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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
DEPARTAMENTO DE ECONOMIA
CURSO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS
ELIEL DOMINGOS DA SILVA
MODERNIZAÇÃO E QUESTÃO AGRÁRIA:
O CASO DA FRUTICULTURA IRRIGADA DE BARAÚNA-RN,
1982-2012
NATAL/RN
2016
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
DEPARTAMENTO DE ECONOMIA
ELIEL DOMINGOS DA SILVA
MODERNIZAÇÃO E QUESTÃO AGRÁRIA:
O CASO DA FRUTICULTURA IRRIGADA DE BARAÚNA-RN,
1982-2012
Monografia apresentada ao Departamento
de Economia da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte, como requisito
parcial das exigências para obtenção do
título de bacharel em Ciências Econômicas.
Orientador: Prof. Dr. Rogério Pires da
Cruz.
NATAL/RN
2016
Catalogação da Publicação na Fonte.
UFRN / Biblioteca Setorial do CCSA
Silva, Eliel Domingos da.
Modernização e questão agrária: o caso da fruticultura irrigada de Baraúna-RN,
1982-2012 / Eliel Domingos da Silva. - Natal, RN, 2016.
65f.
Orientador: Prof. Dr. Rogério Pires da Cruz.
Monografia (Graduação em Economia) - Universidade Federal do Rio Grande
do Norte. Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Departamento de Economia. Curso
de Graduação em Ciências Econômicas.
1. Economia - Monografia. 2. Modernização agrícola - Monografia. 3. Questão
agrária – Monografia. 4. Fruticultura irrigada - Monografia. I. Cruz, Rogério Pires
da. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.
RN/BS/CCSA CDU 330:631
ELIEL DOMINGOS DA SILVA
MODERNIZAÇÃO E QUESTÃO AGRÁRIA:
O CASO DA FRUTICULTURA IRRIGADA DE BARAÚNA-RN,
1982-2012
Monografia apresentada ao Departamento
de Economia da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte, como requisito
parcial das exigências para obtenção do
título de bacharel em Ciências Econômicas.
Aprovado em: 24/11/2016
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________________
PROF. DR. ROGÉRIO PIRES DA CRUZ
Orientador
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
__________________________________________________
PROF. DR. CASSIANO JOSÉ BEZERRA MARQUES TROVÃO
Examinador
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
Dedico esta monografia ao meu saudoso pai,
Milson Florentino da Silva (in memoriam), pelo
exemplo de vida que foi para mim e meus irmãos.
À minha mãe, Marta Domingos da Silva, que
muito me incentivou em minhas atividades
escolares desde minha infância e acreditou que
este sonho se realizaria.
À minha esposa Michelle Fernandes e minhas
filhas Maria Eduarda e Maria Vitória pelo amor
incondicional, compreensão das minhas ausências
do lar e apoio nessa trajetória.
Ao meu Professor e Orientador Rogério Pires da
Cruz pelas suas contribuições, atenção e
paciência ao longo dessa jornada.
AGRADECIMENTOS
Foram aproximadamente três anos de muito trabalho desde o início de 2014,
época em que cursei a disciplina Gestão de Políticas Públicas II, onde minha atenção foi
atraída para o tema da questão fundiária e a política pública da reforma agrária. No
decorrer dessa jornada encontrei muitos percalços. Foi uma luta contra o tempo, mas o
foco foi mantido no objetivo. Esse objetivo, que de mim exigia maturidade intelectual,
autonomia e disciplina, me faziam, às vezes, sentir-me sozinho. Apesar disso, foram
inúmeras as pessoas que comigo contribuíram e quero aqui citá-las.
Primeiramente, agradeço a Deus, criador e doador da vida, minha razão de
existência, por dar-me forças e sabedoria dia após dia ao longo dessa senda trilhada.
Aos meus pais, Milson e Marta, que durante todo o percurso da minha vida
estiveram ao meu lado e acreditado que eu e meus irmãos atingiríamos os sonhos que
eles não haviam concretizado em suas vidas. Não há palavras suficientes para expressar
meu agradecimento por tudo o que fizeram por mim.
À minha esposa e amiga, Michelle, sustentáculo dessa longa jornada de
dedicação acadêmica. Foram incontáveis os momentos abdicados da família em favor
dos estudos. Agradeço pelo carinho, apoio, companheirismo, solidariedade e pelos seus
conselhos sempre oportunos, fundamentais para a superação dessa etapa, iniciada em
meados do ano de 2011 na Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE
(Campus Recife).
À minha sogra, Dona Marlete Fernandes, por suas orações e pelo apoio, por
vezes anônimo, mas que muito contribuiu.
À Professora Dr.ª Eliane Aparecida Abreu, docente do Departamento de
Economia da UFRPE e minha orientadora quando exerci a atividade de monitoria na
disciplina Microeconomia I.
Ao meu orientador, o Professor Dr. Rogério Pires da Cruz, por ter me estendido
a mão, me ter aberto as portas do recôndito do seu lar e pela extrema gentileza e
demonstração de afeto humano ao visitar-nos quando do nascimento da minha filha
Maria Vitória, em 2015. Isso ficará gravado na memória. Pela abnegação com que me
mostrou, de forma brilhante, os caminhos possíveis e viáveis; que acreditou em mim e
no meu trabalho, ouvindo pacientemente as minhas considerações, partilhando comigo
as suas ideias, conhecimento e experiências, sempre me estimulando com elogios e,
principalmente, críticas. Quero expressar o meu reconhecimento e admiração pela sua
competência profissional e minha gratidão pela sua amizade, por ser um profissional
extremamente qualificado e pela forma humana que conduziu minha orientação.
Agradeço pelo respeito, pela paciência, pelo crédito e pela expectativa, tal qual como se
estivesse em meu lugar.
Ao professor Dr. Cassiano José Bezerra Marques Trovão agradeço pela
disponibilidade em participar de minha banca examinadora, pelo seu rigor metodológico
e por contribuir com inestimáveis orientações.
Aos demais docentes do curso de Ciências Econômicas, pela convivência
harmoniosa, pelas trocas de conhecimento e experiências que foram deveras
importantes na minha vida acadêmica e contribuíram para a minha inserção profissional.
Aos amigos de curso que contribuíram, diretamente e indiretamente, para
realização desse sonho, compartilhando os ensinamentos, cedendo artigos, livros e pelos
incentivos tão úteis ao longo dessa jornada.
A todos os parentes e amigos, cujos nomes não caberiam nessas poucas folhas.
Agradeço pelos momentos de alegria que a mim proporcionaram, os quais foram tão
importantes ao equilíbrio emocional.
E, finalmente, à UFRN que me proporcionou chegar onde estou e, com o
fechamento desse ciclo, vislumbrar novos objetivos.
“In sudore vultus tui vesceris pane, donec
revertaris in terram de qua sumptus es: quia
pulvis es et in pulverem reverteris”.
Genesis 3:19
SILVA, Eliel Domingos da. Modernização e Questão Agrária: o caso da fruticultura
irrigada de Baraúna-RN, 1982-2012. Natal: Departamento de Economia da UFRN,
2016. Monografia (Bacharelado em Ciências Econômicas).
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo analisar se a modernização agrícola teria sido
um fator incentivador, ou não, de um movimento de concentração e de ociosidade
fundiária. Para tanto, propõe elaboração de um estudo de caso junto ao município de
Baraúna (RN), por estar contido numa área de expansão da Fruticultura Irrigada (FI) -
esta, entendida como um símbolo da modernização agrícola recente, naquele município.
Para a elaboração do presente estudo fez-se uso de pesquisa bibliográfica e, ainda,
foram coletados dados do IBGE mais informações obtidas no Cartório Municipal, a
partir dos quais se lançou mão do método estatístico-descritivo para apresentação dos
resultados da pesquisa. Foi escolhido o período de 1982 a 2012 pelo ótimo desempenho
da FI modernizada e pelo dinamismo do seu MTA. Os principais resultados foram os
seguintes: a) a modernização não provocou aumento da concentração fundiária,
expresso por um índice de Gini abaixo da média do estado do RN e do Brasil; b) o
volume de ociosidade da terra, tomado como parâmetro de especulação, manteve-se
estável no período de estudo. Portanto, não obstante a vasta literatura em contrário que
faz análise para o caso geral, este estudo de caso concluiu que a modernização agrícola,
quando modificou, tanto a concentração, quanto a ociosidade fundiária, foi em pequeno
grau.
_______________________________
Palavras-chave: Modernização agrícola; Questão agrária; Baraúna-RN.
SILVA, Eliel Domingos da. Modernização e Questão Agrária: o caso da fruticultura
irrigada de Baraúna-RN, 1982-2012. Natal: Departamento de Economia da UFRN,
2016. Monografia (Bacharelado em Ciências Econômicas).
ABSTRACT
The present work has as objective to analyze if the agricultural modernization would
have been an incentive, or not, of a movement of concentration and land idleness. To do
so, it proposes the elaboration of a case study with the municipality of Baraúna (RN), as
it is contained in an area of expansion of the Irrigated Fruticulture (FI) - this one,
understood as a symbol of the recent agricultural modernization, in that municipality.
For the preparation of the present study, a bibliographical research was used, and data
from the IBGE were collected from the Municipal Registry Office, from which the
statistical-descriptive method was used to present the results of the research. The period
from 1982 to 2012 was chosen for the excellent performance of the modernized FI and
the dynamism of its MTA. The main results were as follows: a) the modernization did
not provoke an increase of the land concentration, expressed by a Gini index below the
average of the state of the RN and Brazil; B) the volume of idleness of the land, taken as
a parameter of speculation, remained stable during the study period. Thus, despite the
vast literature to the contrary that analyzes the general case, this case study concluded
that agricultural modernization, when it modified both concentration and landlessness,
was to a small degree.
_______________________________
Keywords: agricultural modernization; Agrarian question; Baraúna-RN.
LISTA DE ABREVIATURAS E/OU DE SIGLAS
CE Ceará
FGV Fundação Getúlio Vargas
FI Fruticultura Irrigada
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
ITR Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural
MTA Mercado de Terras Agrícolas
MTR Mercado de Terras Rurais
PAM Produção Agrícola Municipal
PIB Produto Interno Bruto
RN Rio Grande do Norte
SIDRA Sistema IBGE de Recuperação Automática
SNCR Sistema Nacional de Crédito Rural
SPU Secretaria do Patrimônio da União
UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte
LISTA DE FOTOS
Foto 1: Meloeiros de Baraúna.
Foto 2: Produtor rural - Massatoshi - com melão gália.
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1: PIB Municipal da agropecuária (valor adicionado a preços básicos) em R$
(mil) a preços do na 2000. Baraúna, 1985-2010.
Gráfico 2: Evolução do Crédito rural no Brasil em R$ (mil), 1982-2006.
Gráfico 3: Evolução do crédito rural (em R$ mil a preços do ano 2000). Nordeste,
1982-2006.
Gráfico 4: Total de contratos de crédito rural. Baraúna-RN, 1993-2004.
Gráfico 5: Exportações de Baraúna-RN (em Kg), 1997-2015.
Gráfico 6: Exportações de Baraúna-RN (em US$), 1997-2015.
Gráfico 7: Uso da terra agrícola. Percentuais de terras utilizadas e não utilizadas em
relação aos totais. Baraúna-RN, 1985, 1995-96 e 2006.
Gráfico 8: Número de transações no MTA. Baraúna-RN, 1982-1993.
Gráfico 9: Número de transações no MTA. Baraúna-RN, 1994-1999.
Gráfico 10: Número de transações no MTA. Baraúna-RN, 2000-2012.
Gráfico 11: Área transacionada no MTA. Baraúna-RN, 1982-1993.
Gráfico 12: Área transacionada no MTA. Baraúna-RN, 1994-1999.
Gráfico 13: Área transacionada no MTA. Baraúna-RN, 2000-2012.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Crédito Rural - Recursos dos créditos de custeio. Brasil, 1987/1997.
Tabela 2: Número de estabelecimentos irrigados. Baraúna, 1985-2006.
Tabela 3: Área irrigada. Baraúna, 1985-2006.
Tabela 4: Número de estabelecimentos por utilização de fertilizantes e defensivos
agrícolas. Baraúna, 1985-2006.
Tabela 5: Área colhida e quantidade produzida dos principais produtos agrícolas.
Baraúna, 2006.
Tabela 6: Evolução do índice de Gini. Brasil e Rio Grande do Norte. 1985-2006.
Tabela 7: Evolução do índice de Gini de Baraúna-RN, 1985-2006.
Tabela 8: Número estabelecimentos agrícolas. Percentuais dos estratos de área em
relação ao total. Baraúna-RN. 1985, 1995/96 e 2006.
Tabela 9: Área dos estabelecimentos agrícolas. Participação percentual dos estratos
em relação aos totais. Baraúna-RN. 1985, 1995/96 e 2006.
Tabela 10: Número de negócios e de área negociada pelos nipônicos em relação aos
totais. Percentuais da participação de nipônicos (Nipo) em número de
negócios e totais de área negociada. MTA Baraúna, 1994/1998.
Tabela 11: Número de imóveis transferidos em doação pelo Estado do Rio Grande do
Norte-RN (1962/1992) e pelo Governo Federal (1993/2006). Participação
do número de imóveis, segundo estratos de área, em relação ao total.
Baraúna-RN, 1962/2006.
Tabela 12: Área transferida em doação pelo Governo do Estado do Rio Grande do
Norte-RN (1962/1992) e pelo Governo Federal (1993/2006). Participação da
área doada segundo estratos de área (ha) em relação ao total. Baraúna (RN),
1962/2006.
SUMÁRIO
RESUMO ..................................................................................................................... 8 ABSTRACT ................................................................................................................. 9 LISTA DE ABREVIATURAS E/OU DE SIGLAS ................................................ 10 LISTA DE GRÁFICOS ............................................................................................ 12 LISTA DE TABELAS .............................................................................................. 13
INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 14 CAPÍTULO 1 Formação e dinâmica do mercado de terras agrícolas: breves
notas ........................................................................................................................... 21 1.1 Questão agrária: um tema atual .................................................................... 21
1.2 Progresso técnico, questão agrária e preço da terra agrícola ........................ 25
CAPÍTULO 2 Origens da modernização agrícola e seus impactos fundiários
posteriores: o caso de Baraúna-RN ......................................................................... 27 2.1 Breve histórico da área de estudo ................................................................. 27
2.2 Aspectos econômicos recentes ..................................................................... 28
2.2.1 Modernização da agricultura ..................................................................... 30
2.2.2 A fruticultura irrigada ................................................................................ 34
2.3 Estrutura fundiária e ociosidade da Terra ..................................................... 36
2.4 A dinâmica do MTA de Baraúna-RN de 1982 a 2012 ................................. 41
2.5 Política pública fundiária .............................................................................. 46
CAPÍTULO 3 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS E CONCLUSÃO ................. 49
APÊNDICES ............................................................................................................. 53
ANEXOS .................................................................................................................... 60 REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 63
14
INTRODUÇÃO
A terra é um bem universal de caráter natural, parte integrante do meio-
ambiente, ou ainda, a terra pode ser entendida como um bem imobiliário, porquanto
alvo de compra e venda. Modernamente, diz-se que a terra, além de mercadoria,
assumiu o papel de ativo de aplicação de capitais, vez que concorre, em termos de
rentabilidade com outros ativos da economia - tais como, o dólar, o ouro, ações, etc..
A literatura disponível apresenta pontos de vista complementares entre si acerca
do papel da terra no capitalismo.
Polanyi (2000, p. 14), autor considerado um clássico na análise dessa matéria,
interpreta o mercado de terras como parte crucial para o desenvolvimento do
capitalismo, partindo do ponto de vista de que a terra é elemento garantidor das
economias de mercado. A terra, que outrora era protegida pelo Estado, agora se tornou
uma mercadoria cuja oferta e demanda é comandada por mercados autorreguláveis.
Para a garantia de uma produção industrial, sempre crescente demandante de
recursos naturais e trabalho em demasia, foi necessária a criação de um mercado de
terras e de trabalho, através da transformação destes em mercadorias, o que foi
abordado por Polanyi (2000, p. 97). Segundo este autor, a terra não é objeto da
produção por ser originário da natureza e por isso a partir daquele instante
transformava-se numa mercadoria fictícia, em contraposição às mercadorias reais.
Nessa época, a Europa encontrava-se na transição do feudalismo para uma economia de
mercado e, portanto, “uma economia de mercado só pode existir numa sociedade de
mercado” (POLANYI, 2000, p. 93).
No mercado de terras as transações são feitas com base em valores monetários e,
quando estabelecidas, o detentor (proprietário) da terra - quando não for vantajoso
investir nela de forma produtiva - tem a expectativa que o ativo que tem em mãos, na
forma de um título de propriedade chancelado pelo Estado em um cartório de registro de
imóveis, se valorize, ou seja, que seu valor monetário aumente. Portanto, a terra é um
ativo visto como uma reserva de valor1.
1 A esse respeito, Keynes ensina que: “Pode ser que em determinadas circunstâncias históricas os
proprietários de riqueza tenham pensado que a posse de terra se caracterizava por um alto prêmio de
liquidez, e, visto que a terra participava com a moeda da particularidade de ter, em princípio, elasticidades
de produção e de substituição muito baixas, é concebível que tenha havido na história ocasiões em que o
desejo de possuir terra haja desempenhado o mesmo papel que a moeda em tempos recentes, no sentido
15
É pelo caráter mercantil da terra e por ser um ativo de reserva de valor, com
expectativas de valorização com o passar do tempo e guardar em si certa liquidez,
mesmo que em menor escala e não equiparada a outros ativos - como a moeda -, que
passaremos a tratar da evolução histórica do mercado de terras no Brasil.
Historicamente, observa-se que, na época do mercantilismo e da expansão
ultramarina - empreendida pelos países centrais da Europa -, as novas colônias da
América detinham terras em abundância para o cultivo e pastagens para a atividade
pecuária.
A doação de terras, nos moldes das Sesmarias, foi a primeira ação da Coroa
Portuguesa como solução para a produção agrícola e povoamento da colônia recém-
descoberta. No entanto, o intuito inicial foi deturpado pela formação de grandes
latifúndios determinada por uma minoria ávida por terras - mais conhecida como
aristocracia da terra -, que via a propriedade da terra, inicialmente, como fonte de
poder político e econômico (GALVÃO, 2006, p. 8). As sesmarias vigoraram até a
independência do Brasil, em 1822, período esse em que o apossamento de terras
públicas ou devolutas foi prática adotada de forma indiscriminada.
Posteriormente, a partir da promulgação da “Lei de Terras” de 1850 (Lei nº
601), a terra tornou-se mercadoria, ou seja, teve seu comércio constituído como base
para obtenção de lucros, derivados dos movimentos de compra e venda da terra.
Desse momento até a abolição da escravatura, em 1888, houve um
fortalecimento da classe proprietária, sobretudo a cafeeira, avessa ao pagamento de
impostos territoriais e ao cadastramento de suas terras, sendo também contrários aos
abolicionistas (os quais eram progressistas e aspiravam à República como estrutura
política do Estado brasileiro). Estes últimos, dentre outras coisas, propunham a
distribuição fundiária para os futuros escravos libertos. Finalmente, depois de todas
essas manobras político-jurídicas, tendo implícitos interesses econômicos, foi possível
de manter a taxa de juros num nível demasiado alto. [...]. As altas taxas de juros sobre hipotecas da terra,
muitas vezes excedendo o rendimento provável de sua cultura, constituem um aspecto comum de muitas
economias agrícolas. As leis sobre usura eram especialmente dirigidas contra as extorsões dessa natureza.
E com razão, pois, nas antigas organizações sociais, nas quais inexistiam as obrigações a longo prazo no
sentido moderno, a concorrência de uma elevada taxa de juros sobre hipotecas pode muito bem ter tido o
mesmo efeito em retardar o crescimento da riqueza procedente do investimento corrente em ativos de
capital recém produzidos, tanto quanto as altas taxas de juros sobre dívida de longo prazo o fizeram nos
tempos mais recentes (KEYNES, 1936, p. 233).
16
libertar os escravos e enfim proclamar a República, mas com o acesso à terra restrito e
nas mãos de poucos2.
Dessa forma ficou instituído o mercado de terras no Brasil, o que transformou a
terra em mercadoria, fato que foi ratificado e aprofundado com a “Lei que Orça a
Receita Geral da República” de 1891, a Lei nº 746 de 29 de dezembro de 1900 e a “Lei
do Orçamento da União” de 1901. Estas leis traziam em seus bojos outras formas de
acesso à terra, que não somente a posse, tal como descrito em Linhares (1999), ao se
referir à Lei de 1900, de que:
No que toca à União, as medidas anteriormente descritas, estabelecidas
através de legislação indireta (não era uma lei direcionada para a
democratização da estrutura fundiária e, sim, para a execução do Orçamento
da União), constituíam a primeira legislação nacional sobre o acesso e posse
da terra e, na prática, revogava a Lei de Terras, de nº 601, de 1850. Enquanto
esta estabelecia que só através da compra dava-se o acesso à terra, a Lei de
1900 abria outras formas de acesso, como o arrendamento, reconhecias as
posses feitas à revelia da Lei de 1850 e consagrava todos os atos contrários
realizados desde então (LINHARES, 1999, p. 78).
É a partir daí que surgiu o incentivo à busca por repostas para perguntas tais
como: Qual o motivo de, a princípio até os dias de hoje, se ter dificuldade de acesso à
terra em meio a tanta terra? Ou ainda, por que nesse contexto se pode observar tanta
terra ociosa?
Nessa busca por respostas à Questão Agrária no Brasil, é mister apresentar o que
aqui consideramos ser uma de suas variáveis mais importantes, a saber, a modernização
agrícola.
A mencionada modernização agrícola, no Brasil, ocorreu na esteira da
Revolução Verde, a partir da década de 19603, significando a elevação da produtividade
2 “Os itens mais avançados da pauta abolicionista e republicana, como a mobilização e tributação da
propriedade fundiária, um vigoroso programa de incorporação dos negros à nação, através do sistema de
ensino e da distribuição de lotes de terras, bem como, o desenvolvimento industrial, eram abandonados
pelas elites vitoriosas. Para estas, a intangibilidade da propriedade substituía a escravidão como base de
um verdadeiro programa de vida” (LINHARES, 1999, p. 74). Acrescenta ainda que: “O fechamento do
acesso dos pobres à terra era a garantia fundamental da hegemonia plantacionista. A desigualdade da
propriedade deveria ser a base para a pretensa igualdade política apregoada na constituição da
República” (LINHARES, 1999, p. 74).
3 No caso específico da Região Nordeste, a modernização agrícola ou tecnificação da agricultura
transcorreu de forma diferenciada e desigual das demais regiões (à exceção da Região Norte) pelo fato
de ter recebido menor crédito agrícola, evidenciado por Locatel (2012).
17
da terra, o que tornou o setor agrícola nacional mais competitivo, aumentando assim sua
parcela na composição do PIB.
A modernização agrícola substituiu a tração animal pela mecânica; cambiou um
tipo de agricultura sazonal - dependente da chuva - para outra que existe em função da
irrigação; ou ainda, adotou melhoramentos - tais como, sementes, implementos, adubos
químicos, agrotóxicos, herbicidas, inseticidas, fungicidas etc.. Desse modo, a
modernização agrícola foi uma tentativa de adequação da agricultura brasileira ao modo
de produção capitalista, haja vista que a mesma era considerada o setor atrasado da
economia, dada a sua posição à montante da indústria na cadeia produtiva e detentora de
produtividade abaixo da média mundial (BUAINAIN; GARCIA, 2016, p. 109).
Graziano da Silva (1982, p. 17) também discursa sobre o “atraso” do setor agrícola.
Essas mudanças na forma de produzir podem ser entendidas como uma forma
nova de “fabricar” novas terras através do aumento da produtividade da terra, ou seja,
produzir mais com a mesma área de terra, como salienta Graziano da Silva (1981, apud
Graziano da Silva, 1982, p. 45).
Dessa forma, para este mesmo autor, tal evento significou a transformação da
agricultura de setor “quase suficiente” em setor dependente da indústria e que
Essa industrialização da agricultura é exatamente o que se chama
comumente de penetração ou "desenvolvimento do capitalismo no
campo". O importante de se entender é que é dessa maneira que as
barreiras impostas pela Natureza à produção agropecuária vão sendo
gradativamente superadas. Como se o sistema capitalista passasse a
fabricar a natureza que fosse adequada à produção de maiores lucros.
(GRAZIANO DA SILVA, 1980, p. 6).
Dessa forma, para este mesmo autor, tal evento significou a transformação da
agricultura de setor “quase suficiente” em setor dependente da indústria e que “A
subordinação da terra representa, pois, a sua reprodução pelo capital, dado por
suposto que o capital cria a forma de propriedade adequada a si mesmo” (GRAZIANO
DA SILVA, 1982, p. 45).
Ainda, sob o aspecto da estrutura fundiária brasileira, a modernização agrícola,
na perspectiva de Graziano da Silva (1982, p. 46), foi um modo de se desenvolver as
forças produtivas da agricultura despojando-a de seu caráter “quase autossuficiente” e
subordinando-a ao capital industrial. Contudo, foi uma modernização dolorosa, no
sentido de que foi conservadora, sem fazer uma Reforma Agrária e mantendo-se quase
18
intacta a estrutura fundiária anterior: latifundiária, monocultora, concentrada e ociosa,
ou ainda, mantendo-se uma Questão fundiária.
Neste ponto, é essencial a definição de Questão Agrária e Questão Fundiária.
Para tanto, primeiramente, tomaremos o conceito de Prado Júnior (1979) de Questão
Agrária, quanto diz que
É nisso que consiste essencialmente a nossa questão agrária. E ela se
resume nisto que a grande maioria da população rural brasileira, a sua
quase totalidade, com exclusão unicamente de uma pequena minoria
de grandes proprietários e fazendeiros, embora ligada à terra e
obrigada a nela exercer sua atividade, tirando daí seu sustento, se
encontra privada da livre disposição da mesma terra em quantidade
que baste para lhe assegurar um nível adequado de subsistência. Vê-se
assim forçada a exercer sua atividade em proveito dos
empreendimentos agro mercantis de iniciativa daquela mesma minoria
privilegiada que detém o monopólio virtual da terra. (PRADO
JÚNIOR, 1979, p. 32).
Em segundo lugar, faremos uso da definição de Questão fundiária em Lima
(1999) com sua exposição sobre as teses de Caio Prado Júnior a respeito de tal questão.
Para o autor a Questão Fundiária historicamente
Tratava-se, em suma, de uma estrutura agrária condicionada pela alta
concentração de terras e recursos produtivos sob a posse de pequeno
número de proprietários capitalistas, e tipificada na existência
economicamente predominante da grande unidade de produção
extensiva, na qual baixos níveis de remuneração relativa de capital,
oriundos de fatores de gestão entre os quais encontram-se a
subutilização do solo, o emprego de técnicas não intensivas de cultivo
e a baixa qualificação da força de trabalho empregada, eram
compensados por altos montantes absolutos de lucro, obtidos em
virtude das dimensões dos recursos da grande propriedade fundiária.
Caracterizavam, deste modo, a economia agrária especulativa, cujo
mecanismo de reprodução de capitais consistia na exploração do
monopólio da terra e na sobrevalorização de seus preços de
comercialização. (LIMA, 1999, p. 131).
Em suma, a Questão Agrária está associada ao acesso ou à divisão da terra e ao
decorrente empobrecimento da população rural, enquanto a Questão Fundiária está
relacionada basicamente ao tamanho da propriedade agrícola, isto é, à estrutura
fundiária - latifúndio, minifúndio, propriedades rurais produtivas ou improdutivas.
19
Segundo Reydon (2011, p. 3), a Questão Agrária está circunscrita a um quadro
de concentração e ociosidade da terra, em contraposição de uma pressão exercida sobre
a mesma por diversos atores sociais e/ou agentes econômicos: destacando-se, dentre
eles, o Estado, com um papel crucial na intervenção e mediação em favor da resolução
deste conflito. O autor, nesse mesmo texto, ainda deduz que, sob a Questão Agrária,
encontra-se oculta uma relação de dominação determinante da distinção entre os ricos e
os pobres, que é definidora dos rumos e do ritmo do desenvolvimento. Além disso, há a
possibilidade de especulação com terras, proporcionada pelas expectativas de
rendimentos advindos da posse destas e que agravam aquela desigualdade4.
Diante de tal problemática, que tem fomentado inúmeros conflitos desde a
colonização até a atualidade, é possível ver o quão complexo é o fenômeno, posto que
não há apenas um fator envolvido, mas, muitos fatores correlacionados, destacando-se
no presente trabalho a Modernização Agrícola.
O crédito agrícola é um parâmetro utilizado para se determinar o nível de
tecnificação do setor agrícola. Nesse sentido, no semiárido nordestino há a larga
implementação da irrigação agrícola, que se dá através de financiamento rural ou de
intervenção do Estado dado, por exemplo, pela perfuração de poços com fins de
irrigação. Assim, no semiárido potiguar, mais precisamente em Baraúna-RN, tem sido
economicamente exitosa a fruticultura irrigada, com destaque dos produtos para
exportação, mais especificamente frutas - manga e melão, principalmente.
Nesse contexto, o objetivo do presente trabalho reside no estudo dos impactos da
modernização agrícola incentivada pelo Estado brasileiro sobre os níveis da
concentração e da ociosidade da terra. Com isto se quer ver até que ponto a
modernização gera, amplia ou, ainda, mantém uma questão fundiária.
Desse modo, surge a pergunta de pesquisa: a modernização agrícola gera,
mantém, ou ainda, amplia, uma Questão fundiária, eventualmente existente, num dado
território?
No primeiro capítulo estuda-se a origem da conformação da estrutura
fundiária no Brasil. Em seguida, faz-se o registro da transformação dessa terra em
mercadoria, a partir da constituição e desenvolvimento do Mercado de Terras Rurais
4 Ao longo da história, o acesso e uso da terra foram regulados, não faltando leis versando a respeito do
tema. Porém, houve e há um abismo entre tais regulações de cunho formal e o praticado, fato que
acarreta em perda de credibilidade das instituições nacionais e insegurança jurídica quanto à
propriedade fundiária, devido à incipiência da governança agrária.
20
(MTR), ocorrido em 1850, até o final dos anos 1960 com o advento da modernização
agrícola. Neste ponto, a terra tende a ser, além de mercadoria, um ativo, pois, a
modernização gerou um aumento da produtividade da agricultura e elevou seus níveis
de rentabilidade, o que faz com que a mesma se confronte com outros ativos.
No segundo capítulo estuda-se a formação da estrutura fundiária de Baraúna-
RN, bem como seus níveis de concentração e ociosidade, e as relações econômicas entre
demandantes e ofertantes de terras agrícolas registradas no Cartório do Registro de
Imóveis do município selecionado.
O terceiro capítulo constitui-se em uma discussão dos resultados, e, por fim,
apresenta-se a conclusão.
Para tanto, far-se-á uso de pesquisa bibliográfica da literatura disponível sobre o
tema, além da obtenção de dados de negócios com terras realizados naquele município.
Além disso, foi realizada coleta de dados secundários junto a instituições, tais como, o
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (IPEA) e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), a
fim de ampliar o acesso à informação do tema em estudo.
21
CAPÍTULO 1 Formação e dinâmica do mercado de terras agrícolas:
breves notas
1.1 Questão agrária: um tema atual
O Brasil, em pleno século XXI, ao contrário dos países desenvolvidos, ainda
padece de problemas de estrutura fundiária relacionados à Questão Agrária. Como
mencionado anteriormente, foram herdados do período colonial e persistem na
atualidade brasileira.
Assim, desde uma perspectiva histórica, durante o período de vigência das
sesmarias, que se estendem do descobrimento do Brasil até a Lei de Terras (Lei Nº 601
de 1850), a posse da terra se dava pela outorga real, tendo influência nisso a igreja e as
relações políticas estabelecidas.
Apesar dos conflitos e controvérsias entre os vários grupos de interesse, a Lei de
Terras de 1850 tinha caráter regulatório para organizar o acesso à terra, barrar o acesso
às terras não ocupadas, estabelecer um cadastro de terras para definir áreas públicas ou
devolutas, ou seja, aquelas pertencentes ao Estado. Modernamente, ainda, deu base
jurídica para que a terra se transformasse em um ativo a ser usado como garantia para
empréstimos.
Todavia, a posse - mecanismo de ocupação de terras até ali existente, também
pela falta de regulação estatal - continuou em prática, e se dava através da usucapião,
com concessões de propriedades, independente de detenção de títulos, mesmo após a
Proclamação da República. Tal situação, que foi principalmente condicionada pelo
poder político oligárquico, contribuiu para inviabilizar a realização de um cadastro de
terras, capaz de determinar quais eram as terras devolutas existentes. Ademais, os
registros de terras eram feitos pela Igreja, mesmo depois da Lei de Terras, sem contar
que esse processo de apropriação permaneceu praticamente intacto mesmo após a
abolição da escravatura (1888) e da Proclamação da República (1889). Apesar da
determinação de se registrar terras em cartórios, a partir de 1864, tais registros tem a
especificidade de serem imprecisos e incertos quanto a real situação da propriedade. Isto
porque são decisões tomadas por entes privados, supostamente, em nome do interesse
público.
22
Com a Proclamação da República, em 1889, concedeu-se autonomia aos estados
na demarcação das terras devolutas e concessão títulos de propriedade, o que
inviabilizou ainda mais a capacidade de regulação da estrutura fundiária e, por extensão
do ainda incipiente mercado de terras.
Um traço marcante do atual sistema de registro de estabelecimentos realizado
em cartório foi herdado da institucionalização do Registro Público de Terras, de 1900,
onde as informações de demarcação eram dadas pelo proprietário, isto é, dependiam da
boa-fé destes, o que abriu margem para fraudes. Tal cenário de incapacidade de
governança dos mercados de terras foi aprofundado, quando da vigência do Código
Civil de 1916, reafirmando o cartório como instituição oficial de registro de terras e de
negócios com terras.
A partir disso, houve tentativas de regulação fundiária que contribuíram para
desestabilizar ainda mais as garantias à propriedade da terra, como o Decreto Lei
1.164/715, e suas modificações no Decreto-Lei 2.375/87
6, as quais versavam sobre a
proteção de áreas importantes para a segurança e o desenvolvimento nacional, ou seja,
fronteiras, áreas ricas em minérios e proximidades de rodovias federais.
Todavia, o Estatuto da Terra (1964) teve o mérito de inovar e somar às políticas
de Reforma Agrária no que se refere às funções sociais da terra, válido até hoje, sob a
égide da Constituição Federal de 19887. Esta ordenação jurídica incorporou essas
5 Art. 1º São declaradas indispensáveis à segurança e ao desenvolvimento nacionais, na região da
Amazônia Legal, definida no artigo 2º da Lei nº 5.173, de 27 de outubro de 1966, as terras devolutas
situadas na faixa de cem (100) quilômetros de largura, em cada lado do eixo das seguintes rodovias, já
construídas, em construção ou projeto.
Parágrafo único. Os pontos de passagem e as extensões dos trechos planejados serão fixados
definitivamente pelo Departamento Nacional de Estradas de Rodagem, após os estudos técnicos e
topográficos finais.
6 Art. 1º Deixam de ser consideradas indispensáveis à segurança e ao desenvolvimento nacionais as
atuais terras públicas devolutas situadas nas faixas, de cem quilômetros de largura, em cada lado do eixo
das rodovias, já construídas, em construção ou projetadas, a que se refere o Decreto-lei nº 1.164, de 1º de
abril de 1971, observado o disposto neste artigo.
Art. 5º A União transferirá, a título gratuito, ao respectivo Estado ou Território, terras públicas não
devolutas que, nas faixas mencionadas no caput do artigo 1º, lhe pertençam, condicionada, a doação, a
que seu beneficiário vincule o uso daquelas áreas aos objetivos do Estatuto da Terra e legislação conexa.
1º Será também possível, à União, transferir, ao Estado, ou Território, onde se situem, terras públicas a
ela pertencentes, localizadas na Faixa de Fronteira, inclusive para os objetivos aos quais se refere
o caput deste artigo.
7 CF/1988. Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente,
segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I - aproveitamento
racional e adequado; II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio
ambiente; III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV - exploração que
favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
23
mesmas funções, a saber, visava o bem-estar dos proprietários e trabalhadores, níveis
satisfatórios de produtividade do uso da terra, preservação dos recursos naturais e
respeito às leis trabalhistas.
A fim de implantar as exigências do Estatuto da Terra criou-se o Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), em 1970, autarquia responsável
pela realização da reforma agrária, pelo Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (SNCR) e
administração das terras públicas da União. Através do registro do imóvel rural e
emissão do Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR) pelo INCRA, tanto
proprietários, quanto posseiros, pagavam o Imposto sobre o Imóvel Rural (ITR), sem a
conferência das informações declaradas e atualizadas a cada cinco anos. Vale ressaltar
que o imposto cobrado era e, ainda na atualidade, continua a ser muito baixo. Portanto,
o Estatuto da Terra deu continuísmo à formalização da ocupação de terras pela posse,
inclusive avançando em terras públicas.
No tocante à estrutura da regulação e governança fundiária brasileira, com base
nas leis em vigência, de modo simplificado, vem que: das instituições envolvidas com a
governança agrária, o INCRA tem posição de destaque, porém sem os laços necessários
com os municípios, nem tampouco com órgãos do Poder Judiciário. Desse modo,
entende-se ser premente a criação de uma instituição centralizadora do cadastro de
terras que ligue o INCRA a estas instituições.
Além disso, das instituições importantes para a tomada de decisões de
governança agrária brasileira, que não tem integração entre si, são o Governo Federal,
os Governos Estaduais, o INCRA, Institutos Estaduais de Terras, o sistema de cartórios
de registro de imóveis, Municípios, Secretaria do Patrimônio da União (SPU) e a
Receita Federal. A integração mais estreita entre essas instituições através da
interligação e cruzamento de informações, como por exemplo, entre cartórios de
registros de imóveis (ligados ao Poder Judiciário) e o INCRA, que por sua vez
alimentaria o banco de dados da SPU e receita Federal, tendo o apoio dos municípios e
estados, implicaria para uma maior eficiência na tributação (ITR), delimitação das terras
públicas e, por fim, contribuiria para o melhoramento de governança, em termos de
controle, para a solução da questão agrária.
Na atualidade, ainda há conflitos por terra - em sua maioria sangrenta -,
descontrole da aquisição de terras por estrangeiros e o uso predatório e agressor ao meio
ambiente.
24
Diante desses fatos, Reydon (2011, p. 22) aponta para a necessidade de adoção
de políticas agrárias de forma combinada com o objetivo de fazer frente à Questão
Agrária no presente tempo, tais como: modernização dos sistemas de registros de
imóveis, cadastramento das propriedades privadas e públicas, titulação de posseiros de
terras, Tributação sobre a terra (ITR), colonização de áreas alteradas, financiamento da
aquisição de terras e, for fim, a reforma agrária.
Resta, nesse contexto, apontar a necessidade de estudos de casos sobre mais um
tipo de impacto, a saber, da modernização agrícola na estrutura fundiária, tal como
ocorre em regiões do semiárido brasileiro, onde, tudo indica, a questão agrária em nada
ou muito pouco difere do contexto nacional. E, ainda, nessa perspectiva analisar os
motivos de persistência dessa problemática nacional, tal como aqui se supõe ter no
preço da terra, um de seus determinantes.
Assim, inicialmente, no período compreendido entre 1967 e 1973, diante da
instabilidade do mercado financeiro e um quadro inflacionário, sob a égide da Lei da
Reforma do Mercado de Capitais de 1965, Sayad (1977), apreende que os preços da
terra agrícola subiram, evidenciando estreita relação entre a queda dos preços das ações
e o aumento do preço da terra. Para ele,
Não há dúvida que a história dos controles impostos ao setor financeiro no
período posterior à Lei da Reforma do Mercado de Capitais está ligada à
própria história do controle da inflação. Mas é inegável também,
particularmente após 1971, que o controle imposto aos juros de operações
normais do mercado financeiro e a permanência do crédito seletivo como
incentivo aos investimentos produtivos poderiam ser explicados pela
presença de investimentos mais rentáveis, com as aplicações e imóveis
urbanos e rurais. (SAYAD, 1977, p. 632).
A partir de então, a Questão Agrária será analisada sob o aspecto do progresso
técnico e dos preços da terra agrícola, que é o resultado das forças de mercado - isto é,
oferta e demanda por terras. Todavia, há fatores submersos nesse processo, a saber, a
especulação com terras, que é o resultado das expectativas dos agentes econômicos em
obter significativos rendimentos advindos da posse da terra, que, por sua vez, resulta em
concentração e ociosidade fundiária, parâmetros aqui selecionados para caracterizar a
existência, ou não, de uma Questão Agrária.
Adiante a Questão Agrária será estudada sob a ótica da Modernização Agrícola,
pressuposto básico para o aprofundamento de tal questão.
25
1.2 Progresso técnico, questão agrária e preço da terra agrícola
A modernização agrícola tem como um de seus determinantes o volume do
crédito agrícola no período e subsidiado pelo Estado. Desse modo, como o crédito
condicionou a modernização, possibilitou-se a ampliação da produção agrícola, que, por
sua vez dinamizou os mercados de terras, tendo como consequência uma elevação no
preço da terra rural.
A modernização da agricultura decorrente do crédito agrícola subsidiado, com
seu auge em meados da década de 1960 e os anos 1970, teve seu abandono gradativo a
partir de 1987. O progresso técnico da agricultura foi implementado, sobretudo, pelo
Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR), que contribuiu para o aumento da
produtividade do setor agrícola, propiciado pela compra de máquinas, inovações
tecnológicas, melhoramento de processos, sementes e fertilizantes. Tal fato deixa clara a
penetração da financeirização no campo, dado pela introdução do sistema bancário.
O abandono da política de incentivos à agricultura, com o crédito facilitado e
com amortizações igualmente facilitadas e dilatadas, contribuiu para a redução da
rentabilidade do setor agrícola.
Ao associarmos o crédito rural em valores monetários às taxas de juros,
depreendemos que há uma relação inversa entre eles, pois, ao subir a taxa de juros há
uma queda da tomada do crédito, ao passo que na queda daquelas, há um aumento na
tomada destas (mas não na mesma proporção), conforme evidenciado na Tabela 1 a
seguir.
Tabela 1: Crédito Rural - Recursos dos créditos de custeio. Brasil, 1987/1997.
Ano Valor do Crédito Rural em R$ Taxa de juros anual em %
1987 19.447.353.642,96 7,00
1988 13.305.367.708,35 7,00
1989 14.286.914.432,70 7,00
1990 7.639.082.305,49 9,00
1991 8.656.080.004,25 9,00
1992 7.354.561.851,21 0,30
1993 5.573.112.510,66 -4,23
1994 8.560.748.357,73 21,60
1995 4.603.497.122,44 5,56
1996 4.500.718.559,00 5,14
1997 8.500.000.000,00 4,78
Fonte: Delgado e Filho (1998, apud OLIVEIRA; FERREIRA, 2014, p. 68).
26
Nessa conjuntura de implementação e desenvolvimento da modernização da
atividade agrícola, o preço da terra guarda relação direta com os preços das commodities
agrícolas, ou seja, a dinâmica do mercado de produtos determina a dinâmica do
mercado de terras agrícolas.
Na sequência do estudo, a partir de um estudo de caso, propomos a verificação
de provável existência de concentração de terras, seja por causa da modernização
agrícola ou por motivo especulativo, confrontando os estudos e teorias apresentados, em
caso isolado da região Oeste potiguar. Isto é, para o município de Baraúna-RN.
27
CAPÍTULO 2 Origens da modernização agrícola e seus impactos
fundiários posteriores: o caso de Baraúna-RN
No capítulo anterior, vimos que o mercado de terras de um município pode ser
influenciado pelos fatores/condições locais (microeconômicas) em conjunto com as
determinações macroeconômicas.
Assim, neste capítulo procura-se ampliar este tipo de perspectiva inserindo
aspectos históricos e recentes da economia do município de Baraúna-RN, escolhido para
este estudo por estar contido na fronteira de expansão agrícola do estado do Rio Grande
do Norte e por apresentar características pujantes e de destaque no semiárido, sobretudo
no que diz respeito à sua inserção na produção agrícola da fruticultura irrigada, voltada
para exportação.
Para tanto, no primeiro item, é feito um breve relato histórico de Baraúna-RN,
que remonta à origem do município. Adiante também serão abordados aspectos
econômicos recentes, a modernização agrícola, o advento da fruticultura irrigada, um
panorama de sua estrutura fundiária e políticas agrárias implementadas pelo Estado e o
recente afluxo de descendentes de japoneses para o MTA de Baraúna-RN.
2.1 Breve histórico da área de estudo
O entendimento da dinâmica do Mercado de Terras Agrícolas e da expansão
recente da fruticultura irrigada no município de Baraúna-RN está necessariamente
atrelado à forma de como se deu o seu processo de ocupação desse território.
A origem do município tem forte traço característico de sua localização e por ser
fronteira do estado do Rio Grande do Norte com o estado do Ceará.
Segundo Santos Jr. (1998, apud Cruz, 2000, p. 139), o primeiro morador do local
foi o agricultor de nome João Batista Dantas, considerado seu primeiro morador e
fundador, entre os anos de 1930 e 1935. Foi a iniciativa dele, de cavar um poço, que
atraiu muitas famílias para o lugar, o que contribuiu para o seu povoamento. Na
sequência, uma família proveniente do Ceará, de nome Pacheco, ocupou
progressivamente aquelas terras através da atividade pecuarista, sendo expulsa
gradativamente por famílias advindas do próprio estado do Rio Grande do Norte, o que
28
não ocorreu sem muitos conflitos. Daí decorre a imprecisão de limites (divisa) entre os
dois estados até em tempos próximos aos dias atuais.
Existem três versões para a adoção do nome Baraúna pelo município:
i. Há a vertente, de acordo com o historiador e folclorista Cascudo (1968, apud
CRUZ, 2000, p.140), que afirma que o nome Baraúna advém da palavra da
língua tupi “ibirá-una”, uma espécie de madeira de cor preta;
ii. Outra versão, de moradores mais antigos, atesta que o nome Baraúna vem de um
herói mossoroense chamado Alexandre Baraúna; e, por último:
iii. A versão de que tal nome veio em homenagem a um “preto velho” que
frequentava aquela região com o intuito de pescar e caçar.
Contudo, é fato que, o município começou como um povoado e posteriormente
foi elevado ao status de distrito (através da Lei Municipal 889, de 17 de novembro de
1953) pertencente a Mossoró. Neste período era parte do trajeto de tropeiros montados
em burros que viajavam entre Mossoró-RN e Russas-CE, ao qual foi dado o nome de
“Rancho do Sabiá8”, o que perdurou até 1935. Neste ano, o governo municipal de
Mossoró construiu um poço, uma capela, uma escola e umas poucas casas, adotando
para ela o nome de Baraúna-RN, que ostenta até hoje. Baraúna-RN emancipou-se de
Mossoró em 1981, pela Lei nº 5.107 de 15 de dezembro desse mesmo ano, e tem na
agricultura a principal atividade produtiva de sua estrutura econômica.
2.2 Aspectos econômicos recentes
A economia de Baraúna-RN, em seus primórdios, destacou-se pela exploração
de madeira, nas décadas de 1940 e 1950. Em seguida foi a vez da produção do algodão
entre os anos 1960 e 1980. Por fim, veio a produção agrícola da fruticultura irrigada
(especificamente a produção do melão, no início dos anos 1990), produção voltada para
exportação. Além disso, contém atividades petrolíferas, e apresenta características
econômicas peculiares dentre os 62 municípios de sua mesorregião - Oeste Potiguar -, a
8 Ali havia tropeiros que viajavam entre o Ceará e Mossoró e que descansavam no vilarejo chamado
Rancho do Sabiá, sob uma frondosa árvore de nome “pé de sabiá”.
29
saber, seu destaque como a fronteira agrícola9 do estado, sua diversificação produtiva
em expansão desde 1995 que se deu a partir da produção do melão, passando pela
produção da cebola, mamão e melancia.
Finalmente, foi o detentor do maior valor da produção agrícola norte rio-
grandense, registrado no ano de 2010 (lavoura permanente e temporária), de
aproximadamente R$ 132 milhões, segundo a PAM (Produção agrícola Municipal) do
IBGE (2010). Tal parcela equivale a 17% da produção das lavouras do Rio Grande do
Norte, marca esta ultrapassada em 2013, quando o município foi o 17º no ranking da
PAM do IBGE, atingindo R$ 138.578.000,00 de valor da produção agrícola e
participando com 0,6% no total do valor da produção nacional.
Todavia, os indicadores de maior relevância na escolha de Baraúna-RN para a
presente pesquisa são, de acordo com o IDEMA (2008), o seu PIB total de R$
101.101.000,00 e PIB per capita de 4.795,00, referentes a 2005, conforme o Gráfico 1 a
seguir, contendo o período da entrada da FI modernizada (1990-1999) e períodos
anterior e posterior, mostra tal relevância.
Gráfico 1: PIB Municipal da agropecuária (valor adicionado a preços básicos) em R$ (mil) a
preços do na 2000. Baraúna, 1985-2010.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE apud IPEADATA.
9 Por fronteira Agrícola entende-se ser o processo de colonização e desbravamento de novas terras
incultas e mais férteis para a produção agropecuária, que, no caso do Brasil se deu do litoral para o
oeste, como apontado por Andrade (1980, p. 49). Atualmente as principais fronteiras agrícolas estão na
Amazônia, no Centro-Oeste e a região denominada MATOPIBA (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia).
Baraúna é um dentre os municípios situados na área de expansão agrícola do RN.
0,00
10.000,00
20.000,00
30.000,00
40.000,00
50.000,00
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70.000,00
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20
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20
10
PIB Municipal da agropecuária
Linear (PIB Municipal da agropecuária)
30
A evolução do PIB da agropecuária do município apresentou tendência ao
crescimento desde 1985, com picos em 2002 e 2003 da ordem de aproximadamente R$
60 mi, o que faz supor a existência de uma economia agrícola dinâmica no município de
Baraúna-RN.
2.2.1 Modernização da agricultura
A modernização agrícola eclodida a partir da década de 1960, da chamada
“Revolução Verde”, e, guiada pelo Sistema de Crédito Rural (SNCR) - com sua
expressão na expansão do crédito subsidiado - teve efeitos fundiários danosos, como
afirma Graziano da Silva (1982, p. 29-31):
Aí vem a solução mágica: vamos modernizar a agricultura! Só com o
aumento da produtividade é que teremos boas rendas; daí se poderem
pagar maiores salários e dar mais emprego! E então aparecem as
formulações de política e seus instrumentos para acelerar a
modernização. Um dos mais importantes, ou pelo menos aquele sobre
o qual se tem dado grande ênfase é o crédito rural, que parece de
sucesso pouco provável (GRAZIANO DA SILVA, 1982, p. 29).
Pois, a partir de então, houve um aprofundamento da questão da terra pelo
aumento da concentração fundiária, haja vista a mudança do complexo rural para o
complexo agroindustrial.
Este, por sua vez, tem a lógica da grande produção de commodities agrícolas
para exportação, em resumo, é traduzido como a permanência do latifúndio e da
monocultura.
Para esse autor, ainda, a chamada “modernização dolorosa” liderada pelo Estado
teve um misto de “modernizante”, porém conservadora das desigualdades regionais,
beneficiando determinados proprietários e áreas, e dolorosa por acirrar os conflitos
sociais, na medida em que é um processo contraditório.
Pois, se de um lado o setor agrícola adquiriu competitividade e escala para
atender a demanda internacional, por outro lado a distribuição da riqueza gerada ocorreu
de forma desigual.
No período escolhido, 1982-2006, o Brasil experimentou duas tendências de
fluxo de crédito em dois períodos distintos como mostrado no Gráfico 2 a seguir.
31
Gráfico 2: Evolução do Crédito rural no Brasil em R$ (mil), 1982-2006.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Banco Central do Brasil (BACEN) apud IPEADATA.
Percebe-se que houve uma expressiva queda do crédito rural de 1982 a 1996,
cerca de 80%. Todavia, houve retomada do crédito a partir de 1996 até 2006, porém
insuficiente para recuperar o patamar do início do período .
A Região Nordeste apresentou tendência de decréscimo na oferta de crédito
rural desde 1982 até 2000, ocasião em que ocorre uma moderada tendência ao
crescimento, tal como mostrado a seguir no Gráfico 3.
Gráfico 3: Evolução do crédito rural (em R$ mil a preços do ano 2000). Nordeste, 1982-2006.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Banco Central do Brasil (BACEN) apud IPEADATA.
0
10.000.000.000
20.000.000.000
30.000.000.000
40.000.000.000
50.000.000.000
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100.000.000
150.000.000
200.000.000
250.000.000
300.000.000
350.000.000
400.000.000
450.000.000
500.000.000
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01
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02
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03
20
04
20
05
20
06
32
Apesar dos dados do Gráfico 4 a seguir serem em números de contratos de
crédito rural, o mesmo é relevante no sentido de que há demanda crescente por crédito
agrícola a partir de 2001, tendo aumentado em cerca de 300%.
Gráfico 4: Total de contratos de crédito rural. Baraúna-RN, 1993-2004.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Banco Central do Brasil (BACEN) apud IPEADATA.
No que diz respeito à penetração do progresso técnico no campo potiguar,
nota-se que, no caso de Baraúna-RN, tanto houve o crescimento em aproximadamente
42% em 1995-96 e 140% em 2006 do uso de tratores tendo como base o ano de 1985,
quanto a elevação da utilização de veículos, de 677, em 1985, para 1.143 em 200610
.
Todavia, nesse período, foi verificado um recuo tanto no quantitativo de
máquinas quanto de arados em 2006 em relação a 1985, isto é, houve uma redução em
torno de 21% e 10%, respectivamente. Logo, deve-se relativizar a presença da
modernização no campo, que não foi algo uniforme e amplo, tal como deixa a entender
o senso comum.
Isto posto, passaremos a mostrar dados da realidade de Baraúna com o
propósito de análise comparativa com a literatura existente.
Em Baraúna, ainda devido ao processo de modernização em curso, existe um
expressivo número de projetos de irrigação, levado a cabo preponderantemente pela
perfuração de poços, demonstrado nas Tabelas 2 e 3 a seguir, a qual dá um vislumbre do
10
Com base nos dados do SIDRA/IBGE válidos para os anos 1985, 1995-96 e 2006 (Veja-se Apêndice
3).
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
3500
1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
33
crescente volume da área beneficiada pela irrigação, a saber, houve um aumento de 18
ha irrigados em 1985 para 2.462 ha em 2006, correspondendo a aproximadamente a
13.700% da área irrigada inicialmente (Tabela 3), corroborado pelo aumento de cerca de
600% em 2006 em relação a 1985 do número de estabelecimentos com irrigação
(Tabela 2).
Tabela 2: Número de estabelecimentos irrigados. Baraúna-RN, 1985-2006.
Ano
Estabelecimentos
Irrigados (I) Total (II) (I)/(II)
1985 23 1.062 2,16%
1995-96 - - -
2006 153 788 19,41%
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do SIDRA/IBGE.
Observa-se, pois, um incremento de 20% do número de estabelecimentos
irrigados em relação ao total, no ano de 2006, contra cerca de 2% de 1985.
Tabela 3: Área irrigada. Baraúna-RN, 1985-2006.
Ano
Área irrigada (ha)
(I)
Área total (ha)
(II)
(I) / (II)
(%)
1985 18 70.831 0,02%
1995-96 - - -
2006 2.462 25.729 9,56%
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do SIDRA/IBGE.
No que concerne à área irrigada, houve um aumento considerável de
aproximadamente 10% da participação da área irrigada em relação ao total em 2006 em
face do insignificante percentual de área irrigada em relação ao total em 1985.
Quanto à utilização de fertilizantes e defensivos agrícolas, constata-se que houve
um considerável aumento de estabelecimentos quanto ao uso de fertilizantes, de 31
estabelecimentos em 1985 para 147 estabelecimentos em 2006 (aproximadamente
500%) e, quanto ao uso de defensivos agrícolas, houve uma redução, de 820
estabelecimentos em 1985 para 470 estabelecimentos em 2006, ou seja, caiu quase pela
metade, conforme a Tabela 4 a seguir.
34
Tabela 4: Número de estabelecimentos por utilização de fertilizantes e defensivos agrícolas.
Baraúna-RN, 1985-2006.
Ano
Nº de estabelecimentos segundo o uso
Total
(I)
Fertilizantes
(II)
(II)/(I)
Defensivos
(III)
(III)/(I)
1985 1.062 31 2,91% 820 77,21%
1995-96 - - - -
2006 774 147 18,99% 470 60,72%
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do SIDRA/IBGE.
A partir da emergência da modernização foram criadas as condições para a
expansão, na agricultura local, de produtos de alto valor comercial, como é o caso,
principalmente do melão, seguido pela melancia e pela banana, voltados
prioritariamente para exportação, tal como foi iniciado na década de 1990.
2.2.2 A fruticultura irrigada
O desenvolvimento da produção de melão, no município de Baraúna-RN, foi
precedido por um aumento no dinamismo dos negócios realizados no mercado de terras
local. Isto se deveu, principalmente, pelo fato desse município possuir solos propícios e
abundância de água, proveniente de poços artesianos,
Inicialmente, tal produção do setor da Fruticultura Irrigada de Baraúna-RN é
explicitada na Tabela 5 a baixo, com singular destaque para a cultura do melão, com
99.200 t produzidas em apenas 62 ha, dando, assim, um vislumbre do grau de
produtividade e tecnificação dessa cultura, apesar de, neste caso, não atender
completamente os requisitos de um bom indicador econômico de produtividade11
agrícola tal qual proposto por Buainain e Vieira (2009, p. 40), por ter sido aqui somente
relacionados a quantidade produzida com o fator de produção terra, o que nos impede
de afirmar, com precisão, o grau de produtividade da FI do município.
11
Por definição, a produtividade é um indicador econômico que relaciona valores de produção com
quantidades dos fatores de produção utilizados, sendo, portanto, um indicador importante para a análise
comparativa do desempenho e perspectivas de empresas e setores produtivos. Considerando que no setor
agrícola todos os três fatores de produção - terra, capital e trabalho - tem grande importância, o indicador
de produtividade de um fator isolado, pode não refletir com precisão a capacidade produtiva por não
considerar as interações entre os 3 fatores (BUAINAIN; VIEIRA, 2009, p. 40).
35
Tabela 5: Área colhida e quantidade produzida dos principais produtos agrícolas. Baraúna-RN,
2006.
Produto
Área colhida
(ha)
Quantidade produzida (t)
Algodão herbáceo 1.100 715
Manga 1.100 660
Goiaba 110 27
Feijão 7 528
Melancia 800 40.000
Banana 1.600 1.161
Melão 62 99.200
Milho 3.200 6.400
Tomate 8.000 2.000
Castanha de caju 50 246
Coco-da-baía (1)
410 16
Mamão 4 4.260
Sorgo granífero 710 332
Mandioca 200 114
Mamona 16 4
Cebola 75 217
Batata-doce 106 36
Total 17.140 155.900 Fonte: IBGE apud IDEMA.
A fim de ampliar a visão que se tem da agricultura local e de sua importância,
observa-se sua inserção no contexto internacional, através da observação da dinâmica
exportadora, tal como está evidenciada nos Gráficos 5 e 6 a seguir.
Gráfico 5: Exportações de Baraúna-RN (em Kg), 1997-2015.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do MDIC/Aliceweb.
0
5.000.000
10.000.000
15.000.000
20.000.000
25.000.000
30.000.000
35.000.000
40.000.000
36
De 1997 a 2015 as exportações do município de Baraúna-RN cresceram
aproximadamente 600%, em termos de volume (Kg).
Também, no período de 1997 a 2015, houve um crescimento das exportações em
termos de valor monetário (Gráfico 6 abaixo), de aproximadamente 300%. Isso se deu
por causa da alta dos preços internacionais dos produtos da FI e pelo crescente aumento
da demanda externa, sobretudo europeia, corroborado pelo alto nível de produtividade
da FI de Baraúna-RN e adequação do setor às exigências fitossanitárias internacionais.
Gráfico 6: Exportações de Baraúna-RN (em US$), 1997-2015.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do MDIC/Aliceweb.
Assim, uma vez apresentadas as condições concretas do mercado de produtos
agrícolas, passa-se à apresentação de dados relativos à questão fundiária em nível local.
2.3 Estrutura fundiária e ociosidade da Terra
Na atualidade, através de dados contidos no Censo Agropecuário de 2006, do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nos deparamos com alto grau de
concentração de terras12
, tanto no Brasil, quanto no estado do Rio Grande do Norte.
A economia brasileira tem um quadro de concentração de terras como um todo,
respaldado pela estrutura histórica de sua distribuição.
12
Os índices de Gini para o Brasil e Rio Grande do Norte para o período exposto encontram-se na faixa
compreendida entre 0,701 e 0,900 que corresponde a concentração forte a muito forte de graus de
concentração, de acordo com terminologia elaborada por Câmara (1949, p. 517).
0
5000000
10000000
15000000
20000000
25000000
37
Ademais, de 1985 a 2006 o índice de concentração fundiária - Índice de Gini13
-
pouco tem mudado, dentro da categoria forte a muito forte, de acordo com Câmara
(1949, p. 517), apresentando oscilações minúsculas, conforme Tabela 6 a seguir.
Tabela 6: Evolução do índice de Gini. Brasil e Rio Grande do Norte. 1985-2006.
Unidade Geográfica 1985 1995/96 2006
Brasil 0,857 0,856 0,858
Rio Grande do Norte 0,853 0,852 0,823
Fonte: Censos agropecuários do IBGE (1985/2006).
Na economia norte rio grandense, similarmente à do Brasil, esses dados
mostram que, em 1985 e 1995 o índice de Gini era cerca de 0,85 e em 2006 era de
0,823.
Finalmente, Baraúna-RN apresentou um grau de concentração de terras
significativamente inferior ao índice nacional e do RN, em um patamar próximo a 0,66
(Tabela 7 a seguir).
Tabela 7: Evolução do índice de Gini de Baraúna-RN, 1985-2006.
Ano 1985 1995 2006
Índice de Gini 0,666 0,666 0,666
Fonte: Programa estatístico Gretl 2016C a partir de dados do IBGE (1985/2006).
Os dados disponíveis sobre a estrutura fundiária, no que tange à concentração de
terras agrícolas, em Baraúna-RN, constam das Tabelas 8 e 9, apresentadas abaixo.
Tabela 8: Número estabelecimentos agrícolas. Percentuais dos estratos de área em relação ao
total. Baraúna-RN. 1985, 1995/96 e 2006.
Estratos
área (ha)
1985 1995/1996 2006
Número % Número % Número %
0 – 10 290 27,3 295 30,8 329 42,51
10 – 20 175 16,5 166 17,3 169 21,83
20 – 50 299 28,2 271 28,3 172 22,22
50 – 100 176 16,6 126 13,1 55 7,11
100 e + 122 11,4 101 10,5 49 6,33
Total 1062 100,0 959 100,0 774 100,00 Fonte: Fundação IBGE. (Censos Agropecuários/SIDRA).
13
O Índice de Gini foi criado, em 1912, pelo estatístico, demógrafo e sociólogo italiano Conrado Gini
(1884 - 1965). Equivale à medida do grau de concentração ou desigualdade de distribuição, nesse caso,
a terra. O valor do coeficiente de Gini oscila entre 0 e 1. Quanto mais próximo do zero, menor é o grau
de concentração e quanto mais próximo do valor 1, maior é o grau de concentração.
38
Em primeiro lugar, com referência ao comportamento dos diferentes estratos de
área, a maior parte dos estabelecimentos existentes nesse município em 1985 era de
pequeno porte, ou seja, entre 1 e 50 hectares, pois, representavam 72% do total, que se
eleva para 76% em 1995/1996, e, 86% em 2006. Simultaneamente, são verificadas
quedas, em termos percentuais, tanto dos estabelecimentos de médio porte (50 a 100
ha), em aproximadamente 3 pontos percentuais em 1995/96 e 6 pontos percentuais em
2006, quanto dos grandes estabelecimentos (100 ha e mais), em aproximadamente 1
ponto percentual em 1995/96 e 4 pontos percentuais em 2006.
Portanto, tais movimentos dão indícios de que, no período em análise, ocorreu
relevante e crescente participação percentual dos pequenos estabelecimentos, ao
contrário dos demais estratos. Pois, estes, apresentaram tendência de queda de
participação percentual, evidenciando assim, um primeiro indício de desconcentração da
terra agrícola.
Com base na Tabela 9, a seguir, no que concerne ao comportamento dos
pequenos estabelecimentos (em estratos de área), entre 1 e 50 ha, tiveram aumento em
participação percentual, partindo de aproximadamente 19% da área total ocupada, em
1985, a 23%, em 1995/96 e a 34% em 2006, o que representa quase o dobro da
participação inicial, em termos de área.
Tabela 9: Área dos estabelecimentos agrícolas. Participação percentual dos estratos em relação
aos totais. Baraúna-RN. 1985, 1995/96 e 2006.
Estratos
área (ha)
1985 1995/1996 2006
Área % Área % Área %
0 – 10 1.227 1,7 1.249 2,5 1.500 5,83
10 – 20 2.387 3,4 2.272 4,5 2.271 8,83
20 – 50 9.572 13,5 8.135 16,1 4.876 18,95
50 – 100 12.188 17,2 8.457 16,7 3.642 14,16
100 e + 45.457 64,2 30.459 60,2 13.440 52,24
Total 70.831 100,0 50.572 100,0 25.729 100,00 Fonte: Fundação IBGE. (Censos Agropecuários/SIDRA).
Em simultâneo, os estabelecimentos de tamanho médio, estratos variando de 50
e 100 ha, demonstram leve decréscimo, de 17% em 1985 para 14% em 2006. De modo
semelhante, também houve o decréscimo da participação dos grandes estabelecimentos
no período, a saber, de 64% em 1985 para 52% em 2006.
39
Por conseguinte, diante dos resultados do cálculo do índice de Gini, que tem por
finalidade de medir concentração, que para o caso específico deste MTA se expressa na
concentração da propriedade da terra, tal concentração mostrou-se estável entre 1985 e
2006, no patamar de 0,722 (Apêndices 9, 10 e 11), nível abaixo do índice de Gini
nacional e do RN, apesar de ainda figurar na categoria concentração forte a muito forte,
conforme Câmara (1949, p. 517), exposto no Apêndice 8.
Esse nível é relativamente baixo, se levarmos em consideração que, para a
estrutura fundiária brasileira, esse número atinge níveis de 0,80 (no ano 2000).
Logo, apesar da maior parte das terras ainda estar concentrada nas mãos de uns
poucos produtores, todavia, observa-se uma tendência de redução nessa magnitude no
período em pauta.
Em face do exposto acima, de volta à literatura, no que concerne à utilização das
terras agriculturáveis brasileiras, vem que, apesar da exigência de atendimento da
“função social” da propriedade da terra feita pela Lei Nº 4.504, de 30 de novembro de
1964, a Lei de Terras, há uma abundante literatura que defende a existência da
predominância de ociosidade fundiária, além da concentração de terras e das estruturas
produtivas de caráter latifundiário e monocultor, o que dá indícios de flagrante oposição
à legislação fundiária, o é bem explicitado por Reydon (2007):
A história da legislação agrária sobre os direitos de propriedade da terra no
Brasil tem se desenvolvido conforme duas tendências. De um lado, o Estado,
legislando e procurando exercer (com mais ou menos veemência) seu poder
no sentido de definir e restringir os direitos de propriedade no Brasil e, de
outro, os interesses da grande propriedade fundiária, resistindo a qualquer
forma de restrição ao direito de propriedade da terra, seja opondo-se à
legislação fundiária, seja sabotando sua efetiva aplicação. Nesse confronto,
reproduzido ao longo de nossa história fundiária, os interesses privados
levaram a melhor e tornaram efetivamente plenos para si os direitos de
propriedade privada não respeitando os seus usos sociais e/ou ambientais.
Isso não significou a democratização do acesso à terra para a maioria.
(REYDON, 2007, p. 35).
Ainda acerca disso, Gomes (2004), em dissertação apresentada, traz a afirmação
de que
[...] o alto grau de ociosidade das terras no Brasil está relacionado, em parte,
aos fins especulativos a que está subordinada. A aquisição de terras por
razões não diretamente ligadas à sua função produtiva, e sim como reserva de
valor, é uma tradição no Brasil, transformando grandes extensões em
propriedades privadas de muitos agentes financeiros, vários deles
internacionais, que não têm o menor vínculo com a produção agropecuária
(GOMES, 2004, p. 14).
40
Com o objetivo de ampliar o conhecimento sobre a estrutura fundiária local
estuda-se, a seguir, a magnitude apresentada pela ociosidade de terras, de Baraúna-RN,
no Gráfico 7, apresentado a seguir e que abrange o período de 1985 a 2006.
Gráfico 7: Uso da terra agrícola. Percentuais de terras utilizadas e não utilizadas em relação aos
totais. Baraúna-RN, 1985, 1995-96 e 2006.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados de Censos Agropecuários IBGE/SIDRA.
Do gráfico acima se observa a existência de estabilidade no nível de ociosidade
d terra, sento tomado como parâmetro para tal a área de terras não utilizadas, ociosidade
esta que, muito provavelmente, varia de maneira inversamente proporcional à demanda
externa por produtos da fruticultura irrigada.
Em suma, há presença de ociosidade fundiária, porém a níveis não prejudiciais à
produção agrícola do município, dado o alto grau de produtividade do setor fruticultor,
propiciado pela modernização agrícola do município.
Por fim, na literatura consultada, ainda, tem-se que Reydon (2011), a respeito da
Questão agrária, levanta a tese de que “No mundo rural a grande concentração da
propriedade da terra e a elevada ociosidade da terra associada à existência de inúmeros
sem terras demandando terras demonstram que a questão agrária brasileira ainda precisa
ser enfrentada” (REYDON, 2011, p. 3).
Assim sendo, então, no caso de Baraúna-RN essas variáveis de concentração e
ociosidade precisam ser relativizadas, pelo comportamento atípico, em relação ao geral,
tal como foi exposto acima.
67,62 % 75,04 % 69,27 %
32,37 % 24,95 % 30,72 %
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
1985 1995-96 2006
Terras não utilizadas (ha) Terras utilizadas (ha)
41
2.4 A dinâmica do MTA de Baraúna-RN de 1982 a 2012
É de relevância a apresentação de pesquisa feita no Cartório de Registro de
Imóveis Rurais de Baraúna-RN para um melhor entendimento sobre como se deram os
movimentos de negócios de compra e venda MTA do município desde o ano de 1982
(portanto, 1 ano após a sua emancipação) até 2012, época recente e abrangente da crise
econômica mundial de 2008.
Os dados foram separados em número de transações e área total transacionada e
os anos pesquisados foram subdivididos em três partes, a saber, de 1982 a 1993, de
1994 a 1999 e de 2000 a 2012, por causa da conjuntura inflacionária da economia
brasileira, pelo advento da fruticultura irrigada e devido à crise econômica mundial de
2008, respectivamente.
No primeiro período houve um total de 665 transações no MTA de Baraúna-RN,
com destaque para os anos de 1983, 1985, 1988 e 1993. Ademais, o período teve
característica irregular com respeito à tendência e uma média de aproximadamente 55
transações, como mostrado, a seguir, no Gráfico 8.
Gráfico 8: Número de transações no MTA. Baraúna-RN, 1982-1993.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Cartório de Registro de Imóveis de Baraúna-RN.
Para o segundo período, compreendido de 1994 a 1999, ocorreram 261
transações, número bem abaixo do período anterior, com destaque para os anos de 1997
0
20
40
60
80
100
120
1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993
Nº
tran
saçõ
es
42
e 1999, com 54 e 51 transações, respectivamente, tendo uma leve tendência ao
crescimento, demonstrado no Gráfico 9 a seguir.
Gráfico 9: Número de transações no MTA. Baraúna-RN, 1994-1999.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Cartório de Registro de Imóveis de Baraúna-RN.
Por fim, o terceiro e último período, que vai de 2000 a 2012, teve um volume de
transações de aproximadamente 500, com manutenção em um patamar aproximado de
60 transações, de 2001 a 2004, com queda em 2005 e tendência de crescimento a partir
daí, até 2010, havendo queda brusca em 2011 e 2012, de acordo com o Gráfico 10 a
seguir.
Gráfico 10: Número de transações no MTA. Baraúna-RN, 2000-2012.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Cartório de Registro de Imóveis de Baraúna-RN.
0
20
40
60
80
100
120
1994 1995 1996 1997 1998 1999
Nº
tran
saçõ
es
0
20
40
60
80
100
120
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012
Nº
tran
saçõ
es
43
No período de 1982 a 1993, a área total transacionada foi de quase 52 mil ha,
havendo maior intensidade no ano de 1983, com cerca de 50% acima da área média
transacionada em todo o período, que foi de aproximadamente 4.300 ha, conforme
mostrado a seguir no Gráfico 11.
Gráfico 11: Área transacionada no MTA. Baraúna-RN, 1982-1993.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Cartório de Registro de Imóveis de Baraúna-RN.
No período de 1994 a 1999, conforme o Gráfico 12 abaixo, também houve
menor dinâmica no total de área negociada, no montante de um pouco mais de 17 mil
ha, com distinção para o ano de 1995, atingindo o patamar de quase 5 mil ha.
Gráfico 12: Área transacionada no MTA. Baraúna-RN, 1994-1999.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Cartório de Registro de Imóveis de Baraúna-RN.
0
1000
2000
3000
4000
5000
6000
7000
1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993
Áre
a tr
ansa
cio
nad
a (h
a)
0
1000
2000
3000
4000
5000
6000
7000
1994 1995 1996 1997 1998 1999
Áre
a tr
ansa
cio
nad
a (h
a)
44
Por outro lado, pelo aspecto de área transacionada, o período de 2000 a 2012
experimentou o dobro em relação ao período anterior, conforme o Gráfico 13 a seguir,
com tendência ao crescimento de 2000 a 2002 e acentuada queda entre 2004 e 2005.
Gráfico 13: Área transacionada no MTA. Baraúna-RN, 2000-2012.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Cartório de Registro de Imóveis de Baraúna-RN.
Em 2006 o MTA de Baraúna experimentou acentuado crescimento de negócios,
com novamente decréscimo em 2007 e 2008. E, por fim, novo crescimento de negócios
de 2009 a 2010, apresentando abrupta queda em 2011 e 2012.
Albano (2011, p. 368-369), em sua tese de doutoramento, corrobora com nossas
argumentações feitas sobre a estrutura fundiária de Baraúna-RN. Segundo ele, ao fazer
análise comparativa das transações de compra e venda de terras nos MTA’s dos
municípios de Ipanguaçu-RN e Baraúna-RN, no período que vai de 1979 a 2008,
observou-se que, neste último, tem um grande número de transações, porém estável. Há
uma média de 50 por ano, com um aumento de transações por ocasião de sua
emancipação de Mossoró em 1981, ao contrário de Ipanguaçu, onde existe uma maior
concentração fundiária e um volume maior e instável de negócios, principalmente na
década de 1990 com a expectativa da política de crédito fundiário, demonstrando,
assim, o caráter especulativo desse mercado.
Ainda é destacado por Albano (2011, p. 368-369) que a inserção da fruticultura
irrigada em Baraúna-RN, entre 1993 e 2002, causou picos em transações com terras,
seguidos por um período de estabilidade no MTA (2003 a 2008), mesmo na vigência de
0
1000
2000
3000
4000
5000
6000
7000
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012
Áre
a tr
ansa
cio
nad
a (h
a)
45
intervenção do Estado, tanto a nível federal quanto em nível estadual, em políticas
fundiárias através de crédito fundiário e distribuições de terras.
Todavia, segundo este autor, Baraúna-RN atualmente sofre um processo de
concentração da terra devido à chegada de empresas da fruticultura irrigada, em especial
de imigrantes japoneses que compraram alto volume de terras na década de 1990 e se
utilizam de maquinário, insumos e defensivos agrícolas (características preponderantes
da modernização agrícola), o que é confrontado pelos dados da Tabela 10, obtidos em
pesquisa no cartório de registro de imóveis de Baraúna.
Tabela 10: Número de negócios e de área negociada pelos nipônicos em relação aos totais.
Percentuais da participação de nipônicos (Nipo) em número de negócios e totais de área
negociada. MTA Baraúna-RN, 1994/1998.
Ano
Número negócios Área negociada (ha)
Nipo
(I)
Total
(II)
(I) / (II)
Nipo
(III)
Total
(IV)
(III)/(IV)
1994 2 31 6,45 104,3 1.535,5 6,79
1995 1 20 5,00 60,9 791,0 7,70
1996 5 25 20,00 757,9 1.573,0 48,18
1997 1 21 4,76 48,0 1.116,8 4,30
1998 1 16 6,25 50,0 895,9 5,58
Total 10 113 8,85 1.021,1 5.912,2 17,27 Fonte: Cartório de Registro de Imóveis de Baraúna-RN.
No âmbito dessa questão da modernização agrícola, nos deparamos com o
entendimento de Albano (2011, p. 402) de que a recente migração de descendentes de
imigrantes japoneses, na década de 1990, vindos do sudeste do país com o fim de
compra de terras agrícolas, sendo atraídos pela possibilidade de rendimentos
consideráveis da comercialização de frutas tropicais, contribuiu para o aumento da
concentração fundiária em Baraúna-RN. Entretanto, para o período em apreço, com
base em pesquisa no Cartório de Registro de Imóveis de Baraúna-RN, foi verificada
uma irrelevante participação dos nipônicos no processo de negociações de compra e
venda e terras agrícolas, tal como exposto a seguir.
No período de 1994 a 1998 houve uma inexpressiva participação dos nipônicos
no número de transações em relação ao total, de 10 transações destes em contraposição
ao total de 113 transações, isto é, o correspondente a aproximadamente 9% do total de
transações.
No tocante à área transacionada pelos nipônicos em relação ao total, foram
transacionados em torno de 1.000 ha por estes em relação à área total transacionada, que
46
foi de aproximadamente 6.000 ha, o que corresponde a cerca de 17% do total da área,
com exceção do ano de 1996, que apresentou participação destes em 20% dos negócios,
traduzindo-se em quase metade das terras transacionadas no ano.
Por fim, fica visível que o MTA de Baraúna-RN vivenciou um dinamismo
proporcionado pela modernização agrícola, porém tal dinamismo não foi o bastante para
a promoção de concentração da terra agrícola, tal como esperado, tendo como base a
literatura consultada.
2.5 Política pública fundiária
O município de Baraúna-RN foi alvo de intervenção do Estado, tanto pelo
governo estadual quanto pelo governo federal, respectivamente nos períodos de 1962-
1992 e 1993-2006, que ocorreu através da implementação de uma política de reforma
agrária.
Vale ressaltar que tal intervenção do Estado se deu pela transferência de terras
com fins de assentamento, conforme demonstrado nas Tabelas 11 e 12 a seguir.
Tabela 11: Número de imóveis transferidos em doação pelo Estado do Rio Grande do Norte
(1962/1992) e pelo Governo Federal (1993/2006). Participação do número de imóveis, segundo
estratos de área, em relação ao total. Baraúna-RN, 1962/2006.
Estratos área (ha)
Governo do RN Governo Federal
Total 1962/1992 1993/2006
Número % Número % Número %
0 – 10 16 4,58 4 8,89 20 5,06
10 – 20 55 15,71 3 6,67 58 14,68
20 – 50 146 41,71 15 33,33 161 40,76
50 – 100 116 33,14 22 48,89 138 34,94
100 e + 17 4,86 1 2,22 18 4,56
Total 350 100,00 45 100,00 395 100,00 Fonte: Cartório de Registro de Imóveis de Baraúna-RN.
Em primeiro lugar, a partir da Tabela 11, há o indicativo da maior intensidade da
Política Fundiária no primeiro período, que vai de 1962 a 1992, pois, foram assentadas
350 famílias no primeiro período contra um total de 45 famílias no segundo período, ou
seja, 89% e 11% do total, respectivamente.
No primeiro período, 62% do total de assentados tiveram acesso a pequenos
estratos de terra, que vai até 50 hectares, sendo que 33% dos assentados tiveram acesso
47
a estratos de terra entre 50 e 100 hectares. Os 5% últimos foram beneficiados com áreas
superiores a 100 hectares.
No segundo período, aproximadamente 49% dos assentamentos foram de
estratos de terras até 50 hectares, enquanto os assentamentos de médio estrato (50 a 100
ha) foram também em torno de 49% e os grandes estratos (mais de 100 ha)
compreenderam cerca de 2% dos assentados.
Pelo aspecto da área distribuída, foi observado que tal Política Pública de cunho
Fundiário foi mais atuante no primeiro período, 1962 a 1992, de acordo com a Tabela
12 abaixo.
Tabela 12: Área transferida em doação pelo Governo do RN (1962/1992) e pelo Governo
Federal (1993/2006). Participação da área doada segundo estratos de área (ha) em relação ao
total. Baraúna (RN), 1962/2006.
Estratos área
(ha)
Governo do RN Governo Federal
Total 1962/1992 1993/2006
Área (ha) % Área (ha) % Área (ha) %
0 – 10 115,2 0,69 22,0 0,97 137,2 0,72
10 – 20 959,9 5,75 39,6 1,75 999,5 5,28
20 – 50 4.798,2 28,75 484,7 21,48 5282,9 27,88
50 – 100 8.161,0 48,90 1.512,3 67,02 9673,3 51,06
100 e + 2.654,9 15,91 198,0 8,77 2852,9 15,06
Total 16.689,2 100,00 2.256,6 100,00 18.945,8 100,00 Fonte: Cartório de Registro de Imóveis de Baraúna-RN.
Do total de área transferida, aproximadamente 89% e 11% do total da área
distribuída, foram distribuídos no primeiro e segundo períodos, respectivamente.
No primeiro período (1962/1992), cerca de 35% da área distribuída foi de
pequenos imóveis (até 50 ha), enquanto aproximadamente 49% e 16% foram de médios
(50 a 100 ha) e grandes imóveis (mais de 100 ha), respectivamente.
Diferentemente do primeiro período, no segundo, aproximadamente 24% da
área distribuída destinou-se a assentamentos de pequeno estrato de terras (até 50
hectares) contrastando aos outros aproximados 67% e 9% destinados a assentamentos
de médio e grande portes, respectivamente de 50 a 100 ha e mais de 10 ha.
Dessa forma, de 1962 a 2006 foram doados aproximadamente 19 mil hectares,
montante de terras bastante expressivo em comparação à extensão do município (82.570
hectares), ou seja, houve a distribuição de quase um quarto da área do município de
48
Baraúna-RN, demonstrando que o município se constituiu num caso concreto de êxito
da intervenção do Estatal, através da atuação da política governamental fundiária.
Portanto, fica evidente que a atuação do Estado pela política fundiária
contribuiu para a estabilidade do nível de concentração da terra em Baraúna-RN. E,
aliado a isso, o estímulo à modernização fez com que os patamares de ociosidade da
terra ficassem relativamente estáveis.
49
CAPÍTULO 3 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS E CONCLUSÃO
O presente estudo teve início com uma abordagem histórica da estrutura
fundiária brasileira - partindo da implantação do regime sesmarial, da formação de uma
aristocracia da terra, da criação da Lei de Terras de 1850, da vigência do Estatuto da
Terra de 1964 e, mais recentemente, da Constituição Federal de 1988.
A literatura consultada registrou ainda que, a modernização agrícola (Revolução
Verde) é uma forma de aprofundamento da concentração da terra nas mãos de poucos e
da precarização do trabalho rural.
Essa revisão deu base para mensurar a realidade e, nesse sentido, permitiu
observar que, por um lado, houve a prevalência de concentração da posse da terra,
evidenciado pelos índices de Gini, o que é válido tanto para o caso nacional, quanto
para o Rio Grande do Norte. Por outro lado, a existência de especulação com terras
agrícolas, sugerida, sobretudo, pela presença de ociosidade da terra no Mercado de
Terras Agrícolas - MTA.
No presente estudo verificamos que, Baraúna-RN vivenciou o advento da
fruticultura irrigada, enquanto manifestação concreta da modernização agrícola. Em
geral, a literatura registra concentração da terra diante desse processo modernizador.
Aqui, especificamente no caso de Baraúna-RN, constatamos uma tendência à
desconcentração.
De forma semelhante, o volume de terras agrícolas ociosas, ociosidade tomada
como parâmetro para movimento de especulação no MTA, permaneceu praticamente
estável no período de 1985 a 2006. Em suma, não houve alteração significativa no nível
de ociosidade da terra em Baraúna-RN.
Além disso, o presente estudo problematizou a tese de que teria ocorrido no
período de 1994 a 1999 um processo de concentração fundiária pela entrada de
produtores nipônicos no setor de fruticultura irrigada e pela intensidade da
modernização agrícola empregada em Baraúna-RN. Nesse período, fica claro que não
houve alteração significativa no nível de concentração de terras no referido município,
restando comprovado por cálculos de índices de concentração.
Ressaltamos ainda que, a produção da fruticultura irrigada, até o presente ano
(2016), tem se portado de forma exitosa, haja vista o cenário apresentado de
estabilidade de desconcentração fundiária dado pelo índice de Gini do município, e pela
50
evidência de ausência ou nível desprezível do uso especulativo da terra, dado pelo nível
de produção e produtividade da fruticultura irrigada de Baraúna-RN.
Um fator ampliador da competitividade desses produtores é sua atuação através
da estratégia cooperativista com a formação de associações de produtores, como é o
caso da COODAP - Cooperativa de Desenvolvimento Agroindustrial Potiguar.
Cabe-nos levar em consideração, ainda, a existência de críticas suscitadas pelo
modelo produtivo agrícola do semiárido nordestino, mais especificamente Baraúna-RN.
Primeiramente, tem-se a inserção do Brasil na economia internacional como exportador
de produtos primários de forma dependente da demanda e exigências internacionais -
posicionando-se à montante dentro da cadeia global de valor, uma vez que a produção
agrícola da fruticultura irrigada sai do Brasil, com baixo valor agregado, para o mercado
europeu e norte-americano, a exemplo do melão.
Do mesmo modo, existem os problemas sociais e econômicos de Baraúna-RN
no tocante ao déficit de desenvolvimento do município advindos da atividade da
fruticultura irrigada. Pois, há o uso desordenado dos recursos hídricos pelos produtores
agrícolas, dada a abundância de suas águas subterrâneas, baixo preço da terra e mão de
obra barata, além de que esses produtores não terem vida social. Ou seja, o município é
um locus simplesmente de produção e não de vivência, circulação de renda e,
consequentemente, o acarretamento de baixos índices de desenvolvimento da região,
configurando Baraúna-RN como um enclave de modernização.
Também foi observado o perfil fundiário de Baraúna-RN, pelo aspecto da
intervenção do Estado através da Política Fundiária, que teve como resultado a
diminuição da desigualdade distributiva de terras. Em outros termos, a política
governamental foi um elemento importante para o não aprofundamento da concentração
fundiária no período que vai de 1962 a 2006, com maior dinâmica no período inicial
(1962 a 1992), sendo relegada a segundo plano nos anos restantes.
Dessa forma, a política distributiva do Estado mostrou-se, em grande medida,
como um exemplo de atenuação da realidade concentradora da terra, apesar de nosso
estudo limitar-se a um município do território semiárido nordestino.
Ressaltamos, ainda, que o intervencionismo Estatal teve maior expressão por
parte do Governo Estadual do RN em relação à atuação do Governo Federal em resposta
à pressão sobre a terra evidenciada pelos movimentos sociais ocorridos desta aquela
época, a saber, a década de 1960.
51
Assim sendo, tudo indica que, a política fundiária de Estado tenha amortecido a
tendência concentracionista da terra como causa da modernização agrícola. Fica,
portanto, como sugestão, a elaboração de pesquisas aprofundadas a respeito dos
impactos de políticas públicas fundiárias sobre o processo de concentração fundiária em
Baraúna-RN.
De todo o exposto, os dados analisados para o período de 1982 a 2012, permitem
deduzir que, o município potiguar de Baraúna-RN não seguiu a tendência nacional de
concentração fundiária como consequência da modernização do campo, ou em outra
perspectiva, em Baraúna-RN também não houve desconcentração fundiária, embora a
participação de pequenos estabelecimentos agrícolas (menores estratos de terra) terem
ampliado sua participação na área total de estabelecimentos rurais. Com isso, descarta-
se a existência de nexo causal entre modernização agrícola e concentração fundiária, ao
menos para o caso desse município. De igual modo, também não houve significativa
oscilação no nível de especulação fundiária no MTA de Baraúna-RN, dado o estável
grau de ociosidade da terra no município.
Portanto, a economia agrícola de Baraúna-RN figura como um profícuo
exemplo de espaço econômico produtivo, pelo destaque que apresenta na produção
agrícola do Rio Grande do Norte sendo, juntamente com o município de Mossoró, um
dos expoentes exportadores da fruticultura irrigada do estado.
Em suma, o presente estudo conclui que, de um lado, a modernização agrícola
na fruticultura irrigada de Baraúna-RN, estimulou o uso da terra; e, de outro lado, a
política fundiária governamental contribuiu para reduzir a estabilização da concentração
da propriedade da terra. E, ainda, a entrada dos produtores de origem nipônica no MTA
de Baraúna-RN, no setor da fruticultura irrigada, não necessariamente contribuiu para
modificação do status quo da estrutura fundiária do referido MTA.
Nesse diapasão levamos também em consideração que, as realizações dos
Governos Federal e Estadual de viabilização de políticas de Reforma Agrária,
certamente foram relevantes para o atual nível de concentração de terras em Baraúna-
RN, tal como foi demonstrado pelo cálculo do Índice de Gini, e, muito provavelmente,
por terem sido doadas principalmente terras públicas ou devolutas, aos agricultores da
região.
Por fim, para que haja respostas amiúdes sobre a não observação de
aprofundamento de concentração e ociosidade fundiárias, tal qual afirmado pela
abundante literatura sobre a Questão Agrária, sugere-se a realização de uma pesquisa
52
multidisciplinar do tema; não só da Ciência Econômica, mas da Geografia, Geologia,
Sociologia, Ciência Política, Antropologia, dentre outras. Com isso, espera-se poder
entender qual (is) a (s) variável (is) que atuou (aram) no sentido de contrariar a tese
hegemônica sobre os impactos que, via de regra, são derivados da implantação da
modernização agrícola.
53
APÊNDICES
54
Apêndice 1: Indicadores de modernização agrícola. Baraúna, 1985 a 2006.
Ano
Indicadores de modernização agrícola
Tratores
Máquinas
Plantio Colheita
1985 71 43 10
1995-96 101 34 1
2006 171 35 7
Total 343 112 18
Apêndice 2: Indicadores de modernização agrícola. Baraúna, 1985 a 2006.
Ano
Indicadores de modernização agrícola
Arados Veículos
Animal Mecânico Animal Mecânico
1985 30 47 564 113
1995-96 23 59 319 98
2006 - 63 491 652
Total 53 169 1.374 863 Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (SIDRA).
Apêndice 3: Uso agrícola da terra (ha). Baraúna, 1985-2006.
Tipo de uso da terra
Área (ha)
1985 1995-96 2006
Lavouras permanentes 2.941 4.402 936
Lavouras temporárias 19.092 7.724 4.946
Pastagens plantadas 113 259 13
Matas e florestas plantadas 82 - 2.351
Total 22.228 12.385 8.246 Fonte: Censos Agropecuários IBGE/SIDRA.
Apêndice 4: Terras disponíveis não utilizadas (ha). Baraúna, 1985-2006.
Tipos de Terras
Área (ha)
1985 1995-96 2006
Pastagens naturais 9.365 6.561 6.848
Matas e florestas naturais 27.126 21.477 10.861
Lavouras temporárias em descanso 5.449 6.093 -
Produtivas não utilizadas 4.495 3.113 -
Área não ocupada com lavouras - - 882
Total 46.435 37.244 18.591 Fonte: Censos Agropecuários IBGE/SIDRA.
55
Apêndice 5: Áreas adquiridas pelos nipônicos. MTA Baraúna (RN), 1994/1998.
Ano Comprador Área (ha)
1994 Ruth N. IRIKITA 41,0
1994 Miyuki KITAYAMA 63,3
1995 Chuji KOZIMA 60,9
1996 Junichi IRIKITA 34,2
1996 Junichi IRIKITA 26,0
1996 Masatoshi OTANI 398,2
1996 Junichi IRIKITA 93,6
1996 William Akira SUZUKI 205,89
1997 C. Y. MATSUMOTO 48,0
1998 OTANI Agro Pec. Ltda. 50,0
Total - 1.021,1 Fonte: Cartório de Registro de Imóveis. Baraúna (RN).
Apêndice 6: Número de negócios e área negociada (ha) pelos nipônicos (nipo). Mercado de
Terras Agrícolas (MTA). Baraúna (RN), 1994/1998.
Ano Número negócios Área negociada (ha)
1994 2 104,3
1995 1 60,9
1996 5 757,9
1997 1 48,0
1998 1 50,0
Total 10 1.021,1 Fonte: Cartório de Registro de Imóveis. Baraúna (RN).
56
Apêndice 7: Número total de negócios e área total negociada (ha). Mercado de Terras Agrícolas
(MTA) Baraúna (RN), 1982/2012.
Ano Número negócios Área negociada (ha)
1982 5 181
1983 103 6.579,31
1984 48 4.960
1985 91 4.783,68
1986 40 5.259,04
1987 37 5.546,41
1988 86 41.687,94
1989 66 5.673,27
1990 45 3.883,90
1991 25 2.619,70
1992 46 3.247,29
1993 73 4.263,25
1994 31 1.535,5
1995 20 791,0
1996 25 1.573,0
1997 21 1.116,8
1998 16 895,9
1999 51 2.512,73
2000 23 2.071,65
2001 57 2.893,41
2002 58 380,71
2003 55 4.785,70
2004 56 2.651,67
2005 21 964,82
2006 45 3.666,90
2007 27 2.342,19
2008 43 2.68,52
2009 40 4.168,94
2010 56 4.816,46
2011 12 552,54
2012 1 20
Total 1.323 126.424,71 Fonte: Cartório de Registro de Imóveis. Baraúna (RN).
Apêndice 8: Faixas de graus de concentração para o Índice de Gini.
De 0,000 a 0,100 Concentração nula
De 0,101 a 0,250 Concentração nula a fraca
De 0,251 a 0,500 Concentração fraca a média
De 0,501 a 0,700 Concentração média a forte
De 0,701 a 0,900 Concentração forte a muito forte
De 0,901 a 1,000 Concentração muito forte a absoluta Fonte: Câmara (1949).
57
Apêndice 9: Cálculo do Índice de Gini. Baraúna, 1985. Foram encontradas uma ou mais variáveis não-numéricas. Estas variáveis receberam códigos numéricos conforme mostrado a seguir. Tabela de codificação para a variável 1 (EstratosAreaha):
Observações Estratos área (ha) Total de imóveis Área total
1 '0 – 10' 290 1.227
2 '10 – 20' 175 2.387
3 '20 – 50' 299 9.572
4 '50 – 100' 176 12.188
5 '100 e +' 122 45.457
EstratosAreaha Número de observações = 5 Coeficiente amostral de Gini = 0,266667 Estimativa do valor da população = 0,333333
Índice de Gini: (1 – 0,333333) = 0,666667
Fonte: Gretl 2016C a partir de dados do Censo Agropecuário do IBGE, 1985.
0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1
0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1
Estratos Área (ha)
Curva de Lorenz
58
Apêndice 10: Cálculo do Índice de Gini. Baraúna, 1995-96.
Fonte: Gretl 2016C a partir de dados do Censo Agropecuário do IBGE, 1995-96.
Foram encontradas uma ou mais variáveis não-numéricas. Estas variáveis receberam códigos numéricos conforme mostrado a seguir. Tabela de codificação para a variável 1 (EstratosAreaha):
Observações Estratos área (ha) Total de imóveis Área total
1 '0 – 10' 295 1.249
2 '10 – 20' 166 2.272
3 '20 – 50' 271 8.135
4 '50 – 100' 126 8.457
5 '100 e +' 101 30.459
EstratosAreaha Número de observações = 5 Coeficiente amostral de Gini = 0,266667 Estimativa do valor da população = 0,333333
Índice de Gini: (1 – 0,333333) = 0,666667
0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1
0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1
Estratos Área (ha)
Curva de Lorenz
59
Apêndice 11: Cálculo do Índice de Gini. Baraúna, 2006.
Fonte: Gretl 2016C a partir de dados do Censo Agropecuário do IBGE, 2006.
Foram encontradas uma ou mais variáveis não-numéricas. Estas variáveis receberam códigos numéricos conforme mostrado a seguir. Tabela de codificação para a variável 1 (EstratosAreaha):
Observações Estratos área (ha) Total de imóveis Área total
1 '0 – 10' 329 1.500
2 '10 – 20' 169 2.271
3 '20 – 50' 172 4.876
4 '50 – 100' 55 3.642
5 '100 e +' 49 13.440
EstratosAreaha Número de observações = 5 Coeficiente amostral de Gini = 0,266667 Estimativa do valor da população = 0,333333
Índice de Gini: (1 – 0,333333) = 0,666667
0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1
0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1
Estratos Área (ha)
Curva de Lorenz
60
ANEXOS
61
Anexo 1: Mapa de Baraúna. Localização no Rio Grande do Norte e Brasil.
Fonte: IBGE/SIDRA
Anexo 2: Mapa de Baraúna.Localização Brasil, RN e na microrregião de Mossoró.
Fonte: IBGE/SIDRA.
62
Foto 1: Meloeiros de Baraúna.
Fonte: Revista Globo Rural. Edição 215 – set. 2003.
Foto 2: Produtor rural - Massatoshi - com melão gália.
Fonte: Revista Globo Rural. Edição 215 – set. 2003.
63
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