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Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 1 EDITOR Ricardo Burg Ceccim COMISSÃO EDITORIAL Cristianne Maria Famer Rocha Carlos Dácio Araújo Manoel Mayer Júnior Ricardo Burg Ceccim Ruth Sant’Helena da Silva Sandra Maria Salles Fagundes CONSELHO EDITORIAL Airton Stein – FFFCMPA Alcindo Antônio Ferla – SES/RS Álvaro Crespo Merlo – UFRGS Carlos Alvarez – Universidade de Alicante/Espanha Carmem Silveira Oliveira – UNISINOS Célia Regina Pierantoni – UERJ Ceres Víctora – UFRGS Cristianne Maria Famer Rocha – UERGS Dagmar Elisabeth Estermann Meyer – UFRGS Denise Rangel Ganzo de Castro Aertes – SMS/PMPA Emerson Elias Merhy – UNICAMP Giorgio Solimano – Universidade do Chile/ALAESP Jaime Breilh – EQUADOR Jairnilson Silva Paim – ISC/UFBA Janice Dornelles de Castro – UERGS José Luis Araújo – FIOCRUZ Jussara Gue Martini – ABEN/UNISINOS Liane Beatriz Righi – UNIJUI Maria Ceci Araújo Misoczky – UFRGS Maria Cecília Souza Minayo – FIOCRUZ Maria Luiza Jaeger – SES/RS Marlow Kwitko – PUC/RS Moacyr Scliar – FFFCMPA Moisés Goldbaum – USP Newton Barros – AMRIGS Paulo Duarte Amarante – ENSP/CEBES Ricardo Burg Ceccim – ESP/RS ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL SECRETARIA DA SAÚDE ESCOLA DE SAÚDE PÚBLICA

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Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 1

EDITORRicardo Burg Ceccim

COMISSÃO EDITORIALCristianne Maria Famer RochaCarlos Dácio AraújoManoel Mayer JúniorRicardo Burg CeccimRuth Sant’Helena da SilvaSandra Maria Salles Fagundes

CONSELHO EDITORIALAirton Stein – FFFCMPAAlcindo Antônio Ferla – SES/RSÁlvaro Crespo Merlo – UFRGSCarlos Alvarez – Universidade de Alicante/EspanhaCarmem Silveira Oliveira – UNISINOSCélia Regina Pierantoni – UERJCeres Víctora – UFRGSCristianne Maria Famer Rocha – UERGSDagmar Elisabeth Estermann Meyer – UFRGSDenise Rangel Ganzo de Castro Aertes – SMS/PMPAEmerson Elias Merhy – UNICAMPGiorgio Solimano – Universidade do Chile/ALAESPJaime Breilh – EQUADORJairnilson Silva Paim – ISC/UFBAJanice Dornelles de Castro – UERGSJosé Luis Araújo – FIOCRUZJussara Gue Martini – ABEN/UNISINOSLiane Beatriz Righi – UNIJUIMaria Ceci Araújo Misoczky – UFRGSMaria Cecília Souza Minayo – FIOCRUZMaria Luiza Jaeger – SES/RSMarlow Kwitko – PUC/RSMoacyr Scliar – FFFCMPAMoisés Goldbaum – USPNewton Barros – AMRIGSPaulo Duarte Amarante – ENSP/CEBESRicardo Burg Ceccim – ESP/RS

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

SECRETARIA DA SAÚDE

ESCOLA DE SAÚDE PÚBLICA

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2 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

Ronaldo Bordin – UFRGSSarah Escorel – CEBESSandra Maria Salles Fagundes – UERGSSoraya Vargas Côrtes – NIPESC/UFRGSStela Meneghel – UNISINOSTeresa Borget Armani – ESP/RSVânia Maria Fighera Olivo – UFSMVirginia Alonso Hortale – ENSP

EQUIPE TÉCNICAAna Paula Andrioli Taday – versão português-espanhol; digitaçãoAntônio Sergio Freitas Ferreira – capaCamila Slomp – capaGeisa Costa Meirelles – CRB 10/1110Luiz Cezar F. de Lima – editoraçãoMárcia Stypulkowski – CRB 10/1172Raquel Macagnan Silva – versão português-inglêsRuth Sant’Helena da Silva – CRB 10/666Silvana Matos Amaro – CRB 10/1098Simone Silveira Nascimento – capaSimone Pereira – revisão português

TIRAGEM2000 Exemplares

A Revista Boletim da Saúde é associada à Associação Brasileira de EditoresCientíficos

B668 Boletim da Saúde / Secretaria da Saúde do Rio Grande doSul; Escola de Saúde Pública. – v. 14, n. 1 (1969). –Porto Alegre: SES/ESP, 1969 –

SemestralApós um período de interrupção, o Boletim da Saúde

está sendo editado novamente.ISSN 0102-1001

1. Boletim da Saúde – Periódicos I.Secretaria daSaúde-RS. II.Escola de Saúde Pública-RS

NLM WA

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Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 3

Apresentação

Saúde se faz com gente, gente que deve ser autora da sua história,gente que ajuda a construir o Sistema Único de Saúde no país. O fazer emsaúde como em qualquer área deve ser contado, deve se debatido, deve serescrito, para pensar criticamente a prática cotidiana, para divulgar o que estásendo feito, para trocar experiências, para servir de subsídio à prática dofazer saúde nos vários locais.

A proposta do Sistema Único de Saúde é resultado de muita luta dosmovimentos sociais e é proposta de que se construa uma atenção à saúde dapopulação brasileira a partir das necessidades e problemas sentidos e vividospelas pessoas de cada rincão deste país, logo não se propõe à cópia denada.

A partir da realidade do povo de cada local, poder adaptar, recriar e daro contorno necessário ao que se aprende com os usuários e com a luta pelaimplementação da reforma sanitária brasileira requer o compartilhar genero-so da experiência e de sua interpretação. Como me disse uma representantedos usuários, precisamos de pacientes impacientes. Penso que precisamosque a população usuária, os trabalhadores da saúde, os prestadores de ser-viços de saúde e os gestores de saúde sejam construtores do SUS de acordocom os seus princípios: direito de todos e dever do Estado; co-responsabili-dade da União, dos estados e dos municípios; universalidade, igualdade,eqüidade e integralidade no acesso e na atenção à saúde; descentralizaçãoda gestão e participação da população com direito à informação.

O relançamento da revista Boletim da Saúde é mais um compromisso dagestão estadual do Rio Grande do Sul com a informação e em assegurartratamento acadêmico e intelectual:

ü aos dados coletados nos serviços;ü às experiências de serviço;ü à informação como instrumento de ação e à documentação em saúde;ü à recuperação da memória e da história da saúde em nosso âmbito de

reflexão institucional;ü ao papel do estado como ordenador da formação de recursos huma-

nos na área da saúde e como sede de experiências inovadoras comoos Núcleos Regionais de Educação em Saúde Coletiva, o Pólo deEducação em Saúde Coletiva e a Residência Integrada em Saúde;

ü à implementação do SUS, às estratégias de gestão da Secretaria daSaúde do Rio Grande do Sul para assumir o seu papel legal de coor-denação da política de saúde no estado e de cooperar técnica e finan-ceiramente com os municípios (principais executores da política desaúde), de acordo com às necessidades da população.

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4 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

Entre os artigos deste primeiro número de relançamento, temos um arti-go especial, um artigo de alguém que viveu com muita intensidade, coração,paixão, dor e luta a defesa da vida e da saúde, a defesa de um país maisdemocrático e mais equânime, onde o povo deve ser autor da sua história. Oartigo é sua participação guerreira e crítica em um dos seminários de nossaSecretaria da Saúde (SES/RS): esta publicação é em tua homenagem, DavidCapistrano Filho, e para todos os militantes da saúde que vêm lutando emtoda a história da saúde do país para que, como dizias no Seminário, possa-mos no cotidiano fazer e transformar o sonho em realidade: Guerra pelo direi-to à saúde. Valores humanistas e cooperação técnica e financeira que evi-denciem a saúde como uma nova cultura de solidariedade não autoritária.Defesa da vida com meios técnicos, domínio tecnológico e compromisso comos usuários que evidencie o efetivo cuidado à saúde e a luta pela autonomiadas pessoas. Gestão do setor da saúde como tributo à defesa da vida nopróprio trabalho em saúde, a descentralização da gestão com papel ativo dogestor, o fortalecimento do conhecimento, da participação popular e do con-trole social.

Boa leitura para cada uma e para cada um participante da luta por saú-de, democracia e eqüidade. Que a leitura possa ajudar a construir mais vidacom qualidade, igualdade e eqüidade para todos!

Como diz Olívio Dutra, Governador do Estado do Rio Grande do Sul,“Boa Luta para Todos, para que o SUS seja legal, não só na legislação, masna vida da população brasileira!”

Maria Luiza Jaeger,Secretária da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul

1999 a 2002

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Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 5

Sumário

Enfoque

v Implantação do SUS no Rio Grande do Sul: linhas estratégicas daSecretaria da Saúde na Gestão Democrático-Popular eleita para omandato de 1999 a 2002Maria Luiza Jaeger; Ricardo Burg Ceccim; Alcindo Antônio Ferla; AnaMaria Consentino Müller; Celso Bitencourt dos Anjos / 9

Artigov Perfil epidemiológico de uma amostra de crianças atendidas em

dermatologia sanitáriaAna Rejane Wortmann; Themis Rosa; Vera Bauer Silveira; Regina Loureiro/ 29

v O Relatório de Gestão como instrumento de controle social no SUS, ocaso do Rio Grande do SulAlcindo Antônio Ferla / 41

v Campanha de testagem anônima no Dia Mundial da Luta Contra a AIDSCarmem Viegas; Juliana Dors Tigre da Silva; Lúcia Escobar; Ana LúciaBaggio; Katia Baialardi; Vilma Paese; Regina Loureiro / 59

v Tratamento ambulatorial, com supervisão semanal, de pacientes egressosde hospital especializado em tuberculoseJarbas Figueira Osório; Pedro Dornelles Picon; Sérgio Luiz Bassanesi;Erecina Figueiredo; Tania Mariza Freitas; Dalfran Maciel; Dolores Bender;Yolanda Carvalho Silveira; Ana Maria Vieira Cardoso; Lígia Gladis Richter;Irone Terezinha Girotto; Paulo Picarelli Ferreira / 67

v Acreditação pedagógica na educação em saúde coletiva

Ricardo Burg Ceccim / 81

v Um centro de informação e documentação em saúde pública/saúdecoletiva: compromissos, interfaces e perspectivas possíveis e a estanteda utopia – Parte IRuth Sant’Helena da Silva / 99

v Identificação de grupos vulneráveis por meio da detecção de clusters dehomicídios como apoio ao planejamento de ações em saúde: área deviolência e traumaSimone M. Santos; Christovam Barcellos; Marilia S. Carvalho / 117

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6 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

Memória e Históriav Do isolamento ao sanatório: diferentes práticas e serviços em um espaço

de saúde pública de Porto Alegre – de 1909 a 2001Pedro Dornelles Picon; Denise Soares Bastos; Paulo Garcia / 133

v Segregar para curar? A experiência do Hospital Colônia ItapuãArtur Henrique Franco Barcelos; Viviane Trindade Borges / 143

Especialv A gestão em saúde e sua confecção de imagem: arte política e produção

de realidades democráticasDavid Capistrano Filho / 161

Resumov Avaliação das condições higiênico-sanitárias em alimentos envolvidos em

surto ocorrido no município de Antônio Prado/RS – Janeiro de 1999Anita Mércio D’Andrea; Helena Jansson Rosek; Maria do Céu Borralho eAlbuquerque; Yara Elisabetha Rampanelli / 173

v Avaliação de produtos importados analisados no Lacen do Rio Grande doSul – 1999Anita Mércio D’Andrea; Débora Cecconi Fulginiti; Helena Jansson Rosek;Lúcia Maria Guedes Diefenbach; Maria do Céu Borralho e Albuquerque;Rosaleine Grando; Yara Elisabetha Rampanelli / 175

Atos Normativosv Portaria Nº 16/99 / 179v Resolução Nº 04/2000 / 183v Portaria Nº 09/2000 / 185v Portaria Nº 39/99 / 189

Normas Editoriaisv Política e Normas Editoriais / 193

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EnfoqueEnfoqueEnfoqueEnfoqueEnfoque

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Atenção montadora página 8 é branca

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Implantação do SUS no Rio Grande do Sul: linhas estratégicas da Secretaria da Saúde...

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 9

Implantação do SUS no Rio Grande do Sul:linhas estratégicas da Secretaria da Saúdena Gestão Democrático-Popular eleita parao mandato de 1999 a 2002 1

Maria Luiza Jaeger2

Ricardo Burg Ceccim3

Alcindo Antônio Ferla4

Ana Maria Consentino Müller5

Celso Bitencourt dos Anjos6

Resumo: Trabalho de sistematização e síntese da proposta de gestão em saúdeno Estado do Rio Grande do Sul para o período de 1999 a 2002. O trabalho apresentaos cinco eixos estratégicos propostos no mandato: descentralização, regionalização,formação, atenção integral à saúde e ênfase ao controle social e à pactuaçãointergestores. São descritas as formas de operacionalização da gestão estadual emsaúde, buscando a consolidação e o avanço na implantação do SUS. O artigo contribuià preservação da memória institucional da construção política do setor da saúde noEstado do Rio Grande do Sul.

Palavras-Chave: Sistema Único de Saúde; Rio Grande do Sul; Gestão em saú-de; Política de saúde; Memória institucional.

1 Texto extraído do Seminário de Avaliação, Integração e Participação na Elaboração e Execuçãoda Política Estadual de Saúde, realizado em 24 e 25 de Abril de 1999, na sede do Centro deTreinamento da Procergs, Porto Alegre/RS. Os autores referidos foram os ordenadores dos te-mas relatados, expressando opiniões coletivas e sistematizadas das reuniões preparatórias doSeminário. A consolidação dos textos de base com a apresentação verbal foi realizada porRicardo Burg Ceccim e Vanderléia L. P. Daron, relatores do Seminário. O presente artigo nãoreflete opiniões pessoais ou estranhas ao relatório do Seminário, buscando tão somente a opor-tunidade de disseminação de um debate datado historicamente, tal como se deu no momentocorrespondente ao final do primeiro trimestre de gestão estadual, mandato 1999-2002.2 Socióloga, especialista em Saúde Pública e em Educação e Políticas de Saúde, representanteda CUT durante toda a vigência da Comissão Nacional de Reforma Sanitária, ex-assessora técni-ca do Conselho Nacional de Saúde, ex-Secretária Municipal de Saúde em Porto Alegre-RS, ex-Presidente do Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre-RS, Secretária da Saúde no RioGrande do Sul.3 Sanitarista, Mestre em educação em saúde, Doutor em saúde coletiva, Diretor da Escola deSaúde Pública – SES/RS, como assessor pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.4 Médico de Saúde Pública, Doutorando em educação, Coordenador da Assessoria Técnica aoPlanejamento – SES/RS.5 Sanitarista, Mestre em administração da saúde, Coordenadora da Coordenação de Regulaçãodas Ações e Serviços de Saúde/CRASS – SES/RS.6 Sanitarista, Doutor em saúde coletiva, coordenador da Coordenação de Atenção Integral à Saú-de/CAIS – SES/RS.

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Maria Luiza Jaeger et al.

10 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

Apresentação

Nos dias 24 e 25 de abril de 1999, a Secretaria da Saúde do Estado do RioGrande do Sul (SES/RS) realizou o Seminário de Avaliação, Integração e Parti-cipação na Elaboração e Execução da Política Estadual de Saúde, ocorrido logoao final do primeiro trimestre de governo, buscando, com base na reflexão sobreo acúmulo do período na gestão estadual para o setor, democratizar informa-ções e democratizar a tomada de decisões.

A avaliação das definições, proposições e encaminhamentos adotadospela direção da Secretaria da Saúde decorreu da necessidade de estabeleceruma gestão em saúde de acordo com o compromisso de uma Saúde de Verda-de e com Qualidade para Todos os Gaúchos, segundo a marca de campanhapara o governo democrático e popular no Rio Grande do Sul.

A integração dos diversos segmentos de coordenação da Secretaria daSaúde e dos diversos segmentos de apoio ao Governo do Estado decorreu daexigência ética desse mesmo governo de alcançar uma gestão transparente ede trocas cooperativas.

A participação, enquanto abertura de um espaço objetivo à critica e à cola-boração, decorreu da afirmação da vontade de elaborar a política estadual desaúde com os diversos segmentos técnicos e políticos de contribuição com agestão estadual em saúde.

Participaram do seminário 88 pessoas que foram distribuídas em sete gru-pos para o debate mais minucioso das dificuldades, avanços e propostas.

Um conjunto de documentos foi colocado em discussão com os participan-tes para permitir a análise compartilhada, a avaliação de perspectivas à Secre-taria da Saúde, a avaliação das propostas de ação de governo e a formulaçãode propostas para a visibilidade institucional. Entre os documentos distribuídos,estavam Saúde de Verdade – projetos prioritários e sua repercussão financeira,Projeto Vidas – monitoramento da saúde materna, infantil e do idoso, PlanoEstadual de Assistência Farmacêutica, Proposta de Plano de Atuação da Esco-la de Saúde Pública, Proposta de Formulação da Política de Atenção Hospitalare Ações Prioritárias da Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde.Tais documentos foram produzidos pela pressão de demandas do primeiro tri-mestre de governo, permanecendo em discussão para o posterior amadureci-mento em efetivos planos de trabalho e ação política em saúde.

O Seminário propôs que os participantes avaliassem a gestão estadual,segundo os principais avanços e principais dificuldades, propondo as mudançasnecessárias. A avaliação da proposta do Seminário e a avaliação de sua execu-ção, expostas ao final do próprio Seminário, foram extremamente positivas, per-mitindo que ao final do primeiro trimestre de governo se promovesse uma ava-liação geral, se validasse as linhas estratégicas e se levantasse um conjunto deiniciativas para executar os objetivos da Secretaria e para gerar prestígio e legi-timidade ao governo democrático-popular. A positividade com que se encerrou oSeminário, sem dúvida, tornou mais aceitáveis, para os atuais gestores, osexaustivos esforços desse período para colocar em curso as ações e o projeto

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Implantação do SUS no Rio Grande do Sul: linhas estratégicas da Secretaria da Saúde...

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 11

de uma Saúde de Verdade.Neste documento, recortamos do Seminário a exposição sobre as Linhas

Estratégicas da Secretaria da Saúde (descentralização, regionalização, forma-ção e atenção integral à saúde) e a principal estratégia destacada na aborda-gem sobre Contexto e Política no Governo Democrático e Popular (fortaleci-mento das instâncias de pactuação e controle social no SUS). Foi a discussão eo debate desse Seminário que apresentou e definiu, como operacionalização dagestão estadual em saúde, os cinco eixos estratégicos que o segundo trimes-tre, recém iniciado, deveria colocar em curso e buscar consolidar para omandato.

As linhas estratégicas da Secretaria da Saúde

Descentralização

A formalização do Sistema Único de Saúde (SUS) na Constituição Federalde 1988 representou um grande avanço na organização do sistema de saúdebrasileiro. Entre outros aspectos, a diretriz descentralização abriu caminho paraa melhor aplicação e racionalização dos recursos operacionais e financeirosutilizados nos Municípios, Estados e União para a organização desse Sistema,principalmente ao definir a esfera municipal como o primeiro patamar de plane-jamento, execução, controle e avaliação das ações e serviços de saúde. A Cons-tituição associou à descentralização outras duas diretrizes: a integralidade daatenção à saúde e o controle social, estipulando o acesso universal a todos osníveis de complexidade do Sistema, o reconhecimento da indissociabilidade dosdiversos aspectos da saúde das pessoas e, também, permitindo à população adeliberação sobre a política de saúde a ser desenvolvida, além do acompanha-mento e fiscalização das ações do setor.

As definições constitucionais abriram caminho para que, em 1990, tam-bém por ampla pressão da população organizada, principalmente por meio dosmovimentos populares e sindicais, o SUS fosse regulamentado em uma lei ordi-nária, a Lei Orgânica da Saúde. Nessa lei, avançou-se um pouco mais na orga-nização de um sistema realmente único, efetivamente resolutivo e mais equâni-me de atenção à saúde. A definição de níveis decrescentes de responsabilida-des operativo-assistenciais e crescentes de responsabilidade na cooperaçãotécnica e financeira dos Estados e da União auxiliou na superação de impasseshistóricos na definição de atribuições para cada esfera de governo. Por outrolado, a organização, ainda que tênue, de ações e serviços descentralizados am-pliou enormemente o acesso a essas ações e serviços a parcelas da populaçãoaté então completamente excluídas do sistema de saúde.

Como não poderia deixar de ser, a reorganização da atenção precisou seracompanhada de um redirecionamento do financiamento. No artigo 35, a LeiOrgânica da Saúde definiu uma forma de repasse para estados e municípios, jáque foram diminuídas as responsabilidades assistenciais diretas da União. E,com base nos antecedentes sobre o tema, utilizou-se como critério básico o

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Maria Luiza Jaeger et al.

12 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

populacional, partindo-se da lógica de que, de forma geral, um maior contingen-te populacional faria jus a uma maior parcela de recursos. Esse critério foirelativizado por outros que vêm sendo progressivamente implementados desdeentão, sempre com a vigilância e a pressão das instâncias de controle social,principalmente conselhos de saúde e conferências de saúde. Atualmente, mes-mo que reste uma significativa parcela de recursos federais sendo transferidaaos estados e municípios, bem como para outras instituições, por intermédio decontratos e convênios, uma crescente fração do aporte da União já chega àponta do sistema diretamente por repasse do Fundo Nacional para os fundosmunicipais e estaduais de saúde.

Outro fator que mobiliza gestores, conselheiros e a sociedade organizadaé a insuficiência de recursos financeiros para o SUS, principalmente no contextodo aumento das demandas assistenciais provocadas pelo agravamento dasmás condições de vida e trabalho. Discute-se, nacionalmente, a identificação defontes estáveis para o setor e a participação das três esferas de governo nofinanciamento da saúde, aspecto onde se destaca a histórica omissão dosgestores estaduais, com a qual o Rio Grande do Sul contribuiu até a gestãopassada.

O diagnóstico inicial da Secretaria da Saúde apontou excessiva centraliza-ção do poder de decisão e dos recursos no círculo central; municipalização bu-rocrática dos serviços, produzindo ações com baixa resolutividade edescontínuas, sobrecarregando municípios maiores; o âmbito regionalsucateado e apenas com funções administrativas, esvaziado de qualquer auto-nomia de gestão na coordenação regional do SUS; recursos financeiros transfe-ridos sem critérios técnicos de reforço à organização regional e de estímulo àimplementação do SUS; fragmentação de respostas às instâncias de pactuaçãoe de controle social; o Estado não habilitado a qualquer das modalidades degestão previstas no SUS.

O compromisso de campanha era de que o novo governo realizaria amunicipalização solidária da saúde , fornecendo apoio técnico, financeiro eoperacional aos municípios, fortalecendo a regionalização e participando naconstituição de consórcios intermunicipais e regionais de saúde, queobjetivassem a solução conjunta de problemas comuns vivenciados nos municí-pios, em micro e/ou macrorregiões geo-sanitárias. O governo estadual destina-rá recursos financeiros diretamente aos fundos municipais de saúde, recursosesses que, em caráter emergencial e imediato, serão calculados apenas porhabitante/ano. Já no primeiro ano de governo, todos os municípios serão con-templados com recursos, tendo em vista a implantação dos sistemas loco-muni-cipais de saúde.

A proposta de Gestão Estadual em Saúde do governo visa adequar, políti-ca e organizacionalmente, a Secretaria da Saúde ao seu papel gestor no SUS.Está sendo pleiteada a habilitação do Estado do Rio Grande do Sul à GestãoPlena do Sistema Estadual de Saúde, ampliando a autonomia da SES/RS nagestão do SUS, ao mesmo tempo em que está sendo buscada, junto ao Ministé-rio da Saúde, a ampliação dos recursos financeiros e discutido o reajuste do teto

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Implantação do SUS no Rio Grande do Sul: linhas estratégicas da Secretaria da Saúde...

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 13

financeiro do Estado.A mudança no perfil de atuação e o fortalecimento das estruturas regionais

do gestor estadual deverão permitir uma efetiva coordenação da política estadu-al de saúde no âmbito regional, em cooperação técnica e operacional, por meiodo contato direto ou mediante assessoramento aos municípios, além da organi-zação de unidades regionais para o planejamento, controle e avaliação de todosos aspectos da assistência (financeiros, operacionais, de regulação epactuações intergestores).

Iniciamos a efetivação da descentralização da gestão do SUS com o incen-tivo financeiro e a regionalização da assistência e da formação por intermédiode:

1. remodelagem das delegacias regionais de saúde em coordenadoriasregionais de saúde, que de repassadoras de papéis aos municípios passaram àcooperação técnica;

2. um projeto de redes macrorregionais (sete macrorregiões geo-sanitári-as);

3. criação de 19 Núcleos Regionais de Educação em Saúde Coletiva(Nuresc), na Escola de Saúde Pública/RS, para capacitação de gestores e apoioà formação de conselheiros;

4. reorientação dos programas de residência médica pela inclusão do aper-feiçoamento profissional especializado (noção de Equipe de Saúde) e ênfase naeducação em saúde coletiva (epidemiologia, planificação e administração e ci-ências sociais para pensar o Sistema);

5. parceria com as universidades do estado como a constituição do Pólo deEducação em Saúde Coletiva;

6. fortalecimento dos consórcios existentes ou estímulo à organização denovos consórcios.

Os consórcios constituem estratégia à organização regionalizada da saú-de, tanto nos aspectos assistenciais (consultas e exames especializados, cen-tros de referência em saúde da mulher e do trabalhador, assistência hospitalar),quanto nos aspectos operacionais (aquisição de insumos, equipamentos etc.).A cooperação técnica, financeira e operacional com os municípios, o estímulo àgestão descentralizada do SUS (habilitação dos municípios à gestão plena daatenção básica e à mudança para a gestão plena do sistema dos municípioscom capacidade técnica e operacional para isso) e o suporte técnico para ahabilitação aos incentivos e projetos existentes no contexto nacional, viabilizarãomaior aporte de recursos federais para o Rio Grande do Sul e viabilizarão, tam-bém, o despertar da municipalização como construção de sistemas municipaisde saúde.

O fortalecimento das instâncias de pactuação e controle social deverá seestender pelo reconhecimento das prerrogativas de funcionamento dos Conse-lhos de Saúde, da Comissão Intergestores Bipartite e pelo respeito às funções edecisões dos Conselhos de Saúde.

A pactuação de estratégias com os municípios, por intermédio da Comis-são Intergestores Bipartite, o fortalecimento do envolvimento dos municípios e a

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Maria Luiza Jaeger et al.

14 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

construção de uma relação solidária e responsável com o SUS deverão caracte-rizar uma fase pioneira nacional da descentralização: a municipalização solidá-ria com transferência regular de recursos financeiros aos municípios, preten-dendo-se a viabilização de sistemas municipais, consórcios intermunicipais,intergovernamentais e regionais de saúde, gerenciamento regional e o SistemaEstadual de Saúde.

Regionalização

O diagnóstico da rede de atenção do estado, realizado no primeiro trimes-tre, deve ser encarado como inicial, mas é suficiente para motivar o processo deconstrução de políticas setoriais.

A rede básica do estado, em sua maioria, caracteriza-se como de baixaresolutividade e restrita quanto ao acesso (como, por exemplo, horário de fun-cionamento). Ocorre desassistência aos quadros de baixa e média gravidade dorisco à saúde que necessitam de pronto-atendimento. Os hospitais ligados aoSistema Único de Saúde não se articulam num sistema com critérios definidos.A maior parte dos hospitais ligados ao SUS é de pequeno porte, isto é, commenos de 50 leitos, apresentando uma baixa resolutividade e baixa eficiência(taxa de ocupação entre 20 e 30%). Existem hospitais com certo grau detecnologia incorporada que são potencialmente aproveitáveis como unidadesde referência, sendo sua distribuição geográfica favorecedora a que se repenseseu funcionamento sistêmico. A política utilizada para repasses do Tesouro doEstado, por meio de convênios, não obedece a critérios técnicos,epidemiológicos, de equalização e de otimização.

A lógica que se pretende implantar para a rede de atenção é aquela comordenamento orgânico locorregional. Deverá ser enfatizada a regionalização e ahierarquização, traduzidas em distribuição e complementaridade em rede (úni-ca).

Sendo a regionalização o primeiro eixo do processo, estruturou-se a cons-trução de macrorregiões. Foram utilizados como critérios para a criação dasmacrorregiões de ordenamento da atenção à saúde do Rio Grande do Sul: acapacidade instalada dos hospitais e outros serviços e a sua distribuição geo-gráfica; o fluxo e acesso dos usuários a esses serviços; a utilização da implanta-ção do subsistema de urgência/emergência como base e/ou impulsionador deoutros sub-sistemas; a utilização do conceito de urgência/emergência de ma-neira ampliada (prevenção, atenção primária/suporte básico, atendimento pré-hospitalar, atendimento intra-hospitalar/suporte avançado, reabilitação, salva-mento e resgate, educação popular) e, com igual importância, a existência e ofuncionamento de outras divisões regionais no Governo do Estado (por exem-plo, da Educação, da Agricultura, do Trabalho e da Assistência Social), visandoàs ações intersetoriais (uma visão de Sistema e não a racionalização burocráti-ca de portes e cestas de procedimentos).

A regionalização da saúde deve, também, agregar os serviços de apoiodiagnóstico e terapêutico, de modo a evitar o deslocamento para grandes cen-

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tros, encarecendo o sistema e penalizando o usuário. A rede de atenção passaa ser pensada de modo hierarquizado para cada macrorregião, respondendo àpreservação de todo o existente e ao incentivo à multifuncionalidade de serviçospara corresponder às realidades locorregionais:

1. hospitais regionais: aqueles que, pela sua capacidade instalada, por seuvolume de atendimento e sua resolubilidade sirvam de referência para amacrorregião de saúde;

2. hospitais microrregionais: são hospitais de porte médio, porém com su-ficiente capacidade para solucionar casos menos complexos, diminuindo a con-centração dos atendimentos e facilitando o acesso;

3. centros de referência e de especialidades;4. hospitais de apoio: são unidades de pequeno porte onde diversas moda-

lidades (unidades mistas) de atenção podem ser implantadas (centro de enfer-magem obstétrica, hospital-dia, centro de atenção psicossocial, casa de apoio,casa de passagem, centro de referência à saúde do trabalhador etc.);

5. rede municipal de atenção básica à saúde.A Secretaria da Saúde vem fazendo uma série de mudanças na sua estru-

tura, tanto em Porto Alegre, quanto nas coordenações regionais da saúde. Ago-ra, as coordenadorias regionais de saúde deverão ter o papel de gerenciar apolítica setorial e adaptá-la às necessidades do padrão de morbi-mortalidaderegional. A gestão regional deve se dar em parceria com os gestores e conse-lhos municipais, constituindo uma co-responsabilidade na resolução das deman-das em saúde.

Além dessas linhas de trabalho, outros aspectos deverão ser enfocados:construção de apoios para este sistema (centrais reguladoras para internação ecentrais de marcação de consultas), estabelecimento de métodos e rotinas detrabalho para as decisões e ações de curto prazo na área de assistência hospi-talar e o estabelecimento de um programa de apoio gerencial aos gestores mu-nicipais, gestores de hospitais e demais serviços vinculados ao SUS.

Os cortes constantes no financiamento do Sistema Único de Saúde, querda esfera federal, quer da esfera estadual, nos últimos anos, tem tido comoconseqüência a descapitalização das instituições. Para manter estas institui-ções funcionando e ordenar o destino destes recursos, a Secretaria da Saúdeestá trabalhando com propostas que abrangem a Atenção à Urgência e Emer-gência, Atendimento à Gestante de Alto Risco e o Índice de Valorização Hospita-lar. Essas ações são financiadas pelo Ministério da Saúde e serãocomplementadas pela esfera estadual, com critérios de financiamento, exer-cendo, assim, o controle sobre a qualidade de suas ações.

O repasse de recursos deverá estabelecer outra relação entre as partes,não um repasse a fundo perdido, mas uma antecipação de receita a ser com-pensada em parcelas acordadas entre as partes: exigência de plano diretor,tanto para aplicação de curto prazo, como para os repasses regulares; composi-ção de Conselho Gestor de caráter fiscalizador e deliberativo com composiçãoda administração do hospital, usuários e representantes dos governos estaduale municipal.

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Estabelece-se, assim, um novo patamar nas relações entre gestores, oque permite o controle social sobre os recursos públicos repassados a cadauma das unidades prestadoras, seja um hospital ou um consórcio.

A proposta de regionalização pretende ordenar a oferta de serviços, hojeconcentrada em grandes centros, promovendo a eqüidade do acesso, aresolubilidade, a humanização do atendimento e a maior proximidade do acessoao local de origem dos usuários.

Pretende-se, também, traçar uma política de investimento mais conse-qüente, enquanto se estabelece a tipologia das unidades prestadoras, o pata-mar tecnológico a ser incorporado e o grau de resolubilidade esperado.

Mais do que ordenar a oferta, pretende-se mudar a cultura organizacional,onde a oferta orienta a demanda e o gestor é um mero repassador de recursos,submetido às diferentes pressões, como o empresariado médico e as indústriasde equipamentos e de medicamentos.

O ordenamento regional visa à constituição de redes descentralizadas deatenção, onde cada serviço alcance resolubilidade de acordo com as necessi-dades de um sistema hierarquizado, integrado e integrador.

Formação

A formação, de modo pioneiro, está sendo colocada como linha estratégicana gestão estadual do SUS.

Por que a formação é estratégica?1. Porque é condição para a construção, para a implementação e para a

compreensão do SUS;2. porque há elevada demanda e ampliaram-se as expectativas de obter

formação segundo a orientação política constante na proposta de governo;3. porque é forma de difusão do conhecimento;4. porque se explica por si mesma (qualquer um compreende o que é for-

mação entre os critérios de uma política pública) e valoriza a ação governamen-tal;

5. porque produz forte consenso social e porque forma novos consensos;6. porque é arma de luta: nas consciências, nos corpos e nos sentimentos.Como a formação se coloca no Contexto de Prioridades?1. Visando à geração de uma cultura de Educação Continuada, dissemina-

da em todas as regiões de saúde, ao alcance dos municípios e dos trabalhado-res da saúde, uma vez que a formação é um importante meio para alcançar osobjetivos do SUS;

2. visando à descentralização e à regionalização das ações formativas,descentralizando e regionalizando a própria Escola de Saúde Pública;

3. visando à integração ensino-serviço da Secretaria da Saúde com os ór-gãos formadores do Estado, interpondo o SUS estadual no diálogo com a for-mação de profissionais de saúde e requisitando a participação dos cursos deLicenciatura na requalificação do trabalhador de saúde de escolaridade no ensi-no médio (conteúdos humanistas, educação popular, línguas estrangeiras, artes

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e o saber geral, como o português e a matemática);4. visando à integração de profissionais recém-formados, por intermédio

de programas de bolsas de residência médica e aperfeiçoamento especializado;5. visando à criação de uma Escola de Educação Profissional em Saúde

para o ensino técnico dos trabalhadores de escolaridade correspondente aoensino médio;

6. visando ao acesso à informação qualificada em saúde, por meio da cria-ção de um Centro de Informação e Documentação em Saúde e do(re)lançamento de uma revista científica;

7. visando à revisão ética e à avaliação metodológica das propostas depesquisa em saúde no Estado, por meio de uma Comissão de Ética na Pesqui-sa em Saúde.

A formação não se confunde com uma proposta de comunicação e infor-mação em saúde, que é absolutamente fundamental e necessária à visibilidadedo setor saúde no governo. Não se somam à formação, em senso estrito, osEncontros e Conferências que debatem a política de saúde. Esses pertencemao conjunto da Secretaria e são transversais a todas as propostas.

Existem, na área da saúde, 57 profissões e ocupações somadas, entrepessoal de âmbito elementar, médio e superior, o que revela o tamanho dasnecessidades de formação continuada.

Qual a abrangência da formação como Linha Estratégica?1. Pós-graduação (stricto e lato sensu, profissional ou acadêmica). As

áreas de prioridade incluem: formação de sanitaristas, formação de enfermeirosobstetras e enfermeiros neonatologistas, formação de odontólogos de saúdecoletiva, especialização em gestão do SUS e gestão de hospitais e serviços,especialização em saúde da família, mestrado profissional em administração dasaúde ou em saúde coletiva;

2. educação profissional no âmbito da escolaridade do ensino médio (qua-lificação para o trabalho, profissionalização, educação continuada e especializa-ção técnico-profissional). Os dados de Recursos Humanos disponíveis mos-tram que 51% dos trabalhadores de escolaridade básica não têm qualificaçãopara a função que exercem, 35% sequer conta com o ensino fundamental. Cal-cula-se que haja, ainda, 8 mil atendentes atuando em enfermagem;

3. formação inovadora de Acompanhantes Terapêuticos e Redutores deDanos (pessoal de escolaridade básica);

4. educação popular em saúde com a criação de um programa de comuni-cação e documentação do material instrucional popular;

5. capacitação para elaboração de projetos e políticas de saúde;6. formação extensiva em gestão do SUS e atuação complementar com o

Conselho Estadual de Saúde para a capacitação de Conselheiros Municipais eEstaduais de Saúde;

7. aperfeiçoamento para saúde mental coletiva e para pessoal de odonto-logia em atendimento às pessoas com deficiências;

8. formação de auditores em saúde e do Sistema de Saúde;9. educação continuada para trabalhadores de saúde;

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10. programas de Residência Médica e Aperfeiçoamento Especializado In-tegrados (Residência Integrada em Saúde), bem como programas de estágio ebolsas para acadêmicos;

11. Centro de Informação e Documentação em Saúde, transformando abiblioteca setorial de saúde pública da ESP/RS;

12. revista com periodicidade semestral ou quadrimestral;13. Comitê de Ética na Pesquisa em Saúde.A formação está atribuída à Escola de Saúde Pública/RS, que passa a ser

pólo de capacitação para o SUS/RS. A Escola de Saúde Pública/RS érecolocada como o órgão de educação e produção de conhecimento em saúdepertencente à Secretaria da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul. Promoveráa educação e a produção de conhecimento por meio de: ensino; pesquisa; ativi-dades de extensão em educação; atualização, manutenção e desenvolvimentode acervo bibliográfico; difusão de informação científica, documental e de edu-cação popular; fomento ao debate das políticas de saúde e revisão ética daspropostas de pesquisa.

A consigna estruturante da ESP/RS passa a ser Educação em Saúde Co-letiva e os conceitos estruturantes desta consigna são:

1. educação: processo relativo aos aprendizados, envolvendo aspectoscognitivos e afetivos de caráter sócio-interativo. Assim, a educação abrange tan-to o campo das construções cognitivas, quanto as experiências intensivas resul-tantes do estar junto e da composição de coletivos de aprendizagem;

2. saúde: em seu sentido mais abrangente, saúde é a expressão das con-dições de vida e trabalho, expressando as determinações das condições dealimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte,emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso às ações e serviçosde saúde. Mas saúde é, também, a capacidade de enfrentar as adversidades domeio ou a capacidade de mobilizar energias para afirmar a vida;

3. coletiva: qualidade da produção e circulação do conhecimento e das re-lações sociais. Pode estar referida a um conjunto de pessoas, à articulação deprojetos ou ao intercâmbio entre instituições. Essa concepção supõe e propõeprocessos cooperativos ou de interação para reconhecer a importância da for-mação de redes, da interação entre diversidades e das parceiras descentraliza-das e transversais.

Por meio da formação se pode preparar profissionais altamente qualifica-dos para o exercício das ações e serviços de saúde nos diferentes campos detrabalho, da investigação, da docência e das atividades sociais; manter forteinteração com a sociedade e com os órgãos formadores do Estado; empenharprojetos educacionais e de desenvolvimento do conhecimento para a elevaçãoda qualidade de vida humana e da consciência ética na área da saúde.

Atenção Integral à Saúde

A atenção integral à saúde, mais do que uma diretriz constitucional, é umgrande desafio a todos os que atuam na defesa e na implementação do Sistema

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Único de Saúde. Em primeiro lugar, por decorrência de sua abrangência. Diz-nos a Constituição que a saúde deve ser garantida mediante políticas sociais eeconômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos e aoacesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteçãoe recuperação (art. 196). Segundo a Lei Federal 8.080, de 19 de setembro de1990, a saúde expressa os níveis de organização social e econômica do país,sendo determinada e condicionada, entre outros fatores, pela alimentação, mo-radia, saneamento básico, meio ambiente, trabalho, renda, educação, transpor-te, lazer e acesso a bens e serviços essenciais, bem como outras ações queproduzem nas pessoas e nas coletividades condições de bem-estar físico, men-tal e social (art. 3º).

Definir, portanto, que há que se garantir a integralidade significa dizer quedevem ser desenvolvidas ações intersetoriais para alcançar níveis crescentesde saúde. Também significa dizer que é necessário integrar as ações e os servi-ços de saúde e suas diversas sub-áreas de conhecimento de forma a permitiruma ação que considere todas as dimensões das pessoas e das coletividades.É uma atribuição desafiadora para o poder público, principalmente, quando seconsidera que a fragmentação foi construída, não somente na organização dosserviços, como também na própria construção do conhecimento. Mais do queuma proposição técnica, a idéia da atenção integral à saúde implica uma mu-dança de enfoque na organização e na prestação das ações e serviços desaúde.

A distância e as dificuldades, que são históricas, para alcançar esse obje-tivo, não são justificativas aceitáveis para a inércia dos governos em buscá-lo.Se é verdade que o desenvolvimento teórico nessa área ficou descolado daspráticas concretas, também é verdade que há movimentos possíveis para apro-ximar os serviços dessa dimensão conceitual.

O desafio de aproximar as diversas subáreas de atuação já foi aceito naproposta de reorganizar as diversas áreas programáticas do antigo Departa-mento de Ações em Saúde. Além de agrupar os inúmeros programas em áreastécnicas e aproximar as vigilâncias epidemiológica e sanitária, também forampropostos projetos integradores, a partir do desafio de atuar conjuntamente noenfrentamento de problemas que ainda sensibilizam os indicadores de saúde doEstado.

É preciso destacar, nessa perspectiva, o projeto político de agrupar as di-versas áreas técnicas na proposição de estratégias de atenção para oenfrentamento dos principais problemas de saúde do Estado e para produzir,como conseqüência, uma reorientação na assistência atualmente prestada, amelhoria na qualidade de vida das pessoas e a mudança nos indicadores desaúde.

A diversidade epidemiológica, demográfica e sócio-cultural dos municípiose regiões do Estado levou à constatação de que deveria ser feito um trabalhomais efetivo para reduzir a mortalidade e a morbidade infantil, com ampliação daeqüidade na alocação de recursos e cooperação técnica, agregada à atençãode saúde ao idoso, tendo em vista o aumento da expectativa de vida, que no Rio

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Grande do Sul é de 71 anos de idade, com concentração de idosos na maioriados municípios de região rural. A área assistencial abrange, então, como priori-dade, a saúde materna, infantil e do idoso. Para a seleção de municípios a se-rem priorizados como de atenção inicial, devem estar aqueles com mortalidadeinfantil média acima de 20 por 1.000 nos últimos cinco anos, os municípios-sededas Coordenadorias Regionais de Saúde, os municípios da Região Metropolita-na de Porto Alegre e aqueles municípios que pertenciam aos programasassistenciais “de famílias carentes”, para evitar a descontinuidade na atenção.

Evitando-se reforçar a idéia das estratégias pontuais de redução das doen-ças e mortes, foi formulada a idéia de um projeto integrado e integrador daintersetorialidade: o Projeto Vidas, que representa uma proposta institucionalarticuladora de todos os setores da Secretaria da Saúde, buscando efetiva mu-dança do perfil de saúde dos municípios, oferecendo-se como elo para todoaparato estadual de governo. O Vidas pretende uma política sinérgica de altera-ção positiva nos determinantes e condicionantes da saúde/doença.

A atenção integral à saúde visa à melhoria da qualidade de vida da popula-ção, adequando a atenção à saúde às diferentes realidades dos municípios comações integradas intra-institucionais, interinstitucionais e intersetoriais, utilizan-do, para isto, as estruturas existentes nas regiões e municípios, com atividadeselaboradas conjuntamente (assessoria central, coordenação regional e políticamunicipal), acompanhadas e avaliadas continuamente.

Em relação à área da Vigilância à Saúde, as atividades a serem desenvol-vidas englobam suas subáreas clássicas: epidemiológica, sanitária e ambiental,incluindo-se a vigilância aos ambientes e às condições do trabalho. O cuidadosoacompanhamento e controle da incidência e prevalência das doençastransmissíveis, zoonoses e vetores, bem como das ações de prevenção e umconjunto de atividades de acompanhamento das condições de qualidade daágua, dos alimentos e dos produtos e serviços de saúde, refletem a proteção dasaúde da população.

As atividades das demais áreas técnicas da Saúde Coletiva, que fazemparte da Coordenação de Atenção Integral à Saúde, mostram o acompanha-mento das condições de vida e saúde da população gaúcha. A elaboração depropostas específicas de atenção e um grande conjunto de interfaces com ou-tras áreas do governo e da sociedade estão sendo verificados.

Exemplo emergencial é a assistência farmacêutica. As mudanças na orga-nização nacional da assistência farmacêutica básica, com a substituição do re-passe de medicamentos pela criação de Incentivo Financeiro específico, queocorreu no início de 1999, tornaram necessária a elaboração do Plano Estadualde Assistência Farmacêutica Básica, pactuado na Comissão IntergestoresBipartite (CIB/RS) e aprovado pelo Conselho Estadual de Saúde (CES/RS), comdiversas ações de capacitação nas Coordenações Regionais e nos Municípios.

A atenção integral à saúde constitui-se em pressuposto ético da formula-ção de políticas para promoção, prevenção, assistência e reabilitação, elevandoa qualidade de vida, reduzindo a mortalidade e prolongando a expectativa devida.

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Propostas quanto ao Controle Social e às instâncias de pactuação

A efetiva implantação do SUS, com controle social, merece destaque. Porum lado, o papel histórico das esquerdas no cenário nacional e, por outro, oslimites reais e concretos colocados ao governo estadual para realizar aquilo quevem sendo construído historicamente na luta pela Reforma Sanitária no país.Numa formulação simples, pode-se apontar, no Estado do Rio Grande do Sul,que falta fortalecimento ao movimento social para a defesa da vida e do SUS eque este é o grande desafio: controle social e recuperação da saúde pública.

É preciso aprofundar a questão da municipalização, enquanto posição degoverno. Discutir o que é a municipalização, os significados da municipalizaçãona área da saúde e rever essa posição na área da educação. Fortalecer a con-duta governamental de compatibilizar financiamento e proposta política com de-mocracia e descentralização . Construir uma gestão solidária e comprometidacom os municípios, sem prefeiturizar. Este tema merece aprofundamento, pois,se de um lado, há dúvidas e questionamentos acerca da municipalização naárea da educação, por outro, não há dúvidas na área da saúde. Ao contrário, hálonga convicção e certeza de que o caminho da descentralização,hierarquização, atenção integral e controle social são a possibilidade concretade implantar o SUS e garantir mais resolutividade na atenção à saúde da popu-lação.

O estabelecimento de uma nova relação com a Comissão IntergestoresBipartite e o fortalecimento dos Conselhos de Saúde demonstrarão as respon-sabilidades do Governo Estadual e do Governo Federal. É necessário aproveitarbem os recursos e dar-lhes a necessária transparência administrativa.

No que se refere às exigências políticas deste mandato, vale ressaltar osseguintes elementos: assegurar 10% das receitas líquidas do Estado para asaúde, reunir todos os recursos financeiros da saúde no seu Fundo Estadual,viabilizar o controle social pelo Conselho Estadual de Saúde e instituir o repassefinanceiro Fundo-a-Fundo de Saúde (do Estado aos municípios). Essas são lu-tas históricas, conquistadas em leis que ajudamos a escrever e que o conjuntode nosso governo necessita apropriar-se para assumi-las, caso contrário, corre-mos sérios riscos de comprometer o processo que pode garantir saúde de ver-dade com qualidade para todos os gaúchos, como afirma o Programa deGoverno.

Quanto à Municipalização Solidária da Saúde, projeto deste governo, pre-cisamos manter a proposta histórica de repasse em dinheiro do Estado aosmunicípios, assegurando o compromisso de capacitação de conselheiros e aefetivação do acompanhamento da gestão municipal. A utilização desse recursodeve servir à implementação da descentralização, com a estruturação de políti-cas regionais intermunicipais, interinstitucionais e intergovernamentais. O re-passe não deve engessar ações e deve respeitar definições estabelecidas pelosmunicípios; deve ser viabilizado o seu repasse e esse não deve ser repassadoaos consórcios, mas diretamente aos municípios (Fundo-a-Fundo); os repassesdevem ter no controle social a garantia de transparência sobre a utilização feita

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pelos municípios. Será preciso capacitar os Conselhos Municipais de Saúde,incluir participantes das Coordenadorias Regionais de Saúde (CRS – SES/RS)nos Conselhos; criar comissões de planejamento e administração nos FundosMunicipais de Saúde; envolver os movimentos sociais no estímulo ao funciona-mento dos Conselhos Municipais de Saúde (CMS); o CMS deve ser informadosobre os recursos disponibilizados para o município e a ESP/RS, junto com oConselho Estadual de Saúde/RS, por intermédio dos Núcleos Regionais de Edu-cação em Saúde Coletiva, deve programar capacitações para os gestores.

A implantação de Comissões Intergestores Bipartite em todas as regiõesde saúde será uma forma de democratizar o processo de regionalização, valori-zar as instâncias de pactuação e fortalecer o controle social.

O fortalecimento da estrutura da atenção básica à saúde via o trabalho dascoordenadorias regionais nos municípios, oferecendo apoio técnico e políticoaos mesmos, bem como articulando esse trabalho com os movimentos popula-res, sindicatos e demais atores sociais de fortalecimento do controle social, afim de que seja, de fato, implantado o SUS, poderá inverter a lógicahospitalocêntrica existente, atualmente, no Estado e terminar com acompartimentalização das ações.

Para mudar a política hospitalar no Rio Grande do Sul, será necessáriatanto a reorganização da atenção, como o fortalecimento do controle social,necessita-se do ordenamento de sistemas regionais de saúde com atenção bá-sica, de média e de alta complexificação tecnológica e não o custeio de serviçoshospitalares para que esses alcancem, isoladamente, o máximo de tecnologiaem saúde. O acesso à saúde se faz na rede única, regionalizada ehierarquizada, sob as diretrizes da descentralização, integralidade da atenção eparticipação da sociedade.

É preciso, também, acabar com as barbaridades como a dos gastos com acompra dos medicamentos excepcionais sem o critério da eqüidade: mostrar asimpossibilidades do governo estadual e denunciar as demais esferas.

Os agentes voluntários de saúde que atuam com as organizações popula-res são hoje um verdadeiro batalhão solidário do SUS. Por isso, a Secretaria daSaúde tem a tarefa de propor alternativas no sentido das ações conjuntas, par-cerias ou outras modalidades de atuação, a fim de que cumpram o papel solidá-rio na construção do SUS/RS.

A Escola de Saúde Pública/RS deverá priorizar a implantação dos NúcleosRegionais de Educação em Saúde Coletiva e capacitar gestores regionais emunicipais, bem como- atuar na qualificação de conselheiros e lideranças popu-lares para efetivar o controle social no SUS/RS. Os Núcleos devem se articularcom as universidades nas regiões e com entidades que atuam na EducaçãoPopular em Saúde, buscando a maior proximidade dos gestores municipais.

O cumprimento da lei de extinção do Inamps estipula uma obrigatoriedadea ser defendida pelo gestor que preza o controle social e sua aplicação seráuma novidade nacional ao ser implementada no Rio Grande do Sul. O artigo 12da Lei Federal nº 8.689, de 27 de julho de 1993, assevera que o gestor do SUS,em cada esfera de governo, apresentará trimestralmente ao conselho de saúde

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Implantação do SUS no Rio Grande do Sul: linhas estratégicas da Secretaria da Saúde...

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correspondente e em audiência pública nas câmaras de vereadores e nas as-sembléias legislativas respectivas, para análise e ampla divulgação, relatóriodetalhado contendo, dentre outros, dados sobre o montante e a fonte de recur-sos aplicados, as auditorias concluídas ou iniciadas no período, bem como so-bre a oferta e produção de serviços na rede assistencial própria, contratada ouconveniada.

A Lei Federal 8.142, de 28 de dezembro de 1990, definiu duas instânciascolegiadas na gestão das políticas de saúde: a Conferência de Saúde e o Con-selho de Saúde. Assim, se de um lado a existência do Conselho é condição dehabilitação às regras do SUS, de outro ele será fortalecido pela exigência doexercício de sua aprovação na aplicação de recursos estaduais e na aprovaçãodos relatórios de gestão. Além da realização da 3ª Conferência Estadual, prepa-ratória da 11ª Conferência Nacional de Saúde, deverão ser realizadas conferên-cias temáticas que popularizem e sistematizem o debate temático e deliberemas diretrizes estaduais às áreas técnicas de condução das políticas públicas desaúde.

O Rio Grande do Sul está fazendo a sua parte e cobra do governo federal edas prefeituras que façam o que lhes cabe. Ao instituir a municipalização solidá-ria da saúde, que consiste no repasse regular e automático de recursos do orça-mento do Estado para todos os municípios gaúchos que assumirem a gestão doSUS, o Governo do Estado começará a assumir o seu papel de cooperar técnicae financeiramente com os municípios. A efetiva implantação do SUS no RioGrande do Sul exigirá a parceria responsável de toda a sociedade. Precisare-mos lutar pelo reajuste da tabela do SUS, pela gestão mais qualificada dos re-cursos já existentes e, principalmente, pelo controle social sobre a suadestinação.

Encerramento

Construir uma Saúde de Verdade e com Qualidade para Todos os Gaú-chos e manter a unidade de gestão exigirá transparência e sabedoria capazesde articular austeridade administrativa na implantação do Sistema Único de Saú-de com o fortalecimento da sociedade civil no controle social das políticas desaúde. Somente com garra, força, coragem, compromisso, companheirismo,alegria e participação é que a Secretaria da Saúde construirá as condições paragarantir o acesso integral à saúde para todos os gaúchos.

As linhas estratégicas de gestão estabelecem a ligação dos vários proje-tos, mesmo na diversidade, e isto dará ao estado a possibilidade de desenvolveruma nova cultura de luta política pela saúde, agora de dentro de um governo.

Não queremos padronização, falta de originalidade ou desenvolvimento li-near, mas muita ação e pensamento que, por sermos Estado, deverão estar àserviço da população e que, por estarmos vinculados às questões de saúde,devem estar à serviço da defesa da vida. Precisamos instigar os trabalhadoresda Secretaria da Saúde e os trabalhadores do SUS a um desempenho efetivona defesa da vida e construção da saúde de verdade.

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O alicerce de nosso projeto deverá ser a construção de forçasaglutinadoras e não o embate de forças competitivas. A exigência ética de ali-nhavarmos um SUS como defesa da vida não se dará igualmente entre todas astendências do movimento sanitário. As diversas forças políticas, intelectuais, detrabalhadores e sociais são demasiado heterogêneas para que se suponha queserá fácil essa administração estadual. Entretanto, sem o desejo de fortalecer,dia após dia, a capacidade geral de comando estadual do SUS, não conquista-remos nunca o necessário acúmulo. As mazelas cotidianas são muito menoresque o projeto coletivo e uma imposição de ruptura ao processo de aprendiza-gem seria desastroso. O SUS pode dar certo no Estado do Rio Grande do Sul,de uma forma pioneira neste país, e precisamos perseguir juntos essa meta.

Implantación del SUS en el Rio Grande do Sul: líneas estratégicas de la Se-cretaria da Saúde en la gestión democrático popular elegida para el mandato de1999 a 2002

Resumen: Trabajo de sistematización y síntesis de la propuesta de gestión ensalud en el Estado del Rio Grande do Sul para el período 1999 – 2002. El trabajopresenta los cinco ejes estratégicos propuestos por el mandato: descentralización,regionalización, formación, atención integral a la salud y énfasis al control social y a lapactuación intergestores. Son descriptas las formas de operacionalización de la gestiónestadual en salud, buscando la consolidación y el avance en la implantación del SUS.El artículo contribuye a la preservación de la memoria institucional de la construcciónpolítica del sector de salud en el Estado del Rio Grande do Sul.

Palabras Clave: Sistema Único de Saúde; Rio Grande do Sul; Gestión en salud;Política de salud; Memória institucional.

Implantation of SUS in Rio Grande do Sul: strategic lines of Secretaria daSaúde in the Democratic-popular Administration elected for the mandate of 1999to 2002

Abstract : A work of systemization and synthesis of the administration proposal inhealth in the State of Rio Grande do Sul for the period of 1999 to 2002. The workpresents the five strategic axes proposed in the mandate: decentralization,regionalization, formation, integral attention to health and emphasis to the social controland the inter-managers pact. The ways of operating the state administration in healthare described, looking for the consolidation and the advance in the implantation of SUS.The article contributed for the preservation of the institutional memory of the politicalconstruction of the section of health in the State of Rio Grande do Sul.

Key-words : Sistema Único de Saúde; Rio Grande do Sul; Administration in health;Politics of health; Institutional memory.

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Implantação do SUS no Rio Grande do Sul: linhas estratégicas da Secretaria da Saúde...

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 25

Primeiro Dia: Sábado – 24/04/998:30h – AberturaCoordenação: Ricardo Burg Ceccim9:00h – Contexto e Política no GovernoEstadualCoordenação: Vanderléia L. P. DaronExpositores:ü Miguel Rosseto – Vice-Governadorü David Capistrano Filho – Coordena-dor do Projeto Qualis/SP, Secretário deSaúde (1989-1992) e Prefeito (1993-1996) de Santos-SPü Maria Luiza Jaeger – Secretária deEstado da Saúde10:45h – Início do Debate11:00h – Intervalo11:15h – Seqüência do debate12:00h – Almoço13:30h – Plenária de abertura do pro-cesso de avaliação participativaCoordenação: Ricardo Burg Ceccim eKátia Reichow14:00h – Trabalho em grupos:Análise dos Principais Avanços, Princi-pais Dificuldades e Propostas de Mu-dança na SES/RS16:00h – Intervalo16:20h – Plenária e Debate das Avalia-çõesCoordenação: Kátia Reichow, StênioDias Pinto Rodrigues e Ricardo BurgCeccim18:00h – Encaminhamentos comestruturação e distribuição de materialpara trabalho no dia seguinteCoordenação: Ricardo Burg Ceccim18:30h – Encerramento21:00h – Jantar

Anexo

Seminário de Avaliação, Integração e Participação na Elaboração eExecução da Política de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul

Data: 24 e 25 /04/1999 Local: Centro de Treinamento da ProcergsProgramação:

Segundo Dia: Domingo – 25/04/998:30h – As Linhas Estratégicas da Secreta-ria da SaúdeCoordenação: Maria Luiza Jaeger (Abor-dando o eixo transversal do Fortalecimentodas Instâncias de Pactuação e ControleSocial)Expositores:ü Alcindo Antônio Ferla – Coordenador daAssessoria Técnica ao Planejamento:Descentralização;ü Ana Maria Consentino Müller – Coorde-nadora da Regulação das Ações e Serviçosde Saúde: Regionalização;ü Celso Bitencourt dos Anjos – Coordena-dor da Atenção Integral à Saúde: AtençãoIntegral de Saúde;ü Ricardo Burg Ceccim – Diretor da ESP/RS: Formação.9:30h – Trabalho em GruposRoteiro: Análise compartilhada dos docu-mentos distribuídos, avaliação de perspec-tivas à SES/RS, propostas de ação do go-verno e propostas para a visibilidadeinstitucional.12:00h – Almoço14:00h – Plenária e encaminhamentoCoordenação: José Eduardo Martins Gon-çalves 15:45h – Intervalo16:00h – Gestão do Estado em Saúde: per-cepção estratégicaCoordenação: Maria Luiza JaegerDebatedor: David Capistrano Filho17:30h – Avaliação do Seminário e encami-nhamentos: ser governo em saúdeCoordenação: Maria Luiza Jaeger18:00h – Encerramento e ConclusãoCoordenação: Vanderléia L. P. Daron

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Atenção montadora página 26 é branca

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ArtigoArtigoArtigoArtigoArtigo

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Atenção montadora página 28 é branca

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Perfil epidemiológico de uma amostra de crianças atendidas em dermatologia sanitária

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 29

Perfil epidemiológico de uma amostra decrianças atendidas em dermatologiasanitária

Ana Rejane Wortmann1

Themis Rosa1

Vera Bauer Silveira2

Regina Loureiro2

Resumo: Em março de 1999, o Ambulatório de Dermatologia Sanitária da Se-cretaria Estadual da Saúde do Rio Grande do Sul criou um serviço de atendimentoespecializado em dermatologia pediátrica. Com a intenção de conhecer o perfilepidemiológico da demanda ao novo serviço, foi feito um estudo transversal comuma amostra de 163 crianças, medindo–se a prevalência das patologias e de al-guns fatores de risco associados. Os resultados indicaram que além da esfera detratamento, as medidas preventivas devem pertencer ao projeto assistencial. A cli-entela atendida, na sua maioria, era proveniente das camadas sociais de baixarenda e escolaridade, mas as crianças tinham boas condições de higiene e as casastinham boas condições de saneamento. No entanto, quase 30% dos diagnósticosforam de escabiose, que também se manifestava em muitos outros familiares e pes-soas que compartilhavam a casa.

Palavras–Chave: Dermatologia; Pediatria; Saúde pública.

Introdução

Em março de 1999, foi inaugurado o serviço de Dermatologia Pediátricano Ambulatório de Dermatologia Sanitária (ADS) da Secretaria Estadual daSaúde do Rio Grande do Sul (SES/RS), com o objetivo de atender à demandade crianças que procuravam atendimento com as mais variadas patologiascutâneas. Ao mesmo tempo, foi dado início a um estudo transversal com aproposta de estabelecer as patologias cutâneas mais freqüentes nesta faixaetária e, por meio da determinação dos fatores de risco associados, poderatuar não só na esfera do tratamento como também de maneira preventivadessas dermatoses.

A dermatite atópica e as zoodermatoses, dentre as quais destacamos aescabiose e a pediculose, e as piodermites configuram as principais e mais

1 Médica Residente em Dermatologia Sanitária.2 Preceptora da Residência Médica em Dermatologia Sanitária.

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Ana Rejane Wortmann et al.

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freqüentes patologias de pele em nosso meio, no que se refere à dermatologiapediátrica.

Foi realizado um estudo no serviço de dermatologia pediátrica da Uni-versidade Federal do Rio Grande do Sul, na Irmandade Santa Casa de Mise-ricórdia de Porto Alegre (Cestari et al.,1992). Dos diagnósticos realizados, osmais freqüentemente encontrados foram: eczemas (31,7%), sendo mais co-mum o atópico; infestações (14,1%) e piodermites (11,5%). Conforme estemesmo trabalho, a maioria das referências encontradas na literatura estuda aincidência das dermatoses em todos os grupos etários. Zaitz et al. (1979), emSão Paulo, encontraram em 1.795 pacientes um percentual maior deeczemas (40,25%), seguido de zooparasitoses, micoses superficiais, tumo-res e reações de hipersensibilidade. Em um estudo retrospectivo, realizadona Clínica de Dermatologia Pediátrica do Hospital Geral da Cidade do Méxi-co, verificou–se que, dentre os dez mil atendimentos realizados entre os anosde 1990 e 1994, as principais dermatoses encontradas foram dermatiteatópica, verrugas, pitiríase alba (uma das manifestações cutâneas de pacien-tes atópicos), prurigo por ectoparasitas e vitiligo (Garcia; Vazquez; Gonçal-ves, 1995). Já nos Estados Unidos, o predomínio foi de acne, verrugas,eczemas, psoríase e ceratoses actínicas, provavelmente por diferenças cli-máticas e sócio–econômicas (Hayden, 1985). Ainda em outros estudos, amaior incidência foi de infestações, piodermites e prurigo estrófulo (Perret etal, 1991; Talhari; Torrecila; Talhari, 1987).

O Ambulatório de Dermatologia Sanitária da SES/RS é um serviço dereferência para o atendimento de dermatologia dentro de uma perspectiva deSaúde Coletiva. Atende a uma demanda mais específica da população, mui-tas vezes encaminhada por outros Serviços. No ambulatório de pediatria esteperfil ainda era desconhecido, embora não esperássemos resultados diferen-tes dos encontrados na literatura referida. O que pretendíamos, entretanto,era avaliar também os possíveis fatores de exposição, de forma que obtivés-semos informações para definir as estratégias assistenciais de maiorresolutividade para nossa demanda.

Material e método

Foram avaliadas 163 crianças, na faixa etária de 0–12 anos, comafecções cutâneas, que procuraram o serviço de dermatologia pediátrica es-pontaneamente, por encaminhamento de profissionais de outros serviços(pediatras) ou por dermatologistas do próprio ambulatório, no período de abrila setembro de 1999.

O delineamento escolhido foi o estudo transversal, com o objetivo derelacionar as patologias mais prevalentes e os fatores de risco associados.

Os desfechos estudados foram as diversas patologias dermatológicas –tipo de afecção cutânea: eczemas, zoodermatoses, piodermites e outras –diagnosticadas por anamnese e exame físico. Foram coletados dados so-

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Perfil epidemiológico de uma amostra de crianças atendidas em dermatologia sanitária

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bre sexo e idade da criança, escolaridade do responsável e renda familiarpara definir o perfil da amostra estudada. Para avaliar a exposição, foramanalisados dados sobre condições de habitação, tais como número de cômo-dos, número de pessoas e presença de água, esgoto e banheiro dentro decasa; condições de higiene pessoal, segundo uma avaliação subjetiva doentrevistador; contato em grupo com outras crianças de acordo com a fre-qüência à escola ou creche; história de contato com casos semelhantes; his-tória de contato com animais; história de tabagismo intradomiciliar e antece-dentes patológicos familiares e pessoais.

Os questionários foram aplicados pelas próprias investigadoras e esta-giários, sempre imediatamente antes da consulta dermato–pediátrica. As in-formações eram dadas pelo adulto que estivesse acompanhando a criança àconsulta. A coleta de dados foi feita durante aproximadamente quatro meses– em duas diferentes estações do ano – outono e inverno.

Resultados

As dermatoses mais encontradas foram: escabiose (28.8%); dermatiteatópica (19,6%); outros eczemas (15,3%); dermatofitoses (7,4%); impetigo(6,7%) e outras (22,1%). Quando analisamos a possibilidade de associaçãodos diagnósticos, verificamos que a maioria destes era única e, apenas nocaso do diagnóstico de escabiose, encontramos algumas complicações comoo impetigo (8 casos – 17%) e outros eczemas (3 casos– 6,4%), além de cincocasos (10,6%) de dermatite atópica e escabiose diagnosticados na mesmacriança – como observamos no quadro (Quadro 1).

Quadro 1 – Distribuição das dermatoses diagnosticadas e diagnósticos asso-ciados

Diag.1 Escabiose Impetigo Dermatite Dermatite Outros OutrasFreq % Freq % Atópica Micoses Eczemas Dermatites

Diag.2 Freq % Freq % Freq % Freq %Escabiose Zero Zero 2 Zero Zero 1

– – 6,3 – – 2,8Impetigo 8 Zero Zero Zero 1 Zero

17,0 – – – 4,0 –Dermatite 5 Zero Zero Zero Zero 1atópica 10,6 – – – – 2,8Outros 3 Zero Zero 1 1 1Eczemas 6,4 – – 8,3 4,0 2,8Não se 31 11 30 11 23 33aplica 66,0 100,0 93,7 91.7 92,0 91,6TOTAL 47 11 32 12 25 36

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A tabela 1 nos mostra a distribuição das variáveis demográficas daamostra estudada. Aproximadamente 30% da amostra tinha menos de 2 anosde idade e praticamente metade dos pacientes eram meninas e metade me-ninos. Ao examinarmos a renda familiar e a escolaridade dos responsáveis,verificamos que metade da população estudada tinha renda familiar menordo que 3 salários mínimos e 76% desta população tinha apenas o ensinofundamental completo. Entretanto, quando avaliamos condições de habita-ção, do ponto de vista da exposição às condições de risco para dermatoses(tanto infecciosas como alérgicas), encontramos um resultado surpreenden-te. Apesar de pertencerem a uma camada social com baixa renda, 94% dosentrevistados referiram ter no domicílio água, esgoto e banheiro interno e amaioria (64,2%) das casas acomodava apenas uma pessoa por cômodo (con-siderando todos os cômodos da casa).

Tabela 1 – Distribuição de algumas características demográficas da amostraestudada

VARIÁVEL (n=165) FREQÜÊNCIA %SEXOFeminino 84 50,9Masculino 81 49,1IDADEMenos de 2 anos 50 30,32 anos ou mais 115 69,7RENDA FAMILIAR (SM)Menos de 01 SM 3 1,81–3 SM 80 48,54–6 SM 58 35,27–10 SM 12 7,310 SM ou + 10 6,1Ignorado 2 1,2ESCOLARIDADEAnalfabeto 2 1,21ª – 4ª série 36 21,85ª – 8ª série 88 53,3Ensino médio 36 21,8Nível superior 2 1,2Ignorado 1 0,6CONDIÇÕES DE HABITAÇÃO(Nº de pessoas por cômodo)Uma pessoa por cômodo 106 64,2Duas pessoas por cômodo 41 24,8

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Perfil epidemiológico de uma amostra de crianças atendidas em dermatologia sanitária

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 33

VARIÁVEL (n=165) FREQÜÊNCIA %Três pessoas por cômodo 8 4,8+ de três por cômodo 10 6,2

CONDIÇÕES DE HABITAÇÃO(Saneamento básico)Água encanada 3 1,8Esgoto 4 2,4Água e esgoto 156 94,5Nenhum 2 1,2CONDIÇÕES DE HABITAÇÃO(Banheiro em casa)Banheiro interno 146 88,5Banheiro externo 15 9,1Sem banheiro 1 0,6Ignorado 3 1,8

Alguns dos fatores de risco estudados estão organizados na tabela 2.Uma avaliação da higiene pessoal feita no momento da consulta mostrou quea maioria das crianças tinha boas condições de higiene. Mais de metade de-las freqüentava creche ou escola, apenas 12% em turno integral. A freqüên-cia de presença de animais domésticos na casa foi alta (66%) e também apresença de tabagistas (52%). A referência de casos semelhantes na famíliachama a atenção – 36% dos entrevistados responderam que alguém na casatinha um quadro semelhante ao da criança que estava sendo examinada. Amesma situação foi verificada quando perguntamos sobre casos de alergiarespiratória entre os familiares. Quanto à freqüência de alergias entre ascrianças (relatada pelos pais ou responsáveis), 31,5% responderam afirmati-vamente. Quando perguntados sobre para quais substâncias estas criançastêm alergia, três fatores se destacaram: pêlos, poeira e insetos.

Tabela 2 – Distribuição de alguns fatores de risco avaliados na amostra estu-dada

VARIÁVEL (n=165) FREQÜÊNCIA %HIGIENE PESSOALBoa 127 77,0Regular 30 18,2Ruim 3 1,8Ignorado 5 3,0

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VARIÁVEL (n=165) FREQÜÊNCIA %FREQÜÊNCIA EM CRECHE/ESCOLAUm turno 73 44,2Dois turnos 20 12,1Não freqüenta 72 43,6CASOS SEMELHANTESSim 59 35,8Não 95 57,6Ignorado 11 6,7ANIMAIS DOMÉSTICOSSim 109 66,1Não 56 33,9TABAGISMO NO DOMICÍLIOSim 86 52,1Não 77 46,7Ignorado 2 1,2ALERGIA RESPIRATÓRIA NA FAMÍLIASim 105 63,6Não 59 35,8Ignorado 1 0,6ECZEMA NA FAMÍLIASim 40 24,2Não 119 72,1Ignorado 6 3,6ALERGIA RESPIRATÓRIA PESSOALSim 63 38,2Não 99 60,0Ignorado 3 1,8ECZEMA PESSOALSim 42 25,5Não 114 69,1Ignorado 9 5,5ALERGIA A SUBSTÂNCIASSim 52 31,5Não 7 58,8Ignorado 16 9,7

Na análise da distribuição do desfecho estudado – dermatoses – se-gundo alguns fatores de exposição (tabela 3), poucas situações apontarampara a possibilidade de associação estatística. A maioria das variáveis estu-dadas mostrou uma distribuição mais ou menos igualitária, com exceção da

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Perfil epidemiológico de uma amostra de crianças atendidas em dermatologia sanitária

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distribuição dos casos de escabiose, segundo o fato de ter casos semelhan-tes na família e os casos de dermatite atópica, segundo a presença deeczemas na família e história de alergia respiratória. Também encontramosuma freqüência maior de impetigo e dermatite atópica no outono. Testamosalgumas variáveis para estimar associação e risco, considerando os diagnós-ticos agrupados em dermatoses infecciosas e dermatoses alérgicas, além deagrupar algumas categorias de exposição.

Tabela 3 – Distribuição dos desfechos agrupados, associação estatística eestimativa de risco

FATORES DE DOENÇAS DOENÇAS Tendência Intervalo deRISCO (n=127) INFECCIOSAS ALÉRGICAS de OR confiança

Freq. % Freq. % associação (IC)(p)

IDADEMenor de 2 anos 30 42,9 16 28,0 NS – –Maior/igual a 2 anos 40 57,1 41 72,0SEXOMasculino 40 57,1 25 43,9 NS – –Feminino 30 42,9 32 56,1RENDA FAMILIARMenos de 3 SM 33 47,1 36 63,2 NS – –Mais de 3 SM 37 52,9 21 36,8ESCOLARIDADEDOS PAISAté Ensino 51 72,9 46 80,7 NS – –FundamentalAcima do Ensino 19 27,1 11 19,3FundamentalHIGIENE PESSOALBoa 49 70,0 47 82,4 NS – –Regular 50 27,1 48 14,0Ruim 2 2,8 2 3,5FREQÜENCIA EMCRECHE/ESCOLASim (meio–turno) 24 34,2 28 49,1 NS – –Sim (turno integral) 25 15,7 29 8,8Não 35 50,0 24 42,1CASOS SEMELHANTESSim 39 55,7 8 15,8 0,000 5,98 2,33 – 15,72Não 40 41,4 9 70,1Ignorado 2 2,9 8 14,0

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FATORES DE DOENÇAS DOENÇAS Tendência Intervalo deRISCO (n=127) INFECCIOSAS ALÉRGICAS de OR confiança

FREQ. % FREQ. % associação (IC)(p)

CONTATO COMANIMAISSim 49 71,4 34 59,7 NS – –Não 50 28,6 35 40,3Ignorado Zero – Zero –TABAGISMODOMICILIARSim 37 52,9 31 54,4 NS – –Não 38 45,7 26 45,6Ignorado 1 1,4 Zero –ALERGIARESPIRATÓRIAFAMILIARSim 47 67,1 34 61,4Não 48 32,9 35 36,8Ignorado Zero – 1 1,8ECZEMA NA FAMÍLIASim 8 15,7 19 38,6 0.003 3.39 1.36 –Não 9 80,0 20 57,9 8.61Ignorado 3 4,3 2 3,5ALERGIA RESP.PESSOALSim 19 32,9 27 47,4Não 20 65,7 28 49,1 NS – –Ignorado 1 1,4 2 3,5ALERGIA PESSOALSim 20 28,6 16 28,0Não 21 61,4 17 56,1 NS – –Ignorado 7 10,0 9 15,8ESTAÇÃO DO ANOOutono 34 52,9 40 70,1Inverno 34 47,1 17 29,9 0.04 2.10 0,94 – 4,69

Discussão e conclusões

Os resultados ficaram dentro da expectativa, os eczemas e asinfestações foram as dermatoses encontradas com maior freqüência. Tam-bém não nos surpreendeu o fato da clientela atendida ter, na sua maioria,

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Perfil epidemiológico de uma amostra de crianças atendidas em dermatologia sanitária

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 37

baixa renda e escolaridade – este é também o perfil da clientela adulta atendi-da no ADS. Entretanto, a maior parte das variáveis de exposição não apre-sentaram associações estatisticamente significativas com as dermatoses –mesmo agrupadas como doenças infecciosas e doenças alérgicas. E as duassituações em que as medidas de efeito mostraram risco aumentado para asdermatoses agrupadas foram exatamente as situações em que a convivênciafamiliar e a hereditariedade influenciam neste resultado. As variáveis casossemelhantes na família e história de eczemas na família mostraram associa-ção com os desfechos estudados, principalmente, em função da altaprevalência encontrada de escabiose e dermatite atópica. A variável estaçãodo ano mostrou uma tendência de associação – com p = 0,04 – entretanto, oIntervalo de Confiança da medida de risco não confirmou este resultado. Éprovável que isto tenha ocorrido em função do tamanho da amostra que, sen-do pequena, não teve poder estatístico suficiente para demonstrar associa-ção e maior risco de dermatites alérgicas no inverno.

Algumas situações metodológicas devem ser comentadas. A coleta dosdados sobre condições de higiene pessoal foi necessariamente subjetiva – aimpressão pessoal do entrevistador. Entretanto, ao nosso ver, para significarfator de risco para dermatose, seria pouco provável que uma falta de higienecrônica não fosse percebida – mesmo que a criança tivesse tomado banho ecolocado roupa limpa para a consulta. A variável número de pessoas por cô-modo pode ter sido coletada de forma inadequada, pois todos os cômodos dacasa foram considerados como disponíveis para acomodar as pessoas deforma adequada.

Outro dado que chamou a atenção foi que muitas pessoas não identifi-cavam as lesões pruriginosas como escabiose (sarna) e, freqüentemente, jáhaviam tentado tratá-las como alergia. Este dado, que não tinha sido incluídocomo variável a ser coletada no instrumento de inquérito, foi uma observaçãomuito importante, pois nos aponta para a necessidade de orientar melhor aspessoas sobre os riscos dos diagnósticos e tratamentos errados. Veja a asso-ciação escabiose–impertigo. Outras crianças já tinham tido diagnóstico e indi-cação de tratamento, mas o mesmo não tinha sido efetivo.

Outra observação que se faz necessária é que as crianças,freqüentemente, foram o caso índice para uma série de diagnósticos e trata-mentos de outras pessoas na família com a mesma dermatose, principal-mente os casos de escabiose.

Consideramos que este estudo trouxe informações importantes paranosso trabalho na Dermatologia Pediátrica e que poderá ser útil para queoutros serviços com as mesmas características possam planejar suas estra-tégias de atendimento.

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Perfil epidemiológico de una muestra de niños atendidos en dermatologíasanitaria

Resumen: En marzo de 1999, el Ambulatório de Dermatologia Sanitária de laSecretaria Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul creó un servicio de atenciónespecializado en dermatología pediátrica. Con la intención de conocer el perfilepidemiológico de la demanda al nuevo servicio, se realizó un estudio transversalcon una muestra de 163 niños midiéndose la prevalencia de las patologías y dealgunos factores de riesgo asociados. Los resultados indicaron que, además de laesfera de tratamiento, las medidas preventivas deben pertenecer al proyectoasistencial. La clientela atendida, en la mayoría, era proveniente de las camadassociales de baja renta y escolaridad, pero los niños tenían buenas condiciones dehigiene y las casas tenían buenas condiciones de saneamiento. Sin embargo, casi30% de los diagnósticos realizados fueron de escabiosis, que también semanifestaba en muchos otros familiares y personas que vivían en la misma casa.

Palabras Clave: Dermatología; Pediatría; Salud pública.

Epidemic profile of a sample of children assisted in sanitary dermatology

Abstract: In March 1999, the Ambulatório de Dermatologia Sanitária of theSecretaria da Saúde of Rio Grande do Sul created a service of specialized service inpediatric dermatology. With the intention of knowing the epidemic profile of thedemand to the new service, a traverse study was made with a sample of 163 children,measuring the prevalence of the pathologies and of some associated risk factors.The results indicated that besides the treatment sphere, the preventive measuresshould belong to the assistance project. The assisted clientele, in its majority, camefrom the social classes of low income and education, but the children had goodhygiene conditions and the houses had good conditions of sanitation. However,almost 30% of the diagnoses were of scabies, that were also manifested in manyother relatives and people that shared the house.

Key–words: Dermatology; Pediatrics; Public health.

Referências

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Perfil epidemiológico de uma amostra de crianças atendidas em dermatologia sanitária

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Atenção montadora página 40 é branca

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O Relatório de Gestão como instrumentode controle social no SUS, o caso do RioGrande do Sul 1

Alcindo Antônio Ferla2

Resumo: Relatórios de gestão e controle das ações e serviços de saúde nalegislação nacional aparecem pela primeira vez na Lei Federal nº 8.080/90 comoproposta de instrumento de acompanhamento da gestão financeira dos recursos dasaúde de cada uma das esferas, particularmente aqueles repassados pelo FundoNacional de Saúde a estados e municípios. A gestão do SUS no Estado do RioGrande do Sul, em 1999, optou por fortalecer essas possibilidades e facilitar as rela-ções com os gestores municipais. Tomando como base a legislação existente sobreRelatórios de Gestão e o Decreto Estadual que instituiu a Municipalização Solidáriada Saúde, regulamenta-se a utilização dos mesmos instrumentos e fluxos já estabe-lecidos legalmente, inclusive o Relatório de Gestão Municipal, ratificando-se quetambém os repasses estaduais são objeto de análise do Sistema Estadual de Acom-panhamento, Controle, Avaliação e Auditoria. Isso significou que a regularidade dautilização dos recursos do Estado do Rio Grande do Sul, repassados aos municí-pios, além das instâncias de controle horizontal já existentes, também será acompa-nhada pelos componentes municipal, estadual e federal do Sistema Nacional deAuditoria e pelos conselhos municipais de saúde e câmaras municipais. Os relatóri-os de gestão abertos à transparência e ao controle social sobre o poder público sãomecanismos que qualificam a gestão da saúde no estado.

Palavras-Chave: Gestão em saúde; Sistema Único de Saúde; Rio Grande doSul; Controle social; Financiamento da saúde; Legislação sanitária; Controle e audi-toria em saúde.

Introdução

A construção do Sistema Único de Saúde (SUS) envolveu amplos seto-res sociais e estabeleceu parâmetros e desafios para a administração públicaque, muitas vezes, se chocaram com a tradição administrativa centralizadorae burocrática, fortemente consolidada em nosso país durante o período da

1 Texto elaborado para subsidiar a sistemática de relatórios no acompanhamento da gestão doSUS, Seminário de Planejamento, abril de 2000.2 Médico de Saúde Pública, doutorando em Educação, Coordenador da Assessoria Técnica aoPlanejamento da Secretaria de Estado da Saúde do Rio Grande do Sul, ASTEPLAN-SES/RS.

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ditadura militar. Mesmo que, desde os anos 50 do século passado, a teoriaadministrativa já estivesse produzindo alternativa organizacional e degerenciamento, controle e avaliação, foram as propostas de políticas sociais– gestadas pelos movimentos de resistência à ditadura – que, visando à ga-rantia da qualidade de vida, aceleraram as mudanças concretas na gestãodas políticas públicas em termos de novidade a sua organização e ao seuacompanhamento.

A partir da década de 70, principalmente com origem nas lutas dosmovimentos populares por saúde, a Reforma Sanitária Brasileira3, que se ex-pressou no processo constituinte, na Constituição Federal e na legislaçãocomplementar subseqüente, postulava a democratização do acesso aos bense serviços de saúde, mas também a democratização do acesso aos mecanis-mos de funcionamento do Estado e não somente aos resultadosredistributivos das políticas públicas (Carvalho, 1997, p. 93).

Nesse sentido, as diretrizes constitucionais de descentralização da ges-tão, integralidade da atenção e controle social sobre o sistema de saúde de-mandaram maior velocidade na produção de tecnologias de gestão para aárea da saúde. Rigidez na hierarquia, distribuição estática de autoridade, pre-cisão na definição de objetivos organizacionais, formalização precisa de pro-cedimentos e instrumentos de controle em função da especialização das es-truturas organizacionais e da distribuição do trabalho mostraram-se crençasinadequadas para o objetivo de produzir e acompanhar políticas para amelhoria da qualidade de vida das pessoas, situação intimamente associadaàs variáveis sociopolíticas e mutantes condições de vida a que estão subme-tidas. Foi preciso compor estratégias e modelos capazes de responder agil-mente às condições concretas e conceitos como flexibilidade,descentralização, autonomia, horizontalidade, interdisciplinaridade, transpa-rência e controle por parte da população foram conceitos que auxiliaram naproposição das novas estratégias. A própria arquitetura institucional do Esta-do foi posta em cheque e as propostas que emergiram tratavam de criar ins-tâncias e procedimentos de pactuação e cooperação entre as esferas de go-verno e de controle social e publicização4 do poder público. É importante

3 A Reforma Sanitária Brasileira é o processo de transformação da norma legal e do aparelhoinstitucional que regulamenta e se responsabiliza pela proteção à saúde dos cidadãos, carac-terizado pelo deslocamento de poder político à população, concretizado pela busca do direitouniversal à saúde e por um sistema público, de gestão estatal, para a sua execução. Esseprocesso foi desencadeado principalmente a partir da década de 70 e teve sustentação políti-ca e técnica nos movimentos populares e sindicais e em grupos de trabalhadores em saúde eda academia que defendiam esse ideário e o processo mais geral de democratização do Esta-do, o chamado Movimento de Reforma Sanitária Brasileira (Fleury Teixeira, 1989).4 Por publicização se está definindo o processo de subordinação da lógica do Estado ao inte-resse público, assim entendido o interesse mais geral ou comum da sociedade. Veja-se que háum deslocamento teórico do público, contemporaneamente reduzido às estruturas, funções eações do Estado, para um termo etimologicamente associado à expressão latina que lhe deuorigem: res pública – coisa ou negócio do povo, conforme Carvalho (1997).

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destacar que, embora apareça em quase todas as teorias sobre o Estado emque a descentralização também está presente, com perspectivas as mais di-versas, no Brasil a disseminação de fóruns de participação na área da saúdese dá a partir do final da década de sessenta, ancorada na formulação teóricaque aponta a crise de legitimidade das democracias liberais, na crise econô-mica mundial, na eclosão dos novos movimentos sociais, na orientação dosórgãos internacionais de fomento e na agenda do setor saúde brasileiro(Côrtes, 1996). Ou seja, mesmo que por vezes traduzida somente na deman-da por ampliação do acesso a ações e serviços de saúde, o movimento brasi-leiro de reforma do setor saúde tem suporte diretamente na idéia de demo-cratização do Estado, com controle social da sociedade.

Na área da saúde, onde esse processo de mudanças aconteceu maisprecocemente, diversas das estratégias desenvolvidas já têm ampla regula-mentação legal, embora ainda despertem algumas resistências por parte,principalmente, da tecnoburocracia existente nas áreas de gestão e de orien-tação técnica das políticas específicas e nas instâncias de controle burocráti-co, que perderam poder com a inversão do modelo organizacional. Já sãobem clássicos os estudos que, partindo inclusive da organização do conheci-mento científico na área da saúde, demonstram a resistência das áreas técni-cas na construção compartilhada, descentralizada e horizontal de estratégiasde atenção à saúde, pautadas também por outras racionalidades, exceto aracionalidade cognitivo-instrumental que colonizou o desenvolvimento cientí-fico moderno. A resistência burocrática das áreas administrativas, traduzidana tentativa constante de subordinar as ações assistenciais aos procedimen-tos formais legitimados pela tradição administrativa ainda vigente, tambémdescreve, nos estudos que identificam limites de tecnologia administrativa nasaúde, o viés tecnoburocrático que compromete a plena implementação doSUS no país. Estudos têm identificado, inclusive, certa autonomia datecnoburocracia estatal em relação à própria orientação política formuladapara o aparelho de Estado (Lucchesi, 1989). É na interação com essas ins-tâncias de gestão estatal que os fóruns de participação da população têmproduzido arranjos inovadores da gestão pública. Essa possibilidade de cria-ção é intrínseca à própria idéia de controle social, que representa desde aorigem uma mediação instável entre o controle da população sobre o poderpúblico, própria do Movimento de Reforma Sanitária, e a idéia de controle dopoder público sobre a população, própria da cultura política autoritária da dita-dura militar (Ferla, 1999).

Reconhecedores da posição inovadora em que se encontrava a saúdedurante o período de discussões dos dispositivos constitucionais, os legisla-dores constituintes definiram, no próprio texto da Carta Magna que define oatual sistema público de saúde brasileiro, a autonomia para que o Poder Pú-blico dispusesse sobre a regulamentação, fiscalização e controle das ações eserviços de saúde (Brasil, 1988, Art. 197), já que a efetivação das definiçõesque estavam sendo formuladas dependeria de constituir novas tecnologias e

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de implementá-las, o que implicaria em superar o conjunto de resistências jádescritas e despender mais tempo para implantar o então novo sistema desaúde.

Apesar dessas resistências, é indubitável o avanço que já se observa nopaís na implementação dos princípios e das diretrizes constitucionais para aorganização e o funcionamento do sistema público de saúde. Entre as estra-tégias e os instrumentos desenvolvidos para acompanhar a implantação darede única de ações e serviços, descentralizada, hierarquizada, com garantiade ações integrais e permeável ao controle social, já estão regulamentadosplanos de saúde (planejamento horizontal, pactuado pelos diversos atores),relatórios de gestão (prestação de contas pública e transparência da gestão),conselhos e conferências de saúde (controle social) e diversos subsistemasde informação que permitem a qualquer cidadão acessar dados sobre a orga-nização e o funcionamento do SUS. Muitos desses avanços institucionais,que se descolam da lógica tecnoburocrática em direção à democratização docontrole institucional, são conseqüência da própria ação das instâncias departicipação da população no sistema de saúde. Essas instâncias formamopinião e vontade pública e seu efeito se expressa não pela ação direta degoverno, que está fora de sua esfera de atuação, mas pelo estabelecimentode parâmetros de interesse público para o governo (Carvalho, 1997).

Localizar e comentar, nesse contexto, as disposições legais sobre osRelatórios de Gestão tem o duplo objetivo de demonstrar a regulamentaçãojá existente e mostrar os mecanismos de sua eficácia, desfocando a falsaquestão que pretende que as inovações sanitárias substituam o controle bu-rocrático, sabidamente ineficaz, pela ausência de controle formal.

Relatórios de Gestão e controle das ações e serviços de saúde nalegislação nacional

No âmbito federal, a idéia de relatórios de gestão aparece pela primeiravez na Lei Federal nº 8.080/90 como proposta de instrumento de acompanha-mento da gestão financeira dos recursos da saúde de cada uma das esferas,particularmente aqueles repassados pelo Fundo Nacional de Saúde a esta-dos e municípios:

Art. 33 – Os recursos financeiros do Sistema Único de Saúde – SUSserão depositados em conta especial, em cada esfera de sua atuação, emovimentados sob a fiscalização dos respectivos conselhos de saúde.[...].§ 4º – O Ministério da Saúde acompanhará através de seu sistema deauditoria a conformidade à programação aprovada da aplicação dos re-cursos repassados a estados e municípios; constatada a malversação,desvio ou não aplicação dos recursos, caberá ao Ministério da Saúdeaplicar as medidas previstas em lei (Legislação..., 2000).

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Ainda no ano de 1990, a Lei Federal nº 8.142/90 designa por Relatóriode Gestão o instrumento que, entre os pré-requisitos para que estados e mu-nicípios recebam recursos financeiros da União para a saúde, permite o con-trole da execução dos recursos em conformidade à programação das ações,conforme o referido no § 4º da Lei Federal nº 8.080/90, citado acima.

Além da gestão financeira, outros conceitos citados na Lei Federal nº8.080/90 serão incorporados na descrição do Relatório de Gestão, na medidaem que esta lei condiciona as transferências financeiras e a alocação de re-cursos orçamentários para a saúde à existência de um Plano de Saúde emque estejam pactuadas atividades, programas e prioridades:

Art. 36 – O processo de planejamento e orçamento do Sistema Único deSaúde – SUS será ascendente, do nível local até o federal, ouvidos seusórgãos deliberativos, compatibilizando-se as necessidades da política desaúde com as disponibilidades de recursos em planos de saúde dos mu-nicípios, dos estados, do Distrito Federal e da União.§ 1º – Os planos de saúde serão a base das atividades e programaçõesde cada nível de direção do Sistema Único de Saúde – SUS e seu finan-ciamento será previsto na respectiva proposta orçamentária.§ 2º – É vedada a transferência de recursos financeiros para o financia-mento de ações não previstas nos planos de saúde, exceto em situaçõesemergenciais ou de calamidade pública, na área da saúde (Ibid., 2000,grifos do autor).

A Lei Federal nº 8.689/93, que dispõe sobre a extinção do Instituto Na-cional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps), avança um pou-co mais na definição legal do Relatório de Gestão. Essa Lei distribui as res-ponsabilidades assistenciais, o quadro de servidores, o orçamento e opatrimônio alocados na autarquia federal extinta, bem como define os meca-nismos de acompanhamento e controle de toda a infra-estrutura do Inamps,que é disponibilizada, de forma descentralizada, ao SUS. Dois artigos dessaLei são importantes para a discussão de Relatórios de Gestão, como se veráa seguir, por tratarem do Sistema Nacional de Auditoria e da apresentaçãodos relatórios de gestão:

Art. 6º – Fica instituído no âmbito do Ministério da Saúde, o Sistema Na-cional de Auditoria de que tratam o inciso XIX do art. 16 e o § 4º do art. 33da lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990.§ 1º – Ao Sistema Nacional de Auditoria compete a avaliação técnico-científica, contábil, financeira e patrimonial do Sistema Único de Saúde,que será realizada de forma descentralizada. [...].§ 4º – O Departamento de Controle, Avaliação e Auditoria será o órgãocentral do Sistema Nacional de Auditoria.Art. 12 – O gestor do Sistema Único de Saúde em cada esfera de governoapresentará, trimestralmente, ao conselho de saúde correspondente eem audiência pública nas câmaras de vereadores e nas assembléias

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legislativas respectivas, para análise e ampla divulgação, relatório deta-lhado contanto, dentre outros, dados sobre o montante e a fonte de recur-sos aplicados, as auditorias concluídas ou iniciadas no período, bemcomo sobre a oferta e produção de serviços na rede assistencial própria,contratada ou conveniada (Ibid., 2000, grifos do autor).

A relação íntima do relatório de gestão com o controle e a avaliação ficaestabelecida no parágrafo único do artigo 13 da mesma lei. Nesse artigo, quetrata da reestruturação global do Ministério da Saúde à qual o Executivo deve-ria proceder para adequá-lo ao que determina a Constituição Federal e àsLeis Orgânicas da Saúde, está disposto que:

Art. 13 – [...].Parágrafo Único – A reestruturação a que se refere este artigo contem-plará a estruturação do Sistema Nacional de Auditoria, ora instituído, as-sim como suas correspondentes projeções nas Unidades da Federação,que funcionará nos termos do inciso XIX do art. 16 e do § 4º do art. 33 daLei nº 8.080/90, de 19 de setembro de 1990, e do inciso IV do art. 4º daLei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990 (Ibid.).

O Decreto Federal nº 1.232, de 30 de agosto de 1994, que dispõe sobreas condições e a forma de repasse regular e automático de recursos do Fun-do Nacional de Saúde para os fundos de saúde estaduais, municipais e doDistrito Federal, regulamenta as condições de controle e acompanhamentoda gestão:

Art. 5º – O Ministério da Saúde, por intermédio dos órgãos do SistemaNacional de Auditoria e com base nos relatórios de gestão encaminha-dos pelos estados, Distrito Federal e municípios, acompanhará a confor-midade da aplicação dos recursos transferidos à programação dos servi-ços e ações constantes dos planos de saúde.Art. 9º – A União, por intermédio da direção nacional do SUS, sem prejuí-zo da atuação do Sistema de Controle Interno do Poder Executivo Fede-ral, exercerá o controle finalístico global do Sistema Único de Saúde, uti-lizando-se, nesse sentido, dos instrumentos de coordenação de ativida-des e de avaliação de resultados, em âmbito nacional, previstos na LeiOrgânica da Saúde e explicitados neste Decreto. (Ibid., grifos do autor)

O controle, a avaliação e a auditoria da gestão do SUS devem ser reali-zados pelas instâncias respectivas do Ministério da Saúde, como se podeconstatar, de forma descentralizada e também pelos estados e municípios,considerando as competências estabelecidas pela Lei Federal nº 8.080/90para essas esferas de gestão do SUS. Essa disposição foi explicitada pelaPortaria do Ministro da Saúde nº 1.286, de 26 de outubro de 1993, que regu-lamenta a contratação de serviços pelos estados, pelo Distrito Federal e pe-los municípios:

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Art. 2º – [...].Parágrafo Único – Na forma do disposto nos artigos 17, inciso XI, e 18,inciso X, da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, e nos artigos 6º, §2º, e 12, da Lei nº 8.689, de 27 de julho de 1993, o estado e o municípiomanterão procedimentos e órgãos incumbidos do controle e da avaliaçãodos serviços e ações de saúde na respectiva esfera de governo, dentroda regulamentação do Sistema Nacional de Auditoria (Ibid.).

Em complementação aos dispositivos já mencionados, o Decreto Fede-ral nº 1.651, de 28 de setembro de 1995, que regulamenta o Sistema Nacionalde Auditoria no SUS, descreve com mais detalhe o Relatório de Gestão, bemcomo os fluxos de acompanhamento e controle da gestão do SUS no país.Nesse Decreto fica explicitado o Relatório de Gestão e, em caso de convênio,acordo, ajuste ou outro instrumento congênere, a prestação de contas, comoinstrumento de excelência para a comprovação da aplicação de recursostransferidos no âmbito do SUS. Mais do que isso, considerando-se que tam-bém há a necessidade de descrição, na forma de prestação de contas, dautilização dos recursos próprios e do impacto das ações desenvolvidas, pode-se dizer que o relatório de gestão é o instrumento de acompanhamento finan-ceiro, do funcionamento dos serviços e da eficiência, eficácia e efetividadedas ações de saúde desenvolvidas no âmbito do SUS. Diz o referido Decretoacerca das informações que devem compor o Relatório de Gestão:

Art. 6º – [...].§ 3º – O relatório de gestão compõe-se dos seguintes elementos:I – programação e execução física e financeira do orçamento, de proje-tos, de planos e de atividades;II – comprovação dos resultados alcançados quanto à execução do planode saúde de que trata o inciso III do art. 4º da Lei nº 8142, de 1990;III – demonstração do quantitativo de recursos financeiros próprios apli-cados no setor saúde, bem como das transferências recebidas de outrasinstâncias do SUS;IV – documentos adicionais avaliados nos órgãos colegiados de delibe-ração própria do SUS (Ibid.).

Essa disposição é complementada no artigo 9º com uma formulaçãosimilar àquela contida no artigo 12 da Lei Federal nº 8.689/93, sobre o fluxodos relatórios de gestão e sua abrangência:

Art. 9º – A direção do SUS em cada nível de governo apresentará, trimes-tralmente, ao Conselho de Saúde correspondente e em audiência públi-ca, nas Câmaras de Vereadores e nas Assembléias Legislativas respec-tivas, para análise e ampla divulgação, relatório detalhado contendo, den-tre outros, dados sobre o montante e a fonte de recursos aplicados, asauditorias concluídas ou iniciadas no período, bem como sobre a oferta eprodução de serviços na rede assistencial própria, contratada ouconveniada (Ibid.).

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Duas outras definições do Decreto Federal nº 1.651/95 esclarecem aforma de utilização do Relatório de Gestão e o constituem em um efetivoinstrumento de controle da gestão no SUS, não apenas dos procedimentosadministrativos relativos à execução financeira, mas de todos os aspectosoperacionais, incluindo o impacto das ações de saúde. O artigo 3º desse De-creto estabelece que o Relatório de Gestão é um dos aspectos a serem ana-lisados pelo Sistema Nacional de Auditoria (SNA) que, como se sabe, desdo-bra-se em todas as esferas de gestão do SUS e tem como funções:

Art. 2º – O SNA exercerá sobre as ações e serviços desenvolvidos noâmbito do SUS as atividades de:I – Controle da execução, para verificar a sua conformidade com os pa-drões estabelecidos ou detectar situações que exijam maioraprofundamento;II – avaliação da estrutura, dos processos aplicados e dos resultadosalcançados, para aferir sua adequação aos critérios e parâmetros exigi-dos de eficiência, eficácia e efetividade;III – auditoria de regularidade dos procedimentos praticados por pessoasnaturais e jurídicas, mediante exame analítico e pericial (Ibid.).

O segundo aspecto destacado no referido Decreto e que dá ao Relatóriode Gestão a condição legal de instrumento de acompanhamento, de controlee de avaliação do SUS é a possibilidade de responsabilização dos gestorespor irregularidades encontradas no relatório, como se poderá verificar nascitações apresentadas a seguir.

Art. 3º – Para o cumprimento do disposto no artigo anterior, o SNA [Siste-ma Nacional de Auditoria], nos seus diferentes níveis de competência,procederá: [...].III – ao encaminhamento de relatórios específicos aos órgãos de controleinterno e externo, em caso de irregularidade sujeita a sua apreciação; aoMinistério Público, se verificada a prática de crime; e ao chefe do órgãoem que tiver ocorrido a infração disciplinar, praticada por servidor públi-co, que afete as ações e serviços de saúde.Art. 10 – Em caso de qualquer irregularidade, assegurado o direito dedefesa, o órgão competente do SNA encaminhará, segundo a forma detransferência do recurso prevista no art. 6º, relatório ao respectivo Con-selho de Saúde e ao DCAA [Departamento de Controle, Avaliação e Au-ditoria do Ministério da Saúde], sem prejuízo de outras providências pre-vistas nas normas do estado ou Município (Ibid.).

Como se vê, a legislação do SUS criou um conjunto de mecanismos deacompanhamento, controle e avaliação que são extremamente rigorosos e,principalmente, têm a avaliação concomitante de um conjunto de instânciasque permitem uma validação bastante mais eficiente do que os tradicionaismecanismos burocráticos de controles administrativos e centralizados. E o

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relatório de gestão é um dos principais mecanismos nesse sentido, uma vezque é avaliado pelas instâncias gerais de controle administrativo interno eexterno da administração pública, além do conjunto de instâncias de controlepróprios da área da saúde, que inicia na instância local, onde o serviço foiprestado. Como se viu no artigo 10 do Decreto Federal nº 1.651/95, o Conse-lho de Saúde é uma instância de análise não somente do relatório de gestão,mas também do relatório das irregularidades nele encontradas pela instânciado Sistema Nacional de Auditoria. Esse dispositivo foi colocado na legislaçãocomplementar em decorrência da diretriz constitucional da participação dapopulação no controle do SUS. Essa diretriz tem uma tradução mais especí-fica na Lei Federal nº 8.142/90:

Art. 1º – O Sistema Único de Saúde – SUS de que trata a Lei nº 8.080, de19 de setembro de 1990, contará, em cada esfera de governo, sem pre-juízo das funções do Poder Legislativo, com as seguintes instânciascolegiadas:I – a Conferência de Saúde eII – o Conselho de Saúde.§ 1º – A Conferência de Saúde reunir-se-á a cada 4 anos com a repre-sentação dos vários segmentos sociais, para avaliar a situação de saúdee propor as diretrizes para a formulação da política de saúde nos níveiscorrespondentes [...].§ 2º – O Conselho de Saúde, em caráter permanente e deliberativo, ór-gão colegiado composto por representantes do governo, prestadores desaúde, profissionais de saúde e usuários, atua na formulação de estraté-gias e no controle da execução da política de saúde na instância corres-pondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas deci-sões serão homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído emcada esfera de governo.[...].§ 4º – A representação dos usuários nos Conselhos de Saúde e Confe-rências será paritária em relação ao conjunto dos demais segmentos(Ibid.).

O princípio do controle da sociedade sobre o poder público, cuja legisla-ção foi conquistada principalmente pelos movimentos populares e sindicais,além de um importante segmento da academia e de trabalhadores em saúde,fundamenta-se na idéia de democratização e transparência na gestão públi-ca5. Esse princípio desdobra-se em um conjunto de instrumentos de controlecontinuado por parte das próprias instâncias e atores do SUS, que não anu-lam os mecanismos e instrumentos de controle administrativo e formal sobreo poder público, mas que lhe associam formas mais diretas e contínuas de

5 No caso do Estado do Rio Grande do Sul, a Constituição Estadual assevera, quanto ao SUS,que as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada,observada como a participação, com poder decisório, das entidades populares representativasde usuários e trabalhadores da saúde, na formulação, gestão, controle e fiscalização das po-líticas de saúde (Rio Grande do Sul, Art. 242, Inciso IV, 1989).

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avaliação e controle. Essas formas, que incluem indicadores concretos einstitucionalizados, característicos do acompanhamento de processosorganizacionais, e também fluidos e subjetivos, característicos dos fenôme-nos vividos pelos cidadãos, têm, justamente nessa abrangência, uma garan-tia de funcionamento diferenciado: é o usuário concreto, que recebe a açãoem saúde, a primeira instância de controle, inclusive, da eficácia dessa ação.É esse usuário, representado nos Conselhos de Saúde e nas audiências pú-blicas, que dá o primeiro nível de consistência e validação dos relatórios degestão do SUS. Equivocadamente, algumas estruturas burocráticas de con-trole interno e externo têm ignorado esse dinâmico mecanismo de controle doSUS em nome da suposta primazia dos mecanismos burocráticos decontrole.

Reconhecendo a prerrogativa legal dos Conselhos e Conferências deSaúde no acompanhamento e na deliberação sobre as questões referentesao SUS, é possível verificar mais algumas formulações sobre o tema de pres-tação de contas e relatórios de gestão, que reforçam o caráter institucionaldesse mecanismo na área da saúde. Tomando-se como exemplo o RelatórioFinal da 10ª Conferência Nacional de Saúde (10ª CNS), realizada em setem-bro de 1996, tem-se que a transparência na prestação de contas, com fortale-cimento das estratégias já formalizadas legalmente, é um pleito afirmado porreiteradas vezes, inclusive ampliado para outras áreas do Poder Público. Jáno primeiro capítulo do Relatório, onde estão as deliberações sobre asinterfaces da saúde, cidadania e políticas públicas, temos que os conselhei-ros decidiram:

4. Defender um Estado público e solidário, através de:4.1. transparência real e controle social em todas as instituições públicasfederais, estaduais e municipais, com prestação de contas realizada re-gularmente e com cumprimento das deliberações dos fóruns que têmparticipação da população (Conferência..., 1996).

Além de afirmar essa nova lógica de controle, o controle cidadão sobreos recursos públicos, as deliberações da 10ª CNS aprofundaram-se em ques-tões já indicadas legalmente. A responsabilização do Sistema Nacional deAuditoria, descentralizado e acompanhado dos respectivos Conselhos deSaúde, insere-se nesse contexto. Além disso, os participantes da 10ª CNSdetalharam um pouco mais o que estava definido legalmente até então emrelação aos relatórios de gestão. Veja-se o que está definido como atribui-ções dos gestores do SUS no segundo capítulo, referente à gestão e à suaorganização:

48. O Ministério da Saúde e as Secretarias Estaduais e Municipais deSaúde devem ter suas atribuições definidas de modo claro e objetivo,tendo como princípio o caráter público e democrático da gestão. Entreoutras atribuições, os gestores do SUS devem: [...].

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48.4. apresentar aos respectivos Conselhos de Saúde, trimestralmente,os Planos de Aplicação e Prestação de Contas dos Recursos da Saúde;e em audiência pública, no Poder Legislativo respectivo, cumprindo a LeiFederal nº 8.689/93. As audiências públicas devem ser antecedidas emquinze dias pelo envio de relatório padronizado contendo, entre outros:48.4.1. o montante e a origem de todas as fontes de recursos alocadosao SUS;48.4.2. o total e o detalhamento, com descrição qualitativa e quantitativa,das ações e metas na atenção à saúde no SUS;48.4.3 a oferta de ações e a produção nas unidades e serviços de saúdepróprios, conveniados e contratados;48.4.4. o detalhamento dos pagamentos efetuados sob as diversas rubri-cas aos serviços públicos, conveniados e contratados;48.4.5. as sindicâncias e auditorias iniciadas e concluídas no trimestre,assim como o encaminhamento dado às mesmas;48.4.6. a discriminação dos gastos com investimentos (Ibid.).

Diversas outras deliberações da 10ª CNS reforçam e fortalecem a idéiade mecanismos ágeis e continuados de acompanhamento, controle e avalia-ção das ações e serviços de saúde no SUS. O Relatório dessa Conferência,aliás, é de leitura obrigatória a todos aqueles que, imersos no ceticismo pelacapacidade da população em controlar diretamente a execução das ações dopoder público, ainda optem por defender os mecanismos burocráticos, autori-tários e centralizados para controlar os recursos públicos. Mais do que asrecentes e continuadas notícias da imprensa mostrando a facilidade na burladesses mecanismos burocráticos, o caráter afirmativo e propositivo das deli-berações emanadas dos próprios usuários (50% dos delegados da Conferên-cia representam usuários do SUS) demonstra a disposição e o conhecimentoque já existe por parte dos Conselhos de Saúde. Conhecimento que, certa-mente, pode ser aprofundado com o exercício cada vez mais amplo dessecontrole. Esse é o princípio que norteou a definição dos novos mecanismosinstitucionais de controle da ação descentralizada no SUS do RS, como severá.

Relatórios de Gestão e a legislação do SUS no Rio Grande do Sul

Partindo da história da construção do SUS no país e das possibilidadeslegais já constituídas nacionalmente, a gestão do SUS no Estado do RioGrande do Sul (SUS/RS), iniciada em 1999, optou por fortalecer essas possi-bilidades e facilitar a relação com os gestores municipais. Passou-se a reco-nhecer que a relação com os gestores municipais é uma relação horizontal degestores públicos, que embora pertençam a esferas de governo diferentes,compartilham a gestão do mesmo sistema de saúde: o Sistema Único deSaúde. Compartilhar responsabilidades para o desempenho da obrigaçãoconstitucional de ofertar as ações e serviços de saúde necessários a cada

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cidadão, conforme direito assegurado, significa que o Estado deve estabele-cer outra forma de relação com o gestor municipal. Uma relação em que aimpossibilidade eventual de cumprir requisitos burocráticos (comprovação deadimplência, regularidade fiscal etc.) é secundarizada pela necessidade dedesenvolver, com cooperação técnica, financeira e operacional, ações desaúde com qualidade. Deve-se observar que isso não significa desconhecera lei, muito ao contrário, significa observá-la, uma vez que o reconhecimentoàs particularidades da saúde levou os constituintes a incluir, já na constituiçãode 1988, a observação de que, por se tratar de questão de relevância pública,a avaliação, a regulamentação e o controle das ações e serviços de saúdedeveriam ser dispostos pelo Poder Público nesses termos (Constituição Bra-sileira, Artigo 197), o que já foi feito reiteradamente com instrumentos e fluxospróprios, como se viu no decorrer deste texto.

Por isso, na criação da Municipalização Solidária da Saúde6, a definiçãoda transferência regular e automática aos Fundos Municipais de Saúde utili-za-se dos mecanismos já disponíveis neste âmbito: Plano de Saúde, Relató-rio de Gestão e o Plano de Aplicação com o compromisso do gestor municipalem operacionalizar, com as regras do SUS, as ações e serviços de saúde.Como o cuidado em saúde é continuado (nem a promoção à saúde e nem otratamento das doenças é agendável para o tempo em que o cumprimentodos requisitos burocráticos for concluído) e implica em gasto constante (ma-nutenção, qualificação, aquisição de insumos etc.) não é possível postergarrepasse de recursos financeiros por decorrência do nível de controle previstopela tradição burocrática. A legislação do SUS, por isso, criou os novos me-canismos, baseados no acompanhamento constante por parte do ControleSocial. É preciso relembrar que essa particularidade para a área da saúde foiestabelecida pela própria Constituição Federal.

No Estado do Rio Grande do Sul, a Constituição Estadual, no artigo 245,prevê que o Poder Público repasse recursos financeiros aos municípios paracusteio e investimento na saúde. O Decreto Estadual nº 38.546, de 05 dejunho de 1998, que dispõe sobre o Sistema Estadual de Auditoria no SUS,regulamenta para o SUS/RS as definições contidas na legislação federal, in-cluindo os instrumentos de controle, no caso, do Relatório de Gestão, comose poderá verificar a seguir.

Art. 3º – As atividades de auditoria contábil, financeira e patrimonial e deavaliação de desempenho, qualidade e resolutividade das entidades pú-blicas e privadas que integram o Sistema Único de Saúde do Estado seestenderão:

6 A Municipalização Solidária da Saúde caracteriza a participação da SES/RS, enquanto órgãogestor do SUS/RS, no financiamento das ações e serviços públicos de saúde e na cooperaçãotécnica e operacional aos municípios, bem como expressa o compromisso destes com aestruturação dos sistemas locais de saúde (Decreto Estadual nº 39.582/1999, de 10 de junhode 1999).

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I – à aplicação dos recursos estaduais repassados aos municípios, deconformidade com a legislação estadual; [...]V – às ações, métodos e instrumentos implementados pelos órgãos mu-nicipais de controle, avaliação e auditoria, atuando diretamente ou emcooperação técnica, quando configuradas situações de inexistência, in-suficiência ou omissão do Sistema Municipal do SNA;VI – às prestações de contas com verificação in loco, quando configura-das situações de inexistência, insuficiência ou omissão do Sistema Muni-cipal do SNA.§ 1º – A verificação da aplicação dos recursos repassados pelo estadoaos municípios, na conformidade com a programação aprovada, será fei-ta mediante análise dos relatórios de gestão (Rio Grande do Sul, 1998,grifos do autor).

Esse mesmo Decreto, contrariando legislação federal, estabelece perio-dicidade para os Relatórios de Gestão diversa daquela preconizada nos ins-trumentos legais já citados:

Art. 3º – [...].§ 3º – Os municípios encaminharão, anualmente, à Secretaria Estadualda Saúde e do Meio Ambiente, o relatório de gestão aprovado pelo Con-selho Municipal de Saúde, acompanhado de cópia do relatório de gestãoencaminhado ao Ministério da Saúde (Ibid., grifos do autor).

Percebe-se a ineficácia dessa disposição, haja vista as disposições detrimestralidade reiteradas pela legislação federal, em particular da Lei Federalnº 8.689/93 e do Decreto Federal nº 1.651/95. Outra curiosidade desse De-creto Estadual é que define a periodicidade trimestral para a apresentaçãodos Relatórios de Gestão da Secretaria da Saúde do Estado, em disposiçãodiferenciada ao que preconiza para os municípios. Ressalte-se que essa dis-posição não foi cumprida na gestão de governo que a propôs. O artigo 11 doDecreto Estadual nº 38.546/98, como se pode ver a seguir, repete o dispostono artigo 12 da Lei Federal n° 8.689/93:

Art. 11 – O Secretário da Saúde e do Meio Ambiente apresentará, trimes-tralmente, ao Conselho Estadual de Saúde e em audiência pública naAssembléia Legislativa, para análise e ampla divulgação, relatórios deta-lhados contendo, dentre outros, os dados sobre o montante e a fonte derecursos aplicados, as auditorias concluídas ou iniciadas no período, bemcomo sobre a oferta e produção de serviços na rede assistencial própria,contratada ou conveniada (Legislação..., 2000).

Com amparo na farta legislação existente sobre Relatórios de Gestãocomo instrumentos de controle financeiro e operacional e de avaliação doSUS, o Decreto Estadual nº 39.582, de 10 de junho de 1999, que criou aMunicipalização Solidária da Saúde, estabelece esse como o mecanismo de

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acompanhamento das transferências do Fundo Estadual de Saúde para osFundos Municipais de Saúde.

Art. 4º – A transferência de que trata o artigo 1º fica condicionada à: [...]IV – apresentação trimestral de Plano de Aplicação e de Relatório deGestão na Câmara Municipal, precedidos de aprovação pelo respectivoConselho de Saúde, no qual conste a prestação de contas dos recursosfinanceiros utilizados e a contrapartida de recursos do Orçamento doMunicípio [...].Art. 8º – A Secretaria da Saúde e do Meio Ambiente, com base nos Rela-tórios de Gestão encaminhados pelos municípios, acompanhará a ade-quação dos recursos transferidos à programação dos serviços e açõesconstantes dos Planos de Saúde (Ibid., grifos do autor).

Veja-se que está previsto o acompanhamento, por meio dos Relatóriosde Gestão, inclusive dos recursos da contrapartida municipal. Deve ser res-saltado que os Planos Municipais de Saúde, que servem de parâmetro à ava-liação dos Relatórios de Gestão e Planos de Aplicação dos recursos, devemestar disponíveis, junto à SES/RS, desde a adesão dos municípios a uma dasformas de gestão previstas legalmente. A SES/RS solicita a atualização des-ses Planos sempre que a vigência prevista está ultrapassada e os municípiosdevem atualizar a versão disponível na SES/RS sempre que os mesmos tive-rem qualquer modificação. De todo modo, todas as alterações nas políticas,projetos ou prioridades constantes no Plano de Saúde que, aprovadas pelosConselhos Municipais de Saúde, adquirem status de atualizações ao PlanoMunicipal de Saúde, tornando esse fórum, portanto, a instância adequada deavaliação dos próprios Planos, como por exemplo, o Plano de Aplicação dosRecursos transferidos de outras esferas de governo.

Tomando como base essa ampla legislação existente sobre Relatóriosde Gestão e o Decreto Estadual que instituiu a Municipalização Solidária daSaúde por meio de repasses Fundo a Fundo, a Portaria da Secretária Estadu-al de Saúde nº 09/99, de 21 de junho de 1999, regulamenta a utilização dosmesmos instrumentos e fluxos já estabelecidos legalmente, inclusive o Rela-tório de Gestão Municipal como o instrumento de acompanhamento, controlee avaliação da utilização dos recursos repassados, ratificando que tambémos repasses estaduais são objeto de análise do Sistema Estadual de Acom-panhamento, Controle, Avaliação e Auditoria. Isso significa que a regularida-de da utilização dos recursos do Estado do Rio Grande do Sul, repassadosaos municípios gaúchos, além das instâncias de controle horizontal já exis-tentes (controle interno nos municípios e estados, Tribunal de Contas do Es-tado e Ministério Público), também serão acompanhados pelos componentesmunicipal, estadual e federal do Sistema Nacional de Auditoria e pelos Con-selhos Municipais de Saúde e Câmaras Municipais. Diferentemente dos pri-meiros, onde há análises anuais, nos fluxos próprios da saúde essa análisefeita pelas instâncias próprias é trimestral. Também diferenciadamente dos

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O Relatório de Gestão como instrumento de controle social no SUS, o caso do Rio Grande ...

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primeiros, e sem excluir a análise in loco por suspeita de irregularidades, nofluxo próprio da saúde não é uma amostra dos procedimentos que sofre aná-lise, mas 100% das atividades são inspecionadas trimestralmente. Vê-se,dessa forma, que há muito mais rigor no fluxo de acompanhamento e controlenos fluxos da área da saúde, e não menos regularidade legal do que naquelesdas demais áreas das políticas públicas.

Também como demonstração do rigor a que são submetidos os fluxosda Municipalização Solidária da Saúde e dos demais repasses financeiros daSES/RS para os Fundos Municipais de Saúde, por meio da Resolução daComissão Intergestores Bipartite (CIB/RS) nº 80/99, de 07 de outubro de1999, estabeleceu-se que os municípios devem preencher adequadamente oSistema de Informações em Orçamentos Públicos de Saúde (Siops), criadopelo Ministério da Saúde por demanda do Conselho Nacional de Saúde e doMinistério Público Federal. As informações disponibilizadas nesse Sistemasão acompanhadas nacionalmente pelo Ministério da Saúde e pelo MinistérioPúblico Federal, que é o órgão que pune os responsáveis pelas informaçõesprestadas. No Rio Grande do Sul, em decorrência dessa decisão dosgestores do SUS, estão sendo estabelecidos mecanismos ágeis de participa-ção da SES/RS nesse fluxo, garantindo assim maior consistência aos Relató-rios de Gestão Municipal, que incorporaram esse sistema na formatação dosdados de execução financeira.

Para padronizar as informações prestadas pelo conjunto dos municí-pios, a Portaria da Secretária Estadual de Saúde nº 19/99, de 10 de novembrode 1999, define a forma de apresentação do Relatório de Gestão Municipal,após ampla discussão com os próprios municípios, através de sua represen-tação junto à CIB/RS e ao Conselho Estadual de Saúde (CES/RS).

Com o mesmo respaldo legal já apresentado, mais duas outras iniciati-vas do Governo do Estado do Rio Grande do Sul utilizaram-se da prerrogativado repasse Fundo a Fundo e dos mecanismos de acompanhamento e contro-le já estabelecidos pelo SUS, como se viu até aqui. O Decreto do SenhorGovernador do Estado nº 39.870, de 14 de dezembro de 1999, estabeleceque serão transferidos do Fundo Estadual de Saúde aos Fundos Municipaisde Saúde, com os mecanismos próprios para esse fim, os recursos financei-ros para a Política de Saúde e Saneamento Básico (Prosan). Esse Decreto foiregulamentado pela Portaria nº 26/99, de 29 de dezembro de 1999, da Se-nhora Secretária de Estado da Saúde. Da mesma forma, os recursos finan-ceiros alocados no orçamento da SES/RS para projetos da Consulta Popularde 1998 foram definidos como de transferência do Fundo Estadual para osFundos Municipais, por meio do Decreto Estadual nº 39.871, de 14 de dezem-bro de 1999. A regulamentação desse Decreto deu-se pela Portaria SES/RSnº 25/99, de 30 de dezembro de 1999.

Como se viu, é inquestionável a regularidade legal dos instrumentos pro-postos para o funcionamento, para o acompanhamento, para a avaliação epara o controle do Sistema Único de Saúde. Esses mecanismos, produzidos

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pelo movimento de reordenação do sistema público de saúde, principalmentea partir da década de 70, têm origem no movimento mais amplo de democra-tizar o Estado, não somente nos efeitos da política pública – no caso ampliaro acesso a ações e serviços de saúde – como também de democratizar opróprio funcionamento do Estado.

Embora ainda sejam, na prática, em grande medida estratégias inéditasno país, as iniciativas de implementação efetiva do SUS, desencadeadas noano de 1999 pela Secretaria da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul, têmmecanismos de controle e avaliação amplamente definidos legalmente, tantono âmbito federal quanto estadual.

As questões que ainda precisam ser resolvidas passam, assim, a serquestões do âmbito das resistências tecnoburocráticas, como bem descreve-ram vários estudos já desenvolvidos. Para resolvê-las, entretanto, é precisoconsiderar que a história de construção dos mecanismos de controle socialsobre o Estado vem, há quase trinta anos, lapidando seus objetivos. Não épossível, sequer legítimo, subordinar o interesse público, assim manifesto, aoargumento da tradição administrativa dos controles e à impessoalidade daresponsabilidade do poder público. Mais do que nunca é imperativo que sedesenvolvam ações de qualificação dos profissionais envolvidos com essasresistências, como as demais, como uma estratégia de qualificação do pró-prio aparelho do Estado.

A insuficiência de efetividade (inefetividade) dos mecanismos burocráti-cos no controle administrativo do governo nos mostra que transparência econtrole social sobre o poder público são os mecanismos que podem qualifi-car a gestão pública e que os mecanismos burocráticos já alcançaram o tetode sua eficácia.

El informe de gestión como instrumento de control social en el SUS, elcaso del Rio Grande do Sul

Resumen: Informes de gestión y control de las acciones y servicios de saluden la legislación nacional aparecen por primera vez en la Ley Federal nº 8.080/90como propuesta de instrumento de supervisión de la gestión financiera de los recur-sos de la salud de cada una de las esferas, particularmente aquellos repasados porel Fondo Nacional de Salud a estados y municipios. La gestión del SUS en el Estadodel Rio Grande do Sul, en 1999, ha optado por fortalecer esas posibilidades y facili-tar las relaciones con los gestores municipales. Tomando como bases la legislaciónexistente sobre Informes de Gestión y el Decreto Estadual que instituyó laMunicipalización Solidaria de la Salud, se reglamenta la utilización de los propiosinstrumentos y flujos ya establecidos legalmente, incluso el Informe de Gestión Mu-nicipal, ratificándose que los repasos estaduales también son objeto de análisis delSistema Estadual de Supervisión, Control, Evaluación y Auditoría. Eso ha significa-do que la regularidad de la utilización de los recursos del Estado del Rio Grande doSul, repasados a los municipios, además de las instancias de control horizontal yaexistentes, también será supervisionada por los componentes municipal, estadual y

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O Relatório de Gestão como instrumento de controle social no SUS, o caso do Rio Grande ...

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federal del Sistema Nacional de Auditoría y por los consejos municipales de salud ycámaras municipales. Los informes de gestión abiertos a la transparencia y al controlsocial sobre el poder público son mecanismos que califican la gestión de la salud enel estado.

Palabras Clave: Gestión en salud; Sistema Único de Saúde; Rio Grande doSul; Control social; Financiamiento de la salud; Legislación sanitaria; Control yevaluación en salud .

The report of administration as instrument of social control in SUS, thecase of Rio Grande do Sul

Abstract: Reports of management and control of health actions and servicesin the national law appear for the first time in the Federal Law no. 8.08/90 as aproposal of tool for guidance of the financial management of health resources ofeach of the fields, particularly those sent by the National Health Fund to the Statesand Towns. The management of SUS in the state of Rio Grande do Sul, in 1999,chose to empower those possibilities and facilitate the relationships with townmanagers. Having as basis the current law about Reports of Management and theState Decree that institutionalized the Local Sharing Health, it is regulated the use ofthose same tools and fluxes already established by law, including the Report of TownManagement, confirming that also the state transferences of credit are object toanalysis of the State System of Guidance, Control, Evaluation and Audition. Thismeant that the regularity of use of the resources of the state of Rio Grande do Sul,transferred to towns, besides the instances of horizontal control already existing, arealso guided by the town, state and federal components of the National System ofAudition and by the Town Health Councils and the Town Chambers. Managementreports open to transparency and social control about the public power aremechanisms that qualificate the health management in the state.

Key-words: Health management; Sistema Único de Saude; Rio Grande doSul; Social control; Health financing; Sanitary law.

Referências

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Alcindo Antônio Ferla

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Campanha de testagem anônima no Dia Mundial da Luta Contra a AIDS

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 59

Campanha de testagem anônima no DiaMundial da Luta Contra a AIDS

Carmem Viegas1

Juliana Dors Tigre da Silva1

Lúcia Escobar2

Ana Lúcia Baggio2

Katia Baialardi2

Vilma Paese2

Regina Loureiro3

Resumo: O Ambulatório de Dermatologia Sanitária da Secretaria da Saúde doRio Grande do Sul tem aproveitado o dia 1º de dezembro – Dia Mundial da LutaContra a AIDS – para intensificar o atendimento de seu Centro de Testagem eAconselhamento. Para verificar o perfil da população atendida neste dia, avaliamos,além da prevalência de infecção por HIV e Sífilis, algumas variáveis demográficas ede exposição (risco). Quatro pessoas entre as 89 testadas tiveram o resultado doteste HIV positivo e quatro tiveram o teste para sífilis reagente. A análise das outrasvariáveis estudadas mostrou que esta Campanha anual parece atingir seus objeti-vos: testar uma população que não viria fazer o teste sem este motivo – pessoasjovens que, na sua maioria, consideravam-se em muito baixo risco. Apesar da baixaprevalência encontrada de infecção por HIV e Sífilis, esta Campanha é importante,pois abre a possibilidade de descobrir estas infecções precocemente e abre a opor-tunidade de contato com as informações e o aconselhamento relativos às DoençasSexualmente Transmissíveis e à Síndrome da Imunodeficiência Adquirida.

Palavras-Chave: HIV; Testagem; Avaliação; Campanha de prevenção.

Introdução

O dia 1º de dezembro – Dia Mundial da Luta Contra a AIDS – tem-secaracterizado não só como um dia de protestos e reivindicações, mas tam-bém, como um dia privilegiado para fazer trabalhos de prevenção – uma vezque as pessoas estão mais permeáveis à causa. O Ambulatório de

1 Residente em Dermatologia Sanitária da Residência Integrada em Saúde (RIS) – Secretariada Saúde do Rio Grande do Sul (SES/RS) – Ambulatório de Dermatologia Sanitária (ADS) /Escola de Saúde Pública (ESP), e-mail: [email protected] Técnica responsável pelo atendimento do Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA –ADS – SS/RS), e-mail: [email protected] Epidemiologista do ADS – SES/RS; preceptora da RIS – SES/RS, e-mail: [email protected]

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Carmem Viegas et al.

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Dermatologia Sanitária (ADS-SES/RS) tem aproveitado, nos últimos anos,este dia para intensificar o atendimento de seu Centro de Testagem eAconselhamento (CTA), oferecendo palestras de aconselhamento sobre DSTe AIDS em horários ampliados, de forma a atender até 100 pessoas em ape-nas um dia. Com a possibilidade atual de, ao diagnosticar precocemente ainfecção por HIV, monitorar e tratar com presteza o indivíduo infectado – deforma a manter o equilíbrio imunológico e prevenir com eficiência as infec-ções oportunistas – vem-se incentivando o teste para quem “está na dúvida”.

O CTA do ADS-SES/RS é o Centro de Testagem mais antigo do Brasil,criado em 1989, e tem uma longa experiência em aconselhamento e diagnós-tico de Doenças Sexualmente Transmissíveis e Síndrome daImunodeficiência Adquirida (DST/AIDS). A rotina de funcionamento é diária eatende a uma demanda em torno de 30 indivíduos para testar ou receber osresultados dos testes. No ano de 2000 (até julho), foram realizados 1252 tes-tes anti-HIV no CTA do ADS, com uma prevalência de infecção de 13,9% (174testes positivos). Entretanto, somente 95 indivíduos (54,6% dos que tiveramteste positivo) vieram receber o resultado do teste. Dos 1078 indivíduos quetiveram teste negativo, 754 (69,9%) voltaram ao ADS. Das 95 pessoas quetiveram o teste positivo e vieram saber o resultado, sessenta e nove (72,6%)eram do sexo masculino – a maioria deles tinha entre 30 e 49 anos de idade(33 – 47,8%) e 21 (30,4%) tinham menos de 29 anos. As mulheres com diag-nóstico de soropositividade que retornaram para receber o resultado do testeforam 26 (27,4%) e a maioria delas – 18 (69,2%) – tinham menos de 29 anosde idade. A forma de transmissão mais freqüente para os homens foi a rela-ção sexual heterossexual (26 indivíduos – 37,7%), seguida da relação sexualhomossexual (20 – 29,9%) e de 11 indivíduos (16,0%) que eram usuários dedrogas injetáveis (UDI) . Entre as mulheres, quase todas relataram terem-secontaminado por relação sexual heterossexual – sendo que a maioria (24 –92,3%) tinha parceiro fixo e apenas uma relatou ser UDI (Rio Grande do Sul,[2001?]).

No Brasil, em 1984, 71% dos casos notificados eram referentes a ho-mens de orientação homo/bissexual. Progressivamente, observou-se a redu-ção da participação dessa subcategoria de prevalência, que em 1999/2000 éde 16%. Essa tendência pode ser observada em todas as regiões do Brasil. Oaumento de casos por via heterossexual fez-se acompanhar de uma expres-siva participação das mulheres no perfil epidemiológico da doença, constata-da na progressiva redução da razão de sexo (homens/mulheres) entre todasas categorias de exposição – de 24:1 (1985) para 2:1 (1999/2000). Desde oinício da epidemia, o grupo etário mais atingido, em ambos os sexos, tem sidode 20 a 39 anos, perfazendo 70% do total de casos de AIDS notificados até03/06/2000. A transmissão sangüínea do HIV em hemofílicos e em indivíduosque receberam transfusão de sangue, segmento populacional intensamenteatingido no início da epidemia, vem apresentando um importante declínio aolongo da última década e meia. Essas subcategorias representavam 62,5%

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Campanha de testagem anônima no Dia Mundial da Luta Contra a AIDS

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 61

da categoria de exposição sangüínea, em 1984, e 0,9% em 1999/2000. Em1984, 37% dos casos de AIDS por transmissão sangüínea eram atribuídos aocompartilhamento de agulhas e seringas no uso de drogas injetáveis. Essasubcategoria, em 1999/2000, já representava 99% das ocorrências por trans-missão sangüínea (Boletim Epidemiológico AIDS, 2001).

A população que freqüenta o CTA rotineiramente já foi estudada emmais de uma ocasião, entretanto, a clientela específica do dia 1° de dezembroainda não tinha o perfil conhecido. Da mesma forma, não tínhamos muitanoção da efetividade dos meios de divulgação deste trabalho.

Metodologia

Com o objetivo de verificar o perfil da população atendida no CTA no DiaMundial da Luta Contra a AIDS, avaliamos algumas variáveis que considera-mos importantes. Além das variáveis demográficas e das prevalências deinfecção por HIV e Sífilis, medimos: a freqüência de testes anteriores, o tipode exposição (risco), o porquê da escolha deste dia para fazer o teste e comosoube das atividades da Campanha no CTA do ADS. Perguntamos também arespeito do uso da camisinha, que todos sabem ser uma barreira bastanteeficaz da transmissão de DST e AIDS. Entretanto, o fato destas pessoas te-rem vindo testar-se demonstra que provavelmente o preservativo não foi usa-do sistematicamente. Por isso também observamos as justificativas feitaspara o uso ou não do preservativo – já que todos os indivíduos consideravamter-se exposto a algum risco.

Todas as 89 pessoas que participaram das atividades do “Dia” foramconvidadas a participar da pesquisa. O consentimento foi verbal e todos dis-puseram-se a responder às perguntas. Um pequeno questionário foi aplicadoindividualmente e com a privacidade mantida durante a coleta de sangue.Nenhum indivíduo foi identificado pelo nome – como é a rotina do CTA – todosreceberam apenas uma senha.

Resultados

Quatro (04) pessoas, entre as 89 testadas, tiveram resultado positivo aoteste de HIV e quatro (04) pessoas tiveram resultado reagente ao teste deVDRL – nenhuma delas teve os dois testes com resultado positivo simulta-neamente (Quadro 1).

A distribuição das variáveis demográficas mostrou um perfil mais oumenos esperado. A distribuição por sexo ficou perfeitamente equilibrada, amaioria da população era jovem – com uma concentração maior na faixa-etária de 20 – 39 anos de idade e, em termos de escolaridade, a distribuiçãofoi razoavelmente equilibrada (Quadro 2).

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Carmem Viegas et al.

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Quadro 1 – Resultados dos testes para infecção por HIV e sífilis

VARIÁVEL (n=89) FREQÜÊNCIA PROPORÇÃORESULTADO DO TESTE ANTI-HIVPositivo 4 4,5%Negativo 85 95,5%RESULTADO DO TESTE VDRLPositivo 4 4,5%Negativo 85 95,5%

Quadro 2 – Distribuição das variáveis demográficas na população estudada

VARIÁVEL (n=89) FREQÜÊNCIA PROPORÇÃOSEXOMasculino 44 49,4%Feminino 45 50,6%FAIXA ETÁRIAMenos de 20 anos 12 13,5%20 – 29 anos 33 37,1%30 – 39 anos 22 24,7%40 – 49 anos 13 14,6%50 anos ou mais 9 10,1%ESCOLARIDADEAté a 4ª Série 20 22,5%Até a 8ª Série 17 19,1%Ensino Médio incompleto 12 13,5%Ensino Médio completo 22 24,7%Superior incompleto 12 13,5%Superior completo 6 6,7%

A maioria das pessoas estava fazendo o teste pela primeira vez, entre-tanto, 27% já tinham feito o teste antes. A grande maioria (89%) dos indiví-duos testados considerou que a exposição ao vírus HIV havia sido sexual equatro pessoas resolveram testar-se apesar de considerar que não haviamtido exposição nenhuma. A maioria também respondeu que escolheu o dia 1°de dezembro para fazer o teste porque “criou coragem por causa da campa-nha” ou “pela facilidade dos horários”. Dentre as pessoas que participaram dacampanha, 53% souberam das atividades programadas para o dia no próprioADS – “informados pessoalmente durante a semana anterior (29%); “porquevi os cartazes espalhados pelo ADS”; “porque havia visto a faixa colocada nafrente do ADS” foram as justificativas apresentadas. Tanto a faixa quanto os

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Campanha de testagem anônima no Dia Mundial da Luta Contra a AIDS

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 63

cartazes haviam sido confeccionados por alguns dos funcionários do ADSque participaram da campanha.

Quadro 3 – Distribuição das variáveis de exposição e motivações para fazero teste na população estudada

VARIÁVEL (n=89) FREQÜÊNCIA PROPORÇÃOTIPO DE EXPOSIÇÃOSexual 79 89,0Uso de drogas 2 2,2Transfusão zero –Acidental 2 2,2Nenhuma 4 4,4Outra 2 2,2JÁ FEZ O TESTE ANTESSim 24 27,0%Não 65 73,0%QUANTAS VEZESNenhuma 65 73,0%Uma vez 18 20,2%Mais de uma vez 6 6,7%

HÁ QUANTO TEMPO (ultima vez)Menos de 1 ano 9 10,0%Dois anos 7 7,9%Três anos 3 3,4%Quatro anos 2 2,2%Cinco anos 3 3,4%Não se aplica 65 73,0%

PORQUE VEIO FAZER O TESTE HOJECriou coragem com a campanha 25 28,1%Pela facilidade dos horários 27 30,3%Veio acompanhar alguém 9 10,1%Exposição recente 11 12,4%Por casualidade 14 15,7%Outro motivo 3 3,3%

COMO SOUBE DA CAMPANHAPor outra pessoa (amigo, familiar etc.) 8 9,0%Propaganda na Imprensa 26 29,2%Faixa e cartazes no ADS 7 7,9%Informado pessoalmente no ADS 26 29,2%Veio consultar por outro motivo 8 9,0%Já havia participado em outros anos 1 1,1%Não sabia – viria mesmo fazer o teste 13 14,6%

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Carmem Viegas et al.

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Quanto ao uso de camisinha verificamos, mais uma vez, que a maioriadas pessoas “não usa” (26%) ou usa “às vezes” (48%). As justificativas parafazer o teste de quem usa sempre ou de quem não usa nunca encontram-seno quadro abaixo:

Quadro 4 – Justificativas apresentadas por alguns participantes do estudo àrespeito do uso ou não da camisinha

VARIÁVEL FREQÜÊNCIA PROPORÇÃOQUEM USA SEMPRE ... (n = 23)Camisinha arrebentou 7 30,4%Só não usou uma vez 4 17,4%Passou a usar depois de um “susto” 1 4,3%Ex-marido não era confiável 1 4,3%Marido era UDI – morreu assassinado 1 4,3%Não confiança no último exame 1 4,3%Tem um irmão com AIDS 1 4,3%Desde que sabe-se infectado por HIV 1 4,3%Como método anticoncepcional 1 4,3%Veio fazer o teste para “liberar” o uso 1 4,3%com o parceiro fixo

Não fez comentários 1 4,3%

QUEM NÃO USA NUNCA ... (n = 23)É viúva 1 4,3%Marido morreu recentemente de AIDS 1 4,3%Veio fazer o teste por solicitação da 1 4,3%clínica para usuários de drogas

Teve relação com alguém que morreu 1 4,3%de AIDS

Parceira é infectada 1 4,3%Não fez comentários 18 78,3%

Como foram poucos os indivíduos com teste positivo para HIV e Sífilis,não foi possível realizar análises estatísticas para avaliação de fatores derisco. Isto aconteceu porque a amostragem foi insuficiente para testes deassociação e efeito e por uma questão ética – entre tão poucos indivíduos,ficaria fácil identificar características individuais se estratificássemos a amos-tra. Entretanto, é possível descrever a distribuição da amostra segundo algu-mas características e o resultado do teste anti-HIV:

1. Dos quatro indivíduos que tiveram o teste positivo, dois eram do sexofeminino e dois do masculino.

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Campanha de testagem anônima no Dia Mundial da Luta Contra a AIDS

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2. Dois indivíduos já tinham feito o teste antes e dois ainda não tinhamfeito.

3. Todos os indivíduos com teste positivo relataram exposição sexual aovírus.

4. Três dos quatro indivíduos vieram fazer o teste no dia da campanhaporque “criaram coragem por causa da campanha”.

5. Dois dos quatro indivíduos responderam que usavam camisinha sem-pre (um deles já conhecia sua sorologia positiva) e dois responderam que nãousavam nunca.

Discussão e conclusões

A campanha do Dia Mundial no ADS parece ter atingido uma populaçãoque não viria fazer o teste não fosse este motivo – pessoas jovens, muitosuniversitários e alguns que consideravam-se de muito baixo risco. Entretanto,os resultados confirmaram o esperado – os indivíduos que tiveram resultadopositivo para anti-HIV tinham exposições reconhecidas.

Ainda chama a atenção a grande proporção de pessoas que fazem oteste mais de uma vez – que ao nosso ver significa ter experimentado a pos-sibilidade de “nova exposição” – algumas pessoas até muitas vezes. Seráque as pessoas pensam no teste como medida de prevenção da doença apóscontaminação? Apesar de saberem-se em risco, as pessoas continuam seexpondo?

Outra situação que chama a atenção – mas não surpreende – é a gran-de proporção de pessoas que usam camisinha “às vezes” (48%) e as justifi-cativas ou as situações em que usa continuam as mesmas. Nos parece que o“parceiro fixo” continua dando “segurança” às pessoas, além de alguns rela-tos de uso do preservativo “até estabelecer uma relação estável” ou “quandodesconfia do parceiro”.

Apesar da baixa prevalência de infecção por HIV e Sífilis encontradaentre as muitas pessoas testadas no dia da campanha, se comparada com aprevalência média na rotina do CTA, consideramos que o trabalho foi válido.Além de conhecer a situação sorológica, todas estas pessoas receberamaconselhamento. Foram feitos dois diagnósticos de infecção por HIV em pes-soas que nunca tinham sido testadas antes.

Consideramos que pelo menos duas afirmações feitas pela maioria daspessoas participantes da campanha justificam a manutenção desta prática –1) “criar coragem de vir fazer o teste por causa da campanha” e 2) “aproveitara facilidade dos horários e facilidade dos acessos para conseguir testar-se”.Pode-se concluir, por conveniência, que duas condições ampliariam/facilitari-am a busca pela testagem e aconselhamento em HIV/AIDS: quebrar as bar-reiras de vergonha/temor em fazer o teste e melhorar a acessibilidade emhorários de disponibilização do teste.

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Carmem Viegas et al.

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Campaña de test anónimo en el Día Mundial de la Lucha Contra el SIDA

Resumen: El Ambulatório de Dermatologia Sanitária de la Secretaria da Saú-de del Rio Grande do Sul ha aprovechado el día 1º de diciembre – Día Mundial de laLucha Contra el SIDA – para intensificar la atención en su Centro de Test yAconsejamiento. Para verificar el perfil de la población atendida en ese día,evaluamos, además de la prevalencia de infección por VIH y sífilis, algunas variablesdemográficas y de exposición (riesgo). Cuatro personas entre las 89 testadastuvieron el resultado del test VIH positivo y cuatro tuvieron el test para sífilis reagente.El análisis de otras variables estudiadas mostró que esa Campaña anual parecealcanzar sus objetivos: testar una población que no haría la prueba sin ese motivo –personas jóvenes que, en su mayoría, se consideraban de muy bajo riesgo. A pesarde la baja prevalencia encontrada de infección por VIH y sífilis, esa Campaña esimportante, pues abre la posibilidad de descubrir esas infecciones precozmente, asícomo la oportunidad de contacto con las informaciones y el aconsejamiento relativosa las Enfermedades Sexualmente Transmisibles y a la Síndrome de laInmunodeficiencia Adquirida.

Palabras Clave: VIH; Test; Evaluación; Campaña de prevención.

Campaign of anonymous testing in the world day of fight against aids

Abstract: The Ambulatório de Dermatologia Sanitária (ADS) has been takingadvantage of the first day of December – World Day of Fight Against AIDS – tointensify the service of the Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA). To verifythe profile of the population assisted in the CTA on this day, we evaluated, besidesthe infection prevalences for HIV and Syphilis, some demographic and expositionvariables (risk). Four people among the 89 tested had the result of the test as positiveHIV and four people had the test for syphilis reagent. The analysis of the other studiedvariables showed that this annual campaign seems to reach its objectives: to test apopulation that would not come to do the test without this reason – young people that,in their majority were considered in very low risk. We considered that, in spite of thelow infection prevalence for HIV and Syphilis found in this population, this campaignis important because, besides the possibility to discover these infections early, allthese people have the opportunity to receive information and advice on STD/AIDS.

Key-words: HIV; Testing; Evaluation; Campaign of prevention.

Referências

RIO GRANDE DO SUL. Secretaria da Saúde. Ambulatório de Dermatologia Sanitária.Programa EpiInfo. Banco de Dados do CTA –ADS. Porto Alegre, [2001?].BOLETIM EPIDEMIOLÓGICO AIDS. Brasília: Ministério da Saúde, v. 14, n. 1, jan./mar. 2001.

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Tratamento ambulatorial, com supervisão semanal, de pacientes egressos de hospital ...

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 67

Tratamento ambulatorial, com supervisãosemanal, de pacientes egressos dehospital especializadoem tuberculose

Jarbas Figueira Osório1

Pedro Dornelles Picon1

Sérgio Luiz Bassanesi1

Erecina Figueiredo1

Tania Mariza Freitas1

Dalfran Maciel1

Dolores Bender1

Yolanda Carvalho Silveira1

Ana Maria Vieira Cardoso1

Lígia Gladis Richter1

Irone Terezinha Girotto1

Paulo Picarelli Ferreira1

Resumo: No período de agosto de 1989 a maio de 1997, 86 pacientes detuberculose egressos do Hospital Sanatório Partenon, hospital público estadual doRio Grande do Sul, Brasil, receberam tratamento ambulatorial supervisionadosemanalmente. O grupo era constituído por pacientes com sérios problemaspsicossociais, com grande risco de não adesão ao tratamento após a alta hospitalar,sendo, por isso, acompanhados por equipe multidisciplinar ambulatorial. A taxa decura foi de 79,3%, com 13,4% de abandono e 7,3% de falência. Esses resultadosforam comparados aos obtidos com tratamentos auto-administrados, nãosupervisionados, de duas coortes de pacientes tratados ambulatorialmente numaunidade de saúde, com protocolo assistencial orientado pela Política Estadual deControle da Tuberculose. As taxas de cura, abandono e falência foramsuperponíveis, indicando que a estratégia utilizada é uma alternativa satisfatória parao tratamento ambulatorial de pacientes selecionados.

Palavras-Chave: Hospital Sanatório Partenon; Ambulatório hospitalar;Tuberculose pulmonar; Adesão ao tratamento.

1 Técnico do Hospital Sanatório Partenon, e-mail: [email protected]

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Jarbas Figueira Osório et al.

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Introdução

O Hospital Sanatório Partenon é um hospital público, especializado, cria-do para o tratamento e assistência às pessoas com tuberculose. As indica-ções para internação de pacientes com tuberculose são: mau estado clínicodevido à tuberculose ou à outra doença associada; doença intercorrente as-sociada que necessite assistência hospitalar; sintomas incontroláveisambulatorialmente; efeitos adversos aos tuberculostáticos; tratamento comfármacos de reserva e/ou cirúrgico; problemas psicossociais que interfiramna adesão ao tratamento ambulatorial. Mais da metade das internações de-correm de problemas psicossociais e mau estado clínico, sendo essa últimasituação, muitas vezes, secundária à primeira. Em geral, são pacientes emestado grave, o que se reflete nos resultados do tratamento. Estudos do anode 1983, no Hospital Sanatório Partenon (HSP), mostraram uma taxa de curamuito baixa, próxima de 50%, decorrente do grande número de pacientes queabandonavam o tratamento após a alta hospitalar (Picon et al., 1993).

Visando aumentar a eficiência do tratamento, em 1989, foi criado o Am-bulatório de Egressos do Hospital Sanatório Partenon (AEHSP) para atenderaos pacientes de tuberculose que, após a alta hospitalar, necessitassem detratamento ambulatorial e fossem considerados de alto risco para o abando-no do tratamento. O objetivo desse Ambulatório era prestar assistência inten-siva, com auto-administração de medicamentos e supervisão semanal. Oacompanhamento seria feito por equipe multidisciplinar. Diferentemente darotina do protocolo assistencial da Política Estadual de Controle da Tubercu-lose – PCT, que prevê o fornecimento de medicação para trinta dias, noAEHSP, os pacientes receberiam tuberculostáticos para somente sete dias,com a finalidade de ampliar a vigilância sobre o tratamento, diagnosticar pre-cocemente intercorrências, detectar abandonos e ajustar a intervenção daequipe do AEHSP. Esperava-se, com isso, reduzir as taxas de abandono,melhorar a adesão ao tratamento e, conseqüentemente, elevar as taxas decura.

O objetivo do presente trabalho é relatar os resultados obtidos peloAHESP em seus primeiros oito anos de existência e, assim, contribuir com osorganismos de controle da tuberculose que, cada vez mais, têm se preocupa-do em definir estratégias que melhorem os resultados do tratamento (Iseman;Cohn; Sbarbaro, 1993; Dye et al., 1998).

Material e método

Eram encaminhados para o AEHSP os pacientes adultos que fossemconsiderados de alto risco de abandono do tratamento ambulatorial de rotinae que aceitassem e pudessem cumprir as normas do AEHSP. Foramconsiderados de alto risco de abandono do tratamento os pacientes queapresentassem pelo menos uma das seguintes condições: alcoolismo; adição

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Tratamento ambulatorial, com supervisão semanal, de pacientes egressos de hospital ...

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 69

a drogas ilícitas; situações psiquiátricas selecionadas (esquizofrenia,distúrbio anti-social ou limítrofe, déficit de inteligência, distúrbio do humor);história de abandono de tratamento; história de tratamento irregular; opiniãode familiar como tendo baixa probabilidade de adesão e estrutura familiarfrágil ou inexistente.

As normas do AEHSP previam que somente poderiam ser incluídospacientes que:

• tivessem motivação e possibilidade de freqüentar semanalmente ogrupo;

• possuíssem familiar ou responsável que se comprometesse emassumir o controle do uso da medicação em casa e que comparecesse àsreuniões periódicas da equipe pelo menos uma vez ao mês;

• residissem na região metropolitana de Porto Alegre, para facilitar o seucomparecimento nas datas aprazadas;

• se dispusessem a ser reinternados em caso de recaída no uso deálcool ou de drogas ilícitas ou ainda se ocorresse descontinuidade no uso damedicação;

• aceitassem visitas do Serviço Social;• aceitassem que seus casos pudessem ser discutidos com os demais

pacientes.De agosto de 1989 a maio de 1997, 86 pacientes iniciaram tratamento

no AEHSP, sendo 46 homens (53,5%) e 40 mulheres (46,5%). A idade dospacientes variou de 15 a 67 anos, com média de 40 anos de idade. Eramanalfabetos ou com primeiro grau incompleto 95,3% dos pacientes. A maioria,86,4%, tinha renda familiar inferior a um salário mínimo ou não tinha rendafixa. Cerca de 44% não eram naturais da região metropolitana de PortoAlegre. Havia uma elevada taxa de alcoolismo (52,3%), sendo 22,5% entre asmulheres e 78,3% entre os homens. Na tabela 1, estão os motivos quedeterminaram a internação desses 86 pacientes, destacando-se osproblemas psicossociais. Na tabela 2, pode ser observada a distribuição dospacientes segundo sua história terapêutica anterior e o esquema terapêuticoao qual foram submetidos.

Tabela 1 – Motivo da internação no Hospital Sanatório Partenon dospacientes encaminhados para o AEHSP

MOTIVO DA INTERNAÇÃO Nº %Psicossocial 39 45,3Mau estado geral 15 17,4Efeitos adversos dos tuberculostáticos 13 15,1Doença intercorrente 7 8,2Tratamento com drogas de reserva e/ou cirurgia 7 8,2Sintomas 3 3,5Outros 2 2,3TOTAL 86 100

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Jarbas Figueira Osório et al.

70 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

Tabela 2 – Distribuição dos pacientes segundo a história terapêutica e osesquemas terapêuticos utilizados

História Esquema terapêuticoterapêutica RHZ SHM RHM SEMZ AOTH OUTROS TOTAL

VT+PT 15 4 2 – – 2 23RC – 1 – 2 – 1 4RA 11 4 1 6 – 2 24RF – – – 25 5 5 35

Total 26 9 3 33 5 10 86

VT: Virgens de Tratamento ou sem tratamento prévio quando da internação.PT: Primotratamento, por terem iniciado o uso de tuberculostáticos antes de internar.RC: Retratamento após cura.RA: Retratamento após abandono.RF: Retratamento após falência.

O modelo de assistência aos pacientes do AEHSP incluía uma equipemultidisciplinar, atendimentos individuais e em grupo, medicaçãosupervisionada com busca imediata de faltosos e envolvimento de familiarcomo co-responsável pela supervisão do tratamento.

A equipe multidisciplinar constituía-se de médico clínico, médicopsiquiatra, enfermeiro, assistente social, auxiliar de enfermagem e auxiliarsocial. O atendimento era semanal, em instalações amplas que permitiam aavaliação individual de cada paciente, bem como o trabalho de grupo comtodos os pacientes, terapeutas e familiares sentados em círculo. Ao longodos anos, o número máximo de pacientes que foram tratadossimultaneamente foi quinze.

Semanalmente, os pacientes eram pesados e recebiam atendimentoindividual pelo médico clínico, que coletava dados sobre a evolução clínica naúltima semana, que incluía: sintomas; regularidade e correção no uso damedicação; possíveis efeitos adversos dos tuberculostáticos; uso de bebidasalcoólicas, de outros tóxicos e mesmo de cigarros; relações familiares eretomada da atividade laboral. Quando possível, as informações eramconfirmadas com os familiares. Ao término desse atendimento, cada pacienterecebia as solicitações de exames, quando necessário, e os tuberculostáticospara mais uma semana. Na seqüência, os pacientes eram encaminhadospara a atividade de grupo.

Nessa abordagem, em grupo e semanal, utilizava-se a dinâmica degrupo homogêneo de auto-ajuda. Participavam dessas reuniões os pacientes,seus familiares e a equipe de profissionais. Inicialmente, os pacientes tinhamum tempo para conversar livremente sobre suas inquietações a respeito dadoença e do tratamento, o que os estimulava a expressar e compartilhar seussentimentos, medos, dúvidas e experiências. Na segunda parte da reunião,

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Tratamento ambulatorial, com supervisão semanal, de pacientes egressos de hospital ...

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cada paciente fazia um relato sucinto sobre a evolução de seu tratamento,oportunidade em que a equipe técnica aproveitava para ressaltar os aspectosque considerasse importantes para o grupo, como reincidência de uso debebidas alcoólicas e/ou a possibilidade de tratamento irregular. Essesaspectos eram discutidos abertamente com o grupo, incluindo os familiares.Todos participavam na decisão sobre a melhor conduta para o caso emquestão, que podia ser mesmo a indicação de reinternação.

Com vistas à prevenção de abandonos, a auxiliar ou a assistente socialvisitava os faltosos no dia seguinte ao não comparecimento à reuniãosemanal. Nessas visitas, era entregue medicação para mais sete dias e ospacientes eram aprazados para a próxima reunião semanal. Nesse trabalho,procurava-se envolver o familiar co-responsável. Se após isso o pacientecontinuasse faltoso, indicava-se reinternação e o mesmo era excluído doAEHSP, passando a constituir um caso de abandono de tratamento.

A assistência social auxiliava os pacientes na utilização de recursossócio-institucionais disponíveis, com o objetivo de resolução das questõesconcretas, tais como: encaminhamento de documentação (carteira deidentidade, carteira do trabalho etc.); solicitação de benefício junto ao InstitutoNacional de Seguridade Social – INSS; retirada do Fundo de Garantia porTempo de Serviço – FGTS e acesso ao seguro-desemprego ou abono anualpara empregados de baixa renda – PIS e Pasep2 – para pacientes comtuberculose e HIV positivo; encaminhamento de auxílio na área desubsistência (cesta básica) e fornecimento de vale-transporte para prevenir aausência na reunião semanal por motivos financeiros.

Os 86 pacientes foram tratados com os esquemas de fármacosantituberculose escolhidos com base na análise da história terapêutica préviae da curva baciloscópica (Picon et al., 1980; Picon; Rizzon; Ott, 1993). Ostuberculostáticos utilizados foram: rifampicina (R); hidrazida (H); pirazinamida(Z); estreptomicina (S); etambutol (M); etionamida (E); amicacina (A);ofloxacina (O) e tiacetazona (T). Os principais esquemas administrados foramos seguintes:

Esquema RHZ: 2 meses de RHZ + 4 meses de RH;Esquema SHM: 3 meses de SHM + 3 meses de HM + 6 meses de H;Esquema RHM: 3 meses de RHM + 3 meses de HM + 6 meses de H;Esquema SEMZ: 3 meses de SEMZ + 9 meses de EM;Esquema AOTH: 3 meses de AOTH + 9 meses de OTH.As altas ocorreram por cura, abandono, falência, óbito ou transferência,

como a seguir descritas:Cura: pacientes que usaram os tuberculostáticos pelo tempo

programado, ocorrendo, nos casos bacilíferos, melhora clínica acompanhada

2 Programa de Integração Social (PIS) e Programa de Formação do Patrimônio do ServidorPúblico (Pasep) substituídos pela Constituição de 1988 em novos programas de seguridadesocial.

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72 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

de negativação do escarro até o 6° mês de tratamento, permanecendo assimaté o final e, nos casos abacilíferos, melhora clínico-radiológica.

Abandono: pacientes que interromperam o tratamento antes do seu final,independentemente da sua situação clínica ou bacteriológica.

Falência: pacientes com persistência de baciloscopia positiva no escarrono 6° mês de tratamento ou pacientes nos quais a baciloscopia voltou apositivar, por dois meses consecutivos, após negativação inicial; ambas assituações acompanhadas de piora clínico-radiológica.

Óbito: pacientes que morreram antes do final do tratamento,independentemente da causa.

Transferência: pacientes que, por iniciativa própria, transferiram seutratamento para outro serviço.

A análise estatística foi realizada utilizando-se o teste qui-quadrado, comcorreção de Yates sempre que necessário, aceitando-se um valor de p<0,05como de significância estatística.

Resultados

Os resultados do tratamento dos 86 pacientes acompanhados noAEHSP, segundo o sexo, estão na tabela 3.

Tabela 3 – Resultados do tratamento dos pacientes do AEHSP, de acordocom o sexo, 1989 –1997

Resultados Mulheres Homens TotalNº % Nº % Nº %

Cura 31 79,5 34 79,1 65 79,3Abandono 3 7,7 8 18,6 11 13,4Falência 5 12,8 1 2,3 6 7,3Óbito – – –Subtotal 39 100 43 100 82 100Transferência 1 3 4Total 40 46 86

Para comparação, na tabela 4 são mostrados os resultados dotratamento de dois outros grupos de pacientes atendidos ambulatorialmenteem uma Unidade de Saúde (US), que na época atendia pacientes comtuberculose, segundo o PCT. O primeiro desses grupos é composto pelospacientes adultos que iniciaram e continuaram seu tratamento na mesma US,no período de 1989 a 1994. No segundo grupo de comparação estão ospacientes que iniciaram o uso de tuberculostáticos quando da internação noHSP e foram encaminhados, após a alta hospitalar, para continuação dotratamento naquela US, no mesmo período.

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Tratamento ambulatorial, com supervisão semanal, de pacientes egressos de hospital ...

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 73

Tabela 4 – Resultados do tratamento de pacientes adultos com tuberculoseque iniciaram seu tratamento e foram acompanhados na US e de pacientesadultos que foram acompanhados nesta US após terem recebido alta doHospital Sanatório Partenon, 1989 a 1994

Resultados US US, vindos do HSP

Nº % Nº %Cura 973 82,1 36 73,5Abandono 143 12,1 7 14,3Falência 40 3,4 4 8,1Óbito 29 2,4 2 4,1Total 1185 100 49 100

Fonte: Banco de dados da US.

O grupo do AEHSP, conforme pode ser visto nas tabelas 5 e 6, incluíauma alta proporção de casos de alto risco para abandono de tratamento.Tinha uma proporção de alcoolistas significativamente maior que o grupo daUS (p<0.001) e uma proporção de pacientes em retratamento, especialmentede retratamento pós-abandono e pós-falência, também significativamentemaior que os dois grupos, US e US vindos do HSP (p<0,001). Apesar desseperfil de mais alto risco, os pacientes do AEHSP apresentaram taxas de curasimilares aos demais grupos de comparação.

Tabela 5 – Percentual de alcoolistas nos grupos AEHSP, US e US vindos doHSP, de acordo com o sexo

Sexo AEHSP US US, vindos do HSPHomens 78% 35% 63%Mulheres 23% 4% 0%Todos 52% 23% 54%

Tabela 6 – Distribuição dos pacientes nos grupos AEHSP, US e US vindos doHSP, segundo a história terapêutica prévia

História Terapêutica AEHSP US US, vindos do HSP% % %

Sem tratamento prévio 12,8 87,5 80,0Primotratamento 14,0 0 0Retratamento pós-cura 4,6 9,5 4,0Retratamento pós-abandono 27,9 2,6 16,0Retratamento pós-falência 40,7 0,2 0Crônico 0 0,2 0Total 100 100 100

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Na tabela 7, estão os resultados do tratamento dos três grupos dospacientes em primeiro tratamento. Não ocorreram diferenças significativasnas taxas de cura, abandono, falência e óbito entre as três coortes.

Tabela 7 – Distribuição dos pacientes virgens de tratamento e emprimotratamento dos grupos AEHSP, US e US vindos do HSP, segundo osresultados do tratamento

ResultadosAEHSP US US, vindos

do HSP

Nº % Nº % Nº %Cura 17 80,9 981 82,0 31 79,5Abandono 4 19,1 137 11,4 4 10,3Falência – 30 2,5 2 5,1Óbito – 49 4,1 2 5,1Total 21 100 1316 100 39 100

Nos pacientes em retratamento pós-abandono e pós-falência (tabela 8),observou-se taxa de cura significativamente maior entre a coorte AEHSP eUS (p<0001) e entre AEHSP e US, vindos do HSP (p=0,024).

Tabela 8 – Distribuição dos pacientes em retratamento pós-abandono e pós-falência dos grupos AEHSP, US e US, vindos do HSP, segundo os resultadosdo tratamento

ResultadosAEHSP US US, vindos

do HSP

N° % N° % N° %Cura 45 78,9 31 41,9 3 37,5Abandono 7 12,3 34 45,9 3 37,5Falência 5 8,8 8 10,8 2 25Óbito – 1 1,3 –Total 57 100 74 100 8 100

Os resultados obtidos, de acordo com o esquema terapêutico utilizado,podem ser vistos na tabela 9. Não houve diferença significativa nas taxas decura, abandono e falência, entre os grupos de esquemas.

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Tratamento ambulatorial, com supervisão semanal, de pacientes egressos de hospital ...

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 75

Tabela 9 – Distribuição dos pacientes do AEHSP segundo os resultados dotratamento e o esquema terapêutico utilizado

Resultados

Esquema terapêuticoRHZ, SHM SEMZ OUTROS

ou RHM

Nº % Nº % Nº %Cura 28 82,3 24 72,7 13 86,6Abandono 6 17,7 4 12,1 1 6,7Falência – 5 15,2 1 6,7Óbito – – –Total 34 100 33 100 15 100

Discussão

A tuberculose permanece sendo um importante problema de saúdepública no Estado do Rio Grande do Sul, a despeito da existência de umaPolítica Estadual de Controle da Tuberculose implantada há várias décadas(Ott et al., 1993). Segundo dados da Equipe de Tuberculose da Secretaria daSaúde/RS, de 1988 a 1998, diagnosticou-se, aproximadamente, 76% dosbacilíferos estimados na população (além do mínimo de 70% recomendadopela OMS), mas conseguiu-se curar apenas 78% deles, menos que os 85%recomendados (WHO, 1991). Esta baixa taxa de cura deve-se, em parte, aofato da tuberculose ser uma doença que exige o uso de fármacos por longotempo, o que favorece a não-adesão ao tratamento. Essa não-adesão étambém provocada pela alta prevalência, entre os pacientes, decaracterísticas que induzem ao abandono, como o alcoolismo, a adição adrogas e uma série de outros problemas psíquicos e/ou sociais. A taxa dealcoolismo em pacientes ambulatoriais da US, no período de 1989 a 1994, foide 23%. Em pacientes hospitalizados no Hospital Sanatório Partenon, no ano1984, a taxa de alcoolismo foi de 62% (Picon et al., 1993), pois, para aquelehospital, são encaminhados pacientes com irregularidade de tratamento, namaioria das vezes por causa do alcoolismo. Sendo assim, esses pacientes,por serem de mais alto risco de abandono, devem receber um tratamentoespecífico, não só quando internados, mas, principalmente, quando retornamao ambulatório para a continuação do tratamento.

Dentro desse enfoque, a experiência aqui relatada pode ser útil paraauxiliar na estruturação desse tipo de assistência em outros locais. Pelaanálise da metodologia empregada, pode-se verificar que o atendimentooferecido no AEHSP se diferenciava daquele realizado nas unidades desaúde do PCT (Ott et al., 1993), fundamentalmente pela maior freqüência deencontros, pelo trabalho de grupo e pelo tratamento supervisionado. O

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trabalho da equipe, nas reuniões de grupo, faz-se pela utilização de métodosde clarificação dos sentimentos e fantasias subjacentes, permitindo aospacientes uma melhor elaboração dos aspectos psicológicos envolvidos coma doença. Essa dinâmica cria uma identidade de grupo de característicassaudáveis que fortalece a motivação de cada paciente para atingir o objetivocomum do grupo, a cura da tuberculose. Além disso, propicia uma experiênciade educação em saúde, em que os próprios pacientes, aos poucos, vãotranspondo a linguagem técnico-científica para a sua cultura, possibilitando aassimilação dos conhecimentos necessários a respeito da doença, bem comoa diminuição das fantasias mais comuns, como, por exemplo, a falsa crençade que, ao melhorarem os sintomas, não precisariam mais seguir otratamento.

Resultados do tratamento de pacientes com característicassemelhantes às apresentadas pelos pacientes do AEHSP já tinham sidoavaliados no Hospital Sanatório Partenon, nas coortes dos anos 1979, 1980,1982 e 1983 (Picon et al., 1993). O estudo da coorte de 1983, no final de1984, excluindo-se dois pacientes transferidos para outro estado, mostrouque, dentre os 587 com alta hospitalar e que deveriam continuar o tratamentoambulatorialmente, 321 curaram (54,7%), 113 abandonaram (19,2%), 88morreram (15%) e 65 continuavam em tratamento (11,1%), devido à falênciaou por terem sido readmitidos após abandono. Os pacientes, naqueles anos,fizeram a primeira fase do tratamento internados no Hospital e a fase seguintenas Unidades de Saúde, conforme o protocolo do PCT. Portanto, ao teremalta, recebiam tuberculostáticos para 30 dias e eram orientados a comparecerna Unidade de Saúde mais próxima de sua residência, para a continuidade dotratamento. Quando compareciam, recebiam assistência individual demédicos clínicos, de auxiliares de enfermagem e, em algumas unidades, deenfermeiros, mas não recebiam assistência psiquiátrica e/ou social. Após oatendimento, eram agendados a comparecer mensalmente na Unidade, masmuitos deles acabavam abandonando o tratamento ou fazendo uso irregularda medicação. Frente a essas evidências, pode-se suspeitar fortemente queo atendimento de rotina da maioria das unidades de saúde que seguiam oprotocolo do PCT é inadequado para os pacientes egressos do HSP. Por suavez, os melhores resultados obtidos no AEHSP, com 79,3% de cura, 13,4%de abandono e 7,3% de falência, decorrem do trabalho diferenciado, realizadopor equipe multidisciplinar, com assistência não somente individual, como pormeio de trabalho de grupo, com a participação de um familiar no controle daingestão dos fármacos. Além disso, o fornecimento dos tuberculostáticos parasomente 7 dias permitiu uma melhor avaliação da adesão ao tratamento.

A comparação dos resultados do AEHSP com os obtidos com ospacientes que iniciaram o tratamento na US e US, vindos do HSP (tabelas 3 e4) mostrou serem as taxas de cura e de abandono semelhantes. Esses dadossugerem que o trabalho da equipe do AEHSP foi adequado para tratar umapopulação mais doente, com uma taxa elevada de alcoolismo e,

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Tratamento ambulatorial, com supervisão semanal, de pacientes egressos de hospital ...

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principalmente, com um número maior de casos em retratamento. Isto podeser comprovado pelos resultados da tabela 8, onde se verifica que ospacientes que estavam em retratamento após abandono e/ou falência noAEHSP apresentaram taxas de cura e de abandono significativamentemaiores que os pacientes em situação semelhante, tratados na US.

Embora não seja a intenção deste trabalho avaliar a eficácia deste oudaquele esquema de tuberculostáticos, mas sim a eficiência da proposta detratamento apresentada, é necessário que sejam feitas algumasconsiderações a respeito do tema. Ao se analisar a tabela 2, verifica-se que34 pacientes (41,5%) utilizaram esquemas de eficácia comprovada, como oRHZ, RHM ou SHM, restando a dúvida de que os resultados não seriam osmesmos caso os esquemas fossem outros. Sabe-se que em pacientes comproblemas psicossociais semelhantes consegue-se uma taxa de cura menor,em torno de 65%, quando tratados com esquemas de “terceira-linha”,conforme demonstraram alguns relatos da literatura brasileira (Comissão deTerceira Linha do Hospital Sanatório Partenon, 1995; Seiscento, 1997).Porém, ao analisar-se os resultados da tabela 9, verifica-se que a taxa decura foi semelhante quando se comparou os resultados obtidos com um“bom” esquema (RHZ, RHM ou SHM), com aqueles do esquema SEMZ oumesmo de esquemas de “terceira linha”. Estas são evidências de que se podeatingir bons resultados com a utilização de esquemas de primeira ou segundalinha, desde que se consiga melhorar a adesão dos pacientes ao tratamento,pela prestação de assistência diferenciada, ressaltando a importância defatores organizacionais.

Comentários finais

Os pacientes tratados no AEHSP tinham graves problemas, como baixograu de instrução, baixa renda familiar, elevada taxa de alcoolismo e elevadataxa de casos em retratamento. Esse conjunto de problemas sinalizava ummau prognóstico em relação à adesão e ao sucesso do tratamento. Emfunção dos bons e significativos resultados obtidos pelo AEHSP, entendem osautores que a metodologia deve ser mantida e que sua aplicação deve serexpandida, transformando-a em uma nova rotina nas unidades de saúdeconvencionais, visando, principalmente, aos pacientes em retratamento apósabandono ou falência.

Tratamiento ambulatorial, con supervisión semanal, de pacientesegresos del hospital especializado en tuberculosis

Resumen: En el período de agosto de 1989 hasta mayo de 1997, 86 pacientesde tuberculosis egresos del Hospital Sanatório Partenon, hospital público estadualdel Rio Grande do Sul, Brasil, recibieron tratamiento ambulatorial supervisionadosemanalmente. El grupo era constituido por pacientes con serios problemas

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psicosociales, con gran riesgo de no-adhesión al tratamiento tras la alta hospitalar,siendo, por eso, acompañados por una equipo multidisciplinar ambulatorial. La tasade cura fue de 79,3%, con 13,4% de abandono y 7,3% de falencia. Esos resultadosfueron comparados a los obtenidos con tratamientos autoadministrados, nosupervisionados, de dos cohortes de pacientes tratados ambulatorialmente en unaunidad de salud, con protocolo asistencial orientado por la Política Estadual deControl de Tuberculosis – PCT. Las tasas de cura, abandono y falencia fueronsuperpuestas, indicando que la estrategia utilizada es una alternativa satisfactoriapara el tratamiento ambulatorial de pacientes seleccionados.

Palabras Clave: Hospital Sanatório Partenon; Ambulatorio hospitalar;Tuberculosis pulmonar; Falta de cooperación del paciente.

Ambulatory Treatment, with weekly supervision, of patients from ahospital specialized in tuberculosis

Abstract: From August 1989 to May 1997, 86 tuberculosis patients comingfrom Hospital Partenon, a public hospitalof the State of Rio Grande do Sul, Brazil,underwent basic weekly treatment with supervision. The group was constituted ofpatients with serious psychosocial problems, with a great risk of not carrying on thetreatment after they left the hospital, being therefore, guided by a multidisciplinaryteam of basic care. The healing rate was 79,3% with 13,4% of abandon and 7,3% ofdeaths. Those results were compared to the ones obtained with self-administeredtreatments, without supervision, of two groups of patients with basic treatment in ahealth unit with an attending protocol oriented by the State Politics of TuberculosisControl – PCT. The healing, abandon and death rates were superposed, indicatingthat the strategy used is a satisfactory alternative to basic treatment of selectedpatients.

Key-words: Hospital Partenon; Hospital basic treatment; Lungs tuberculosis;Treatment resistance.

Referências

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Tratamento ambulatorial, com supervisão semanal, de pacientes egressos de hospital ...

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Atenção montadora página 80 é branca

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Acreditação pedagógica na educação em saúde coletiva

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 81

Acreditação pedagógica na educação emsaúde coletiva 1

Ricardo Burg Ceccim2

Resumo: O artigo transpõe uma exposição verbal realizada na XIX Conferên-cia da Associação Latino-Americana e do Caribe de Educação em Saúde Pública,realizada em Havana, Cuba, em julho do ano de 2000. A exposição apresentavauma proposta de sistema de acompanhamento e avaliação da qualidade da educa-ção levada a efeito pelas instituições de ensino em saúde coletiva e sua importâncianos países em processo de reforma sanitária. Trata-se da aceitação da necessidadede expansão da educação em saúde coletiva para o âmbito da pós-graduação delato sensu, mas reconhecendo os riscos da falta de acompanhamento da qualidadee a necessidade de interpor um sistema de confiança da sociedade que funcionecomo uma política pública de crescimento, melhoria da qualidade e compromissosocial da formação em saúde coletiva para a implementação do Sistema Único deSaúde no Brasil.

Palavras-Chave: Avaliação institucional; Acreditação pedagógica; Educaçãoem saúde coletiva; Saúde pública.

Apresentação

No mês de julho de 2000 ocorreu em Havana – Cuba a XIX ConferênciaLatino-Americana e do Caribe de Educação em Saúde Pública, organizadapela Associação Latino-Americana de Educação em Saúde Pública (Alaesp)e Organização Pan-Americana da Saúde da Organização Mundial da Saúde

1 O presente documento corresponde à palestra proferida na sessão Processos Dinamizadorespara o Fortalecimento das Instituições de Educação em Saúde Pública: Grupo de TrabalhoMelhoramento da Qualidade, durante a XIX Conferencia de la Associación Latinoamericana ydel Caribe de Educación en Salud Pública, realizada de 02 a 04 de julho de 2000 em LaHabana, Cuba. A exposição verbal ocorreu em 02 de julho, sob o título Acreditação Pedagógi-ca e Melhoria da Educação em Saúde Pública – proposta brasileira. A sessão previa o debatedos processos contínuos de melhoria da qualidade nas Instituições de Educação em SaúdePública, a assunção do enfoque de gestão estratégica, os processos de auto-avaliação eacreditação da educação em saúde pública e uma maior vinculação com atores externos,como os outros programas de educação em saúde pública, organizações governamentais enão-governamentais e ex-alunos, entre outros.2 Sanitarista, Doutor, Diretor da Escola de Saúde Pública do Estado do Rio Grande do Sul(ESP/RS), Professor de Educação em Saúde na Universidade Federal do Rio Grande do Sul(Ufrgs).

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Ricardo Burg Ceccim

82 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

(Opas-OMS), por intermédio do Programa de Desenvolvimento de RecursosHumanos da Divisão de Desenvolvimento de Sistemas e Serviços de Saúde.

Entre as atividades principais da Conferência estava a organização degrupos de trabalho para discutir processos dinamizadores de mudança iden-tificados como estratégicos para fortalecer os campos de ação das institui-ções de formação em saúde pública: desenvolvimento curricular e os novosparadigmas da saúde; desenvolvimento profissional e as novas competênci-as para atuação em saúde pública; desenvolvimento educacional, a educa-ção à distância e a educação permanente em saúde pública; desenvolvimen-to da ação e do compromisso intersetorial das Escolas de Saúde Pública edesenvolvimento da qualidade nas Escolas de Saúde Pública (OrganizaciónPanamericana de la Salud Pública, 2001, prelo3).

Como plano de metas da XIX Conferência, as conclusões e recomenda-ções dos grupos de trabalho constituem seus produtos centrais e funcionamcomo esquemas gerais de base para os programas de ação em cooperaçãointerinstitucional.

O grande tema da XIX Conferência da Alaesp foi o Desenvolvimento daEducação em Saúde Pública: Desafios para o Século XXI, buscando o forta-lecimento do protagonismo das Escolas de Saúde Pública, estipulando diretri-zes à educação e capacitação em saúde pública para incentivar a coopera-ção técnica e constituindo processos dinamizadores de mudanças dirigidosao estímulo e à ação dessas instituições. A Escola de Saúde Pública do Esta-do do Rio Grande do Sul (ESP/RS), integrante do grupo brasileiro que vemdiscutindo um modelo para acreditação de cursos de saúde pública e progra-mas educativos afins, foi convidada a apresentar a proposta brasileira na ses-são desenvolvimento da qualidade nas Escolas de Saúde Pública entre osprocessos dinamizadores de mudanças. Nesta sessão, além da exposiçãorealizada pela ESP/RS, ocorreu o relato da Associação Mexicana de Educa-ção em Saúde Pública (Amesp), que exerce um programa de acreditação decursos de saúde pública naquele país.

A XIX Conferência contou com participantes de 56 Instituições de Edu-cação em Saúde Pública da região das Américas. Além das instituições daAlaesp, participaram da reunião a Federação Mundial de Associações deSaúde Pública (WFPHA), a Associação Americana de Saúde Pública (APHA),a Associação de Escolas de Saúde Pública dos Estados Unidos (ASPHER) ea representação da sede central da OMS.

3 Todos os dados referidos constam do programa oficial distribuído pela Organização Pan-Americana da Saúde por ocasião da preparação e realização da XIX Conferência da Alaesp.Todas estas informações, bem como a transcrição de palestras centrais, a síntese das ses-sões dos processos dinamizadores de mudança, o informe sobre expectativas das instituiçõesformadoras e as conclusões ou recomendações finais são objeto da publicação Educación enSalud Pública: nuevas perspectivas para las Américas, organizado por Charles Godue, asses-sor regional da OMS para a Educação Médica e em Saúde Pública, obra que entra no preloimediatamente ao final da Conferência (julho 2000), com distribuição confirmada em 2001(Organización Panamericana de la Salud Pública, 2001, prelo).

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Acreditação pedagógica na educação em saúde coletiva

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No Brasil, a Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coleti-va (Abrasco) congrega os programas nacionais de educação em saúde públi-ca, significando a organização brasileira correspondente à Alaesp. Na regiãoda América Latina e do Caribe existem associações nacionais de educaçãoem saúde pública, além do Brasil, na Argentina (Aaesp), no México (Amesp)e na Venezuela (Avesp). Embora nem todas congregadas à Abrasco, o Brasilpossui 39 instituições formadoras em saúde pública, identificadas por oca-sião das convocações para o debate da acreditação pedagógica (ver ane-xo 1). Destas instituições formadoras, 11 são integrantes da Alaesp (veranexo 2).

Introdução

A Associação Latino-Americana e do Caribe de Educação em SaúdePública foi criada em 1974, decorrente da preocupação com a formação emsaúde pública na região. Essa formação iniciou na América Latina no início doséculo XX, preocupada, fundamentalmente, com o enfrentamento das doen-ças tropicais. Em 1920 a Fundação Rockefeller ajudou a criar uma escola desaúde pública vinculada ao sistema universitário, a Universidade de São Pau-lo, no Brasil, e outra vinculada ao sistema de serviços de saúde, o Ministérioda Saúde, no México. Em 1959, a Opas toma a iniciativa de congregar asescolas de saúde pública da região, reunindo 09 escolas em um evento reali-zado no México. Desta reunião, seguiram-se encontros bienais para o debatedo ensino especializado em saúde pública.

No ano de 1974, a reunião ocorreu em Lima, no Peru, e as escolas pre-sentes resolveram criar a Associação Latino-Americana de Escolas de SaúdePública, quando surgiu a sigla Alaesp. Como os programas de pós-gradua-ção em saúde pública entravam em ascensão, principalmente pela oferta nosDepartamentos de Medicina Preventiva e Social das Faculdades de Medicinada região, a Associação passou a incorporar os esforços pela pesquisa pós-graduada e pela formação de pessoal de elevada educação superior como osprogramas de mestrado e doutorado, posteriormente entabulados pela maio-ria das escolas, inclusive aquelas vinculadas aos sistemas de serviços. Amudança na participação de instituições formadoras levou à mudança donome da entidade para Associação Latino-Americana e do Caribe de Educa-ção em Saúde Pública, mantendo-se a sigla e mantendo-se a noçãogeneralizante de Escolas de Saúde Pública para as diversas instituições for-madoras especializadas.

No Brasil, a saúde pública foi subordinada à designação maisabrangente de saúde coletiva, que contrai epidemiologia, medicina preventi-va e saúde pública, assegurando a permeabilidade e transversalização dasciências sociais em saúde de um modo que caracteriza diferenciadamente oBrasil em relação ao mundo. Em 1979, foi criada, no Brasil, a Abrasco. Se emtoda a região latino-americana e caribenha a educação em saúde pública

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passou a enfatizar o desenvolvimento de programas de ensino e pesquisaque respondam aos desafios construtores da reforma setorial e daintersetorialidade, no Brasil ainda se destaca a descentralização da gestão(política, financeira e administrativa), a participação social com caráter dedeliberação sobre políticas, planos e relatórios de gestão e a hierarquizaçãosem conotação de escalas de complexidade, mas organização em rede únicade um sistema de serviços de resolutividade intercomplementar (atenção in-tegral à saúde).

Diferentemente dos países desenvolvidos onde a saúde pública repre-senta o conhecimento especializado orientado pela dispersão da clínica, noBrasil a saúde coletiva está reorientando a clínica, tanto pela inserção de seucampo de saberes à clínica tradicional, quanto pelo debate profícuo daintegralidade da atenção e intersetorialidade das práticas em saúde da popu-lação.

Referências de partida à acreditação pedagógica na educação emsaúde coletiva

A Saúde Coletiva representa área específica, no campo das ciências dasaúde, tanto no que se refere à produção de conhecimentos e aoordenamento de informações documentais e científico-tecnológicas, como noque se refere à formação e/ou certificação de especialistas.

A superior qualificação em Saúde Coletiva ocorre, no Brasil, em progra-mas de formação lato sensu (residência nos serviços de saúde ou cursos deespecialização) e programas de formação stricto sensu (cursos de mestradoacadêmico ou profissionalizante e cursos de doutorado). Discute-se a gradu-ação em saúde coletiva, segundo a reivindicação de que há um núcleo desaberes e práticas desta área de conhecimento que a distingue em profundi-dade do campo das ciências da saúde. No Brasil, os sistemas de Ciência eTecnologia e de Aperfeiçoamento do Pessoal de Educação Superior4 no-meiam a Saúde Coletiva como grupo específico entre 10 áreas do conheci-mento: medicina, enfermagem, odontologia, farmácia, nutrição,fonoaudiologia, fisioterapia, terapia ocupacional, educação física e a saúdecoletiva. Nesta classificação, a saúde coletiva apresenta 03 subáreas:epidemiologia, saúde pública e medicina preventiva.

4 O Brasil implementa o desenvolvimento científico e tecnológico pelo fomento à pesquisa quese faz por meio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq),uma fundação de direito privado, vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia e implementaos estudos e avaliações necessários ao desenvolvimento do ensino de pós-graduação e fo-mento aos estudos e atividades que contribuam para o desenvolvimento e consolidação daeducação superior por meio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Supe-rior (Capes), fundação pública, vinculada ao Ministério da Educação. Ambos os órgãos utili-zam a mesma tabela/base de Áreas do Conhecimento.

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A Reforma Sanitária Brasileira passou a exigir a absorção de especialis-tas em saúde coletiva para o planejamento, gestão e avaliação das diversasinstâncias descentralizadas do Sistema Único de Saúde. No Brasil, de acordocom a Constituição Nacional, a condução setorial da saúde deve ser descen-tralizada para os entes federados, com comando único por esfera de gover-no. Além disso, os instrumentos ordenadores do Sistema Único de Saúdeexigem das esferas descentralizadas o domínio de recursos conceituais eoperacionais de administração e planificação em saúde, de epidemiologia esistemas de informação e dos estudos de sociedade e políticas públicas. Acondução setorial deve se dar, a rigor, de baixo para cima, das instânciaslocais, distritais e municipais às instâncias regionais, estaduais e nacional,cada instância maior contribuindo à ampliação da autonomia e das compe-tências técnicas das instâncias menores.

Esse processo passou a exigir profissionais de saúde coletiva e nãomeros técnicos ou bons clínicos/terapeutas/cuidadores. O domínio de cadainstituição de prestação de serviços requer planejamento, avaliação,resolutividade em rede intercomplementar, garantia de acesso com acolhi-mento em rede orgânica, vigilância à saúde e ações intersetoriais de promo-ção da saúde. A saúde coletiva tende a desequilibrar seu pólo predominanteda pesquisa para a gestão de sistemas e/ou serviços.

A maior demanda de especialistas gerou uma infinidade de cursos, pro-gramas de capacitação e subáreas de formação com as mais diversas car-gas horárias, propostas curriculares e modalidades de aprovação de alunos eos mais diversos campos de experimentação.

Ferreira et al. (2000, p. 74) lembram que pouco mais de 50% dos progra-mas em funcionamento, que hoje já ultrapassam uma centena, foram estabe-lecidos na década de 90 do século XX. De um lado, os novos cursos/novasinstituições vieram introduzir a necessária novidade e atualização de rituais,processos e interações e, conforme os autores citados, motivar a mudançadas estruturas, dos cursos ou das instituições mais tradicionais; de outro lado,ainda segundo esses autores, prevalece a preocupação de acercar-se da rea-lidade concreta do setor para justificar melhor sua existência.

O crescimento da oferta de cursos e variedade da origem institucionaldos mesmos coloca a qualidade desta oferta em risco. Em toda a AméricaLatina há uma preocupação com os cursos de quintal ou de garagem, umaindústria de certificados de especialização vendidos por dinheiro e qualidadedidático-pedagógica de risco, além da escolha de parâmetros curriculares dis-cutíveis do ponto de vista do mais avançado conhecimento brasileiro em saú-de coletiva.

Se, ao final dos anos 90, o mundo começa a discutir em suas instânciasde debate da saúde coletiva o desenvolvimento curricular, profissional e edu-cacional, a ação e o compromisso intersetorial, a qualidade da educação emsaúde coletiva entrou em foco de maneira singularizada, isto é, tratava-se depleitear a formação para a qualidade de uma política pública, capaz de escu-

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ta, observação e leitura das demandas sociais e competentes na sua conver-são em serviços, ações, projetos e articulação de realidades.

A educação em saúde coletiva e seu fortalecimento como campo deação para a garantia da qualidade das ações e serviços de saúde individual ecoletiva e seu desenvolvimento para a gestão de sistemas e serviços de saú-de passou a integrar as discussões internacionais pela formulação das Fun-ções Essenciais da Saúde Pública (Gemmel et al., 2000, p. 89-108). O Brasilnão pode furtar-se de propor sistemas de avaliação desta formação específi-ca, pois vive, no setor da saúde, o mais amplo e intenso processo de reformasetorial e do Estado na região latino-americana e caribenha.

Descrição da proposta

A acreditação pedagógica é uma proposta que se desdobra dosbinômios sistema de avaliação e sistema de ensino; avaliação institucional eindicadores educacionais; políticas públicas e projetos pedagógicos; desen-volvimento organizacional e gestão da educação, entre outros conceitos queassociam o crescimento contínuo das instituições de ensino, qualidade dosserviços educacionais, desempenho nas aprendizagens, compromisso so-cial das instituições de ensino, produção de interações e efeitos de integraçãoentre instituições de ensino e sociedade.

A acreditação pedagógica, como um processo avaliativo de caráterinstitucional e de desenvolvimento da qualidade, deve ser capaz de orientar ainstituição para seu autoconhecimento e o reconhecimento das suaspotencialidades e desempenhos, mas sua principal justificativa está em infor-mar e ampliar o compromisso social da instituição com a qualidade daimplementação das políticas públicas afetas por seu objeto. No caso da edu-cação em saúde coletiva, o compromisso social com a saúde da população.No Brasil, compromisso com a implementação do Sistema Único de Saúde.

A acreditação pedagógica na educação em saúde coletiva se propõe alevar adiante o aperfeiçoamento do ensino e o acompanhamento da qualida-de pedagógica das instituições de educação em saúde coletiva e dos cursosde saúde pública e áreas afins. Visa, de um lado, privilegiar o profissional queestá em formação e, de outro, o sistema de saúde onde ele irá atuar.

O produto mais importante da acreditação pedagógica proposta é amobilização pelo aperfeiçoamento educacional e o engajamento em um pro-cesso de administração coletiva da qualidade e não o selo, pontos ou notasque venha a obter.

A Acreditação Pedagógica, então, estaria inscrita num processo pro-gressivo e permanente de avaliação institucional e melhoramento da qualida-de da Educação em Saúde Coletiva, fortalecendo seu compromisso social.

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Objetivos estratégicos

Se nos anos 70 e 80 do século passado, o Brasil precisava expandir aoferta da formação em saúde coletiva, desde os anos 90 essa formação pre-cisa da intensificação da melhoria da qualidade formativa.

Um sistema de acreditação pedagógica da educação em saúde coletivadeverá buscar:

– controlar e garantir a qualidade educacional e pedagógica;– aperfeiçoar programas de formação voltados para o desenvolvimento

do Sistema de Saúde;– construir elementos/indicadores/critérios de verificação das

potencialidades e certificação de qualidade de cada Instituição de Educaçãoem Saúde Coletiva;

– estabelecer uma regulação compartilhada entre formadores, gestoresdas ações, serviços de saúde e sociedade na perspectiva da adoção do siste-ma de acreditação pedagógica por agências nacionais oficiais de avaliação/pesquisa/ensino/desenvolvimento;

– promover a cooperação interinstitucional em rede.

Iniciativa e metodologia de construção da proposta

Na conjuntura brasileira, a iniciativa de um sistema de acreditação decursos de saúde pública surgiu na Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp),da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). O tema da avaliação e acompanha-mento do ensino de pós-graduação lato sensu em saúde coletiva (formaçãode especialistas/sanitaristas) foi incluído pela Ensp/Fiocruz – Rio de Janeiro/Brasil (Ensp/Br), na cooperação mantida com a École Nationale de la SantéPublique, de Renes/França (Ensp/Fr).

A Ensp/Br, então, montou um Seminário Nacional de apresentação deuma proposta designada como Acreditação Pedagógica (termo de referênciautilizado pelos consultores franceses: Accréditation pédagogique – Ensp RioBrésil / Ensp France – Année 1999-2000 – Programme de coopération)5. Aacreditação pedagógica, na França, serve à auditoria, ao acompanhamento eà certificação nacional de cursos e/ou instituições de educação em saúdepública, direção hospitalar e direção de centros de assistência médico-social(École Nationale de la Santé Publique, 1999a).

Neste Seminário Nacional, foi elaborado um documento-base – Carta deIntenções – que demarcava o compromisso inicial da Ensp e de diversasinstituições de educação em saúde coletiva, integrantes das ações descen-tralizadas da Ensp/Br para a construção de um projeto nacional deacreditação pedagógica da educação em saúde coletiva (Escola Nacional de

5 A consultoria francesa se fez representar no Brasil pelos professores Christian Chauvigné eClaire Droniou, da Ensp/Fr.

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Saúde Pública, 1999).A partir daí, passam a ser organizados Seminários Regionais no país

para disseminar a proposta, angariar críticas, estabelecer alianças no interes-se regional, fortalecer as escolas de governo que realizam formação pós-graduada em saúde coletiva, reunir o conjunto de instituições de ensino uni-versitário para ampliar adesões à construção de uma metodologia nacionalaceitável por todos e factível na realidade brasileira. Estes Seminários fica-ram acertados em um cronograma de março a outubro de 2000.

No primeiro Seminário Regional, foram nomeados dois Grupos de Tra-balho (GT): um GT de Articulação Política (4 instituições representadas, entreelas a ESP/RS), incumbido de contatar os órgãos de educação, de saúde, deciência e tecnologia e de organização política do setor e um GT de Articula-ção Técnica (6 instituições representadas, entra elas a ESP/RS), incumbidode formular as minutas de instrumento e critérios a serem submetidas aosSeminários Regionais.

Foi organizada uma visita técnica à Ensp/Fr para acompanhar proces-sos de auditoria e certificação (3 instituições do Brasil representadas, entreelas a ESP/RS) e ampliar a apropriação do sistema utilizado como referência.

Uma estratégia de rede foi montada para somar parceiros a cada Semi-nário Regional e foi estruturada uma oficina para ser levada ao principal even-to brasileiro da área da ciência e gestão de serviços em saúde coletiva: oCongresso Brasileiro da Associação Brasileira de Pós-Graduação em SaúdeColetiva (a cargo do GT de Articulação Política).

Na seqüência, um Seminário, com a presença da consultoria francesapara o debate dos instrumentos estruturados e das alianças conquistadaspara a sustentação técnica e política da proposta, foi previsto para 06 mesesapós o Seminário Nacional de apresentação às Instituições de Educação emSaúde Coletiva.

Tecnologia de acreditação pedagógica em saúde coletiva

Os procedimentos da Acreditação podem ser catalogados em um com-ponente político e um componente técnico, como na composição dos GTPolítico e Técnico, acima citados. Quanto ao componente político, falamos deavaliação interna e externa. Quanto ao componente técnico, falamos dos indi-cadores quantitativos e qualitativos a serem examinados.

A consultoria francesa do projeto brasileiro da Acreditação sempre insis-tiu no reconhecimento dos componentes político e técnico no processo daacreditação pedagógica. Estarei me referindo, entretanto, ao trabalho de Lei-te, Tutkian e Holz (2000) para introduzir estes aspectos.

As autoras caracterizam com perfeição a tecnologia metodológica daacreditação quando descrevem a avaliação para o desenvolvimento damelhoria da qualidade educacional e desenvolvimento do compromisso so-cial das instituições de ensino. Convém ressaltar que todo sistema de avalia-

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ção ou acreditação é um sistema eminentemente político , tanto do pontode vista de sua concepção, das suas conseqüências para o ensino e da sualegitimação social, quanto pelas exigências ético-profissionais (técnico-do-centes) para a sua assimilação pela equipe pedagógica e de administraçãoeducacional.

O componente político envolve a auto-avaliação crítico-reflexiva, social-mente contextualizada e com participação dos professores, alunos e funcio-nários administrativos. Essa auto-avaliação, por si só, já deve gerar proces-sos de desenvolvimento com protagonismo de todos os segmentos das insti-tuições de ensino; envolve, ainda, a avaliação externa exercida por paresque, mediante a escuta das demandas da sociedade e análise da auto-avalia-ção, examinam desempenhos e potencialidades. O componente técnico en-volve instrumentos qualitativos e quantitativos de apuração da realidade,como a coleta de dados e registros, uso de questionários e roteiros, realiza-ção de entrevistas e reuniões para produzir pareceres com sugestões e aqui-latar indicadores (relação candidatos/vagas, nº de ingressantes/nº deconcluintes, novos alunos/alunos totais, nº de professores/nº de alunos, eva-são, bolsas, vagas ociosas, qualificação docente, títulos em acervo bibliográ-fico e documental, obsolescência do acervo, tempo de permanência dos alu-nos etc.).

Na proposta francesa, que tem inspirado os grupos brasileiros, o Siste-ma de Acreditação Pedagógica se compõe de três instrumentos técnicos:Caderno de Encargos, Guia de Padrões e Manual de Certificação. Para finsdesta exposição, opto pela identificação do Caderno de Encargos como Ter-mo de Adesão – protocolo de compromissos entre acreditadores eacreditandos, do Guia Referencial como Padrão Referencial – guia para aação (não deve servir a comparações desvinculadas da realidade específicae nem funcionar como parâmetro absoluto de medida) e do Manual deCertificação como Atestado de Participação – sem conotação derankeamento da qualidade, mas atestando a participação, a adesão e o com-promisso processual com o Sistema (École Nationale de la Santé Publique,1999b).

Os três instrumentos podem ser definidos:– Termo de Adesão – Contrato de responsabilidades assumido para in-

gressar no Sistema de Acreditação. O contrato deve expressar a pactuaçãoentre as partes sobre o que, como e quando será passível de adequada ava-liação;

– Padrão Referencial – Estipulação de critérios de avaliação que abar-quem o dispositivo institucional, o público da formação, o processo de forma-ção e o controle da formação;

– Atestado de Participação – Emissão de uma espécie de atestado deque o centro formador ou curso avaliado responde aos padrões referenciadose cumpre o contratado no caderno de encargos, estando engajado no proces-so de melhoria da qualidade (Certificação).

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Equipe/recursos de ativação do processo no Brasil

Até este momento, o Projeto de Acreditação Pedagógica conta com osrecursos próprios das instituições envolvidas com a sua construção (2 GT eorganização dos Seminários Regionais): a Escola Nacional de Saúde Públi-ca/Brasil; Escolas de Saúde Pública dos Estados do Rio Grande do Sul, MatoGrosso do Sul e Minas Gerais; o Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva doCentro de Pesquisas Aggeu Magalhães da Fiocruz/PE e das UniversidadesFederais da Paraíba, Pernambuco e Maranhão; a Escola Superior de Ciên-cias da Santa Casa de Misericórdia de Vitória e o Instituto Estadual de SaúdePública do Espírito Santo/Centro de Formação em Saúde Coletiva.

Estabelecimento do processo de acreditação pedagógica

O processo de acreditação pedagógica, na medida em que se configuracomo uma política pública, não se dirige apenas para as instituições de edu-cação em saúde coletiva. Seu produto é de interesse público e seus resulta-dos disponibilizam à sociedade informação sobre a qualidade das instituiçõese cursos que se pretende freqüentar. A proposta brasileira, entretanto, até omomento, é a da adesão voluntária ao processo.

O estabelecimento do processo de acreditação até agora delineado en-volve:

– caráter voluntário do ingresso no Sistema de Acreditação: aacreditação não deve ser imposta, devendo ser solicitada por aqueles quedesejam ser acreditados;

– destinação exclusiva aos programas formativos no âmbito da educa-ção pós-graduada de lato sensu (predominantemente cursos de especializa-ção, podendo ser considerada para cursos de aperfeiçoamento, residência eaprimoramento profissional);

– incidência sobre programas de formação regulares: pelo fato de serprocessual, a acreditação deve priorizar programas regulares, sustentando-os em sua própria qualificação;

– não exclusão dos programas acreditados: a acreditação não deve clas-sificar excelências, não deve rejeitar inclusões e não deve servir à compara-ção entre experiências, mas servir apenas à experiência avaliada;

– a acreditação não deve preconizar avaliações subjetivas, seu proces-so deve prever, da parte postulante, o cumprimento de requisitos para ingres-sar no Projeto e preencher as exigências do Termo de Adesão e, da parte doacreditador, a utilização de um conjunto de critérios para o julgamento (Pa-drão Referencial).

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Características de qualidade

O perfil docente dos cursos de especialização é um aspecto importantee deve ser avaliado. O perfil pedagógico necessário aos cursos de especiali-zação é diferente daquele necessário aos cursos stricto sensu porque os alu-nos são originários do serviço (da rede) e retornarão ao serviço (à rede), nãose tratando de qualificação de pessoal para a docência acadêmica. Assim, aestrutura do curso/centro formador deve estar sustentada em um diálogo per-manente com a rede de gestão da política e assistência de saúde.

Os alunos precisam desenvolver competências para a gestão, planeja-mento e avaliação da política e da assistência em saúde, donde a necessida-de de um guia referencial com foco nas oportunidades de aprendizagens evivências teórico-reflexivas e não nas estruturas burocráticas ou formais ou asimples coerência interna de objetivos, planos e avaliações. Há que se consi-derar que a convocação ao pensamento e a oferta de vivências criativas dereflexão e alteridade se relacionam melhor com o desenvolvimento da capa-cidade inventiva e problematizadora. Do ponto de vista do conhecimento, nãoé na estrutura formal que encontramos a qualidade, mas nas suas opera-ções, interações, desafios e oportunidades.

A estrutura atual dos cursos precisa reduzir sua ênfase burocrática,flexibilizando-se com a política setorial da saúde entre as políticas públicas epertencendo à condução de políticas sociais junto com a população egestores de saúde representados nos Conselhos de Saúde do Sistema Únicode Saúde (SUS).

O processo de trabalho na gestão da formação deve compatibilizar or-ganização interna e avaliação externa (dos serviços e dos conselhos de saú-de).

São elementos previstos para o Padrão Referencial:– estrutura institucional;– coordenação;– projeto político-pedagógico;– programa;– recursos;– processo de auto-avaliação crítica;– pertinência ao SUS (o para que da instituição de educação em saúde

coletiva);– resultados.Além desses elementos, entende-se como documentos afins:– organização formal;– funcionamento efetivo;– parcerias e relações instituição de ensino – sociedade;– coordenação pedagógica;– relação e perfil do corpo docente fixo;– relação e perfil dos docentes convidados;

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– potencial pedagógico dos docentes;– meios pedagógicos;– logística geral;– acervo bibliográfico e de documentos;– referências teóricas e metodológicas;– progressão pedagógica;– inovação pedagógica;– métodos pedagógicos;– provas escritas;– monografias e memoriais dos alunos;– relações administrativas;– gestão dos processos de desenvolvimento dos alunos;– gestão dos processos de desenvolvimento dos professores;– gestão dos processos de desenvolvimento do pessoal auxiliar e admi-

nistrativo;– gestão do tempo de formação.

Acumulação de força política

Tratando-se a acreditação pedagógica de um sistema avaliativoinstitucional e de acompanhamento para o desenvolvimento e melhoria daqualidade educativa, com características de política pública e inserido naconstrução da gestão em saúde, entende-se como necessária a suacredibilidade junto aos órgãos de condução do setor da educação e do setorda saúde. De um lado, a legitimidade como processo capaz de avaliar e con-tribuir com a educação superior; de outro, a legitimidade do fortalecimento doSUS.

Até o momento, delineou-se um roteiro de reuniões com a Coordenaçãode Projetos Especiais da Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento doPessoal de Educação Superior (Capes) do Ministério da Educação (MEC),órgão responsável pela avaliação e certificação dos Programas de Pós-Gra-duação no Brasil e reunião com a Coordenação Geral de Desenvolvimento deRecursos Humanos do Ministério da Saúde (MS), órgão responsável pelapolítica de formação de pessoal para o Sistema Único de Saúde no Brasil.

Também foi delineada uma reunião com a Coordenação de Desenvolvi-mento de Novas Práticas do Departamento de Atenção Básica à Saúde doMS, órgão responsável pela capacitação e educação permanente de pessoalde saúde para a melhoria do modelo assistencial de saúde no Brasil, com aCoordenação de Desenvolvimento de Recursos Humanos da RepresentaçãoBrasileira da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/Brasil) e com aCoordenação do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior da Se-cretaria de Ensino Superior (SESu) do MEC.

Optou-se pelo informe às Câmaras Técnicas de Recursos Humanos ede Planejamento e Gestão do Conselho Nacional de Secretários de Estado

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da Saúde (Conass), órgão de articulação da política setorial na esfera estadu-al do Sistema Único de Saúde no Brasil.

Conclusões

Ferreira et al. (2000, p. 81), ao examinarem as tendências da educaçãoem saúde pública na região latino-americana e caribenha, destacam umaespecificidade da contemporaneidade do ensino neste setor: o vínculo aca-demia-serviços de saúde. Os autores ressaltam que, para as estruturas maistradicionais, a integração ensino-serviço se limita(va) ao proveito da docênciaou exclusivamente aos interesses do ensino. Essa integração passa, com areforma sanitária, por uma infinidade de variações justificadas por demandaspróprias dos serviços ou das instituições de ensino. Com a descentralizaçãoda gestão e a ampliação da participação social, as instituições de ensino pas-sam a ser demandadas por programas educativos que se dão em função dasiniciativas de promoção da saúde, ação política e formação de opinião naprópria população. Um sistema de acreditação pedagógica em saúde coleti-va, formulado no seio da reforma sanitária, terá o seu principal papel político-pedagógico na pertinência ao projeto de reforma, à descentralização da ges-tão, ao fortalecimento do controle da sociedade sobre o setor da saúde, àação técnica e política de efetiva implantação de um sistema de saúde derelevância pública e capaz de atenção integral à saúde. Pertinência e qualida-de (re)configuram a avaliação institucional de melhoria da qualidade didático-pedagógica, de melhoria da capacidade de gestão e de transparência públicapara usuários e sociedade sobre os produtos e desempenhos em ensino,pesquisa, extensão e documentação em saúde coletiva no âmbito da institui-ção acreditada.

Gemmel et al. (2000), ao cotejarem as implicações das reformassetoriais e as funções essenciais da saúde pública na sua educação, mencio-nam um conjunto de desafios, dentre eles a atitude ativa das Escolas de Saú-de Pública em protagonizar o processo de mudança relativo aos recursoshumanos do setor da saúde (em reforma), principalmente, formando/com-pondo quadros condutores das mudanças e lideranças das organizações desaúde. Além da formação de gerentes de serviços e/ou gestores de sistemasde saúde, as Escolas de Saúde Pública devem desenvolver programasformativos que apontem a conquista de novos conhecimentos, atitudes e ha-bilidades relativas à melhor consecução de uma saúde pública modificada/ampliada/renovada.

Buss et al. (2000, p. 119-125) sumarizam as estratégias de desenvolvi-mento das Escolas de Saúde Pública. As estratégias que podem permitir umamelhor inserção das Escolas de Saúde Pública no cenário de mudanças emsaúde são:

– capacidade de articulação política – inserção das escolas nas deci-sões em saúde;

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– capacidade pedagógica e docente – preparação para a gestão e degestores em saúde;

– capacidade de pesquisa e desenvolvimento de tecnologias – geraçãoe disseminação de conhecimento;

– capacidade de desenvolver a cooperação técnica – tecer redescolaborativas para objetivos comuns, ampliando parcerias e pactuações pelaeducação;

– capacidade de gestão das escolas de saúde pública – desenvolvimen-to organizacional da instituição de ensino, com ampliação da autonomia didá-tica e administrativa.

O processo de acreditação pedagógica em saúde coletiva deve ser pro-cesso componente da gestão da mesma: um processo socialmente organiza-do e promovido por instituições com legitimidade e credibilidade técnica epolítica no campo da ciência e gestão em saúde coletiva. Os instrumentos daacreditação pedagógica devem ser construídos e legitimados socialmente,estando sempre sob reavaliação e revisão. A acreditação, por ser um proces-so contínuo, não pretende apreciações de caráter finalístico, por issoacreditandos e acreditadores estarão em auto-avaliação e avaliação externaa cada ação de exercício da condução de seu processo.

Acreditación pedagógica en la educación en salud colectiva

Resumen: El artículo transpone una exposición verbal realizada en la XIX Con-ferencia de la Asociación Latinoamericana y del Caribe de Educación en Salud Pú-blica, realizada en La Habana, Cuba, en julio del año de 2000. La exposiciónpresentaba una propuesta de sistema de acompañamiento y evaluación de la calidadde la educación llevada a cabo por las instituciones de enseñanza en salud colectivay su importancia en los países en proceso de reforma sanitaria. Se trata de laaceptación de la necesidad de expansión de la educación en salud colectiva para elámbito del postgrado de lato sensu, pero reconociendo los riesgos de la falta deacompañamiento de la calidad y la necesidad de interponer un sistema de confianzade la sociedad que funcione como una política pública de crecimiento, mejoría de lacalidad y compromiso social de la formación en salud colectiva para laimplementación del Sistema Único de Saúde en Brasil.

Palabras Clave: Evaluación institucional; Acreditación Pedagógica; Educaciónen salud pública; Salud colectiva.

Pedagogic Believing in the education in collective health

Abstract: The article transposes a verbal exhibition held during the XIXConference of the Latin-American and the Caribbean Association of Education inPublic Health, in Havana, Cuba, in July 2000. The talk presented a proposal of asystem of assistance and evaluation of the quality of the education by the teachinginstitutions in collective health and its importance in the countries going through the

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Acreditação pedagógica na educação em saúde coletiva

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 95

process of a sanitary reform. It is about the acceptance of the need of an expansionof the education in collective health to the extent of the masters degree of latu sensu,but recognizing the risks of the lack of assistance of the quality and the need ofinterposing a system of trust of the society that works as public politics of growth,improvement of the quality and social commitment with the formation in collectivehealth for the implementation of the Sistema Único de Saúde in Brazil.

Key-words: Institutional evaluation; Pedagogic believing; Education incollective health; Public health.

Referências

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Ricardo Burg Ceccim

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ANEXO 1 – Centros Formadores em Saúde Coletiva no Brasil

a) Escolas de Saúde Pública vinculadas aos sistemas de serviço (09):– Estado do Ceará (ESP/CE);– Estado do Espírito Santo: Instituto Estadual de Saúde Pública/Centro de

Formação em Saúde Coletiva (IESP – SES/RS);– Estado do Mato Grosso do Sul (ESP Dr. Jorge David Nasser/MS);– Estado do Mato Grosso (ESP/MT);– Estado de Minas Gerais (ESP/MG, ex-Esmig);– Estado de Pernambuco (ESP/PE);– Estado do Paraná (ESP/PR);– Estado do Rio Grande do Sul (ESP/RS);– Ministério da Saúde/Fundação Oswaldo Cruz (Escola Nacional de Saúde

Pública/Br).b) Núcleos de Estudos em Saúde Coletiva / Saúde Pública/Saúde Coleti-

va e Nutrição / Interdisciplinar de Pesquisa em Saúde Coletiva (Nesc /Nesco / Nesp / Nipesc) (14):

– Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães – Fiocruz – Recife/PE;– Fundação Federal Universidade do Amazonas;– Universidade Estadual de Londrina/PR;– Universidade Estadual de Maringá/PR;– Universidade Estadual de Ponta Grossa/PR;– Universidade Federal da Paraíba;– Universidade Federal de Minas Gerais;– Universidade Federal do Ceará;– Universidade Federal do Espírito Santo;– Universidade Federal do Paraná;– Universidade Federal do Piauí;– Universidade Federal do Rio Grande do Norte;– Universidade Federal do Rio Grande do Sul;– Universidade Nacional de Brasília.c) Instituto de Medicina Social / Saúde Coletiva / Faculdade de Saúde

Pública (IMS / ISC / FSP) (03):– Universidade Estadual de São Paulo;– Universidade Estadual do Rio de Janeiro;– Universidade Federal da Bahia.d) Departamentos de Medicina Preventiva e Social / Saúde Pública / Saú-

de Coletiva / Medicina Social (10)– Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória;– Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.– Universidade Estadual de Campinas;– Universidade Estadual de São Paulo/Ribeirão Preto;– Universidade Estadual de São Paulo;– Universidade Federal de Pelotas;

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Acreditação pedagógica na educação em saúde coletiva

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– Universidade Federal de Santa Catarina;– Universidade Federal de São Paulo;– Universidade Federal do Maranhão;– Universidade Federal do Rio Grande do Sul.e) Outros (02)– Programa de Desenvolvimento Gerencial de Sistemas e Serviços de Saú-

de / Escola de Administração / Ufrgs;– Programa de Estudos Avançados em Administração Hospitalar e de Siste-

mas de Saúde / Escola de Administração / FGV.

ANEXO 2 – Instituições e Programas Brasileiros Filiados à Alaesp

– Faculdade de Saúde Pública da Universidade Estadual de São Paulo;– Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Uni-

versidade Estadual de São Paulo;– Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina de Ribeirão

Preto da Universidade Estadual de São Paulo;– Departamento de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa

Catarina;– Escola de Saúde Pública da Secretaria da Saúde do Estado do Rio Grande

do Sul;– Escola de Saúde Pública Dr. Jorge David Nasser da Secretaria da Saúde

do Estado do Mato Grosso do Sul;– Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz do Ministé-

rio da Saúde;– Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro;– Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia;– Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva e Nutrição da Faculdade de Medici-

na da Universidade Federal de Minas Gerais;– Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva do Centro de Pesquisas Aggeu

Magalhães da Fiocruz/PE.

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Atenção montadora página 98 é branca

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Um centro de informação e documentação em saúde pública/saúde coletiva: compromissos ...

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Um centro de informação edocumentação em saúde pública/saúdecoletiva: compromissos, interfaces eperspectivas possíveis e a estante dautopia – Parte I 1

Ruth Sant’Helena da Silva2

“Separada da prática, a teoria é puro verbalismo inoperante;desvinculada da teoria, a prática é ativismo cego” (Freire, 1978. p. 135).

Resumo: É feita uma análise da situação da Biblioteca da Escola de SaúdePública – ESP/RS, no início da atual gestão. Princípios teóricos e técnico-políticosorientaram ações de gerenciamento dos recursos informacionais no setor, resultan-do na apresentação do projeto de Centro de Informação e Documentação em Saúde– Ceids. A concepção do Ceids se materializa, paulatinamente, mediante aexplicitação de compromissos, interfaces e perspectivas, constituíndo-se no cons-tante trabalho de controle e disseminação de informação documental em saúde. Ascategorias conceituais e referenciais, base dos acervos construídos ao longo dotempo, geram viabilidades de compartilhamento, qualificação profissional, estudo,pesquisa, extensão e educação continuada na ESP/RS e na Secreataria da Saúde/SES-RS. Nossa expectativa é fomentar a discussão sobre o papel da informação emsaúde no processo de formação e na aspiração de que o uso da informação sejaincorporado cotidiana e permanentemente como insumo ao conhecimento e à inter-venção nas ações de saúde, indispensável no ciclo de construção coletiva do co-nhecimento em saúde. Trata-se de um artigo-documentário com o papel de dar his-tória e visibilidade a um processo institucional relevante e comprometido com a saú-de coletiva.

Palavras-Chave: Informação em saúde; Memória institucional; Escola de Saú-de Pública/RS; Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul; Documentação.

1 O assunto será apresentado em 2 partes: Parte I - ações desenvolvidas no biênio 1999-2000;Parte II – ações que abrangeram 2001 – 2002.2 Sanitarista, Bibliotecária/Documentalista, com Especialização em Administração de Siste-mas de Bibliotecas. Coordenadora do Centro de Informação e Documentação em Saúde –CEIDS, ESP/RS. E-mail: [email protected].

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Introdução

A atuação profissional no âmbito da informação bibliográfica e docu-mental em saúde pública e saúde coletiva3, além do desafio ao conhecimentoe aplicação, de forma crítica, das modernas tecnologias da informação, emconstante evolução e aperfeiçoamento, favorecem e instigam a uma perma-nente reflexão e busca de sentido transcendente às práticas técnico-instru-mentais cotidianas das ações de gerenciamento dos estoques de informa-ção.

O desenvolvimento das tecnologias da informação, principalmente apartir da Segunda Guerra Mundial, tornou-se compulsivo pela constataçãodo problema conhecido como “explosão informacional”, que significa o cres-cimento exponencial da informação e seus registros. O fenômeno, impulsio-nado pela necessidade de construir e manter as dianteiras tecnológicas, oconseqüente poder político-econômico e a hegemonia entre países, intensifi-cou-se ao longo do tempo, firmando a necessidade de um trabalho extraordi-nário para construir mecanismos de controle e acessibilidade a um acervocrescente de informação e conhecimento, especialmente científico-tecnológico.

O aparato crescente das tecnologias da informação trouxe conseqüên-cias abrangentes e transformadoras nas sociedades modernas, surgindo ex-pressões como era da informação e sociedade da informação. Isto porque secriou um consenso sobre a centralidade da informação como pressupostopara a base dos sistemas produtivos, especialmente relacionado ao seu valorde uso pragmático-instrumental e econômico, mas também extrapolando oslimites da questão tecnológica, para novas formas de inserção dos sujeitoshumanos em seus espaços sociais. A informação afirmou um status de ins-trumento de construção de processos de ação para a democracia, a cidada-nia e o desenvolvimento humano, com profunda e progressiva alteração nasformas de conhecer, interagir, compartilhar e disseminar e nas formas deconstruir o conhecimento.

Tamanha importância confluiu para uma rica e desafiadora reflexão so-bre este insumo multifacetado e incitante, a matéria-prima do trabalho desen-volvido no âmbito da chamada Ciência da Informação que, embora sem defi-nição precisa, tem aprofundado conceitos teóricos, alguns bastante comple-xos, construídos especialmente nas áreas da Biblioteconomia e Documenta-ção, Arquivologia, Museologia e Informática.

3 O uso das expressões “saúde pública” e “saúde coletiva”contextualiza-se no estudo e análiserealizados por autores como Almeida Filho e Paim (1999), considerando-se “saúde pública”em sua perspectiva histórica e “saúde coletiva” como um novo “paradigma”, redefinindo asbases conceituais da epidemiologia e incorporando as ciências sociais ao debate, que seapresentam na forma de um movimento de transformação social da saúde, especialmente emprocesso na América Latina.

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A tentativa de compreender as questões sobre a informação em saúde eas metodologias para seu controle e difusão têm orientado a ação prática e aproposta técnico-política para a idealização de um serviço de informação bi-bliográfica e documental em construção na Escola de Saúde Pública (ESP/RS), com abrangência de alcance na Secretaria da Saúde do Estado do RioGrande do Sul (SES/RS), notadamente, a implantação do projeto do Centrode Informação e Documentação em Saúde – Ceids. O artigo aqui apresenta-do configura-se um artigo-documentário e cumpre seu papel de informar edocumentar um processo histórico.

Considerando a contribuição teórico-referencial, o contexto institucionale a perspectiva do trabalho que se realiza, o gerenciamento da informaçãobibliográfica e documental em saúde ultrapassa a rotina da aplicação dastécnicas e metodologias de controle usuais da prática profissional na área daDocumentação. Transcende o imobilismo dos depósitos de documentos (ne-cessariamente organizados de forma sistemática e técnica) para se fixar nadinâmica do fenômeno/processo da informação como produto humanocognitivo, contextualizado histórica e socialmente. Mediante elementos con-siderados fundamentais da informação – diálogo, linguagem e grupo – ge-ram-se consensos sobre conteúdos, significados, viabilidades para a disse-minação e construção de laços sociais e referenciais. Este compromissoético-político do Ceids define a busca de intercâmbios, compartilhamento,maximização do uso da informação de melhor qualidade e adequação emsaúde coletiva, procurando fazer sentido nos contextos de vida e ação paraos seus diferentes públicos.

Um pouco da história

A Biblioteca da ESP/RS foi criada em 1972, inicialmente constituída peloacervo remanescente da Biblioteca do Departamento Estadual de Saúde.

Ao longo do tempo, prestou inestimável serviço de organização, manu-tenção e disseminação da informação bibliográfica em saúde pública e saúdecoletiva, oferecendo suporte teórico-referencial aos diferentes cursos realiza-dos pela ESP/RS. Seu público preferencial foi/é composto pelo corpo docen-te/discente da Escola e pelos profissionais da SES/RS. De forma ampliada,pode-se arrolar:

Público Interno:• corpo funcional da SES/RS;• corpo docente/discente/pesquisadores da ESP/RS (Cursos e Progra-

mas de Residência);• gestores estaduais de serviços, regiões sanitárias, políticas públicas;• Centro de Saúde-Escola Murialdo;• pesquisadores da SES/RS.Público Externo:• gestores municipais;

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• conselheiros de saúde (conselhos estadual e municipais);• profissionais de saúde (especialmente quando se realizam concursos

públicos na área);• demandas de outras unidades de informação (bibliotecas da área das

ciências da saúde);• alunos do ensino médio em profissionalização e superior das institui-

ções de ensino do estado;• pesquisadores da saúde coletiva;• população em geral interessada em informação, divulgação e educa-

ção em saúde.Regimentalmente, a Biblioteca da ESP/RS sempre teve a missão de

atender às necessidades de informação bibliográfica em saúde pública, noâmbito da Secretaria de Estado da Saúde, sendo também instância de depó-sito legal de toda a produção intelectual da mesma.

Em janeiro de 1999, quando assumiu a atual direção da ESP/RS, a Bi-blioteca apresentava uma série de problemas estruturais, como:

• inexistência de acessos às modernas tecnologias de informação e co-municação (apenas uma linha telefônica de uso geral da ESP/RS permitia oacesso discado à Internet e um único computador de uso gerencial, portanto,a Biblioteca estava autocontida em sua capacidade de atendimento einteração);

• precariedade absoluta de equipamentos de informática;• inadequação do programa de gerenciamento da informação documen-

tal (o uso do Sistema de Informação Bibliográfica – SIB, gerenciado pela Com-panhia de Processamento de Dados do Estado do Rio Grande do Sul(Procergs), era alimentado pela indexação de um só tipo de material biblio-gráfico – o livro, sabidamente de difícil aquisição, considerando-se seu cará-ter de material permanente, inviabilizando o acesso e a disseminação da in-formação em saúde, veiculada em outros tipos de documentos, como os pe-riódicos, por exemplo);

• espaço físico no limite da possibilidade de ampliação de recursosinformacionais e da prestação de serviços de qualidade;

• falta de trabalhadores especializados e presença incompatível com obom desempenho do setor (uma bibliotecária com pedido de remoção forma-lizado, um auxiliar de biblioteca preparado precariamente para o trabalho euma vaga de estagiária de Biblioteconomia em transição para outro local deestágio);

• coleções bibliográficas necessitando recomposição e atualização.

A análise detalhada da situação geral permitiu algumas constatações:

1º) a falta de equipamentos adequados inviabilizava a participação daBiblioteca nos seguintes sistemas cooperativos:

• Sistema Brasileiro de Comutação Bibliográfica (Comut);

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• Catálogo Coletivo Nacional de Publicações Periódicas (CCN);• Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da

Saúde (Bireme), sistema ao qual a Biblioteca integrava como Unidade Parti-cipante.

Em todos estes sistemas cooperativos, em outros períodos, a Bibliotecaestivera integrada.

Além do isolamento, representado pela perda dos principais acessos decompartilhamento e recuperação de estoques de informação em saúde exis-tentes, a situação retirava, na época, a possibilidade de apresentação de pro-jetos de melhoria às agências de fomento, considerando-se que a participa-ção em sistemas cooperativos é pré-requisito eliminatório na avaliação eaprovação deste tipo de projeto.

2º) A situação do acervo de livros, a partir de um estudo deobsolescência da coleção, está indicada no quadro abaixo:

Quadro 1 – Situação do acervo

Data de Publicação Quantidade de Registros %Anterior a década de 60 127 2,22Década de 60 211 3,70Década de 70 1761 30,85Década de 80 2265 39,70Década de 90 até 03/99 1343 23,53Total 5707 100,00

Fonte: Fichário de Registros da Biblioteca da ESP/RS

Ressalte-se que, na área da saúde pública/saúde coletiva, a atualizaçãodo acervo tem uma evolução diferenciada, considerando o critério de inova-ção, tomado como crítico na maioria das ciências da saúde. Em saúde públi-ca/saúde coletiva, vale o valor do conteúdo da informação, sua evolução his-tórica e aplicabilidade, conferido mediante parâmetros diversos, comopertinência, criticidade e vanguardas4. De outra parte, as ciências da saúdesão bem estruturadas em seus sistemas de informação documental. A produ-ção na área é intensa e bem organizada, do ponto de vista de acesso, circula-ção e editoração.

Verificou-se que o último processo de aquisição de livros ocorreu em1996 e, que dos 237 títulos arrolados, 117 (49,37%) foram doações anexa-das ao acervo.

4 O acervo especializado em saúde pública/saúde coletiva, além das ciências da saúde, incor-pora a área das ciências sociais e humanidades, como epistemologia, meio ambiente, antro-pologia, sociologia, história, educação etc.

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3º) a análise da coleção de títulos de periódicos revelou a seguinte situa-ção:

total de títulos: 316formas de aquisição: doações – 82,6%

permutas – 6,4%assinaturas – 12%

total de títulos assinados: 38

Quadro 2 – Assinaturas de periódicos

Período Assinaturas mantidas % Assinaturas canceladas %Década de 70 38 100,00 0 0Década de 80 33 86,85 5 13,15Década de 90 5 13,15 33 86,85

Fonte: Fichário de Registro de periódicos da ESP

No mesmo expediente indicado para compra de livros, em 1996, haviasolicitação de assinatura de 29 títulos de periódicos nacionais e internacio-nais. Não houve atendimento do pedido.

O contexto relatado serviu de estímulo e desafio à concepção da pro-posta inovadora do Ceids, especialmente respaldada na afirmação da ESP/RS como um centro de formação e desenvolvimento na área da saúde paraatuação no Sistema Único de Saúde (SUS). Acreditou-se na perspectiva dereversão do quadro setorial, tendo como ação motivadora, além do apoio danova gestão, o compromisso profissional com a socialização e democratiza-ção da informação, do saber e do conhecimento em saúde pública/saúdecoletiva.

O Projeto Ceids- ESP/RS

Como expressão da política pública de saúde, a atual gestão da SES/RSconstituiu a ESP/RS como o órgão responsável pela política de educação noSUS necessária para o desempenho dos trabalhadores que nele atuam. Odesenvolvimento técnico-científico e político da saúde coletiva, em execuçãona SES/RS, expressa a consonância com os princípios e diretrizes consagra-dos pela Lei que regulamenta o SUS.

A implantação do projeto de Centro de Informação e Documentação emSaúde, tendo como embrião a Biblioteca da ESP/RS, apresenta-se como umacontribuição ao esforço de melhoria das condições de ensino e pesquisa naEscola, por meio da facilitação do acesso universal e democrático à informa-ção em saúde. Na concepção do Projeto Ceids, para fins de controle docu-

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mental, informação em saúde, conceitua-se como todo o conteúdo (dados,fatos, textos, artefatos, sons e imagens) organizado para comunicação emqualquer formato e por meio de qualquer canal ou suporte físico (Vieira, 1999,p. 72). Consideramos que a informação em saúde pública/saúde coletiva éconsiderada como um bem de características singulares, insumo interativo,dinâmico, multifacetado, agente catalisador para ações potencialmentetransformadoras das estruturas cognitivas individuais e coletivas, de elevadarelevância social, de inerente vocação à mais ampla difusão, apropriação eutilização pela sociedade.

O Ceids assume a responsabilidade de gerenciamento dos recursosinformacionais e documentais em saúde pública/saúde coletiva, a partir dosseguintes campos de atuação:

a) informação técnico-científica – contempla a formação, manutenção edesenvolvimento de coleções de interesse, a organização, o armazenamentoe a disseminação destes estoques de informação existentes ou sendo cons-tituídos para a disponibilização ao acesso universal, independente de origemgeográfica;

b) memória institucional da Saúde Pública no âmbito da SES/RS – apartir do inventário técnico-histórico-administrativo das instituições de basena saúde pública estatal e estadual, contempla a organização de acervos(textuais, iconográficos, de memória oral e de artefatos tridimensionais) parapreservação, restauração, divulgação, exposição, pesquisa e desenvolvimen-to científico e/ou tecnológico;

c) fomento à análise, estímulo ao debate e à discussão dos indicadoresnuméricos gerados pelos Sistemas de Informação em Saúde, tendo em vistao trabalho da Rede Nacional de Informações em Saúde (RNIS) e da RedeGaúcha de Informações em Saúde (RGIS) – contempla as interfaces com ainformação bibliográfica e documental em saúde pública/saúde coletiva, deespectro conceitual abrangente, tendo em vista as necessidades de suporteao controle social, aos processos decisórios, às projeções socio-sanitárias eao planejamento estratégico em saúde;

d) promoção, divulgação e educação em saúde – contempla a reunião eorganização de materiais caracterizados como multimeios (discos compac-tos, vídeos, fôlderes, cartazes, fitas-cassete etc.). Na esfera da educaçãopopular em saúde, projeta-se a criação de um Centro de Referência de Edu-cação Popular em Saúde, que buscará construir um acervo de documentosoriundos dos movimentos sociais (cartilhas, textos, vídeos, relatos de experi-ências, manuais etc.), colocando-os à disposição para compartilhamento epesquisa e, também, como espaço de fomento à discussão do conhecimentotécnico-científico/saber popular em saúde;

e) serviços editoriais – contempla a normalização de trabalhos técnico-científicos, catalogação na fonte, elaboração/revisão de referências e cita-ções bibliográficas, acesso às bases de dados on line e em CD-ROM, comu-tação bibliográfica e incentivo à produção editorial.

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A definição destes campos de atuação, alguns de caráter inovador, sina-liza a diferença entre a Biblioteca da ESP/RS, especializada em saúde públi-ca/saúde coletiva, com prestação de serviços reconhecidos desde 1972 esua evolução para um Centro de Informação e Documentação, idealizado naexpectativa de transformar e modernizar processos técnicos, produção,gerenciamento, apropriação e uso do conhecimento em saúde pública/saúdecoletiva, de forma integrada e interativa.

São novas atribuições ao Ceids:a) manutenção da oferta de suporte técnico-teórico-referencial perma-

nente ao ensino, pesquisa, extensão educativa e documentação em saúdepública/saúde coletiva no âmbito da ESP/RS;

b) reunião, manutenção, desenvolvimento e gerenciamento de acervosorganizados e armazenados em formato eletrônico dos diferentes tipos dedocumentos existentes ou a serem adquiridos pela ESP/RS;

c) disponibilização pública, por intermédio de tecnologias de acesso ecomunicação universal de rápida e eficiente recuperação na Internet, às de-mandas de informação em saúde pública/saúde coletiva;

d) formulação e proposição de diretrizes para as ações decorrentes dogerenciamento dos recursos documentais, especificamente, de cada um dosprocessos, princípios e atribuições indicados ou emergentes na esfera decompetência da Documentação em Saúde;

e) contribuição ao fomento, incremento e instrumentalização da produ-ção e disseminação do conhecimento gerado em saúde pública/saúde coleti-va no âmbito da ESP/RS;

f) contribuição à promoção, análise, processamento técnico e dissemi-nação de informação em saúde pública/saúde coletiva, favorecendo o estí-mulo à reflexão contínua sobre o saber técnico-científico e também sobre osaber constituído pelo senso comum, cultura e educação popular nesta área;

g) estabelecimento de uma política de sensibilização quanto à preserva-ção e recuperação da memória e da história institucional no âmbito daSES/RS.

Implementação

Melhorias significativas à prestação de serviços da Biblioteca naESP/RS, em direção à consolidação do Ceids, vêm, paulatinamente, sendoconquistadas:

1) Espaço físicoHouve a ampliação do espaço físico do Ceids, com o acréscimo

emergencial de aproximadamente 30m² e foi estruturado um pré-projetoarquitetônico para a construção de prédio próprio, segundo critérios técnicos

5 O pré-projeto arquitetônico foi elaborado pelo Serviço de Arquitetura e Engenharia da SES/RS, sob responsabilidade técnica do arquiteto Ednezer R. Flores.

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Um centro de informação e documentação em saúde pública/saúde coletiva: compromissos ...

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e condições pertinentes à prestação de serviços de qualidade5.Projetou-se espaço para um novo auditório e o Ceids (biblioteca,

multimeios, memória institucional, espaço de exposições, sala de estudo emgrupo, cabines para estudo individual etc.). A edificação, com tipologia emmonobloco, consistirá em três pavimentos, utilizando serviços de infra-estru-tura do complexo existente ao qual irá integrar-se, com as devidas adequa-ções e redimensionamento.

2) Desenvolvimento da coleçãoDe 1999 a dezembro de 2000 foram incorporados ao acervo 621 títulos

de livros, 848 folhetos e houve o acréscimo de 55 novos títulos de periódicos.

3) Incremento da força de trabalhoA partir do ano de 2000, foram nomeados três bibliotecários

concursados e um auxiliar de biblioteca. Do quadro funcional, foram designa-dos mais dois auxiliares de biblioteca e as vagas para estagiários ampliaram-se de uma para quatro, sendo três de Biblioteconomia e uma de História. Foinomeada de forma especial, enquanto aguardamos por concurso, uma histo-riadora e museóloga que desenvolve atividades de recuperação da memóriae da história institucional no Ceids.

4) Melhoria de infra-estruturaEm 1999, a biblioteca da ESP/RS foi encontrada com 1(um)

microcomputador 486, com acesso discado à Internet (inútil peladesatualização programática, dificuldade no acesso e manutenção de cone-xão e inviabilidade de expansão) e uma impressora matricial. Foram adquiri-dos 2 (dois) microcomputadores Pentium e 1 (uma) impressora jato de tinta.

Ações estratégicas e serviços inovadores

Além das melhorias referidas, estabeleceram-se ações de integração,consideradas estratégicas para o desenvolvimento do Ceids, bem como ser-viços inovadores, tendo em vista seu alcance e desdobramentos, ultrapas-sando os limites da prestação de serviços usualmente realizados em Bibliote-cas como:

1) Recuperação da memória e da história institucionalUma das iniciativas desencadeadas logo ao início da atual gestão da

ESP/RS diz respeito à recuperação da memória e da história institucional daSES/RS. Esta responsabilidade sempre esteve presente nos dos regimentosinternos da Secretaria.

Em março de 1999, houve uma primeira reunião com os coordenadoresou representantes do Hospital Colônia Itapuã, Hospital Sanatório Partenon,Hospital Psiquiátrico São Pedro, Coordenação de Atenção Integral em Saúde– Cais, ESP/RS e Ceids para apresentação da nova proposta de trabalho,

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discussão e manifestação de adesão ao projeto.Com a integração de uma historiadora ao Ceids, iniciou-se um trabalho

sistemático de recuperação da memória da SES-RS. Esta tarefa deveria co-meçar pela ESP/RS. Contudo, por fatores circunstanciais e pela situação deprecariedade em que se encontrava a documentação histórico-administrativado Hospital Colônia Itapuã – HCI, a prioridade foi deslocada. O trabalho de-senvolveu-se pela higienização e reconhecimento da documentação do HCI,sendo a historiadora auxiliada por uma estagiária do Ceids. Assim, surgia oembrião do núcleo de trabalho que hoje desenvolve a história e documenta-ção naquele hospital.

A ação de Recuperação da Memória e da História Institucional, funda-menta-se em algumas premissas básicas:

a) o conceito de documento inclui qualquer tipo de suporte físico utiliza-do para registro ou manifestação da informação;

b) a memória institucional, por meio da documentação existente, porapresentar-se fragmentada e dispersa, necessita de um tratamento sistema-tizado e cientificamente orientado.

A recuperação da memória e da história institucional abrange o estabe-lecimento de uma política de sensibilização para a questão de sua preserva-ção e a recomposição do que for possível do passado, mediante uma pesqui-sa histórica de fontes textuais, iconográficas, de memória oral e dos artefatostridimensionais, isto é, do que se puder reunir, recuperar, organizar econtextualizar para preservação.

O processo pressupõe, por meio do conhecimento deste patrimônio his-tórico, a fixação da identidade temporal, o estímulo à pesquisa e à reflexãopara uma melhor compreensão dos caminhos percorridos e às viabilidadesdo presente e finalmente, o estabelecimento de uma política degerenciamento, registro e tratamento das informações em saúde produzidashoje, com a consciência da necessidade de preservação e conservação da-quilo que vai possibilitar a reconstrução da história no futuro.

O trabalho inclui o inventário da documentação e a organização de acer-vos para a divulgação em espaços institucionais, bem como o acesso virtualem bases de dados digitalizadas.

Em 23 de junho de 2000, no Gabinete da SES/RS e com a presença daSecretária de Estado da Saúde, realizou-se uma reunião, solicitada pela ESP/RS, para apresentação do Projeto Ceids e a sua proposta para estabeleci-mento de uma política de gerenciamento da documentação, incluindo-se,além da documentação técnico-científica, a técnico-administrativa. Estiverampresentes representantes da Escola de Saúde Pública/RS, Hospital ColôniaItapuã, Hospital Psiquiátrico São Pedro, Hospital Sanatório Partenon, CentroSaúde-Escola Murialdo e Gabinete da Secretária.

Por definição da Secretária, incluiu-se, também, a Fundação Estadualde Produção e Pesquisa em Saúde (Fepps), considerando-se sua significa-ção no contexto histórico –institucional, porquanto, agrega o Laboratório Cen-

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tral de Saúde Pública (Lacen), antigo Instituto de Pesquisas Biológicas (IPB),a Unidade de Produção de medicamentos, antigo Laboratório Farmacêuticodo Estado do Rio Grande do Sul (Lafergs), o Centro de InformaçõesToxicológicas (CIT) e o Hemocentro (Hemorgs).

Reafirmada a ação técnico-política de resgate da memória e da históriaproposta pelo Ceids-ESP/RS, na forma descentralizada, mediante adesão decada uma das instituições nomeadas, iniciaram-se trabalhos neste sentido,de acordo com deliberações, capacidades operacionais e técnicas, tipo deacervo e necessidades conjunturais. Ao grupo de profissionais atuantes cha-mou-se Equipe Ampliada, composta por profissionais de Biblioteconomia eDocumentação, História, Museologia, Arquivologia ou com alguma experiên-cia na área. Os trabalhos realizados incluem o recolhimento, higienização epreservação de documentos, o registro de memória oral, entrevistas e obten-ção do relato de experiências gerenciais, entre outros. Definiu-se espaçosinstitucionais específicos para exposições e para a guarda da documentaçãoreunida.

A Equipe Ampliada realizou inúmeras reuniões em 2000 para discutirconceitos aproximadores nas diferentes áreas, informar sobre o andamentodos trabalhos, buscar apoio institucional para as ações ou construirpactuações para a integração de linhas de atuação e políticas.

2) Integração do Ceids à Rede Nacional de Informações em Saúde –RNIS e Rede Gaúcha de Informações em Saúde – RGIS.

Esse processo ocorre pela introdução e gerenciamento do componenteinformação bibliográfica e documental na Rede Gaúcha de Informações emSaúde – RGIS, que disponibilizará comunicação com 100% dos municípiosgaúchos via Internet. O Ceids faz o controle e a disseminação da informaçãoem saúde coletiva, especialmente nas áreas definidas como de relevânciaepidemiológica, além do apoiar e estimular o registro de experiências munici-pais de gestão em saúde mediante a interação com os Núcleos Regionais deEducação em Saúde Coletiva (Nuresc), criados pela ESP/RS nas 19 regiõessanitárias da SES/RS.

3) Pesquisa sobre os trabalhadores da SES/RS6

Na intenção de estabelecer um serviço de Disseminação Seletiva daInformação – DSI, foi proposta uma pesquisa junto aos trabalhadores da SES/RS.

A DSI consiste em identificar e fornecer informação seletiva a públicosespecíficos por meio de notificações pessoais ou a grupos, de acordo com osperfis de interesse dos usuários previamente definidos.

6 A pesquisa sobre a força de trabalho da SES/RS faz parte do projeto de desenvolvimentoaprovado pela Fapergs em dezembro 2000: Educação em Saúde Coletiva: melhoria da infra-estrutura para estudo, ensino e pesquisa na Escola de Saúde Pública da Secretaria da Saúde– SES/RS. A parte II do presente artigo-documentário apresentará os resultados e as conclu-sões do trabalho.

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A pesquisa acabou tendo um alcance maior e iniciou-se em agosto de2000 com os seguintes objetivos:

• realizar um levantamento exaustivo do perfil da força de trabalho daSES/RS no sentido de conhecer, valorizar e qualificar a atuação dos trabalha-dores do SUS, contextualizando políticas de capacitação, educação continu-ada, ensino, pesquisa e desenvolvimento;

• realizar um levantamento das potencialidades docentes entre os servi-dores da SES/RS para modalidades de formação (docência em cursos depós-graduação e educação profissional ou aperfeiçoamento);

• definir um perfil de usuários da Informação Técnico-Científica da SES/RS visando conhecer as necessidades de informação; comportamentos fren-te à problemática de busca de informação documental em saúde e uso dasfontes de informação em Saúde.

• promover a DSI em saúde pública/saúde coletiva de forma rápida, se-letiva, atualizada e pertinente à população pesquisada.

Produtos e serviços

a) Ampliação da análise de conteúdo/indexação do acervoA abrangência da indexação dos documentos de interesse na área de

saúde pública/saúde coletiva está ampliada. Equivale a dizer que os Catálo-gos de Autor, Título e Assunto arrolam, além dos livros, periódicos, folhetos,CD, normas técnicas e demais documentos em acervo.

b) Disseminação da informação em acervoTrabalha-se na produção de instrumentos de oferta e disseminação da

informação em saúde:1. BOLETIM ALERTA – iniciado em julho de 1999 e que consiste na

divulgação dos sumários das publicações periódicas recém incorporadas aoacervo e disponíveis para consulta/empréstimo/cópia, mediante preenchi-mento de formulário específico. A periodicidade é mensal.

2. INFORMAÇÃO PARA A SAÚDE: Rio Grande do Sul – configura-secomo mais um mecanismo de disseminação da informação em saúde, con-tém resenhas e resumos, bibliografias e atos normativos, memória, notícias eespaço para manifestações. Cópias podem ser obtidas mediante formulárioespecífico. A periodicidade é semestral.

Multimeios

A ESP/RS teve, ao longo do tempo, um serviço chamado MaterialInstrucional, integrado às ações de Educação para a Saúde. Era de sua com-petência, basicamente, o estímulo à produção, recepção, coleta e distribui-ção dos materiais de divulgação (campanhas e eventos) oriundos, principal-

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mente, do Ministério da Saúde e da SES/RS. Entre os materiais oferecidos,estavam cartazes, fôlderes e fitas de vídeo.

Em seminário interno da ESP/RS, em 1999, decidiu-se que o Ceids de-veria absorver as atribuições desse Serviço. A partir de então, tem-se procu-rado desenvolver uma ação de disseminação desse tipo de informação, deforma integrada às políticas do Ceids e do projeto político-pedagógico daESP/RS. Esses materiais existentes podem ser considerados como demultimeios pedagógicos, em apoio às práticas de ensino/aprendizagem.

A maior coleção é a de fitas de vídeo – aproximadamente 400 exempla-res, seguidas de cartazes, fôlderes, discos compactos, slides, álbuns seria-dos e outros.

Atendendo a uma demanda espontânea, busca-se, gradativamente,qualificar esse acervo com materiais atualizados, selecionados e pertinentesao público ao qual se destinam. Pela análise do banco de dados cadastrais,pode ser caracterizado como público interessado em educação em saúde:professores, profissionais de saúde que exercem atividades didático-pedagó-gicas, conselheiros de saúde, alunos em busca de subsídios para trabalhosescolares dos três graus de ensino e público leigo interessado. Para ser usu-ário não há pré-requisito. Basta cadastrar-se para retirar materiais de interes-se. O uso desses documentos está relacionado, geralmente, a algum tipo deatividade didático-pedagógica como aulas, palestras, seminários e trabalhosescolares.

Assim, o serviço de Multimeios, no Ceids, de forma genérica, propõe-sea reunir, fomentar a criação, identificar, armazenar, recuperar, divulgar edisponibilizar materiais de apoio didático-pedagógico, estabelecendo umarede de intercâmbio e comunicação com entidades produtoras e/ou distribui-doras deste tipo de documento.

Docência

A capacitação técnico-política em saúde pública/saúde coletiva propõeestudo, pesquisa, produção de conhecimento, criticidade e socialização dosaber acumulado. A habilidade de usar adequada e seletivamente os esto-ques de informação técnico-científica disponíveis é um fator importante nasatividades de formação. A realização dos cursos ministrados na ESP/RS, emseus diversos formatos, cria espaços privilegiados para o conhecimento euso das principais fontes de informação da área das Ciências da Saúde, seusacessos e potencialidades.

Além disso, as atividades didático-pedagógicas da ESP/RS, de carátertransitório (cursos), se reafirmam como espaço de desenvolvimento e educa-ção permanente nos serviços de saúde (teoria/prática). Assim, o estabeleci-mento de vínculos permanentes com o estudo, a atualização e a educaçãocontinuada dos trabalhadores do SUS podem ser viabilizados mediante umacultura de uso cotidiano da informação em todas as ações de saúde.

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Nessa intenção, o Ceids contribuiu com a capacitação no manejo detécnicas e instrumentos bibliográfico-documentais e conhecimento dos meiosde acesso à pesquisa bibliográfica e à apresentação de trabalhos técnico-científicos.

A participação do Ceids na docência nos cursos da ESP/RS, além deinformar sobre o perfil normativo e metodológico da busca e uso bibliográfi-co, busca potencializar as habilidades para o processo de comunicação, apro-priação, percepção e desenvolvimento do ciclo documentário, desde o aces-so à informação registrada, sua assimilação plena, até a motivação e criaçãode viabilidades para a produção do conhecimento e sua disseminação.

Articulações

Ao longo do biênio 1999-2000, o Ceids esteve participando de algunsfóruns de discussão de políticas ou ações programáticas na área da informa-ção:

a) Projeto Telecentros – de iniciativa da Secretaria da Ciência eTecnologia, integrando o Programa de Inclusão Social pela difusãotecnológica, inclusão digital, acesso e uso das tecnologias da informação viaInternet e suas aplicações.

b) Organização dos Centros de Pesquisa do Estado (OCP) – buscado fortalecimento das instituições estaduais de pesquisa pela sua própria ar-ticulação e pela articulação com a agência de fomento à pesquisa (Fapergs),instituições acadêmicas e direções das próprias instituições. Foi realizado umdiagnóstico da situação das bibliotecas das quatorze instituições que inte-gram a OCP. O trabalho, entregue ao Secretário de Ciência e Tecnologia,resultou favorável à aprovação dos projetos de melhoria da infra-estruturadas bibliotecas que participaram do Edital-2000. O Ceids teve seu projetoaprovado, resultando em importante investimento institucional na área de do-cumentação como descrito até aqui.

Conclusão

O Projeto Ceids aqui relatado na forma de um artigo-documentário é umempreendimento coletivo. Pertence e se estrutura na interface com todos osprofissionais de saúde, de forma restrita, ou com seus outros e diversificadospúblicos. O artigo-documentário sobre o Projeto Ceids cumpre o papel deconstruir historicidade a um processo coletivo e institucional, filiado a umaconcepção ético-política de trabalho com a informação bibliográfica e docu-mental em saúde coletiva.

Existe uma gama de atores na “ecologia informacional” (Seracevic,1996, p.58) que envolve produtores de dados, informação e conhecimento(serviços de saúde, autores, pesquisadores, compiladores, organizadoresetc.), instituições financiadoras, editores, canais de divulgação (os documen-

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tos em qualquer formato) e os reelaboradores (produtores de bases de da-dos, bibliotecas e centros de documentação e os usuários).

No processo de interação entre estes agentes, os papéis se trocam,mesclam ou sobrepõem-se, de tal forma que todos são participantes em al-gum momento, como informantes, intérpretes, mediadores ou usuários.

Assim se constitui e fortalece o Ceids, na busca e no intercâmbio servi-ços/usuários que harmoniza interesses e necessidades de informação biblio-gráfica e documental em saúde, procurando aperfeiçoar as categoriasconceituais e temáticas, tornando-as cada vez mais pertinentes e seletivasaos seus públicos.

Há muita informação na área da saúde. É necessário discernimento paraa busca daquelas informações cujo significado favoreça a construção da au-tonomia e da qualidade de vida.

No Ceids, mais do que um aparato de habilidades, técnicas,metodologias e tecnologias de informação em exercício, existe solidariedadeafetiva, dedicação profissional, persistência e crença de que é possível cons-truir serviços públicos de qualidade. Esses componentes motivadores consti-tuem a invisível, mas perceptível, “estante da utopia”, com um rico e diversifi-cado acervo de colaboração.

O ciclo documentário, de forma esquemática, mostra a trajetória → do-cumento → dado → informação → conhecimento que permeia todo o trabalhorealizado no Ceids.

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Un centro de información y documentación en salud pública/saludcolectiva: compromisos, interfaces y perspectivas posibles y la estantería dela utopía – PARTE I

Resumen: Se hace un análisis de la situación de la Biblioteca de la Escola deSaúde Pública – ESP/RS, en el inicio de la actual gestión. Principios teóricos y técni-co políticos orientaron acciones de gerenciamiento de los recursos informacionalesen el sector, resultando en la presentación del proyecto del Centro de Informação eDocumentação em Saúde – Ceids. La concepción del Ceids se materializa, paulati-namente, mediante la explicitación de compromisos, interfaces y perspectivas,constituyéndose en el constante trabajo de control y diseminación de informacióndocumental en salud. Las categorías conceptuales y referenciales, base de los acer-vos construidos a lo largo del tiempo, generan viabilidades de compartimiento,calificación profesional, estudio, investigación, extensión y educación permanenteen la ESP y en la Secretaria da Saúde SES/RS. Nuestra expectativa es fomentar ladiscusión sobre el papel de la información en salud en el proceso de formación y enla aspiración de que el uso de la información sea incorporado cotidiana y permanen-temente como insumo al conocimiento y a la intervención en las acciones de salud,indispensable en el ciclo de construcción colectiva del conocimiento en salud. Setrata de un artículo documentario con el papel de dar historia y visibilidad a unproceso institucional relevante y comprometido con la salud colectiva.

Palabras Clave: Información en salud; Memoria institucional; Escola de SaúdePública/RS; Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul; Documentación.

A center of information and documentation in collective/public health:commitments, interfaces and possible perspectives and the shelf of utopia –PART I

Abstract: It is made an analysis of the situation of the Library of the Escola deSaúde Pública – ESP/RS, in the beginning of the current administration. Theoreticaland technician-political principles leaded the actions of administration ofinformational resources in the section, resulting in the presentation of the project ofthe Centro de Informação e Documentação em Saúde – CEIDS. The conception ofCEIDS is gradually materialized by the explicitation of commitments, interfaces andperspectives, constituting the present work of control and spread of documentalinformation in health. The conceptual categories and references, basis of thecollections built along the time, generate sharing possibilities, professionalqualification, study, researches, extension and continuous education in ESP/RS andin Secretaria da Saúde/SES-RS. Our expectation is to foment the discussion on therole of the information in health in the formation process and in the aspiration that theuse of the information is incorporated daily and permanently as input to theknowledge and to the intervention in the actions of health, indispensable in the cycleof collective construction of the knowledge in health. It is an article-report with therole of providing history and visibility to a institutional process that is relevant andcommitted with the collective health.

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Um centro de informação e documentação em saúde pública/saúde coletiva: compromissos ...

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Key-words: Information in health; Institutional memory; Escola de Saúde Pú-blica/RS; Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul; ocumentation.

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Identificação de grupos vulneráveis por meio da detecção de clusters de homicídio como ...

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Identificação de grupos vulneráveispor meio da detecção de clusters dehomicídios como apoio ao planejamentode ações em saúde:área de violência e trauma

Simone M. Santos1

Christovam Barcellos2

Marilia S. Carvalho3

Resumo: Os homicídios respondem pela maior parte dos óbitos que se devemà causas externas nas grandes cidades brasileiras, afetando principalmente homensjovens. Por um lado, o problema da violência não pode ser entendido somente atra-vés das atitudes individuais, por outro, viver sob condições sócioeconômicas adver-sas, por si só, não determina comportamentos violentos. Os resultantes do conjuntode condicionantes sociais, históricos e ambientais têm expressões diversas no es-paço urbano. Desta forma, uma importante estratégia de vigilância epidemiológicapara a prevenção e controle da violência nas grandes cidades é a identificação degrupos mais vulneráveis aos homicídios por meio da análise da concentração espa-cial destes eventos. A distribuição dos equipamentos públicos de segurança e edu-cação mostrou-se deficitária nas microáreas com alto índice de homicídios.

Palavras-Chave: Violência; Mortalidade por homicídios; Sistema de informa-ção geográfica; Análise espacial; Epidemiologia; Vigilância à saúde.

Introdução

O objetivo geral deste estudo é analisar a distribuição espacial das resi-dências das vítimas de homicídios no município de Porto Alegre, em 1996,visando a identificar a sua concentração espacial. Por meio da interpolaçãocom o método Kernel, foram calculadas a densidade de homicídios e a densi-dade média da população, cuja razão gerou um índice de homicídios. A partirdo índice de homicídios, foram identificadas diferentes microáreas de risco,

1 Escola de Saúde Pública do Estado do Rio Grande do Sul (ESP/RS).E-mail: [email protected] Departamento de Informações em Saúde (DIS/Cict/Fiocruz).3 Departamento de Epidemiologia e Métodos Quantitativos (Demqs/Ensp/Fiocruz).

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Simone M. Santos et al.

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as quais foram caracterizadas pela presença de escolas, serviços de saúde,delegacias e postos de polícia militar.

Os métodos espaciais utilizados permitiram a identificação demicroáreas que concentram óbitos, cujas populações devem ser enfocadasno planejamento de ações de prevenção das mortes violentas, como a pro-moção de comportamentos saudáveis e de ações intersetoriais que busquemampliar a cidadania e a qualidade de vida.

Este estudo fornece informações sobre os locais onde se concentramresidências de vítimas de mortes por homicídios no município de Porto Alegree, a partir deste conhecimento, tenta orientar o planejamento e a execução deações que permitam uma melhora na qualidade de vida dos cidadãos.

A taxa de mortalidade por homicídios em Porto Alegre foi de 21,2 óbitospor 100.000 habitantes, no ano de 1996 (Santos, 1999). Junto com os aciden-tes de transporte, os homicídios são a maior causa de morte dentro das cau-sas externas, no Brasil, chegando a ser a primeira causa de mortalidade geralnas idades entre 15 e 34 anos, em algumas metrópoles (Mello Jorge et al.,1997).

As causas externas de morte ou traumas, como vem sendo referida nasaúde coletiva, não são meramente acidentes, como geralmente são reco-nhecidas, trata-se de causas de morte evitáveis e, assumidas dessa forma,são passíveis de intervenção que promova a diminuição da sua ocorrência edas conseqüências que delas advêm (Loés, 1996).

Os profissionais da área de saúde podem atuar em dois momentos prin-cipais: na prevenção dos acidentes e violências, de forma a evitar a ocorrên-cia de lesões que podem levar ao óbito e mediante suporte às pessoas queforam lesadas, tentando diminuir as seqüelas e a ocorrência do óbito. Emrelação às mortes por homicídios, o campo mais carente de atuação é exata-mente o da prevenção. Com o uso, cada vez maior, das armas de fogo quegeram lesões mais fatais, o atendimento à pessoa lesionada é cada vez maislimitado. A identificação de grupos sujeitos aos complexos fatores envolvidosna gênese dos homicídios constitui o primeiro passo na busca de um maiorentendimento do contexto onde a violência acontece e é fundamental para oplanejamento de ações preventivas mais específicas.

As informações disponíveis nos sistemas de informação em saúde,quando atualizadas e tratadas, constituem-se em muito mais do que um ban-co de dados, devendo tornar-se uma ferramenta de operação dos agentesque intervêm no processo do evento estudado (Scaringella, 1999). A vigilân-cia à saúde de eventos específicos relacionados a acidentes e violência, vi-sando a fornecer subsídio às autoridades sanitárias na elaboração de progra-mas de prevenção e controle, deve estimar a morbi-mortalidade em termosde magnitude, tendências, custo e impacto social; identificar grupos e fatoresde risco; detectar clusters; avaliar a efetividade das intervenções; induzir pes-quisas e incorporar novos conhecimentos para o contínuo aperfeiçoamentodos serviços (Waldman; Mello Jorge, 1999).

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A distribuição espacial dos eventos e a análise de seus padrões sãocontribuições importantes para a gestão de um sistema local de saúde. Avisualização das informações é uma ferramenta complementar para odirecionamento das atividades (Carvalho, 1997). Pela análise dos padrões dedistribuição espacial dos homicídios, é possível identificar grupospopulacionais que estão submetidos a riscos de natureza difusa, muitas ve-zes superpostos, mas que se expressam em características sócio-econômi-cas e demográficas (Barcellos; Bastos, 1996) e que condicionam e são condi-cionadas pela forma de ocupação do espaço urbano.

Os Sistemas de Informações Geográficas (SIG) permitem, por meio dogeoprocessamento, a integração de dados de saúde e do ambiente em diver-sas unidades de análise, além de possibilitar a criação de indicadores com-postos. O recente desenvolvimento tecnológico facilitou o acesso a estes sis-temas (por diminuição do custo e compatibilidade de uso em computadorespessoais) e promoveu o crescimento do uso do SIG em epidemiologia nospaíses da América Latina (Castillo-Salgado, 1996). Apesar da recente difusãode tecnologias que permitem a manipulação de informações gráficas e ma-pas em microcomputadores, a falta de bases cartográficas digitalizadas e deendereçamento dos bancos de dados dificulta o uso de informaçõesdesagregadas para as esferas locais.

A concentração de eventos pode ocorrer no espaço, no tempo ou emambos. Um cluster ou agrupamento de eventos pode ser definido como umfoco particular de alta incidência (Cook-Mozffari et al., 1988) ou como umgrupo delimitado de ocorrências relacionadas entre si, por intermédio de al-gum mecanismo social ou biológico ou tendo em comum uma relação comoutro evento ou circunstância (Knox, 1988). O seu valor, entretanto, está noentendimento do impacto dos processos e estruturas de organização socialna determinação dos eventos de saúde (Jones; Moon, 1987). A análise espa-cial é obviamente muito importante para a identificação de áreas onde ascondições de saúde são precárias e que necessitam de uma atenção diferen-ciada.

A análise da concentração espacial de homicídios a partir do padrão dedistribuição de pontos é possibilitada pela disponibilidade de um SIG que lo-caliza endereços permitindo, dessa forma, o mapeamento diferencial demicroáreas por intermédio do padrão de ocorrência de homicídios, ou seja,pelo padrão de densidade de pontos.

Método

A área analisada corresponde ao município de Porto Alegre, capital doRio Grande do Sul, estado localizado no extremo sul do Brasil, cuja popula-ção em 1996 era de 1.288.879 habitantes.

Os dados de mortalidade fazem parte do Sistema de Informação sobre

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Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde, relativos ao ano de 1996, do qualforam selecionados os óbitos causados por agressões (aqui denominadashomicídios), referentes aos códigos de X85 a Y09 da 10ª Revisão da Classi-ficação Internacional de Doenças (CID10). Os homicídios corresponderam a30,5% da mortalidade devido às causas externas, apresentando 286 óbitos.

O indicador de mortalidade foi construído a partir da localização pontualdo endereço de residência da vítima, que consta na declaração de óbito. Alocalização é feita a partir da comparação do endereço que consta na decla-ração de óbito com o cadastro de logradouros, definindo o código do trechode logradouro a que pertence o endereço. As coordenadas geográficas x (lon-gitude) e y (latitude), de cada ponto, são calculadas por operação do SIG. Omapeamento da localização de pontos permite a visualização da distribuiçãodos eventos numa base cartográfica, onde cada ponto corresponde ao óbitolocalizado. O SIG municipal foi capaz de localizar 272 residências quecorrespondem a 95,1% dos óbitos por homicídio.

A análise dos padrões das distribuições de pontos de dados de área e asmúltiplas combinações entre diferentes camadas construídas em ambientede SIG constituíram os principais métodos utilizados.

A distribuição dos homicídios foi analisada por alisamento pelo métodode Kernel de densidade. O Kernel de estimativa de densidade (Diggle, 1985apud Bailey, 1994) permite a obtenção de uma estimativa espacial alisada daintensidade local dos eventos sobre a área estudada, o que essencialmenteresulta numa “superfície de risco” para a ocorrência destes eventos. A densi-dade média da população foi analisada pelo método de Kernel de distribuiçãode valores, a partir do total populacional dos setores censitários.

Realizou-se uma estimativa de eventos por população por meio de umarazão onde o numerador é o Kernel de densidade de homicídios e o denomi-nador é o Kernel de distribuição de valores da população. Esta razão é calcu-lada segundo os valores estimados pelo método de Kernel que são atribuídosa cada ponto de interseção de uma grade regular, de 200 por 200 células,construída para a interpolação. Por meio dessa razão, foi construído o Índicede homicídios , utilizando-se o software S-Plus© com o módulo espacial. Foicalculado o índice de homicídios médio em cada setor censitário por intermé-dio de operação entre camadas de informação em ambiente de SIG, transfor-mando a informação da grade regular em atributo dos polígonos dos setores.

A distribuição dos índices de homicídios por quintis serviu de base paraa classificação dos setores censitários em três grupos de índices de homicídi-os: considerou-se como microárea de alto risco aquelas que se encontraramno quintil superior da distribuição; de baixo risco aquelas que se encontra-ram no quintil inferior; e os demais como risco intermediário. Considerou-semicroáreas com formação de clusters aquelas de alto risco, cujo índice dehomicídios reflete a grande concentração de ocorrência dos mesmos.

Também foram localizados alguns equipamentos urbanos, por meio doendereço, em ambiente de SIG. As Delegacias e Postos de Polícia Civil e

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Militar tiveram 100% de localização. As camadas de Escolas de Ensino Fun-damental e Médio e dos Postos de Saúde e Hospitais onde há atendimentopúblico pelo Sistema Único de Saúde foram fornecidas, já, em forma de ma-pas de pontos, sendo que para as escolas houve 94,12% de localização. Es-tas camadas foram sobrepostas ao padrão do índice de homicídios, permitin-do o cálculo da disponibilidade daqueles nas diferentes áreas do município.

Resultados e discussão

Distribuição das microáreas de índices de homicídios

Pode-se observar a distribuição das residências das vítimas de homicí-dios e os polígonos dos setores censitários que serviram de base para a aná-lise da distribuição da população, na figura 1.

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Na figura 2, pode-se observar as microáreas de índices de homicídiosgeradas a partir desta categorização do índice de homicídios. No primeirogrupo encontram-se os setores censitários que ocuparam o quintil superiorda distribuição – alto risco . O segundo grupo é formado pela reunião dosquintis intermediários , concentrando 60% dos setores censitários. O terceirogrupo foi constituído pelos setores censitários do quintil inferior da distribui-ção – baixo risco.

O alto índice de homicídios em diferentes microáreas, provavelmenteresulta de contextos diferenciados, mas se sobrepõem, em parte, a bairros debaixa condição socioeconômica e adjacências, encontrando-se em regiõesperiféricas ao núcleo mais urbanizado onde se concentram atividades de ser-viços. Há microáreas de alto risco que se diferenciam das demais áreas domunicípio porque abrangem setores com baixa condição socioeconômica,onde está presente a atuação de grupos envolvidos com o tráfico de drogas,onde ocorrem conflitos entre os diferentes grupos que disputam o controle dotráfico e entre estes e a polícia, na tentativa de repressão ao crime ( por exem-plo, os bairros Santo Antônio, Santa Teresa e Medianeira e parte dos bairrosPartenon, Teresópolis, Glória e Vila Jardim). Há outras microáreas da zonanorte e zona sul que englobam setores de baixa condição socioeconômicaonde a atuação de traficantes é menor. Nessas áreas é provável que outrospadrões de conflitos estejam presentes, possivelmente relacionados com aforma violenta de solucionar desentendimentos pessoais (por exemplo, osbairros São José, Bom Jesus, Sarandi, Protásio Alves e Restinga).

As microáreas de risco intermediário englobam setores de diversas con-dições socioeconômicas, enquanto as microáreas de baixo risco abrangem amaior parte das regiões rurais da cidade e há uma microárea que concentrasetores de alta condição socioeconômica e bem provida de serviços.

Presença de equipamentos urbanos nas microáreas de índices dehomicídios

Para analisar a distribuição dos equipamentos urbanos, a presença des-tes e sua proporção nas microáreas de diferentes índices de homicídios foicomparada com a distribuição da população residente em cada área. Estacomparação é apresentada na tabela 1.

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Tabela 1 – Perfil dos grupos de índice de homicídios segundo distribuição dosequipamentos urbanos, Porto Alegre, 1996

Grupo de Índice de HomicídiosQ. Inferior Q. Intermediário Q. Superior Total

Indicador Baixo Risco Risco Alto RiscoIntermediário

n % n % n % n %Área em Km² * 147,8 34,2 233,2 54,0 50,7 11,8 431,7 100,0População 213.293 16,9 731.433 57,9 318.166 25,2 1.262.892 100,0Homicídios 9 3,4 120 44,8 139 51,9 268 * 100,0Postos 9 16,7 36 56,2 17 26,6 64 100,0de PolíciaUnidades 11 9,3 61 51,7 46 39,0 118 100,0de SaúdeEscolas 29 38,7 35 46,7 11 14,7 75 100,0ParticularesEscolas 43 14,0 206 67,3 57 18,6 306 100,0Públicas* Foram excluídos 2 homicídios das ilhas e 2 em virtude do ajuste do contorno do município.

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A categoria de quintil superior contém mais da metade dos homicídiosem uma pequena área do município (11,8%). A categoria de quintil inferiorapresenta uma pequena parte (3,4%) do número total de homicídiosdispersos em uma grande área do município (34,2%). Na categoria intermedi-ária está compreendida, aproximadamente, metade dos homicídios da popu-lação e da região que forma Porto Alegre.

A distribuição dos postos de polícia civil e militar apresentou propor-ções similares à distribuição populacional nas diferentes microáreas do muni-cípio. A princípio, se poderia considerar que essa similaridade implica emeqüidade, tendo em vista que este serviço tem que ser prestado a toda popu-lação, indistintamente, considerando-se apenas o total populacional. Na rea-lidade, as demandas são diferenciadas entre as áreas e onde há concentra-ção de homicídios deveria haver um aporte maior de atenção policial, o quenão está ocorrendo. Apesar deste estudo refletir um perfil estático no tempo,não é esperado que as áreas de concentração de homicídios apresentemgrandes variações de um ano para outro, a não ser que ocorra uma açãointensiva da polícia. Deste modo, pode-se considerar que há uma defasagemrelativa de postos de polícia na área de maior concentração de homicídios.

As unidades de saúde apresentaram uma distribuição relativa commaior eqüidade. A menor proporção da presença deste serviço ocorreu noquintil inferior de índice de homicídios, que tem um padrão de maior renda,onde a população é, freqüentemente, associada a planos de saúde particula-res. Já a maior proporção ocorreu no quintil superior de índice de homicídios,onde se concentra, também, a população de menor renda que tem no serviçode saúde público a maior, senão a única, porta de acesso aos serviços desaúde.

As escolas particulares tiveram localização expressiva na área de bai-xo índice de homicídios e pouca presença na área de alto índice de homicídi-os, apresentando um padrão que acompanha o perfil de renda das áreas. Asescolas públicas apresentaram uma defasagem de oferta nas áreas comalto índice de homicídios, considerando-se o total populacional nessas áreas.Em relação ao perfil de demanda que é maior onde a população tem rendamenor, esta oferta é mais escassa. A renda baixa restringe o acesso à educa-ção, sendo este dependente da disponibilidade da escola gratuita.

Implicações da detecção de microáreas de maior risco para oplanejamento de ações em saúde

Apesar desta abordagem ter um caráter estritamente quantitativo, sa-bendo-se que a presença da escola não garante diretamente o acesso aoensino, que pode ser dificultado por outros fatores, como a necessidade detrabalhar, e que o efetivo policial e a qualidade do serviço prestado tambémpode ser diferenciada entre os diversos pelotões e delegacias, indica-se acarência destes serviços nas áreas de altos índices de homicídios. A avalia-

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ção da qualidade destes serviços e o aumento da sua oferta nestas áreaspodem constituir um passo importante para diminuir o índice de homicídios e,sobretudo, para melhorar a qualidade de vida da população, facilitando oacesso à educação.

Neste mesmo sentido, essas áreas devem ser priorizadas para oferta deáreas de lazer, centros de convivência com atividades específicas para ado-lescentes, constituição de atividades de educação em saúde com enfoqueem temas de interesse dos adolescentes e de outros serviços que garantama capacidade de ser cidadão e de ser respeitado.

Apesar da sua importância para a saúde, a responsabilidade pelo con-trole dos homicídios tem sido delegada quase inteiramente à justiça criminale ao aparato policial. Sanções legais têm lugar definido na prevenção doshomicídios, mas apenas como parte de uma estratégia mais ampla emultifacetada. Como a maior parte das mortes está relacionada com armasde fogo (Santos et al, 2000), é possível utilizar diversas estratégias para pre-venir os ferimentos e mortes, como algumas iniciativas nos EUA (CDC, 1992),pela inibição, restrição ou redução do fácil acesso às armas de fogo pelapopulação em geral ou em locais específicos. Entre as estratégias no nívellocal encontram-se intervenções como o treinamento na resolução de confli-tos e a redução da incidência de violência interpessoal pelas mudanças decomportamentos.

As ações dirigidas a grupos específicos, planejadas em equipesmultidisciplinares, constituem a forma mais imediata de intervenção para pre-venir que ocorra a violência, mesmo que os resultados obtidos sejam limita-dos pela ausência de políticas mais amplas. As mortes em conseqüência deuma lesão grave, intencional ou não (Kreis et al, 1985 apud Hijar-Medina,1997), têm uma apresentação trimodal: 50% ocorrem dentro dos primeirosminutos de ocorrida a lesão; 30% ocorrem dentro das duas horas seguintes àlesão; e os 20% restantes ocorrem durante as duas ou três semanas poste-riores à lesão. O potencial de impacto destas ações de cunho preventivo éenorme, principalmente se direcionadas às áreas identificadas como de maiorexposição.

Os serviços de saúde pública, apesar de todas as dificuldades, aindaconstituem uma importante interface de contato do Estado com a população.Alguns profissionais discutem a existência de uma síndrome do trauma. Estaseria apresentada por pacientes que são atendidos, de forma recorrente, porcausa da exposição às agressões e que tendem a sofrê-las várias vezes,ficando expostos a uma agressão com desfecho fatal (Ponzer; Brismar,1996). Estas situações são mais fáceis de ser captadas a partir do contatocom os serviços de saúde onde há um vínculo maior entre os profissionais desaúde e os usuários das ações e serviços públicos.

Em Porto Alegre, a existência de uma rede de atenção básica em saúdecoletiva procura reforçar o vínculo da população às unidades de saúde deáreas definidas e que servem de referência local. Estas unidades são respon-

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sáveis não somente pela atenção dentro das unidades, mas também atuamna localidade e em suas instituições sociais. Aproveitando esta chance decontato, é possível criar meios de atuar nas realidades locais com o objetivode prevenir esta mortalidade, por exemplo, pela implementação de atividadesde cunho informativo e formador. Para isso, deve haver um preparo profissio-nal das equipes de saúde que atuam nas microáreas identificadas como demaior risco para os homicídios, garantindo a sensibilização e a capacitaçãodos profissionais para o desenvolvimento de ações dirigidas.

Além disso, considerando-se que o conceito de saúde compreende oacesso e usufruto aos direitos sociais e às melhores políticas públicas, ficaevidente que as condições de saúde da população são reflexo de uma gamade fatores que podem ser objeto de ações de diversos setores da esfera pú-blica, necessitando de um entendimento intersetorial e demandando umaintegração entre diversos profissionais e áreas do conhecimento.

Considerações finais

O método de Kernel mostrou-se adequado para a definição de áreasdiferenciadas na superfície da região em estudo. A identificação do padrão deocorrência dos homicídios permitiu o reconhecimento de grupospopulacionais de maior vulnerabilidade em relação a estas causas de morte.Além disso, através do estudo das características específicas de cada área, épossível identificar outros locais com características semelhantes onde sepode esperar a ocorrência de novos eventos.

O Índice de homicídios, calculado pela razão entre o kernel de densida-de de homicídios e o kernel de distribuição de valores da população, mostrou-se adequado para diferenciar as microáreas que constituem o município, in-dependentemente de macrolimites políticos e administrativos. A visualização,em forma de mapa, foi fundamental para aferir a flutuação do índice nas áreascom pequena população. A sua principal vantagem foi a de permitir a diferen-ciação a partir da localização pontual do evento (sem nenhuma unidade deagregação pré-estabelecida) e a partir de informações sobre um período detempo breve (apenas um ano).

A possibilidade da análise dos padrões espaciais dos homicídios podeser incorporada para a constituição do sistema de vigilância das mortes vio-lentas, de modo relativamente simples. Uma de suas grandes vantagens é ade não necessitar de uma série histórica para avaliação dos eventos. Outra, éa capacidade de direcionar as análises a áreas específicas, gerando maioragilidade no retorno das informações que se pode obter através do sistema emaior especificidade no dimensionamento dos processos sociais que atuamem cada área.

Segundo Mendes et al (1993), a microárea (socioeconômica eambientalmente homogênea, com riscos à saúde similares) é o espaço privi-legiado, ainda que não o único, para o enfrentamento dos problemas de saú-

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de, de forma contínua, por meio de operações direcionadas à superação dosnós críticos identificados na rede causal. É nesta escala que ocorrem as rela-ções do cotidiano que representam a realidade inserida no contextosocioespacial.

Assim, partindo do território-microárea, pode-se avaliar os recursos eserviços disponíveis e adequar os investimentos, preferencialmente onde seconcentram os problemas de saúde. Pode-se avaliar quais tipos de açõesdevem ser produzidas para ter impacto no nível geral da organização econô-mica, política e cultural, bem como os reflexos que elas produzem na inser-ção social dos grupos em questão (Castellanos, 1990).

Identificación de grupos vulnerables por medio de la detección declusters de homicidios como apoyo al planeamiento de acciones en salud: áreade violencia y trauma

Resumen: Los homicidios responden por la mayor parte de los óbitos debido alas causas externas en las grandes ciudades brasileñas, afectando principalmente alos hombres jóvenes. Por un lado, el problema de la violencia no puede ser entendi-do solamente a través de las actitudes individuales. Por otro, vivir bajo condicionessocioeconómicas adversas, por si sólo, no determina comportamientos violentos.Los resultantes del conjunto de condicionantes sociales, históricos y ambientalestienen expresiones diversas en el espacio urbano. De esta forma, una importanteestrategia de vigilancia epidemiológica para la prevención y control de la violenciaen las grandes ciudades es la identificación de grupos más vulnerables a loshomicidios por medio del análisis de la concentración espacial de estos eventos. Ladistribución de los equipos públicos de seguridad y educación se ha mostradodeficitaria en las microáreas con alto índice de homicidios.

Palabras Clave: Violencia; Mortalidad por homicidios; Sistema de informacióngeográfica; Análisis espacial; Epidemiología; Vigilancia a la salud.

Identification of vulnerable groups through the detection of clusters ofhomicides as support to the planning of actions in health: violence area andtrauma

Abstract: Homicides are responsible for most of the deaths due to externalcauses in the greatest Brazilian cities, affecting mainly young men. On one hand, theproblem of violence cannot only be understood through the individual attitudes, onthe other hand, only living under adverse socioeconomic conditions does not deter-mine violent behaviors. The resultants of the set of social, historical andenvironmental conditionings have several expressions in the urban space. This way,an important strategy of epidemic surveillance for the prevention and control ofviolence in the greatest cities, is the identification of groups that are more vulnerable

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to homicides through the analysis of the space concentration of these events. Thedistribution of public equipment of safety and education was shown deficient in themicro-areas with high index of homicides.

Key-words: Violence; Mortality by homicides; System of geographicalinformation; Space analysis; Epidemiology; Health surveillance.

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Identificação de grupos vulneráveis por meio da detecção de clusters de homicídio como ...

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Memória e HistóriaMemória e HistóriaMemória e HistóriaMemória e HistóriaMemória e História

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Do isolamento ao sanatório: diferentes práticas e serviços em um espaço de saúde pública ...

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 133

Do isolamento ao sanatório: diferentespráticas e serviços em um espaço desaúde pública de Porto Alegre – de 1909a 20011

Pedro Dornelles Picon2

Denise Soares Bastos3

Paulo Garcia4

Resumo : O tema Do isolamento ao sanatório: diferentes práticas e serviçosem um espaço de saúde pública de Porto Alegre – de 1909 a 2001 foi apresentadopelo Hospital Sanatório Partenon no Seminário Informação, Memória e História emSaúde Pública, promovido pelo Ceids/RS em maio de 2001. O artigo ora apresenta-do pretende trazer alguma contribuição para a pesquisa e a reflexão acerca datemática do resgate da memória da saúde pública no Estado do Rio Grande do Sul,a partir do microcosmos do Hospital Sanatório Partenon e dos diferentes serviçosimplementados numa mesma área física do bairro Partenon, em Porto Alegre, doinício do século XX a este início de século XXI. A trajetória de ocupação deste espa-ço - de Hospital de Isolamento a partir de 1909 a um complexo de serviços públicosde saúde nos dias atuais - pode auxiliar a compreensão de como diferentes políti-cas, demandas e práticas sanitárias determinam a estruturação dos serviços de saú-de, em particular no campo do tratamento das doenças infecto-contagiosas.

Palavras-Chave : Memória institucional; Hospital Sanatório Partenon; PortoAlegre; História.

Do início do século XX até os dias de hoje, concepções diversas fizeramcom que diferentes instituições e práticas de saúde tivessem lugar no bairroPartenon, na antiga Estrada do Mato Grosso, hoje avenida Bento Gonçalves,número 3722.

1 Trabalho apresentado no Seminário “Informação, memória e história em saúde pública” ,realizado na Escola de Saúde Pública do Estado do Rio Grande do Sul, em 25 de maio de2001.2 Médico pneumologista, Direção de Ensino e Pesquisa/HSP, e-mail:[email protected] Técnica em Assuntos Culturais, Coordenadora Núcleo de Documentação e Memória/HSP, e-mail: [email protected] Historiador, e-mail: [email protected]

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Pedro Dornelles Picon et al.

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Esse endereço, que hoje sedia o Hospital Sanatório Partenon, passou aser um espaço voltado à saúde a partir da compra de um terreno – antigopotreiro – em 1908, pelo governo estadual, onde seria construído, no anoseguinte, o Hospital de Isolamento São José.

O bairro Partenon, na virada do século XIX para o XX, esteve demarca-do como um espaço de segregação de doentes, abrigando, no então Hospí-cio São Pedro, doentes mentais ou alienados e, no Hospital de IsolamentoSão José, portadores de moléstias contagiosas. Além desses hospitais, haviatambém um lazareto na Chácara das Bananeiras.

Os órgãos governamentais se preocupavamcom o destino da população pobre vagando peloespaço público, sobretudo no Centro, uma vezque as doenças infecto-contagiosas não ficavamcircunscritas nos bairros periféricos. É nesse con-texto que é concebida a legislação que obriga acomunicação dos casos de moléstias contagio-sas e a própria criação do Hospital de Isolamento.

Para isolar os doentes, os órgãos sanitáriosda época utilizavam lazaretos, que no final do sé-culo XIX podiam significar hospital de lazarentos(leprosos) e edifício onde fazem quarentena aspessoas vindas de terras onde reina doença epi-dêmica e contagiosa (Carvalho; Deus, 1895).

Os hospitais de isolamento ou lazaretosapresentavam algumas particularidades em rela-ção aos demais hospitais da época: eram financi-ados pelos órgãos públicos, enquanto os demaisdependiam, em grande parte, da filantropia e atu-avam no controle das doenças infecto-contagio-sas, particularmente nos momentos de epidemias.

A primeira referência a lazaretos em Porto Alegre reporta à década de1880 como sendo um hospital para atender variolosos pobres quando daocorrência de surtos epidêmicos.

Como as medidas terapêuticas da época eram ineficientes, procurava-se minimizar os riscos da doença para a sociedade, resultando mais em umcombate aos doentes do que às doenças. O principal alvo, nesse caso, era acamada mais pobre da população, enquanto que aqueles com boas condi-ções financeiras eram isolados em suas próprias residências.

Os lazaretos estavam ligados ao Desinfectório de Higiene do Estado,que pertencia ao Departamento de Higiene da Secretaria de Estado dos Ne-gócios do Interior e Exterior.

Trabalhando em conjunto, os hospitais de isolamento e o Desinfectório

2º CARTÓRIO DE NOTASEM

PORTO ALEGRE32 – Ladeira (General Camara) – 32

EXTRACTO

Freguezia do immovel:NOSSA SENHORA DO ROSARIO

Denominação ou rua e numero:ARRAIAL DE SÃO JOSÉ

Confrontações e caracteristicas:Um terreno, outr�ora potreiro,com a área superficial de187.710 m2, mais ou menos,limitando-se ao Norte com oarroio do Sabão, ao Sul coma Estrada do Matto Grosso, aLeste com Angelo Ignacio deBarcellos, por uma linharecta, a Oeste com o GeneralJoaquim Sabino PiresSalgado por uma cerca emquatro rumos differentes.

Nome e domicilio do adquirente:FAZENDA DO ESTADO

Reprodução da escritura decompra do terreno no Arraial deSão José acervo Departamentode Patrimônio do RS

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Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 135

tinham por objetivo, primeiramente através do isolamento hospitalar, preveniro contágio de novas vítimas e proporcionar a desinfecção de seus pertencese residências a fim de impossibilitar a disseminação das epidemias.

Desde 1893, conforme Relatórios da Secretaria de Estado dos Negóciosdo Interior e Exterior, já havia a demanda para a construção de um novo hos-pital de isolamento.

Somente em 1909, com aconstrução do Hospital de Isola-mento no Arraial São José, na Es-trada do Mato Grosso, no bairroPartenon, essa demanda seriaatendida.

A escolha do local, afastadodo centro da cidade, segue a lógi-ca higienista vigente, que prevê,diante da deficiência na prevençãode doenças, a segregação dos in-divíduos que colocavam em riscoa saúde da cidade.

A partir de sua construção, aárea onde se localizava o Hospitalde Isolamento foi sendo utilizadapelo governo estadual para incor-porar progressivamente novosserviços de saúde.

Serviço de Assistência Públi-ca de Porto Alegre, de 1898,que também recolhia porta-dores de moléstias trans-missíveis – acervo ArquivoHistórico Moysés Vellinho.

Hospital de Isolamento em construção, 1909 –acervo Arquivo Histórico do RS.

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Pedro Dornelles Picon et al.

136 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

Em 1918, Porto Alegre foi vítima da pandemia conhecida como GripeEspanhola ou influenza. Os primeiros registros de vítimas na cidade são de18 outubro de 1918, quando três casos foram registrados. Entre os dias 19 e23 foram recolhidos ao Hospital de Isolamento 21 doentes. Em novembro, aepidemia se generaliza pela cidade. A Diretoria de Higiene calculou em70.000 o número de pessoas que contraíram a doença, em uma populaçãode 168.700 habitantes.

Até dezembro de 1918, ha-viam falecido, em Porto Alegre,1.316 pessoas com a epidemia.No estado, esse número subiupara 3.791.

Uma das medidas de con-tenção da epidemia foi a amplia-ção do Hospital de IsolamentoSão José. A influenza, como do-ença contagiosa, inscrevia-se en-tre aquelas para cujo atendimen-to o hospital havia sidoconstruído. Dessa forma, o Hos-pital de Isolamento passou a con-tar com 6 pavilhões.

Em 1926, uma vez que a construção de um hospital específico parahansenianos não era viável, a Diretoria de Higiene adaptou dois dos pavi-lhões do Hospital de Isolamento para neles serem recolhidos os leprosos indi-gentes de Porto Alegre.

O Hospital de Emergên-cia para Leprosos, inaugura-do em 1936, foi instalado noterreno do Hospital de Isola-mento, próximo ao local ondehoje se encontra a Escola deSaúde Pública. O hospital ti-nha como objetivo atenderexclusivamente aos doentesque perambulavam pelasruas da capital ou para os ca-sos contagiantes que neces-sitavam de imediato e rigoro-so isolamento.

Hospital de Isolamento ampliado por ocasião daepidemia de gripe em 1918 – acervo HospitalSanatório Partenon.

Hospital de Emergência para Leprosos – acervo Hos-pital Colônia Itapuã.

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No ano de 1940, foi criado, no Hos-pital de Isolamento, o primeiro serviçopúblico de cirurgia da tuberculose do RioGrande do Sul. Nesse período, o HI con-tava com duas seções, uma Seção deTuberculose e uma Seção de MoléstiasTransmissíveis Agudas.

Com a necessidade cada vez maiorde leitos hospitalares públicos parainternação de doentes com tuberculose,o governo estadual inaugurou, em 1946,no Hospital de Isolamento, o AbrigoCarmem Gonçalves, para tratamento da-queles doentes então considerados incu-ráveis.

Os abrigos para tuberculosos irrecuperáveis, como estabelecimentos deinternação, representavam um papel importante na profilaxia da tuberculose,porque, segundo a lógica vigente, retiravam os doentes contagiantes do meioem que viviam e onde disseminavam a doença pelo contágio.

Na mesma época, iniciou-se a construção de um outro pavilhão, de alve-naria, para tuberculosos recuperáveis, denominado Bonifácio Paranhos daCosta, inaugurado em 1949.

Antes da descoberta da quimioterapia, na década de 1940, pouco erapossível fazer para o controle da tuberculose, além da vacinação BCG e apli-cação de algumas técnicas cirúrgicas, em casos restritos. Em qualquer situa-ção, buscava-se a descoberta precoce do doente bacilífero, fonte de infec-ção, para que fosse encaminhado aos hospitais com a finalidade de isola-mento e tratamento com as medidas disponíveis.

A Campanha Nacional Contra a Tuberculose (CNCT), de 1947, pregavao isolamento de focos em hospitais. Essa foi a época do incentivo à criaçãode leitos para tuberculose no Brasil. A partir de pouco mais de 10 mil leitos,em 1946, chegou-se a mais de 21 mil no final de década de 50.

Dentro dessa nova política de saúde, a partir de um convênio do Estadocom a União, foi construído, com verbas federais, o Hospital SanatórioPartenon, inaugurado em 27 de janeiro de 1951.

O projeto de um sanatório já era considerado pelo governo estadual des-de, pelo menos, 1916, só passando a ser efetivado com a inauguração doHSP.

Procissão em frente ao Abrigo CarmemGonçalves – Acervo Hospital SanatórioPartenon.

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Pedro Dornelles Picon et al.

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Na década de 60, o HospitalSanatório Partenon estava lotadode crônicos, como resultado dapouca resolutividade dosdispensários de tuberculose, ondea taxa de cura era muito baixa.

Esses pacientes permaneci-am internados por longo tempo,bloqueando os leitos para os no-vos crônicos que continuavamsendo produzidos em razão do tra-tamento irregular.

Nesse período, ocorrerammudanças no Sanatório Partenonpara adequação às normas dita-

das pela CNCT, que visavam à atualização do hospital aos novos conheci-mentos.

O tratamento prolongado a que os pacientes tinham que ser submetidosfazia com que tivessem que permanecer internados durante meses e atéanos. Em conseqüência, terminavam criando estruturas de sociabilização quelhes permitissem uma permanência mais amena. Criaram, já nos primeirosanos de funcionamento do hospital, um grêmio cultural e uma cooperativa,organizavam festas, bailes e campeonatos, criaram uma rádio e um jornalinternos, entre várias outras atividades.

Uma dessas atividades, de grande repercussão dentro e fora do hospi-tal, visto que contava com a participação de autoridades sanitárias importan-tes, era o Baile da Rainha da Primavera, escolhida entre as pacientes.

O Hospital de Isola-mento São José, concebidopara tratar doenças contagi-osas agudas, funcionou atéo final da década de 1960,em concomitância com oSanatório Partenon, quandopassou a servir a pacientescom problemasdermatológicos, no iníciopara dermatoses bolhosasconhecidas como fogo sel-vagem e, mais tarde, comoUnidade de Internação emDermatologia Sanitária.

Hospital Sanatório Partenon no final da décadade 1950 – acervo Hospital Sanatório Partenon.

Baile da Rainha da Primavera, década de 1950 – acer-vo Hospital Sanatório Partenon.

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Do isolamento ao sanatório: diferentes práticas e serviços em um espaço de saúde pública ...

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 139

A AIDS passou a fazer parte da história do Hospital Sanatório Partenonem 1983, quando nessa instituição foi diagnosticado o primeiro caso da doen-ça no estado. Desde então, o HSP dedica-se ao tratamento da doença, cadavez mais associada à tuberculose. Em razão disso, alguns novos serviços desaúde foram instalados na área do antigo Arraial de São José.

No prédio original do Hospital de Isolamento, funciona, desde 1997, oHospital-Dia para pacientes com AIDS. O Centro de Testagem eAconselhamento Caio Fernando Abreu, que dá orientações sobre doençassexualmente transmissíveis e AIDS, está instalado, desde 2000, no prédioque servia ao Sanatório e que depois passou a ser o Laboratório Central deBacteriologia para o Programa de Controle da Tuberculose no RS.

Além desses, estãoinstalados na área do Sa-natório Partenon e do anti-go Hospital de Isolamento oHemocentro do Estado e oCentro de Saúde-EscolaMurialdo.

O Hemocentro foicriado em 1983, com a fina-lidade de coordenar asações na área dehemoterapia. Antes daexistência desse prédio,esse serviço, então um em-brião do que vem a serhoje, funcionava em depen-dências do antigo bloco cirúrgico do Sanatório. Junto ao Hemocentro, come-çou a funcionar, a partir de 2002, a Clínica de Hematologia, atendendo pa-cientes hemofílicos e com Doença de Von Willebrand.

O Centro de Saúde-Escola Murialdo, instituição voltada ao atendimentode saúde primário e referência da residência em Medicina Geral Comunitária,funciona desde 1993. O Laboratório Central de Patologia do Estado foi insta-lado nas dependências do antigo bloco cirúrgico do Sanatório, em 1997. To-das essas instituições atuam de forma integrada, atendendo unicamente peloSistema Único de Saúde.

Hoje, o Hospital Sanatório Partenon, através de sua Direção de Ensino ePesquisa, vem desenvolvendo, além de pesquisa na área das doençasinfecto-contagiosas, sobretudo tuberculose e AIDS, pesquisa histórica volta-da ao resgate da memória institucional e atividades de educação em saúdeque buscam socializar esses conteúdos.

Essas atividades deram origem ao Núcleo de Documentação e Memóriado hospital, que realiza pesquisa documental, tendo como fontes documentos

Prédio original do Hospital de Isolamento, de 1909, hojeHospital-Dia para aids – acervo Hospital SanatórioPartenon.

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Pedro Dornelles Picon et al.

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escritos e imagéticos da própria instituição e de acervos particulares e públi-cos; registro de história oral, a partir de depoimentos de antigos funcionários,pacientes e diretores; organização e ampliação do acervo institucional e ativi-dades de divulgação para o público.

A exposição Do Isolamento ao Sanatório, além de contar um pouco dahistória do Hospital e das instituições que o antecederam, apresenta um bre-ve panorama da saúde desde meados do século XIX, com a constituição dosprimeiros serviços de saúde em Porto Alegre, as principais doenças inciden-tes no estado e capital, e os tratamentos e formas com que a sociedade, emdiferentes épocas, se relaciona com saúde e doença.

O projeto contempla também a itinerância da exposição por escolas,centros comunitários, instituições educacionais e de saúde, além da constitui-ção de um espaço permanente para o debate e a divulgação do trabalho pro-duzido na instituição, bem como o estabelecimento de parcerias com as maisdiversas entidades afins.

De espaço de isolamento e exclusão, no século passado, a um comple-xo de serviços públicos de saúde nos dias atuais, esse endereço pretendecontinuar sediando, além de serviços qualificados, um espaço permanentede produção científica e debate sobre saúde pública e questões de interessesocial.

Del aislamiento al sanatorio: diferentes prácticas y servicios en unespacio de salud pública de Porto Alegre – de 1909 a 2001

Resumen : El tema Del aislamiento al sanatorio: diferentes prácticas y serviciosen un espacio de salud pública de Porto Alegre - de 1909 a 2001 fue presentado porel Hospital Sanatório Partenon en el Seminario Información, Memoria e Historia enSalud Pública, promovido por el Ceids/RS en mayo de 2001. El artículo orapresentado pretiende traer alguna contribución para la investigación y la reflexiónacerca de la temática del rescate de la memoria de la salud pública en el Estado delRio Grande do Sul, a partir del microcosmos del Hospital Sanatório Partenon y de losdiferentes servicios implementados en una misma área física del barrio Partenon, enPorto Alegre, del inicio del siglo XX a este inicio de siglo XXI. La trayectoría deocupación de este espacio - de hospital de aislamiento a partir de 1909 a un complejode servicios públicos de salud en los días actuales - puede auxiliar a la compreensiónde cómo diferentes políticas, demandas y prácticas sanitarias determinan laestruturacción de los servicios de salud, en particular en el campo del tratamiento delas enfermedades infectocontagiosas.

Palabras Clave : Memória institucional; Hospital Sanatório Partenon; Porto Ale-gre; Historia.

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Do isolamento ao sanatório: diferentes práticas e serviços em um espaço de saúde pública ...

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 141

From the isolation to the sanatorium: different practices and services in aspace of public health of Porto Alegre – from 1909 to 2001

Abstract: The topic From Isolation to Sanatorium: different practices andservices in a space of public health in Porto Alegre – from 1909 to 2001 waspresented by Hospital Sanatorio Partenon in the Seminar Information, Memory andHistory in Public Health, promoted by Ceids/RS in May 2001. The article herepresented aims at contributing for the research and thinking on the theme of rescuingthe memory of public health in the state of Rio Grande do Sul, starting from themicrocosm Hosrital Sanatório Partenon, and the different services implemented in asame physical area in Partenon neighborhood, in Porto Alegre, from the beginning ofthe 20th century to the early 21st century. The way of occupation of that area – from anisolation hospital in 1909 on, to a complex of public health services nowadays – mayhelp us to understand how the different sanitary politics, requirements and practicesdetermine the structure of health services, mainly in the field of infecto-contagiousdiseases.

Key-words : Institutional memory; Hospital Sanatório Partenon; Porto Alegre;History.

Referências

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Segregar para curar? A experiência do Hospital Colônia Itapuã

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 143

Segregar para curar? A experiência doHospital Colônia Itapuã

Artur Henrique Franco Barcelos1

Viviane Trindade Borges2

Resumo: O Hospital Colônia Itapuã (HCI) surgiu em 11 de maio de 1940, aten-dendo a uma política de saúde pública que segregava indivíduos portadores deHanseníase. Sob essa perspectiva, tivemos a constituição gradual de uma comuni-dade que procurava reconstituir, no HCI, a sociedade “além muros” que os excluia,chegando a abrigar cerca de 700 pacientes. No início da década de 60, tivemos ocontrole da doença e a diminuição da incidência de casos no Rio Grande do Sul,ocorrendo muitas altas e diminuindo o número de internados.

Assim, tornou-se possível dar abrigo a novos moradores. Em 07 de julho de1972, tivemos o início do Projeto Centro Agrícola de Reabilitação – CAR, resultantede uma política de saúde pública que buscava a reinserção social de pacientes por-tadores de sofrimento psíquico por meio da laborterapia. Foram transferidos para oHCI cerca de 150 pacientes oriundos do Hospital Psiquiátrico São Pedro. Emborauma novidade na política de saúde mental, a mesma reforçou o caráter asilar doHospital.

Este trabalho procura relatar a história desses pacientes dentro da instituiçãoem uma perspectiva social, objetivando analisar o que foi feito para reintegrar estesegressos do internamento compulsório à sociedade, ao longo dos 61 anos do Hospi-tal Colônia Itapuã.

Palavras-Chave: Saúde Pública; Hanseníase; Laborterapia; Exclusão social;Reinserção social.

Fundado em 1940, o Hospital Colônia Itapuã (HCI) surgiu para abrigarindivíduos portadores do Mal de Hansen. O HCI insere-se em um contextoonde as políticas em saúde pública visavam à exclusão social de portadoresde doenças contagiosas como a Tuberculose e a Hanseníase, como já acon-tecia com portadores de Sofrimento Psíquico. O Hospital possuía o objetivode segregar pacientes hansenianos do convívio social, confinando-os em umlocal longe dos centros urbanos. A área escolhida para a implantação do Hos-pital foi a antiga Fazenda Santa Clara, adquirida pela Sociedade BeneficenteLeprosário Rio-Grandense.

1 Coordenador do Centro de Documentação e Pesquisa do Hospital Colônia Itapuã daSecretaria de Estado da Saúde do Rio Grande do Sul, e-mail: [email protected] Estagiária e pesquisadora do Cedope/Hospital Colônia Itapuã, e-mail:[email protected]

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Artur Henrique Franco Barcelos et al.

144 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

Esta aquisição se fez com o apoio do Governo do Estado do Rio Grandedo Sul e do Governo Federal e ficava localizada em Itapuã, município deViamão. Ao retirar estes indivíduos do convívio social, cumpria-se um duploobjetivo: evitar a propagação da doença e preservar a frágil aparência saudá-vel da sociedade. A criação do HCI atendeu, desta forma, a uma política na-cional de controle e prevenção da lepra implantada nas primeiras décadas doséculo XX e que viabilizou a construção de diversos leprosários, com caracte-rísticas similares, em vários estados do país. Desde o início, o Hospital con-tou com o trabalho voluntário das Irmãs Franciscanas de Penitência e Carida-de Cristã, para as quais, mais tarde, foi instalada uma residência. Os portado-res do Mal de Hansen eram identificados pelo Serviço de Profilaxia da Lepra,ao qual cabia providenciar a internação dos casos em que houvesse risco decontágio. Vinha uns caminhão cheio de doente. É que pegavam em casa,sabe? Que coisa mais triste. Pegavam e nem deixavam se despedir dafamília...(L.K.)2

A infra-estrutura das dependências e a sua distribuição no espaço geo-gráfico davam ao HCI um aspecto de uma microcidade, com instalaçõescomo escolas, igrejas, enfermarias, padaria, lavanderia, refeitório, cadeia eprefeitura, entre outras estruturas urbano-institucionais. Este micro-universodividia-se em duas áreas, a área suja/doente, como era chamado o local onderesidiam os pacientes, e a área limpa/saudável, onde residiam os médicos,as Irmãs Franciscanas e alguns funcionários As áreas eram delimitadas porcercas que impediam a circulação dos pacientes fora de seu espaço. O obje-tivo da criação deste espaço auto-sustentável era evitar que os pacientestivessem contato com a sociedade.

Analisando-se o cotidiano da vida no interior da Instituição é possívelperceber que os pacientes buscavam reproduzir aspectos da sociedade ex-terna que os havia excluído. Assim, ocorriam muitos casamentos, porém, tan-to estes casamentos quanto os filhos destes pacientes envolviam medidasjurídicas, como as previstas pelo Decreto nº 7558 que regulamentava, noBrasil, o tratamento de doentes em leprosários, de 11 de novembro de 1938:

[...]Art. 94 – e) o casamento entre doentes de lepra internados só será reali-zado com assentimento da administração dos estabelecimentos, queatenderá, salvo casos especiais, à sua oportunidade em relação ao esta-do da evolução da doença e à capacidade da seção destinada à habita-ção dos casados;f) os filhos de doente de lepra, logo após o nascimento, embora um sódos progenitores seja doente, serão separados e mantidos até à adoles-cência, quer em vigilância em domicílio, quer em preventórios especiaisque, quando localizados na área do estabelecimento, ficarão anexos àzona de habitação das pessoas sãs, não podendo em caso algum ser

2 Todos os depoimentos de paciente possuem consentimento informado.

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nutridos no seio de uma ama nem amamentados pela própria mãe, seesta estiver doente de lepra (Brasil, 1938).

Os filhos dos pacientes eram encaminhados ao Amparo Santa Cruz,construído em julho de 1940, no bairro Belém Velho, em Porto Alegre, a fimde se evitar o contágio. Esta medida teve várias conseqüências sobre aestruturação familiar dos pacientes, o que é percebido na documentação daInstituição, onde se constata uma grande incidência de casos de criançascom problemas emocionais e, principalmente, pelos depoimentos dos pacien-tes:

Ah, as crianças... agora chegou num ponto que tocou fundo o coração dagente. Quando a mulher ganhava nenê na enfermaria, o filho era arran-cado dos braços da mãe e levado pro Amparo. Naquela época não podiater criança aqui dentro, não deixavam, não era permitido, não que nemagora. Eu ia uma vez por mês lá visitar as minha guria, a Maria e a Isabel(N.T.T)3.

Com o avanço no tratamento da doença e a diminuição da sua incidên-cia no Rio Grande do Sul, no final da década de 50, não se fazia mais neces-sário o internamento compulsório, que foi abolido por lei em 1954. Assim, ospacientes poderiam voltar a seus locais de origem. Isto levou a uma diminui-ção de pacientes, que passaram de 700 para 340, em 1960.

Apesar do internamento ter deixado de ser compulsório na década de60, foi somente em 1987 que os filhos dos pacientes receberam permissãopara permanecerem na Instituição, o que foi acontecendo gradualmente.Ocorreram problemas de adaptação entre pais e filhos que haviam perdido oconvívio por longos anos. Muitos pais preferiram que seus filhos permane-cessem no Amparo até a idade limite, 16 anos4, alegando que na Colônia nãohavia condições de estudarem e obterem uma profissão. De fato, a EscolaInterna não fornecia qualquer tipo de diploma ou comprovante de escolarida-de. Neste sentido, observou-se que havia uma relutância em trazer as crian-ças, em sua maioria já adolescentes, para o HCI. Na análise da documenta-ção, foi observada a permanência de dois jovens no Amparo que ultrapassa-ram a idade limite e lhes foi estabelecida a data para que abandonassem aInstituição. Ocorre que, apesar destas crianças muitas vezes passarem perí-odos de férias de 20 ou 30 dias com seus pais no HCI, como é verificado naleitura de ofícios existentes no arquivo do Cedope/HCI, havia pouco contato

3 Esta preocupação com a relação familiar é verificada na documentação disponível, conformese constatou em ofícios da diretora do Amparo à assistente social do HCI, enfatizando a impor-tância do contato com os pais na educação das crianças e propondo um encontro para queesta questão fosse discutida.4 Conforme o Estatuto e o Regulamento do Instituto Assistencial Infanto-Juvenil, documentodo Amparo Santa Cruz à diretoria do HCI, de 30 de março de 1978, arquivo do Cedope/HCI.

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entre pais e filhos5. Outro limite ao contato entre pais e filhos dava-se pelofato de que o mesmo somente poderia ocorrer quando os pais tivessem con-dições clínicas de recebê-los6. Porém, pela história oral são desvendadosaspectos ignorados desta realidade (Constantino, 2001). É com base nosdepoimentos dos sujeitos históricos que conseguimos compreender de formamais explícita o quanto estas medidas de prevenção, que segregavam com oobjetivo de curar e evitar o contágio, contribuíram para a efetiva destruição daidentidade destes pacientes, não apenas no que se refere ao convívio social,mas à sua constituição familiar:

Às vez eu tou revoltada aí, sabe o quê? Porque nóis ganhava as criançajá ia embora pra lá, só via quando nascia né, depois quando ficava boa agente tinha ordem pra ir lá visitar eles, mas ficar aqui não, não ficava comos pai. Então esses tempo, já faz muito tempo, a diretora lá do... ela veoaí e fez uma reunião lá na enfermaria, chamou todos os pai pra ir lá, daíeu fui, não sabia o que era. Daí ela disse que agora quem quiser trazer osfilho pra cá morar com os pai pode trazer... todo mundo ali ficou quieto, eulevantei em pé e disse assim: Não, a senhora vai me desculpar, os meusnão vêm pra cá morar aqui, porque quando eles nasceram não deixaramficar com nós, mandaram pra lá e agora que tão grande que podetrabalhá... os meus não... tão tudo trabaiando, tão vivendo a vida deles...(L. do P. B.)

Neste contexto, temos a relutância dos pais em aceitar seus filhos e arelutância dos filhos em aceitarem não apenas os pais, mas o próprio espaçoa que estes pertencem. Não havendo alternativas, estas crianças são enca-minhadas ao HCI, verificando-se a dificuldade de adaptação com a incidênciade casos onde os jovens passam a sofrer de depressão, identificando o Am-paro como sua casa7. O que chama a atenção é o caso de uma filha adotivade um casal de hansenianos, a qual passa a residir com os pais aos 16 anos,que revela preconceito em relação à doença, como pode ser verificado emum documento destinado ao Hospital Psiquiátrico São Pedro, onde consta aevolução de seu comportamento: Há mais ou menos três anos começou a ternojo / repulsa dos pais adotivos, ofende-os de leprosos e tudo mais. Acha quepode contagiar-se. Está extremamente rebelde e agressiva, fazendo amea-ças de matar a mãe adotiva e se matar após [...]8. Percebe-se que a questãoda doença não foi trabalhada com estes menores de maneira a conscientizá-los a respeito das formas de contágio ou mesmo das razões que culminaramna institucionalização de seus pais. Sem dúvida, o internamento compulsório

5 Ofício da direção do HCI para a direção do Amparo Santa Cruz, de 20/12/1983. (arquivo doCedope/HCI).6 Ofício do Amparo Santa Cruz para a assistente social do HCI, de 07/05/1981. Arquivo doCedope/HCI.7 Estudo de caso do Serviço Social do HCI, de 30/04/1983, arquivo do Cedope/HCI.8 Secretaria da Saúde e do Meio Ambiente. Hospital Colônia Itapuã. Evolução e prescrição docaso de paciente ao Hospital Psiquiátrico São Pedro. (Arquivo do Cedope/HCI).

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não mutilou apenas a identidade dos portadores do Mal de Hansen, mas tam-bém de seus familiares e, principalmente, de seus filhos concebidos nesteambiente asilar, onde se buscava a reprodução da sociedade além muros. Oque deve ser enfatizado é que estes menores não foram abandonados porseus pais, isto foi imposto por Lei, como forma de se evitar o contágio. Nestecenário, as visitas eram realizadas através da cerca que separava os doismundos, sem que houvesse o contato físico, ou seja, pais e filhos apenas seobservavam. Os bebês eram levados assim que nasciam, as mães não podi-am nem amamentá-los e só os veriam um mês depois. Esta ruptura de laçosfamiliares neste ambiente já tão frágil, no que se refere ao estabelecimentode vínculos, onde se estava preso sem se ter cometido crime algum, interferiude forma a agravar a fragilidade emocional destes pacientes, que se viamsem o direito de viverem como cidadãos livres. Estavam presos por estaremdoentes e, na tentativa de reconstituírem suas vidas, não podiam criar seusfilhos. O regulamento asseverava que só em casos especiais os doentes po-derão se ausentar do estabelecimento por tempo limitado, mediante licença econdições fixadas pelo respectivo diretor (Brasil, 1938).

Sob esta perspectiva, percebe-se que a aproximação entre pais e filhosfoi realizada de forma gradual. Inicialmente, a distância era considerada umanorma necessária para garantir a saúde das crianças, havendo um contatoapenas visual através da cerca. Posteriormente, para aqueles com condiçõesclínicas favoráveis, tornou-se possível visitar os filhos no Amparo, como podeser verificado nos depoimentos, realizando-se passeios específicos para es-tas visitas. Após este processo de contato físico inicial, temos uma incipienteconvivência diária, tornando-se possível trazer as crianças para passarem asférias junto aos pais. E, por fim, há a liberação para que os menores passas-sem a viver com seus pais, o que não deixa de ser uma necessidade impostapelo Amparo, na medida em que estes somente poderiam ser abrigados atéos 16 anos de idade. Desta forma, percebe-se uma inicial ruptura que procuraser resgatada de forma processual, porém não intencional. Ou seja, não foifeito um trabalho social pensado para que esta convivência fosse possível, osfatos apenas se encaminharam neste sentido, pois era a única solução, vistoque a doença estava controlada e os filhos não tinham mais idade para per-manecerem no Amparo. Havia, contudo, a necessidade de haver desenvolvi-do um trabalho com estas crianças, no sentido de compreenderem os moti-vos pelos quais estavam afastadas do convívio familiar. A partir do momentoem que se tornaram possíveis as primeiras relações de convivência, seriamnecessários esclarecimentos a respeito da doença e suas formas de contágioe prevenção, o que evitaria que os filhos sentissem receio de contrair a doen-ça, passando a agir de forma preconceituosa, rejeitando seus pais.

Na medida em que os pacientes passaram a ter o direito de abandonara instituição ou, posteriormente, a permissão para que seus filhos pudessemresidir nas dependências do Hospital, pôde-se refletir sobre o que foi feitopara reintegrá-los ao convívio social. Podemos designar tais ex-pacientes

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como pessoas egressas do cárcere, pois haviam sido retiradas de seus locaisde origem e obrigadas a permanecer em um mesmo espaço de forma com-pulsória por um longo período. Muitas destas pessoas que puderam sair doHCI não foram aceitas em suas comunidades de origem e acabaram voltandopara o Hospital, constituindo-o em um espaço asilar. Entre os egressos queconseguiram se reintegrar, muitos tiveram que esconder o seu passado, oseu internamento no HCI. Temos outros, entretanto, que nem ao menos ten-taram a reintegração social, pois já não possuíam qualquer vínculo com asociedade que os excluiu.

A comunidade tinha medo. É medo da doença. Primeiramente, ninguémse misturava. Tinha muito preconceito em relação aos pacientes. Olhaisso, pode ver que alguns mudavam de nome e tudo mais. Porque elesforam tirados da sociedade e colocados lá. E para ninguém reconhecê-los, trocavam de nome. Algumas famílias não considerava eles (IrmãFranciscana S. M. H.).

Pela análise da documentação do período, percebe-se que nenhum tra-balho foi realizado no sentido de recuperar a cidadania e a auto-estima dospacientes. Ao iniciarem seu tratamento, os pacientes não possuíam nenhumcontato com a família por meses e, quando este finalmente ocorria, era portrás da cerca que separava o mundo dos sadios do mundo dos doentes. Estabarreira que separa o internado do mundo externo, impedindo as visitas e assaídas, faz com que ocorra o rompimento do indivíduo com o seu papel ante-rior, ou seja, com o seu papel de cidadão livre e uma avaliação da perda destepapel (Goffman, 1999). O indivíduo perdia sua liberdade, não havia mais odireito de ir e vir. Este, agora era membro de um mundo à parte, criado paraabrigar aqueles que possuíam Lepra como o fator determinante em comum.Os pacientes procuravam se integrar e interagir com o conjunto de normasimpostas9 neste micro-universo, assimilavam e/ou modificavam tais normas,tornando o HCI o seu local de moradia e vida.

A estrutura interna da Colônia separava em pavilhões os homens e asmulheres. Aqueles que se casassem passavam a morar no pavilhão doscasados, até que houvesse uma casinha disponível10. Os casados, em suamaioria, viviam em casas geminadas, sendo dois casais por casa. A educa-ção das crianças não era formal. Os meninos e as meninas recebiam aulasem separado e os conteúdos não iam muito além da alfabetização básica,matemática e catequese. Estas crianças não eram filhas dos pacientes que

9 No acervo do Centro de Documentação e Pesquisa do HCI (Cedope) encontra-se uma sériede regimentos internos de diferentes anos que procuravam regular a vida dos doentes.10 As “casinhas”, termo utilizado pelos pacientes, eram destinadas exclusivamente aos casa-dos. Eram casas geminadas, com dois quartos, sala, cozinha e banheiro, em que habitavamdois casais. Hoje os pacientes moram com seus familiares e podem modificar a estrutura da“casinha” como desejarem, sob a supervisão do Serviço de Arquitetura e Edificação do HCI(SAE), alguns pacientes da internação psiquiátrica também residem nestas instalações.

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se casavam dentro do Hospital, mas sim, daqueles que vinham para o HCIdoentes, em muitos casos, sem sua família. Sendo assim, foram definidospavilhões para meninas e para meninos, os quais os pacientes denominavamde Internato.

A vida dos internados era regulada pela existência de uma Prefeitura deInternados, a qual era subordinada à direção do Hospital. Pela análise dadocumentação da Prefeitura, percebe-se a existência de uma série de Proto-colos de solicitações de pacientes a fim de obterem permissão para recebe-rem visitas11, realizarem partidas de futebol12, realizarem bailes13 ou solicita-ções para mudança de dependências14, enfim, a direção procurava controlartoda a rotina dos pacientes. Esta imposição ao paciente de ter que solicitarpermissão para realizar atos que pessoas podem executar de forma espon-tânea no mundo externo, como receber visitas e jogar futebol, o coloca emum papel submisso, coibindo a sua liberdade de ação (Goffman, 1999). Se-gundo o Decreto 7.558/38, as visitas deveriam obedecer às disposições doregimento interno do Hospital. Em ofício do auxiliar da Prefeitura dos Interna-dos ao Diretor do HCI, do ano de 197315, encontramos uma crítica dos pa-cientes ao regimento interno, principalmente no que se refere às visitas:

[...] Como é do conhecimento de V.S., nem um Diretor que passou poreste Hospital, nestes últimos 10 anos, conseguiram solucionar os proble-mas das visitas. Conseguiram piorar ainda mais a situação, entre interna-dos e visitantes. Muitos de nossos visitantes deixaram de vir nos visitar,pois uma hora podiam entrar livremente e ficar até alguns dias, outrahora, chegavam no portão de entrada, lá estava a ordem: é expressa-mente proibida a entrada de visitantes.

No HCI, estavam pessoas internadas de forma compulsória, que foramafastadas não apenas do convívio social, mas também do contato físico comseus familiares e obrigadas a dividirem o seu espaço com pessoas estra-nhas. Pessoas que perderam seus direitos civis, podendo se fazer umaanalogia ao tratamento empregado aos leprosos na antigüidade, onde umacerimônia simbólica declarava o indivíduo doente como morto em termos ci-vis (Albuquerque, [199-?]). Um trabalho e uma política de reinserção social,não apenas para que os pacientes não viessem a sofrer com o preconceito,

11 Protocolo nº 37/83, de 21/12/83, onde o paciente solicita à direção permissão para que seussobrinhos e cunhada permaneçam no HCI no período de 21 a 25 de dezembro de 1983. Unida-de / Prefeitura no acervo – Cedope/HCI.12 Protocolo nº 35/83, de 16/11/83, onde o paciente solicita à direção permissão para a realiza-ção de uma partida de futebol em 20/11/83. Unidade / Prefeitura - acervo do Cedope/HCI.13 Solicitação de pacientes à direção para a realização de um baile em 24/02/79. Unidade /Prefeitura -acervo do Cedope/HCI.14 Solicitação de paciente à direção a fim de obter permissão para ocupar um rancho na LagoaNegra, em 18/12/78. Unidade / Prefeitura – Cedope/HCI.15 Ofício do auxiliar da Prefeitura dos internados ao diretor do HCI, em 15/11/1973 (arquivo doCedope/HCI).

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mas também para que tivessem condições financeiras para o seu sustentoalém muros, seriam absolutamente necessários, visto que lhes fora negado,de forma compulsória, o direito ao trabalho. O Decreto 7558/38, já referido,estipulava ao hanseniano: não exercer profissão ou ofício que, a juízo da au-toridade sanitária, o ponha em contato direto ou indireto com pessoa sã. (Bra-sil, 1938).

Na medida em que o tratamento poderia ser realizado em ambulatórios,salientava-se a existência de um documento que era fornecido pelo HCI aopaciente, para que este entregasse ao Chefe de Serviço de Profilaxia da Le-pra, onde constava que: [...] o expoente é portador do Mal de Hansen [...]deseja fazer tratamento a domicílio, para isto está de acordo em cumprir asdeterminações da Lei Federal nº 610 de Janeiro de 1949, do Decreto 7481 de14 de setembro de 1938 e do Serviço de Profilaxia da Lepra deste Estado. Defato, seria necessário um documento do HCI destinado ao médico responsá-vel pelo tratamento ambulatorial, porém, chamou-nos a atenção o parágrafofinal: Assim sendo, após as diligências que forem necessárias, requerer aV.Excia. se digne a conceder-lhe o isolamento a domicílio que é permitido porlei16.

Os pacientes readquirem o direito de viver em sociedade, mas ao aban-donar seu confinamento, ao atravessar a cerca que divide os dois mundos,alguns trazem nas mãos um documento onde são condenados ao isolamentoa domicílio. Em que difere este isolamento do confinamento asilar? Quasenão percebemos diferença, visto que o isolamento domiciliar somente erapermitido em prédio que não fosse de habitação coletiva, de comércio ou deindústria. O doente não poderia receber visitas sem o consentimento da au-toridade sanitária; somente poderia ausentar-se do domicílio com licença es-pecial desta autoridade e não poderia exercer profissão em que realizassecontato direto ou indireto com pessoa sã. Os filhos destes pacientes seriamafastados e mantidos em preventórios até a adolescência. O não cumprimen-to destas exigências implicaria na remoção do doente para o Hospital de iso-lamento (Brasil, 1938). O tratamento domiciliar pouco diferia do tratamentohospitalar, ambos segregavam e marcavam a pessoa com o estigma da do-ença, um fardo que carregarão por toda vida. Como pode ser percebidopelos depoimentos, o preconceito sofrido por estes pacientes era reiteradoquando regressavam para seus locais de origem ou quando revelavam seupassado:

Eu não tive apoio dos meus colega de serviço, não me aceitaram ... aíentremo num acordo de eu retornar pra cá, eu aceitei, porque aqui eutrabalhava [...] (A. A.).

16 Acervo do Cedope/HCI. Correspondência ao Chefe do Serviço de Profilaxia da Lepra dePorto Alegre, assinada pelo paciente o qual expõe que é portador da doença. Hospital ColôniaItapuã, 17 de Setembro de 1960.

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Não, nunca pra ninguém falei. Agora, só uma coisa eu tinha medo... meufalecido velhinho ele queria é botar uma bodeguinha, eu era contra dizmas eu já não tenho mão boa, vão me perguntar que que deu na mão eporque tem a mão assim e quem sabe um dia a gente se enrola e ficamsabendo da onde nós somos vai ver que não vamo vender um nada [...](C. L.).

Percebe-se que a pessoa realmente continuava isolada, apesar de estarentre a sociedade extra-muros. Estava fadada ao confinamento domiciliar,diferindo da instituição apenas em seu aspecto físico, acentuando-se a soli-dão de sentir-se um doente dentro da área limpa/saudável, onde não seriaaceita se os sadios soubessem do seu passado, da sua origem, da sua iden-tidade. Devido a esta realidade, muitos pacientes voltaram para o seu isola-mento institucional no HCI e outros optaram por omitir sua identidade, deixan-do lacunas na sua história de vida que pudessem revelar sua origem.

Porém, não foi somente o preconceito que fez com que os pacientesretornassem à colônia. O fato de terem sido arrancados de suas casas paraviverem em isolamento causou uma ruptura não apenas familiar e social, mastambém no que se refere ao trabalho. Estes pacientes tinham dificuldades emserem aceitos em suas comunidades de origem e, com isso, grande partenão conseguia retomar para seus antigos empregos. Os pacientes que pas-savam a residir em locais onde eram desconhecidos encontravam dificuldadeem explicar a lacuna em suas carteiras de trabalho, deixada pelo tempo emque permaneceram internados. Assim, trabalhar e reconstruir suas vidas, res-gatar a cidadania perdida pelos anos de confinamento compulsório, tornava-se algo extremamente complexo, onde todos os caminhos pareciam levar aoregresso ao cárcere.

O fato é que os portões foram abertos, o internamento não era maiscompulsório, o direito de ir e vir foi reestabelecido, mas como reinserir estesegressos do HCI ao convívio social? Através da análise da documentação edos depoimentos dos pacientes entrevistados, percebe-se que pouco foi feitoneste sentido. Em um requerimento do vereador Appolinário da Costa, domunicípio de Viamão, de 16 de novembro de 1971, tem-se a solicitação deum auxílio aos hansenianos que desejavam viver fora do Hospital17:

[...] o maior problema social dos Hansenianos é em decorrência da difícilsituação financeira, notadamente nos casos em que o doente não temum auxílio pensão ou mesmo aposentadoria pela previdência social, quelhe permitam viver sem o auxílio de parentes ou mesmo de pessoasamigas.Pois toda criatura portadora de Hanseníase constantemente necessitade controle médico e um tratamento de vitaminas e cálcio, além de outrasdrogas que são de custo elevado, implicando em despesas permanentes.

17 Arquivo do Cedope/HCI.

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Ao pensar no preconceito sofrido por estes pacientes, a conclusão a quefacilmente se chega é de que o maior problema social dos hansenianos era oestigma carregado em virtude da doença. Sem dúvida, a questão financeirafoi preponderante para que regressassem ao HCI, mas o preconceito foi oprincipal fator, pois não permitiu a reintegração social necessária para queestes pudessem trabalhar, se manter e, conseqüentemente, reconstituir suasvidas.

Outro ponto que chama a atenção no trecho citado do requerimento dovereador Appoplinário da Costa é a questão do custo do tratamento. Se esteera realizado de forma ambulatorial em postos de saúde, gratuitamente, nãohaveria de se tornar um fardo oneroso para os pacientes, exceto pela discri-minação social. A constituição de um espaço asilar na Colônia é reforçadapela transferência para o HCI, em 07 de julho de 1972, de cerca de 180 egres-sos do Hospital Psiquiátrico São Pedro, que eram de origem rural. No RioGrande do Sul, a superação do modelo hospitalar centralizado na capital éum tema de discussão desde 1925 (Fagundes, 1992). Este sistema centrali-zado de atendimento, concentrado no Hospital Psiquiátrico São Pedro, de-monstra sinais de fracasso desde o início do século XX, devido àsuperlotação, ao abandono e à cronificação dos doentes (Fagundes, 1992).As primeiras iniciativas neste sentido foi a construção de hospitais psiquiátri-cos regionais. No final dos anos 50, tem-se a criação dos primeiros ambulató-rios de caráter público vinculados ao Hospital Psiquiátrico São Pedro e àsuniversidades (Ibid., 1992).

Nos anos 70, surge a proposta de setorização, ou seja, a criação deserviços de saúde mental por região e por área geográfica. Tal propostapossuia o objetivo central de reduzir o número de pacientes internados noHospital Psiquiátrico São Pedro. Assim, os pacientes permaneceriam juntoàs suas comunidades de origem. Para facilitar a reintegração social de pa-cientes cronificados no Hospital Psiquiátrico São Pedro, foi criado o CentroAgrícola de Reabilitação (CAR), localizado no Hospital Colônia Itapuã. Nestelocal, pacientes masculinos de origem rural seriam reabilitados por meio dalaborterapia, praticando atividades agrícolas. Isto lhes possibilitaria resgatar ovínculo com o trabalho no campo, permitindo seu retorno para as suas comu-nidades no interior do Estado, segundo expectativa do governo estadual.

A vinda destes pacientes, egressos do hospital psiquiátrico, provocouuma reorganização interna da comunidade hanseniana. O espaço físico éreordenado, uma série de pavilhões são desocupados para abrigar os novospacientes e uma cerca é construída, agora dividindo pacientes hansenianos epacientes psiquiátricos.

Com o controle da Hanseníase, este espaço segregador passa a abrigarpessoas que acabaram por se institucionalizar, as quais representavam umnúmero pouco significativo em relação à capacidade do Hospital. Há, portan-to, a necessidade de se dar uma nova utilidade a este local e assim a história,ironicamente, se repete e os loucos passam a habitar o leprosário. Pode-se

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fazer uma analogia com o período final da Idade Média, quando a lepra pra-ticamente desaparece do mundo ocidental, deixado vazios às margens dascomunidades em que viviam, anteriormente, os lazarentos, restam os espa-ços à espera de habitantes. O desaparecimento dos leprosários é interpreta-do por Foucault (1972) não como conseqüência das práticas médicas, mascomo um resultado espontâneo da segregação e da ruptura com os focosorientais de contágio com o final das cruzadas (Foucault, 1972). Os leprososse retiram e deixam vazios seus cárceres à espera de novos ocupantes. Mes-mo com o desaparecimento dos leprosários, o estereótipo do leproso comofigura temida e perturbadora, envolta por panos a fim de encobrir suas cha-gas, insiste em avançar ao longo da história. Mesmo encarada como umamanifestação de Deus, sua segregação é a sua salvação. Pelo abandono,obterão a comunhão, como Lázaro, que morreu em frente a casa do novo-ricoe foi levado diretamente ao paraíso (Ibid., 1972) Mesmo com o desapareci-mento dos leprosos, as estruturas de segregação se mantiveram e os locaisonde funcionavam antigos leprosários passaram a ser habitados por novospersonagens, igualmente marginalizados.

Pobres, vagabundos, presidiários e “cabeças alienadas” assumirão opapel abandonado pelo lazarento, e veremos que a salvação se esperadessa exclusão, para eles e para aqueles que os excluem (Foucault,1972).

Acompanhando a leitura de Foucault, percebe-se que, sob um novo con-texto, as antigas estruturas continuarão existindo, atendendo a uma perspec-tiva que não procura suprimir a doença e sim manter os doentes afastadosem seu cárcere, separando o mundo dos sadios do mundo dos doentes. Osleprosários passam a ser ocupados pelos alienados. O Leprosário de Itapuãpassa a se chamar Hospital Colônia Itapuã e ganha novos moradores: pa-cientes psiquiátricos. A história se repete, porém alguns leprosos ainda per-manecem em seu confinamento, passando a dividir o espaço com os pacien-tes do Centro de Reabilitação para Doentes Mentais Crônicos (CRDMC)18.

Neste ambiente, cujas estruturas de exclusão acabaram por transformarpacientes em moradores19, a vinda de pacientes originários do Hospital Psi-quiátrico São Pedro reforça o caráter asilar e provoca a revolta dos pacientes/moradores que ali estavam. Pelo depoimento dos pacientes, é possível per-ceber que os novos personagens não eram bem-vindos neste espaço criadocomo exclusividade para portadores de Hanseníase:

18 Inicialmente denominado CRDMC, posteriormente denominado CAR (Centro Agrícola deReabilitação), este serviço encontrava-se subordinado ao Hospital Psiquiátrico São Pedro.Atualmente, este serviço denomina-se UIP (Unidade de Internamento Psiquiátrico), formandouma unidade do HCI. Arquivo do Cedope/HCI.19 Estes pacientes são chamados hoje pela instituição de pacientes/moradores do HCI.

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[...] Houve reação do pessoal que já tavam aqui contra esses mental...mas depois se davam bem (L. A. dos S.).

No documento sobre o histórico do Centro Agrícola de Reabilitação eUnidade de Internação Psiquiátrica, encontramos o registro que os morado-res de Itapuã rechaçaram frontalmente a idéia de levar loucos para lá.20

Esta reação dos pacientes hansenianos em aceitar os novos moradoresé perfeitamente compreensível, se pensarmos que estes procuraram repro-duzir a sociedade que os excluiu, fazendo do HCI o seu local de moradia. Aocupação de seu espaço por outros doentes provoca indignação pois, namedida em que estes se institucionalizaram, passaram a ver o HCI comopropriedade sua e trazer estes novos pacientes seria expropriar-lhes do quelhes pertencia:

[...] eles chegaram e tomaram conta do que era nosso. Isso aí já deurevolta em muitas pessoas por causa disso... eu acho que eles não têmdireito de chegar e agarrar as nossas coisa, nós tinha mesa de ping-pong, agora tá lá no CAR (E. N).

O leprosário passa a se tornar também hospício e, novamente, temos aconstituição de dois mundos delimitados por uma cerca21: de um lado os le-prosos e de outro os loucos, dois grupos estigmatizados pela sociedade aolongo da história, dividindo o mesmo espaço. Contudo, apesar de viveremigualmente com o fardo da exclusão social, embora por diferentes razões,houve resistência dos hansenianos em aceitar estes pacientes cronificados.Neste contexto, podemos novamente voltar nosso pensamento para a IdadeMédia, quando a ocupação dos leprosários deu-se, em um primeiro momen-to, por pacientes portadores de doenças venéreas. Esta nova lepra, comodenominada por Foucault, toma o lugar da primeira, tornado-se a nova habi-tante dos leprosários. Houve, neste período, uma resistência dos própriosleprosos em aceitar estes doentes, pois sentiam medo (Foucault, 1972).Foucault destaca que, apesar de os leprosos terem direitos mais antigos deresidirem em seus antigos cárceres, encontram-se em menor número e aca-bam por perderem seus espaços para os doentes portadores de doençasvenéreas e, posteriormente, para os loucos. Essa realidade se confunde como que ocorreu no HCI, porém, ao invés de perderem o seu espaço, oshansenianos passaram a dividi-lo com os pacientes vindos do Hospital Psi-quiátrico São Pedro.

A idéia de se transferir pacientes portadores de sofrimento psíquico parao HCI vinha desde a década de 60, quando tentou-se uma experiência com

20 Histórico do CAR. Unidade de Internação Psiquiátrica, S/D. Arquivo do Cedope/HCI.21 A cerca que separava os pacientes hansenianos dos pacientes portadores de sofrimentopsiquico é retirada em 1990. Arquivo do Cedope/HCI.

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Segregar para curar? A experiência do Hospital Colônia Itapuã

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cinco pacientes. Porém, este projeto foi interrompido, como consta em docu-mento com o histórico do CAR/UIP:

Estes eram visitados semanalmente por uma psiquiatra e adescontinuidade do tratamento aconteceu a curto prazo. Abandonados,os pacientes começaram a voltar para o HPSP. Alguns permaneceramcomo agregados, dedicando-se em troca de alimentação e pousada (Ar-quivo do Cedope/HCI).

Este primeiro movimento, no sentido de libertar estes pacientes de seucárcere manicomial, lhes fornecendo a possibilidade de reabilitação por meiodo trabalho, parece trazer implícita a idéia de servidão, como nos evidencia oregistro acima citado. Inicialmente fadados ao esquecimento, estes pacientespassaram a representar a obtenção de mão-de-obra barata. No período de1972 a 1982, a horta dos pacientes do CAR fornecia verduras, não apenaspara o consumo interno, mas para outras instituições hospitalares da Secre-taria da Saúde e do Meio Ambiente, produzindo o esperado retorno financeirodo Projeto. Os pacientes onerosos para o Estado, que lotavam o HospitalPsiquiátrico São Pedro neste período, ganharam uma nova dimensão com alaborterapia22, na medida em que conseguiam arcar com a sua subsistência,como nos mostra Maria Clementina Pereira Cunha (1986):

A intenção era de que, através do trabalho terapêutico dos internos, seatingisse o estágio de auto-suficiência e, possivelmente, mesmo um pe-queno excedente destinado ao mercado. O louco, que constituía até en-tão um ônus sobre os ombros do governo ou da família, seria de algumaforma reintegrado a um circuito produtivo e arcaria com o custo da suaprópria substancia – condição, aliás indispensável para que se pudesseampliar a escala da assistência (Cunha, 1986).

Segundo a autora, a cura do indivíduo se dá na medida em que esterecupera a sua capacidade produtiva (Ibid., 1986). Nesta perspectiva, em1972, tem-se a fundação do CAR (Centro Agrícola de Reabilitação), inicial-mente denominado CRDMC (Centro de Reabilitação de Doentes Mentais Crô-nicos), o qual, segundo relatório da equipe da UIP, possuía as seguintes atri-buições:

[...] o objetivo primordial de reabilitar pacientes que tivessem alta a curtoe médio prazo, podendo os mesmos serem ressocializados e retornar aoseu meio familiar ou serem preparados para a vida extra-hospitalar emcolônias, fazendas, sítios, etc; com o apoio das Delegacias de Saúde doEstado.

22 A laborterapia visava à recuperação pela reintegração do indivíduo ao mercado de trabalho.

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Havia uma série de critérios para a seleção de pacientes destinados aoCAR. Entre estes, se estabelecia que o paciente fosse de origem rural; quetivesse algum contato com a família ou perspectivas de viver fora do ambien-te hospitalar; que fosse do sexo masculino; que tivesse idade entre 18 e 45anos; que apresentasse, preferencialmente, diagnóstico de esquizofrênicocrônico (Critérios da Divisão Pinel do HPSP).

O que contradiz este objetivo é o fato de o Projeto ser voltado para doen-tes crônicos, pacientes sem possibilidade de reintegração, aos quais era cer-to o destino de terminar seus dias confinados em um cárcere manicomial(Cunha, 1986). Gradualmente, estes critérios tornaram-se mais flexíveis, vis-to que no Hospital Psiquiátrico São Pedro – HPSP já não havia mais pacien-tes com vínculo familiar ou com condições laborativas.

Na medida em que grande parte dos pacientes acaba seinstitucionalizando, o CAR passa a se chamar UIP, adquirindo novos objeti-vos, conforme seus relatórios:

A UIP é uma unidade hospitalar com finalidades de preservar, recuperare elevar a dignidade dos doentes mentais, muitos dos quaisinstitucionalizados e hospitalizados na UIP. Pacientes com alta e devolvi-dos a UIP por problemas não resolvidos em nível ambulatorial ou de ser-viços informais de saúde retornaram à UIP para cuidados intensivos daequipe e reencaminhados a suas localidades de origem.

Neste contexto, a instituição passa a se redefinir. Temos uma populaçãode pacientes/moradores que acaba por formar, no HCI, o seu espaço de mo-radia. A intenção se redefine no sentido de resgatar a cidadania destes pa-cientes através da ruptura com a segregação e da recuperação da auto-esti-ma. Nesse sentido, temos a constituição do Projeto Fazenda Santa Clara, oqual possui entre seus objetivos a implementação de uma proposta terapêu-tica através do resgate da cidadania da população asilada:

Este projeto visa à transformação de uma estrutura, que tinha como polí-tica o isolamento, em um espaço articulador de várias políticas públicascom ações integradas para o desenvolvimento sócio-econômico e cultu-ral da região de Viamão, objetivando a inclusão pela renda, garantindoassistência e potencializando iniciativas de agroindústria envolvendo assecretarias de Saúde, Agricultura, Meio Ambiente, Cultura, Trabalho, Ci-dadania e Assistência Social.

O HCI possui hoje cerca de 185 pacientes institucionalizados, entre por-tadores de sofrimento psíquico e hansenianos, e presta assistência ambula-torial de 24 horas, cuidado odontológico, atendimento psicológico e apoiolaboratorial aos 5000 habitantes da região. Todo o trabalho que vem sendodesenvolvido pela instituição visa à recuperação da cidadania, pois esses ci-dadãos, que de formas diferentes acabaram por retornar ao seu internamento

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Segregar para curar? A experiência do Hospital Colônia Itapuã

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asilar, formam hoje uma comunidade de moradores marcados como regres-sos do cárcere23.

O resgate da história da Instituição serve, agora, para conscientizar ospacientes/moradores de sua importância como sujeitos históricos, contribuin-do para o resgate social. Nesta perspectiva, surgiu o Cedope/HCI – Centro deDocumentação e Pesquisa do Hospital Colônia Itapuã – (Viamão, 1999). As-sim, desencadeou-se um trabalho de história oral, o qual objetiva dar voz àmemória e aos sentimentos vividos ao longo de uma história de exclusão esegregação. No que se refere aos depoimentos, a questão da identidade ad-quire um aspecto especial por meio das lembranças e da construção dasrepresentações do passado, pois as fontes orais fazem parte de um processocognitivo, onde encontram-se presentes memória e história, levando a umreconhecimento da identidade do sujeito como parte integrante do fato histó-rico (Neves, 2000). As memórias podem ser distorcidas, podem mudar ascores das paredes, podem recolocar as cercas em seus lugares, mas são,enfim, interpretações que nos servem para conhecer e elucidar os fatos con-cretos e documentados. Neste sentido, os pacientes re-estabelecem seu vín-culo com a instituição, reafirmando sua cidadania, percebendo que possuemhistórias de vida singulares, mesmo diante da aparente uniformidade dointernamento asilar, e podem re-conduzir sua história atual.

¿Segregar para curar? La experiencia del Hospital Colônia Itapuã

Resumen: El Hospital Colônia Itapuã (HCI) surgió en el 11 de mayo de 1940,atendiendo a una política de salud pública que segregaba individuos portadores deHanseníasis. Bajo esa perspectiva, tuvimos la constitución gradual de unacomunidad que buscaba reconstituir, en el HCI, la sociedad “extra muros” que losexcluía, llegando a abrigar cerca de 700 pacientes. En el inicio de la década de 60,tuvimos el control de la enfermedad y la disminución de la incidencia de casos en elRio Grande do Sul, ocurriendo muchas altas y disminuyendo el número de interna-dos.

De esa manera, se posibilitó dar abrigo a nuevos habitantes. En 07 de julio de1972, tuvimos el inicio del Proyecto CAR (Centro Agrícola de Reabilitação), resultan-te de una política de salud pública que buscaba la reinserción social de pacientesportadores de sufrimiento psíquico por medio de la laborterapia. Fueron transferidospara el HCI cerca de 150 pacientes oriundos del Hospital Psiquiátrico São Pedro.Aunque siendo una novedad en la política de salud mental, la misma ha reforzado elcarácter asilar del Hospital.

Este trabajo busca relatar la historia de esos pacientes dentro de la institución,en una perspectiva social, objetivando analisar lo que fue hecho para reintegrarestos egresos del internamiento compulsorio a la sociedad a lo largo de los 61 añosdel Hospital Colônia Itapuã.

23 Referimo-nos aqui aos egressos do cárcere (internação compulsória) que acabaram, dediferentes formas, retornando à instituição que os segregou de convívio, circulação, trabalho epaternidade/maternidade como de direito aos cidadãos comuns.

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Palabras Clave: Salud Pública; Hanseníasis; Laborterapia; Exclusión;Reinserción.

To segregate or to cure? The experience of the Hospital Colônia Itapuã

Abstract: The Hospital Colônia Itapuã (HCI) was founded on May 11, 1940,assisting on public health politics that segregated individuals bearers of Hansen’sdisease. In such perspective, we had the gradual constitution of a community thattried to reconstitute, in HCI, the society “beyond the walls” that excluded them,sheltering about 700 patients. In the beginning of the 1960’s, there was the control ofthe disease and the decrease of the incidence of cases in Rio Grande do Sul, with alot of discharges and reducing the number of interned patients. Thus, it was possibleto shelter new residents. On July 07, 1972, there was the beginning of the ProjetoCentro Agrícola de Reabilitação – CAR, resulting from public health politics thatlooked for the social reinsertion of patient bearers of psychic suffering through thelabortherapy. About 150 patients originating from the Hospital Psiquiátrico São Pedrowere transferred to HCI. Although an innovation in the politics of mental health, thesame reinforced the character of shelter of the Hospital.

This paper tries to tell the history of those patients inside the institution in asocial perspective, aiming at analyzing what was done to reinstate those peoplecoming from the compulsory internment to the society, along the 61 years of theHospital Colônia Itapuã.

Key-words: Public health; Hansen’s disease; Labortherapy; Exclusion;Reinsertion.

Referências

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A gestão em saúde e sua confecção de imagem: arte política e produção de realidades ...

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A gestão em saúde e sua confecção deimagem: arte política e produção derealidades democráticas 1

David Capistrano Filho2

25 Anos da Revolução dos Cravos3

Resumo: O relato aqui documentado registra as tematizações ouproblematizações tecidas sobre a proposta de gestão em saúde no Rio Grande doSul para o período de 1999 a 2002, apresentada durante o Seminário de Avaliação,Integração e Participação na Elaboração e Execução da Política Estadual de Saúde,realizado nos dias 24 e 25 de Abril de 1999. O autor, convidado a debater os eixospropostos à gestão e as possibilidades de gerar uma adequada visibilidade ao proje-to democrático-popular para a saúde, coloca o compromisso com os usuários dasações e serviços de saúde do SUS e o direito integral à saúde como diretriz em todasas decisões assistenciais, administrativas, educacionais e político-sanitárias. A to-

1 NOTA DO EDITOR: O presente texto corresponde à tematização/problematização apresen-tada por Capistrano Filho acerca das propostas do governo estadual eleito para o mandato1999-2002 por ocasião do Seminário de Avaliação, Integração e Participação na Elaboração eExecução da Política Estadual de Saúde, realizado nos dias 24 e 25 de Abril de 1999. O autordeixou-nos o manuscrito que subsidiou sua argüição e as anotações realizadas durante odebate com a platéia do Seminário. O manuscrito e essas anotações fizeram parte doinstrunmento público de relatoria do Seminário.2 Sanitarista, ex-Diretor do Distrito de Vila Prundente -São Paulo/SP, ex-Coordenador de saúdeem Jundiaí/SP, ex-secretário Municipal de Saúde das cidades de Bauru e Santos no Estado deSão Paulo, ex-Prefeito municipal de Santos/SP, precursor da Lei da Reforma Psiquiátrica Bra-sileira, após a intervenção no Hospício Anchieta (Santos/SP) e a criação/idealização do proje-to Núcleos de Atenção Psicossocial em saúde mental, desafiou a saúde pública brasileira aoatendimento humanizado extra- hospitalar pelo Programa de Internação Domiciliar e desenca-deou o Programa de Redução de Danos para usuários de drogas injetáveis em São Paulo(retirou a cidade de Santos do primeiro lugar na prevalência de Aids no Brasil), implantou oProjeto Qualis de Atenção Integral à Saúde e a Casa de Parto de Sapopemba, ambos em SãoPaulo/SP, primeiro editor da re\rista Saúde em Debate do Centro Brasileiro de Estudos emSaúde (Cebes), um dos diretores da Coleção Saúde e Debate da Editora Hucitec e consultorem gestão e políticas de saúde nos vários âmbitos de coordenação do SUS.3 NOTA DO EDITOR: A epígrafe utilizada por Capistrano Filho se refere à comemoração portu-guesa da queda do regime salazarista. Portugal comemorou, no 25 de Abril de 1999, 25 anosda Revolução dos Cravos, a revolução militar que derrubou o regime ditatorial salazarista. Anoite de 24 para 25 de Abril de 1974 desencadeou o processo revolucionário comemoradopelos portugueses como um tributo à liberdade, à alegria e à democracia. O cravo viria simbo-lizar a revolução quando, em resposta a oferenda de flores aos militares, um deles colocou ocravo vermelho recebido no cano da sua espingarda. A data ficou registrada como o Dia daLiberdade e o movimento das forças armadas como a Revolução dos Cravos, culminada emuma nova Lei Magna para o país, a Constituição de 1976.

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David Capistrano Filho

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nalidade discursiva utilizada pertence ao incentivo ao nascimento de um projeto degoverno com elevada expectativa de inovação e acolhimento dos desafios democrá-ticos e humanistas.

Palavras-Chave: Controle Social; Gestão em saúde; Política de saúde; Secre-taria da Saúde do Rio Grande do Sul; Rio Grande do Sul.

O eixo essencial/central de uma ação governamental deve ser a Defesada Vida. Não como um eixo nos discursos e textos, mas no trabalho em saú-de, com meios técnicos, domínio tecnológico, compromisso com os usuáriose ênfase humanista em todas as decisões assistenciais, administrativas, edu-cacionais e político-sanitárias. A gestão e os conceitos relativos à saúde de-vem estar pautados por uma ética, uma ciência, uma filosofia e uma arte dadefesa da vida.

Para tematizar/problematizar a gestão/atenção à saúde no âmbito esta-dual do Rio Grande do Sul, procurarei localizar os sete pontos que considerocentrais para uma política de saúde de verdade e com qualidade4 :

1. defesa da vida como eixo essencial/central: este ponto sugere que adefesa política por uma vida de melhor qualidade e de maior duração busqueaumentar a qualidade de vida e prolongá-la. Para isto, pode ser necessáriomudar desde as bases, as estruturas técnicas, científicas e tecnológicas comque se trabalha em saúde. É uma luta ideológica de construção de valoresque se contrapõem aos do neoliberalismo; de construção da oposição à má-xima do lucro (e sua eficácia) por valores próprios do humanismo. A luta ideo-lógica na sociedade tenta colocar as necessidades da qualidade de vida comoum devaneio, enquanto propõe os valores do lucro e da eficácia como motiva-ção e mobilização, provocando maior exclusão social;

2. defesa da vida como uma espécie de introdução ou uma espécie deporta aberta à luta contra a aceitação da idéia de que saúde é mercadoria e apopulação sua consumidora, pois isto acaba com a idéia de cidadania. A lutacontra a concepção privatista e liberal que se opera nos serviços de saúde eno discurso profissional da saúde tem de ser feita como defesa da vida, numaperspectiva humanista;

3. compreender a defesa da vida como campo de alianças políticas, re-ligiosas, sociais e como fonte de legitimação dos Governos (Democráticos ePopulares): a saúde é campo privilegiado de consensos e alianças. A saúdepública possui um alto consenso na sociedade brasileira. Os temas da saúdeda criança e da saúde materna possuem alto consenso em nossa sociedade.Criança, Mãe, Saúde e Educação são valores altamente legitimados. A Edu-

4 Saúde de Verdade e com Qualidade é a marca de governo proposta na campanha eleitoralpara a gestão em saúde no Estado do Rio Grande do Sul, no período de 1999 a 2002, configu-rando o mote para o debate que apresento no presente documento.

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cação é mais ambígua, porque eivada de contradições (pode ser iluminista,pode ser libertadora, pode ser o treinamento e habilitação para a competiçãoferoz, pode ser transcendental). Já a Saúde é campo onde se pode encurra-lar as posições do direito à saúde como defesa da criança e da mãe (direito àvida humana) e a defesa da dignidade do idoso, direito a uma vida mais longa;

4. compreender a defesa da vida como o contato com a alteridade: me-dir-se pelo outro, pôr-se na pele do outro; capacidade de indignação,voluntarismo sadio do respeito humano. Pode-se dizer que a política deve sera ciência do necessário e a arte do possível. Uma política de saúde precisado inconformismo e deve ser motor da busca de possibilidades. Oinconformismo é a ruptura dos limites do impossível. Um motor de busca é acapacidade de cobrar, de entusiasmar, de construir o seu próprio carisma, desaber transitar entre o utópico e o imediato, de transitar da globalidade àstarefas pequenas do cotidiano, imbuído da tarefa grandiosa5;

5. conceber “arte” e “ciência” na mudança: como uma guerra política,ideológica, cultural e de sopapos, a mudança é a arte de saber fazer a guerra.A política não deixa de ser guerra, apenas é de outra natureza. Se queremosa paz, temos de nos preparar para a guerra. Esses são ensinamentos quevêm tanto de Sun Tzu, como de Karl von Clausewitz6;

6. construção de uma nova cultura sanitária: é a dissipação das névoasque encobrem os condicionantes da saúde e da doença. É a necessidade derelacionar as condições de vida e trabalho com a saúde, inclusive formandonovos consensos para destruir a ideologia que mascara a relação trabalho-doença. Precisamos construir figuras emblemáticas, experiências eparadigmas da saúde, conceituando-a de forma concreta na sociedade. Amídia funciona como uma glândula maligna que secreta conceitos e valoresnegativos à vida, e precisamos construir heróis novos, para serem copiados/seguidos, influenciarem o pensamento e serem exemplares. Convém lem-brar os ensinamentos de Berthold Brecht (Sobre a confecção de retratos) ede Mao Tsé-Tung, sobre a necessidade de se criar referências concretas quemostrem que é possível construir esta nova cultura sanitária. Se criamos ser-viços/ações que podem ser referidos sempre como aqueles que defende-mos, podemos dizer: não temos todos os serviços perfeitos, mas podemosmostrar o nosso ideal;

5 Quando fizemos, em Santos, a intervenção no Hospício Anchieta, Antônio Lancetti dizia: “oque precisamos fazer agora, além de seguirmos a luta antimanicomial, é prestar os cuidadosmaterno-infantis que os moradores desse manicômio precisam.” Basaglia dizia que precisa-mos insuflar os participantes à luta e também prestar os cuidados maternais àqueles quetemos que cuidar, realizar a maternagem daquilo que queremos ver crescer/desenvolver-se.6 Os ensinamentos lógicos e abrangentes d’Arte da Guerra de Sun Tzu, desde o século IVantes de Cristo, colocam a política como uma estratégia da vida. A política é uma espécie deguerra sem efusão de sangue; a guerra é mesmo uma parte das relações políticas, cujo fim éforçar o adversário a executar a nossa vontade, mas a guerra absoluta, a guerra total, nostermos de Clausewitz, é a guerra popular, onde o sujeito político é o povo. A guerra passa,nestes termos, a coincidir com a soberania do povo.

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David Capistrano Filho

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7. intersetorialidade: trabalhar com as áreas da Educação, do Sanea-mento e do Meio Ambiente, que ajudam a dar governabilidade e legitimidadea um projeto popular para a área da saúde e para a qualidade de vida humana.

Há uma nova mídia no mundo que precisa ser utilizada de maneira deta-lhada, é um trabalho político que combina a difusão da formação de umanova cultura sanitária com as experiências concretas. A maior artilharia paraa guerra está na difusão de informação, a guerra se ganha com a infantaria,mas a artilharia é o seu impacto7.

As linhas estratégicas de trabalho do setor da saúde no Estado do RioGrande do Sul – Descentralização, Regionalização, Formação, Atenção Inte-gral e Fortalecimento do Controle Social – constituem a base e as condiçõesnecessárias para alcançar alguns objetivos de alta relevância, capazes de terimpacto no quadro epidemiológico do estado e de contribuírem poderosa-mente para a construção de consensos e legitimidade do governo eleito pelopovo gaúcho em 1998.

As macrodiretrizes da Secretaria de Estado da Saúde (SES/RS) paraalcançar seus objetivos são: a gestão democrática e participativa e o apoiotécnico e financeiro à descentralização, o ordenamento regionalizado da redede atenção, o impulso ao desenvolvimento da Atenção Integral à Saúde e odesencadeamento de múltiplos processos de formação como meio e estraté-gia de viabilização desses objetivos. Estas macrodiretrizes, associadas àsiniciativas de capacitação de gestores e de conselheiros de saúde e de coo-peração técnica com os municípios, redefinem o papel do setor da saúde noSUS (no país e no Rio Grande do Sul): municipalização com papel ativo dogestor estadual.

Ser governo não significa a mesma coisa em diferentes conjunturas/contextos. Na situação de crise em que vive o país e o Rio Grande do Sul,cujas conseqüências são alto desemprego, destruição dos serviços sociais,empobrecimento acentuado da classe média, exploração dos trabalhadorese ampliação do número de excluídos, a missão de uma Secretaria da Saúdeé a defesa da vida da população, em primeiro lugar dos mais vulneráveis (ostrabalhadores da cidade e do campo, os excluídos em geral, as crianças e osidosos, os jovens vitimados pelas drogas e pela violência, por exemplo).

Não entoar a defesa da vida como a ladainha da qualidade de vida queneutraliza a participação política popular ou as lutas contra-hegemônicas por

7 Com o Qualis se pode aprender muito de artilharia: aprendemos como se forma e se informaa opinião. Não é a TV, são as rádios, aprendemos a disputar os comunicadores através dosformadores desses comunicadores (trazer até esses comunicadores o máximo de figurões emsaúde para que tenham seus relatos e gravações para levar ao ar no dia-a-dia, mostrar-sesempre acessível e pronto para entrar no ar ou realizar uma gravação), juntar os intelectuaisde saúde e agentes de base, fazer jornais locais sobre saúde, aproveitar a experiência dasigrejas evangélicas, distribuir santinhos com frases de saúde etc., é o trabalho da EducaçãoPopular em Saúde.

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A gestão em saúde e sua confecção de imagem: arte política e produção de realidades ...

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 165

maior autonomia e maior poder de decisão, mas Ser governo, isto é, ajudar adesenvolver e difundir uma nova cultura sanitária, cuja síntese é a legislaçãodo SUS e os novos desenhos organizacionais da assistência em implantaçãono país. Ser governo é, também, ser oposição aos governos locais e federalque sustentam e executam a política neoliberal, antinacional e antipopular.

O padrão de referência dos indicadores de saúde no Rio Grande do Sulnão deve ser o Brasil e, sim, o de Cuba e dos países mais desenvolvidos domundo, particularmente o Canadá, a Inglaterra, o Japão e os paísesescandinavos. O trabalho de uma Secretaria da Saúde, em todos os níveis,deve ser concebido como técnico-político. A dimensão política, em nenhummomento, pode passar para segundo plano ou ser esquecida.

Como a guerra, a política exige estratégia, tática, suprimentos, reservas,tropa (infantaria e artilharia), alianças e, sobretudo, audácia. O método daconstrução de situações exemplares e de heróis do novo sistema de saúde éo mais adequado, tanto para disseminar o novo no conjunto dos serviços,como para difundir elementos da nova cultura sanitária em construção.

A intersetorialidade deve ser tenazmente buscada. Decorre da próprianatureza da saúde, resultante de condições de vida e de trabalho onde influ-em a existência ou não de políticas sociais, a estrutura e a conjuntura econô-mica nacional, estadual e, também, local e microrregional.

No Estado do Rio Grande do Sul, onde 80% dos municípios são peque-nos, a saúde pode e deve liderar a discussão de Planos Integrados de Desen-volvimento Rural, por exemplo. As políticas de saúde mental e de saúde doidoso também só podem se desenvolver com o recurso à cooperação de ou-tros órgãos governamentais e de iniciativas da sociedade civil.

Não haverá êxito possível no trabalho de uma Secretaria da Saúde semescolher prioridades e aferrar-se a elas. Onde tudo é prioridade não há possi-bilidade, nem resultado visível do trabalho. Saúde é uma área potencialmentegeradora de prestígio, legitimadora do governo democrático-popular, poden-do, também, ser o contrário. Isso exige uma meticulosa, engenhosa e audaziniciativa na área da comunicação.

Nesse sentido, proponho, com base em tudo que ouvi nas propostas/teses, apresentações e debates neste Seminário de Avaliação, Integração eParticipação na Elaboração e Execução da Política Estadual de Saúde, seteeixos de ação para o setor da saúde e os meios de sua viabilização:

1. reduzir a mortalidade infantil, especialmente nos municípios onde elaainda é superior a 20/1.000 nascidos vivos. Considerar que a mortalidadeinfantil, no Rio Grande do Sul, está concentrada no componente neonatalprecoce e neonatal em geral;

2. melhorar os cuidados pré-natais, a assistência ao parto e aopuerpério, perseguindo os objetivos de promover o parto normal ehumanizado e o aleitamento materno;

3. melhorar a assistência ao idoso, levando em conta a importância des-

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David Capistrano Filho

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se segmento na estrutura demográfica do estado, sua contribuição para amorbi-mortalidade e a utilização dos leitos hospitalares hoje existentes;

4. reorganizar a assistência hospitalar, construindo uma redehierarquizada (complementarizada) de estabelecimentos, em conjunto comos municípios e com os hospitais públicos e filantrópicos;

5. dar prioridade, em termos de vigilância à saúde, à luta contra o usoinadequado de defensivos agrícolas (agrotóxicos) e anabolizantes para ani-mais, protegendo a parcela dos trabalhadores envolvida na agricultura fami-liar e a saúde dos consumidores, além de viabilizar a exportação de produtosagropecuários para os países onde a legislação é rigorosa e observada;

6. apoiar os municípios para o desempenho de suas funções no SUS,especialmente nos itens capacitação de secretários, gerentes de unidades edemais profissionais, mediante cooperação técnica;

7. contribuir poderosamente para a construção e difusão de uma novacultura sanitária, centrada na compreensão do vínculo entre as condições devida e trabalho e os padrões de saúde, na prioridade à prevenção, na promo-ção do autocuidado (desenvolvendo a autonomia das pessoas) e no combateàs concepções hospitalocêntricas e medicalizantes, bem como contra àsidéias de saúde como mercadoria e de cidadãos como meros consumidores.

As principais iniciativas para executar esse conjunto de objetivos (quedevem ser quantificados, ou seja, transformados em metas) são as seguintes:

1. qualificar e expandir a proposta dos Programas Agentes Comunitári-os de Saúde e Saúde da Família como instrumentos adequados para promo-ver a elevação da cobertura e a melhora qualitativa do pré-natal, a assistênciaao puerpério, o aleitamento materno, 100% de cobertura vacinal e o controleda diarréia/desidratação e das infecções respiratórias agudas, na infância;

2. implantar Casas de Parto, operadas por enfermeiros obstetras capa-citados, com os propósitos de incentivar o parto normal, humanizar o parto,reduzir a mortalidade materna e perinatal e descongestionar os hospitais demaior porte que, organizadamente, ficariam responsáveis pelos partos cirúr-gicos e por fórceps, que não deveriam ultrapassar 15-20% do total;

3. construir, em conjunto com a Secretaria do Trabalho, da Cidadania eda Assistência Social e com os municípios, Centros de Convivência utilizá-veis por idosos, para combater a solidão, prevenir o sofrimento mental, pro-mover caminhadas e outros exercícios, bailes e excursões, bem como a ade-são a tratamentos permanentes, como os referentes à hipertensão arterial eao diabetes (mediante grupalização, troca de receitas etc.) e às doenças res-piratórias, como a asma e a doença pulmonar obstrutiva crônica e por outroscidadãos onde a convivência é instrumento de defesa da vida (crianças, ado-lescentes, jovens);

4. definir as funções dos pequenos hospitais municipais e filantrópicosespalhados pelo estado, cerca de 400 no Rio Grande do Sul, podendo neles

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A gestão em saúde e sua confecção de imagem: arte política e produção de realidades ...

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serem sediadas Casas de Parto, leitos para internações de enfermidadesmais simples e de curta duração e cirurgias que até poderiam ser feitasambulatorialmente. Além da definição de funções, a Secretaria da Saúde po-deria ajudar na capacitação de gestores e na elaboração de protocolos clíni-cos;

5. a luta contra o uso inadequado de anabolizantes e agrotóxicos deveassumir as feições de uma verdadeira campanha, envolvendo os municípios,o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (com seus acampamen-tos e assentamentos), a Federação dos Trabalhadores da Agricultura, a Se-cretaria da Agricultura, as Universidades e os órgãos do Ministério da Saúdee do Ministério da Previdência;

6. a ajuda, em termos de capacitação e cooperação técnica aos municí-pios, deve ser uma função primordial da Escola de Saúde Pública, por meiode cursos de curta duração realizados em Porto Alegre ou nas sedes dascoordenadorias regionais de saúde (CRS). Dadas as prioridades, a coopera-ção técnica deve se voltar para programas como o de acompanhamento derecém-nascidos de risco. A Escola de Saúde Pública deve ser menos acadê-mica e mais amplamente envolvida com o máximo de prioridades da SES ouSUS/RS;

7. a construção e difusão de uma nova cultura sanitária não se confun-de, nem se reduz à propaganda. Ela requer a base sólida do trabalho concre-to, ao fim e ao cabo, percebido pela população como prestação de serviços,inclusive os imateriais, exigindo a cooperação com os municípios, conquis-tando dirigentes, técnicos e conselheiros municipais e estaduais de saúde.

A difusão da nova cultura é uma arte: Brecht sintetizou essa arte especí-fica (a de propagar a verdade) em célebre texto intitulado Cinco maneiras dedizer a verdade. Mao apontou um caminho fecundo, especialmente para nósque trabalhamos em regime de economia de guerra.

Para usar o método de Mao, que exortava os chineses a fazer como osque melhor faziam, precisamos montar vitrines. Aí vão algumas sugestões devitrines:

a) uma Casa de Parto em cidade da região metropolitana que não tenhasuficientes leitos obstétricos, após capacitação de um grupo pioneiro de en-fermeiros obstetras;

b) um Centro de Convivência para crianças, adolescentes, jovens e ido-sos;

c) a escolha de um município que será declarado livre de agrotóxicos eanabolizantes;

d) a escolha de um hospital pequeno (máximo de 50 leitos) que seráredirecionado nos moldes da reorganização proposta, inclusive com a defini-ção de sua referência de maior complexidade de recursos instrumentais;

e) a produção de um cartaz e um guia de utilização dos serviços públi-

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David Capistrano Filho

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cos de saúde, centrado na difusão do direito à saúde, incluindo os principaistextos legais (em linguagem clara e resumida). Esse guia pode ser oferecidoaos municípios e entidades sindicais e de movimento popular, que poderãoacrescentar seu logotipo na capa e contribuir para alcançar grande tiragem.

Guerra pelo direito à saúde. Valores humanistas e cooperação técnica efinanceira que evidenciem a saúde como uma nova cultura da solidariedade,não autoritária. Defesa da vida com meios técnicos, domínio tecnológico ecompromisso com os usuários que evidenciem o efetivo cuidado à saúdecom a luta pela autonomia das pessoas. A gestão do setor da saúde deve serum tributo à defesa da vida no próprio trabalho em saúde: democratização dodireito à saúde, descentralização com papel ativo do gestor estadual e fortale-cimento do conhecimento pela população.

La gestión en salud y su confección de imagen: arte política y producciónde realidades democráticas

Resumen: El relato aqui documentado registra las tematizaciones oproblematizaciones tejidas sobre la propuesta de gestión en salud en el Rio Grandedo Sul para el período de 1999 a 2002, presentada durante el Seminario deEvaluación, Integración y Participación en la Elaboración y Ejecución de la PolíticaEstadual de Salud, realizado en los días 24 e 25 de Abril de 1999. El autor, invitadoa debatir los ejes propuestos a la gestión y las posibilidades de generar unaadecuada visibilidad al proyecto democrático popular para la salud, coloca elcompromiso con los usuarios de las acciones y servicios de salud del SUS y elderecho integral a la salud como directriz en todas las decisiones asistenciales, ad-ministrativas, educacionales y político sanitárias. La tonalidad discursiva utilizadapertenece al incentivo al nacimiento de un proyecto de gobierno con elevada expec-tativa de inovación y acogimiento de los desafíos democráticos y humanistas.

Palabras Clave: Control Social; Gestión en salud; Política de salud; Secretariada Saúde do Rio Grande do Sul; Rio Grande do Sul.

The administration in health and its image-making: political art andproduction of democratic realities

Abstract: The report here documented registers the themes or problems whichcame up during the administrative proposal of health in Rio Grande do Sul for theperiod of 1999 to 2002, presented during the Seminar of Evaluation, Integration andParticipation in the Elaboration and Execution of the State Politics of Health, held inApril 24 and 25, 1999. The author, invited to debate the axes proposed to theadministration and the possibilities of generating an appropriate visibility to thedemocratic-popular project for health, places the commitment with the users of theactions and services of health from SUS and the integral right to health as guidelinein all of the assistance, administrative, educational and political-sanitary decisions.

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A gestão em saúde e sua confecção de imagem: arte política e produção de realidades ...

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The discursive tone used belongs to the incentive to the creation of a governmentalproject with high expectation of innovation and reception of the democratic andhumanists challenges.

Key-words: Social control; Administration in health; Politics of health; Secreta-ria da Saúde do Rio Grande do Sul; Rio Grande do Sul.

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ResumoResumoResumoResumoResumo

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Avaliação das condições higiênico-sanitárias em alimentos envolvidos em surto ocorrido no ...

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 173

Avaliação das condições higiênico-sanitárias em alimentos envolvidosem surto ocorrido no município deAntônio Prado/RS – Janeiro de 1999

XVII Congresso Brasileiro de Ciência e Tecnologia de Alimentos, 08 a 10 de gostode 2000, em Fortaleza, CE.

Anita Mércio D’Andrea1

Helena Jansson Rosek1

Maria do Céu Borralho e Albuquerque1

Yara Elisabetha Rampanelli1

O trabalho de investigação de surtos de enfermidades causadas por alimentos,pelo serviço de Vigilância Sanitária, permite estabelecer medidas que garantam ainocuidade dos mesmos. A ocorrência de surto de origem alimentar, envolvendo600 pessoas, foi investigada pela Vigilância Sanitária Municipal. Cerca de 15 horasapós a ingestão dos alimentos, iniciaram os sintomas: náuseas, vômitos, cólicascom distensão abdominal, diarréia, febre e dor de cabeça. Aproximadamente 164pessoas foram hospitalizadas no Hospital São José, no Município de Antônio Prado.O presente trabalho relata a contribuição com a Vigilância Sanitária, no sentido deprocurar isolar o provável agente causador do surto e conhecer a epidemiologia datransmissão de enfermidades por alimentos. Os alimentos enviados ao LaboratórioCentral (Lacen) foram: sopa de agnoline; carne lessa; pescoço recheado; carne degado assada e crua; creme de maionese caseira; bolo; pão; alface; pimentão; repo-lho; tomate; mortadela; presunto; queijo fatiado; ralado e de fôrma; frango assado ecru. Também foram remetidas amostras de água, sendo uma da fonte de abasteci-mento municipal e outra do reservatório do salão onde ocorreu a confraternização.Todas as análises de alimentos foram realizadas seguindo as metodologias reco-mendadas pelo Compendium of Methods for the Microbiological Examination ofFoods, da American Health Association (APHA)2 e os padrões adotados foram os daPortaria SVS-MS nº 451, de 15.09.97. Para análise da água foi realizada a pesquisade coliformes totais e E.coli, em 100 ml de amostra, de acordo com a técnica dosubstrato cromogênico, recomendada pelo Standard Methods for Examination ofWater and Wastewater3 e os padrões de referência foram os indicados na Portaria

1 Técnico da Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde/Fepps – Laboratório Cen-tral de Saúde Pública/Lacen, e-mail: [email protected] AMERICAN PUBLIC HEALTH ASSOCIATION. Compendium of methods for themicrobiological examination of foods. 3th ed. 1992. cap. 25, p. 371-415.3 AMERICAN PUBLIC HEALTH ASSOCIATION. Standard methods for examination of waterand wasterwater. 9th ed. 1995, p. 64-65.

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Anita Mércio D’andrea et al.

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MS nº 36, de 19.01.90. De um total de 19 amostras recebidas e analisadas, verifi-cou-se a presença de Salmonella sp e de coliformes fecais em 11 (57,8%); deStaphylococcus aureus em 7 (36,8%); de clostrídios sulfito redutores em 4 (21,05%)e de bolores e leveduras em 1 (5,2%). As amostras de água também estavam emdesacordo com a legislação, no que se refere à potabilidade (consumo humano),pela presença de coliformes totais e Escherichia coli.

As Enfermidades Transmitidas por Alimentos são um grave problema de saú-de pública em todo o mundo4 e o presente estudo buscou contribuir com dados parao conhecimento epidemiológico dos agentes causadores das patologias manifesta-das. O número de amostras que apresentaram microrganismos potencialmente ca-pazes de causar Enfermidade Transmitida por Alimento, bem como a presença deindicadores de condições higiênico-sanitárias deficientes, apontam para possíveisfalhas nas condições de processamento e/ou armazenamento dos alimentos ofere-cidos para consumo, aumentando a probabilidade de contaminação do produto porbactérias patogênicas. Não foi possível isolar os microrganismos em amostras pro-venientes dos manipuladores, pois este material não foi enviado ao Lacen, o queprejudicou o fechamento do surto. A atuação da Vigilância Sanitária em todas asesferas é fundamental, proporcionando programas de treinamento aosmanipuladores de alimentos, promovendo a segurança alimentar e objetivando, fun-damentalmente, à diminuição de surtos que, além de causarem prejuízos à saúde dapopulação, acarretam significativas perdas econômicas para o estado5.

Palavras-Chave: Surto; Enfermidades; Alimentos.

4 FOOD AND DRUG ADMINISTRATION BACTERIOLOGICAL ANALYTICAL MANUAL. 8th ed.Arlington: AOAC, 1995. cap. 5, p. 1-20.5 Pode-se perfilar este estudo aos de D.S.Gelli et al. (Surto de enfermidades transmitidas poralimentos investigados pelo Laboratório de Saúde Pública do Estado de São Paulo, no períodode 1994 a 1998. In: Congresso Brasileiro de Microbiologia, 20, 1999, Salvador-BA) e A.M.M.Simões et al. (Avaliaçãoda qualidade microbiológica das refeições servidas por uma unidadede alimentação e nutrição de Salvador -BA, no período de 1998. In: Congresso Brasileiro deMicrobiologia, 20, 1999, Salvador-BA).

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Avaliação de produtos importados analisados no Lacen do Rio Grande do Sul – 1999

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 175

Avaliação de produtos importadosanalisados no Lacen do Rio Grandedo Sul – 1999

XVII Congresso Brasileiro de Ciência e Tecnologia de Alimentos, 08 a 10 deagosto de 2000, em Fortaleza, CE.

Anita Mércio D’Andrea1

Débora Cecconi Fulginiti1

Helena Jansson Rosek1

Lúcia Maria Guedes Diefenbach1

Maria do Céu Borralho e Albuquerque1

Rosaleine Grando1

Yara Elisabetha Rampanelli1

Com a criação do Mercosul e a crescente abertura do mercado internacional,desenvolveu-se a internacionalização da economia brasileira. Os laboratórios preci-sam estar preparados para atender à demanda de análise de alimentos que entramem nosso País. Com a preocupação de assegurar a qualidade de alimentosofertados, oriundos de outros países, foram realizadas diversas análises de váriosprodutos importados. Esta modalidade de análise atende ao programa realizado jun-to ao Ministério da Saúde, por meio da Vigilância Sanitária de Portos, Aeroportos eFronteiras. Do ponto de vista da saúde, os conceitos de sanidade e de qualidadenão podem ser considerados isoladamente. Um produto pode estar atendendo aospadrões de qualidade usualmente aceitos porque estes padrões são relativos àscondições físicas e organoléticas e estar sanitariamente inadequado porque contémagentes ou substâncias prejudiciais à saúde, não detectáveis pelos órgãos dos sen-tidos. Os laudos analíticos têm papel fundamental para a liberação dos respectivoslotes, sendo necessários para posterior comercialização desses produtos. Estetrabalho teve como objetivo conhecer a qualidade de alguns alimentos importados ecomercializados no estado do Rio Grande do Sul. Durante o ano de 1999, foramcoletados 187 produtos importados para análise fiscal junto ao Laboratório Central(Lacen). Os alimentos enviados foram os seguintes: massa de grão duro, carne bo-vina em conserva, molho de ostras, pó instantâneo para bebida nutritiva, chás, leitede côco natural, açúcar de palmito, bebida sauza margarita, pêssegos em calda,presunto, lombo suíno, pernil suíno defumado e curado, mortadela, batata chip frita,funcho e mangerona, provenientes de diversos países. Todas as amostras foramanalisadas microbiologicamente, dependendo do tipo de alimento, quanto à presen-

1 Técnico da Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde/FEPPS – LaboratórioCentral de Saúde Pública/Lacen, e-mail: [email protected].

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Anita Mércio D’Andrea et al.

176 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

ça de Salmonella sp, coliformes fecais, Staphylococcus aureus, Bacillus cereus, bo-lores e leveduras e prova de incubação (Laboratório de Microbiologia). Nas amos-tras de massa, foram feitas, ainda, pesquisa de fragmentos de insetos (Laboratóriode Microscopia) e determinação de acidez, umidade e resíduo mineral fixo (Labora-tório de Físico-Química). Nas amostras de funcho e mangerona, o laboratório demicroscopia realizou pesquisa de matéria estranha. Todas as análises seguiram mé-todos oficiais, sendo as microbiológicas segundo as metodologias recomendadaspelo Compendium of Methods for the Microbiological Examination of Foods daAmerican Health Association (APHA )2 e os padrões adotados foram os da PortariaSVS-MS nº 451, de 15.09.97. Todas as amostras (100%) se encontraram própriaspara o consumo em todos os aspectos analisados. Apesar desse resultadosatisfatório, é importante dar continuidade a este programa junto à Vigilância Sanitá-ria do Ministério da Saúde, em relação aos produtos que chegam ao nosso estado,com a finalidade de garantirmos a saúde da população com relação ao consumoseguro desses alimentos. De acordo com os resultados apresentados, concluímosque estão sendo oferecido ao consumidor produtos de boa qualidade, em relaçãoaos parâmetros analisados, com poucos riscos de agravos à saúde.

Palavras–Chave: Análise; Qualidade; Alimentos importados.

2 AMERICAN PUBLIC HEALTH ASSOCIATION. Compendium of methods for themicrobiological examination of foods. 3th ed. 1992. cap. 25, p. 371-415.

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Atos NormativosAtos NormativosAtos NormativosAtos NormativosAtos Normativos

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Portaria Nº 16/1999

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 179

Portaria Nº 16/99

Institui o Programa de Residência Integrada em Saúde

Considerando:a) que compete aos gestores do Sistema Único de Saúde exercerem, em seu

âmbito administrativo o ordenamento da formação de recursos humanos daárea, bem como a proposição de prioridades, métodos e estratégias para aformação e educação continuada dos recursos humanos do SUS na esferacorrespondente, conforme a Lei Orgânica da Saúde (Lei Federal nº 8.080 de1990, Art. 6º e Art. 14);

b) que compete também aos Estados em seu âmbito administrativo a partici-pação na formulação e desenvolvimento de recursos humanos para a saú-de, conforme a Lei Orgânica da Saúde (Lei Federal nº 8.080 de 1990, Art.15, Inciso IX);

c) que a formação ocupa papel estratégico na condução da política de saúde;

d) que uma política de saúde em defesa da vida exige o compromisso dosgestores em efetivar a integração ensino-serviço;

e) que a qualificação dos trabalhadores em saúde requer a montagem de ativi-dades formativas contextualizadas nas necessidades sociais e no compro-misso com a reorganização das estratégias de atenção à saúde, principal-mente pelas noções de parceria, interdisciplinaridade, práticamultiprofissional e transversal, resolubilidade loco-regional, humanizaçãoda assistência e vínculo entre usuários e trabalhadores em saúde;

f) a necessidade de captação para trabalhadores de diferentes profissões denível superior para exercerem, com familiaridade, as funções estratégicasde qualificação do Sistema Único de Saúde;

g) a condição qualificada de assistência à saúde, aliada à longa experiênciaem Programas de Residência Médica em órgãos próprios da SES/RS, comoo Centro de Saúde Murialdo, o Hospital Psiquiátrico São Pedro e o Ambula-tório de Dermatologia Sanitária;

h) a experiência e competência da Escola de Saúde Pública da SES/RS nodesenvolvimento de recursos humanos e a parceria que este órgão vemdesenvolvendo com diferentes instituições universitárias e demais órgãosformadores em saúde.

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Portaria Nº 16/1999

180 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

RESOLVE:

Artigo 1º – Criar o Programa de Aperfeiçoamento Especializado no âmbito doEstado do Rio Grande do Sul, constituído como modalidade do ensino de pós-gradu-ação latu sensu, de caráter multiprofissional e interdisciplinar, sob a forma decapacitação em serviço acompanhada por atividades didáticas complementares,orientação técnico-científica e supervisão assistencial de profissionais de elevadaqualificação ética e profissional.

Artigo 2º – Integrar o Programa de Aperfeiçoamento Especializado aos Pro-gramas de Residência Médica já existentes, mantidos integral ou parcialmente pelaSecretaria da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul, instituindo-se o Programa deResidência Integrada em Saúde, que será coordenado pela Escola de Saúde Públi-ca da SES/RS.

Artigo 3º – Os Programas de Residência Médica continuarão cumprindo inte-gralmente a legislação a eles pertinente, bem como as Resoluções da ComissãoNacional de Residência Médica e prosseguirão concedendo o título de especialistaconforme legislação vigente.

Artigo 4º – Para obter apoio técnico e/ou financeiro da SES/RS, o Programade Residência Médica ou Aperfeiçoamento Especializado que vier a ser propostopor órgãos formadores ou serviços de elevada qualificação assistencial e de seucorpo funcional deverá ser credenciado pela mesma, através da Escola de SaúdePública, reservando-se a esta o direito de não credenciar ou descredenciar Progra-mas que não ofereçam ou deixem de oferecer condições adequadas de ensino-aprendizagem em serviço ou de integração dos dois tipos de Programa (ResidênciaIntegrada).

Artigo 5º – Tanto Programas de Residência Médica quanto Programas deAperfeiçoamento Especializado apoiados pela SES/RS poderão ocorrer em órgãospróprios do Estado ou em outros conveniados para este fim, e poderão contar com oacompanhamento, a orientação e a supervisão dos profissionais dos próprios qua-dros da SES/RS, como de outros órgãos públicos ou privados conveniados para talou, ainda, profissionais contratados através de prestação de serviços como pessoasfísicas ou jurídicas

Artigo 6º – As normas e rotinas para o credenciamento ou descredenciamentoserão objeto de portaria específica expedida pela Direção da Escola de Saúde Pú-blica.

Artigo 7º – Os Programas de Aperfeiçoamento Especializado:

(a) terão a duração de 24 (vinte e quatro) meses, com carga horária anualmínima de 2.800 horas e máxima de 3.200 horas, com um mínimo de 10%e um máximo de 20% da carga horária com atividades didáticas comple-mentares, tais como seminários, atividades teórico-práticas e outras;

(b) poderão ser reconhecidos com o nível acadêmico de especialização me-diante cumprimento da legislação pertinente;

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Portaria Nº 16/1999

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 181

(c) terão processo de seleção divulgados em edital, onde deverão constar oórgão que sediará cada Programa, com o respectivo número de vagas paracada profissão, documentação necessária, local e período das inscrições.

Artigo 8º – Os Programas de Aperfeiçoamento Especializado, próprios oucredenciados pela SES/RS, terão seu início estabelecido pela mesma, através daEscola de Saúde Pública.

Artigo 9º – Os alunos dos Programas de Aperfeiçoamento Especializado:(a) dedicarão tempo integral a esta atividade, com uma carga horária semanal

máxima de 60 (sessenta) horas, podendo nela serem incluídas um máximode 24 (vinte e quatro) horas de plantões;

(b) receberão mensalmente, enquanto permanecerem cursando o Programa,bolsas mantidas pela SES/RS, em valor equivalente às dos Programas deResidência Médica, conforme formulação nacional destes programas.

Porto Alegre, 01 de outubro de 1999.

MARIA LUIZA JAEGERSecretária de Estado da Saúde

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Resolução Nº 04/2000

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 183

Resolução Nº 04/2000

O Plenário do Conselho Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul –CES/RS,em sua Reunião Plenária Ordinária realizada no dia 13 de abril do ano 2000, no usodas atribuições que lhe confere a Lei Federal 8.142/90 e a Lei Estadual 10.097/94 e

Considerando a necessidade de dar cumprimento às novas normasestabelecidas pelo Ministério da Saúde sobre a forma e condições de pagamento doFator de Incentivo ao Desenvolvimento do Ensino e Pesquisa – Fideps aos Hospitaisde Ensino;

Considerando a necessidade de readequar o papel dos Hospitais Universitári-os nas redes hierarquizadas e regionalizadas de serviços do Sistema Único deSaúde;

RESOLVE:

Definir as diretrizes que devem regular o processo de negociação da Secreta-ria da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul com os hospitais atualmente habilita-dos a receber o Fideps, a saber:

– Estabelecer o prazo máximo de seis (6) meses para que os hospitais cum-pram os requisitos para (concessão) habilitação do Fideps estabelecidos na legisla-ção específica;

– Estabelecer os compromissos do hospital com um novo perfil de atendimen-to, priorizando a oferta ambulatorial e hospitalar de atendimentos mais complexos;

– Estabelecer os compromissos do hospital com a capacitação de profissio-nais e serviços de saúde de sua macrorregião de abrangência, conforme as diretri-zes estabelecidas pelos Núcleos Regionais de Educação em Saúde Coletiva -Nuresc ;

– No caso dos hospitais psiquiátricos, exigir enquadramento imediato nas nor-mas federais e estaduais de assistência à Saúde Mental, especificamente a portaria224-SAS/MS, de 29/01/92, e Lei Estadual nº 9716.

– Estabelecer que a Secretaria da Saúde do Estado deve refazer as vistoriasaos hospitais e reelaborar os pareceres, emitindo uma avaliação conclusiva sobre aclassificação dos mesmos e os valores de Fideps a serem estipulados, no prazomáximo de 45 dias.

– Acompanhamento dos gestores e do CES/RS

Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

Porto Alegre, 13 de abril de 2000.

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Resolução Nº 04/2000

184 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

HOMOLOGAÇÃO

A Secretária da Saúde do Estado do Rio Grande do Sul, na qualidade deGestor Estadual do Sistema Único de Saúde e de acordo com os preceitos do Pará-grafo Único, do Artigo 5º, da Lei Estadual nº 10.097, de 31 de janeiro de 1994, homo-loga a Resolução CES/RS nº 04/2000, de 13 de abril de 2000, do Conselho Estadualde Saúde.

Porto Alegre, 13 de abril de 2000.

MARIA LUIZA JAEGERSecretária de Estado de Saúde/RS

ADALGIZA BALSEMÃO ARAÚJOPresidente do Conselho Estadual de Saúde/RS

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Portaria Nº 09/2000

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 185

Portaria Nº 09/2000

A Secretária de Estado da Saúde, no uso de suas atribuições legais, previstasnos artigos 90 e 243 da Constituição Estadual, combinados com o disposto na lei8080/90 e considerando:

– que a proposta de pólos de capacitação, formação e educação permanentede pessoal da saúde da família visa ao fortalecimento de desenvolvimento técnico-operacional do Sistema Único de Saúde,

– que a proposta do pólo de capacitação, formação e educação permanentede pessoal da saúde da família do Rio Grande do Sul foi aprovada em plenária daComissão Intergestores Bipartite de 19/02/99, prevendo que o gestor estadual ficas-se responsável pela sua coordenação, ficasse sediado na Escola de Saúde Públicae que se orientasse pela designação em Saúde Coletiva (projeto de formação daEscola de Saúde pública no que tange no papel que deve ser exercido pelo gestordo SUS, no âmbito estadual, na qualificação de recursos para área da saúde, segun-do determina a lei 8080/90, artigos 6º, 14 e 15, inciso IX),

– que o conceito de pólo, tanto para a disseminação das experiências de saú-de da família e desenvolvimento das suas estratégicas na rede assistencial (Termode Referência do MS para a elaboração dos projetos de pólo), quanto para a con-quista de uma cultura de capacitação e formação continuadas, integração entre ór-gãos formadores e o gestor estadual que estreite os vínculos da formação com aorganização da atenção à saúde e coordenação da política de educação para o SUSno âmbito estadual (Política de Formação para o SUS/RS) é o de articulação deinstituições formadoras na área da saúde com as esferas de gestão do SUS,viabilizando a integração ensino-serviço, incentivando a pesquisa em serviço, bus-cando a reformulação curricular na educação profissional e superior e a avaliação daassistência e do ensino em saúde,

– que a proposta de gestão em saúde do Rio Grande do Sul se pauta, princi-palmente, pela descentralização da gestão e regionalização da atenção, conformeas decisões reiteradas na Comissão Intergestores Bipartite ao longo de1999 e 2000,pactuando-se o desenho de 07 macrorregiões de ordenamento e hierarquização darede estadual de saúde (Metropolitana, Serra, Vales, Centro-Oeste, Norte, Sul, eMissioneira),

– que a criação, em cada Coordenadoria Regional d Saúde, de um NúcleoRegional de Educação em Saúde Coletiva deu origem a uma aproximação continu-ada entre Universidades/Centros Universitários e instâncias regionais de gestão doSUS estadual,

– que o estreitamento dos vínculos institucionais e gerenciais da Escola deSaúde Pública com as Instituições de Ensino Superior, escolas permitiu propor àsinstituições participantes do pólo de capacitação, formação e educação permanentede pessoal da saúde da família sua inclusão ao projeto de Pólo de Educação emSaúde Coletiva para que se evitasse o paralelismo de ações relavas à formação detrabalhadores de saúde e se otimizasse os recursos federais, estaduais, regionais,municipais, universitários e de serviços, onde noção de redimensionamento diz res-peito ao desejo e prática da adesão do maior número possível de unidades acadêmi-cas (além dos cursos de graduação identificados diretamente com a saúde, também

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Portaria Nº 09/2000

186 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

os cursos das carreiras de ciências e da educação, ciências veterinárias, ciênciassociais e outras), o maior número possível de departamentos universitários (não sóos departamentos do grupo da medicina social, saúde pública e saúde comunitária)e a integração das escolas profissionais,

– que o convênio 463/99, celebrado entre a União, através do Ministério daSaúde, e o governo do Estado do Rio Grande do Sul, através da Secretaria de Esta-do da Saúde, com o objetivo de apoiar a implantação e implementação de pólos decapacitação, formação e educação permanente de pessoal da saúde da família, aoser absorvido pela proposição de Pólo de Educação em Saúde Coletiva, deverápromover a ampliação e a potencialização das atuais conquistas da estratégia desaúde da família como proposta assistencial e de promoção de saúde, elevando-oao estatuto de plano de governo e não projeto paralelo às demais ações formativasproprietárias prioritárias ao SUS no Rio Grande do Sul e

– que a representação do conjunto dos dirigentes municipais de saúde do RioGrande do Sul, através de sua Associação de Secretários e Dirigentes Municipais deSaúde (ASSEDISA), na discussão da formação em saúde para o SUS no Rio Gran-de do Sul é de crucial importância,

RESOLVE:

Art. 1º – Instituir o Pólo de Educação em Saúde Coletiva do Rio Grande do Sul,instância de articulação dos órgãos formadores no Rio Grande do Sul com a SES/RS.

Art. 2º – O Pólo de Educação em Saúde Coletiva do Rio Grande do Sul seráintegrado pelos Núcleos Regionais de Educação em Saúde Coletiva dasCoordenadorias Regionais de Saúde da SES/RS, Instituições de Ensino Superior(universidades e centros universitários), escolas de educação profissional da áreada saúde, Hospitais Universitários Universitários ou de Ensino, a Associação dosSecretários e Dirigentes Municipais de Saúde do Rio Grande do Sul e o Município dePorto Alegre/Secretaria Municipal de Saúde (município sede da Escola de SaúdePública e do Centro de Saúde Murialdo da Escola de Saúde Pública).

Parágrafo Único – Quanto as instituições de Ensino Superior, o Pólo de Edu-cação em Saúde Coletiva do Rio Grande do Sul deverá ser composto, preferencial-mente, pelas universidades públicas e pelas universidades comunitárias de expres-são regional que estiverem executando ações de parceria no âmbito da gestão re-gional do SUS/RS, seguindo a pactuação das 07 macrorregiões de saúde na orien-tação de decisões no interesse da formação em saúde para o SUS/RS.

Art.3º – O Pólo de Educação em Saúde Coletiva do Rio Grande do Sul é com-posto pelas seguintes instituições:

I. Gestor Estadual do SUS, através da Escola de Saúde Pública e da Coor-denação de Atenção Integral à Saúde (SES/RS);

II. Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS);III. Universidade Federal de Pelotas (UFPel);IV. Fundação Universidade Federal de Rio Grande (FURG);V. Universidade Federal de Santa Maria (UFSM);

VI. Fundação Faculdade Federal de Ciências Médicas de Porto Alegre(FFFCMPA);

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Portaria Nº 09/2000

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 187

VII. Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul(UNIJUÍ);

VIII. Universidade de Cruz Alta (UNICRUZ);IX. Universidade de Passo Fundo (UPF);X. Universidade Regional Integrada (URI);

XI. Universidade de Caxias do Sul (UCS);XII. Centro Universitário Vale do Taquari de Ensino Superior (UNIVATES);

XIII. Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC);XIV. Universidade da Região da Campanha (URCAMP);XV. Universidade do Vale dos Sinos (UNISINOS);

XVI. Grupo Hospitalar Conceição (GHC);XVII. Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA);

XVIII. Pontifica Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS);e seu Hospital São Lucas (HSL);XIX. Prefeitura Municipal de Porto Alegre (PMPA), através da secretaria Mu-

nicipal de Saúde, inclusive o Hospital de Pronto Socorro;XX. Associação dos Secretários e Dirigentes Municipais de Saúde

(ASSEDISA);XXI. Núcleos Regionais de Educação em Saúde Coletiva (NURESC) de cada

uma das Coordenadorias Regionais de Saúde da ESP/RS;XXII. Escola Estadual de Educação Profissional em Saúde.

Parágrafo Primeiro: Outras instituições poderão ser incluídas, considerandoa representação regional, o envolvimento e o comprometimento em ações na áreada Educação em Saúde Coletiva.

Parágrafo Segundo: O desligamento de instituições decorrerá de sua própriasolicitação ou de critérios que venham a ser formulados durante o funcionamentodas ações do Pólo de Educação em Saúde Coletiva.

Art.4º – A coordenação da articulação representada pelo Pólo de Educaçãoem Saúde Coletiva será exercida pela direção acadêmica da Escola de Saúde Públi-ca da SES/RS.

Art. 5º – A representação no Pólo de Educação em Saúde Coletiva será objetode designação oficial das instituições à Coordenação do Pólo, através de represen-tante titular e suplente.

Art. 6º – As deliberações do Pólo de Educação em Saúde Coletiva será resul-tado da decisão da maioria simples entre as instituições presentes em reuniões cha-madas pela coordenação do Pólo.

Art. 7º – Para a viabilização e potencialização das ações de formação e educa-ção continuadas, poderão ser formados comitês temáticos responsáveis pela cons-trução, execução e avaliação de propostas com enfoques específicos, que deverãoser encaminhadas para conhecimento e avaliações em reunião com os representan-tes oficiais do Pólo de Educação em Saúde Coletiva.

Parágrafo único – Parágrafo Único: Dentre os comitês temáticos será com-posto, obrigatoriamente, um para a área técnica da Atenção Básica, do qual fará aCoordenação Estadual dos Programas de Agentes Comunitários de Saúde e deSaúde da Família, integrantes da Coordenação da Atenção Integral à Saúde da SES/RS.

Art. 8º – Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação, revogando-seas disposições em contrário, particularmente as Portarias N º 08/97 e 07/98 de 07 de

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Portaria Nº 09/2000

188 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

julho de 1997 e 21 de dezembro de 1998, respectivamente, da Secretaria de Estadoda Saúde e do Meio Ambiente.

Porto Alegre, 08 de maio de 2000.

MARIA LUIZA JAEGER,Secretária de Estado da Saúde

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Portaria Nº 39/1999

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 189

Portaria Nº 39/99

A Secretária de Estado da Saúde do Rio Grande do Sul, no uso das atribuiçõesque lhe conferem a Constituição Estadual e a Lei Federal nº 8.080, de 19 de setem-bro de 1990.

Considerando a necessidade de dar seguimento ao processo dedescentralização político-administrativa do Sistema Único de Saúde na esfera esta-dual;

Considerando que a vontade política do governo estadual é a da conquista deuma cultura de capacitação continuada, educação permanente e integração entreórgãos formadores (instituições de ensino superior, escolas de educação profissio-nal, organismos de educação popular em saúde, entre outras formas de organiza-ção voltadas para o ensino no âmbito da Educação em Saúde Coletiva) e o gestorestadual que estreite os vínculos da formação com a gestão em saúde, assumindoos desafios de implementação do Sistema Único de Saúde – SUS;

Considerando que a Secretaria de Estado da Saúde do Estado do Rio Grandedo Sul, em consonância com os princípios e diretrizes consagradas pela Lei Federalnº 8.080/90, que regulamenta o Sistema Único de Saúde e como expressão daspolíticas públicas em saúde, constitui a Escola de Saúde Pública, como órgão res-ponsável pela formação, qualificação e educação continuada de pessoal para a saú-de;

Considerando que a Escola de Saúde Pública é órgão responsável pela pro-dução do conhecimento por meio do ensino, estudo, pesquisa aplicada, atividadesde extensão educativa e ação social direta, visando a construção de uma práticapúblico-educacional que convoque instituições de ensino, docentes, pesquisadores,estudiosos e movimentos sociais da área a se engajarem em um processo de forma-ção e desenvolvimento de pessoal para a saúde;

Considerando que a formação em Saúde Pública constitui-se em eixo para apolítica de Estado do Rio Grande do Sul, sendo entendida como projeto prioritário dogoverno do Estado para a efetiva implementação do Sistema Único de Saúde;

Considerando que a necessidade da Secretaria de Estado da Saúde de dis-por de uma instância que agregue as demandas em saúde por meio da cooperaçãotécnica e financeira entre o Estado e o Município foi remodelada pelos DecretosEstaduais nº 39.582, de 10 de junho de 1999, e nº 39.691, de 30 de agosto de 1999.

RESOLVE:

Artigo 1º – Instituir Núcleos Regionais de Educação em Saúde Coletiva –NURESCs como estratégia descentralizada da Escola de Saúde Pública nasCoordenadorias Regionais de Saúde, da Secretaria da Saúde.

PARÁGRAFO Único – A representação dos NURESCs se fará por indicaçãodos coordenadores das Coordenadorias Regionais de Saúde, em parceria com aEscola de Saúde Pública, de servidor que apresente titulação ou experiência na áreada Educação em Saúde ou área afins.

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Portaria Nº 39/1999

190 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

Art. 2º – atribuir às Coordenadorias Regionais de Saúde, por meio dosNURESCs, a viabilização das articulações regionais com os órgãos formadores, co-ordenando a educação continuada, a extensão educativa e a ação social direta naEducação em Saúde Coletiva.

Art. 3º – Determinar às Coordenadorias Regionais de Saúde, por meio dosNURESCs, a aproximação de ações educativas em saúde aos municípios e a conso-lidação do conceito de educação permanente em saúde coletiva para o SistemaÚnico de Saúde.

Art. 4º – Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.Art. 5º – Revogam-se as disposições em contrário.

Porto Alegre, 1º de dezembro de 2000.

Maria Luiza Jaeger –Secretária de Estado da Saúde

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Normas EditoriaisNormas EditoriaisNormas EditoriaisNormas EditoriaisNormas Editoriais

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Política e Normas Editoriais

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 193

BOLETIM DA SAÚDEPOLÍTICA E NORMAS EDITORIAIS

POLÍTICA EDITORIAL

1 Identificação

Com início em 1969, o Boletim da Saúde é um periódico de divulgação, inicial-mente publicado pela Secretaria de Estado dos Negócios da Saúde do Rio Grandedo Sul. De 1974 até 1980, sua publicação realizou-se em convênio com a FundaçãoSESP- Serviço Especial de Saúde Pública. Desde 1981, a Escola de Saúde Públicada Secretaria da Saúde e do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul – SSMA, passoua ser responsável pela revista. Em 1986 foi interrompida a publicação do Boletim daSaúde. Após longo intervalo, o periódico está sendo republicado com nova apresen-tação e nova política editorial, enfatizando a informação técnico-científica, e com aexpectativa de continuidade editorial efetiva ao longo do tempo.

O Boletim da Saúde está registrado no Instituto Brasileiro de Informação emCiência e Tecnologia – IBICT, sob o International Standard Serial Number – ISSN0102-1001.

2 Objetivos

O Boletim da Saúde visa a difusão do conhecimento em saúde coletiva desdea produção, disseminação e uso deste conhecimento a partir da pesquisa, do estu-do, da práxis, além do desenvolvimento e debate na área. O periódico pretende tertambém um caráter regionalizado, recebendo contribuições das universidades públi-cas e comunitárias integradas ao objetivo comum de reflexão teórico/prática em saú-de coletiva.

3 Distribuição

A responsabilidade pela distribuição do Boletim da Saúde será do Centro deInformação e Documentação em Saúde – Ceids, com a contribuição da Assessoriade Comunicação Social da SES/RS e colaboradores interessados.

4 Abrangência dos trabalhos

Os diversos setores da SES-RS e Políticas da Secretaria estão estimulados econvidados a apresentar originais.

A proposta é que se tenha, por meio dos trabalhos apresentados, uma interfaceda recomposição da memória institucional e a necessidade constante de atualiza-ção, educação continuada, pesquisa, estudo e debate em saúde coletiva.

Todas as matérias serão submetidas ao julgamento de pareceristas – Comis-são Editorial e do Conselho Editorial.

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Política e Normas Editoriais

194 v Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000

5 Periodicidade

Revista semestral.

6 Tiragem

Inicial de 2000 exemplares.

NORMAS EDITORIAIS

1 Informações aos colaboradores

As matérias a serem elaboradas devem ter como eixo temático os princípiosorientadores da atual gestão da saúde pública no Estado, estruturados em:

1. artigos de periódico – originais, inéditos ou de revisão;2. ensaios e reflexões;3. relatos de experiências;4. exposição de enfoque gerencial e das políticas;5. estudo de caso;6. notícias de projetos de pesquisa ou de ação, sob forma de notas ou resu-

mo;7. resenhas (resumos de textos lidos e importantes para divulgação);8. trabalhos apresentados em eventos;9. textos formulados para estudo nas equipes ou para ensino;

10. trabalhos de alunos ou textos de professores e convidados;11. memória;12. atos normativos.

Também apresenta seções de:1. cartas ao editor: comentários dos leitores sobre trabalhos publicados,

expressando concordância ou discordância, explicando as razões;2. editorial.

2 Definição das estruturas

• Artigo de Periódicos – Texto com autoria declarada, que apresente e discutaidéias, métodos, técnicas, processos e resultados nas diversas áreas do conheci-mento. O artigo pode ser:

a) original, quando apresenta temas ou abordagens próprias;b) de revisão, quando resume, analisa e discute informações já publicadas.

• Ensaios e Reflexões – Textos analíticos resultantes de estudos, pesquisas erevisões .

• Relatos de Experiências – Apresentação de experiência profissional, base-ada no estudos de casos de interesse, acompanhados de comentários sucintos,

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Política e Normas Editoriais

Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 195

úteis para a atuação de outros profissionais na área.

• Exposição de enfoque gerencial e das políticas

• Estudo de caso – Um estudo de caso refere-se a uma análise intensiva deuma situação particular. É uma inquirição empírica que investiga um fenômeno con-temporâneo dentro de um contexto da vida real.

• Notícias de projetos de pesquisa ou de ação – Em formato de resumo.

• Resenhas – De maneira genérica, a recensão ou resenha designa um tipode trabalho de síntese, análise resumida ou arrolamento de produções científicas,ou ainda, exposição sintética de assuntos tratados em uma obra. A recensão críticaanalisa em profundidade o assunto, conferindo apreciação do valor informativo daobra. Geralmente é elaborada por especialistas da área em questão.

• Resumos – Apresentação concisa dos pontos relevantes de um texto. Resu-mo Informativo – Informa suficientemente ao leitor, para que este possa decidir so-bre a conveniência da leitura do texto inteiro. Expõe finalidades, metodologia, resul-tados e conclusões.

• Memória e História – Resgate histórico da memória da Secretaria de Estadoda Saúde através de colunas fixas que relatam o antes (a história), e como estãohoje as principais instituições.

• Atos Normativos – Textos legais de importância para o desempenho deações didático-pedagógicas da Escola de Saúde Pública, ou outras julgadas impor-tantes.

3 Orientações gerais para apresentação dos originais

Todos os trabalhos devem ser enviados em duas cópias impressas em papel eem disquete no editor de textos Word for Windows, em espaço duplo, com margemesquerda de 3 cm e margem direita de 2 cm, margem superior 2,5 cm e inferior 1,5cm, fonte Times New Roman 12, com no máximo 20 páginas.

A primeira página (folha de rosto) deverá conter apenas o título do trabalho,versão em inglês do título, nome(s) completo(s) do(s) autor(es), indicando o respon-sável pela correspondência, nome e endereço(s) da instituição a que está vincula-do, além de breve currículo do(s) autor(es).

Recomenda-se que os trabalhos sigam a seguinte estrutura:• título (em letras minúsculas, somente a primeira letra em maiúscula);• autoria;• resumo (em português);• palavras-chave (em português);• texto (introdução, métodos, resultados, discussão e conclusões), podendo

haver subtítulos. Os elementos de apoio ( notas, tabelas, quadros, fórmulas e ilustra-ções) deverão estar inseridos dentro do texto;

• referências;

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Política e Normas Editoriais

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• anexos;• tradução do resumo em inglês.

Os originais serão publicados em língua portuguesa. Os trabalhos devem se-guir, rigorosamente, as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas –ABNT.

– Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE – Normas deapresentação tabular.

OBS: Todas as normas citadas estão à disposição no Ceids.

3.1 Título Termo ou expressão que indica o conteúdo do artigo.

3.2 AutoriaNome completo de cada um dos autores, titulação mais importante de cada

autor, instituição ao qual está vinculado, endereço eletrônico e telefone para contato.

3.3 ResumoResumo informativo, conforme NBR 6028, em português, destacando objeti-

vos pretendidos, metodologia empregada, resultados mais importantes e principaisconclusões. A extensão deve ser de até 250 palavras.

3.4 Palavras-chave ou descritoresIndicar de três a seis palavras-chave, que são termos ou expressões

indicativas do conteúdo do trabalho. Pode-se empregar termos integrantes da listapublicada pelo Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências daSaúde – Bireme, disponível no endereço eletrônico: http://decs.bvs.br/.

3.5 TextoOs artigos de investigação científica poderão ser organizados segundo a es-

trutura formal: Introdução, material e método, resultados, discussão e conclusões.Contudo, metodologias de caráter qualitativo, pesquisa-ação, etc. podem apresen-tar-se em formas compatíveis com estes métodos.

3.5.1 Elementos de apoioNotas, citações, gráficos, tabelas, figuras, fotografias, ilustrações, quadros, etc,

devem limitar-se ao mínimo indispensável e aparecer o mais próximo possível dotexto a que se referem.

Gráficos e tabelas devem ser construídos segundo as Normas de Apresenta-ção Tabular do IBGE, com um título e legendas explicativas .

Fotografias apresentadas devem conter título explicativo.

3.6 AgradecimentosBreves e objetivos, somente para contribuições significativas para o trabalho.

Devem ser mencionados apoio financeiro e material recebidos. As pessoas listadasnos agradecimentos endossam os dados e as conclusões e precisam dar seu con-sentimento para serem incluídas na lista de agradecimentos.

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Bol. da Saúde, v. 14, n. 1, 1999-2000 v 197

3.7 ReferênciasDevem aparecer listadas em ordem alfabética ou numérica para facilitar a cita-

ção do trabalho. A exatidão das mesmas é de responsabilidade do(s) autor(es). Suaelaboração segue a Norma da ABNT.

3.8 AnexosDocumentos, nem sempre do autor do artigo, que serve de fundamentação,

comprovação ou ilustração.

3.9 Tradução do resumoA apresentação do resumo (summary) em inglês e (Resumen) em espanhol

deverá ser uma versão exata do resumo em português.

3.10 Key-words e palabras claveApresentação das palavras-chave em inglês e espanhol.

4 Ética

Todos os trabalhos que tratem com experimentos em seres humanos ou ani-mais, serão previamente encaminhados ao Comitê de Ética da Escola de SaúdePública para apreciação.

O comitê orientará quanto a critérios específicos.

5 Responsabilidade

As opiniões emitidas nos trabalhos, bem como a exatidão, adequação e proce-dência das referências e citações bibliográficas, são de exclusiva responsabilidadedos autores.

6 Abreviaturas

Devem ser evitadas, pois prejudicam a leitura confortável do texto. Quandoforem usadas, devem ser escritas por extenso ao serem mencionadas pela primeiravez no texto.

7 Seleção dos trabalhos

Os trabalhos recebidos para publicação no “Boletim da Saúde”, serão encami-nhados para o Grupo de Pareceristas, para análise, respeitando o anonimato.

8 Trabalhos já publicados

Serão aceitos trabalhos já publicados em outros periódicos, desde que autori-zados pelo Conselho Editorial do periódico onde o artigo tenha sido originalmentepublicado.

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Política e Normas Editoriais

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9 Envio do artigo

Os trabalhos para a apreciação do Conselho Editorial devem ser enviadospara o Centro de Informação e Documentação em Saúde – Ceids, Av. Ipiranga 6311– Bairro Partenon, CEP 90610-001, e-mail: [email protected] .

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