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1 Suspens ions of Pe rception  Attention, Spectacle and Modern Culture CRARY, Jonathan (1999). Suspensions of Perception: attention, spetacle, and Modern Culture. Cambridge, Massachusetts, The MIT Press. ART 2237 - Linguagem da Mídia Visual  Prof. Luiz Antonio Coelho Departamento de Artes e Design, PUC-Rio Programa de Pós-Graduação em Design Novembro de 2003 acques Chueke & Marcelo Pereira

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Suspensions of Perception

 Attention, Spectacle and Modern Culture

CRARY, Jonathan (1999). Suspensions of Perception: attention, spetacle, and Modern Culture.

Cambridge, Massachusetts, The MIT Press.

ART 2237 - Linguagem da Mídia Visual  Prof. Luiz Antonio Coelho

Departamento de Artes e Design, PUC-Rio

Programa de Pós-Graduação em Design

Novembro de 2003

acques Chueke & Marcelo Pereira

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Introdução : Sobre o Autor

onat an rary

Jonathan Crary recebeu seu Ph. D de Columbia em 1987 depois de conseugir seu B. A. na mesma uni-versidade e seu B. F. A. no San Francisco Art Institute, onde estudou cinema e fotograa.

Sua primeira posição como professor foi no Departamento de Artes Visuais da Universidade da Cali-

fornia e, desde 1989, ele é professor em horário integral em Columbia.

Crary começou escrevendo sobre arte contemporânea e publicou diversos artigos em várias publica-ções, como Art in America, Artforum, October, Domus, Arts, Village Voice, entre outras.

Em 1986 ele foi um dos co-fundadores (e continua como co-editor) da Zone Books, uma editora queornou-se internacionalmente conhecida por suas publicações em áreas como história intelectual,eoria da arte, política, antropologia e losoa. Em 1992, o professor Crary tornou-se co-editor do vo-

lume deste ano da Incorporations, que reunia uma grande quantidade de reexões sobre o proble-ma do corpo na cultura tecnológica moderna.

Crary é autor de Techniques of the Observer: On Vision and Modernity in the Nineteenth Century

(1990) que foi traduzido para sete idiomas estrangeiros. Com este livro, ele iniciou seus estudos sobreas origens da cultura visual moderna, os quais ele continua a desenvolver em sua pesquisa atual.

Seu livro Suspensions of Perception: Attention, Spectacle an Modern Culture foi publicado em 1999 efoi o ganhador do Lionel Trilling Book Award de 2001.

O professor Crary também recebeu vários prêmios, como o Gugggenheim, Mellon, Getty e o NationalEndowment for the Arts Fellowships, além de ser membro do Institute for Advanced Study. No outo-no de 2002 ele foi Professor Visitante na Princeton University School of Architecture.

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Capítulo 1 : Modernidade e o Problema da Atenção

mport nc a a tenção

Um dos desenvolvimentos mais importantes da história da percepção no século XIX foi o apareci-mento relativamente súbito dos modelos de visão subjetiva em uma grande variedade de disciplinasdurante o período entre 1810 e 1830. Passou-se a acreditar que o funcionamento da visão dependiadiretamente da formação psicológica do observador. A visão passou a ser encarada como falha, não

possuía objetividade nem certeza.

Por volta de 1860, o trabalho de Hermann von Helmholtz e Gustav Fechner

entre outros, deniu os contornos de uma certeza epistemológica geral, na qual a experiênciaperceptiva perdera suas garantias primais que uma vez mantiveram uma relação privilegiada com afundação do conhecimento.

noção de que nossa experiência perceptiva e sensorial depende menos de estímulo externo do quedo funcionamento do nosso aparato sensorial foi uma das condições para o aparecimento históricode noções de visão autônoma, que pode ser denida como a liberação da experiência perceptiva deuma relação necessária com um mundo exterior.

O acúmulo de conhecimento sobre o funcionamento do observador personicado mostrou formaspelas quais a visão estava aberta a procedimentos de normatização, quanticação e de disciplina.visão podia, então, ser controlada por técnicas externas de manipulação e estimulação. Essa foi a

conquista decisiva da ciência da psicofísica em meados do século XIX. A visão, concebida desta forma,ornou-se compatível com vários outros processos de modernização.

desintegração de uma distinção entre interior e exterior torna-se uma condição para o aparecimen-o da cultura da modernização e para a expansão dramática das possibilidades da experiência estéti-

ca. Na segunda metade do século XIX, verica-se a explosão da invenção visual e da experimentaçãona arte européia.

Nos últimos 100 anos, as modalidades de percepção estiveram em um estado de transformação per-pétua (ou de crise perpétua, como alguns clamam). Podemos armar que a única característica per-

manente da visão é que ela não possui nenhuma característica permanente. Ela está inserida em umpadrão de adaptação a novas relações tecnológicas, congurações sociais e imperativas econômicas.

No nal do século XIX, o problema da atenção torna-se um assunto fundamental no campo da psico-logia cientíca. Esse problema estava diretamente relacionado ao campo social, urbano, psíquico e in-dustrial, cada vez mais saturado com inputs sensoriais. A falta de atenção, especialmente no contextodas novas formas de produção industrial em larga escala, começou a ser tratada como um problemasério e perigoso, apesar de que geralmente era a própria organização moderna do trabalho a causada falta de atenção. As congurações do capitalismo estão em constante alteração, levando a atençãoe a distração a novos limites com uma seqüência interminável de novos produtos, fontes de estímuloe correntes de informação que são então respondidas com novos métodos de gerência e regulagemda percepção. Gianni Vattimo notou que a intensicação do fenômeno comunicativo e o

aumento da circulação da informação não são meros aspectos da modernização, mas estão no centrodesse processo.

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Desde Kant, parte do dilema epistemológico da modernidade tem sido denir a capa-cidade humana para a síntese na fragmentação de um campo cognitivo. Esse dilema torna-se aindamais agudo na segunda metade do século XIX, junto com o desenvolvimento de várias técnicas paraimpor tipos especícos de síntese perceptiva, desde a difusão em massa do estereoscópio na décadade 1850 até as primeiras formas do cinema na década de 1890. O século XIX testemunhou a demoliçãodo ponto de vista transcendental de Kant e de suas categorias sintéticas, detalhadas em sua primeiracrítica.

Segundo Kant, toda possível percepção só poderia ocorrer em termos de um princípio sintético ori-ginal de unicação, uma causa própria, que caria acima de qualquer experiência sensorial empírica,como a visão. Quando as garantias losócas de qualquer unidade cognitiva entraram em colapso,o problema da “manutenção da realidade” gradualmente tornou-se uma função da capacidade me-ramente psicológica para síntese ou associação. A substituição da vontade feita por Schopenhauer

pela unidade transcendental da percepção de Kant é um evento com muitos efeitoscolaterais, pois implicou que a percepção do mundo com um todo não era mais o produto da Lei,mas dependia de uma relação potencialmente variável de forças, incluindo forças externas, fora docontrole do sujeito. Era imperativo a todos os pensadores da época compreender como se originavao pensamento consciente.

O mal-funcionamento da capacidade de síntese, geralmente descrito como dissociação, passou a serrelacionado com psicose e outras patologias mentais. Mas o que era rotulado como uma desintegra-ção patológica da percepção era de fato evidência de uma mudança fundamental do relacionamentodo sujeito com um campo visual.

Para a psicologia institucional das décadas de 1880 e 1890, parte da normalidade psíquica era a ha-

bilidade de combinar percepções em um todo funcional, afastando assim a ameaça da dissociação.O psicologista alemão Oswald Külpe insistia que sem uma capacidade para atenção, aconsciência estaria a mercê de impressões externas e o pensamento se tornaria impossível por causado ruído de nossos arredores. A própria visão, com todas as suas inconsistências e idiossincrasias nãopoderia funcionar de forma conável sem a intervenção “jurídica” da atenção para juntar todos osdados sensoriais.

Max Nordau era um dos mais lidos escritores a ligar a falta de atenção ao comportamen-o sociopático. Para Nordau, atenção era uma defesa repressiva e disciplinar contra todas as formas

disruptivas de livre associação. A atenção tornou-se, então, uma forma imprecisa de designar a relativacapacidade de um sujeito para isolar certos conteúdos de um campo sensorial de forma seletiva paramanter um mundo ordenado e produtivo.

É claro que noções de atenção já existiam em vários lugares antes do século XIX. Mas é importanteindicar como, na segunda metade do século XIX, a atenção tornou-se fundamentalmente um novoobjeto dentro da modernização da subjetividade. Em muitos casos, antes do século XIX, ela tinha umaimportância local em assuntos de educação, etiqueta, práticas pedagógicas ou pesquisa cientíca.Mesmo quando a atenção era um objeto de reexão losóca, era de forma supercial, no máximo umproblema secundário nas explicações sobre a mente e a consciência.

Para Etienne Bonnot de Condiliac, atenção era um caso de força de uma sensação, oefeito de um evento externo ao sujeito. Nesse sentido, sua opinião não é diferente daquela da losoabritânica do século XVIII com seus modelos da mente como receptor passivo de sensações, modelosque não precisavam de uma idéia de atenção. A atenção, como era concebida no século XIX, é radi-calmente estranha para uma noção do século XVIII de atividade mental como um molde que irá pre-

servar a constância dos objetos. Há uma descontinuidade histórica entre o problema da atenção nasegunda metade do século XIX e seu lugar no pensamento europeu dos séculos anteriores.

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Especialmente no período de 1840 até meados da década de 1860, houve uma variedade de tenta-ivas para propor novos princípios para deduzir uma unidade efetiva da mente ou do pensamento.Geralmente agrupados sob a categoria de associacionismo1 tais trabalhos simplesmente não derama devida importância à atenção. Somente a partir de 1870 é que um papel central na maneira comoum mundo prático de objetos se forma para um observador passa a ser consistentemente atribuídaà atenção.

unc onamento a tenção

Desde que o estudo da atenção no nal do século XIX tentou racionalizar oque acabou provando-se irracionalizável, as questões levantadas mostraram-semais importantes do que suas conclusões empíricas.

Para a maioria dos autores, a atenção implicava em algum processo de organi-zação mental na qual um número limitado de objetos ou estímulos estão isola-dos de um pano de fundo maior, com todas as atrações possíveis.

Independentemente da forma como era descrita, a atenção implicava em umafragmentação inevitável de um campo visual onde a coerência homogêneados modelos clássicos de visão era impossível. A atenção como um um proces-so de seleção signicava necessariamente que a percepção era uma atividade

de exclusão, descartando partes de um campo perceptivo.

As implicações culturais e losócas desse pensamento levantaram problemase produziram uma variedade de posicionamentos.

Havia aqueles que consideravam a atenção como uma expressão da vontadeconsciente de um sujeito autônomo para quem a própria atenção, enquanto

escolha, era parte da liberdade auto-constituída deste sujeito. Outros, como Freud, acredi-avam que a atenção era uma função biológica determinada por instintos, resquício da nossa herança

evolucionária arcaica, que moldava a nossa relação com o ambiente. Finalmente, havia aqueles queacreditavam que um sujeito atento poderia ser produzido e controlado através de estímulos exter-nos.

O modelo do observador humano atento que dominava as ciências empíricas da década de 1880 emdiante era inseparável de uma nova noção de sensação para um sujeito humano. Dentro dos ambien-es de laboratório cada vez mais sosticados, a sensação se tornou um efeito, ou um conjunto de efei-os, que eram tecnologicamente produzidos e que eram usados para descrever um sujeito compatível

com essas condições tecnológicas. Seu signicado de faculdade “interior” desapareceu e a sensaçãose transformou em uma quantidade (ou conjunto de efeitos) que podia ser medida ou observadaexternamente.

atenção passa a ser estudada em termos da resposta a estímulos gerados por máquinas. Esses es-ímulos, elétricos por natureza e abstratos em conteúdo, permitiam uma determinação quantitativa

 _______________________________________ 

. associacionismo

. m. Doutrin

iações, combinações, conexões de idéias com origem nas sensações proporcionadas pela experiência e pelos sentidos.

Como a atenção monitora algumas sensações

não outras?

O que determina como a atenção é capaz de

perar como um oco a consc nc a

Que forças ou condições fazem o indivíduo

tentar para apenas alguns aspectos do mundo

xterior e não para outros?

Quantos eventos ou objetos podem ser simul-

aneamente o serva os por un n v uo e por 

uanto tempo?

 Até que ponto a atenção é uma ação au-

omática ou voluntária?

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das capacidades sensoriais de um sujeito perceptivo. Neste projeto, o antigo modelo de sensaçãocomo algo que pertence ao sujeito tornou-se irrelevante, pois ela agora tinha um signicado empíricoapenas em termos de magnitudes que correspondiam a determinadas quantidades de energia e aempos de reação mensuráveis. Por volta da década de 1880, a idéia clássica de sensação deixa de ser

um componente signicativo na imagem cognitiva da natureza.

Assim como a ascensão da psicometria nas ciências humanasreduziu (ou pelo menos alterou) a importância da sensação sub- jetiva, outro desao para a noção clássica de sensação pode servista nos trabalhos de diversos pensadores.

James e Bergson, em particular, desaaram a noção de uma sen-sação pura e simples, da qual dependia o associacionismo. Am-

bos armavam que qualquer sensação é um conjunto formadopela memória, desejo, vontade, antecipação e experiência ime-diata. Seu trabalho, no entanto, oferecia pouco suporte à idéia deuma percepção estética autônoma. Charles S. Pierce

também argumentava contra a idéia das sensações “imedia-tas”, armando que elas são complexos irredutíveis de associaçãoe interpretação.

Em 1879, Wilhelm Wundt estabeleceu o primeiro laboratório de psicologia do mundo,na Universidade de Leipzig. Este espaço laboratorial, com todos os seus aparatos calibrados e comseus modernos procedimentos de pesquisa tornou-se o modelo para toda a experimentação psicoló-gica voltada para o estudo de um observador atento a uma grande variedade de estímulos gerados

articialmente.

Esse foi um dos primeiros espaços práticos da modernidade onde a humanidade podia problematizara si mesma.

Atenção e o Capitalismo

Parte da lógica cultural do capitalismo exige que aceitemos como natural a mudança rápida da aten-ção de uma coisa para outra. O capital produziu esse tipo de adaptabilidade humana e tornou-seum regime de atenção e distração recíprocas. A modernização não é um conjunto de mudanças queocorrem apenas uma vez, mas um processo contínuo e modular que jamais é interrompido para quea subjetividade individual possa acompanhá-la.

Enquanto o funcionamento global do capitalismo transformou-se nas fases pós-industrial e nas fasede informação e comunicação, a atenção enquanto problema social e subjetivo manteve algumascaracterísticas persistentes. Para melhor compreender o fato, considere o trabalho de Thomas Edison,

onde alguns elementos de um sistema moderno de transformação perceptiva foramformulados. Sua importância não está em nenhuma invenção especíca, mas em seu papel no apare-cimento de um novo sistema de quanticação e distribuição.

 _______________________________________ . psicometria

. f. O conjunto ou qualquer dos métodos quantitativos em psicologia; psicométrica

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Edison enxergava o mercado em termos de como imagens, sons,energia ou informação poderiam ser moldados em bens mensurá-veis e distribuíveis e como uma sociedade de sujeitos individuaispoderia ser organizada em unidades separadas e especializadas deconsumo. A mesma lógica que apoiou o fonógrafo - a estruturaçãoda experiência perceptiva em termos de uma sujeito mais solitáriodo que coletivo - repete-se nos dias de hoje, na centralidade da telado computador como veículo primário para a distribuição de bensde consumo eletrônicos.

A capacidade de Edison de compreender a relação econômica entreo hardware (as máquinas que faziam e reproduziam os lmes) e osoftware (os próprios lmes) coincidiu com os padrões emergen-

tes de integração vertical das esferas de produção dentro de umaúnica corporação. Seu primeiro produto tecnológico, um híbridode telégrafo e marcador de estoque do início da década de 1870,é paradigmático pelo que ele anuncia em arranjos tecnológicossubseqüentes, incluindo aqueles do nal do século XX: a indistinção

entre informação e imagens visuais e a transformação do uxo abstrato e quanticável em um objetoatento de consumo.

O trabalho de Edison era inseparável da produção contínua de novas necessidades e da conseqüentereestruturação da rede de relações na qual esses produtos seriam consumidos. Hoje, Steve Jobs, BillGates e Andy Groove são exemplos atuais deste mesmo projeto histórico de racionalização e moder-nização perpétuas.

onc usão

ssim como no nal do século XIX, no nal do século XX, o controle da atenção depende da capaci-dade de um observador em ajustar-se às diferentes formas de consumo do mundo sensorial. Atravésdos diferentes modos de produção, a atenção continua a ser uma imobilização disciplinar e uma aco-modação do sujeito em relação à mudança e à novidade.

Pode-se discutir que durante a hegemonia do behaviorismo, a atenção, junto com a idéia de “processomental”, era marginalizada como um objeto explícito de pesquisa. Entretanto, todo o regime de pes-quisa de estímulo e resposta foi baseado nas capacidades de atenção de um sujeito humano. Muitose discutiu que problemas relacionados com o uso eciente de novas tecnologias durante a SegundaGuerra foram em parte responsáveis por uma nova onda de pesquisa em atenção. Nas últimas déca-das, passou-se a acreditar que o caráter unitário da mente consciente é inseparável da atenção.

Muitos estudos contemporâneos são baseados na assumpção de que a atenção não é simplesmenteum fator psicológico, mas sua operação pode ser demonstrada em um nível neuronal, enquanto ou-ros acreditam que ela sempre será um fenômeno mais elusivo.

Independente dos méritos das várias teorias, a atenção provou ser um problema persistente dentro

do contexto disciplinar generalizado das ciências sociais e comportamentais.

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Capítulo 4 : Reinventando a Síntese

c e e c pun t

Fins do século XIX e Início do século XX: Modelos na qual a experiência visual éum produto combinado de atividades especícas e distintas, seja na retina, sejano córtex visual.

ilhelm Wundt em 1880 declarou: “A consciência é considerada como umcampo da visão: Objetos entram nesta e primeiramente são apenas percebidosindenidamente, como as imagens que entram no campo de visão pelo cantoda retina. É requerido tempo para que o objeto seja visto claramente...quandoa atenção do discernimento é conferido sobre este e este é apreendido (aper-cebido).”

undt criou o esquema baseado na distinção entre Blickfeld e Blickpunkt : Entreum campo visual geral de um lado, e um ponto de foco localizado no outroextremo.

Este modelo tornou-se extremamente inuente sobre as duas décadas seguintes, em termos episte-

mológicos, perceptuais e na psicologia subjetiva.

Blickfeld  para Wundt, era o campo da consiência geral, enquanto oBlickpunkt era o foco da consciência onde a apreensão ocorria, efe-tivamente como sinônima de atenção.

Wundt trabalhou com um modelo topológico extendido da consci-ência e da atenção, onde havia um continuum entre as impressõesturvas apreendidas no Blickfeld  em direção à percepção clara doatento Blickpunkt .

Estudantes do laboratório de Wundt trabalharam por décadasquanticando a diferença no tempo que um sujeito percebia a

entrada de um estímulo dentro do campo vago de consciência eo tempo que levava para que o mesmo estímulo se tornasse umobjeto de atenção ativa. O tempo encontrado em sujeitos entãodenominados “normais” era de 1/10 de segundo.

Embora houvessem discordâncias do porquê alguns conteúdos e não outros recebiam atenção (inibi-ção, vontade, interesse, hábito, etc.), o uso do plano topológico foi amplo.

Esse novo conhecimento e esquema, foi organizado em técnicas para a condução de experiênciassobre percepção externa. Ao mesmo tempo eles indicavam o colapso dos modelos de uma percepçãounicada e homogênea.

O que está em questão aqui, é um modelo da experiência subjetiva, localizada em diferentes pontosentre 1880 e 1990, na qual a consciência não é uma esfera homogênea onde o mundo se apresenta

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por completo para um sujeito; mas sim um espaço fragmentado na qual con-teúdos movem-se entre zonas de níveis diversos de clareza e consciência, deforma incerta e sensível.

Um aspecto crucial deste modelo é a constante variação da essência do Bli-

ckpunkt , movendo-se de pontos focais para as margens da consciência e emreverso. Este modelo “topográco” do olho parece organizar o campo visual emtermos de plano e plano de fundo com uma distinção entre centro focal e fun-do periférico – mas essas distinções não tem permanência ou estabilidade.

Quebrando Paradigmas

Percepção era um processo na qual estes termos cambiavam perceptualmente de um para o outro,em constante reverso e recolocação. Mesmo que o central Blickpunkt coincidisse com o centro anatô-mico, as modalidades cognitivas em questão são parte de um amplo processo moderno de descen-ralização.

Ao nal do 1890, no trabalho de Charles Sherrington, entre outros, estudando o sistema

nervoso foi compreendido que a periferia do olho com sua habilidade intensicada em detectar mo-vimento seria um poderoso remanescente do nosso remoto passado biológico, com o qual tínhamosa capacidade de iniciar ação instantaneamente, seja contra predador ou presa – o que implica numadistribuição mixta e simultânea da atenção através deste campo visual dividido e portanto caracteri-

ando uma distinção gura/fundo irrelevante.

Assim como William James e outros concordaram, não era mais uma questão de su-cessão de estados imóveis ou visões de uma relação xa entre centro e periferia, mas sim a primazia

de estados transitivos na qual as nuances dinâmicas da percepção eramconstituintes da “realidade” psíquica.

Os problemas do centro ótico e da periferia, e do funcionamento dispersoda resposta sensorial, foram parte da progressiva modernização da per-cepção desde o século XIX. Dois dos mais proeminentes experimentos doséculo XIX na experiência ótica denem alguns dos termos dessas novascondições: A pintura panorâmica e o estereoscópio.

pintura panorâmica: Um modelo arquitetônico de uma imagem em360º propunha uma constante ativação da periferia ótica à partir de umcentro estável de atenção focada.

O estereoscópio: Apresentava um modelo complementar (ou rival) dedispêndio visual. Sua decisiva exclusão da periferia visual apresentou

ma ilusória imagem tridimensional que precariamente extendia-sealém do limite do centro fóveo, produzindo uma imagem que , na sua

ipertangibilidade, era apenas gura sem fundo, sem periferia.

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O que se perdeu em ambos os experimentos, é a possibilidade de não apenas uma relação gura/fun-do, mas um relação consistente e coerente de distância entre imagem e e observador.

Esses aspectos forma notados pelo crítico e escultor alemão Adolf Hildebrand, quedepreciou ambos os aparatos, em defesa de valores espaciais ecientes e a rejeição de uma psicologiabaseada na visão.

o xo

Em recentes escritos teóricos, a idéia do olho xo (e geralmente monocular), foi colocada como umelemento formativo dos sistemas clássicos de representação, funcionando para se obter a xação aqualquer custo e assim atingir-se um fenômeno de superioridade conceitual.

Entretanto, é sugerido que a problemática reside na noção que o olho xo, imóvel (ao menos o quãoestático as condições siológicas permitam) é o que aniquila a aparente “naturalidade” do mundo erevela a natureza provisória e uida da experiência visual – enquanto o olhar incerto e móvel é o quepreserva a pré-construída identidade do mundo. Esse último é o olho que habitualmente “acaricia”objetos, extraindo apenas relações prévias dentre estes. Uma vez que o olho torna-se estático, umapotencial situação volátil surge: após um relativo breve período de tempo, o olho imóvel desencadeiauma profusão de atividades – é a porta de entrada para ambos transe e a desintegração perceptual.

Louis Sass traçou vários exemplos sobre o xo e “revelador” olhar xo e sua “esquisiticeperceptual” no começo do moderno século XX: o olhar xo que é “rígido e xo – passivo então, se des-gasta, fragmenta-se ou exaure seu objeto, dissolvendo o semblante do dia-a-dia.

maioria das discussões sobre a longa xação tendem a discorrer sobre a a noção de uma visão nor-mativa; como exemplo, Nelson Goodman caracteriza o olho xo como “cego”. Wolfang

Köhler: A visão xa pode produzir tamanha instabilidade cromática, uma precipitaçãode planos imprevistos entre diversas perturbações dinâmicas, que qualquer discussão sobre “se o re-ângulo aparenta estar distorcido” é irrelevante. Aí surge uma contradição insolúvel entre o objetivo

de se estabilizar o mundo para que se possa olhar para este analiticamente e a experiência do aparatopsicológico incapaz de tal estabilidade.

inda sobre o olho xo, algumas de suas teorias tentaram explicar o trabalho de Cézanne – implican-do que as distorções criadas por este seriam o resultado de um artista tentando retratar elmentesuas subjetivas impressões óticas (até mesmo a proposta banal de que seus últimos trabalhos foramproduto de sua visão deteriorada pela catarata na sua velhice e seus trabalhos reetiriam os efeitosdessa deciência).

Tais abordagens trouxeram à Cézanne o problema do “perceptualismo” – a idéia de quesuas pinturas envolviam graus de transcrição do como o mundo “apareceria” para ele.

sensibilidade de Cézanne não estava voltada às condições siológicas da visão, mas ele buscouformas de exceder essas limitações e tornar o olho um novo órgão – num mundo que que poderia serencarado somente num processo dinâmico.

Não era também um esforço em se negar o corpo, criando uma visão pura e desencarnada, mas em sedescobrir novas relações cognitivas e físicas

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declaração de Cézanne de que não há linhas retas na natureza seria uma renunciação do que Niet-zsche identicou como o mundo dos fenômenos: “O mundo adaptado que achamosser o real”. A “realidade” encontra-se na contínua recorrência do idêntico, familiar, tudo no seu lugar epapel lógico, na crença de que aqui podemos conar e calcular.

mbos Cézanne e Nietzche recusam esse processo pelo qual “o turvo e o caos no sentido das impres-sões são, como sempre foram, logicados”. Em Nietzche aprendemos que a antítese desse mundo defenômenos é “o amorfo e inconcebível mundo do caos das sensações”.

Em Cézanne nós atingimos uma atenção motora e sensória para a emergência contínua e desintegra-ção da constelação de relações da qual o ser era um elemento constituinte.

Busca pelo Controle

Com a acumulação institucional de conhecimento sobre o sujeito humano, mais a atenção se mostrouser ambígua e problemática, e portanto tornou-se necessário criar condições experimentais na qual ocomportamento atentivo do observador tivesse um mínimo de ambiguidades.

lgumas dessas condições envolveram a produção de outros tipos de visão “xada”, dentro da cres-cente compreensão das características “transitivas” e instáveis da natureza da percepção.

moderna psicologia, como surgiu no século XIX, “propôs-se como uma forma de lidar com o emba-raço de não ter certeza absoluta; para isso sugeriu como incorporar os “caprichos” e imprevisibilidadeda subjetividade num composto de restrições.

Como então as condições poderiam ser controladas para que as experiências perceptuais do sujeitopudessem ser convincentemente quanticadas?

O taquistoscópio, desenvolvido durante princípios a meados da década de 1880, era um produto dabusca por uma unidade elementar do comportamento atentivo, na qual acreditava-se necessária casovárias formas de atividade perceptual e cognitiva deveriam ser empiricamente observáveis e avalia-das. É apresentado um estímulo visual (uma imagem, palavra, um grupo de símbolos) sendo que aduração do estímulo era extremamente curta – O surgimento e desaparecimento da composição é

praticamente instantâneo.

Entretanto, o taquistoscópio presumidamente tornava possível oexame de capacidades psicológicas especícas da qual o tempoera excluído como uma variável.

Os dados do taquistoscópio derivavam de um arranjo tecnológicoque imobilizava o corpo e o olho: A velocidade do obturador eramuito mais rápida do que as capacidades musculares do olho.

Era um aparato desenvolvido com um único requerimento maior:Permitia um único vislumbre na qual os olhos não teriam tempode percorrer diferentes pontos focais durante a exposição de ummesmo campo. Em 1906 foram feitas fotograas dos olhos em ex-

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posições menores que 1/100 de um segundo, e de fato não era possível detectar mudanças signica-ivas de xações do olho. Neste sentido produziu sua forma controlada de visão xa.

Pesquisadores buscaram, por exemplo, determinar quantos elementos individuais um sujeito atentopoderia apreender sem mover o olho de ponto a a ponto ou sem realizar simples operações mentais.Isto era referido como a “área da atenção”.

experimentação, incluindo trabalhos prévios de Wundt, mostrou, ao contrário de suposições asso-ciacionistas, que era possível observar várias coisas simultaneamente. Entretanto, não era esta umaquestão em se perceber a Gestalt composta por um punhado de elementos separados.

O taquistoscópio foi um entre diversos exemplos, de como – dentro de um contexto de moderniza-ção tecnológica – velozes aparatos mecânicos eram reciprocamente relacionados a novas formas de

estase do corpo.

atenção, uma questão central no século XIX, era em muitos casos conceitualizada como uma moda-lidade física de relativa imobilidade dentro de um universo em constante formação por experiênciasde velocidade e mobilidade.

Primeiramente, tempo de reação foi suposto como a medida de intervalo entre a inserção de umestímulo (visual, auditivo, táctil) e a resposta motora do organismo. Portanto, pesquisadores acredi-avam estar quanticando o tempo requerido para reconhecer um estímulo esterno e o tempo para

se organizar uma resposta e este. As consequencias epistemológicas3 desdobradas da descoberta deHelmoltz incluiram a compreensão o presente mundo como o vivemos, é de fato o mundo como erauma fração de segundo anterior – o aparente presente é na verdade o passado. Mesmo o taquistoscó-

pio, que buscava estabilizar o que Wundt denominava “estado presente” da percepção, estava de fatosendo acionado dentro de um conjunto de eventos psicológicos temporariamente extendidos.

O argumento de Foucault sobre a signicância da biologia e da volátil questão da “vida”no século XIX é de particular importância: A essência da vida humana não é mais algo representávelno espaço tabular da representação clássica, mas tornou-se compreendida em termos da sua exis-ência no tempo, de funções e energias que de desdobraram e desenvolveram fora da mediação da

visibilidade clássica.

Outras Percepções

Foucault: “A vida torna-se uma força fundamental, e aquele que se opõe em estar na mesma direçãoque o movimento está para a imobilidade, assim como o tempo para o espaço...A experiência da vidaé portanto colocada como a mais geral lei dos seres, a revelação daquela força primitiva na base doque eles são: funcionando como uma ontologia4 indomada.

 _______________________________________ 

. ep stemo oga

o Gr. epistéme, ciência + lógos, tratado. s. f., estudo crítico das várias ciências; gnosiologia, teoria do conhecimento.

. on.to.lo.gi.a

. f. . Ciência do ser em geral. . Filos. Parte da metafísica que estuda o ser em geral e suas propriedades transcendentais.

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Porém, se nos termos epistêmicos de Foucault, o “ser” é sobrepujado pelo “sendo” no século XIX, onovo problema para as ciências quantitativas era como formalizar objetos de estudo que se ´presen-avam em termos de desenvolvimento, mudança, crescimento ou decadência. Claramente, não era a

questão da ciência em negar a temporalidade dos seus objetos, mas sim adequando esse tempo emelementos sucetíveis de várias formas de controle e racionalização.

atenção, como um objeto do conhecimento envolvia o reconhecimento de que a percepção eraessencialmente temporal e instável, mas também, se estudada determinadamente, capaz de ser ma-nipulada e relativa estabilização (como o exemplo do taquistoscópio demostrou).

Em meio a esmagadora aceitação losóca e cientíca sobre a instabilidade, falibilidade, opacidadese limitações gerais da experiência perceptiva e dos sentidos humanos, havia entretanto variados es-forços, mesmo nas artes visuais, para determinar ou denir o âmago funcional ou a manifestação de

uma percepção “pura”. Esta era uma questão prioritaria sobre a apreensão de uma imagem que repre-sentasse o mundo externo.

Mas o que é a “percepção pura”, quando não mais é uma questão de enxergar o mundo como umaunidade? O que acontece quando a percepção não é mais sinônimo de presença?

Matter and Memory (1896), deMatter and Memory Matter and Memory  Bergson é um texto entrelaçado de debates e discussõessobre a natureza da percepção e da atenção. É o repensar da condição de uma imagem. Ambos Berg-son e Cézanne compartilhavam de uma compreensão que sustentava o fato de que a experiência per-ceptual nunca iria conceder algo “puro” no sentido tradicional, uma vez que as formas mais profundasde percepção são um mixto, uma composição.

O livro demonstra que a atenção opera em duas vertentes. Uma é a atenção ao uxo de sensaçõesexternas e eventos enquanto a outra é a atenção voltada à forma na qual as memórias coincidem oudivergem com a “presente” percepção. O nível de autonomia que um indivíduo possui é proporcionalà própria indeterminação e imprecisão que a memória se entrelaça com a percepção. Quanto maisdeterminada esta for (a memória), mais habitual e repetitiva será a resposta perceptual ao ambiente emenor autonomia e liberdade caracterizará a existência individual.

Quando uma ação se segue a um estímulo “sem que o ser interra neste”, este indivíduo se torna um“autômato consciente”, e Bergson sustenta que a maior parte dos nossos atos diários “têm muitos pon-os em comum com o ato reexo”. Os momentos mais ricos e criativos ocorrem no que ele evocativa-

mente chama de “zona de indeterminação”. Esta postula um sujeito com a capacidade de recriar o pre-sente, ou seja, escapar das restrições e necessidades de relações de um ambiente interno individual.

Os organismos mais evoluídos, seres humanos, tem potencialmente maior independência de reaçõescompulsórias aos estímulos do ambiente. Desta “zona de indeterminação”, aceita como um fato, pude-mos inferir a necessidade de uma percepção, uma relação variável entre objetos de acordo com nossointeresse neste.

De certa forma, Bergson está propondo um modelo da relação estética “desinteressada” do mundocom um suporte evolucionário e biológico. O fato que nosso sistema nervoso pode não somenteatrasar resposta à estímulos, como também pode variar respostas – como uma precondição ao sujeitolivre e autônomo.

O livro de Bergson tinha uma proposta clara: Foi uma forte resposta padronização geral da experiênciae automação da resposta perceptual na virada do século.

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ovas en nc as no cu o

Deleuze faz uma valorosa distinção entre cinema e pintura: Uma vez que as imagenspictóricas são intrinsecamente imóveis, “é a mente que faz o movimento”. Para ele, a arte industrial docinema coincide com uma nova “automação subjetiva e coletiva”. Com isto, vem grandes possibilida-des: De um lado o surgimento de novas formas experimentais de vida, de liberdade e criação, na qualo trabalho de Cézanne também participa; do outro lado, a elaboração de incontáveis procedimentospara a manutenção da atenção, os quais são sugeridos no trabalho de Seurat: Os primei-ros pontos para um modelo armativo do comportamento automático, aonde funções do pensamen-o são avaliados segundo um arsenal de ferramentas sináticas, perceptuais e conceituais. Em segundo

(implícito no cinema desde o começo), é um modelo do automatismo passivo na qual o sujeito “édesprovido do seu próprio pensamento , e obedece uma impressão interna que se desenvolve apenasem visões ou ações rudimentares (do sonho ao sonâmbulismo, através da intermediação de hipnose,sugestão, alucinação, obsessão, etc.).

Deleuze, entre outros, mostrou que é nesse nível que uma arte do movimento automático iria coinci-dir com o fascismo, o organização de combate mecanizado, e com a propaganda de Estado de todosos tipos.

Cézanne no seu trabalho, não teve amarras em improvisar substitutos para um ponto xo irrecupe-rável ou eixo que prenderia o mundo. Nos seus últimos trabalhos tentou repetidamente apreender eatingir um espaço uido e infundado, preenchido de forças e intensidades ao invés de objetos equi-librados num maleável e dócil espaço visual que se tornaria sujeito de inndáveis formas de reestru-

uração, manipulação externa, através da entorpecida padronização do século XX. Seu cuidado impie-doso para com a atenção propriamente dita, buscando por um limiar aonde a revelação é inseparávelda sua dissolução, apresentada como superando a percepção administrada da cultura do espetáculopara a qual a atenção é voltada para tudo menos para si mesma.

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 Anexo : Outras Percepções (Aumont)

usca sua

Fala-se de busca para designar o processo que consiste em encadear diversas xações sucessivassobre uma mesma cena visual, a m de explorá-la em detalhe. É evidente que esse processo está inti-mamente vinculado à atenção e à informação: O ponto no qual se deterá a próxima xação é determi-nado ao mesmo tempo pelo objeto da busca, pela natureza da xação atual e pela variação do campo

visual. Quando se olha uma paisagem do alto de uma colina, a busca visual será diferente (como serãodiferentes os pontos sucessivos de xação e o ritmo) se o olhar for de um geólogo, de um apreciadorde ruínas romanas, ou de um agricultor.

sse exemplo simplista pretende mostrar que só há busca visualquando houver projeto de busca mais ou menos consciente (atéa aparente ausência de projeto, que consiste na mera coleta deinformação interessante sem a preocupação com a natureza dessainformação).

ssa noção é muito pertinente no caso das imagens. Notou-se hámuito tempo (pelo menos desde os anos 30) que olhamos as ima-

gens não de modo global, de uma só vez, mas por xações sucessi-as.

Quase todas experiências concordam: no caso de uma imagemolhada sem intenção particular, as xações sucessivas duram alguns

décimos de segundo cada uma e limitam-se estritamente às partes da imagem mais providas deinformação (o que se pode denir com bastante rigor como as partes que, memorizadas, permitemreconhecer a imagem no momento de uma segunda apresentação).

O que surpreende nessas experiências é a ausência total de regularidade nas seqüências de xação:não há varredura regular da imagem do alto para baixo, nem da esquerda para a direita; não há esque-ma visual de conjunto, mas, ao contrário, várias xações muito próximas em cada região densamenteinformativa e, entre essas regiões, um percurso complexo.

“Tentou-se prever as trajetórias de exploração de uma imagem pelo olho, mas, se não for dada umaordem explícita, essas trajetórias são uma inextricável rede de linhas quebradas. O único resultadoconstantemente vericado é de que a trajetória é modicada pela introdução de ordens particulares,o que é normal em vista do que dizíamos: um olhar informado desloca-se de outro modo no campoque explora.”

O importante, no intuito deste livro, é reter que a imagem - como toda cena visual olhada durante cer-o tempo — se vê, não apenas no tempo, mas à custa de uma exploração que raramente é inocente; é

a integração dessa multiplicidade de xações particulares sucessivas que faz o que chamamos nossavisão da imagem.

 AUMONT, Jacques 1993 . A Imagem. São Paulo: Papirus Editora.