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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS I FERNANDA LÍCIA DE SANTANA BARROS DESAFIOS E POSSIBILIDADES DO ENSINO DA CULTURA AFRO- BRASILEIRA NO ESPAÇO ESCOLAR: O USO DA PASTA DE TEXTOS Salvador 2010

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS I

FERNANDA LÍCIA DE SANTANA BARROS

DESAFIOS E POSSIBILIDADES DO ENSINO DA CULTURA AFRO-BRASILEIRA NO ESPAÇO ESCOLAR: O USO DA PASTA DE TEXTOS

Salvador 2010

FERNANDA LÍCIA DE SANTANA BARROS

DESAFIOS E POSSIBILIDADES DO ENSINO DA CULTURA AFRO-BRASILEIRA NO ESPAÇO ESCOLAR: O USO DA PASTA DE TEXTOS

Monografia apresentada como requisito parcial à obtenção da graduação em Pedagogia com Habilitação em Anos Iniciais, apresentado ao Departamento de Educação Campus I da Universidade do Estado da Bahia, sob orientação da professora Claudia Silva de Santana.

Salvador 2010

FICHA CATALOGRÁFICA: Sistema de Bibliotecas da UNEB

Barros, Fernanda Lícia de Santana Desafios e possibilidades do ensino da cultura afro-brasileira no espaço escolar : o uso da pasta de textos / Fernanda Lícia de Santana Barros . – Salvador, 2010. 63f. Orientadora: Profª. Claudia Silva Santana.. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) – Universidade do Estado da Bahia. Departamento de Educação. Colegiado de Pedagogia. Campus I. 2010. Contém referências, apêndices e anexos. 1. Educação - Brasil. 2. Cultura afro-brasileira - Estudo e ensino. 3. Educação e estado - Brasil. I. Santana, Claudia Silva. II. Universidade do Estado da Bahia, Departamento de Educação. CDD: 370.19342

FERNANDA LÍCIA DE SANTANA BARROS

DESAFIOS E POSSIBILIDADES DO ENSINO DA CULTURA AFRO-BRASILEIRA NO ESPAÇO ESCOLAR: O USO DA PASTA DE TEXTOS

Monografia apresentada ao Curso de graduação em Pedagogia da Universidade do Estado da Bahia, como requisito parcial para obtenção do grau de Pedagogia Anos Iniciais, sob orientação da professora Claudia Silva de Santana.

Salvador, _____ de ________________ de 200___.

____________________________________

Profª. Claudia Silva de Santana (Orientadora)

____________________________________

Profª. Adelaide Rocha Badaró

____________________________________

Profº. Silvio Fonseca Dortas

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por mais uma conquista, e a todos que direta ou indiretamente

contribuíram nesta minha caminhada. A minha família pelo apoio nesta trajetória e

nos momentos necessários. As professoras Claudia e Adelaíde pela disponibilidade

e atenção. Ao professor Sílvio pelo carinho e atenção nesta caminhada. Aos

professores e gestores das escolas municipais que colaboraram com a pesquisa.

Conhecer é tarefa de sujeitos, não de objetos. E é como sujeito e somente enquanto sujeito, que o homem pode realmente conhecer.

Paulo Freire

RESUMO Este trabalho tem como tema Os desafios e possibilidades do ensino da cultura afro-brasileira no espaço escolar. Foi levantado o seguinte problema: Quais os desafios e possibilidades encontrados pelo professor no uso da Pasta de Texto e no ensino da cultura africana e afro-brasileira, aplicação da Lei 10.639/03 nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental na Rede Municipal de Ensino de Salvador. A pesquisa com a temática em questão é qualitativa, bibliográfica e documental na qual trabalha com descrições e interpretações, onde o campo de observação foi Escolas da Rede Municipal de Ensino na cidade de Salvador. Pesquisar o assunto é fundamental para compreender como se dão as relações raciais no interior da escola, visto que este espaço é lócus de relações sociais que estruturam e marcam o processo de socialização da criança. Palavras-Chave: Cultura. Africana. Afro-brasileira. Lei 10.639/03. Pasta de Textos.

ABSTRACT

This work has as its theme the challenges and opportunities of teaching african-Brazilian culture in school. He was raised the following issue: What are the challenges and opportunities encountered by teachers in the use of paste text and teaching of African culture and african-Brazilian implementation of Law 10.639/03 the first years of primary education in municipal schools in Salvador . The research on the subject in question is qualitative, literature and documents on which he works with descriptions and interpretations, where the field of observation was of the Municipal Schools of Education in the city of Salvador. Find the subject is essential to understand how to race relations within schools, since this space is the locus of social relations that structure and mark the process of child socialization Key-words: Culture. African. African-Brazilian. Law 10.639/03. Paste Text.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO..............................................................................................................08

2 O ENSINO AFRO-BRASILEIRO...............................................................................10

2.1 Cultura afro-brasileira no espaço escolar: aplicação da Lei 10.639/03 e sua complementação de Lei 11.645/08............................................................................13 2.2 O livro didático: carência da temática africana e afro-brasileira...........................21 3.0 EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS E PARA O ENSINO DA HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA NA EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL: A PASTA DE TEXTO PARA SUPORTE AO PROFESSOR DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO................................................................................25 3.1 Formação continuada de professores para a aplicação da Lei 10.639/03 e sua complementação 11.645/08: uma necessidade para a aplicabilidade.......................33 4 O QUE DIZEM OS PROFESSORES SOBRE O USO DA PASTA DE TEXTO E APLICAÇÃO DA LEI. 10.639/03...............................................................................37 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................45

REFERÊNCIAS.........................................................................................................47 APÊNDICES..............................................................................................................50 ANEXOS..................................................................................................................52

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como tema Os desafios e possibilidades do ensino da

cultura afro-brasileira no espaço escolar, sendo dado enfoque na perspectiva

contemporânea, temática necessária na atualidade para refletir e pesquisar a

importante contribuição da cultura afro-brasileira para a construção e formação

da população brasileira.

A proposta da educação étnica racial estabelecida pela Lei 10.639/03, alterou

a Lei de Diretrizes e Bases - LDB e passou a exigir que as escolas brasileiras de

ensino Fundamental e Médio incluíssem no currículo o ensino da história e

cultura afro-brasileira. Esta Lei inserida no currículo escolar traz uma nova

abordagem a temática, pois se propõe investigar fatos que não foram contados e

sim negados, vistos apenas sob uma ótica eurocêntrica. Frente a essas

questões, cabe ao professor a busca e a promoção de transformação na

educação, principalmente rompendo com os velhos paradigmas existentes.

Neste trabalho será levantado o seguinte problema: Quais os desafios e

possibilidades encontrados pelo professor no uso da Pasta de Textos e no

ensino da cultura africana e afro-brasileira nos Anos Iniciais do Ensino

Fundamental na Rede Municipal de Ensino de Salvador?

Procurando discutir as dificuldades encontradas pelos professores que não

aplicam a lei em suas aulas, como também identificar como essa vem sendo

introduzida no currículo pelos professores que aplicam as Leis, pois este trabalho

tem como objetivo geral analisar a utilização do material didático oferecido pelo

município aos professores Pasta de Textos.

A pesquisa com a temática em questão é qualitativa, bibliográfica e

documental na qual trabalha com descrições e interpretações, onde o campo de

observação foram duas Escolas da Rede Municipal de Ensino na cidade de

Salvador. Pesquisar o assunto é fundamental para compreender como se dão as

relações raciais no interior da escola, visto que este espaço é lócus de relações

sociais que estruturam e marcam o processo de socialização da criança.

O trabalho está dividido em três capítulos: no primeiro foram levantados

alguns conceitos importantes segundos teóricos como Stuart Hall, Vera Candau,

Roque de Barros Laraia, Eliane Cavalleiro e outros de fundamental importância

na área em estudo. No segundo capitulo é feita a análise da Pasta de Textos a

qual aborda a temática cultura africana e afro-brasileira na perspectiva da Lei

10.639/03. Neste capítulo são apresentadas as propostas de cada um dos nove

textos e seus respectivos autores. No terceiro capitulo são discutidas a

metodologia do trabalho desenvolvido, as pesquisas de campo que foram

realizadas nas Escolas Municipais: A (situada no bairro do cabula) e B (situada

no bairro de Cajazeiras) onde os professores relataram seus pontos de vistas

sobre os desafios e possibilidades do uso da Pasta de Textos e aplicação da Lei

10.639/03.

Sendo a pesquisa uma atividade teórica de conhecimento,

fundamentação, investigação, diálogo e interação com a realidade, pretendeu-se

com este trabalho discutir os desafios e as possibilidades do uso da Pasta Textos e aplicação da Lei 10.639/03 nas Escolas da Rede Municipal de Ensino

de Salvador, ouvindo as inquietações dos professores sobre a sua realidade, os

quais são desafiados a cada mudança e alteração nas leis deste país.

2. O ENSINO AFRO-BRASILEIRO

Neste capitulo é abordado em que consiste o ensino afro-brasileiro, a posição

de alguns teóricos sobre o referido assunto e a necessidade da cultura afro-

brasileira no espaço escolar, ressaltando as alterações atuais da Lei de Diretrizes e

Bases da Educação - LDB . Como o ensino afro-brasileiro, o currículo da escola

devem propor uma abordagem em prol da formação e afirmação de identidades

abertas a pluralidade cultural, desafiadoras de preconceitos, numa perspectiva de

educação para a cidadania.

O ensino é uma forma sistemática, utilizada pelo homem para instruir seus

semelhantes, em locais denominado escola. Para Libâneo (2002), o ensino pode

ser dividido em três modalidades: o ensino formal, o ensino informal e o ensino não-

formal. O ensino formal é aquele praticado pelas instituições de ensino, com

respaldo de conteúdo, forma, certificação, profissionais de ensino. O ensino informal

está relacionado ao processo de socialização do homem. Ocorre durante toda a

vida, muitas vezes até mesmo de forma não intencional. O ensino não-formal, por

sua vez, é intencional. Em geral é aquele relacionado aos processos de

desenvolvimento de consciência política e relações sociais de poder entre os

cidadãos, praticadas por movimentos populares.

O ensino deve atender as necessidades culturais e sociais, pois a escola do

século XXI necessita organizar seu Projeto Político Pedagógico, na intenção de

desenvolver um currículo de forma integrada, flexível de maneira que os conteúdos,

mesmo que ainda organizados em disciplinas, ou não, sejam abordados por temas

nas mesmas. Por sua vez, deve-se mantê-las articuladas com a intenção de que os

saberes construídos pelas crianças venham a ajudá-los na análise, interpretação,

compreensão e problematização dos fatos e dos fenômenos da realidade complexa

em que vivem. Desse modo, o professor se vê diante de diferentes desafios, entre

os quais, o de encontrar o meio termo entre o desafio à lógica disciplinar e a

sistematização dos conteúdos.

A Lei nº 10.639/03, de 2003 que torna obrigatório o ensino da cultura afro-

brasileira e africana , e sua complementação a Lei nº 11.645/08 que inclui a cultura

indígena, alterou a LDB e passou a exigir que as escolas brasileiras de ensino

fundamental e médio incluíssem no currículo o ensino da história e cultura afro-

brasileira e indígena foi um importante passo para o fomento da pluralidade no

espaço escolar. Um dos aspectos positivos da Lei é o de ter aberto espaço para que

o negro e indígena, fossem incluídos nas propostas curriculares como sujeitos

históricos.

Nessa nova proposta educacional, com a implementação da Lei, será preciso

rever o saber escolar e também investir na formação do educador, possibilitando-lhe

uma formação teórica diferenciada da eurocêntrica. Segundo Rocha (1994),

Etnocentrismo é uma visão do mundo onde o nosso próprio grupo é tomado como

centro de tudo e todos os outros são pensados e sentidos através dos nossos

valores, nossos modelos, nossas definições do que é a existência. Dessa forma, o

currículo escolar até hoje visto, deverá ser revisado, e a escola necessita mostrar

aos alunos que existem outras culturas. Sendo assim a escola terá o dever de

dialogar com tais culturas e reconhecer o pluralismo cultural brasileiro.

Segundo Munanga (2000), a identidade é para os indivíduos a fonte de

sentidos e de experiência. Toda identidade exige reconhecimento, caso contrário ela

poderá sofrer prejuízos se for vista de modo limitado ou depreciativo.

Para Hall (2006), no mundo moderno, as culturas nacionais em que

nascemos se constituem em uma das principais fontes de identidade cultural. Numa

abordagem antropológica, a identidade é uma construção que se faz com atributos

culturais, isto é, ela se caracteriza pelo conjunto de elementos culturais adquiridos

pelo indivíduo através da herança cultural. A identidade confere diferenças aos

grupos humanos. Ela se evidencia em termos da consciência da diferença e do

contraste do outro.

O cotidiano escolar está impregnado do mito da democracia racial, um dos

aspectos da cultura da classe dominante que a escola transmite, pois representa as

classes privilegiadas e não a totalidade da população, embora haja contradições no

interior da escola que possibilitam problematizar essa cultura hegemônica, não

desprezando as diversidades culturais trazidas pelos alunos. Assim, apesar da

escola inculcar o saber dominante, essa educação problematizadora poderia e pode

tornar mais evidente a cultura popular no interior escolar.

A proposta de uma educação voltada para a diversidade coloca a todos nós,

educadores, o grande desafio de estarmos atentos às diferenças econômicas,

sociais e raciais e de buscar o domínio de um saber crítico que permita interpretá-

las. Nesta proposta educacional, será preciso rever o saber escolar e também

investir na formação do educador, possibilitando-lhe uma formação teórica

diferenciada da eurocêntrica.

E o ponto de partida é repensar as práticas pedagógicas e curriculares,

levando em consideração a pluralidade cultural. Nesse sentido ressalta Candau

(2002):

A inclusão do tema pluralidade cultural no processo educacional procura favorecer a mudança de mentalidades, superar o preconceito e combater atitudes discriminatórias. Estas são as finalidades que envolvem lidar com valores de reconhecimento e respeito mútuo, o que é tarefa da sociedade como um todo. Nesse processo se afirma que a escola tem um papel central no combate à discriminação, na divulgação das contribuições das diferentes culturas e na eliminação dos conceitos preconceituosos a respeito dos grupos e povos que conformam o Brasil (CANDAU, 2002, p. 138).

Embora seja um desafio uma escola igualitária, é possível a construção de

uma escola que reconheça que os alunos são diferentes, que possuem uma cultura

diversa e que repense o currículo, a partir da realidade existente dentro de uma

lógica de igualdade e de direitos sociais. Assim, pode-se perceber que a exclusão

escolar não está relacionada somente com o fator econômico e social, como

também relacionada à sua origem étnica. Contudo enfatiza Laraia (2000):

Cada sistema cultural está sempre em mudança. Entender está dinâmica é importante para atenuar o choque entre as gerações e evitar comportamentos preconceituosos. Da mesma forma que é fundamental para a humanidade a compreensão das diferenças entre povos de culturas diferentes, é necessário saber entender as diferenças que ocorrem dentro do mesmo sistema. Este é o único procedimento que prepara o homem para

enfrentar serenamente este constante e admirável mundo novo do porvir (LARAIA, 2000.p.105).

Nesta perspectiva é intrigante e preocupante que até meados do século XX a

África era vista nas escolas como país e não como um continente. Hoje, é possível

perceber uma historiografia e antropologia sobre a África diferente, porém ainda

carente, precisando ser levadas a sério e principalmente para dentro da escola,

reconhecidas e tratadas de maneira crítica, abrindo possibilidades para que os

preconceitos passem a ser questionados e o espaço escolar passe a ser um local de

conhecer a história e raízes culturais até então negadas e omitidas.

2.1 Cultura afro-brasileira no espaço escolar: aplicação da Lei 10.639/03 e sua complementação Lei 11.645/08.

Neste século, estamos diante de questões paradoxais, a intolerância vem

gerando uma série de infortúnios, mas ao mesmo tempo gerando reações, como

ações afirmativas, e o processo de inclusão. Os ataques às religiões de matrizes

africanas, como por exemplo, o candomblé ocorre porque nas escolas que é o berço

ou a semente das futuras gerações, não têm em seus currículos disciplinas que

trabalhem com a diversidade cultural.

E quando acontece de trabalhar a diversidade cultural, o próprio livro didático

reproduz a religiosidade de matrizes africanas com estereótipos negativos, o que

incita mais ainda e contribui para essa segregação que há ainda hoje. Com isso

deixa espaço para que outras religiões, principalmente as protestantes, continuem a

reproduzir o que a imprensa, os livros didáticos e a própria historiografia se

encarregou de fazer durante anos. Diante deste contexto o educador passa a ter

uma grande missão. Sobre esta questão Candau (2002) destaca que :

A instituição escolar está construída sobre a afirmação da igualdade, enfatizando a base cultural comum a que todos os cidadãos e cidadãs deveriam ter acesso e colaborar na sua permanente construção. Articular igualdade e diferença, a base cultural comum e expressões da pluralidade social, constituem hoje um grande desafio para todos os educadores (CANDAU, 2002, p. 9).

Trabalhar igualmente as diferenças não é uma tarefa fácil para o professor,

porque para lidar com elas é necessário compreender como a diversidade se

manifesta e em que contexto. Portanto, pensar uma educação escolar que integre as

questões étnico-raciais significa progredir na discussão a respeito das

desigualdades sociais, das diferenças raciais e outros níveis e no direito de ser

diferente, ampliando, assim, as propostas curriculares do país, buscando uma

educação mais democrática. Por isso para Laraia (2000) :

Comportamentos etnocêntricos resultam também em apreciações negativas dos padrões culturais de povos diferentes. Práticas de outros sistemas culturais são catalogadas como absurdas deprimentes e imorais (LARAIA, 2000, p.76).

Embora saibamos que seja difícil uma escola igual para todos, é necessário

que seja possível a construção de uma escola que reconheça que os alunos são

diferentes, que possuem uma cultura diversa e que repense o currículo, a partir da

realidade existente dentro de uma lógica de igualdade e de direitos sociais. Assim,

podemos deduzir que a exclusão escolar não está relacionada somente com o fator

econômico, ou seja, por ser um aluno de origem pobre, mas também pela sua

origem étnico-racial.

Os professores têm questionado sobre a obrigatoriedade do ensino da cultura

afro-brasileira e africana no espaço escolar, sob o argumento de não estarem

preparados e não terem formação adequada para tal temática, embora seja verdade

isso não pode servir para justificar a ausência desse tema e contribuir com o silêncio

e omissão do que se propõe a lei. É necessária a busca através das pesquisas,

análises, reflexões, questionamentos, ou seja, uma investigação para que se possa

chegar a um objetivo: a informação que atente para a diversidade.

A diversidade étnico-cultural está presente diariamente no contexto brasileiro,

expressando-se na música, na dança, na culinária, na nossa língua portuguesa e

entre inúmeras atividades em nosso cotidiano. O que se faz necessário lembrar, é

que para tratar destas questões é preciso ir além da constatação, da contemplação

e da folclorização que muitas vezes se faz em torno das diferenças existentes.

E é por essa razão e muitas outras que a escola se defronta com pontos de

tensão entre diversidade e homogeneidade. Precisa pensar na necessária

abordagem e articulação entre educação e a perspectiva multicultural, para que os

educadores possam assumir a responsabilidade de desconstruir às atitudes e

posturas discriminatórias e preconceituosas que persistem na atualidade.

Nos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs, a pluralidade cultural vem

como tema transversal, cabendo ao professor fazer uso destes na escola e não

apenas na disciplina de história e sim em todas as disciplinas de forma indissociável,

ou melhor, interdisciplinar nas variadas áreas do conhecimento. E lembrar que

apesar da pluralidade vir presente nos PCNs como tema transversal, pode e deve

fazer parte do currículo como um todo, nele é possível perceber a vasta discussão

teórica sobre a cultura e sua diversidade, mas por uma lado não possibilita ao

professor formas metodológicas de incluir esse tema no currículo.

No PCN – Pluralidade Cultural deixa evidente a necessidade dessa

abordagem em sala de aula, mas existe um grande desafio do professor em

executá-lo sem cair nas contradições da discussão sobre o problema étnico-racial

brasileiro. Mesmo assim Candau (2000) destaca um dado positivo da inclusão da

pluralidade cultural nos PCNs, que diz:

O fato de ter incluído explicitamente a questão da pluralidade cultural nos PCNs significa uma contribuição relevante, uma iniciativa que pode ser integrada ao conjunto de outras já realizadas ou em processo de desenvolvimento (CANDAU, 2000, p. 138).

Com certeza não é e nem será uma tarefa fácil trabalhar com a cultura afro-

brasileira, africana e indígena, mas um lado positivo do documento é que ele revela

a necessidade da escola valorizar as características culturais dos diferentes grupos

culturais que convivem no território nacional. E mesmo com a ausência de outros

elementos fundamentais para difusão da diversidade no espaço escolar, o

documento é importante para que o professor faça uso dessa ferramenta para

subsidiar outros materiais e até mesmo comparar, analisar os pontos em comuns e

de discordância para sua prática docente.

Sua aplicação prática, no entanto, ainda é uma icógnita para muitos na

comunidade escolar, especialmente para os professores que se quationam: o que

pretende a lei? Como sair da teoria? Como e onde buscar material se não teve

acesso a temática na sua formação como docente?

De fato, muitos professores estão encontrando dificuldades para colocar em

prática a temática na escola, porém desde 2003 quando a lei foi sancionada,

materiais didáticos vem sendo produzidos para a auxiliar didaticamente o professor,

como também cresceram os números de pesquisas, projetos, pós-graduação sobre

o tema, e até mesmo capacitações de professores oferecidas e promovidas pelo

Ministério da Educação, Secretária Estadual de Educação e Secretária Municipal de

Educação . Como por exemplo, o material analisado nesta monografia – Pasta de

Textos, foi elaborado para suprir emergencialmente a falta de material didatico que

venha a servir de subsidio para o professor.

Tem-se precebido tensões na escola frente às abordagens para uma

educação voltada para o pluralidade, tais tensões são frutos de uma má formação

docente, e receio de aceitar o novo. Desfolclorizar a cultura afro-brasileira é uma

passo necessário de ser dado, pois a criança precisa perceber que sua cultura não é

um folclore. E que os profissionais de educação como um todo, não apenas o

professor de história, elaborem propostas currículares atentando para os

conhecimentos filosóficos, antropológicos, históricos, sociológicos, religiosos,

históricos, geográfios e cultuarais.

É sempre bom lembrar que nosso passado recente é bastante trágico e por

demais retratado pela historiografia nos diversos meios de comunicação como

submissos e inferiores, e que nos dias de hoje, reflexo de um passado não muito

distante, a escola ainda pulveriza a cultura com base em uma visão européia. Mas

será que nossa escola, juntamente com seus professores estão preparados para

reverter esse quadro e lidar com tais mudanças? Esse é o momento de romper com

tudo isso, elevar a auto-estima das crianças a se permitir a conhecer o outro e a si

mesmo, sentindo-se valorizada e orgulhosa da história e de seus ancestrais,

reconhecendo a sua identidade.

A repressão simbólica é tão intensa nos dias de hoje, que às vezes, não

percebemos que estamos internalizando um discurso onde só tem valor as

aprendizagens realizadas dentro da escola. Mas será que esqueceram a importância

de trazer a diversidade cultural para dentro do espaço escolar? Tudo que é

aprendido fora é visto com reserva, com desconfiança, marcando a diferença do que

aprendido pelas crianças dentro e fora da escola, onde esta última não da valor as

raízes, memórias e cultura de seu público que se constrói no cotidiano dos atores

sociais, a partir da interação com os signos e instrumentos presentes na sociedade.

A postura ética e crítica do indivíduo abarcam a assimilação e reconstrução

dos conceitos, da cultura e do conhecimento da comunidade social nos quais as

crianças e jovens estão inseridos. A escola deve desenvolver no seu público a

capacidade de expressar e comunicar suas idéias, participar e interpretar as

produções culturais, intervir pelo uso do pensamento lógico, da criatividade e da

análise crítica. E com essas atitudes será possível propiciar no espaço escolar o

crescimento de seus estudantes como cidadão consciente e crítico, como inserção

social, política e compromisso histórico, além do exercício cotidiano dos seus

direitos, deveres, condutas, como uma atitude de respeito às diversidades e

autoconfiança.

Na atualidade fala-se muito no multiculturalismo. E segundo Candau (2002), o

multiculturalismo é um fenômeno que começou a ser discutido em países que

adotam políticas multiculturais. Porém, só recentemente o termo passou a ser

incorporado às pesquisas realizadas no Brasil, sob a influência principalmente dos

estudos culturais.

Embora seja um termo ainda em construção em nosso país, é de grande

importância a dimensão que o multiculturalismo vem tomando na educação. A

educação multicultural vem em auxílio do professor para melhor desempenhar sua

tarefa de abordar sobre a realidade em que os estudantes vivem. Ela valoriza a

perspectiva do aluno, abrindo o sistema escolar e construindo um currículo mais

próximo da sua realidade cultural. Abaixo é possível perceber como Moreira e Silva

(2005) mostra a importância do saber cultural no universo escolar que:

[…] deve enfatizar a importância de tornar o social, o cultural, o político e o econômico os principais aspectos de análise e avaliação da escolarização contemporânea. […] Nesse contexto a vida escolar deve ser conceituada não como um sistema unitário, monolítico e inflexível de regras e relações, mas como uma arena fortificada em que sobejam contestações, luta e resistência. Além disso, a vida escolar pode ser vista como uma pluralidade de discursos e lutas conflitantes, como um terreno móvel onde a cultura-de-sala-de-aula se choca com a cultura-de-esquina, e onde professores, alunos e diretores ratificam, negociam e por vezes rejeitam a forma como as experiências e práticas escolares são nomeadas e concretizadas. (MOREIRA e SILVA, 2005, p. 139).

O professor reflexivo é aquele capaz de entender a realidade social, política e

cultural dos alunos e se identificar com ela. Por isso, ele cria possibilidades para que

as condições emergentes passem por transformações necessárias para uma relação

mais igualitária entre os sujeitos. Inclusive, trabalhar no espaço escolar com a

diversidade e cultura afro-brasileira e africana atentando para enfatizar as

expressões e manifestações artísticas dos negros, situando-a no tempo, expondo o

sentido e o significado dessas manifestações.

Neste contexto, faz-se necessário ressaltar a Lei Nº. 10.639/03, que se

constitui em elemento essencial no processo de construção e reconstrução,

conhecimento e valorização das diferentes perspectivas e compreensões da

sociedade brasileira contemporânea, no sentido de desconstruir as representações

preconceituosas e racistas que tem se configurado nos conteúdos didáticos e no

espaço da escola. A implementação da Lei Federal, nas unidades escolares nos

níveis de ensino fundamental e médio, instituindo a obrigatoriedade do ensino da

História da África e dos africanos bem como, o estudo do processo de efetiva

participação e contribuição do povo negro brasileiro no contexto da história do Brasil,

tem provocado inquietações em nossa sociedade e desde já deve influenciar e fazer

parte no sistema escolar.

Desde que foi estabelecida a obrigatoriedade do ensino de História da África

e da Cultura afro-brasileira e Indígena nas escolas, inúmeras discussões foram

estabelecidas com relação a sua aplicação, mesmo porque, haveria a necessidade

das escolas mudarem seus currículos para contemplarem a Lei. Mas, além da

questão curricular haveria outro impasse que era conhecer o tema, afinal como os

professores que nada ou pouco sabiam sobre a História da África, cultura afro-

brasileira e indígena poderia trabalhar nas unidades de ensino com uma temática

ocultada pela historiografia e que nem eles mesmos tiveram em sua formação?

Com esses questionamentos surgiram muitos trabalhos sobre o assunto e

ocorreram muitas mudanças em nossa sociedade e nas escolas, principalmente na

forma de pensar sobre a temática, sete anos depois de sua implementação ainda

estão sendo discutidas a sua ausência na sala de aula. E porque será que depois de

tanto tempo ainda existe discussão sobre a falta da abordagem no espaço escolar?

Por tudo isso, aposta-se que as possibilidades e perspectivas emanadas por

meio da Lei 10639/03 podem estabelecer novos marcos de reflexão na educação

escolar brasileira. A educação voltada para as relações étnico-raciais e para o

ensino de história e cultura afro-brasileira e africana pode promover a igualdade

étnico-racial/social e a não discriminação das pessoas negras. Assim, num futuro

próximo, os negros poderão participar de forma efetiva em condições de direito e em

condições de igualdade com as outras pessoas, no acesso às universidades, a

cargos e funções em todos os setores na sociedade.

Portanto, um dos argumentos que se reflete no estudo da história africana,

não está no ensino pelo ensino desta história, mas sim na desconstrução das

ideologias racistas brasileiras e do modo equivocado como a África e os africanos

foram vistos ao longo da história. O debate entre a questão da diversidade e da

alteridade e o papel assumido pela escola, em referência ao ensino num contexto

multicultural, tem-se ampliado nos últimos anos em decorrência de novas pesquisas

relacionadas à construção de um currículo e de uma linguagem crítica que

desmistifique visões eurocêntricas do conhecimento escolar. No âmbito das

pesquisas realizadas no Brasil, o multiculturalismo desperta interesse tanto para o

sociólogo quanto para antropólogos e educadores que discutem a construção de um

currículo emancipatório que propicie discussões sobre as diversidades culturais

presentes no espaço escolar.

Para Moreira (2001), é impossível pensar numa educação multicultural sem

que se questione sobre o professor e sua formação. Para que se possa questionar o

modo como a escola tem legitimado certos saberes apagando de seu currículo ou

afastando do seu cotidiano as práticas pertencentes à cultura dos grupos

subalternos é necessário investir, de maneira enfática, numa formação pedagógica

multiculturalmente orientada que resista às tendências homogeneizadoras que

permeiam as políticas educacionais atuais.

O currículo deve abarcar um sistema de valores éticos, hierarquicamente

organizados de acordo com o meio social, que tem como fonte e medida a dignidade

do ser humano, aqui definida pela concretização do valor supremo da justiça, afim

de que tenha um caráter norteador para o educador e emancipador para o

educando. É nessa perspectiva que busca-se aqui refletir sobre o currículo real e o

currículo ideal sob o prisma da inclusão da educação para as relações raciais,

conforme rege a Lei Federal nº 10.639/03 bem como, as Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Educação das Relações Raciais e para o Ensino da História e

Cultura Afro-Brasileira e Africana.

Os professores em sua grande maioria que não tem recursos financeiros nem

incentivos das instituições para buscar material de apoio, contam apenas com livros

didáticos que trás uma abordagem do negro carente de atualizações, onde a

trajetória negra geralmente inicia e termina na escravidão, esquecendo de ressaltar

a importância de negros e índios no processo histórico como sujeito, como por

exemplo, é o caso da Independência da Bahia, uma data importante e que não

aparece nos livros didáticos, fazendo com que a data e os sujeitos deste momento

da História da Bahia fiquem de lado, esquecidos pela população que desconhecem

sua própria historia.

Portanto, um dos argumentos que se reflete no estudo da história africana,

não está no ensino pelo ensino desta história, mas sim na desconstrução das

ideologias racistas brasileiras e do modo equivocado como a África e os africanos

foram vistos ao longo da história. O debate entre a questão da diversidade e da

alteridade e o papel assumido pela escola, em referência ao ensino num contexto

multicultural, tem-se ampliado nos últimos anos em decorrência de novas pesquisas

relacionadas à construção de um currículo e de uma linguagem crítica que

desmistifique visões eurocêntricas do conhecimento escolar. No âmbito das

pesquisas realizadas no Brasil, o multiculturalismo desperta interesse tanto para o

sociólogo quanto para antropólogos e educadores que discutem a construção de um

currículo emancipatório que propicie discussões sobre as diversidades culturais

presentes no espaço escolar.

2.2 O Livro didático: carência da temática africana e afro-brasileira.

Como foi abordado anteriormente, um dos grandes obstáculos do ensino da

cultura afro-brasileira é a carência de materiais de didáticos, mesmo porque os livros

atuais ainda têm a visão do colonizador. Outro fator é falta de professores

preparados e dispostos a quebrar os velhos paradigmas dando um novo rumo à

educação para a promoção da diversidade cultural. É necessário ir além da

escravidão nas aulas de História do Brasil, mesmo porque, é notória como a história

do negro que é contada nos livros didáticos e pela mídia começa e termina em um

mesmo fato: a escravidão.

O livro didático deve atender as novas perspectiva do século XXI, e abordar a

cultura afro-brasileira e africana sem estereótipos negativos. Com isso destaca Bittencourt (1997) que:

[...] é um importante veículo portador de um sistema de valores, de uma ideologia, de uma cultura. Várias pesquisas demonstraram como textos e ilustrações de obras didáticas transmitem estereótipos e valores dos grupos dominantes, generalizando temas, como família, criança, etnia, de acordo com os preceitos da sociedade branca. (BITTENCOURT, 1997, p.72).

Desse modo, é notável o quanto o currículo educacional reproduz as

concepções, os valores e as idéias a partir de uma ideologia que rejeita tudo e

quaisquer que sejam as atitudes que possam representar ameaça para a

manutenção da estrutura vigente. Ou seja, a rejeição da alteridade, na verdade, é do

reconhecimento do outro. Os sujeitos estão influenciados e incorporam as

concepções que marcam violentamente aqueles que se acomodam.

Para os educadores existe um grande desafio na atualidade: o de romper com

os velhos paradigmas da sociedade. A julgar pelos valores enraizados durante todo

processo de constituição da nossa identidade, a transformação de nossas

mentalidades no sentido de buscar instrumentos para contemplar a diversidade em

detrimento da cultura dominante, exige-se um árduo exercício de superação. Porém,

há muitas razões para se considerar a importância de abraçar o desafio de educar

para a diversidade: humanizar as relações sociais torna-se imperativo para uma

convivência de respeito e harmonia entre os povos. Abaixo Silva (1995) destaca a

importância da igualdade de oportunidades:

O mito da democracia racial visa camuflar o racismo e bloquear a organização negra, uma vez que internaliza nos membros da sociedade o engodo da igualdade de oportunidades, reforça o sentimento de inferioridade do negro por não ter “capacidade” de aproveitar tais oportunidades, transferindo mais uma vez para a vitima a culpa da sua situação de miséria e marginalização (SILVA, 1995, p. 34).

As possibilidades e os desafios das políticas inclusivas e compensatórias no

âmbito da educação básica como é o caso da Lei 10.639/03 sua complementação

Lei de nº 11.645/08, no Brasil continuam a sofrer dos mesmos limites e

possibilidades que têm acompanhado a nossa evolução histórica. É necessário que

a comunidade escolar, juntamente com seus alunos, familiares, professores,

gestores, ou seja, todos percebam a força que tem para brigar em favor de uma

escola plural.

A escola se estabelece hoje como um dos principais espaços para a

disseminação e fortalecimento de ideologias racistas, pois a mesma não sabe em

pleno século XXI lidar com as diferenças existentes na sociedade,

conseqüentemente não consegue conceber a idéia do diferente no seu cotidiano, da

mesma forma que essas ações são reforçadas no livro didático tanto da educação

infantil, como dos anos iniciais do ensino fundamental. Desse modo Cavalleiro

(2006) destaca que:

Há uma ausência de preocupação com a convivência multiracial no interior da pré-escola, o que colabora intensamente para a construção de indivíduos preconceituosos e discriminadores. Tal fato leva inúmeras crianças e adolescentes a cristalizarem aprendizagens básicas, muitas vezes, no comportamento acrítico dos adultos a sua volta. (CAVALLEIRO, 2006, p. 227)

Muito antes de ser sancionada a Lei 10.639/03 haviam iniciativas de grupos

isolados na qual adotavam uma pedagogia para a diversidade. Algumas medidas, no

sentido de romper com o despropósito que a educação do branqueamento trouxe

para as relações sociais no Brasil, já eram tomadas em muitas capitais como

Salvador, Belo Horizonte, Teresina, Rio de Janeiro, Porto Alegre e São Paulo. Hoje,

depois de sete anos predomina a resistência que muitos tinham com relação

continente africano e suas diversidades, incluindo a forte relação deste continente

com a formação do povo brasileiro, onde nossas trajetórias e raízes têm muitos

pontos em comuns com a cultura africana, na qual denominamos o nome de cultura

afro-brasileira e africana.

É preciso que essa bandeira chegue à população e que ela possa cobrar por

qualidade e igualdade, decorre daí a impulsão para modelos de gestão mais

transparentes e participativos, na busca de novos recursos e um planejamento

estratégico que consubstancie uma vontade política adequada ao valor proclamado

da educação para todos, com respeito mutuo as diferenças e valorização das raízes

culturais individuais e coletivas.

O livro didático em pleno século XXI, permanece autoritário. “Camufla” o

modo de produção das representações que fornece, a sua relação com os meios

históricos, com as problemáticas contemporâneas que determinam a sua

elaboração, impede ao estudante a possibilidade de ver como tudo se origina e de

ser ele o sujeito histórico.

Apesar da historiografia brasileira, atualmente ter apontado para novos

caminhos nos estudos sobre a escravidão e as imagens dos negros dentro da

história do Brasil, ainda é notório a permanência de ideias preconceituosas,

discriminatórias, da valorização do dominador e das rotulações para com os

dominados, imagem estereotipadas do negro, onde aparecem como exóticos,

submissos e inferiores.

O livro didático segundo Bitencourt (2002), tem sido objeto de avaliações

contraditórias nos últimos tempos. Existem várias críticas sobre ele, e uma delas é

de culpá-lo pelo estado precário da educação formal. Por outro lado, é necessário

que se perceba que o livro didático continua sendo um material referencial de

professores, pais e alunos, ou seja, da sociedade, como auxílio e subsidio no

processo da aprendizagem.

Em suma, o livro didático constitui um instrumento no processo de

socialização, tendo o professor como mediador e serve de apoio às atividades como

aos alunos. A função específica do livro didático é auxiliar o professor na tarefa de

mediar o saber, cabendo a ele utilizar esse instrumento de forma racional, ajudando

a democratizar e socializar o conhecimento elaborado, bem como abrir a

possibilidade de crítica dessa herança e criação de novos saberes por parte dos

educandos.

3. EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO - RACIAIS E PARA O ENSINO DA HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA NA EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL: A PASTA DE TEXTOS PARA SUPORTE AO PROFESSOR DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO.

Não perdendo de vista o problema desta pesquisa que é: Quais os desafios e

possibilidades encontrados pelo professor no uso da Pasta de Textos e no ensino da

cultura afro-brasileira nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental na Rede Municipal

de Ensino de Salvador? Neste capítulo são abordados os temas e conteúdos dos

nove textos que compõem a pasta, incluindo os seus autores.

A Pasta de Textos é um material didático destinado ao sistema de ensino da

Rede Municipal de Salvador, que foi elaborada na gestão da ex-secretária municipal

de educação e atual vereadora de Salvador, a pedagoga Olívia Santana. Material

que foi elaborado com o intuito de definir diretrizes para a articulação da cultura

africana e afro-brasileira no espaço escolar, contemplando o respeito à diversidade

humana no que se refere às relações étnico-raciais do cotidiano escolar.

Os textos apresentam uma visão ampla sobre as Diretrizes Curriculares para

a inclusão da história e cultura afro-brasileira e africana na Rede Municipal de

Ensino de Salvador. Nos trabalhos são apresentados argumentos históricos, sócio-

culturais e educacionais em prol de uma educação que atente para a diversidade.

Ao ler os conteúdos da Pasta de Textos o educador percebe que sua abordagem

são relacionadas ao fazer pedagógico, ressaltando a necessidade do estudo da

cultura africana e afro-brasileira, mostrando as possibilidades para a inclusão da

temática nas propostas pedagógicas de suas aulas, ou seja, no currículo escolar.

A cultura africana, afro-brasileira passou a ser por Lei tema indispensável nas

salas de aulas dos nos iniciais, como também a questão racial que antes estava fora

da escola, fará parte como um dos seus componentes. E possível perceber a

importância da questão racial no que ressalta Nascimento (2006) que:

A chamada “questão racial” só entrou de fato na agenda de debates das políticas públicas na metade dos anos de 1990. De uma forma geral, foi nesta década que a sociedade, o governo da União, as escolas e universidades, a mídia e outros entes estatais e privados passaram a discutir mais profundamente o racismo, o preconceito, a discriminação, a desigualdade racial e políticas contra esses problemas. Esse fato é resultado da luta histórica do Movimento Social Negro. [...] Um dos resultados positivos dessa luta histórica é que, hoje, mesmo com resistências de alguns setores da sociedade, não é mais possível negar que o racismo é uma questão presente na realidade concreta e que são necessárias políticas públicas chamadas de ação afirmativa – políticas específicas de promoção de igualdade de oportunidades e de condições concretas de participação na sociedade – para a superação do racismo, da discriminação e das desigualdades raciais ( NASCIMENTO, 2006, p. 8).

O material analisado Pasta de Textos é dividido em nove temas: Gênero e

raça: desafios à escola; Contribuição dos povos africanos para o conhecimento

cientifico e tecnológico universal; A África contemporânea: dilemas e possibilidades;

Quilombos no Brasil e a singularidade de Palmares; Revolta de Búzios ou

Conjuração Baiana de 1798: uma chamada para a liberdade; A Revolta dos Malês

em 1835; A influência das línguas africanas no português brasileiro; Mitos afro-

brasileiros e vivências educacionais e no último texto Educação para a convivência

pacífica entre as religiões.

Em cada texto é possível perceber uma angustia nos educadores pela

ausência nas escolas das abordagens que diz respeito a temática negra. Como por

exemplo: no texto um intitulado Gênero e raça: desafios à escola a autora Mary

Garcia Castro, pesquisadora da UNESCO, Fundação Rockfeller e professora da

Universidade Federal da Bahia, aborda a importância de se destacar as questões

raciais e de gênero dentro da escola, principalmente no que diz respeito a

sexualidade e a auto-estima.

No texto dois, Contribuição dos povos africanos para o conhecimento

cientifico e tecnológico universal de autoria de Lázaro Raimundo dos Passos Cunha,

engenheiro mecânico e diretor de projetos especiais e comunicação do Instituto

Steve Biko, discute da importância de levar para sala de aula a contribuição dos

povos africanos para a humanidade, onde no texto traz um breve histórico das

contribuições dos povos africanos e da diáspora para o conhecimento cientifico e

tecnológico universal que podem e devem ser usados nas aulas de história pelos

professores.

No texto três A África contemporânea: dilemas e possibilidades o professor da

Universidade Federal da Bahia Muniz Gonçalves Ferreira, descreve a crise do

colonialismo europeu e a emersão nacional africana para que o professor tenha a

possibilidade de fazer uma retrospectiva histórica do continente africano, tendo uma

visão do seu subdesenvolvimento, e suas mudanças na reestruturação produtiva

ressaltando os efeitos da globalização dentro do continente.

No texto Quilombos no Brasil e a singularidade de Palmares, tema do texto

quatro, a professora da Universidade Federal da Bahia Maria de Lourdes Siqueira,

aborda a necessidade do educador ter conhecimento da contribuição dos quilombos

na memória de nossos antepassados onde seu trabalho tem como objetivo oferecer

a profissionais da Educação formal e não formal subsídios para a difusão da

pluralidade cultural brasileira.

No texto cinco intitulado Revolta de Búzios ou Conjuração Baiana de 1798:

uma chamada para a liberdade de autoria da professora Marli Geralda Teixeira da

Universidade Federal da Bahia, apresenta um dos temas da pasta de texto de mais

destaque, pois se trata de um assunto que não é enfatizado nas escolas, assunto

que não é encontrado nos livros didáticos de história do município e até mesmo do

Estado. Neste trabalho a professora faz uma retrospectiva do fato histórico para que

o professor perceba a grandiosidade do acontecimento por ser um marco na luta

pela independência, por planejar um rompimento com a dominação portuguesa, e

por se tratar de uma revolta de significado social, que insatisfeita com as

desigualdades e discriminação lutou pela liberdade e por uma sociedade igualitária.

A Revolta dos Malês em 1835, é o tema do texto de número seis, onde o

professor da Universidade Federal da Bahia João José Reis, aborda o desenrolar da

revolta, tema esse bastante importante e que fica de fora das das salas de aulas e

que também estão ausentes nos livros didáticos dos anos inciais do ensino

fundamental do município, fato este que deveriam fazer parte do currículo das

escolas baianas para que os estudantes tenham o conhecimento da revolta, e como

as tradições islâmicas atravessaram o atlântico e fazem parte da história do Estado

da Bahia e do Brasil.

O texto sete, A influência das línguas africanas no português brasileiro da

professora Yeda Pessoa de Castro faz um panorama dos falares africanos na África

e no Brasil, ressaltando os fatores determinantes, a língua de santo e a interferência

na morfologia e sintaxe, para que o educador perceba a herança cultural africana no

Brasil, e o quanto o Brasil e África têm em comum.

O texto oito produzido por Vanda Machado da Silva, Mitos afro-brasileiros e

vivências educacionais, aborda a importância do mito nos espaços escolares para

que a criança possa relacionar o mito com sua própria natureza, principalmente com

o mundo o qual faz parte. O tema é bastante importante e nos últimos tempos tem

sido temas de monografias, teses e dissertações por se tratar de um tema vasto e

rico abrindo possibilidades para uma educação para a relações étnicos e raciais e

aplicação da Lei 10.639/03 nas escolas.

Educação para a convivência pacífica entre religiões, é o tema do texto nove,

de autoria da professora Valdina Pinto, que propõe com atemática uma educação

aberta ao diálogo, onde o educador contribua para a pluralidade religiosa, trazendo a

matriz africana para a sala de aula, possibilitando a desconstrução dos preconceitos

e estereótipos e imagens negativas das expressões religiosas, principalmente

romper com a intolerância religiosa ainda presente na sociedade.

Com mesma temática, os textos constituem referência para a aplicação da

Lei 10.639/03 nas escolas municipais de Salvador, como também vale ressaltar que

é um componente a ser inserido nos currículos nas unidades de ensino municipal,

que atendem a crianças, jovens e adultos. A sua elaboração pela Secretária

Municipal de Educação e Cultura de Salvador - SMEC, resultou da formação

continuada de professores, onde foram traçadas diretrizes para a implementação de

políticas educacionais de valorização das diversidades.

Nos textos são apresentados argumentos históricos, sócio-culturais e

educacionais em favor de uma educação que privilegie a história e a cultura afro-

brasileira e africana, onde abordam aspectos relacionados do fazer pedagógico,

enfatizando a necessidade do estudo da história e cultura afro-brasileira e africana

descrevendo os princípios que fundamentam propostas apontando possibilidades

para a inclusão da temática nas propostas pedagógicas das escolas municipais.

Os nove textos trazem abordagens importantes, mas é necessário que o

professor tome como referência outros materiais didáticos para a inserção da

temática no currículo escolar. Com a leitura do material é possível que o educador

perceba que áreas do conhecimento como, por exemplo, matemática e ciências não

são contempladas, fazendo com que sejam buscados outros materiais que sirvam

de subsídios para inclusão da cultura afro-brasileira no espaço escolar.

É necessário que sejam produzidos inúmeros outros materiais como o da

Pasta de Textos, pois como novas produções será possível desconstruir a imagem

de África até então exposta pela historiografia. E com novas publicações será

possível reverter a imagem do continente que ressalta Oliva (2003) que:

[...] África aparece apenas como um figurante que passa despercebido em cena, sendo mencionada como um apêndice misterioso e pouco interessante de outras temáticas. Tornou-se evidente também que, quando o silêncio é quebrado, a formação inadequada e a bibliografia limitada criam obstáculos significativos para uma leitura menos imprecisa e distorcida sobre a questão ( OLIVA, 2003, p. 8)

Neste contexto, muitos ainda serão os desafios para a temática afro-brasilera

serem inseridas nos currículos das escolas, mas a Pasta de Texto é um inicio e se

configura sim, como uma possibilidade para até então temas como Revolta dos

Malês e Conjuração Baiana que estavam longe de serem abordados nos espaços

escolares. A Pasta de textos deve ser vista como uma iniciativa para inserção de

temas nunca vistos por educadores em seu processo formativo e que diante de

novos desafios, estes busquem novas fontes de estudo e permanente formação

continuada para melhor aplicação da Lei 10.639/03, como também por uma

educação que prime pela diversidade e igualdade.

Os materiais da Pasta de Textos guardam uma larga possibilidade de

entendimento a partir do contexto no qual foram fabricados, do momento

historiográfico vivenciado, das diversas demandas e influências que se

apresentaram na elaboração desse tipo de material e de ideologias ou mentalidades

circulantes. Ao escrever sobre a cultura afro-brasileira e africana os autores mostra

em seus trabalhos o resultado de seus olhares direcionados e cheios de significados

e interpretações, resultando na análise e representação da história de uma cultura

até então esquecida e mal interpretada pela própria historiografia.

É importante que o professor perceba que na Pasta de Textos são

apresentados conteúdos que não se esgotam as inúmeras possibilidades de

trabalho, cabendo ao profissional adotar uma metodologia adequada a cada série,

principalmente introduzir novos pontos e conteúdos a serem abordados. Afinal pode-

se dizer que um dos pontos negativos da Pasta de Textos é a super valorização

das disciplinas de História e Língua Portuguesa, suprimindo as outras áreas do

conhecimento tais como Matemática, Ciências e Geografia.

E válido ressaltar que embora a Lei privilegie as áreas de educação artística,

literatura e história, o profissional deve suprir a carência da temática em outras áreas

do ensino tais como: ciências, matemática, geografia e entre outras. Abaixo

percebe-se na Lei (Lei 11.645/03) um dos pontos negativos nas limitações das áreas

de conhecimento:

§ 1o O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil. § 2o Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de educação artística e de literatura e história brasileiras.

Portanto, a Lei 10.639/03 constitui-se em elemento essencial no processo de

construção, resignificação, conhecimento, reconhecimento e valorização de

diferentes perspectivas e compreensões concernentes a formação e às

configurações da sociedade brasileira contemporânea, no sentido de desconstruir as

significações e representações preconceituosas e racistas que tem se configurado

nos conteúdos didáticos e no espaço da escola nos últimos anos em todas as áreas

do conhecimento.

Para Fernandes (2005), a Lei possibilita a inserção do negro nas propostas

curriculares como sujeito histórico. Sendo assim, faz-se necessário educadores,

principalmente professores preparados, capacitados e habilitados a fazerem uma

reconstrução do currículo partindo da História e da Cultura afro-brasileira,

elaborando propostas pedagógicas que tenha como fundamento, os conhecimentos

filosóficos, antropológicos, sociológicos, históricos, religiosos, geográficos e culturais

que abordem a questão do negro.

3. 1 Formação continuada de professores para a aplicação da Lei 10.639/03 e sua complementação 11.645/08: uma necessidade para a aplicabilidade.

O reconhecimento legal em torno da extrema diversidade do continente

africano, sem falar da afinidade histórica e herança cultural entre Brasil e África, faz-

se necessário salientar que a Lei 10.639/2003 é uma conquista para a Sociedade

Brasileira. Um importante passo para a construção de uma sociedade mais

igualitária no que tange às relações raciais. Agora a tarefa do educador é se

“capacitar” para discutir a história dessa Lei, e dos assuntos pertinentes a temática

entendendo-a como uma das muitas lutas do movimento negro brasileiro na busca

pela igualdade de direitos e respeito.

Diante das muitas visões que diversos autores descreveram a África, há na

atualidade uma grande necessidade de descrever com um “novo olhar” um

continente antes falado e visto apenas como um país. E é por isso que Oliver (1994)

enfatiza que:

[...] A primazia da África na evolução humana é uma descoberta recente que, até aqui, só teve tempo para produzir uma parcela do seu impacto potencial. Os homens de ciência já estão aprendendo a ver a África, não como um lugar atrasado e exótico, mas como o cenário da aquisição pelo homem de suas características genéticas mais profundas. É provável que, à medida que esse conhecimento se difunda e seja ponderado pela próxima geração de cientistas através de todo o espectro das disciplinas intelectuais, o mundo aprenda a pensar na África com mais respeito e os próprios africanos olhem seus companheiros com uma confiança nova. Se as descobertas recentes da biologia molecular alcançarem aceitação, não só para o fato de que o planeta foi primeiramente colonizado a partir da África, mas também que foi amplamente recolonizado pelo primeiro homem plenamente sapiente a se difundir, ainda uma vez, a partir da África no período dos últimos 250 mil anos, o impacto geral deverá ser ainda mais forte( OLIVEIRA, 1994,p. 281).

Nesta perspectiva a aprovação da Lei representou um importante avanço

para uma maior e melhor diversificação das ciências humanas brasileiras,

principalmente para o pesquisador que terá uma vasta possibilidade de estudo. Ao

professor a busca insistente por materiais que possibilitem subsidiar suas aulas,

busca de bons livros didáticos que dêem suporte para o exercício do magistério,

quem sabe até mesmo produzir seu próprio material,preparar aulas, construir

pontes entre comunidades de afro-descendentes e as escolas, adaptando-os à

diversidade de experiências da cultura afro descendente no Brasil.

A formação continuada de professores é uma necessidade, tem como

objetivos, propor novas metodologias e colocar os profissionais a par das discussões

teóricas atuais, com a intenção de contribuir para as mudanças que se fazem

necessárias para a melhoria da ação pedagógica na escola e consequentemente da

educação. É certo que conhecer novas teorias, faz parte do processo de construção

profissional, mas não bastam, se estas não possibilitam ao professor relacioná-las

com seu conhecimento prático construído no cotidiano.

A formação contínua não abrange apenas o professor, mas também inclui os

outros profissionais da educação, como os diretores, os orientadores educacionais,

os supervisores pedagógicos, ou seja, todos aqueles que estejam inseridos na área

educacional. O professor é sempre o mais cobrado e penalizado no que diz respeito

a formação continuada, mas é necessário que todos tenham a consciência da sua

missão e de seu compromisso com a educação. Até mesmo os pais e familiares

devem atentar para tais questões, afinal como poderão cobrar a presença da

temática nas salas de aulas se não procurarem se informar o que é a Lei e o que

ela propõe.

E é necessário para a aplicação da Lei 10.639/03, permanente Formação

Continuada para que haja produção de novos conhecimentos, de troca de diferentes

saberes, de repensar e refazer a prática do professor. Para Sacristán (1990) a

formação de educadores tem se constituído em “uma das pedras angulares

imprescindíveis a qualquer intento de renovação do sistema educativo”, o que nos

ajuda a entender a importância que esta temática vem adquirindo nas últimas

décadas, em meio aos esforços globais para melhorar a qualidade do ensino. Nos

processos de reformas educativas ela é, então, colocada como elemento central.

Neste sentido a formação continuada irá contribuir para que o educador

reconheça a diversidade cultural do espaço escolar, tenha conhecimento do que

propõe a Lei 10.639/03 e sua complementação, para então trabalhar com uma

proposta de conscientização cultural, em uma perspectiva intercultural crítica,

aproximando a reflexão sobre prática docente para a pluralidade cultural à temática

das representações e do saber docente no cotidiano escolar.

Desta forma, a postura reflexiva na busca pela formação continuada não

requer apenas do professor o saber fazer, mais que ele possa saber explicar de

forma consciente a sua prática e as decisões tomadas sobre ele e perceber se

essas decisões são as melhores para favorecer a aprendizagem do seu aluno, pois

segundo Perrenoud (2002), ensinar é, antes de tudo, agir na urgência, decidir na

incerteza.

O ambiente escolar, e toda a sociedade brasileira, encontra-se repleta de uma

realidade em que as diferenças étnicas e culturais não são respeitas, ao contrário,

são incentivadas pela mídia, difundindo preconceitos e práticas racistas por todo o

país, mostrando um racismo velado. Nesse sentido, as produções didáticas

brasileiras de ensino são exemplos evidentes dessa situação, impostas pela elite

dominante.

Mas as inquietações decorridas de muitas brigas por parte da sociedade e do

movimento negro, fizeram com que a Lei fosse sancionada e agora o desfio e outro:

o de fazer valer a Lei, para que não caia no esquecimento como muitas outras Leis

deste país. A formação continuada é um passo para que seja feita a inclusão da

temática na sala de aula e principalmente na qualificação de professores. Segundo

Freire (2002), o homem é um ser inconcluso e deve ser consciente de sua inconclusão,

através do movimento permanente, e pode ser visto na citação abaixo:

A educação é permanente não por que certa linha ideológica ou certa posição política ou certo interesse econômico o exijam. A educação é permanente na razão, de uma lado, da finitude do ser humano, de outro, da consciência que ele tem de finitude. Mas ainda, pelo falto de, ao longo da história, ter incorporado à sua natureza não apenas saber que vivia mas saber que sabia e, assim, saber que podia saber mais. A educação e a formação permanente se fundam aí. (FREIRE, 1997 p. 20).

A Pasta de Textos nasce como uma forma de fazer com que o professor

esteja atualizado com concepções críticas em ralação a temática discutida. Com um

ensino crítico, a Pasta poderá construir subsídios para a desconstrução dos

estereótipos negativos que são atribuídos aos negros e ao continente africano e com

isso darem passos significantes rumo ao reposicionamento das relações raciais na

educação brasileira onde professores e educandos possam juntos entender as

complexidades das diversas visões de mundo bem como ajudar os mesmos em

suas percepções e formação de pensamento crítico em relação às desigualdades

raciais e o racismo, como também auxiliá-los na sua forma de posicionar-se e

perceber o mundo. Diante do exposto, Cavalleiro ( 2001, p. 102) ressalta o desafio

da escola:

Ainda que a escola sozinha não seja capaz de reverter anos de desqualificação da população negra e supervalorização da população branca, a longo prazo ela pode desempenhar um importante papel na construção de uma nova cultura, de novas relações que vão além do respeito às diferenças. Possibilitando que todas as vozes possam ecoar no espaço escolar, chega-se à consciência de que é na diversidade que se constrói algo novo ( CAVALLEIRO, 2001, p. 102).

É necessário e importante romper com o silêncio dentro da escola a que

foram relegados a negros e nativos na historiografia brasileira, para que estes

possam construir uma nova imagem de si mesmo, além é claro do papel do

professor de desempenhar a sua função pensando na possibilidade de transformar a

educação de singular para plural. E para que tudo isso ocorra é imprescindível a

participação de toda a escola, na qualificação e requalificação de seu corpo docente

para que estes possam contribuir na formação que atente para a diversidade.

4. O QUE DIZEM OS PROFESSORES SOBRE O USO DA PASTA DE TEXTOS E APLICAÇÃO DA LEI. 10.639/03

Neste capítulo é tratado as análises dos questionários que foram realizadas com

vinte professores da Rede Municipal de Ensino de duas escolas municipais da

cidade do Salvador: A Escola Municipal A, situada no bairro do Cabula e a Escola

Municipal B, situada no bairro de Cajazeiras. Ambas atendem da Educação Infantil

ao 5º ano do Ensino Fundamental de Nove Anos, nos turnos matutino e vespertino e

no noturno as classes de Educação de Jovens e Adultos - EJA . Trata-se de uma

pesquisa qualitativa, bibliográfica e documental.

A pesquisa qualitativa foi utilizada com o intuito de descrever e comparar os

dados obtidos, foi estruturada por um questionário com perguntas direcionadas e

referentes ao uso da Pasta de Textos e aplicação da Lei 10.639/03, no qual Lakatos

e Marconi (2007), conceitua que se trata de um instrumento e técnica de

investigação composta de questões para recolher informação. Na bibliográfica foram

levantados autores que aborda o tema em questão. Para Minayo (1999) é uma

pesquisa bibliográfica quando elaborada a partir de material já publicado, constituído

principalmente de livros, artigos de periódicos e atualmente com material

disponibilizado na Internet.

Para Triviños (1987), a pesquisa qualitativa permite analisar os aspectos

implícitos ao desenvolvimento das práticas organizacionais, e a abordagem

descritiva é praticada quando o que se pretende buscar é o conhecimento de

determinadas informações e por ser um método capaz de descrever com exatidão

os fatos e fenômenos de determinada realidade. Já para Lakatos e Marconi (2007),

permite analisar dados concretos, deduzindo dos mesmos os elementos constantes,

abstratos e gerais. Para Minayo (1999), a abordagem qualitativa não pode pretender

o alcance da verdade, com o que é certo ou errado, devendo ter como preocupação

primeira a compreensão da lógica que permeia a prática que se dá na realidade.

Com a pesquisa documental foi trabalhada a Lei 10.639/03 e sua

complementação 11.645/08. Onde Lüdke (1988), enfatiza que a análise documental

pode se constituir numa técnica valiosa de abordagem de dados qualitativos, seja

complementando as informações obtidas por outras técnicas, seja desvelando

aspectos novos de um tema ou problema em questão. Segundo Cellard (2008), a

análise documental favorece a observação do processo de maturação ou de

evolução de indivíduos, grupos, conceitos, conhecimentos, comportamentos,

mentalidades e práticas.

Com a pesquisa bibliográfica buscou-se o levantamento de livros, revistas de

relevante interesse para o desenvolvimento deste trabalho. Onde, para Medeiros

(2008), o objetivo da pesquisa bibliográfica é colocar o autor da nova pesquisa

diante de informações sobre o assunto de seu interesse.

Na pesquisa com os professores entrevistados, 5% tinham menos de cincos

anos no município, enquanto que 50% dos professores tinham até dez anos de

atuação no município, e 45% informaram ter mais de dez anos na Rede Municipal de

Ensino. Dos entrevistados, 55% tinham formação acadêmica, o que isso significa

que mais da metade vem procurando investir na sua formação, e se atualizando

para os desafios e possibilidades da sala de aula. Quanto à pós-graduação, apenas

10% informaram ter realizado.

A Lei 10.639, foi sancionada em 2003, e o inquietante é que 100% dos

professores com informaram que não foi abordada no seu processo formativo a

cultura afro-brasileira e africana, com isso foi possível perceber e identificar a

importância da obrigatoriedade da Lei, em pleno século XXI, falar em cultura ainda

é uma barreira, principalmente se for direcionada a cultura africana, afro-brasileira e

indígena.

A obrigatoriedade da Lei 10.639/2003 pode ser considerada um ponto de

chegada de uma luta histórica da população negra, para se ver retratada com o

mesmo valor dos outros povos, e um ponto de partida para uma mudança social,

sendo desafiador para o professor, mas por outro lado abrindo inúmeras

possibilidades de quebrar com os paradigmas impostos na sociedade. Na política

educacional, a implementação da Lei significa ruptura profunda com um tipo de

postura pedagógica que não reconhece as diferenças resultantes do nosso processo

de formação nacional. Para além do impacto positivo junto à população negra, essa

Lei deve ser encarada como desafio fundamental do conjunto das políticas que

visam à melhoria da qualidade da educação brasileira.

De forma mais ampla, os questionamentos se dirigem à necessidade de

mudança radical na estrutura curricular dos cursos em todos os níveis, modalidades

e etapas do ensino que desconsideram ou simplesmente omitem a participação

africana e afro-brasileira na construção do conhecimento em diferentes áreas das

ciências. A Lei n. 10.639/2003, que altera a LDB tem foco na educação escolar, e

deve ser cumprida pelos sistemas de ensino.

Não obstante, observa-se que os Conselhos de Educação, as Secretarias

Estaduais e Municipais de Educação e o próprio Ministério da Educação não vêm

atuando de forma sistemática e integrada no sentido de divulgá-la e de criar as

condições sistêmicas para a sua efetiva aplicação. Inúmeros setores estão sendo

criado afim dar suporte ao Estado e ao Município para a aplicação da Lei, como é o

caso da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial – SEPROMI do Estado da

Bahia e a Secretaria Municipal de Reparação – SEMUR.

Esses e muitos outros centros vêm apoiando e desenvolvendo trabalhos

relacionados à cultura africana e afro-brasileira. Como também existe a Secretaria

de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade – SECAD que pertence ao

Ministério da Educação e Cultura – MEC, que desde o ano de 2004 vem elaborando

cursos a distância para que os professores interessados em se qualificar possam

realizar sua formação continuada sem se preocupar com a distância, como foi o

caso do curso intitulado Ensino Afro Brasil.

A Universidade Federal da Bahia – UFBA, através do seu Centro de Estudos

Afro-Orientais – CEAO também vem desenvolvendo capacitações para professores

da Rede Pública de Ensino sobre a cultura africana e afro-brasileira. Outro núcleo no

Estado que vem atuando com a formação continuada de professores da Rede

Pública de Ensino é o Instituto Anísio Teixeira – IAT, que na modalidade a distância

desenvolve a capacitação com a temática africana e afro-brasileira. É possível

perceber os inúmeros núcleos acima citados preocupados em aprimorar e atualizar

os professores sobre a temática tão esquecida e ocultada pela historiografia e que

no século XXI se propõe a mudar essa história de descaso e esquecimento.

Diante do exposto, foi percebido que esses núcleos que estão oferecendo

formação continuada têm sortido efeito, ou seja, tem contribuído para a aplicação da

Lei 10.639/03 no qual 85% dos entrevistados informaram ter realizado cursos de

atualização oferecidos pelos diversos núcleos, sejam eles Municipal, Estadual ou

Federal. Mas um dos fatores importante da entrevista, foi que 100% dos

entrevistados, tem consciência da necessidade da Lei, pois todos disseram que é de

extrema importância e necessidade de ser aplicada no espaço escolar.

No que se refere ao recebimento e uso da Pasta de Textos, 90% dos

entrevistados receberam o material e falaram que fazem uso, principalmente para

dar suporte a trabalho relacionados à temática, porém os 10% que identificaram não

ter recebido a pasta possuem outros materiais que disseram servir de subsídios

para suas aulas. Uma das professoras entrevistadas trouxe na entrevista um dado

interessante a ser discutido, que é justamente a falta de abrangência das outras

áreas do conhecimento. A professora informou que “gosta da Pasta de Textos, e os

materiais que se encontram divididos em nove textos são interessantes, mas por

outro lado vai caber ao professor buscar por subsídios que os auxiliem em outras

áreas. Para ela a culinária ficou de fora, da mesma forma que as disciplinas de

Matemática, Ciências, Educação Artística e Geografia”.

Diante dessa inquietação pode-se concluir que existe a necessidade de uma

atualização, ou melhor, de uma nova edição da Pasta de Textos contemplando

essas áreas do conhecimento, mesmo porque, existe de fato uma ausência não só

na Pasta de Textos dessas áreas especificadas do conhecimento, mas na própria

elaboração de livros na atualidade que contemplam a Lei 10.639/03 e sua

complementação Lei 11.645/08, enfatizam na sua grande maioria, as disciplinas de

História, Língua Portuguesa e Literatura.

As Leis 10.639/03 e 11.645/08 é uma correção pelo débito histórico em

políticas públicas em especiais para a população negra e indígena. Neste contexto,

a publicação de livros didáticos pertinentes a História da África, Cultura afro-

brasileira e indígena, para o Ensino Fundamental (Anos Iniciais), torna-se uma

alternativa eficaz para o ensino-aprendizagem nas escolas públicas e particulares

sobre o ensino das relações étnicos e raciais. Visto que a docência tem questionado

em órgãos públicos sobre a carência de livros didáticos para a efetivação das leis

supracitadas.

Ainda existe uma necessidade de mobilizar toda a comunidade escolar para a

temática discutida neste trabalho, para que se possa no futuro esquecer da palavra

preconceito. Onde haja professores conscientes e que desenvolvam uma proposta

de ensino para a educação das relações étnico-raciais por meio da reflexão dos

conteúdos, metodologias e propostas de ensino, com ações cotidianas que

desconstrua os estereótipos negativos e a discriminação na escola para que se

estenda para a sociedade com o intuito de pouco a pouco toda a sociedade esteja

consciente e do seu papel. Para Santos (2001), o caminho para vencer o

preconceito no espaço escolar é:

[...] no cotidiano escolar a educação anti-racista visa a erradicação do preconceito, das discriminações e de tratamentos diferenciados. Nela estereótipos e idéias preconcebidas, estejam onde estiverem (meios de comunicação, material didático e de apoio, corpo discente e docente etc.) precisam ser duramente criticados e banidos. É o caminho que conduz a valorização da igualdade nas relações. E para isso, o olhar crítico é ferramenta mestra (SANTOS, 2001, p.105).

A intervenção nos casos de discriminação, racismo, preconceito e demais

formas de desagregação social é fundamental para que não se perpetuem atos

contra a humanidade em nome da superioridade de uma raça em detrimento de

outra. Até mesmo porque existe apenas uma raça, que é a raça humana.

Cavalleiro (2001), enfatiza que a ausência de iniciativas diante de conflitos

raciais entre alunos e alunas mantém o quadro de discriminação. Diante desses

conflitos, o silencio revela conivência com tais procedimentos. Para a criança

discriminada indica menosprezo pelo seu sofrimento. E, principalmente explicita que

ela não pode contar com nenhum apoio em outras situações semelhantes.

Assim, será possível haver uma educação que promova a superação do

preconceito. Afinal ao conhecer a história da cultura africana e afro-brasileira é

possível repensar estereótipos e atitudes preconceituosas, ou seja, sair da

ignorância e reconhecer o outro, valorizando a diversidade. Repensando antes de

tudo o ensino será possível uma educação para as relações étnico raciais, e assim

teremos uma sociedade diferente.

A Lei no 10.639/2003, promulgada em 9 de janeiro de 2003, que altera a Lei

de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB, é considerada um marco na luta

pela superação da desigualdade racial na educação pública brasileira. É importante

destacar outra medida importante de ação-afirmativa que são as Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o

Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, aprovadas em março de

2004, pelo Conselho Nacional de Educação, que são de fundamental importância

para a difusão da cultura africana e afro-brasileira.

Para Munanga (2000), a educação escolar, embora não possa resolver tudo

sozinha, ocupa um espaço de destaque, e afirma se nossa sociedade é plural, étnica

e culturalmente, desde os primórdios de sua invenção pela força colonial, só

podemos construí-la democraticamente respeitando a diversidade do nosso povo, ou

seja, as matrizes étnico-racias que deram ao Brasil atual sua feição multicolor

composta de índios, negros, orientais, brancos e mestiços.

Mas, não se pode deixar também de destacar que os avanços tem sido com

êxito, no dia 20 de Julho de 2010, o Presidente Luis Inácio Lula da Silva, sancionou

a Lei que cria o Estatuto da Igualdade Racial, que tem por objetivo promover

políticas públicas de igualdade de oportunidades e combate à desigualdade e

discriminação. Diante de muitas Leis o que resta aos profissionais da educação

agora são aplicá-las e para os que encontram dificuldades, a formação continuada

ainda é a melhor opção rumo à qualificação e para uma abordagem mais ampla e

significativa da cultura africana e afro-brasileira no espaço escolar.

Uma atitude necessária ao professor em relação a qualquer instrumento que

sirva como mediador, ou seja, subsídios para suas aulas é o questionamento sobre

sua natureza. É importante que o professor tenha consciência da estrutura que o

organiza. Ele deve estar atento ao conjunto de intenções que nos materiais estão

embutidos. Por vezes, torna-se necessário problematizar junto aos alunos sobre

essas intenções.

Refletir sobre os conteúdos em um livro, por exemplo, vai além da reflexão

das páginas escritas. As imagens, a seleção de conteúdos dos textos, a ordem de

prioridade e o espaço ocupado pelos temas dizem aquilo que importa estudar e

saber, do conhecimento que gera valor. Por outro lado, a ausência de imagens, a

confirmação de lugares inferiores na escala social, o espaço destinado a certos

temas, também dizem, mas aquilo que não importa estudar e saber, do

desconhecimento que também gera valor.

A prática pedagógica, por meio de seus instrumentos, pode favorecer as

intenções e possibilidades de reconhecimento de identidades positivas, ao fornecer,

por exemplo, modelos positivos às crianças e aos jovens. A criança e o jovem negro

têm o direito constitucional de se virem representados e referidos enquanto

indivíduo, grupo social e sujeitos históricos.

Um outro dado do questionário que foi bastante gratificante é que 100% dos

professores afirmaram aplicar Lei em suas aulas. O que significa que todos estão

conscientes da importância de se difundir o que propõe a Lei. Mas, por um lado um

dado relatado por uma professora é angustiante e preocupante, trata-se da

resistência dos alunos a cultura africana e afro-brasileira. “Ela afirmou ter dificuldade

apenas em vencer o preconceito que está enraizado nas crianças”.

Realmente é um fator desafiador a ser vencido, podemos identificar que

essas resistências são fruto dos modelos da nossa sociedade que são vistos pelas

crianças, e não só o livro didático é responsável por isso, mas a televisão é uma

grande vilã dessas modelos. Afinal quantas crianças negras fazem parte dos

programas de televisão? E das novelas? E dos desenhos animados? E quando

aparecem de que forma são?

Diante do exposto é possível identificar na mídia a ausência de crianças

apresentadoras negras, e heróis nos desenhos animados televisionados então é

nulo. Nas novelas já aparecem, porém são como as adotadas, rejeitadas e enfim,

submissas. Vencer a resistência por parte das crianças não será uma tarefa fácil,

mas amplas são as possibilidades de vencer esses paradigmas, inclusive inserido

no currículo escolar a cultura africana e afro-brasileira, reafirmando a cada momento

a identidade da criança negra, para que então ela se reconheça.

Assim, afirmar a identidade negra faz parte de um processo de ruptura com

uma história de negação dessa identidade que foi, historicamente, inferiorizada e

subjugada diante de um ideal estético-cultural eurocêntrico. O reconhecimento das

raízes africanas como potenciais na sociedade brasileira pode possibilitar a

afirmação e valorização da identidade negra e o papel do educador de possibilitar

essa ruptura é fundamental.

O exposto neste capítulo foi o que informaram os professores da Rede

Municipal de Ensino de Salvador, portanto o que se pode concluir desses relatos, é

que o corpo docente das unidades escolares entrevistadas tem consciência de seu

papel como educador, e que os desafios e possibilidades são eminentes e que

caberá a cada um deles a busca incessante por uma educação igualitária, onde

negros, brancos e indígenas se reconheçam e se percebam sujeitos históricos. A Lei

Federal de nº 10.639/03, sua complementação Lei de nº 11.645/08 e Pasta de

Textos, são subsídios sim para as aulas, portanto caberá também a eles fazerem

uso destes e outros materiais que venham a surgir, não esquecendo de analisar

cada um desses materiais com um olhar crítico, principalmente para que

identifiquem se estes contemplam o que propõe a Lei.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Torna-se fundamental, por parte dos profissionais dos estabelecimentos de

ensino de todo país uma mudança de postura, tanto no trato pedagógico, quanto na

dimensão das relações humanas. Quando aplicadas em classe, as atividades

didáticas voltadas para o tema favorecem a busca por um novo paradigma, focado

no estabelecimento de formas mais críticas de lidar com a questão da diversidade.

Isto sem deixar de lado o aspecto do respeito que o assunto preconiza, bem como a

promoção de um ambiente reflexivo, na acepção de ampliar o repertório cultural do

aluno a partir da experiência com o outro.

A igualdade almejada é obra de um trabalho sistemático. Diante do exposto,

pode-se inferir que a ação do educador compromissado em levar a cultura e a

história da África e do afro-brasileiro ao cotidiano escolar é fundamental no

rompimento com práticas não expressivas, bem como para o avanço qualitativo das

relações raciais no âmbito educacional.

A partir da análise apresentada nesta pesquisa foi possível perceber a

importância do professor e de sua contribuição na difusão da cultura africana e afro-

brasileira no espaço escolar. Foram abordadas as posições dos teóricos aqui

apresentados, como também foram discutidos os desafios e possibilidades

enfrentados pelos profissionais frente a obrigatoriedade da aplicação da Lei

10639/03, sua complementação Lei 11.645/08 e o uso da Pasta de Textos.

A conscientização e formação continuada dos professores são de

fundamental importância para sua prática pedagógica, e principalmente na busca de

um ensino igualitário que proporcione ao educando a possibilidade de refletir,

questionar sobre sua sociedade, buscando seu reconhecimento como cidadãos

dignos e com direitos iguais em sua sociedade. E no espaço escolar a união de

professores, gestores, familiares e comunidades rumo a quebrar os velhos

paradigmas existentes pela reafirmação e reconhecimento de sua cultura.

Espera-se das discussões apresentadas, mobilizar uma aprendizagem que

propicie a reflexão, questionamentos e antes de tudo a igualdade, vencendo o

preconceito e desafiando os obstáculos e possibilitando uma abordagem da cultura

africana e afro-brasileira no espaço escolar sem restrições e resistência por parte

dos educadores, educando e sociedade, fazendo valer de fato a Lei e as lutas do

movimento negro e dos demais setores que contribuíram para a obrigatoriedade da

temática nos espaços acadêmicos e escolares.

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APÊNDICE 1

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS I

QUESTIONÁRIO

CARGO QUE OCUPA: PROFESSOR ( ) DIRETOR ( ) VICE DIRETOR ( ) COORDENADOR ( ) TEMPO DE SERVIÇO: MENOS DE 5 ANOS ( ) MAIS DE 5 ATÉ 10 ANOS ( ) MAIS DE 10 ANOS ( ) FORMAÇÃO SUPERIOR: SIM ( ) NÃO ( ) PÓS-GRADUAÇÃO: ( ) SIM ( ) NÃO SE AFIRMATIVO, EM QUE ÁREA? 1. CONHECE A LEI 10.639/03 E SUA COMPLEMENTAÇÃO 11.645/08? SIM ( ) NÃO ( ) 2. PASSOU POR ALGUMA ATUALIZAÇÃO PARA APLICAR A LEI EM SUA PRÁTICA EM SALA DE AULA? SIM ( ) NÃO ( ) 3. TEVE CONHECIMENTO DA CULTURA AFRO- BRASILEIRA E AFRICANA NO SEU PROCESSO FORMATIVO? SIM, NA FACULDADE ( ) SIM, NO MAGISTÉRIO ( ) NÃO ( ) 4. O QUE ACHA DA LEI 10.639/03 E SUA COMPLEMENTAÇÃO LEI 11.645/08 NO ESPAÇO ESCOLAR? IMPORTANTE E NECESSÁRIA ( ) DESNECESSÁRIA ( ) 5. PASSOU POR ALGUM PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA OFERECIDO PELO MUNUCÍPIO PARA APLICAÇÃO DA LEI? SIM ( ) NÃO ( ) FEZ POR CONTA PRÓPRIA ( ) 6. RECEBEU A PASTA DE TEXTO OU OUTRO MATERIAL DIDÁTICO SOBRE A LEI PARA CONTRIBUIR NAS AULAS E NA INCLUSÃO DA TEMÁTICA NO CURRÍCULO ESCOLAR? SIM ( ) NÃO ( ) COMPROU MATERIAIS POR CONTA PRÓPRIA ( )

7. TEM DIFICULDADES PARA A APLICAÇÃO DA LEI? SIM ( ) ESPECÍFIQUE____________________________________ NÃO ( ) 8. APLICA A LEI EM SUAS AULAS SIM ( ) NÃO ( ) SE NEGATIVO ESPECIFIQUE:_____________________

ANEXOS 1

ANEXOS 2

ANEXOS 3

ANEXOS 4

ANEXOS 5

ANEXOS 6

ANEXOS 7

ANEXOS 8

ANEXOS 9

ANEXOS 10

ANEXOS 11

ANEXOS 12