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228 Revista da Abordagem Gestáltica – XIII(2): 228-240, jul-dez, 2007 A r t i g o DISTINÇÃO ENTRE PROCEDIMENTOS TÉCNICO E LÓGICO NA ANÁLISE FENOMENOLÓGICA Distinction Between Technical and Logical Procedures on Phenomenological Analysis Distinción entre Procedimientos Técnico y Lógico del Análisis Fenomenológico WILLIAM BARBOSA GOMES Resumo: Em 1986, eu utilizei uma estratégia singela para o exercício da lógica da fenomenologia com alunos de graduação. So- licitei a eles que descrevessem como seria uma boa aula para estudantes de psicologia em uma universidade. A pergunta era pertinente diante das instabilidades pedagógicas da época, quando não se tolerava estruturas clássicas de aulas e nem se sabia como articular propostas liberalizantes. Cinco alunos e quatro alunas, entre 18 e 21 anos responderam ao exercício. Vinte anos depois, revendo o material recolhido, fiquei impressionado com a força expressiva dos depoimentos e a oportunidade de diferen- ciar alguns aspectos procedurais da análise fenomenológica: a distinção entre técnica e lógica. Neste texto, seguindo a fenome- nológica triádica de Husserl e de Merleau-Ponty, percorro os dois caminhos de análise, diferenciando procedimentos técnicos (etapas de organização do material) e lógicos (movimento reflexivo entre o dado da experiência e o ato da consciência). A minha conclusão é que a explanação de métodos e materiais não se restrinja aos procedimentos técnicos e organizadores da análise, mas ressalte a articulação entre a lógica da intencionalidade situada e da intencionalidade apropriável. Palavras-chave: Técnica Fenomenológica; Lógica Fenomenológica; Gestalt Radical; Ensino-aprendizagem. Abstract: In 1986 I used a simple strategy to exercise phenomenological logic with undergraduate students. I asked them to de- scribe how a good class in Psychology would be. The question was relevant due to the pedagogical instabilities of the time. The classical class structures were not tolerated, but it was not clear how to articulate liberal alternatives. The participants were students, with ages between 18 and 21 years old, five males and four females. Twenty years later, after I reviewed the data, I was impressed by the expressiveness strength of those testimonials, and the opportunity to differentiate some procedural aspects of the phenomenological analysis: the distinction between technique and logic. In this paper, I go through two ways of analysis to differentiate technical procedures (i.e. the stages of data organization) from logical procedures (i.e. the reflexive movement be- tween the experience’s data and the consciousness’ act). First, I will follow Husserl and second Merleau-Ponty. I conclude that the explanation of methods and materials shall not be restricted to the technical and organizing procedures of analysis. It shall remark the articulation between the logics of located and appropriative intentionality. Keywords: Phenomenological Technique; Phenomenological Logic; Radical Gestalt; Teaching; Learning. Resumen: En el año de 1986 utilicé una estrategia sencilla con los alumnos del curso de graduación en psicología, para el ejer- cicio de la lógica de la fenomenología. Les fue solicitado describir como sería una buena clase para alumnos de psicología en una Universidad. La pregunta era pertinente delante de la inestabilidad pedagógica de la época, momento en el cual no eran to- leradas las estructuras clásicas en las clases y tampoco sabían como articular propuestas más liberales. Cinco alumnos y cua- tro alumnas entre 18 y 21 años, contestaron al ejercicio. Veinte años más tarde, revisando los datos de entonces, me impresionó la fuerza expresiva de los testimonios y la oportunidad de diferenciar algunos aspectos del procedimiento del análisis fenome- nológico: la distinción entre técnica y lógica. En este texto, basándome en la fenomenológica triádica de Husserl y de Merleau- Ponty, sigo los dos caminos del análisis, diferenciando procedimientos técnicos (etapas de organización del material) y lógicos (movimiento reflexivo entre el dato del experimento y el acto de consciencia). La conclusión a que llegué es que la explicación de los métodos y materiales no deben limitarse a los procedimientos técnicos y organizadores del análisis, pero resaltar la arti- culación entre la lógica de la intencionalidad ubicada y la intencionalidad apropiable. Palabras-clave: Técnica Fenomenológica; Lógica Fenomenológica; Gestalt Radical; Enseñanza; Aprendizaje. As pesquisas qualitativas em suas muitas variações e possibilidades têm prestado grande serviço às ciências humanas, sociais e da saúde, permitindo o estudo em pro- fundidade de fenômenos para os quais não se teria acesso de outra maneira. Há quem afirme que a psicologia passou por duas revoluções simultâneas no final do século XX: as ciências cognitivas (Mahoney, 1993) e as pesquisas quali- tativas (Nicolaci-da-Costa, 2007). Realmente, a dissemina- ção das pesquisas qualitativas abriu muitas possibilidades de estudo, contribuindo para a elucidação de problemas e de situações não acessíveis por outros métodos. A extensa literatura dedicada à introdução da pesqui- sa qualitativa (Denzin & Lincoln, 2000) concentra-se em torno de fundamentos comuns aos diversos métodos, a saber: a etnografia, a fenomenologia e a semiótica. Com efeito, as várias modalidades de pesquisa qualitativa de-

Tecnica Fenomenologica

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  • William B. Gomes

    228 Revista da Abordagem Gestltica XIII(2): 228-240, jul-dez, 2007

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    DISTINO ENTRE PROCEDIMENTOS TCNICO E LGICO NA ANLISE FENOMENOLGICA

    Distinction Between Technical and Logical Procedures on Phenomenological Analysis

    Distincin entre Procedimientos Tcnico y Lgico del Anlisis Fenomenolgico

    WilliaM barbosa goMes

    Resumo: Em 1986, eu utilizei uma estratgia singela para o exerccio da lgica da fenomenologia com alunos de graduao. So-licitei a eles que descrevessem como seria uma boa aula para estudantes de psicologia em uma universidade. A pergunta era pertinente diante das instabilidades pedaggicas da poca, quando no se tolerava estruturas clssicas de aulas e nem se sabia como articular propostas liberalizantes. Cinco alunos e quatro alunas, entre 18 e 21 anos responderam ao exerccio. Vinte anos depois, revendo o material recolhido, fiquei impressionado com a fora expressiva dos depoimentos e a oportunidade de diferen-ciar alguns aspectos procedurais da anlise fenomenolgica: a distino entre tcnica e lgica. Neste texto, seguindo a fenome-nolgica tridica de Husserl e de Merleau-Ponty, percorro os dois caminhos de anlise, diferenciando procedimentos tcnicos (etapas de organizao do material) e lgicos (movimento reflexivo entre o dado da experincia e o ato da conscincia). A minha concluso que a explanao de mtodos e materiais no se restrinja aos procedimentos tcnicos e organizadores da anlise, mas ressalte a articulao entre a lgica da intencionalidade situada e da intencionalidade aproprivel. Palavras-chave: Tcnica Fenomenolgica; Lgica Fenomenolgica; Gestalt Radical; Ensino-aprendizagem.

    Abstract: In 1986 I used a simple strategy to exercise phenomenological logic with undergraduate students. I asked them to de-scribe how a good class in Psychology would be. The question was relevant due to the pedagogical instabilities of the time. The classical class structures were not tolerated, but it was not clear how to articulate liberal alternatives. The participants were students, with ages between 18 and 21 years old, five males and four females. Twenty years later, after I reviewed the data, I was impressed by the expressiveness strength of those testimonials, and the opportunity to differentiate some procedural aspects of the phenomenological analysis: the distinction between technique and logic. In this paper, I go through two ways of analysis to differentiate technical procedures (i.e. the stages of data organization) from logical procedures (i.e. the reflexive movement be-tween the experiences data and the consciousness act). First, I will follow Husserl and second Merleau-Ponty. I conclude that the explanation of methods and materials shall not be restricted to the technical and organizing procedures of analysis. It shall remark the articulation between the logics of located and appropriative intentionality.Keywords: Phenomenological Technique; Phenomenological Logic; Radical Gestalt; Teaching; Learning.

    Resumen: En el ao de 1986 utilic una estrategia sencilla con los alumnos del curso de graduacin en psicologa, para el ejer-cicio de la lgica de la fenomenologa. Les fue solicitado describir como sera una buena clase para alumnos de psicologa en una Universidad. La pregunta era pertinente delante de la inestabilidad pedaggica de la poca, momento en el cual no eran to-leradas las estructuras clsicas en las clases y tampoco saban como articular propuestas ms liberales. Cinco alumnos y cua-tro alumnas entre 18 y 21 aos, contestaron al ejercicio. Veinte aos ms tarde, revisando los datos de entonces, me impresion la fuerza expresiva de los testimonios y la oportunidad de diferenciar algunos aspectos del procedimiento del anlisis fenome-nolgico: la distincin entre tcnica y lgica. En este texto, basndome en la fenomenolgica tridica de Husserl y de Merleau-Ponty, sigo los dos caminos del anlisis, diferenciando procedimientos tcnicos (etapas de organizacin del material) y lgicos (movimiento reflexivo entre el dato del experimento y el acto de consciencia). La conclusin a que llegu es que la explicacin de los mtodos y materiales no deben limitarse a los procedimientos tcnicos y organizadores del anlisis, pero resaltar la arti-culacin entre la lgica de la intencionalidad ubicada y la intencionalidad apropiable.Palabras-clave: Tcnica Fenomenolgica; Lgica Fenomenolgica; Gestalt Radical; Enseanza; Aprendizaje.

    As pesquisas qualitativas em suas muitas variaes e possibilidades tm prestado grande servio s cincias humanas, sociais e da sade, permitindo o estudo em pro-fundidade de fenmenos para os quais no se teria acesso de outra maneira. H quem afirme que a psicologia passou por duas revolues simultneas no final do sculo XX: as cincias cognitivas (Mahoney, 1993) e as pesquisas quali-tativas (Nicolaci-da-Costa, 2007). Realmente, a dissemina-

    o das pesquisas qualitativas abriu muitas possibilidades de estudo, contribuindo para a elucidao de problemas e de situaes no acessveis por outros mtodos.

    A extensa literatura dedicada introduo da pesqui-sa qualitativa (Denzin & Lincoln, 2000) concentra-se em torno de fundamentos comuns aos diversos mtodos, a saber: a etnografia, a fenomenologia e a semitica. Com efeito, as vrias modalidades de pesquisa qualitativa de-

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    correm de um ou outro desses fundamentos ou da combi-nao ou releitura deles. Propositalmente, tomarei, como justificativa para o meu argumento, exemplos da literatu-ra recente, colocando em suspenso, ao menos nessa in-troduo ao texto, meno aos autores clssicos. Assim, da etnografia (Creswell, 2007) vem o reconhecimento da importncia do contexto e da cultura para decodificao de regras que regulam valores, crenas e comportamen-tos. So regras prprias cultura ou ao contexto e que devem ser compreendidas na perspectiva interna e no externa. Da fenomenologia (Moreira, 2002) vem a preo-cupao com a subjetividade na apropriao do objeto, sendo esta apropriao a relao processual da conscin-cia com a experincia. H aqui o cuidado de distinguir e diferenciar a conscincia enquanto ato e objeto. Tal dis-tino aponta para a relao entre conscincia (sujeito) e experincia (objeto), e para as dificuldades inerentes ultrapassagem do objeto pelo sujeito (ver o que se quer ver), ou do sujeito pelo objeto (ver sem considerar a pers-pectiva do olhar). A fenomenologia oferece recursos for-mais para o pesquisador olhar simultaneamente para o objeto e para si mesmo. Da semitica (Shank, 1995) temos a noo de que as experincias apresentam-se conscin-cia na forma de linguagens, com seus sistemas de signos e significaes. Os sistemas de signos esto organizados em diferentes nveis estruturais que perpassam a forma do fenmeno, em maior ou menor visibilidade. A semi-tica nos oferece os meios para uma compreenso estrutu-ral e Gestltica da situao que queremos compreender, decodificando e especificando as diferenas intra-nveis e inter-nveis.

    Os trs fundamentos indicam que os objetos apresen-tados s pesquisas qualitativas so auto-regulados em contextos, sensveis s tenses entre o que est se apre-sentando ao conhecimento e o que j conhecido, assu-mindo configuraes variadas quanto forma de expres-so e de percepo. Os trs fundamentos priorizam o co-nhecimento de primeira pessoa, mas no desconsideram o olhar objetivo e racional de terceira pessoa, e nem a in-tersubjetividade da segunda pessoa sem a qual no seria possvel a comunicao e, por conseguinte, a pesquisa. Com esses trs fundamentos temos uma base slida para uma pesquisa voltada s qualidades vivenciais que ri-gorosa e racional; Gestltica e sistemtica.

    O objetivo deste texto mostrar como procedimen-tos tcnicos se distinguem de procedimentos lgicos, na prtica de pesquisa qualitativa. Essa distino entre tc-nica e lgica auxilia a realizao da anlise e contribui para a compreenso conjuntural do problema. Dos trs fundamentos a fenomenologia que trata diretamente da relao entre a compreenso do pesquisador e os dados de pesquisa. Essa relao inclui as implicaes concer-nentes ao procedimento tcnico para obteno e organi-zao dos dados para a anlise, e ao procedimento lgico que conduz a anlise. Os autores clssicos de referncia sero Husserl (1859-1938) e Merleau-Ponty (1908-1961).

    A diferena entre procedimentos tcnicos e lgicos ser ilustrada por materiais recolhidos em um exerccio sobre como fazer uma anlise fenomenolgica.

    As consideraes apresentadas no presente texto vm a propsito do sugestivo livro de Daniel Augusto Moreira sobre O Mtodo Fenomenolgico na Pesquisa publicado em 2002, com reimpresso em 2004. Temos a uma indi-cao concreta de que o interesse pelo mtodo fenome-nolgico continua vivo. Com a clareza peculiar ao enge-nheiro, Moreira encontrou um modo inovador e aprecivel para introduzir o mtodo. Ele inicia com uma apresen-tao da cincia formal e factual do velho e bom mto-do experimental, para em seguida introduzir os mtodos qualitativos e, entre eles, as caractersticas singulares da fenomenologia. Contudo, ao exemplificar diferentes pro-postas para o mtodo fenomenolgico, citando Van Kaam (1959)1, Colaizzi (1978), Sanders (1982), e Giorgi (1985), Moreira no diferenciou propriamente procedimentos tcnicos de procedimentos lgicos. Em contraste, Giorgi (2006) foi veemente ao listar e discutir teses de doutora-dos que alegaram orientar-se pelo mtodo fenomenolgico husserliano, mas que confundiram ou no distinguiram tcnica e lgica.

    Distino entre Procedimentos Tcnicos e Lgicos

    Procedimentos tcnicos so aqueles que se referem s etapas que orientam a organizao do material obtido. Giorgi (1985) especificou quatro procedimentos tcnicos para anlise: 1) leitura geral do material, 2) definio de unidades de sentido, 3) expresso das unidades na pers-pectiva escolhida pelo pesquisador, e 4) formulao de uma sntese das unidades2. Em contraste, procedimentos lgicos articulam a racionalidade que conduz a anlise e focalizam a mediao entre o que dado como referncia e o que tomado como significado (Lanigan, 1997). O que est sob constante ateno o papel da mediao, isto , a unificao do ato e do objeto na conscincia. A mediao pode levar a outra mediao e assim sucessivamente, com o risco de se distanciar do referente original.

    O mtodo fenomenolgico um movimento entre re-flexes com a finalidade de conhecer, definir e compreen-der um fenmeno circunscrito a um contexto (um modo de relao), como ocorre nas cincias aplicadas; ou um fenmeno em forma absoluta e generalizvel (um modo de ser), como ocorre nas cincias bsicas. Um aspecto

    1 Adrian Van Kaam (1920-2007) foi pioneiro no uso do mtodo fenomenolgico para a psicologia. Foi quem introduziu uma maneira de realizar pesquisa emprica em fenomenologia, de-pois adotada por Amedeo Giorgi. Foi o fundador do Programa de Psicologia Fenomenolgica da Duquesne University. Com esta nota, presto homenagem a este grande fenomenlogo que faleceu em 17/11/2007, quando este artigo estava sendo escrito.

    2 Ver Giorgi, 1985, p. 10; Moreira 2002, p. 123-124.

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    interessante dessas reflexes o movimento tridico en-tre elas, ou seja, como se movimenta da primeira, para a segunda e da para a terceira reflexo. O fim de um ciclo abre o incio de outro, pois cada reflexo tambm tri-dica e assim sucessivamente. O mtodo fenomenolgico distingue-se pela condio de ser abrangente e transpa-rente em seus passos analticos.

    A lgica tridica nos acompanha desde as anlises anteriores de Aristteles, considerada por ele como a ar-gumentao lgica perfeita. Em Aristteles (rganon), a trade era constituda por duas proposies declarativas que se conectavam de tal modo, permitindo que se dedu-zisse uma concluso. Em Kant (1977) a trade aparece em um texto de 1783, sobre a metafsica futura, na elucidati-va ordem: percepo, entendimento e razo. A trade em Peirce uma reduo das categorias transcendentais de Kant, sendo elas: Possibilidade, Existncia e Mediao. A Possibilidade a propriedade relacional que conta apenas com um termo (Primeiridade). A Existncia uma pro-priedade relacional entre dois termos, ou seja, a relao de interao de um objecto com outro (Secundidade). A Mediao uma propriedade relacional entre trs termos (Terceiridade). Em Husserl (1913/1975, 1933/1977) a re-flexividade apresenta-se em trs etapas: 1) a epoch feno-menolgica, que o retorno para a experincia imediata, isto , para o dado que se presenta conscincia como objeto; 2) a reduo eidtica que transforma a descrio em especificaes proposicionais, requerendo o exerccio da imaginao livre; e 3) anlise transcendental que se constitui na descoberta da intencionalidade, no poden-do ser confundida com a tomada de sentido procedente da experincia inicial. Na anlise transcendental dever esclarecer-se o ato que faz a conexo entre a conscincia e seus objetos, superando a subjetividade com a intersub-jetividade. A intersubjetividade o compartilhamento de subjetividades fazendo possvel a experincia da objeti-vidade. Merleau-Ponty (1945/1994) redefiniu a trade l-gica, trazendo os princpios da fenomenologia ideacional de Husserl para o mundo vivencial, no distinguindo o sujeito do seu corpo e do seu universo. Nessa fenomeno-logia, a descrio (primeira reflexo) uma apropriao da realidade do modo que ela , ou seja, tomar o que possivel, dada a condio humana de ser um self corpo-rificado com o poder do movimento. A reduo (segun-da reflexo) concentra-se na distino entre este self cor-porificado e o fenmeno que percebe, isto , o self sendo diferenciado do outro e da coisa percebida. A interpreta-o (terceira reflexo) o encontro da intencionalidade que o objeto traz com a intencionalidade do sujeito que se apropria do objeto. Neste ponto, o pesquisador assu-me uma posio de crtico e de transformador, pois de-tm um conhecimento privilegiado e est em condies de acionar estratgias de mudanas, se for o caso. Lanigan (1992) traz para a trade lgica a influncia da semiolo-gia de Saussure, redefinindo a dualidade tradicional de significante e significado numa trade, na qual a descri-

    o especifica um discurso comunicativo (signo); a redu-o extrai aqueles elementos que expresam a essncia da descrio (significante); e a interpretao define o que essencial e revelador no que foi descrito (significado). A preocupao com a seqncia lgica tridica est tambm em manuais que tratam de aspectos prticos da pesquisa qualitativa. Patton (1990) refere-se descrio qualitati-va, anlise indutiva, e anlise lgica; e Yin (1994) descrio, ao entendimento e explicao.

    Exerccio Uma Boa Aula de Psicologia?

    No segundo semestre de 1986, em uma de minhas aulas sobre pesquisa qualitativa no Curso de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul solicitei aos alunos presentes que respondessem a uma pergunta sobre o tema aula, para em seguida exercitarmos a trade reflexiva da fenomenologia. A enunciao da tarefa foi a seguinte: Descreva como seria uma boa aula para es-tudantes de psicologia numa universidade. Cinco alu-nos e quatro alunas, entre 18 e 21 anos responderam ao exerccio. A enunciao era ampla e permitia que os par-ticipantes seguissem diferentes abordagens em suas res-postas. Na poca passvamos por grandes instabilidades pedaggicas. No havia tolerncia para estruturas clssi-cas de aula. Itens como aulas expositivas, livros textos, manuais, exigncia de freqncia e de provas eram pr-ticas mal-vistas.

    O tema do exerccio ainda nos colocava numa situa-o privilegiada para entender um conceito fenomenol-gico bsico: a intersubjetividade ou a experincia comum que nos une e nos afirma como seres comunicantes. A intersubjetividade definida como a comunicao das conscincias individuais, umas com as outras, realizada com base na reciprocidade (Kaelin & Schrag, 1989). Essa reciprocidade, no caso deste exerccio, presentava-se3 no convvio com a escola e com as atividades de aula, e se-ria comum a todos aqueles que fossem capazes de ler o presente texto. Todos ns sabemos que a atividade con-vencional de aula implica em algum que ensina ou que viabiliza condies para que outros aprendam e cons-truam seu conhecimento. Tambm conhecemos as con-dies gerais das escolas pblicas brasileiras. Sabemos distinguir uma escola particular para ricos e uma escola pblica de periferia, e distinguimos facilmente os prdios de uma escola pblica que se caracterizam quase sempre pelo abandono e mal-trato.

    Nosso convvio com a atividade de aula evoca as mui-tas variedades desta experincia. Certamente, em nossa memria existem lembranas de aulas agradveis e pro-dutivas, de professores interessantes e eficientes, e de colegas amveis e companheiros. No entanto, no pode-

    3 O verbo presentar pouco usado, no entanto o melhor modo de enfatizar a condio fenomenolgica de um mundo que se mostra antes de qualquer representao.

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    mos negar que freqentamos aulas montonas e impro-dutivas, que tivemos professores relapsos e ineficientes, e colegas antipticos. A combinao destes contrastes tambm uma experincia conhecida: Professores mon-tonos, mas eficientes; aulas cansativas, mas importantes; professores simpticos e comunicativos, mas que pouco acrescentou turma. Estivemos na aula em diferentes es-tados de disposio fsica. Algumas vezes desfrutamos o melhor do nosso alerta mental, noutras estvamos can-sados, adoentados, ou simplesmente com o pensamento bem longe dali. De qualquer maneira, o cotidiano da ex-perincia em aula como os demais cotidianos de nos-sas vidas: uma variao de diferentes emoes, estados de nimo e disposio fsica. O conhecimento da situa-o de aula simultaneamente uma experincia comum e singular. comum porque todos a conhecemos, enquan-to vivncia bsica na nossa formao. singular porque cada um de ns tem a sua prpria histria com relao escola, a professores, a colegas e a diferentes disciplinas. Desta forma, a experincia de aula se constitui em par-metro que funciona como referncia em todas s vezes que abordamos esse tema.

    Critrio de Anlise

    O material recolhido foi analisado em trs etapas, cada etapa seguindo as trs reflexes fenomenolgicas (descri-o, reduo e interpretao), distinguindo em cada uma, os procedimentos tcnicos dos lgicos.

    Na Primeira Etapa (descrio) procedi a leitura e a ordenao dos depoimentos de 1 a 9 (Anexo A), tendo como critrio a abrangncia e a perspectiva apresentada pelo participante. Assim, recebeu o nmero 1 aquele de-poimento definiu a boa aula, listando seus fatores cons-tituintes e consensuais. Os depoimentos 2, 3, 5, 6, 7, e 8 foram variaes e ampliaes dos constituintes da boa aula j identificados na resposta 1. A resposta 4 foi tam-bm uma variao das respostas mencionadas. No entan-to, o participante enfatizou a experincia pessoal dele, isto , como se sentia quando numa boa aula. Por fim, o depoimento 9 foi uma viso futurista de uma aula. Note-se nesta descrio fenomenolgica tcnica a emergncia da lgica do pesquisador na ordenao das respostas que no deixa de ser uma reduo simplificada e uma inter-pretao intermediria.

    Na segunda etapa (reduo) revi cada depoimento para demarcar as unidades de sentido, isto , identificar e no-mear percepes, experincias, opinies, conhecimentos e sentimentos expressos no texto. Um exemplo desse pro-cedimento tcnico est na Tabela 1. As unidades foram de-finidas por termos nativos extrados das prprias palavras do participante. A demarcao das unidades de sentido seguiu um modelo conservador de reescrita. No entanto, tal procedimento no realmente necessrio. Ele pode ser simplificado em indicaes de frases chaves elucidativas

    diretamente no texto recolhido, denominadas de termos nativos. Em seguida os termos nativos foram reduzidos para termos analticos que foi a aglutinao das unidades por convergncia temtica. A transformao de termos na-tivos em analticos permitiu a proposio de cinco grandes temas: 1) condies gerais da aula, que incluiu ambiente fsico, relacionamento interpessoal entre professor e alu-nos, papel do professor, fatores psicolgicos como moti-vao de alunos e professor, relao da aula com o curso do aluno, tamanho da turma e infra-estrutura; 2) papel do estudante, que inclui aspectos como a liberdade de opo do aluno para estar em aula, interesse pela disciplina, re-quisitos a serem atendidos a fim de estar preparado para a aula, por exemplo, conhecimento prvio, maturidade pessoal, condies fsicas, e treino para participar da aula; 3) papel do professor, que a preparao prtica e terica nas especificidades da disciplina, e o questionamento so-bre ter ou no ter professor; 4) dinmica da boa aula, que incluiu os aspectos operacionais, por exemplo, modo de iniciar a aula, escolha de assunto, participao dos alu-nos, modos de interveno do professor e de finalizao das atividades do dia; e 5) informaes complementares, que elucidavam determinados aspectos das perspectivas apresentadas nas respostas.

    Na terceira etapa (interpretao) preparei a sntese des-critiva que ser a concretude intersubjetiva da pesquisa. Os procedimentos tcnicos e lgicos das duas etapas ante-riores foram apenas indicados e exemplificados. Exercem o mesmo papel de dados brutos da pesquisa quantitativa que, enquanto tais so ausncias representadas por pa-rmetros estatsticos e interpretadas com base em tabe-las e resultados numricos. A trade lgica tambm est presente na anlise quantitativa, certamente como dom-nio de procedimento tcnico e de lgica interpretativa. A clara descrio dos procedimentos tcnicos favorece a replicao do estudo para comparao dos achados. A re-plicao da pesquisa fenomenolgica apresenta-se como uma tarefa concomitante leitura, tendo como ponto de partida a sntese descritiva. Essa sntese estabelece a in-terao intersubjetiva entre o pesquisador e o leitor, para acompanhamento e crtica da anlise proposta. Ao mes-mo tempo, a descrio o fim de um ciclo, no qual exerce simultaneamente a funo de interpretao, e o incio de um novo ciclo de anlise. Desta forma, a exposio dos resultados seguir a seqncia seguinte: 1) descrio, que trar o entendimento do que uma boa aula na intencio-nalidade dos participantes; 2) reduo, que apontar os elementos essenciais da descrio, utilizando para tanto o exerccio das variaes imaginrias (como poderia ser com a presena disto e a ausncia daquilo e assim suces-sivamente); e 3) interpretao, que far o confronto das intencionalidades, sendo o pesquisador livre para ima-ginar, criticar e propor, usufruindo da mesma liberda-de das interpretaes especulativas dos pesquisadores quantitativos. Essa ltima parte da pesquisa eminen-temente lgica.

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    Descrio Fenomenolgica

    Uma boa aula um processo de envolvimento pro-dutivo entre um grupo de pessoas interessadas num de-terminado tema que denominado turma, e uma outra pessoa que coordena os trabalhos e que denominado de orientador, professor ou coordenador. A boa aula pro-move a explorao e aprofundamento do tema escolhido atravs da troca de experincias e de conhecimentos en-tre os membros da turma, que so denominados de alu-nos. Enquanto processo produtivo, a aula facilita a me-lhor compreenso do tema, suscita debates despertando novas dvidas. Esse processo de troca de vivncias e in-formaes denominado de crescimento. O conceito de crescimento amplo, pois indica o desenvolvimento dos alunos em todos os sentidos.

    Tabela 1: Exemplo de definio temtica e identificao de termos nativos

    TEMATIZAO TRANSFORMAO

    1.1 difcil caracterizar o que vem ser uma boa aula, pois, para mim, isto significa defi-nir e limitar todo um processo de interao de n variveis que se combinam e determi-nam uma boa aula.

    1.1 Boa Aula/defnio: - Caracterizao difcil, pois requer definio e limitao de um processo de interao e combinao de n variveis. (1.1).

    1.2 Entre estas variveis esto a turma, o professor, o assunto, a maneira como discutido, o manejo do professor. (Se um professor autoritrio, democr-tico, pseudo-democrtico), o interesse pelo assunto, a serie-dade necessria, para se tratar o assunto, a viso prtica da-quilo que se est aprendendo, o levantamento de necessidades de se ir mais alm daquilo que se discute na aula, a interao professor aluno, o momento espao-temporal da aula, o ni-mo das pessoas presentes, etc.

    1.2 Boa Aula/lista possvel de variveis:- turma;- professor;- assunto (tema);- a maneira como o tema dis-cutido;- interesse pelo assunto;- seriedade necessria;- viso prtica do que est sen-do aprendido;- levantamento de necessidade de ir alm;- interao professor aluno;- nimo das pessoas presentes (1.2).

    1.3 Dadas inmeras variveis que podem contribuir para este processo no creio que se possa definir uma boa aula.

    1.3 Boa Aula/definio:- constatao de que inmeras variveis contribuem para o processo (boa aula) impedem a proposio de uma definio. (1.3).

    1.4 E sim que quando existe uma inter-relao harmni-ca de todas as variveis e um progresso com crescimento de todos os participantes da aula-processo, crescimento em to-dos os sentidos, a sim, podere-mos dizer, com mais preciso, que isso caracteriza o que vem a ser uma boa aula.

    1.4 Boa Aula/definio:- um processo que aconte-ce;- quando existe uma inter-rela-o harmnica de as variveis;- quando ocorre um cresci-mento de todos os participan-tes;- quando este crescimento em todos os sentidos (1.4).

    Depoimento do Participante 1

    A boa aula acontece em ambiente fsico confortvel, limpo, com cadeiras macias, com boas condies de lumi-nosidade e silncio, onde os participantes possam ouvir uns aos outros. A aula pode ser tanto em uma sala quanto ao ar livre. Seja qual for o local, ela estar sempre prxi-ma a uma biblioteca com acervo adequado.

    A turma pequena e se posiciona em crculo para faci-litar a troca de conhecimentos e de opinio crtica. Os alu-nos esto nesta turma por opo. O tema de interesse e reconhecido como pertinente para a formao na profisso e especialidade escolhida. H tambm nesses alunos uma clareza quanto aos motivos que embasaram a escolhas das disciplinas. Observa-se neles maturidade pessoal e disposi-o mental e fsica para o trabalho. Todos eles apresentam boas condies de tempo e de material para o estudo.

    Uma boa aula preparada com antecedncia. Primeiro escolhe-se o tema especfico do dia. Esta escolha consen-sual entre os participantes (professor e alunos). A seguir, escolhe-se o material que ser previamente lido por todos. A leitura produz reflexes e inquietaes e prepara a par-ticipao dos alunos para as exposies e debates.

    O professor, se houver, um profissional competente e experiente, com conhecimento amplo e profundo em seus aspectos tericos e prticos. Por estar familiarizado com o tema, ele trar elaboraes pessoais, no se restringindo as snteses ou sistematizaes de leituras. O professor um apaixonado pelo tema e est empenhado em apresent-lo aos alunos. Cabe ao professor: coordenar as atividades, esclarecer ou suscitar dvidas, articular as contribuies dos alunos, trazer subsdios e contribuies diferenciadas, e apresentar uma sntese do material discutido de modo a melhor organiz-lo e integr-lo.

    O professor pode intervir nas atividades por iniciati-va prpria ou por solicitao de algum aluno. Contudo, o professor no uma condio necessria boa aula. Os alunos podero escolher entre eles um colega com maior conhecimento e experincia para exercer essa fun-o. Outro modo modificar o conceito de turma para incluir alunos em diferentes nveis de conhecimento. Nesse caso, os mais adiantados chamam a ateno dos mais novos para aspectos que eles no esto perceben-do. Em contrapartida, os mais novos instigam aos mais adiantados a revisarem criticamente seus conhecimentos mais fundamentais.

    A boa aula inicia de vrias maneiras. Pode iniciar com proposta clara do professor ou de algum aluno quanto ex-plorao e discusso do tema especificado, ou mesmo com uma discusso livre sobre o tema em que os participantes trazem diversos aspectos do material lido e refletido. Outro modo de iniciar solicitar aos alunos que j possuam co-nhecimento do tema a introduzi-lo criticamente. De qual-quer modo, a turma enquanto grupo que tem a palavra final sobre o melhor modo de conduzir o trabalho.

    Uma boa aula no restrita a exposies do professor, dos alunos ou da participao de todo o grupo em forma de seminrio (uma situao de aula em que em cada ses-

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    so um ou mais participantes se encarregam da apresen-tao de um determinado aspecto do tema geral). Outras atividades que tambm ocorrem so as exemplificaes de como levar o tema em estudo para a prtica, a compa-rao de outras perspectivas ou abordagens sobre o tema em discusso e, ainda, a apresentao de palestras por profissionais especializados.

    Em uma boa aula, vez por outra, acontece um epis-dio engraado o que diverte e evita a monotonia. Nessa boa aula a referncia de tempo passa a ser as indicaes fsicas de cansao ou solicitaes de outros compromissos assumidos. O aluno sente-se parte integrante da constru-o e constituio de algo que se configura e se transfor-ma com suas prprias mos. A aula termina com as indi-caes dos alunos de que j alcanaram seus limites de conhecimento para aquele dia. Por fim, encaminha-se a aula seguinte, se for o caso. Essa boa aula conta com ex-celente infra-estrutura. Taqugrafos e datilgrafos trans-crevem os debates e preparam as sinopses que servem de consulta e de sistematizao para os estudos dos alunos e do professor. As aulas so tambm gravadas em videotei-pe e podem ser revistas por todos os alunos antes da aula seguinte, espontaneamente. Esses teipes e sinopses tam-bm esto acessveis aos alunos que faltaram. Nenhum aluno comparece a aula sem est informado do que ocor-reu na aula anterior. O relacionamento interpessoal entre alunos, e entre alunos e professor da melhor qualidade. Todos se tratam com cordialidade e respeito mtuo e sa-bem conviver com suas diferenas.

    Esclarecimentos Lgicos da Descrio

    A descrio para Husserl (1913/1975) o retorno experincia imediata da conscincia, ocorrendo neste momento a epoch ou suspenso das pressuposies da-quele que descreve. O que est sendo descrito no a situao real do conjunto de respostas, mas a conscin-cia essencial e delimitadora do conjunto de respostas de quem descreve. Para Merleau-Ponty (1945/1994; 1964) a descrio reconhece que o fato existe (a aula), antes de qualquer anlise que eu possa fazer sobre ele (fundamen-to etnogrfico). Enquanto fenmeno, eu tomo a aparncia da boa aula na forma em que foi expressa, sendo a minha descrio a transio entre o discurso dos outros e o meu discurso (semitica). Nesta descrio, aquele que descre-ve desaparece abrindo espao para o aparecimento do fe-nmeno, no havendo nesta transio nem experincia interna e nem externa (fenomenologia).

    Reduo Fenomenolgica

    A reduo fenomenolgica inicia-se estabelecendo uma distino entre aula e boa aula. O enunciado como seria uma boa aula foi respondido em termos das con-

    dies necessrias para que uma aula fosse idealmente produtiva. A pergunta em si j foi um convite para uma explorao imaginativa. As respostas reconheceram que uma aula ocorre em uma determinada estrutura, combi-nando diversos elementos que foram especificados. Neste sentido, h uma variao de nfase entre os depoimen-tos: eles podem concentrar-se na informao otimizada dos elementos da boa aula, podem destacar um par de elementos que por contraste ou combinao podem ser importantes na realizao da boa aula; ou podem reco-nhecer a estrutura tradicional de aula para depois modi-fic-la e defini-la em termos possveis, mas nem sempre convencionais.

    Qual seria a distncia da aula real para a aula ideal que estes alunos imaginaram em suas descries? Um primeiro passo para responder a pergunta localizar o contexto referencial dos alunos, ou seja, qual curso, qual universidade e qual poca. Para tanto vou recorrer a um dilogo imaginrio com o mundo vivido pelos partici-pantes, procurando trazer a infra-estrutura de vivncia e imaginar uma possvel justificao.

    O contexto um curso de psicologia de uma univer-sidade pblica brasileira em 1986. O ambiente geral de aula em que eles convivem em um prdio de algumas dcadas de uso, no muito bonito. H certo esforo de limpeza, mas o piso parece no receb-la bem, pois nunca me aparece muito limpo. H arquitetura original do pr-dio violada constantemente para atender demandas das mais diversas, sendo os espaos reservados para convvio transformados em salas de professores ou laboratrios, copiadoras, etc. As paredes podem conter pichaes, as salas nem sempre contam com ambientao climtica e tratamento acstico. O campus no havia descoberto ain-da o conceito de convvio e de bem-estar universitrio. As aulas competiam com todo o barulho que vinha das ruas de uma grande cidade. As cadeiras no eram anat-micas e podiam at estar quebradas, quando no com um prego meio solto que poderia rasgar a roupa. A biblioteca dispunha de poucos livros e de espaos limitados para leitura. Os alunos eram selecionados em concurso vesti-bular muito concorrido, havendo grande chance de que as vagas fossem ocupadas pelos mais bem preparados e oriundos de escolas particulares bem equipadas. Por outro lado, o curso caracterizava pela tradio profissionalizante com pouca ateno pesquisa. Uma tradio consistente com as condies histricas da organizao dos cursos de psicologia no Brasil. Esses cursos, em seus primrdios, contaram com a colaborao professores transferidos de outras disciplinas, sem maiores vnculos com a psicolo-gia que se desenvolvia na Europa e nos Estados Unidos, embora muito deles tenha sido grandes empreendedores na implantao de diversas prticas, principalmente no campo da avaliao psicolgica.

    Esses alunos viviam numa poca em que o pas saia de um regime ditatorial e estava ansioso por prticas par-ticipativas. Qualquer funo que representasse autoridade

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    era mal-vista e devia ser afastada. Esses alunos questio-navam a presena, mas no a funo do professor, certa-mente entendido como facilitador. Desta forma, com-preensiva a posio de que poderia haver um professor, mas se houvesse deveria preencher determinados pr-re-quisitos, exatamente a falta histrica referida acima, mas at certo ponto, Nem sempre pesquisadores reconhecidos so bons professores nos termos tradicionais, mas podem passar com xito uma perspectiva instrumental, crtica e produtiva do conhecimento.

    A dinmica da aula e tambm seu contedo centra-lizado no debate, na crtica e na participao. Os infor-mantes parecem acreditar que o conhecimento produto progressivo do debate. O debate contm algumas regras: os participantes no devero se alongar nas intervenes e devem estar atentos as colocaes e contribuies dos colegas. O debate uma atividade to importante nesta boa aula que participantes devem se apresentar prepara-dos na arte da argumentao. As dificuldades interpes-soais inerentes ao convvio humano foram reconhecidas na figura de autoridade do professor que pode polarizar a relao, e na intolerncia e no abuso da crtica entre colegas que pode trazer inimizades e inibies. A crtica bem vinda, mas no pode ser precipitada, requer aten-o, reflexo e mesmo leituras.

    Os informantes reconhecem que uma boa aula de-pende de alunos bem preparados. Mas como criar con-dies para esta preparao? Tais condies no pode-ro ser exigncias do professor, nem do regulamento do curso. O impasse resolvido no paradoxo de que sempre os alunos cuidariam de preparao prvia sem exceo, mas voluntariamente. H aqui o reconhecimento de uma exigncia, mas desde que seja atendida pela autoconsci-ncia e autocrtica do aluno, uma expresso legtima de sua opo, interesse e desejo de estar naquela atividade. No deixa de ser interessante esta definio internaliza-da do lcus de controle.

    A nfase no debate e na crtica traz outro aspecto im-portante. Revela que a natureza do conhecimento que es-tes alunos esto habituados no de ordem taxonmica ou tcnica, mas interpretativa e consensual. Parece muito mais o desenvolvimento de uma habilidade argumentativa e de um exerccio de crtica intelectual, talvez vivencial, do que um conhecimento cientificamente embasado para sustentar uma prtica profissional e tica.

    Para estes alunos uma aula deve sempre ser um mo-mento de excepcional grandeza intelectual da qual se ex-trai insights arrebatadores, jamais imaginados. Essa cren-a deve-se, certamente, a uma contextualizao histrica do ensino universitrio brasileiro. Existiu at a dcada de sessenta uma tradio de professores bem falantes e com conhecimentos enciclopdicos. Estes professores, com suas exposies abrangentes e empolgantes compensa-vam a falta de livros e revistas nas bibliotecas. Eles eram estudiosos de grande curiosidade, proprietrios de boas bibliotecas, bem informados, mas sem preparo em pesqui-

    sa emprica e em produo de conhecimento. Animavam as aulas, davam boas orientaes profissionais, entusias-mavam o estudante para o estudo, mas eram repetidores. No foram, com raras excees, exemplos de cientistas. Legaram, contudo, o mito da aula magna, aquela que sur-preende e ultrapassa.

    Estes estudantes representam uma gerao que chega-ram ao curso universitrio em meio a um vazio docente. Os professores da antiga tradio haviam desaparecido pela reforma universitria de 1970. Professores realmen-te competentes foram afastados da Universidade pela di-tadura militar. No vazio docente da dcada de setenta, recrutou-se professores para a universidade de muitas maneiras. No entanto, foram raras as contrataes pela via do concurso pblico que elegia como critrio a titula-o acadmica, acompanhada da evidncia de produo cientfica e do desempenho didtico.

    Esta situao agravou-se, sobremaneira, na rea da psicologia pela influncia difusa e muito persistente da didtica humanista. Elas foram decorrentes de transpo-sies clnicas para a escola, sem amparo sistemtico na evidncia emprica. Tambm no avaliava os resultados produzidos, quando o fez, a decepo foi grande. Para essa cultura pedaggica, levar o programa da disciplina no in-cio do semestre era um desrespeito ao aluno. Ele deveria ser ouvido antes de qualquer deciso sobre o programa.

    No lugar das aulas expositivas dos catedrticos vie-ram os seminrios e as tcnicas de grupo. Dessa ltima, a mais popular era a diviso da turma em vrios grupos, reunidos na mesma sala para a leitura de um determina-do texto. O professor percorria os grupos para um ou ou-tro esclarecimento e, quem sabe, oferecer uma pergunta para reflexo.

    A falta de tradio acadmica na rea da psicologia fez com que estes alunos no convivessem com professores preparados para trabalhar com as disciplinas bsicas e in-trodutrias do curso. Como o currculo tinha que ser obe-decido, pode-se imaginar o deslocamento de professores, contra vontade, de disciplinas profissionalizantes, criando a situao do no-conhecimento e da no-paixo.

    Na poca havia restries tanto ao livro texto, quanto aos modelos de procedimentos e tcnicas. Esses recursos eram mal-vistos pelos riscos que ofereciam, limitando a explorao diversificada e criativa do aluno. Os alunos deveriam sentir-se livres para explorar o conhecimento nas suas mais variadas fontes.

    H no depoimento dos participantes um forte conte-do hedonista. A variao imaginria para a descoberta do invariante deste sentido trouxe ambigidades. De um lado, uma atividade ter xito se tambm se constitui em prazer. Por outro, estamos diante de uma gerao hedo-nista por conta de mudanas importantes na estrutura familiar, nas relaes entre pais e filhos, e no reinado da vontade dos filhos em vigncia na poca. Tambm se sabe que a realizao bem sucedida de uma tarefa requer, alm da inspirao, muito esforo e transpirao.

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    Esclarecimentos Lgicos da Reduo

    A reduo apresentada alinha-se com a proposio de Husserl, recorrendo imaginao livre para estabele-cer um dilogo crtico com a sntese descritiva. A epoch ocorreu na primeira reflexo e agora o ato da conscincia comea a se diferenciar do seu objeto, com a expanso do eu do pesquisador e o encolhimento do eu do outro. Aos poucos a inteno do pesquisador vai se tornando presen-te e os seus vises surgem na realizao da Gestalt radical da experincia descrita. No entanto, na diferenciao entre o eu e o outro, o ato intencional conduz a construo de um novo objeto que ser a interpretao. Para Husserl ser a descoberta da intencionalidade, e para Merleau-Ponty o significado da experincia, aqui presente nas demandas dos participantes e nas delimitaes do mundo.

    Interpretao Fenomenolgica

    Aprendemos com a descrio que uma boa aula um processo de troca de conhecimentos e experincias, em condies timas de ambiente fsico, de convvio inter-pessoal, de preparo intelectual e de boa disposio dos participantes. A dinmica de trabalho centrada no de-bate, em clima de liberdade e de respeito mtuo. A re-duo ajudou-nos a comparar a imaginao idealizada enquanto movimento desejante e a vivncia da aula real, enquanto definio de ausncias pela intensificao das nfases. A comparao foi possvel atravs da identifi-cao e exame contextual da aula real destes estudantes e do mundo histrico da poca. A comparao trouxe a Gestalt radical da experincia.

    O que emerge para a interpretao um movimento entre uma aula real precria, na qual vrios valores so transgredidos, e uma aula ideal, na qual tais valores so resgatados e experimentados imaginativamente em toda plenitude. Estes informantes, ao descreverem a aula ideal denunciam a aula real, precria, que no deveria existir. Ao apontar para a aula ideal, eles demolem a aula tradi-cional conhecida, mas preservam a aula clssica univer-sitria, esta sim a grande ausente dos depoimentos e do contexto desses participantes.

    A preservao da aula clssica universitria est no reconhecimento da diferenciao operacional de papis e na estratificao de conhecimentos e experincias dos participantes. Para a boa aula, tem que haver papis fun-cionais de planejamento e coordenao, e nveis de co-nhecimento diferenciados. Quanto dinmica, apesar da preferncia pelo debate, no se descarta a exposio, deste que seja apresentada com competncia.

    O questionamento da figura do professor no descon-sidera a necessidade do papel funcional de coordenao. Questiona-se, sim, aquele participante que embora inves-tido de autoridade funcional, apresenta-se destitudo de autoridade referencial. O que esses estudantes desejavam

    encontrar na boa aula era professor com leitura e articula-o prpria, conhecedor e inovador da prtica, e capaz de globalizar e sistematizar o conhecimento. Nesta sntese os estudantes identificam tanto o pesquisador professor que est envolvido em linha de pesquisa bem definida, em pro-duo continuada de conhecimento; quanto o professor pesquisador que capaz e com competncia de extrapolar os limites de sua pesquisa para oferecer uma viso mais geral e sistematizada da sua rea. Claro que eles no trou-xeram essa observao, at porque a desconheciam. Mas essa condio resolveria a produo de material didtico que para eles seriam as transcries dos debates.

    A ausncia deste professor, com formao prpria e criatividade produtiva, desequilibra os constituintes da aula. Curiosamente, esta falta reconhecida, no entanto dada como aspirao impossvel. Veja-se, que no esforo de remediar, estes estudantes recorrem aos grandes valores da poca: igualdade, liberdade e participao. As duas primei-ras reflexes mostraram que os participantes da pesquisa foram bem sucedidos ao definirem os problemas. No en-tanto, a interpretao agora mostra que ao apontar solues eles no ousaram romper fronteiras tradicionais. Por exem-plo, no caso da infra-estrutura eles se limitaram a apontar para inovaes tecnolgicas que embora existentes, ainda eram faltas notrias na universidade da poca.

    Quanto ao comportamento dos estudantes, h o reco-nhecimento da estrutura de aula clssica. Pois se requer deles: envolvimento efetivo nas disciplinas no estudo e na participao. No entanto, tal exigncia deve ser algu-ma coisa internalizada e autoconsciente, no externa e imposta. Tal condio poderia ser alcanada com prepa-rao especializada, construda na prpria seqncia e progresso curricular.

    A primeira reflexo mostrou que a boa aula provocaria um envolvimento to profundo que haveria dificuldades de estipulao de horrios ou outros aspectos operacio-nais necessrios organizao das atividades universit-rias. Nessa lgica, a boa aula seria um empreendimento invivel. Contudo, esta fora de expresso um desloca-mento de nfase para anunciar o comprometimento com uma obra em construo a qual se deseja avanar apai-xonadamente. O que ocorre aqui a no diferenciao de espaos, certamente pela confuso universitria que a segunda reflexo nos apontou. A aula no parte de um processo maior. , para os participantes, um fato em si com uma intensidade e energia prpria que cessaria, apenas, na exausto. Essa dificuldade de estabelecer limites de espao e tempo uma verdade para a realizao de qual-quer tarefa criativa. Por exemplo, a pesquisa uma tarefa criativa, intensa, com dificuldades de se estabelecer entre limites habituais, seja em procedimentos de laboratrio, seja na preparao de textos e conferncias. Esses estu-dantes desconheciam esse outro lado universitrio, mas sentiam a falta de alguma coisa nessa direo.

    A interpretao mostra, enfim, que ao isolarmos os variantes temporais (os valores de uma poca) e ao defi-

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    nirmos os invariantes constitucionais (os elementos da atividade em si), chegamos a uma definio de boa aula, que na verdade uma aula universitria clssica. Se o contexto da boa aula um pas no qual a educao um valor fundamental, resolve-se o problema do ambiente fsico, da biblioteca e da infra-estrutura. Ento, compe-tncia, seriedade e comprometimento passam a ser con-dies necessrias, enquanto interesse, compartilhamento e paixo tornam-se condies suficientes para que real-mente exista uma aula que pode at ser boa. No entan-to, os depoimentos trazem um clamor por uma reforma universitria capaz de dar forma e sentido as suas aes: reviso de prticas arcaicas e burocrticas e implantao de prticas flexveis e pr-ativas, voltada ao incremento da aprendizagem autnoma e continuada.

    Esclarecimentos Lgicos da Interpretao

    A terceira reflexo foi definida por Husserl (1913/1975) de reduo transcendental. O interesse no mais est vol-tado experincia primordial, aquela do objeto da per-cepo (primeira reflexo), mas concentrada na lgica do eu que por seu afeto, cognio e conao atribui inten-o aos objetos e aos atos da conscincia. A crtica meto-dolgica terceira reflexo quanto ao risco de subjeti-vismo: as falhas na captao de uma rede intersubjetiva. Em contraposio, as contribuies sero a abstrao e a generalizao do fenmeno. Tem-se ento uma proprie-dade correspondente ao conceito em uma cincia bsica. Merleau-Ponty (1945/1994) recolocou a terceira reflexo a servio das cincias sociais, como especificao de um sentido que est posto ao mundo, como uma nova cons-cincia impelindo-me ao movimento, ao e mudan-a. Curiosamente, esse exerccio fenomenolgico sobre a boa aula presta-se as duas proposies fenomenolgicas, pois define os elementos constitutivos da aula (modo de ser), mas vocaliza questes referentes ao desempenho e aproveitamento da aula (modo de relao).

    Consideraes Finais

    As consideraes finais retomam o problema da distin-o entre procedimentos tcnicos e lgicos em quatro as-pectos: 1) reconhecimento da pouca explicitao da lgica tridica nas pesquisas fenomenolgicas; 2) complexidades expositivas da lgica tridica; 3) relevncia do mtodo fe-nomenolgico; e 4) relaes entre mtodo e cincia.

    Entre os anos de 2000 e 20064, foram publicados 53 artigos no Journal of Phenomenological Psychology, 18 dos

    4 Levantamento realizado por Thiago Gomes de Castro em 2007, como parte da preparao de dissertao em anda-mento no Curso de Mestrado em Psicologia da UFRGS, com ttulo provisrio de Eventos marcantes em psicoterapia: Da fenomenologia do relato autoconscincia.

    quais eram relatos de pesquisa emprica. Nesses artigos, a trade lgica no era uma constante, tampouco a expli-citao de procedimentos fenomenolgicos bsicos como a epoch. Com efeito, no se pode esperar algum tipo de nfase entre procedimentos tcnicos e lgicos, como pr-tica corrente. trabalhoso, complexo e dispendioso. No entanto, espera-se que a explanao de mtodos e mate-riais no se contente com a exposio de procedimentos tcnicos e organizadores da anlise, negligenciando a l-gica da intencionalidade situada e a lgica da intencio-nalidade aproprivel, aquela que emana dos objetos. Tal procedimento ressalta o objeto, mas omite o ato da cons-cincia. Lanigan (1997) ilustra com clareza a lgica tri-dica ao distinguir: tipos de evidncias, estrutura de an-lise, e regras de julgamento para validade. Os materiais analisados por Lanigan foram relatos recolhidos por A. R. Luria (1974/1994) sobre desenvolvimento cognitivo em populaes camponesas. No entanto, o artigo de Lanigan mais uma exceo do que uma regra.

    Tcnicas e procedimentos so orientados por uma no-o econmica de ganhos e perdas. A explicitao tcnica esperada como sustentao da relao entre instrumen-tos e anlise de dados. A explicitao lgica fica implcita na indicao de que o mtodo fenomenolgico. Desta forma, a apresentao da anlise em trs passos fica ape-nas subtendida ou restrita a exposio terica do mtodo, distanciada dos estudos empricos.

    Tais consideraes levam-nos inevitvel discusso da relao entre ontologia (o que que estou estudando) e epistemologia (como estou estudando). De fato, ontologias fortes dispensam epistemologias sofisticadas. Pesquisas qualitativas bem sucedidas esto associadas a ontologias fortes, aquelas cujos dados falam por si, sem necessidade de maiores anlises ou demonstraes. Exemplos desse tipo procedem das reas da administrao e marketing (Milliken, 2001) que pelas implicaes econmicas dis-pensam maiores comentrios. Tal assertiva uma boa jus-tificativa para o uso dos mtodos qualitativos. Pergunta-se, ento, qual a contribuio diferenciadora da feno-menologia? DeSouza, Gomes e McCarthy (2005) sugerem que a atitude tica do pesquisador frente ao problema que estuda e ao modo como divulga as concluses. tica que se viabiliza na assimilao lgica das trs reflexes, seja ela em um, dois, ou trs atos. A assero contempla a diversidade de mtodos e os vrios entendimentos de fenomenologia. Contudo, a epistemologia no pode ga-nhar proeminncia em relao ontologia. A funo fe-nomenolgica explicitar a epistemologia manifesta nos atos da conscincia e esta explicitao que transforma lgica em tica.

    Mtodos e procedimentos esto a servio da cincia. Dito simplesmente, o que caracteriza a cincia a busca do conhecimento, com o propsito de esclarecer e de in-dicar intervenes que desvelem os mistrios do mundo e de todos os seres que o constituem. Os fins so bsicos: promoo da qualidade de vida e da preservao das con-

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    dies que viabilizam a vida de novas geraes. A cincia debrua-se sobre os desafios que o conhecimento e o mun-do nos trazem continuadamente, em todos os domnios ontolgicos (fsico, biolgico, psicolgico, social, cultural e interativo). Nestas circunstancias, mtodos so meios e possibilidades que passam a nos interessar, enquanto arcabouo filosfico, historicidade, ou encaminhamento que leve s respostas procuradas. Mtodos so acrscimos que aprimoram a nossa maneira de ver, sentir e pensar o mundo e as suas intrincadas relaes. Eles so amplifica-es de intencionalidades (Ihde, 1979). Contudo, o modo de explicitao do ver, do sentir e do pensar daquele que pesquisa deve se afastar dos riscos da tica retrica. Neste tipo de retrica, a construo do argumento conforma-se ao que o pesquisador quer defender ou provar. A explici-tao est para uma retrica tica, na qual a construo do argumento faz justia ao situacionamento do que se quer compreender. A fenomenologia um recurso pode-roso e disponvel a essa explicitao.

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  • William B. Gomes

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    Anexo A

    Sujeito 1

    difcil caracterizar o que vem ser uma boa aula, pois, para mim, isto significa definir e limitar todo um processo de interao de n variveis que se combinam e determi-nam uma boa aula.// Entre estas variveis esto a turma, o professor, o assunto, a maneira como discutido, o manejo do professor (Se um professor autoritrio, democrtico, pseudo-democrtico), o interesse pelo assunto, a serieda-de necessria para se tratar o assunto, a viso prtica da-quilo que se est aprendendo, o levantamento de neces-sidades de se ir mais alm daquilo que se discute na aula, a interao professor aluno, o momento espao-temporal da aula, o nimo das pessoas presentes, etc. // Dadas in-meras variveis que podem contribuir para este processo no creio que se possa definir uma boa aula // e sim que quando existe uma inter-relao harmnica de todas as variveis e um progresso com crescimento de todos os participantes da aula-processo, crescimento em todos os sentidos, a sim, poderemos dizer com mais preciso que isso caracteriza o que vem a ser uma boa aula. //

    Sujeito 2

    Uma boa aula inicia com a proposta clara do orien-tador para o objetivo a ser tratado neste dia. O grupo de alunos no muito grande e disposto de forma que todos possam interagir e trocar conhecimentos (em crculo), a fim de que todos possam participar e opinar critica-mente sobre o assunto. O lugar onde o grupo se encon-tra claro e arejado para que os participantes sintam-se dispostos a trabalhar. Aps todos os participantes, inclusive o orientador (professor) concordarem acerca do tema, o grupo se organiza de forma a estud-lo em conjunto. Esta organizao sob a forma de ler e dis-cutir acerca do assunto ou simplesmente ouvir alguns dos participantes que j possuam maior conhecimento deste, discutindo-o. O estudo um aprofundamento do tema, explorando-o atravs do material disposio e enriquecendo-o com as experincias e conhecimentos de cada um sobre ele. Como o orientador do grupo pos-sui vivncia maior, ajuda os alunos a esclarecerem d-vidas ou fornecer outras que no surgiram no momento. Quando todo o grupo acredita ter alcanado seus limi-tes de conhecimento para este dia, a aula encerrada, tendo ela criado em todos os alunos uma curiosidade de explorar ainda mais o assunto.

    Sujeito 3

    Em primeiro lugar, vamos supor que as pessoas que participam daquela aula esto interessadas no assunto, desejantes de conhecer mais a respeito deste (por motivos os mais diversos) e j com algumas colocaes, formu-

    laes (diferentes tambm) sobre o mesmo. O professor deveria ter um conhecimento profundo, amplo e atua-lizado do assunto a ser colocado. Este seria apaixonan-te para ele; seu conhecimento no seria apenas terico, mas partiria tambm de uma prtica. O professor seria principalmente um bom colocador de questes, tanto sobre o que os alunos trazem ele daria espao para es-tes participarem. Seria tambm um bom sistematizador para dar uma organizada sobre o que se discute em aula. Cumpridos estes pr-requisitos das pessoas que partici-pam na aula esta se desenrolaria mais ou menos assim: Previamente combinou-se para discutir uma temtica na-quele encontro, as pessoas leram textos, pensaram, refle-tiram, criaram inquietaes sobre o mesmo. Comea-se com uma, discusso livre, algum ressalta tal ponto que o tocou e por esta ponta vai se entrando no tema atra-vs de confrontaes, esclarecimentos, etc. dos partici-pantes. Quando o professor, ou mesmo um estudante o acha conveniente e o solicita; o professor estende-se sobre um determinado aspecto, esclarece, situa, expli-cita, relaciona. Tambm pode retornar o mais relevante na discusso at aquele momento e dar-lhe uma orga-nizada para ento continuar. No fim da aula d-se um encaminhamento de como dar seguimento (se o caso) a discusso no prximo encontro. O aspecto relacional tambm importante. Entre professor e alunos, e entre estes, o relacionamento, seria de cordialidade e respeito mtuo; e de vez em quando haveria um episdio engra-ado. (OBSERVAO: No quis voar muito coloquei apenas o que eu acho minimamente necessrio para que uma aula universitria seja boa.)

    Sujeito 4

    Estou particularmente interessada no assunto. No tenho sono, sinto-me alerta e excitada. Estou disposta a trabalhar e tudo que me interessa conhecer, destrinchar, investigar, sugar. Apropriar-me do conhecimento at o ponto de poder ultrapass-lo. Pode haver um professor. H um professor. Ele entende do assunto e eu o escolhi. Ele apaixonado por isso e est empenhado em transmi-tir o que sabe, em construir novos degraus, em investir no aluno, em mim, em quem queira trabalhar. Essa boa aula eu posso ser Denise e quanto mais eu for Denise, melhor ser para esse conhecimento, para essa cincia que est sendo, ao mesmo tempo, devorada e construda. O tempo no passa pelo relgio e a hora de parar a hora da fome, do cansao ou de outro compromisso. Nessa boa aula eu tenho a exata e lcida conscincia de que eu quero estar ali, de que estou ali porque quero. algo que constitui, acrescenta. como colocar camadas e ir dando conforma-o, sustentao. Constituir. Nessa boa aula eu me sinto assim me constituindo por mim, por minhas mos, com algo que transformei em meu.

  • Distino entre Procedimentos Tcnico e Lgico na Anlise Fenomenolgica

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    Sujeito 5

    Para mim, seriam dois elementos bsicos para se ter uma boa aula: um ambiente propcio e motivao. Em pri-meiro lugar, o ambiente fsico. Teria que ter um mnimo de conforto, onde no existissem cadeiras duras incmo-das. A luminosidade, espao e higiene seriam outros fa-tores que influenciariam. Ainda dentro do fator ambien-te, procuraria existir um clima agradvel entre as pesso-as. Onde todos pudessem colocar suas opinies e posi-cionamento sem uma crtica destrutiva, isto , sem uma depreciao dos mesmos, ou seja, uma melhor aceitao entre as pessoas. Tambm precisaria haver uma melhor distribuio de papis, isto , sem a autoridade-professor e os alunos do outro lado, bem como tambm uma me-lhor e maior comunicao entre eles. Sobre motivao, seria necessrio um tema interessante, tanto para os alu-nos como para o professor, para que houvesse uma com-preenso e um debate sobre o mesmo tentando assim um maior conhecimento. Seria tambm includo neste fator maneiras diferentes, talvez mais dinmicas, de aborda-gem sobre os temas propostos para serem estudados. E por ltimo, pessoas que realmente sejam profissionais em suas reas e que sintam prazer em transmitir e levar ao conhecimento dos outros suas experincias. Aulas mais dinmicas: no s seminrios ou aulas expositivas. Uma maneira seria ler sobre o assunto e aplic-lo ou v-lo na prtica com sua posterior crtica e relato. Ou ainda, um determinado tema visto sobre as diferentes correntes de psicologia aqui podendo ser terico ou/e prtico. Outro, confronto, tambm terico e prtico, entre as diferentes linhas de psicologia podendo ser agrupadas 2 a 2. Outra maneira, promover palestras com pessoas especializadas nas diversas correntes de psicologia e promover debates. Para comear dividimos a aula em dois plos ressalvan-do que esta no a nica maneira de se pensar uma aula e supondo que uma aula possa ser boa mesmo estando polarizada sendo estes plos o professor e os alunos. De um lado o professor, requer-se primeiramente que ele conhea o assunto a ser transmitido. Alm disso, que tenha uma elaborao pessoal a respeito do mesmo de modo a no simplesmente repetir textos, que poderiam, com maior economia de tempo e esforo, serem lidos em casa pelos alunos. Tambm, requer-se que goste do tema que ensina e que, por outro lado, aprecie o fato e o ato de transmiti-lo, sem o qu o maior erudito pode tornar-se um pedante enfadado, comprometendo a qualidade de aula. Do lado dos alunos, requer-se, primeiramente, que estejam na aula por seu prprio desejo, conhecimento de causa, tanto o professor, como o tema e o enquadre da situao de ensino, com conhecimento, tambm, h que se dizer, das opes. Outra condio, que supe parcial-mente anterior, que os alunos renam condies, em termos de conhecimentos prvios e de maturidade pes-soal, de acompanhar satisfatoriamente o curso do ensino. Uma outra ordem de condies reside nas relaes que

    se estabelecem, em aula. Uma forma de organizao que se suportasse e tolerasse as diferenas individuais en-tre os alunos e de cada um desses para com o professor, j que os estabelecemos como plos plos evitaria a necessidade de uma homogeneidade ou de homogenei-zao, permitindo um crescimento pela confrontao e elaborao conjunta de posies conflitantes.

    Sujeito 7

    Um professor que, pasmem, saiba, isso mesmo, saiba a matria que est dando. Que esta mesma matria esteja de algum modo ligada ao curso que o aluno participa. Alunos que saibam suportar suas ignorncias e que tenham cla-ro para que diabos esto estudando aquele tema, e at te-nham optado por estud-lo. J que o professor sabe porque est l e o que vai dar a aula no necessita ser seminrio. simples, o professor tenta passar sua leitura do tema e como ele sabe, e quem sabe, sabe que nem tudo sabe, no pretende que ningum concorde com ele. Mesmo assim brinca de articular este saber porque ele, o professor, gosta tanto do que faz como tem desejo para transmisso. Este mesmo professor no s transmite o assunto que domina, ele est inserido na efetiva aplicao deste conhecimen-to, ele um profissional deste antes de ser um professor. O aluno no fez o segundo grau no Brasil. O aluno at se interessa por ramos de conhecimento, que de nenhuma forma pragmtica ele v usar. O aluno em vrios campos autodidata, enfim, o aluno tem um trnsito pela cultu-ra. O desejo que move o aluno o dele. A Universidade Federal e logo o ensino gratuito, afinal porque merda o governo nos suga impostos.

    Sujeito 8

    A boa aula aquela em que eu j sei alguma coisa do assunto a ser tratado. Para mim isto fundamental, se nos primeiros 15 minutos da aula s me so apresentadas novidades, dificilmente conseguirei retomar ateno, e a disperso ser a norma. Por outro lado, a aula deve susci-tar o debate. A polmica ou se for necessariamente expo-sitiva pelo menos levantar dvidas. A pessoa que estiver ministrando esta aula deve ser um conhecedor do assunto a ser tratado, deve trazer subsdios ao debate, contribui-es diferenciadas dos assistentes da aula no sentido de globalizar aquilo que vai sendo exposto. Para mim as respostas dadas em aula sempre devem vir em bloco. De resto uma boa aula no deve ser ministrada no prdio do Ciclo Bsico do Campus Mdico desta Universidade, sob pena de deixar de ser uma boa aula, pois este prdio simplesmente insuportvel e inconfortvel.

    Sujeito 9

    Uma boa aula de psicologia no teria professor, j que os temas deste campo so inesgotveis. Haveria to so-

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    mente alunos dos mais diversos graus de conhecimento, os mais experientes questionando os novatos sobre aspec-tos no percebidos por estes, que, por sua vez, instigariam aqueles a revisarem criticamente seus conhecimentos mais fundamentais, simplicidade no superficial a profun-didade no esotrica, de modos que o resultado fosse um aperfeioamento integrativo das compreenses de todos e de cada um. As aulas seriam gravadas em vdeo para sua reviso pelos presentes e a atualizao pelos ausen-tes (o que seria buscado sem exceo, espontaneamen-te), e estes nunca se dirigiriam a seguinte desinformados da(s) precedente(s). Os estudantes teriam amplo tempo disponvel para consultas e debates paralelos, possveis inclusive, atravs de um eficiente sistema de comunica-o videofnico. No haveria formatura, mas cada estu-dantes seria sempre, simultaneamente, um trabalhador, incumbido de tarefas de acordo com sua competncia at ento adquirida. Quanto a aula, propriamente dita, re-alizar-se-ia num local de preferncia da maioria dos pre-sentes que estaria sempre disponvel fosse num jardim gramado incrustado num pequeno vale acusticamente, ou uma confortvel sala de tamanho apropriado ao grupo, tambm com perfeita acstica, e com acesso imediato a uma biblioteca onde nunca faltariam as obras procuradas. Os participantes teriam invariavelmente vido interesse pelo assunto tratado, participassem ativamente das dis-cusses ou apenas apreciassem silenciosamente, e todos seriam treinados para a dinmica dos debates, de manei-ra que no houvesse confuses evitveis, e as raras que acontecessem seriam prontamente coordenadas por um sistema eletrnico de inscries (limite de tempo no ha-veria, pois todos seriam suficientemente educados para no abusar e suficientemente tolerantes para conceder apartes devidamente sinalizados). Quando solicitados, os mais experientes preparariam palestras, e para estes e para os debates mais importantes, contraria-se com um eficiente corpo de taqugrafos e datilgrafos, que servi-riam imediatamente redaes e sinopses dos trabalhos, a fim de dinamiz-los e oferecer pronta viso global aos seus participantes.

    William Barbosa Gomes - Graduao em Psicologia pela Universidade Catlica de Pernambuco (1971), Mestrado em Reabilitao Psicolgica pelo Southern Illinois University Carbondale (1980) e Doutorado In-terdisciplinar em Higher Education pelo Southern Illinois University Carbondale (1983). Atualmente Professor Adjunto da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Tem experincia na rea de Psicologia, com nfase em Desenvolvimento Social e da Personalidade, atuando principalmente nos seguintes temas: histria da psicologia, episte-mologia, fenomenologia, e efetividade psicoterpica. Endereo para correspondncia: Instituto de Psicologia UFRGS, Rua Ramiro Barcelos 2600, 90035-003, Porto Alegre (RS). E-mail: [email protected].

    Recebido em 21.10.07Aceito em 15.12.07