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134 RIOS E CIDADES: RUPTURA E RECONCILIAÇÃO Figura 76: Plano para o Sistema de Parques Metropolitanos, da Comissão de Parques do Senado, 1902 Fonte: “The Anacostia Waterfront Framework Plan – District of Columbia, Office of Planning” (2003, p.13) Figura 77: Plano de Pierre Charles L’Enfant (parceria com Thomas Jefferson) para a cidade em 1793 Fonte: “The Anacostia Waterfront Framework Plan - District of Columbia, Office of Planning” (2003, p.12) A dragagem das zonas alagadas foi completada pela Corporação de Engenheiros do Exército dos EUA (1902-1926) para aterrar as zonas alagáveis e construir uma barreira (baluarte) ao longo das margens, a fim de criar o Parque Anacostia. Toneladas do material dragado foram usadas para a construção de duas ilhas artificiais, Kingman e Heritage (Figura 76). Embora o Plano McMillan tenha resultado em significativa construção ao longo do rio, sua visão de um grandioso e significativo sistema de parques públicos nunca foi realizada. Essa visão foi sendo descartada, e, progressivamente, o rio Anacostia se tornou uma área indesejada para uso e ocupação do solo e negligenciada por gestores do uso do solo.

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Figura 76: Plano para o Sistema de Parques Metropolitanos, da Comissão de Parques do Senado, 1902

Fonte: “The Anacostia Waterfront Framework Plan – District of Columbia, Offi ce of Planning” (2003, p.13)

Figura 77: Plano de Pierre Charles L’Enfant (parceria com Thomas Jefferson) para a cidade em 1793

Fonte: “The Anacostia Waterfront Framework Plan - District of Columbia, Offi ce of Planning” (2003, p.12)

A dragagem das zonas alagadas foi completada pela Corporação de Engenheiros do Exército

dos EUA (1902-1926) para aterrar as zonas alagáveis e construir uma barreira (baluarte) ao

longo das margens, a fi m de criar o Parque Anacostia.

Toneladas do material dragado foram usadas para a construção de duas ilhas artifi ciais,

Kingman e Heritage (Figura 76). Embora o Plano McMillan tenha resultado em signifi cativa

construção ao longo do rio, sua visão de um grandioso e signifi cativo sistema de parques

públicos nunca foi realizada. Essa visão foi sendo descartada, e, progressivamente, o rio

Anacostia se tornou uma área indesejada para uso e ocupação do solo e negligenciada por

gestores do uso do solo.

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No início do século XX, o desenvolvimento urbano da capital se expandiu rapidamente para

o norte do centro histórico da cidade. O crescimento populacional de Washington explodiu

após a II Guerra Mundial (Figura 78).

Dessa forma, a bacia hidrográfi ca do Anacostia passou a receber dos córregos tributários a

descarga de poluição e de resíduos industriais. A ocupação suburbana e a área industrial se

expandiram; por conseguinte, a impermeabilização do solo gerou um aumento do fl uxo de

escoamento superfi cial de águas pluviais em direção ao rio.

Em 1990, o Anacostia estava reduzido a um canal de esgoto, resíduos industriais e lixo. A

região do entorno do rio passou a ser associada a um cenário de degradação social, miséria,

violência e drogas. Hoje, a bacia hidrográfi ca do Anacostia é 70% urbanizada, e a região

mais populosa é a sub-bacia Chesapeake. Resta cerca de um quarto da cobertura original

das matas ciliares.

Além disso, fontes de poluição provenientes dos subúrbios de Prince George e distritos de

Montgomery, em Maryland, combinadas com o sistema de esgoto de Washington transbor-

dam do rio Anacostia em épocas de cheias e grandes tempestades.

Apesar dessa situação, o rio Anacostia é freqüentado por garças pousadas nas suas margens,

veados e roedores, que indicam que esse ambiente tão degradado ainda possui habitat para

a fauna. Vem atraindo o interesse dos cidadãos e grupos ambientalistas, e agora é foco de

várias ONGs, grupos comunitários e agências governamentais.

Avanços em ciência e tecnologia, junto com a vontade e os investimentos combinados do

governo, cidadãos, grupos comunitários e organizações não- governamentais (ONGs) ten-

tam reverter o cenário de degradação do Anacostia com uma série de iniciativas ousadas

para tornar o rio navegável novamente.

Figura 78: corredor do rio Anacostia e suas proximidades na década de 1960. O rio Anacostia fl ui no sentido diagonal, de nordeste para sudoeste

Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/Anacostia_River>. Acesso em 03 mar. 2008

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Figura 79: Foto aérea da bacia hidrográfi ca do Anacostia – Localização de áreas sub-utilizadas (Ortofoto – 1999)

Fonte: “The Anacostia Waterfront Framework Plan - District of Columbia, Offi ce of Planning” (2003, p.14-15)

Figura 80: Vista aérea do rio Anacostia e o distrito de Columbia - Washington

Fonte: “The Anacostia Waterfront Framework Plan - District of Columbia, Offi ce of Planning” (2003, p. 2)

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Figura 81: Expansão da área de desenvolvimento econômico do norte e oeste para o quadrante sudeste de Washington, através do Anacostia.

Fonte: “The Anacostia Waterfront Framework Plan - District of Columbia, Offi ce of Planning” (2003, p. 9)

Figura 82: Mapa de Washington. Localização do parque e do Corredor da Rua “M”, em relação ao Anacostia e Capitólio

Fonte: Revista Landscape Architecture (v. 95, n. 6, p. 108, mai. 2005)

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3.3.2 Motivos que levaram à elaboração do Plano

Durante o início do século XX, a Corporação de Engenheiros do Exército dos EUA protago-nizou as alterações do sistema do Anacostia. A Corporação dragou os lençóis d’água, ater-rou os brejos com o objetivo de obter novos terrenos, melhorar o saneamento, combater a malária e promover a navegação e comércio. Contudo, em 1914, a cúpula da Corporação concluiu que as áreas alagáveis do Anacostia não eram necessárias para fi ns comerciais, mas a cidade já estava crescendo, principalmente no quadrante noroeste, e ocupando as áreas de várzeas que haviam sido dragadas.

A Corporação propôs que a área deveria ser desenvolvida como um parque público para sua valorização. O Parque Anacostia foi formalmente estabelecido em 1919, e tornou-se objeto de decisão de política pública com a regulamentação, em 1928, do Plano do Parque do Rio Potomac pela Comissão Nacional de Planejamento de Parques da Capital. Apesar de seu po-tencial, nem o plano de L’Enfant (Figura 77) nem a Comissão McMillan previam a capacidade do Anacostia para acolher e direcionar o crescimento da cidade um ou dois séculos adiante. Essa responsabilidade recaiu sobre a atual geração.

Em 1997, a Comissão de Planejamento da Capital Nacional publicou o seu Plano Ofi cial, que lançava algumas oportunidades de desenvolvimento ao longo do Anacostia e em todo o quadrante Sudeste. O Anacostia Waterfront Iniciative pretendia estabelecer um plano de desenvolvimento para o rio Anacostia e seus arredores, de longo prazo, visando à melhoria da cidade em relação ao passado.

3.3.3 Atores

Desde que a Anacostia Waterfront Iniciative (AWI) assinou o Memorandum of Understan-ding (MOU), em Março de 2000, a Secretaria de Planejamento do Distrito de Columbia tem coordenado a implantação do plano de recuperação do rio Anacostia. O MOU é uma parceria inédita entre 20 Distritos e agências federais que são proprietárias ou controlam as proprie-dades ao longo do rio Anacostia. O Plano da AWI é o produto de um período de três anos de um processo público envolvendo intenso engajamento dos empreendedores. Destacam-se as principais agências e departamentos públicos:

Governo do Distrito de Columbia

Distrito Naval de Washington

Secretaria de Habitação do Distrito de Columbia

Secretaria de Esportes e Entretenimento do Distrito de Columbia

Secretaria de Abastecimento e esgoto do Distrito de Columbia

Comissão Nacional de Planejamento

Corporação Nacional de Revitalização da Capital

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Corpo Militar Americano do Distrito de Washington

Corporação de Engenheiros do Exército dos EUA

Ministério dos Transportes dos EUA

Ministério da Habitação e Desenvolvimento Urbano dos EUA

Agência de Proteção Ambiental dos EUA

Ministério de Gestão e Orçamento dos EUA

Ministério da Agricultura dos EUA

Administração de Pequenos Negócios dos EUA

Secretaria de Trânsito da Área Metropolitana de Washington

3.3.4 Objetivos

O principal desafi o do plano de revitalização do rio é reunifi car diversas áreas de Washington, através da diversifi cação de usos - recreacional, comercial e residencial pela capitalização do maior recurso natural da cidade: a sua orla. O plano visa contribuir para a revitalização dos bairros, aumentando as áreas de parques e desenvolvendo as propriedades do Governo.

O AWFP (Anacostia Waterfront Framework Plan) estabeleceu cinco temas para a revitaliza-ção do corredor do Anacostia: restauração – por um rio limpo e vivo; conectividade – pela eliminação das barreiras e ampliação dos acessos ao rio; lazer – por um amplo sistema de parques na orla; celebração; áreas com fi ns culturais e vitalidade – por melhor qualidade de vida das comunidades dos bairros adjacentes

Outra meta é aumentar as oportunidades de geração de renda e postos de trabalho. Os empreendedores e a comunidade acreditam que a transformação fará com que a cidade de Washington vigore entre as mais belas capitais do mundo. Os principais objetivos do plano são:

1) Traçar os rumos da recuperação ambiental e renovação das atividades dependen-tes da água sobre o rio Anacostia;

2) Repensar infra-estrutura de transporte para melhorar o acesso às propriedades à beira do rio e melhor servir bairros adjacentes;

3) Criar um sistema contínuo e interligado de parques, unidos por trilhas e pistas de caminhada nas margens do rio Anacostia;

4) Revitalizar as margens para celebrar e explorar o patrimônio cultural da cidade e da nação;

5) Promover o desenvolvimento econômico sustentável reconectando a cidade ao

rio e ao papel vital do mar, que oferece oportunidades para viver, trabalhar e

recrear.

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3.3.5 Diretrizes

Em linhas gerais, o plano estabelece diretrizes que visam alcançar o desenvolvimento econô-

mico e sustentável. E, além da recuperação ambiental, propõe diretrizes para o aumento da

vitalidade urbana e para a conexão entre as áreas desarticuladas do tecido urbano, descritas

a seguir:

1) Promover a vitalidade urbana à beira-rio para uma cidade-capital internacional;

2) Produzir um plano coordenado para as margens do rio que possa ser implantado

ao longo do tempo;

3) Recuperar a qualidade da água do rio Anacostia e reforçar a sua beleza natural;

4) Desenvolver uma rede distinta de parques e áreas verdes, atividades náuticas

variadas e locais públicos singulares;

5) Conectar os bairros ao longo do rio uns aos outros e ligar outras comunidades

vizinhas diretamente à água;

6) Promover o desenvolvimento sustentável e de baixo impacto nos bairros lindeiros

ao rio;

7) Estimular o desenvolvimento econômico nos bairros através da criação de empre-

go e atividade comercial;

8) Engajar todos os segmentos da comunidade como responsáveis pelo rio e suas

margens;

9) Endereçar as preocupações da comunidade, incluindo os moradores, proprietários

de glebas, empresários e turistas;

10) Promover a excelência do projeto, em todas as intervenções.

3.3.6 Propostas

As propostas seguem as diretrizes e os objetivos descritos anteriormente. O Plano agrupou

as propostas por temas: meio ambiente, circulação e transporte, parques, atividades cultu-

rais e bairros.

A seguir, são apresentadas as propostas de acordo com os temas mencionados.

Propostas relativas ao Meio Ambiente:

Proporcionar um rio apropriado para nadar em 2025;

Restaurar os tributários, atuando na escala da bacia hidrográfi ca e requalifi cando

os ambientes urbanos e naturais;

Implementar regulamentos e normas que garantam o desenvolvimento susten-

tável;

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Aumentar todos os tipos de atividades náuticas;

Reforçar a educação ambiental no âmbito da bacia hidrográfi ca do rio.

Propostas relativas à circulação e ao transporte:

Fornecer acesso contínuo de pedestres e bicicletas ao longo de todo o rio;

Promover transferências modais de transporte público;

Criar grandes boulevares urbanos com usos mistos e grandes espaços cívicos,

tratados paisagisticamente;

Redesenhar pontes por todo o Anacostia na tradição da arquitetura clássica mo-

numental;

Redesenhar estradas e itinerários livres de barreira entre os bairros e o sistema

Parque-Rio;

Reconectar o tecido viário da cidade ao sistema de parques e à orla.

Propostas relativas aos Parques:

Melhorar a circulação entre rio e espaços públicos, a fi m de criar um sistema

interligado de parques;

Requalifi car as áreas subutilizadas ao longo do rio para se tornarem áreas públicas

signifi cativas;

Garantir o acesso contínuo ao longo do rio para pedestres e ciclistas;

Aumentar a oferta de atividades de recreação ao longo do sistema Rio-Parque;

Criar parques específi cos de acordo com as escalas de vizinhança, regional e na-

cional.

Propostas relativas a atividades culturais:

Enfatizar o caráter único do patrimônio e das bacias fl uviais, incluindo elementos

naturais e urbanos;

Criar parques públicos para abrigar concertos, piqueniques e festivais locais;

Fazer do Anacostia um destino para eventos especiais em nível regional, tais como

apresentações e eventos desportivos;

Criar monumentos condizentes com os segmentos da bacia.

Propostas relativas aos bairros:

Promover o uso misto nos bairros possibilitando a qualidade de vida quotidiana,

de oportunidade trabalho e de recreação;

Investir em bairros existentes para garantir que os atuais residentes tenham me-

lhores serviços e oportunidades;

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Figura 84: Século 21 - Visão das margens do rio Anacostia no centro de crescimento, Washington

Fonte: “The Anacostia Waterfront Framework Plan - District of Columbia, Offi ce of Planning” (2003, p. 8)

Figura 83: Plano geral para a recuperação do rio Anacostia

Fonte: “The Anacostia Waterfront Framework Plan - District of Columbia, Offi ce of Planning” (2003, p.133)

Estabelecer padrões que possibilitem acolher a mais de 20.000 famílias vivendo

em bairros próximos ao rio;

Revitalizar áreas comerciais existentes e ligar esses centros históricos a novos

espaços públicos.

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Figuras 85 a 87: Propostas para melhoria do passeio público e aumento da vitalidade do espaço público

Fonte: Revista Landscape Architecture (v. 95, n. 6, p. 109, mai. 2005)

Figura 88: Desenho artístico – Proposta de um novo centro de educação ambiental na Ilha Kingman

Fonte: “The Anacostia Waterfront Framework Plan - District of Columbia, Offi ce of Planning” (2003, p.22)