re

    laes econmicas muito mais se assemelhavam ao assalariamento e ao traba

    2 Optamos por no sobrecarregar o leitor com exaustivas notas de rodap ao longo desta Introduo. H diversas categorias em uso aqui, como viso (social) de mundo, ciclo histrico, articulaes estratgicas etc. que mereceriam o devido aprofundamento ou pelo menos a referncia s obras e aos autores de onde vieram. Para encontrar estas referncias, podese recorrer ao trabalho recente de um dos autores deste texto: Souza (2012).

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    Caio Martins; Fernando Prado; Isabel Figueiredo; Stefano Motta; Victor Souza

    lho livre do que a qualquer estatuto de relao feudal. Assim, segundo o autor, a

    contradio principal da formao social brasileira no se encontrava no campo,

    j que as relaes sociais e econmicas neste foram, desde o princpio, moldadas

    por fatores de natureza mercantil. O sentido da colonizao teria feito do Brasil

    uma empresa capitalista inserida em relaes internacionais de capitalismo

    comercial.

    No que se refere dominao imperialista, o autor sustenta que esta foi

    engendrada pela mesma origem: a colonizao do Brasil influenciou as institui

    es econmicas, polticas e sociais, que tm sua origem nessa mesma civili

    zao e cultura ocidentais que seriam o bero do capitalismo e do imperialismo

    (p. 121). Sob a herana dessa trajetria, a economia brasileira evoluiu com razes

    no capitalismo mercantil baseado no fornecimento aos mercados externos, o que

    definiria a caracterstica de relao com o imperialismo (p. 122) em uma situa

    o de dependncia e subordinao orgnica e funcional (p. 182).

    Por isso, na viso de Caio Prado, no existiu uma burguesia nacional inimi

    ga do imperialismo em nosso pas, mas uma burguesia brasileira. Isso aniquila a

    tese de uma burguesia progressista nacional e antiimperialista oposta aos

    interesses de setores latifundirios. As fraes interna e externa da burguesia es

    tavam, segundo o autor, ligadas a ramos de produo distintos, mas muito mais

    se associavam do que se combatiam situao tributria do fato de que, de um

    ponto de vista histrico, sua caracterstica heterognea, no que diz respeito sua

    origem3, no suplantou a homogeneidade de seus interesses e a maneira de con

    duzilos.

    Caio Prado conclui que a rpida ascenso dessa burguesia formou uma

    classe que, apesar de representar distintos setores e atividades econmicas, se

    fundia em interesses comuns, sendo, portanto, altamente coesa. Ressalta, ainda,

    que muitas das primeiras indstrias do Brasil foram construdas por fazendeiros

    de caf, o que torna ainda mais indissociveis esses setores sociais no havendo

    aqui, por exemplo, uma oposio entre burguesia e aristocracia. Assim, os di

    ferentes setores da burguesia evoluram paralelamente, ou antes, confundidos

    numa classe nica formada e mantida na base de um mesmo sistema produtivo

    e igual constelao de interesses (p. 182).

    Mas o capitalismo brasileiro no era idntico queles vigentes no centro do

    sistema. A natureza de uma economia voltada para fora e submetida s imposi

    es do imperialismo determinava, segundo o autor, a insuficincia da capacida

    de produtiva brasileira que, devido no superao da heteronomia herdada

    dos tempos de colnia, continuava condicionada por necessidades externas

    3 Os primeiros representantes do que seria um rudimento da burguesia urbana brasileira teriam sido comerciantes portugueses, aos quais se teriam somado, a partir da abertura dos portos, comerciantes de outras nacionalidades.

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    A estratgia democrtica e popular e um inventrio da esquerda revolucionria

    nossa formao social, e no s necessidades internas do prprio povo brasileiro.

    Por se expandir a partir de relaes de trabalho da massa trabalhadora com bai

    xos nveis de vida, a impossibilidade de consumo qualificado era uma decor

    rncia das deficincias orgnicas da vida econmica e social do pas. A superao

    dessa contradio e o desenvolvimento de uma economia interna era pressupos

    to para libertao do pas de suas contingncias coloniais.

    Tal desenvolvimento deveria ser atingido como consequncia de uma ver

    dadeira reorganizao e reorientao da economia pela induo, a partir do Es

    tado, de um desenvolvimento geral e sustentvel, que levasse em conta, em pri

    meiro lugar, o aumento da demanda e sua articulao com as necessidades

    fundamentais de consumo. Caio Prado insiste, portanto, no argumento de que o

    principal problema do Brasil no seria a questo da terra, mas a existncia de

    uma massa de trabalhadores destituda de tudo e, consequentemente, impossi

    bilitada de criar demanda para um mercado interno cujo desenvolvimento seria

    necessrio para a completude do Brasil enquanto nao. A condio principal

    para o amadurecimento desta nova realidade seria a esquerda propor um pro

    grama de reformas necessrias ao progresso e ao desenvolvimento do pas e do

    povo brasileiro (p. 330).

    Caio Prado est em busca de um BrasilNao, que negue sua condio

    colonial ininterrupta, criando assim as bases para a possibilidade de uma revo

    luo socialista, que no estariam dadas at ento. Para crilas, se fazia neces

    srio completar e autonomizar o mercado interno, o que no se realizaria ape

    nas a partir da livre iniciativa privada, posto que estaria movida por interesses

    egostas o lucro. Seria necessrio que uma vontade geral (Estado) induzisse

    o desenvolvimento capitalista brasileiro entendido enquanto desenvolvimen

    to nacional e que uma aliana entre trabalhadores e camponeses pressionasse

    o Estado para que este pautasse a reorientao do mercado brasileiro para a

    satisfao das necessidades da populao brasileira, e no dos grandes grupos

    transnacionais.

    Assim, a revoluo brasileira de Caio Prado no imediatamente socialis

    ta, uma vez que para ele era impossvel uma revoluo socialista numa forma

    o social como a brasileira, de capitalismo incompleto ou imaturo. Curiosa

    mente e isto muito interessante , a posio de Caio Prado, que parte de

    crticas cidas interpretao do Brasil por parte do PCB, considerada fantasio

    sa, chega a um ponto muito prximo daquele partido em termos de proposta de

    programa e de ao e podemos mesmo dizer: de estratgia. Seu programa da

    revoluo brasileira se mantm nos marcos de um carter nacional e antecipa

    elementos importantes da Estratgia Democrtica e Popular e do ciclo estrat

    gico que se segue.

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    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    Caio Martins; Fernando Prado; Isabel Figueiredo; Stefano Motta; Victor Souza

    3) Florestan Fernandes: tarefas em atraso e dialtica de revoluo dentro e

    fora da ordem

    Florestan Fernandes (1976), talvez o principal socilogo brasileiro, vai se

    dedicar, em seu ensaio sociolgico sobre a Revoluo Burguesa no Brasil, com

    preenso do particular desenvolvimento de nossas relaes capitalistas, ao qual

    atribuiu o carter de modernizao conservadora. Segundo ele, o desenvolvimen

    to capitalista e a democracia no Brasil estavam desvinculados e no eram conse

    quncia da evoluo um do outro fato que se constituiria como uma resultan

    te poltica da forma prpria de acumulao de capital nos quadros do capitalismo

    perifrico e dependente. Sua viso tende a suplantar definitivamente a perspec

    tiva que via na revoluo burguesa uma possibilidade de revoluo nacional e

    democrtica.

    A partir de um processo hbrido em que a burguesia no era inicialmente

    uma classe, tendo se constitudo a partir de uma unidade de interesses comuns

    de vrias burguesias (ou ilhas burguesas) que mais se justapem do que se fun

    dem (p. 204), a revoluo burguesa no Brasil acontece com caractersticas de

    uma modernizao conservadora ou revoluo encapuzada. De acordo com Flo

    restan Fernandes, em um primeiro momento, essa transio conservadora foi

    encabeada por elites nativas que no se contrapuseram propriamente socie

    dade colonial, mas s restries advindas do estatuto colonial, pois este neutra

    lizava sua capacidade de dominao em todos os nveis da ordem social (p. 32).

    nesta ruptura, no processo de Independncia, que o poder deixar de organi

    zarse de fora para dentro para organizarse a partir de dentro. Apresentaramse

    a duas tendncias, uma conservadora e outra revolucionria: esta buscava a

    ruptura da condio heteronmica a que tinha sido relegada a economia brasi

    leira e aquela buscava fortalecer a mesma ordem social tal e qual se encontrava,

    negando o aspecto revo lucionrio do episdio da Independncia, restrito su

    perao jurdicopoltica do estatuto colonial. Egressa da situao colonial, nos

    sa economia urbana nasce tendo como base um sistema econmico agrrio, es

    cravista e dependente.

    Um segundo marco importante no processo de dinamizao econmica e

    amadurecimento das condies internas para uma dominao burguesa foi,

    conforme Florestan, o perodo da abolio da escravido e o comeo de uma

    nova era em que se consolida o trabalho livre. Assim, o autor destaca que, nos

    perodos antecedentes a uma dominao propriamente burguesa, as elites nati

    vas, e em especial a oligarquia rural ou agrria, tiveram necessidade de se moder

    nizar, porm buscando manter sua influncia na dominao. Junto ao imigrante,

    essa oligarquia desenvolveu uma concepo burguesa de mundo, assumindo,

    para si, o pioneirismo da modernizao. Seus interesses e sua unificao en

    quanto bloco de poder deramse em oposio presso dos novos assalariados

    ou semiassalariados do campo e da cidade (p. 210).

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    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    A estratgia democrtica e popular e um inventrio da esquerda revolucionria

    O terreno poltico foi o campo de confluncia de interesses, em que foi es

    tabelecido seu pacto tcito de dominao de classe: (...) visavam exercer presso

    e influncia sobre o Estado e, de modo mais concreto, orientar e controlar a apli

    cao do poder poltico estatal, de acordo com seus fins particulares. (p. 204).

    Florestan caracteriza a irrupo da dominao burguesa no Brasil como fundada

    em um modelo autocrtico burgus que, se apropriando de elementos arcaicos,

    acorrentava a expanso do capitalismo a um privatismo tosco, rigidamente par

    ticularista. A forma autocrtica amalgamava um desenvolvimento em que os

    elementos mais atrasados se repem permanentemente como se o burgus

    moderno renascesse das cinzas do senhor antigo (p. 168). Uma das principais

    caractersticas dessa congire de interesses burgueses era a sua quase neutralida

    de para a difuso de procedimentos democrticos, sendo transpassada, portan

    to, por um perfil autoritrio e particularista.

    Segundo o socilogo brasileiro, o carter da formao econmica do capi

    talismo no Brasil, em funo de sua no autonomia em relao dominao ex

    terna, estruturalmente dependente, subdesenvolvido e perifrico. Da advm

    mais uma das suas caractersticas particulares: sob a situao de dependncia,

    os estratos dominantes no possuem autonomia necessria para conduzir e

    completar uma revoluo democrtica e nacional. Na verdade, a dominao

    burguesa teria que se adaptar a um tipo de transformao capitalista em que a

    dupla articulao entre desenvolvimento desigual interno e dominao imperia

    lista externa constitua a regra. Essa dupla articulao estaria fundada na relao

    entre o setor arcaico (rural) e moderno (urbano) no Brasil e na associao de in

    teresses internos e externos.

    Neste diapaso, momentos especficos em que a burguesia participara de

    aventuras nacionalistas que ele nomeia radicalismo burgus deixaram claro

    que ela, por mais que lutasse por causas justas, no teria coragem de romper

    com a dominao imperialista e com os limites do subdesenvolvimento interno.

    Como consequncia, padronizavase uma modalidade de demagogia populis

    ta, sob a qual no se abririam espaos polticos para a participao democrtica

    de amplos setores e se agitariam interesses nacionais como se fossem interesses

    universais. Estas experincias radicais permitiram jovem burguesia o desper

    tar para sua verdadeira condio, ensinandoa a no procurar vantagens relati

    vas para estratos burgueses isolados, custa de sua prpria segurana coletiva e

    da estabilidade da revoluo burguesa (p. 365).

    nesse sentido que, segundo Florestan, a dominao autocrtica se forta

    leceu e criou sua dinmica prpria de relao. Sua ordem converteuse numa

    permanente ditadura de classes preventiva, que tem seu aspecto abertamente

    autoritrio mascarado por demagogias populistas, e a base para a conciliao

    das burguesias e de seus interesses.

    As concluses apontadas por Florestan (1981) abriram caminho a uma reo

    rientao no que diz respeito aos postulados da Revoluo Brasileira. Sua apre

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    Caio Martins; Fernando Prado; Isabel Figueiredo; Stefano Motta; Victor Souza

    ciao estava fortemente fincada na impermeabilidade da autocracia burguesa

    presso dos de baixo, o que levaria ao que chamava de revoluo dentro da or-

    dem, que, encontrando resistncias, poderia se transformar em uma revoluo

    contra a ordem. Para o autor, o embate em torno do aprofundamento das tarefas

    em atraso, efetivadas por um programa de reformas que se choca contra os inte

    resses dominantes, pode levar revoluo contra a ordem. Neste sentido,

    (...) o envolvimento poltico das classes trabalhadoras e das massas

    populares no aprofundamento da revoluo dentro da ordem possui

    consequncias socializadoras de importncia estratgica. A burgue

    sia tem pouco que dar e cede a medo. O proletariado cresce com a

    conscincia de que tem de tomar tudo com as prprias mos e, a m

    dio prazo, aprende que deve passar to depressa quanto possvel da

    condio de fiel da democracia burguesa para a de fator de uma

    democracia da maioria, isto , uma democracia popular ou operria

    (Fernandes, 1981).

    Esta reorientao guarda, por um lado, considervel elevao do nvel de

    radicalidade em relao s formulaes anteriores, j que coloca a revoluo so

    cialista na ordem do dia e busca esboar um caminho para viabilizla desde o

    tempo presente e da luta concreta. Por outro lado, apresenta um importante

    ponto em comum com elas, o qual estar justamente no centro da eventual re

    converso da proposta florestaniana em prisioneira dos limites da democracia

    burguesa: ao considerar que a burguesia brasileira no aceitar fazer concesses

    democratizantes classe trabalhadora em luta ou seja, ao considerar o padro

    autocrtico como norma insupervel nos limites da dominao burguesa brasi

    leira , Florestan abre o flanco para que a prpria luta contra a autocracia seja ela

    mesma vista como parte da luta socialista, da revoluo contra a ordem.

    desta ambiguidade que arrancam os intrpretes petistas de Florestan

    para incorporlo a seu rol de autores, descaracterizando a radicalidade possvel

    da proposta do mestre e transformandoo, sua revelia, em um terico da am

    pliao da democracia como caminho para o socialismo um passo para sua

    incorporao esterilizada como terico do atual projeto petista, de constitui

    o no Brasil de uma democracia ampla, na verdade uma democracia de coop-

    tao mutilada ou interrompida , projeto este combatido explicitamente pelo

    prprio Florestan.

  • 366

    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    A estratgia democrtica e popular e um inventrio da esquerda revolucionria

    4) Ruy Mauro Marini e a controvrsia da dependncia: a crtica estratgia

    nacional e democrtica e notas sobre continuidades que informam a

    estratgia democrtico-popular 4

    A categoria de dependncia perpassa a histria da Amrica Latina desde

    o prprio momento das independncias formais dos pases da regio. Desde

    ento, diversas foras polticas utilizam esta categoria para tratar das relaes

    da regio com o resto do mundo, em especial com a Europa e os Estados Unidos.

    Mas houve um momento na histria latinoamericana em que esta categoria

    foi mais central e entrou em clara disputa poltica: ao final dos anos 1960 at

    meados da dcada de 1970 ou, para ser mais preciso, entre 1964 e 1973, da

    tas simblicas da contrarrevoluo na Amrica Latina e, no por acaso, aps

    a integrao imperialista dos sistemas de produo e aps a Revoluo Cuba

    na de 1959. neste ento que se concentra o que aqui denominamos de con

    trovrsia da dependncia, um perodo no qual praticamente todas as anlises

    sobre a regio e, de fato, todas no mbito da esquerda e do marxismo uti

    lizaram, de forma mais ou menos destacada, a categoria de dependncia para

    sintetizar as principais ca ractersticas das formaes econmicosociais lati

    noamericanas.

    Precisamente por essa contnua e marcante presena da categoria de de

    pendncia nas interpretaes da Amrica Latina, possvel identificar, no plano

    da histria das ideias, diferentes formas de se posicionar sobre a controvrsia em

    torno do tema. Para situla em grandes traos, com especial ateno para sua

    trajetria no Brasil, consideramos que preciso visualizar em seu interior dois

    eixos com origens distintas, derivadas de questes motoras diferentes: tal con

    trovrsia se d, por um lado, como desdobramento e tentativa de superao dos

    debates sobre o desenvolvimento brasileiro, que permearam a disputa intelectual

    nos anos 1950, e, por outro, como desdobramento e tentativa de superao dos

    debates sobre a revoluo brasileira, que no fundo se entroncavam na crtica

    estratgia nacional e democrtica at ento predominante dentro daquele ciclo

    histrico da esquerda no Brasil.

    Aqui nos concentraremos no segundo eixo, em particular na obra de Ruy

    Mauro Marini. A inteno desta seo dupla: mostrar como a figura de Marini

    como representante da esquerda revolucionria que emergia na poca , ao es

    tabelecer a crtica prtica e terica estratgia nacional e democrtica, pode

    con tribuir no sentido de sentar as bases para a superao atual da estratgia

    democrticopopular; e, por outro lado, apontar como a controvrsia da depen

    dncia tomada em si mesma e considerando a forma como se expressou no

    Brasil acaba por gerar linhas de continuidade da estratgia nacional e demo

    crtica e informa a estratgia democrticopopular.

    4 Parte desta seo retoma passagens de outro texto que j circulou previamente: Correa Prado e Gouvea (2014).

  • 367

    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    Caio Martins; Fernando Prado; Isabel Figueiredo; Stefano Motta; Victor Souza

    Em diversos momentos de sua obra, Marini deixa claro que sua preocupa

    o inicial no seria a de encontrar as falhas das teorias desenvolvimentistas ou

    oferecer novas frmulas para o chamado desenvolvimento nacional. A questo

    que lhe movia era outra: a revoluo brasileira e latinoamericana rumo ao socia

    lismo, que requer a anlise do capitalismo na regio. J ao final dos anos 1960 e

    incio dos 1970, considerando o peso que as questes do subdesenvolvimento e

    da dependncia tinham na caracterizao da regio, Marini comea a disputar

    essas categorias, apontando para uma leitura distinta sobre a realidade latino

    americana, que deveria informar uma estratgia socialista e revolucionria.

    Naquele contexto, era muito comum a identificao da dependncia exter-

    na como uma das causas do subdesenvolvimento sendo este definido pela po

    breza extrema, pela desigualdade interna, pela falta de soberania nacional, entre

    outras caractersticas sociais latinoamericanas. Tal viso da dependncia esteve

    presente, por um lado, nas anlises desenvolvimentistas da Comisso Econmi

    ca para a Amrica Latina e o Caribe (CEPAL), que enquanto expresso de alguns

    setores das burguesias internas latinoamericanas e como difusor da ideologia

    do desenvolvimento que tomou corpo no psguerra5 defendia reformas estru

    turais e a ruptura da dependncia externa para superar um desenvolvimento vol

    tado para fora e criar um desenvolvimento voltado para dentro ou autnomo,

    baseado na industrializao via substituio de importaes, sob a liderana das

    respectivas burguesias nacionais e com forte participao estatal (e ainda capita

    lista). Notese, de passagem, que este projeto tem muitos pontos de contato com

    as propostas de Caio Prado Jnior sumariadas acima.

    Por outro lado, a noo de dependncia externa figurava na anlise da

    principal fora de esquerda do Brasil naquele perodo o Partido Comunista Bra

    sileiro (PCB). Essas duas posturas sobre a dependncia acabavam tendo implici

    tamente um ponto em comum: a dependncia externa impediria o pleno desen

    volvimento capitalista do pas, de modo que haveria um capitalismo insuficiente,

    que manteria relaes de produo atrasadas, arcaicas, semifeudais. Nesta

    viso dualista, o subdesenvolvimento era visto como falta de desenvolvimento

    capitalista, o imperialismo como uma relao de dominao entre naes, e a

    dependncia como um fator externo.

    Esta viso, predominante na esquerda durante a dcada de 1950 at meados

    da dcada de 1960, comea a mudar aps a Revoluo Cubana de 1959, quando

    demostrouse a possibilidade da revoluo socialista num pas latinoamericano,

    trazendo tona uma questo que passaria a orientar a esquerda revolucionria:

    em nosso continente, a efetiva independncia somente poderia ser conquistada

    com o socialismo.

    5 H amplssima bibliografia sobre este tema. Ver, entre outros, Marini (1992).

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    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    A estratgia democrtica e popular e um inventrio da esquerda revolucionria

    Desde uma perspectiva marxistaleninista e a partir de anlises da realida

    de latinoamericana, Marini apontou que o subdesenvolvimento e a dependn

    cia no so apenas fruto de uma relao externa de subordinao a outros pases,

    mas surgem igualmente da especificidade das relaes internas de explorao.

    Em sua perspectiva, o capitalismo latinoamericano no podia ser visto como

    um capitalismo ainda insuficiente. Aqui o desenvolvimento capitalista esteve

    marcado pelo passado colonial, pela insero subordinada da excolnia na divi

    so internacional do trabalho e pelas transformaes qualitativas que esta sofre

    com a emergncia do imperialismo como fase monopolista do desenvolvimento

    capitalista. No se tratava de falta de capitalismo, mas sim de um capitalismo

    dependente.

    Portanto, a dependncia no seria apenas a face do imperialismo vista des

    de a Amrica Latina. Sem abandonar a relao entre dependncia e imperialis

    mo, Marini se dispe a analisar o papel da regio no desenvolvimento capitalista

    em escala mundial, em suas determinaes internas e externas. O aprofunda

    mento das relaes capitalistas na Europa nos sculos XVIII e XIX contou com

    um importante fluxo de alimentos e matriasprimas, fator que teria sido essen

    cial para o rebaixamento do valor da fora de trabalho e para a predominncia de

    extrao de maisvalor relativo dos trabalhadores europeus. Enquanto isso, na

    Amrica Latina, por volta de 1840 e j na qualidade de naes formalmente in

    dependentes, configurase a dependncia. Conforme aponta em Dialtica da de-

    pendncia (2005 [1973]), a consequncia da dependncia no pode ser, portanto,

    nada mais do que maior dependncia, e sua liquidao supe necessariamente a

    supresso das relaes de produo nela envolvidas.

    O incio da fase imperialista, a partir do ltimo quarto do sculo XIX, ao

    mesmo tempo modificaria e aprofundaria a dependncia. Nesta fase, que segue

    at hoje6, ocorreriam ainda novas reconfiguraes, como aquelas relacionadas

    industrializao na regio que se deu de maneira diferenciada entre os pases,

    reproduzindo uma espcie de diviso regional do trabalho e dando margem ao

    surgimento do que Marini chamaria de subimperialismo (1977; 2012 [1969/1974]).

    Entretanto, em nenhum pas latinoamericano a industrializao teria rompido

    a dependncia. Aps a Segunda Guerra Mundial, sob hegemonia dos Estados

    Unidos, a industrializao se deu atravs de uma integrao subordinada dos

    sistemas produtivos destes pases.

    Para Marini, portanto, a interpretao marxista da dependncia deve ca

    racterizar a histria latinoamericana como parte de um desenvolvimento capi

    talista com caractersticas particulares e como fruto e determinante do papel de

    sempenhado pela regio no mercado mundial. O fato de conviverem diferentes

    relaes de produo em uma mesma formao social no exclui que a determi

    6 Ver Fontes (2010).

  • 369

    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    Caio Martins; Fernando Prado; Isabel Figueiredo; Stefano Motta; Victor Souza

    nao em ltima instncia de sua lgica de reproduo social esteja baseada no

    capitalismo7.

    O capitalismo dependente estaria marcado por trs elementos, todos inter

    ligados e constantemente reconfigurandose em sua mtua interao: i) pela

    transferncia de valor para as economias centrais; ii) pela superexplorao da for-

    a de trabalho; e iii) pela agudizao das contradies inerentes ao ciclo do capi-

    tal, uma vez que a lgica determinante de acumulao nas economias depen

    dentes produz, em geral, mercadorias destinadas para a exportao e para as

    elites. Em suma, ao longo de sua obra Marini destaca: a) o capitalismo latino

    americano como capitalismo especfico (sui generis); b) a dependncia como

    especificidade deste capitalismo, resultado e determinante do desenvolvimento

    capitalista em escala mundial e inserido nas distintas divises internacionais do

    trabalho, nas quais a Amrica Latina ocupa papel subordinado; c) a dependn

    cia, ainda, como transformao interna das relaes de produo, tambm fruto

    e determinante da reproduo ampliada capitalista, interna e externamente; d) a

    negao de uma aliana da classe trabalhadora com a burguesia, seja nacional

    ou internacional; e) a atualidade da revoluo socialista como a nica maneira

    de romper a dependncia. Estas posies, que sintetizam seu posicionamento

    terico e sua postura frente ao debate estratgico, foram depreendidas do senti

    do geral de diversos de seus textos8.

    Esta sntese estaria incompleta sem uma ltima observao: a partir da ca

    racterizao do capitalismo brasileiro e da emergncia do subimperialismo, bem

    como da crtica aos equvocos da articulao estratgica predominante da prin

    cipal fora da esquerda at 1964, Marini se posiciona sobre o carter da revolu

    o brasileira e reafirma a atualidade da revoluo socialista como o verdadeiro

    carter da revoluo brasileira (2012 [1966], pp. 158160), lembrando que:

    Tudo est relacionado a conseguir uma organizao da produo que

    permita o pleno aproveitamento do excedente criado, ou, vale dizer,

    que aumente a capacidade de emprego e produo dentro do sis

    tema, elevando os nveis de salrio e de consumo. Como isso no

    7 Neste sentido, critica frontalmente a noo de dualismo estrutural, que perpassava muitas anlises da poca, inclusive marxistas: (...) no tem cabimento falar de uma dualidade estrutural dessa economia tal como se costuma entendla, isto , como uma oposio entre dois sistemas econ micos independentes e mesmo hostis, sem confundirse seriamente sobre a questo. Pelo contrrio, o ponto fundamental est em reconhecer que a agricultura de exportao foi a prpria base sobre a qual se desenvolveu o capitalismo industrial brasileiro (2012, p. 133). Notese que esta perspectiva foi exposta j em 1966, bem antes da famosa Crtica da razo dualista (1972), de Francisco de Oliveira.8 Embora Dialtica da dependncia seja a mais conhecida e, talvez, a mais importante obra de Ruy Mauro Marini, em Subdesenvolvimento e revoluo (2012 [1969/1974]) que se encontra a sntese de sua viso sobre esses temas para o caso do Brasil, com destaque para o artigo ali contido sobre o O movimento revolucionrio brasileiro. Em diversos textos Marini tambm analisou a fundo o caso do Chile, sendo que parte de suas anlises foram compiladas em El reformismo y la contrarre-volucin: estudios sobre Chile (1976).

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    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    A estratgia democrtica e popular e um inventrio da esquerda revolucionria

    possvel nos marcos do sistema capitalista, s resta ao povo brasileiro

    (...) o exerccio de uma poltica operria, de luta pelo socialismo.

    Esta ltima passagem mais rica do que poderia parecer primeira leitura,

    sendo elucidativa para a dupla inteno exposta no incio dessa seo. Se, por

    um lado, Marini afirma a atualidade da revoluo socialista e identifica os ele

    mentos que informavam a estratgia nacional e democrtica com subsdios

    para a crtica estratgia democrticopopular , deixa entrever tambm alguns

    elementos que dariam margem para as elaboraes tericas que informaram e

    seguem informando aquela mesma estratgia democrtica e popular. Situadas

    historicamente e como parte da intrincada controvrsia da dependncia, algu

    mas passagens de Marini tal como em Florestan Fernandes podem deixar

    margem para ambiguidades (quando afirma, por exemplo, a incapacidade de

    aumento do consumo das grandes massas). Como exemplo rpido: apegada a

    essa ambiguidade, confundindo aumento de consumo com fim da superexplora

    o da fora de trabalho e esquecendo todo o resto sobre a estratgia revolucio

    nria, a possvel apropriao de Marini pelo vis democrticopopular diria que

    a luta por maior poder de consumo seria tendencialmente uma luta estratgica e

    socialista, pois colidiria contra um ponto crucial do capitalismo dependente.

    5) Carlos Nelson Coutinho e a democracia como o caminho do socialismo

    Entre os anos 1960 e 1980, evidentemente coincidindo com a resistncia

    instaurao e consolidao no Brasil da forma aberta da autocracia burguesa

    manifesta no que Octavio Ianni chamou de A ditadura do grande capital, o tema

    da democracia se afirmou como centro do debate poltico no Brasil. Isto se deu

    inicialmente no campo mais esquerda, mas posteriormente, principalmente a

    partir dos anos 80, como parte de um grande consenso entre aspas devido ao

    fato de que tal consenso comporta grandes diferenas no mbito de um marco

    geral comum.

    Carlos Nelson Coutinho foi um dos pensadores mais destacados neste

    processo de confluncia em direo ao tema da democracia, notadamente entre

    os socialistas. Assim, conhecer profundamente sua contribuio uma das pre

    condies para compreender adequadamente o evolver do pensamento polti

    co brasileiro no perodo em questo e, para isso, no de menor importncia

    considerar os seguintes aspectos: a) todo o seu pensamento maduro marcado

    por certa remisso peculiar a Antonio Gramsci e por um profundo debate com o

    pensamento conhecido como eurocomunista9, o que remete a polmicas no

    movimento comunista internacional, j prenunciando a grande crise seguida

    9 Quanto ao chamado eurocomunismo, cf.: Berlinguer (2009); Carillo (1977); Mandel (1978); Togliatti (1980).

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    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    Caio Martins; Fernando Prado; Isabel Figueiredo; Stefano Motta; Victor Souza

    pelo colapso das experincias socialistas; b) sua reflexo poltica se constitui,

    num primeiro momento, visando a incidir sobre a disputa de rumos no PCB,

    que se aprofundou e encarniou cada vez mais aps a derrota de 1964 e que

    atingiu seu ponto culminante na virada dos anos 70 aos 80; c) num segundo

    momento, esta reflexo esteve diretamente pautada pelo processo de redemo

    cratizao da sociedade brasileira em curso a partir de fins dos anos 1970 e por

    sua deciso de influir sobre os rumos do PT, partido ao qual Carlos Nelson viria

    a aderir nos anos 1980.

    Para uma exposio sumria dos pontos centrais de seu pensamento po

    ltico, devemos, primeiramente, tocar no ponto da via prussiana, chave para

    sua interpretao do Brasil. Data de 1972 a elaborao de artigo sobre o signifi

    cado de Lima Barreto na literatura brasileira. Neste artigo, Carlos Nelson avan

    a no que se constituir futuramente em sua interpretao da peculiaridade

    histrico-estrutural brasileira afirmando, pela primeira vez, a tese segundo a

    qual a formao social brasileira se caracteriza pela sua constituio moderna

    enquanto resultante da via prussiana (Netto, 2012, p. 64). O marcante neste

    raciocnio que o caminho do povo brasileiro para o progresso social um

    caminho lento e irregular [teria ocorrido] sempre no quadro de uma concilia-

    o com o atraso (Coutinho, 1974 [1972], p. 3 grifo nosso) e operado pelo

    alto, sem o acordo das massas populares, excluindoas da vida poltica. Este

    raciocnio, vale assinalar, completamente compatvel com aquele de Flores

    tan sobre o padro autocrtico da dominao poltica operada pela burguesia

    brasileira, ainda que tenha sido formulado antes do livro de Florestan citado no

    presente texto.

    Em segundo lugar, necessrio tocar no ponto habitualmente polmi

    co da relao de Carlos Nelson com o Partido Comunista Italiano e a proposta

    apregoada por este partido de via democrtica para o socialismo10. A relao

    com o PCI, que anteriormente j era de admirao, aprofundase com o exlio na

    Itlia a partir de 1976. O perodo italiano de cerca de dois anos pode ser consi

    derado um divisor de guas em sua trajetria intelectual e poltica, estando inex

    tricavelmente ligadas, de uma parte, a admirao pelo PCI combinada adeso

    ao eurocomunismo como portador da via revolucionria adequada s socie

    dades ocidentais a via democrtica para o socialismo e, de outra parte, a

    apropriao cada vez mais profunda e segura do legado terico gramsciano. Am

    bas as dimenses tiveram bvias repercusses no pensamento e na ao poltico-

    -prtica de Carlos Nelson.

    10 importante, antes de mais, deixar absolutamente claro um ponto: Carlos Nelson se aproxima das posies polticas do PCI porque precisa fundamentar sua adeso a um conjunto de ideias so-bre a democracia que j gozava de larga tradio no debate do PCB e dos comunistas, da democracia como caminho para o socialismo (cf. Konder, 1980). O caminho de Carlos Nelson no do eurocomunismo democracia como valor universal. Antes, o mais correto pensar no sentido contrrio.

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    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    A estratgia democrtica e popular e um inventrio da esquerda revolucionria

    Em terceiro lugar, necessrio apontar para a esfera da disputa de rumos

    no interior do prprio PCB para a consolidao de suas posies. Durante o ex

    lio, Carlos Nelson esteve bastante envolvido no debate poltico travado no seio

    do partido em que militava, cujo Comit Central foi formalmente transferido

    para o exterior em decorrncia das insuficientes condies de segurana (Pres

    tes, 2012, p. 197). Desde a primeira reunio desta instncia, ainda em 1976, se

    estabeleceu forte polarizao entre, de um lado, o secretriogeral Luiz Carlos

    Prestes e, de outro, Armnio Guedes, membro muito ativo da direo, ento resi

    dente em Paris (Prestes, 2012, pp. 197234 e 2012a, p. 42). Enquanto Prestes vinha

    se distanciando teoricamente da linha aprovada no VI Congresso do Partido a

    partir de avaliao da insuficincia da estratgia nacional-democrtica para a

    construo do projeto socialista, Guedes havia aderido s chamadas teses euro

    comunistas e apostava na centralidade da questo democrtica da democra

    cia como caminho e, at certo ponto, finalidade, da luta socialista. No ser

    poss vel desenvolver os detalhes tericos da polmica neste espao, bastando

    aqui assinalar que no contexto desta disputa Guedes props e aprovou no Comi

    t Central do partido a criao de uma Assessoria a ser organizada por ele e se

    diada em Paris, que viria a ser composta por intelectuais militantes do PCB resi

    dentes em pases europeus com a tarefa de auxiliar na discusso dos problemas

    brasileiros.

    A partir da, se formou em torno de Armnio Guedes um ncleo de intelec

    tuais com certa homogeneidade de posicionamento constituda a partir da

    identidade de seus participantes com as teses eurocomunistas ou renovado

    ras , que participou ativamente da polmica que se travava na direo do par

    tido no exlio e teve em Guedes uma espcie de portavoz no Comit Central do

    Partido (Netto, 2012, pp. 6468; Prestes, 2012, pp. 203234 e 2012a, pp. 4349).

    Carlos Nelson Coutinho comps esta Assessoria e escreveu regularmente para o

    jornal do partido, tambm dirigido pelo grupo de Guedes. Teve, portanto, papel

    destacado neste grupo cujos integrantes ficaram conhecidos como os reno

    vadores11, e o debate que se travou entre estes e o secretriogeral foi justamen-

    te o debate sobre o carter socialista (ou no) da revoluo brasileira.

    Podemos dizer, portanto, que foi em decorrncia (e, podese dizer, como

    culminao) deste envolvimento com o debate interno do PCB entre, de um lado,

    uma posio que afirmava a democracia como caminho e fim da luta socialista,

    e, de outro, uma posio que trabalhava pela superao desta relao de subor

    dinao da luta socialista forma democrtica, e com os olhos voltados para o

    Brasil em processo de abertura ou redemocratizao, que Carlos Nelson escre

    11 A Assessoria do Comit Central foi composta por: Armnio Guedes (responsvel), Zuleika Alambert, Carlos Nelson Coutinho, Leandro Konder, Milton Temer, Alosio Nunes Ferreira, Antnio Carlos Peixoto, Mauro Malin (ento residentes em Paris) e Ivan Ribeiro Filho (residente na Itlia). Cf. Prestes, 2012a, pp. 4344.

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    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    Caio Martins; Fernando Prado; Isabel Figueiredo; Stefano Motta; Victor Souza

    veu o ensaio A democracia como valor universal, publicado em maro de 1979 e

    que se tornou verdadeiro divisor de guas na esquerda brasileira. Este ensaio ti

    nha como tema justamente a relao entre democracia e socialismo, articulada

    em busca de respostas para a questo de qual deveria ser o carter da luta da es

    querda revolucionria brasileira.

    Carlos Nelson, com ele, pretendia superar, de uma s vez, o esgotamento

    da estratgia do PCB e os limites do imediatismo voluntarista de uma nova es

    querda que surgia (Braz, 2012, p. 246). Esta tentativa de superao por parte de

    Carlos Nelson aparece, sinteticamente, nos pontos expressos a seguir.

    Em primeiro lugar, a afirmao de que parte da esquerda trabalharia, equi

    vocadamente, com uma viso meramente ttica ou instrumental da demo

    cracia, no reconhecendo seu valor universal, identificando mecanicamente

    democracia poltica e dominao burguesa. Carlos Nelson afirma que esta po

    sio tem suas razes numa errada concepo da teoria marxista do Estado

    (Coutinho, 1980, p. 21), que por sua vez se baseia numa remisso anacrnica ao

    prprio Marx. Para Carlos Nelson, este, em documentos como o Manifesto Co-

    munista, desposa uma viso restrita do Estado, que foi vlida para grande parte

    da Europa continental e do mundo em meados do sculo XIX, mas que teria sido

    superada pela prpria histria em grande parte do mundo j na virada do sculo

    XIX para o XX. A esquerda que continuasse defendendo a posio expressa por

    Marx no Manifesto estaria claramente, mesmo se de boa f, incorrendo em um

    erro no mnimo em um anacronismo.

    Em segundo lugar, a afirmao do valor universal da democracia, no

    como um universal abstrato e sim como um universal atingido historicamente,

    conquis tado nas sociedades capitalistas em que estaria se espalhando desde

    meados do sculo XIX um processo de socializao da poltica, fruto da dimi

    nuio da jornada de trabalho e das conquistas de direitos polticos e sociais

    decorrentes das lutas da classe trabalhadora. Partindo de certas observaes de

    Lenin e de Marx e extraindo delas valor metodolgico geral, Carlos Nelson con

    sidera insupervel a forma democrtica de governo, assim como o mecanismo

    de representao que est na base da verso moderna desta forma poltica (cf.

    Coutinho,1980, pp. 2125).

    Em terceiro lugar: sobre o Brasil, Carlos Nelson considera que a via prussia-

    na a que aludimos acima (um prussianismo brasileiro) teria garantido a mo

    dernizao capitalista nesta formao econmicosocial, inferindo da que o de

    senvolvimento capitalista brasileiro teria, mesmo sob forma poltica autocrtica,

    gerado as condies objetivas para a socializao da poltica e, com ela, o surgi

    mento de uma movimentada sociedade civil, expressa naquele momento hist

    rico na reentrada na cena poltica brasileira da classe trabalhadora.

    Da, em quarto lugar, o autor conclui que a luta socialista no Brasil dos

    anos 80 deverseia dar atravs da luta pela constituio de uma democracia de

    massas, surgida da articulao entre as formas de representao tradicionais e

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    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    A estratgia democrtica e popular e um inventrio da esquerda revolucionria

    os organismos de democracia direta (Coutinho, 1980, p. 29), baseada numa

    socializao da participao poltica que poria a necessidade de socializar

    tambm os meios e os processos de governar o conjunto da vida social (Couti

    nho, 1980, p. 27). A ampliao da democracia seria, assim, o caminho para o

    socialismo.

    Isto posto, passemos ao prximo item, onde procederemos a uma avalia

    o crtica de certos pressupostos que esto na base do raciocnio apresentado.

    6) Estado e questo democrtica: um balano preliminar

    Lanando um olhar mais geral sobre o caminho percorrido at agora, po

    demos ver que existe uma convergncia dos autores com relao aos elementos

    estruturais da formao social brasileira: a forma dependente de desenvolvi

    mento do capitalismo brasileiro teria levado a uma dominao sem hegemonia

    (Carlos Nelson) ou a uma autocracia burguesa (Florestan) e a crise da ditadura

    teria aberto um novo ciclo. Para Coutinho, teria havido uma alterao na correla

    o de foras, expressa na consolidao de uma sociedade civil forte e na oci

    dentalizao do Brasil, levando ampliao do Estado que agora poderia ser

    disputado. Neste contexto, reformas radicais poderiam gradualmente produzir

    mudanas estruturais.

    Outro elemento comum a trs dos autores examinados (excetuandose

    Marini) que estas mudanas poderiam acontecer atravs da presso de foras

    sociais por dentro do Estado. Para Caio Prado, por exemplo, seriam as foras po

    pulares que pautariam suas demandas por meio do Estado, levando a um desen

    volvimento sustentvel e de carter nacional que permitiria superar as barreiras

    advindas de uma produo regida pela propriedade privada e uma economia de

    mercado.

    Aparece, como base para esta posio, a impossibilidade da revoluo so

    cialista e a necessidade de uma mediao prvia. Para Caio Prado, a organizao

    das demandas populares levaria a um desenvolvimento sustentvel e nacional

    orientando a ao do Estado; j para Florestan e Carlos Nelson, aquela mesma

    organizao permitiria articular um programa anticapitalista, antimonopolista e

    antilatifundirio que, para o primeiro, ao se chocar com a impermeabilidade do

    Estado autocrtico, levaria a uma ruptura, e, para o segundo, levaria a um con

    junto de reformas que, junto com a participao nas eleies, permitiria acumu

    lar foras para superar o capitalismo.

    Vejamos: parece haver uma expectativa de que a ocidentalizao do Bra

    sil e a entrada em cena do proletariado nos anos 70 abririam a possibilidade de

    reverter o carter autocrtico do Estado brasileiro e que a luta pela ampliao da

    democracia corresponderia a um acmulo de foras para superar a ordem capi

    talista. Parecenos que esta leitura est embasada numa particular concepo de

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    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    Caio Martins; Fernando Prado; Isabel Figueiredo; Stefano Motta; Victor Souza

    Estado, de democracia, de acmulo de foras e de hegemonia que preciso pro

    blematizar. Passemos, portanto, a esta problematizao.

    Antes do capitalismo no existe separao entre Estado e sociedade civil

    entre o Estado poltico, o da Constituio, e o Estado no poltico, o da sociedade

    civil, o da vida real do povo. Ao momento em que os seres humanos j no so s

    produtores de valores de uso, mas tambm de valor momento em que perdem

    o controle de suas vidas frente ao fetiche da mercadoria , corresponde o mo

    mento em que o povo se torna cidado, cuja vida tambm fica regulada por algo

    externo, a constituio. Os seres humanos, portanto, se alienam, j que ficam

    regulados, por um lado, pelo movimento das mercadorias e, por outro, pela

    Constituio do Estado abstrato (Marx, 2010, p. 51). Dessa forma, a legalidade

    prpria do mundo das mercadorias assume o controle impessoal sobre a vida

    das pessoas.

    Para a correta localizao deste problema, a obra juvenil de Marx tem uma

    grande relevncia, pois j aparecem dois elementos fundamentais da sua teoria

    do Estado que permanecero: a diferena entre o contedo e a forma do Estado,

    em que o contedo est associado com a defesa da propriedade privada; e o ca

    rter alienante, religioso, do Estado e da constituio, que expresso de uma

    alienao que acontece na vida real dos homens.

    Esses dois elementoschave na teoria do Estado marxiana denotam uma

    interpretao do Estado burgus no apenas como instrumento de coero de

    uma classe sobre outra, mas tambm como instrumento de convencimento,

    dada a funo ideolgica que expressa a partir da defesa de uma liberdade e uma

    igualdade abstratas que correspondem igualdade e liberdade, enquanto pro

    prietrios de mercadorias, da troca de equivalentes. O Estado no precisa impor

    pela fora a adeso liberdade e igualdade abstratas, j que essas so aceitas

    como algo natural pelo indivduo produtor de mercadorias. Cada componente

    singular do ser social vivencia de forma permanente e necessria no seu cotidia

    no a realizao dessa liberdade e dessa igualdade atravs da troca de mercado

    rias portadoras de valores equivalentes fora de trabalho para uns, capital para

    outros.

    essa a interpretao da construo terica de Marx a respeito do Estado

    que nos parece mais fiel a seu pensamento e, mais importante que isso, fiel ao

    prprio movimento do real. Dito de outra forma: o que acabamos de expor con-

    tradiz a tese de que em Marx haveria uma teoria restrita do Estado, que seria

    entendido como mero comit executivo dos negcios da burguesia e instru

    mento de coero.

    A dimenso ideolgica e de convencimento do Estado burgus fruto das

    relaes sociais de produo sobre as quais ele se ergue, sendo insuprimvel de

    sua prpria essncia. A divergncia em relao a este ponto nos parece o elemen

    to central da confuso e da tergiversao em torno de uma categoria de anlise

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    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    A estratgia democrtica e popular e um inventrio da esquerda revolucionria

    gramsciana, a de hegemonia, por muitos intrpretes do pensador italiano

    dentre eles, os eurocomunistas. De acordo com estes, a hegemonia ficaria mais

    restringida a uma direo moral e cultural da sociedade a partir da formao do

    consenso e da disputa de ideias e valores, desprezando o contedo material dela,

    ou seja, o convencimento dos trabalhadores produzido diariamente a partir da

    posio subordinada que esses ocupam nas relaes materiais de produo.

    Gramsci afirmava, em Americanismo e Fordismo, que a hegemonia nasce

    no cho da fbrica. Para o comunista sardo, hegemonia no s o conven

    cimento exercido pela burguesia atravs de seus aparelhos privados de hege

    monia, mas ser o carter educador da prpria sociedade burguesa e do capi

    tal, ou seja, o convencimento do ser social que vive de forma permanente relaes

    capitalistas de produo. A interpretao equvoca a nosso juzo do conceito

    de hegemonia por parte dos eurocomunistas implica desconsiderar tambm a

    necessidade de construir uma contrahegemonia (embora esse no seja um ter

    mo usado diretamente por Gramsci) a partir da socializao dos meios de produ

    o. As ideias em disputa no pairam no ar, mas so expresso de correlaes de

    fora entre as classes em luta, e das experincias vividas cotidianamente por es

    tas mesmas classes.

    Entendemos, assim, que acreditar que a disputa do Estado burgus ou dos

    aparelhos privados de hegemonia burguesa corresponda necessariamente a um

    avano da hegemonia dos trabalhadores um erro. Gramsci no desperta ne

    nhuma iluso sobre a mera participao do partido no interior do Estado bur

    gus, pois sabe que a disputa da hegemonia no se d nos espaos dentro desse

    Estado, mas nos espaos independentes deste e com autonomia histrica (ou

    seja, com projeto de classe). Passemos a palavra ao disputado autor:

    As organizaes revolucionrias (o partido poltico e o sindicato pro

    fis sional) nasceram na esfera da liberdade poltica, no campo da de

    mocracia burguesa, como afirmao e desenvolvimento da liberdade

    e da democracia burguesas, (...): o processo revolucionrio se desen

    rola no campo da produo, na fbrica, onde as relaes so de opres

    sor a oprimido, de explorador a explorado, onde no existe liberda

    de para o operrio, onde no existe democracia (...) (Gramsci, 1955,

    p. 124. Il Consiglio di fabbrica).

    Poltica e economia constituem uma unidade inseparvel e a construo

    do poder da classe trabalhadora, desse novo poder, como prefigurao do novo

    Estado em germe j no capitalismo, requer a confrontao com o poder burgus,

    na fbrica, lugar onde a burguesia funda seu poder como classe, e onde se pode

    construir sua autonomia histrica enquanto classe. Os gramscianos que conce

    bem hegemonia como sinnimo de consenso relegam a caracterizao da cita

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    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    Caio Martins; Fernando Prado; Isabel Figueiredo; Stefano Motta; Victor Souza

    o anterior ao perodo prcarcerrio de Gramsci, argumentando uma supera

    o dessa viso nos Cadernos do Crcere, uma vez que a ele introduz a diferena

    entre sociedades ocidentais e orientais: no Oriente o Estado era tudo, a socie

    dade civil era primordial e gelatinosa... No Ocidente o Estado s uma trincheira

    avanada, atrs da qual est uma robusta cadeia de fortalezas e casamatas

    (Gramsci, 2001, p. 866, Quaderno 7 16); isto leva estes intrpretes de Gramsci a

    concluir que a guerra de movimento, de uso da violncia para o assalto ao poder

    adequada para o Oriente, deveria ser substituda no Ocidente pela guerra de po

    sio, a ocupao das trincheiras avanadas na sociedade civil. Entretanto,

    Gramsci no descarta a necessidade do uso da fora para aniquilar os adversrios,

    mas alerta para o fato de que o uso da fora, nas sociedades ocidentais, no

    suficiente; preciso tambm a formao de uma vontade coletiva nacional po

    pular e de uma reforma intelectual e moral das quais o partido, ou o moderno

    prncipe, ser o principal impulsionador e organizador (Gramsci, 2001, pp. 952

    953, Quaderno 8 21). Entretanto, isso no significa que a conquista da hegemo

    nia no Ocidente se d exclusivamente no campo das ideias ou da conquista do

    consenso, pois uma reforma moral no pode estar desvinculada de uma luta no

    terreno econmico. o prprio Gramsci quem chama ateno o fato de que o

    programa de reforma econmica o modo concreto atravs do qual se apresenta

    cada reforma intelectual e moral (Gramsci, 2001, p. 953, Q 8 21).

    Para romper com o domnio e a hegemonia burguesa no ser suficiente

    disputar as ideias, as concepes de mundo, os valores, as instituies do Estado,

    mas ser preciso disputar tambm o poder burgus, poder que se materializa e

    consolida nas relaes de propriedade e no controle e direo do processo de

    produo. A hegemonia, ento, alm de no poder prescindir do uso da fora,

    tambm no pode prescindir da dominao econmica, que acaba sendo tam

    bm outro tipo de fora, uma fora material e constante.

    A ideia de que a luta pela democracia, no contexto de ocidentalizao do

    Brasil, corresponderia a um acmulo de foras para superar a ordem capitalista

    vem mostrando seus limites. No Brasil, houve um processo de socializao da

    poltica: os trabalhadores construram suas prprias organizaes, incorporan

    do e organizando milhes de pessoas na vida poltica, e articulando organis

    mos de democracia direta (CUT, MST, etc.) e indireta, ou institucional (PT), le

    vando este partido ao governo. A pergunta que nos cabe fazer : esse processo

    levou a uma conquista de hegemonia por parte dos trabalhadores?

    Pelo contrrio: produziu um dos momentos mais contrarrevolucionrios e

    de maior apassivamento da classe trabalhadora na histria desse pas. Os sujei

    tos coletivos da classe trabalhadora organizaram grandes massas e criaram v

    rias instncias de participao (s para dar alguns exemplos: os metalrgicos da

    CUT de So Bernardo tm hoje 89 comisses de fbrica, o PT desenvolveu a ex

    perincia dos oramentos participativos, criou o setor de mulheres, de negros,

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    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    A estratgia democrtica e popular e um inventrio da esquerda revolucionria

    na rea da sade foram criados os Conselhos de Sade, assim como em diversas

    categorias profissionais se criaram espaos de participao, de consulta, fruto de

    reivindicaes dos diferentes setores da classe trabalhadora). Entretanto, esse

    processo de socializao da poltica vem cumprindo uma funo de despoliti

    zao da poltica e da vida social em geral.

    Podemos nos perguntar o que significou, concreta e historicamente, a so

    cializao da poltica. Tudo nos leva a crer que consiste na ampla participao

    de todas as classes em diferentes espaos, no apenas da produo, mas tambm

    da distribuio, consumo, fiscalizao etc. Mas se podemos afirmar que se trata

    de uma efetiva socializao da poltica, preciso deixar explcito que seu objetivo

    controlar, gerir, decidir sobre a alocao de recursos necessrios para a re

    produo capitalista, administrando democraticamente os conflitos de interesse

    entre as classes antagnicas. por isso que precisamente quando estes espaos

    democrticos funcionam perfeitamente que eles funcionam para a reproduo

    da ordem e no para o seu enfrentamento. O pressuposto da democracia prole

    tria a eliminao das condies de dominao do proletariado; sem isso no

    h socializao do poder poltico.

    7) Concluses de um trabalho em andamento: hipteses em movimento

    Estas concluses vo em sentido um pouco diferente do que se espera nor

    malmente de um artigo acadmico. Isto porque a pesquisa que realizamos con

    juntamente, em permanente interlocuo at aqui, mais do que nos permitir

    encontrar todas as respostas que buscamos, antes de tudo nos permitiu colocar

    perguntas que nos parecem interessantes e pertinentes, hipteses de trabalho para

    continuar no sentido de contribuir para uma autoavaliao da esquerda brasilei

    ra, que julgamos necessria no momento atual. Seguem ento nossas conclu

    ses em forma de hipteses:

    1. Vivemos hoje o encerramento de um ciclo histrico, o ciclo do Partido dos

    Trabalhadores e de sua estratgia: a Estratgia Democrtica e Popular.

    2. A lgica interna desta Estratgia, sua tenso permanente entre acmulo de

    foras e ruptura, tende a constrangla nos marcos da ordem burguesa. Isto

    nos leva a afirmar que a Estratgia Democrtica e Popular foi plenamente

    desenvolvida nos trs sucessivos governos do Partido dos Trabalhadores. A

    expresso mais clara de seu esgotamento deuse nas manifestaes de Ju

    nho de 2013, ou jornadas de junho.

    3. A Estratgia Democrtica e Popular, portanto, no foi abandonada, nem

    trada, nem rebaixada: ela foi realizada em condies para as quais suas

    contradies internas apontavam. Para articulao entre a hiptese ante

    rior, a presente hiptese a seguinte: fazse indispensvel o debate sobre o

    carter do Estado e suas formas de expresso no caso em questo, o deba

    te sobre a democracia.

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    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    Caio Martins; Fernando Prado; Isabel Figueiredo; Stefano Motta; Victor Souza

    4. A realizao desta Estratgia parece ter passado pela constituio do que

    Florestan Fernandes chamou de uma democracia de cooptao (restrita)

    no Brasil e passou pelo processo de transformismo como apontado por

    Gramsci do Partido dos Trabalhadores e de boa parte das direes dos

    movimentos sociais da classe trabalhadora.

    5. Neste contexto, a pequena burguesia poltica passou a ser operadora do

    projeto poltico dos sucessivos governos petistas, apontando para a modi

    ficao de seu carter de classe.

    6. A Estratgia Democrtica e Popular guarda elementos de ruptura e conti

    nuidade com a Estratgia Nacional e Democrtica. A estratgia socialista se

    ria uma maneira de superar o impasse posto pelas estratgias baseadas em

    acmulos de fora e etapas ambas prisioneiras do mesmo pressuposto,

    a imaturidade da sociedade brasileira para a transio socialista. Neste sen

    tido, o inventrio dos autores da teoria marxista da dependncia pode ajudar

    a lanar luz sobre essa controvrsia perene, uma vez que assinala essa mes

    ma discusso no perodo de transio entre esses dois ciclos estratgicos.

    7. A permanente tenso entre permanentismo e etapismo nos ciclos his

    tricos correspondentes s estratgias socialistas para revoluo no Brasil

    pode ser avaliada em um novo patamar: a partir do encerramento destes

    dois ciclos possvel recolocar, em outra qualidade, a discusso sobre os

    desafios revoluo permanente.

    8. Afirmar o encerramento de um ciclo no significa necessariamente afirmar

    o fim de certos partidos, a ascenso de outros ou o esgotamento de certo

    padro de desenvolvimento, estagnao econmica etc. A ideia de encer

    ramento de um ciclo aplicase to somente ao encerramento das possibili-

    dades revolucionrias contidas em tal ou qual projeto poltico no caso do

    presente trabalho, nos referimos ao esgotamento das possibilidades

    revolucionrias contidas nos projetos nacional e democrtico (formulado

    pelo PCB em certo momento de sua atuao, tendo sido posteriormente

    reavaliado e considera do historicamente supe rado por este partido) e de-

    mocrtico e popular (formulado pelo PT em certo momento e ainda reivin

    dicado por este partido, numa disputa ainda em curso em torno de qual

    seria o sentido deste projeto).

    9. O encerramento de um ciclo no um momento definido, com data e

    hora marcada para ocorrer. Desenrolase antes num lapso temporal, po

    dendo se arrastar por meses, anos ou mesmo dcadas. Vale lembrar: na his

    tria, o velho no termina nunca de morrer enquanto no nasce o novo. E

    mesmo ento, elementos de um podem permanecer como momentos su

    perados no outro.

    10. Os caminhos e descaminhos da histria brasileira j demonstraram que a

    democratizao neste pas no atingiu e nem atingir os padres de

  • 380

    Marx e o Marxismo v.2, n.3, ago/dez 2014

    A estratgia democrtica e popular e um inventrio da esquerda revolucionria

    bemestar de suas congneres europeias, as democracias de cooptao

    pra valer. Na verdade, em tempos de declnio do compromisso fordista (cf.

    Bihr, 1991), a tendncia a contrria: que aquelas regridam em direo a

    algo um pouco mais prximo do padro autocrtico mais aberto. Tratase

    do que Paulo Arantes (2004) chamou de a brasilianizao dos centros ca

    pitalistas mais desenvolvidos, sugerindo ironicamente que mudou o senti

    do em que o Brasil pode ser hoje considerado o pas do futuro: o pas se

    tornou, agora, uma espcie de futuro possvel para os pases centrais em

    tempos de regresso social generalizada.

    11. Neste contexto, apresentase, mais claramente que nunca, a necessidade

    de realizar o esforo de superar as posies polticas de esquerda que apos

    taram na noatualidade da transformao socialista.

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