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Richard Dyer, Pastiche. New York, NY and London: Routledge, 2007, 222 pp. 1  Capítulo 1 Pastiche e Companhia P Pastiche é um termo amplamente utilizado com conotação pejorativa: usado muitas vezes e de for ma indiscriminada. Entre outras coisas é empregado para indicar: A representação de um insulto (nos livros de Nárnia, escritos por C. S. Lewis: “é verdade que o Império do mal de Calormen é u m pastiche árabe ou chinês” ) (Stephen L. R. Clark, cartas do Times Literary Suplement , 9.05. 03: 17); Retorno vazio a modelos obsoletos (A escultura fascista italiana “Celebrando a vitória da Etiópia está mais para o pastiche, de um jeito desolador, da arte da Roma antiga do que de adotar modelos futuristas, Jonathan Jones, The Guardian Saturday  Review , 12.07.03: 19); 1  Tradução nossa (realizada pela professora Daiany Dantas, para constar como subsídio da disciplina Mídia, Estética e Produtos Culturais). 

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Richard Dyer, Pastiche. New York, NY and London: Routledge, 2007, 222 pp.1 

Capítulo 1

Pastiche e Companhia

PPastiche é um termo amplamente utilizado com conotação pejorativa: usado

muitas vezes e de forma indiscriminada. Entre outras coisas é empregado para indicar:

A representação de um insulto (nos livros de Nárnia, escritos por C. S. Lewis: “é

verdade que o Império do mal de Calormen é um pastiche árabe ou chinês”) (Stephen L.

R. Clark, cartas do Times Literary Suplement , 9.05. 03: 17);

Retorno vazio a modelos obsoletos (A escultura fascista italiana “Celebrando a

vitória da Etiópia” está mais para o pastiche, de um jeito desolador, da arte da Roma

antiga do que de adotar modelos futuristas, Jonathan Jones, The Guardian Saturday

 Review, 12.07.03: 19);

1 Tradução nossa (realizada pela professora Daiany Dantas, para constar como subsídio da disciplina Mídia, Estética

e Produtos Culturais). 

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Uma versão inferior (O quadro de Dürer, A virgem no jardim, foi relegada, nos

anos 50, ao status de cópia tardia ou pastiche  – Paul Hill, Times Literary Suplement ,

14.05.04: 20);

Imitação de segunda categoria (acres marcados [ do musical The Water Babies]

ferem os ouvidos por serem um pastiche sub-Sondheimi;

Recriação histórica vazia (A Maria Antonieta de Sofia Coppola beira o mero

pastiche histórico ao entrar dentro da cabeça de Maria Antonieta (Sandra Ballentine,

The Guardian Review, 1.07.05: 15);

Paródia (ubíqua);

Algo próximo do Camp (K. d. langs faz um pastiche „lésbico‟ ii do country

masculino e dos cantores de Western (Cindy Paton, Introdução da Nova edição de

 Lavender Culture (Jay and Young, 1994: xxv), Longe do paraíso é muito mais que um

filme camp ou um pastiche, (Peter Bradshaw, The Guardian Review, 7. 03.03: 12);

Idealização de um estilo (um artigo intitulado “Uma paixão pelo pastiche”, sobre

a revalorização das casas desenvolvidas por Reginald Fairfax Wells, nos anos 1920, fala

da sua noção idealizada das paisagens britânicas, seus chalés de pastiche (Fred

Redwood, The Sunday Telegraph Review, 21.04.02: 19);

Algo que se assemelha a outra coisa sem ser uma imitação direta desta ( o filme

As chaves do carro é um pastiche pós-moderno de Pirandello [Mark Kermode, The

Observer Review, 10.07.05: 7]);

Uma forma de influência (Prince tornou-se a mais singular e proeminente

influência na contemporânea transgressora Black music. Uma geração ( fim p. 7).

(p. 8)

vem reconhecendo suas canções, sampleando sua música e letras, ou fazendo

pastiche de seu som funky, macio e anos 80 (Sean O‟Hagan, The Observer Review,04.04.05: 11);

Um jeito de aprender a arte de outrem (Aos dezoito anos, [Barraqué] estava

escrevendo composições pastiche nos estilos de Schubert e Schuman (David Schiff,

Times Literary Suplement , 5.12.03:27);

Uma arte útil (A declamação romana como um exercício que combina atuação,

análise, memorização e pastiche de sons... pedagogicamente entrelaçados (Emily

Gowers, Times Literary Suplement );

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Recriação histórica eficaz (o alastrado pastiche de Michael Farber, A pétala

carmesim e o Branco, situada na Londres de 1870, alcança lugares que Dickens não

 poderia tocar” (Emma Hagestadt, The Independent Review, 10.10.03:31);

E aqui não incluímos os vários exemplos de pastiche que se referem à

combinação da arte com quaisquer outros elementos;

Todos esses usos são apropriados; Pode-se compreender o que todos eles

significam a um só tempo, embora eles não signifiquem a mesma coisa. Eu poderia

implicar com a afirmação presente na maioria dos usos, de que o pastiche é

intrinsecamente trivial ou ruim, mas não há fundamentação para negar que o termo

possa ser usado em qualquer uma das formas acima citadas. O que eu quero fazer nesse

capítulo é considerar os muitos termos disponíveis para combinação e imitação nas

artes, como um meio de distinguir uma prática particular entre eles para a qual não há

outro termo senão pastiche.

A palavra em si vem do italiano „ pasticcio‟iii, que, no seu uso original,

significava uma torta („vivanda ricopera di pasta e cotta al forno‟ [comida coberta com

massa e cozida no forno] 1535). A ideia de uma refeição feita de misturas  –  carne,

vegetais e massa – foi então aplicada à arte. O pasticcio se referia a quadros produzidos

por um pintor, utilizando os motivos de outro e apresentando os trabalhos como obras

póstumas daquele. Uma das ocorrências registradas desse uso ocorreu em 1619, quando

um cardeal romano descobriu que a pintura vendida a ele por Terence of Urbino como

uma Madona de Rafael era na verdade do próprio Terence. O cardeal convocou o pintor

e disse a ele que se quisesse um  pasticcio (uma torta de carne e vegetais) pediria ao seu

cozinheiro, Maestro Giovanni, que faz alguns deliciosos (Hempel 1965: 165-166). Isto

nos traz três aspectos do que tem sido a herança do termo pastiche.

Para começar, um trabalho de pastiche consiste em agrupar elementos tomados

de outros trabalhos, e este é o princípio combinatório que será discutidoprioritariamente. Em segundo lugar, isto envolve a citação/imitação de trabalhos

anteriores, o que nos leva a noção de pastiche como uma forma de imitação, assunto não

apenas da segunda parte deste capítulo mas também do resto do livro. Em terceiro lugar,

 pasticcio na pintura (fim p. 8)

(p. 9)

envolve o uso não reconhecido e a enganador da combinação e imitação, e essa

associação negativa também está ligada ao pastiche. Wido Hempel especula que issotambém advém das origens culinárias do termo: ao comer uma torta, você nunca estará

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muito certo de quais são os ingredientes presentes (IBID.: 165). Em qualquer caso,

mesmo antes do seu uso num sentido estético, a palavra  pasticcio passou a ser utilizada

na Itália  – e continua a ser  – para indicar enganação e confusão. Pastiche pode agora

apenas significar, e eu desejo que apenas signifique a combinação evidente e a imitação

de trabalhos anteriores, embora a associação negativa persista, sobretudo, agora, em

termos de trivialidade e falta de um sentido. Parte do propósito maior desse livro é

argumentar que essas associações não são intrínsecas ao termo.

Tanto na flexibilidade de seus usos históricos quanto nos múltiplos usos atuais, a

palavra pastiche é, na prática, extremamente elástica. Isto pode ser frustrante. Nas

discussões ao longo da preparação desse livro, eu às vezes me senti jogado em

discussões genéricas e infrutíferas sobre o que seria mesmo o pastiche. Muito

frequentemente, será mesmo  – só depende do que você entende por pastiche. O que me

concerne é onde nós estamos querendo chegar quando usamos a palavra e suas

cognatas, mais do que revelar ou legislar sobre o que isto ou aquilo realmente

significam. As distinções que se seguem, entre uma prática e outra, erguem-se ou caem

por sua lógica de validade e utilidade; o que eu não posso dizer é qual desses termos é

apropriadamente chamado de pastiche, deixar isso de lado me leva a empregar o meu

uso preferencial do termo. Estou, entretanto, me movimentando na direção de uma

definição (já resumida na introdução) do jeito que eu quero usar o termo no resto do

livro.

Capítulo 4

Pastiche, gênero, história

Em uma reunião da associação de diretores de Hollywood em 1950, um orador

se levantou e identificou-se assim: „Meu nome é John Ford. Faço Westerns‟. A anedota

é dita frequentemente para ilustrar a modéstia e objetividade de Ford, mas aqui eu quero

explorar duas outras implicações. Em primeiro lugar, Ford sabe o que ele está fazendo

(fazer Westerns), e segundo o que é claramente visto uma categoria não problemática,

um ponto de referência fixo.

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Tais abordagens amplas não são, no entanto, relevantes para um estudo do

pastiche. Isto requer estilos e preocupações circunscritos e, portanto, reconhecíveis e

isoláveis. Assim não se pode realmente fazer pastiche, digamos, da tragédia de um

modo geral, embora se possa, sem dúvida, realizar um pastiche da tragédia da Grécia

antiga, Elizabetana ou francesa, ou, mais especificamente, da tragédia de Eurípides,

Shakespeare ou Racine.

Da mesma forma, a longa tradição do soneto tem sido uma fonte de referência e

engajamento de todos os que embrenharam-se a fazê-los. (ibid.: 14-23), mas o pastiche

em si exige uma maior especificidade - escrever um soneto, agora, é meramente

escrever dentro de uma determinada estrutura poética, você teria que escrever um como

Petrarca e os Petrarcanos, os românticos ingleses ou os simbolistas franceses antes que

pudesse ser elegível para realizar algo considerado como um ato de pastiche.

Os gêneros que enfoco aqui são os fílmicos. Isto é em parte por causa da minha

familiaridade com eles (estudo de gênero implica considerar um grande número de

obras e não me sinto inclinado a analisar de forma competente, por exemplo, o soneto

Petrarcano ou Rap gangsta) e em parte devido à vivacidade da escrita recente sobre este

campo (por exemplo, Altman 1999, Gledhill 2000, Neale 2000, Thomas 2000), meu

foco é mais restrito ainda, considerando apenas dois gêneros, o Western eo filme noir  

(especialmente o neo-noir).

Eu olho para estes tomando as duas questões derivadas da declaração de Ford: os

tipos de genéricos de auto-conhecimento (com destaque para o Western) e o papel do

pastiche na definição histórica dos gêneros (neonoir). No final, por outro lado,

considero pastiche em relação à história, em termos mais amplos.

(p. 131)

História 

O pastiche genérico é um caso especial da forma mais geral do pastiche

A imitação uma vez admitida, mobiliza as qualidades que indicam uma relação

com trabalhos anteriores (embora às vezes recentes e até coexistentes).

Em outras palavras, o pastiche é sempre e inevitavelmente histórico. Eu quero neste

ponto final olhar um pouco mais sobre o que isso implica, movendo-se agora

longe da instância do gênero.

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Em primeiro lugar, para compreender o que qualquer pastiche dado está fazendo,

temos de devolvê-lo ao seu contexto histórico, este é um princípio fundamental - quase

controversos ou incomuns - que é informado em todas as análises neste livro.

Em segundo lugar, como sugerido acima na sequência da minha discussão de

Tirez sur le pianiste, a historicidade de um pastiche envolve tanto as formas

historicamente específicas estética nas quais ele trabalha, quanto a percepção prevalente

do que é fazer pastiche.

Em terceiro lugar, pode haver circunstâncias históricas que favorecem a

produção de pastiche. O pastiche pode ser encontrado em toda a tradição cultural

ocidental alta, média e baixa (e eu não vejo uma razão pela qual não deve ser

encontrado através de toda a produção cultural humana), e na medida em que este livro

é tentar resgatar o pastiche no pós-modernismo (como um colega sugeriu a mim com

um olhar cintilante), também é argumentar que o pastiche não deve ser apenas

entendido através do exemplo pós-moderno (cf. Wilson, 1990). Entretanto, pode ter

havido mais pastiche, ou ele pode ser mais característico de específicos períodos

históricos, o que incluem os listados abaixo. Todos têm a ver com a possibilidade de

reconhecer o fato em sua forma de ver que as formas dadas num jeito de dizê-las ou

fazê-las, realizando as coisas não são simplesmente a inevitável maneira humana em

que essas coisas são ditas, feitas e realizadas;

• 

Períodos em que uma multiplicidade de tradições são vividas juntas (sob a pressão da

exploração geográfica, do imperialismo ou da migração) que permitem a percepção de

que determinadas formas são realmente particulares. Assim, sociedades como a Roma

antiga e a Inglaterra isabelina (ambos centros de imperialismo, exploração e migração) e

a globalização contemporânea e o mundo diaspórico, podem explicar o uso do pasticheem produtos como, respectivamente, o Satyricon (Petrônio Cl dC), Shakespeare e o pós-

modernismo.

• 

Períodos em que as novas mídias de repente disponibilizaram uma série enorme de

obras acessíveis, como a imprensa (que permite a obra de Cervantes e Rabelais) e as

inovações audiovisuais desde século XIX (Jenny 1982: 35-38), a rapidez e a

multiplicidade elevando um sentido da variabilidade das formas de fazer as coisas.

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produção cultural e de massa: a reprodução mecânica, várias cópias, séries, versões,

regravações, gêneros, ciclos, fórmulas, todas estas insistem na mesmice e, assim,

facilitar a reflexão e o jogo em torno da mesmice.

• 

A percepção de um grupo social sobre o qual as formas culturais vigentes não falam a

respeito. Isso pode se aplicar a qualquer grupo (ou mesmo um indivíduo isolado),

embora possa haver um caso especialmente forte: a afinidade pelo pastiche dos judeus e

dos gays nos últimos dois séculos. Os grupos que são colocados fora das normas sociais

prevalecentes, podem atravessá-las deste modo e têm sido cada vez mais (embora de

forma desigual) socialmente aceitos, de modo que sua relação com as normas culturais é

ao mesmo tempo externa (consciente das normas do status quo) e interna (capazes e

cada vez mais aptos a usá-las).

Nenhuma das opções acima é obrigatória para a produção de pastiche nem

inevitavelmente dão lugar a ele, mas podem torná-lo mais visível.

Em quarto lugar, o pastiche tem um papel na história cultural. Na minha

discussão sobre o gênero, eu sugeri que o pastiche pode ter o efeito de afirmar a

existência de um gênero pelo simples fato de ser capaz de imitá-lo (o que pode ser

argumentado tanto do período inicial do Western quanto do neo-noir) e também ser um

estágio na renovação genérica (fim p. 132)

(p. 133)

(o neo-noir sendo um passo no sentido de normalizar uma produção noir  

contemporânea). Também pode fixar num tempo histórico a percepção dada por uma

determinada forma: o pastiche que Proust faz de Flaubert vê mais do proto-naruralismo

daquele do que nós poderíamos ver agora, Corpos ardentes eclipsou o sentimento de

que estamos diante de um filme noir B, evidente em Tirez sur le pianiste.Pastiche também pode ter um papel na designação de coisas como parte do

passado, como eu sugeri sobre Hamlet e tipo de drama representado por O assassinato

de Gonzago.

No próximo capítulo, eu sugiro que seja assim também ns Afro-American

Symphony e no filme Longe do Paraíso, embora os primeiros também sugerissem a

continuidade rhe do passado com o presente.

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Em alguns casos, o pastiche evoca (ou pode ser tomado para evocar a) uma

forma ou estilo, passado ou contemporâneo, que de alguma forma é mais inocente e

simples, menos auto-consciente.

Isto parece ser especialmente verdade no Western, cada pastiche (Wild and

Wooly, Meu Nome é Ninguém, The Quick and the Dead) de alguma forma o que

implica que os que existiram antes eram Westerns desconhecedores de si mesmos como

construções, mas também é implícita no do romantismo em Madame Bovary e

certamente podem ser extrapolados em O Quebra-Nozes e A Afro -american

Symphony, e alguns pensam que seja a atitude implícita de Longe do Paraíso em

relação ao melodrama dos anos 1950.

O modo pastiche pode, assim, ser um produto de circunstâncias históricas e / ou

um fator de desenvolvimento cultural. De qualquer maneira, é sempre inescapavelmente

histórico em dois sentidos: sempre referencia a algo surgido antes e sempre sinaliza para

este fato (se não o fizer, não é realmente pastiche).

Quando - como com a angústia e a sensualidade do film noir , ou, para antecipar,

com o pathos do filme Longe do Paraíso - também é emocionalmente envolvente, a sua

historicidade facilita nosso sentimento em relação à fonte do nosso sentimento. T.S.

Eliot (1920: 44), discutindo a conscientização nos primeiros movimentos artísticos,

observou que "o sentido histórico envolve uma percepção não só da consumação do

passado no passado, mas da sua presença" e Charles Jencks usa "a presença do passado"

como um termo que indica o pastiche em seu O que é pós-modernismo? (1986).

O que estou sugerindo é que sentido da presença do passado no pastiche não é

apenas algo cerebralmente observado, mas sentido. É parte do conhecimento que

podemos ter do nosso lugar na história. Nós fazemos os nossos próprios sentimentos,

mas não em circunstâncias afetivas de nossa própria escolha; o pastiche pode nos ajudar

a entender as circunstâncias, sentido-as. 

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Resenha

Cohan, Steven. Screen 48:4 Winter 2007. Review, p 547-550, disponível em:

screen.oxfordjournals.org. Acesso: 27 mai/ 2011. 

Antes de ler o novo livro de Richard Dyer, eu nunca tinha pensado em pastiche

como sendo muito mais do que um maneirismo superficial estético, uma forma de

evocar formas ultrapassadas de representação por meio da imitação estilística.

Dyer, no entanto, corrige tão comum e limitada compreensão do termo. Pastiche,

argumenta ele, que este não só tem uma robusta, animada e variada história em filme,

música, arte e literatura, mas é um meio importante de historicidade representada em

termos de sentimento. Dyer reconhece que o pastiche é em si um termo flexível, daí a

dificuldade de discerni-lo, muito menos na identificação de forma categórica, com o

olhar de um crítico. A frouxidão, explica ele, é semântica. "Pastiche" é contíguo a

muitos outros termos para "copiar" e estas são muitas vezes tratados como sinônimos: o

plágio, falsificação, fraude homenagem, paródia. Para ser mais exato, bem como

aqueles outros termos, pastiche envolve a imitação e frequentemente pode ser lidos

como uma "cópia" direta e acrítica.

Mas pastiche não imita, no sentido de conseguir uma reprodução exata, em

contraste com, digamos, um plágio ou falsificação, o objetivo de um pastiche não é ser

indistinguível de sua fonte. A frouxidão do termo tem a ver com sua origem no

" pasticcio", uma palavra italiana inicialmente prevista para uma torta que combina

vários ingredientes ao misturá-los juntos, escondendo seus sabores distintos.

A partir da perspectiva oferecida pela mistura saborosa da torta  pasticcio, Dyer

demonstra como o pastiche envolve uma combinação bem como a imitação - ou, mais

precisamente, ele pode facilmente e promiscuamente combinar imitações sem levar em

conta a totalidade formal ou unidade genérica.

Um texto de pastiche pode ser híbrido e heterogênea, misturando os formas,

gêneros ou estilos, ou pode desencadear o que está sendo motivo de pastiche, por

enquadrá-lo dentro de um narrativa principal, que não pastiche (como no jogo dentro de

um jogo em Hamlet ou o "Follies" números na Follies Sondheim musicais); ou pode

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mais facilmente incorporar pastiche dentro de outro discurso (como no o estilo indireto

livre de Madame Bovary).

Da mesma forma, quando combinado com outros estilos, um pastiche pode

desaparecer de vista, uma vez colocado em novos contextos de recepção. Deste modo, a

“forma que delimita a semelhança do pastiche está sujeita à percepção" tanto por parte

do público e quanto das semelhanças no interior do texto (p. 55). Um pastiche necessita

ser designado textualmente se não é formalmente, ou corre risco de não ser reconhecido,

Dyer aponta para o segmento de noticiário de Cidadão Kane (Orson Welles, 1941); este

é menos visível hoje como um pastiche (em oposição a uma paródia) de A Marcha do

Tempo (1930). Sem uma sinalização de limites claros, as atitudes expressas por um

pastiche podem consequentemente parecer incertas, seu 'sentido' torna-se difícil de

definir.

No entanto, quando um pastiche é imediatamente reconhecível como um

Pastiche', a tendência entre os críticos contemporâneos e revisores, de acordo com

Dyer, é de preterir o pastiche, em função de sua trivialidade, assumindo que pretende

apenas se divertir como um arroubo retórico ou marcar a obsolescência do passado em

relação ao presente.

A questão da interpretabilidade caracteriza o terreno do pastiche. Dyer enfatiza

que há sempre uma diferença significativa entre um pastiche e o que está sendo alvo

deste („pastichado‟?), entre "semelhança" e "deformação e discrepância "(p. 54).

Isso não quer dizer que o que define um pastiche é a distorção absoluta mas, sim,

que envolve semelhanças e memória, explorando a sua interação dinâmica.

Inevitavelmente, e mesmo intencionalmente, um pastiche traz em si uma distância

significativa de sua fonte, ao mesmo tempo em que se aproxima dela por meio de

sentimento, indicando que o contexto e os signos podem ser cruciais para a sua

compreensão. Para a entender como "um pastiche imita sua idéia de que aquilo pode seruma imitação (p. 55), ou seja, remete não à fonte em si, mas a uma percepção [da fonte],

que possui uma especificidade temporal e cultural"(p. 128). Uma das maneiras que Dyer

mostra a intervenção da cultura na memória e dá a especificidade histórica de pastiche é

através do renascimento do cinema noir . "O neo-noir imita", explica ele, usando Corpos

Ardentes (Body Heat, Lawrence Kasdan, 1981) como seu principal exemplo, 'não é noir  

fidedigno, mas a memória do noir , uma memória que pode ser impreciso ou seletiva '(P.

124). Ainda mais do que Chinatown (Roman Polanski, 1974), naépoca de seulançamento, Body Heat exemplificada para os comentadores e público como os

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elementos noir pode ser atualizada com brio considerável. O filme foi, portanto, visto

como um exercício superficial de estilo, em função da moda retro, e o consenso crítico

até hoje o avalia nesses termos.

No entanto, o pastiche de Corpos ardentes do visual noir e de suas convenções

narrativas estava vinculado ao seu próprio momento histórico: visualizar Corpos

ardentes como um pastiche noir permite-nos reconhecer de forma mais acentuada o seu

significado não em imitar o filme noir clássico, mas em propror uma definição críticas

do noir , surgida depois que o ciclo teve o seu curso.

Então, apesar da aparente presença do noir  dos anos 1940 como o referente

ostensivo de sua imitação, o que está sendo feito pastiche em Corpos ardentes é

realmente uma "ideia" do que constituía o noir . Uma vez analisando a ideia e recepção

do filme no contemporâneo, a "ideia" do noir determinada a produção e a atitude deste

filme. Além disso, com o pretexto de inaugurar o neonoir, a "ideia" do pastiche noir em

Corpos ardentes ajudou a moldar a memória cultural de como era "realmente" o filme

noir nos anos 1940, quais as emoções geradas por ele.

Dyer não é de modo algum o primeiro crítico a aludir a relação histórica do

neonoir com o filme noir clássico, mas ele é o primeiro a lê-lo em termos do pastiche.

«Pastiche noir ", diz ele, "é capaz de reconhecer e mobilizar a estrutura de sentimento

que percebe ter sido capturado pelo noir  clássico (P. 130). Dyer demonstra como o

pastiche esteticamente expressa a historicidade por uma série de perspectivas. Ele

encerra o livro com uma breve visão geral do que é, sem dúvida, o exemplo de um

pastiche cinematográfico: Longe do paraíso (Far From Heaven, Todd Haynes, 2002).

Dyer descreve sua própria resposta: "não havia momentos em que eu não poderia ver a

tela em função das lágrimas, mesmo quando "eu era plenamente consciente da forma

como o filme estava recriando o melodrama clássico de Hollywood, num pastiche "(p.

174). Enumerando as múltiplas formas em que este filme situa seus telespectadores doséculo XXI, em uma relação afetiva com o que é pastiche narrativo, estético e crítico,

Dyer conclui, "o pastiche de Longe do paraíso, não só faz com que a historicidade de

sua influência seja evidente, mas também pode nos permitir perceber a historicidade dos

nossos sentimentos "(p. 178). Dyer não está afirmando que tal percepção corresponde a

uma universalidade do pastiche, longe disso, pois ele quer para dar do forte apelo

afetivo que um pastiche como Longe do paraíso pode ter sobre um telespectador, sem

descontar a sua base histórica.

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Como espero que esta resenha indique, Dyer argumenta em todo o seu livro que

o pastiche precisa ser entendido como a expressão retórica específica de alguns afetos

históricos específicos, que se aplicam ao presente e ao mesmo tempo se referem ao

passado. "O aspecto mais valioso do pastiche", ele reitera, "reside na sua capacidade de

mover-nos, mesmo quando conscientes de onde os meios para sermos movidos vêm, de

sua historicidade "(P. 138). Seu livro fortemente desafia os conceitos degradados que

tomam o pastiche por uma imitação trivial, a-histórica e acrítica que, especialmente por

causa da influência de Jameson, agora parece determinar conotações do termo.

Para mostrar o que esse ponto de vista limitador ignora, Dyer procura ainda

demonstrar como pastiche histórica e emocionalmente identifica o que equivale a um

sujeito pós-moderno. "Pastiche começa aqui", ele comenta quando se discute o capítulo

final do romance de Julian Barnes, escrito em 1984, Flaubert‟s Parrot: "o sentimento

como forma, que, ao nível da teoria, é corresponde ao eterno deslizamento de Derrida

ou à performatividade de Butler, corresponde à percepção de que tudo no final é uma

cópia de outra coisa e nós sabemos disso e podemos nunca sair desse ciclo "(p. 173).

Ao fazer esta afirmação, Dyer não está invocando a armadilha filosófica do

eterno retorno, como ela passa a figurar na última página de seu livro, salientando como

o "pastiche articula essa sensação de viver permanentemente, pesarosamente, mas sem

dificuldades, dentro dos limites e potencialidades da construção cultural do pensamento

e do sentimento "(p. 80).

Pastiche é claramente um livro envolvente e rico. Dyer escreve com o talento,

profundidade e conhecimento que se espera, devido aos seus livros anteriores, mas aqui

o seu âmbito de aplicação também é mais expansivo, mais ainda do que em seu livro

anterior Withe (1997).

Ao analisar o pastiche, o corpus de Dyer inclui o romance, drama e música, bem

como filme, e seus exemplos, não se limitando a referências anglo-americanas, vaidesde a Renascença até aos nossos dias, nem suas ilustrações são confinadas a um único

gênero (o Western está presente aqui, assim como o melodrama e o filme noir ) ou

mídia.

Independentemente do tipo de pastiche que ele traz em sua discussão, Dyer lida

com sofisticação crítica, atenção aos detalhes e informações que caracterizam a sua

análise fílmica.

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 iFamoso compositor da Broadway.

iiNo original butch-pastiche, butch é uma palavra que designa a homossexual feminina masculinizada.

iiiDeriva de pasta, como se usa no inglês para designar massas, como spaghetti, lasanha.