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As terras de atlas 16x23 15

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“Democracia e Desenvolvimento no Campo" expõe, de uma forma clara e fundamentada, o vigoroso processo de transformação ocorrido na agricultura brasileira nas últimas décadas.Uma economia rural oligárquica e primária, rumo ao capitalismo tecnológico e globalizado. Os resultados dessa história modernizadora nem sempre são favoráveis a todos os personagens do campo. Há vencedores e perdedores, e existem aqueles que ainda aguardam as oportunidades de progredir ou temem a derrocada

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São Paulo 2016

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Copyright © 2016 by Editora Baraúna SE Ltda

Criação de Capa Jacilene MoraesIlustração da Capa Pedro de OliveiraDiagramação Jacilene MoraesRevisão Textual Alessandra Angelo Primavera

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTESINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ ________________________________________________________________

G833t

Gregorio, Bernardo Lynch de As terras de atlas / Bernardo Lynch de Gregorio. - 1. ed. - São Paulo: Baraúna, 2016.

ISBN 978-85-437-0512-5

1. Ficção brasileira. I. Título.

16-32452 CDD: 869.93 CDU: 821.134.3(81)-3

________________________________________________________________19/04/2016 22/04/2016

Impresso no BrasilPrinted in Brazil

DIREITOS CEDIDOS PARA ESTAEDIÇÃO À EDITORA BARAÚNA www.EditoraBarauna.com.br

Rua da Quitanda, 139 – 3º andarCEP 01012-010 – Centro – São Paulo - SPTel.: 11 3167.4261www.EditoraBarauna.com.br

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Prólogo

“(...) Porque naqueles tempos o Atlântico era navegável e havia uma ilha situada em fren-te à passagem por vós chamada de Pilares de Hércules1. Tal ilha era maior do que a Lýbia e a Ásia2 postas lado a lado. Era o caminho para outras ilhas3 e delas se podia atingir o con-tinente oposto4 que nos separa do verdadeiro oceano5. Porque este mar de Hércules6 é apenas um porto de águas calmas, com uma entrada estreita, mas o outro7 é um mar realmente e está cercado por terras; a este se pode efetiva-mente chamar de continente sem fronteiras8. Na ilha de Atlântida havia, pois, um grande e

1 NB: Estreito de Gibraltar. 2 NB: Norte da África e da Ásia Menor. 3 NB: Bahamas e ilhas do Mar do Caribe. 4 NB: América. 5 NB: Oceano Pacífico. 6 NB: Mar Mediterrâneo. 7 NB: Oceano Atlântico. 8 NB: “Mediterrâneo”, do latim, “entre terras”, também conhecido na antiguidade pelo epíteto de “continente sem fronteiras”.

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magnífico império, que governava toda a ilha e muitas outras terras, estendendo-se por sobre os continentes e para além. Os homens de Atlân-tida haviam sujeitado partes da Lýbia9 para além das Colunas de Hércules até o Egypto10,

bem como a Europa e a Tyrrhênia11.

(...) Porém mais tarde, ocorreram violentos terremotos e inundações e em um único dia e em uma única noite de desgraça, todos vossos guerreiros, como um todo, afundaram tragados pela terra e a Ilha de Atlântida, de certa for-ma, desapareceu nas profundezas do mar. Por esta razão, o mar é naqueles locais impenetrá-veis, em virtude de um banco de lama que se contrapõe ao caminho, causado pelos restos do

que um dia já foi uma ilha.”

Platão,Timeu, 24-25.

9 NB: Norte da África.10 NB: Egito.11 NB: Itália.

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Imagine um lugar distante. Imagine um mundo diferente. Ima-gine um lugar distante no tempo. Imagine um mundo antigo e per-dido em meio a milhares de anos passados. Imagine um mundo tão fantasticamente diverso em que até mesmo Deus pudesse ser jovem. Imagine emergindo dos oceanos da memória da humanidade este mundo antigo. Imagine que surge e que dá forma a si mesmo, como quem desperta de um longo dormir imerso nas profundezas incog-noscíveis do mar. Imagine que é possível, que é real e que é presente. Transporte-se agora através do tempo, para este mundo antigo, para um universo regido por deuses antigos e por suas antigas leis.

Viaje por sobre as ondas da imaginação em busca de uma era re-mota. Permita que a tênue espuma da memória se recomponha ainda uma vez, para recriar em sua mente aquelas praias brancas que um dia existiram. Praias cristalinas onde enormes vagas se chocaram contra imensas falésias de rocha avermelhada. Praias brancas embaladas por uma brisa marítima densa e pesada. Praias brancas onde mesmo a água do mar não havia tido tempo para tornar-se salgada. Praias sob o céu das noites estreladas, cuja luz índigo tingiu as águas e empres-tou às rochas tons violeta. Praias onde o Sol da manhã refletiu-se por sobre os minúsculos cristais das areias brancas. Praias onde os crepús-culos foram mágicas passagens entre os mundos. Praias brancas onde a vontade humana prevaleceu sobre a natureza.

Imagine um mundo antigo com numerosas praias brancas. Vi-sualize-o erguendo-se soberbo por sobre o abismal mar revolto, um monumental planalto sulcado pela mão humana, onde as águas se moveram contra a gravidade, dentro de inimagináveis canais. Pense que na confluência de canais circulares existiu uma cidade. Pense na maior e na mais monumental cidade já construída. Pense em altís-simas torres de mármore branco, em púrpura, em ouro e em ônix. Pense em levíssimas formas arredondas que flutuaram impávidas, sus-tentadas por fogos místicos. Pense em círculos de pedras monolíticas elevados às alturas em desafio a Deus. Pense em intricadas escadarias que se enroscaram ao redor das torres. Pense em descomunais mu-

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ralhas que rodearam uma cidade. Pense em seus afamados portões, adornados com a Efígie do Leão. Pense no leão como símbolo dos reis imortais que um dia governaram uma cidade. Pense em agitação humana constante e em grande acúmulo de gente. Pense em praças, edifícios, enormes avenidas e templos.

Oh, sim! Templos de deuses antigos que hoje não existem mais. Templos onde façanhas divinas foram operadas de forma a curvar até mesmo a vontade de Deus. Templos maravilhosos em formas, esplêndidos em cores e terríveis em significado. Pirâmides de ouro, prata e bronze, com incrustações de rubras letras. Enormes escada-rias e rampas. Altares de cristal erigidos a terríveis espíritos, deuses monstruosos, estranhos poderes. Templos espalhados por todo um vasto continente e interligados entre si. Tempos de templos em que o receber foi mais importante que o doar. Reflexos partidos de tempos de templos há muito esquecidos. Tempos de templos em honra de deuses que hoje não existem mais.

Crie veículos flutuantes em um tráfego intenso. Crie fontes e chafarizes de águas platinadas que formaram esculturas no ar. Crie ilusões e miragens. Crie palácios opulentos em dimensões exageradas. Crie quantas formas de prazer conseguir imaginar. Preencha os senti-dos: visões idílicas, sons excelsos, toques eróticos, paladares exóticos, aromas sedutores... Sensualidade a toda volta.

Sinta-se alguém que caminha por uma rua qualquer. Veja seus trajes suaves e transparentes flutuando por sobre o denso ar. Note como seus pés não tocam o solo a cada passo. Observe como cada se-gundo de existência é prazer, é gozo, é êxtase. Veja as formas arredon-das de seu corpo, seus longos dedos, seu comprido pescoço. Depare-se com os olhos negros dos transeuntes. Olhos totalmente negros. Olhos de grandes íris e sem esclera. Olhos como os de um touro. Olhos em contraste com a pele avermelhada e macia. Longos cabelos acobreados brincando em cachos com o vento. Linguagem telepática: comunica-ção imediata feita por imagens mentais. Seus pensamentos são me-mórias, seus sentimentos são recordações. Sua vida é reminiscência,

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são ecos das vidas de seus antepassados. Você é como sua mãe. Sua mãe foi como a mãe de sua mãe. Não há obrigação, há prazer. Não há moral, há desejo. Porem há leis... Oh, sim, há leis!

Imagine um lugar distante. Pense um mundo antigo. Veja praias brancas. Vivencie uma enorme cidade. Estremeça ante às sombras dos templos. Sinta o prazer de fazer parte deste universo. Experimente o êxtase. Recrie Posêida, a mais bela das cidades!

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Sumário

I - O Leão e a Águia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

II - O Lírio Branco e a Tulipa Negra . . . . . . . . . . . . . . . . 47

III - A Serpente e o Dragão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69

IV - Sinos, Prece e Amor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .91

V - Fantasias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105

VI - O Rouxinol e o Corvo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .123

VII - O Rei e o Herói . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 139

VIII - O Sol e a Lua . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 173

IX - As Sombras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .191

X - Os Subterrâneos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .217

XI - Terras Místicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 239

XII - As Grandes Mudanças . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 261

XIII - Um Único Dia e uma Única Noite . . . . . . . . . 275

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IO Leão e a Águia

“Leô Jygh1,

(...) um ôphtia a te´ên sbiót,

Te´ên pró a zhaich Posêidae.”12

Manu Noah

12 “O Leão e a Águia,(...) e todas as vezes em que se repetirem os símbolos destes animais,sabei que à vossa frente estará um reflexo de todo o mal que um dia Posêida representou”.

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14 Bernardo Lynch de Gregório

Emergindo de seu ócio, Witrin deixou-se ficar em pé, junto à parede transparente de sua câmara, a observar a deslumbrante paisagem que se abria diante de seus olhos. Era uma noite clara e Witrin desejou ver melhor

a lua cheia no meio do céu incrivelmente estrelado. Pela mágica da vontade, as luzes diminuíram no interior da câmara e Posêida surgiu a seus pés em sua roupagem noturna: cravejada por inúmeros pontos cintilantes e móveis. Ainda mais abaixo, Witrin podia distinguir com seus olhos aguçados os tons argênteos com que o luar fazia brilhar as águas do Grande Mar de Atlas. O prazer de deixar-se ali observando a paisagem... Posêida era bela como era bela a própria Witrin.

De súbito, passou junto à janela um carro que fez tremer a bela e que a arrancou de seu vagar fantasioso, causando o rápido reacen-der das luzes da câmara. Witrin tremia em ondas de prazer que lhe subiam do ventre, ao lembrar-se de que quando nascesse o Sol, esta-ria ela se preparando para o Ritual Sagrado no Templo de Posídon13. Como nos anos anteriores, o Ritual Sagrado a faria delirar em êxtase por três dias e três noites. Este ano, porém, seria ela própria quem representaria o papel de Posêida na Encenação da Memória Coletiva. Estremecia também Witrin, ao lembrar-se de que houve uma época em que aquele ritual era sistematicamente evitado por ela e sua mãe. Uma época em que existia um outro ritual a frequentar. Um ritual que agora lhe causava náuseas recordar. Não! Jamais se permitiria re-cordar das palavras de renúncia que tal ritual a obrigara a pronunciar.

O carro, assim como veio, rapidamente se foi e Witrin deixou--se novamente observar a paisagem, ao que as luzes imediatamen-te responderam com um suave diminuir de sua intensidade. Outro carro passava bem mais longe. Visto apenas como um ponto de luz alaranjada e flutuante, cruzava o céu lentamente em seu movimento retilíneo. Os grandes olhos negros de Witrin acompanhavam o andar

13 NB: Divindade atlante, filho de Izzrah com a Grande Mãe e com aparência ictio-antropomórfica, a quem foi dado o poder sobre águas, rios e oceanos. Posídon ficou conhecido pelo epíteto A Teên de “Herói-peixe dos Mares de Atlântida”.

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daquele carro, quando se depararam com a enorme torre do palá-cio real. Lembrou-se de que os doze reis de Atlântida reunir-se-iam. Seria em breve a época de Belial, quando os Reis reafirmavam seu juramento sagrado. Percorreu a paisagem em busca da grande coluna de Belial, onde seria realizada a cerimônia. Lembrou-se de que Belial localizava-se no lado oposto da cidade. Adivinhando seu desejo, outra parede de sua câmara foi tornando-se transparente e conforme Wi-trin, lenta, caminhava até ela, ia deixando ver outra vista da cidade. Lá estava Belial, a grande coluna de Belial. Iluminada por holofotes que clareavam o céu, Belial continuava sendo o símbolo de Witrin e de sua gente. Parou o olhar na imensa escultura em forma de águia que adornava a coluna.

Estremeceu-se Witrin mais uma vez, ao lembrar-se de que sua mãe execrava Belial e de que, se quisesse, ainda poderia se lembrar de outra bela coluna onde estava a inscrição da Lei Única. Mas Wi-trin recusava-se a recordar. Realmente não queria se lembrar daque-las horríveis palavras de renúncia que a Lei Única ostentava. Agora era Witrin Turânia e era tudo o que queria recordar. Como Turânia, possuía tudo o que pudesse desejar, devido a seu alto posto dentro das castas de Posêida. Mesmo que os tons róseos e claros de sua pele depusessem contra sua origem, ela continuava sendo uma Turânia: uma legítima Filha de Belial. Sim, antes de tudo Witrin Turânia, conforme reafirmavam as vívidas imagens que o próprio Rei de Po-sêida havia inscrito na tiara de ouro, que agora fulgurava em sua testa. Como que para certificar-se, Witrin ergueu a mão e tocando a tiara, procurou sentir o relevo do ideograma14 vermelho corres-pondente a seu nome15. “Bela como a estrela das manhãs”, este era o significado de seu nome: Witrin, “filha do casamento sagrado dos Reis com sua terra”, “Filha de Belial”, este era o significado de seu

14 NB: Proveniente da linguagem imagética e não da linguagem falada, a lingua-gem escrita tradicional atlante, conhecida pelo epíteto “palavras que ficam” e pelo nome correspondente de “A Te´ên”, possui características puramente ideográficas, jamais tendo sido quer silábica, quer fonética.15 NB: Trata-se aqui do ideograma A Teên: (|¤___*|).