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Revista de Medicina Desportiva informa Setembro 2017 · 1 Entrevista: José Luís – Massagista do F C Porto 2 FMUP/Comentários Sedentary Behavior, Cadence and Physical Activity Outcomes after Knee Arthroplasty 3 “Síndrome gastrointestinal” induzido pelo exercício: a propósito de uma recente revisão sistemática 4 Tema: Cãibras Musculares Associadas ao Exercício: Etiologia, Prevenção e Tratamento 5 Caso clínico: Lesão Muscular no Futebolista – A Propósito de Dois Casos Clínicos 8 Resumos: 3. as Jornadas de Medicina Desportiva do Rio Ave F C 10 Sociedade Portuguesa de Artroscopia e Traumatologia Desportiva 22 Investigação: Injeção Intra-articular no Tratamento da Osteoartrose do Joelho: Corticoesteroide, Ácido Hialurónico, PRP ou Nenhuma? Um Estudo Prospetivo a 6 Meses 23 Tema: Instabilidade Glenoumeral Traumática do Ombro 27 Notícias 30 Agenda 32 Editorial Sumário O que é que leva um elemento de um departa- mento médico a servir um clube durante ... 64 anos? E Ainda lá continua! Certamente que tem havido muita competência, mas a paixão de ser- vir, o gosto de ser útil, o querer ser prestável e a grande paixão pelo clube têm sido algumas das razões. É um exemplo que acontece no F C Porto, mas poderia acontecer noutro clube qualquer. Ainda recentemente o Rio Ave F C homenageou publicamente o enfermeiro Leonel que tantos anos serviu o Sporting. O Dr. Narciso andou lar- gas dezenas de anos no Desportivo das Aves e o Dr. Dias Costa já não sabe há quantos anos anda no Arouca. Há ainda muitos mais exemplos de longevidade e de dedicação, mas alguns já nos deixaram. De facto, o departamento médico, que fica lá no fundo do corredor, já na zona pouca iluminada, é constituído por elementos tecnica- mente bem formados, mas bem apetrechados da componente humanitária, que todos recebe e acolhe, que ouve e consola, que diagnostica, tranquiliza e trata. O Zé Luís tem sido tudo isto, mas tem sido também um exemplo de convi- vência, que sabe contemporizar e tolerar. Esta é uma justa homenagem prestada nesta edição da Revista. Que belo exemplo! Obrigado Zé Luís. Basil Ribeiro, Diretor Medicina DESPORTIVA informa revista de Bimestral Ano 8 Número 05 Setembro 2017 www.revdesportiva.pt Preço – 2,50€ COMISSÃO CIENTÍFICA: CARDIOLOGIA | António Freitas, Dr – Lisboa – Centro de Medicina Desportiva | Miguel Mendes, Dr – Lisboa – Hospital de Santa Cruz | Ovídio Costa, PhD – Porto – Faculdade de Medicina do Porto | Teles Martins, PhD – Lisboa – Departamento de Saúde Naval | Veloso Gomes, Dr – Faro – Hospital de Faro | CIRURGIA GERAL | Bernardo Vasconcelos, Dr – Lisboa – Serviços Clínicos da Portugal Telecom | DERMATOLOGIA | Osvaldo Correia, PhD – Porto – Epidermis – Centro de Dermatologia | FILOSOFIA DA MEDICINA | Manuel Sérgio, PhD – Lisboa | FISIATRIA | Páscoa Pinheiro, PhD – Coimbra – Faculdade de Medicina de Coimbra | FISIATRIA/HIDROLOGIA CLÍNICA | Pedro Cantista PhD – Porto – Centro Hospitlar do Porto | FISIOLOGIA | Gomes Pereira, PhD – Lisboa – Faculdade de Motricidade Humana | José Alberto Duarte, PhD – Porto – Faculdade de Desporto do Porto | GASTRENTEROLOGISTA E HEPATOLOGISTA | Rui Tato Marinho, PhD – Lisboa – Faculdade de Medicina de Lisboa | IMUNOALERGOLOGIA | André Moreira, PhD – Porto – Hospital de S. João | MEDICINA DESPORTIVA | J. L. Themudo Barata, PhD – Covilhã – Universidade Beira Interior | João Paulo de Almeida, PhD – Lisboa | Luís Horta, PhD – Lisboa – Hospital Curry Cabral | Maria João Cascais, PhD – Lisboa – Nova Faculty of Lisbon | MEDICINA INTERNA | Teixeira Veríssimo, PhD – Coimbra – Faculdade de Medicina de Coimbra | NUTRIÇÃO | Vitor Hugo Teixeira, PhD – Porto – Faculdade de Ciências da Nutrição | ORTOPEDIA | Fernando Fonseca, PhD – Coimbra – Faculdade de Medicina de Coimbra | João Espregueira-Mendes, PhD – Universidade do Minho; Director Clínico da Clínica do Dragão – Universidade do Minho | João Gamelas, PhD – Lisboa – Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa | José Carlos Noronha, PhD – Porto – FPF; Ordem da Trindade | Leandro Massada, PhD – Porto – Centro de Medicina Desportiva do Porto | PEDIATRIA | Carla Rêgo, PhD – Porto – Instituto CUF Porto. Faculdade de Medicina da UP. | PNEUMOLOGIA | Robalo Cordeiro, PhD – Coimbra – Faculdade de Medicina de Coimbra | PSICOLOGIA | Sidónio Serpa, PhD – Lisboa – Faculdade de Motricidade Humana | REUMATOLOGIA | Carlos Vaz, PhD – Porto – Hospital de S. João. | COMISSÃO DE COLABORADORES: FISIATRIA | Gonçalo Borges, Dr – Porto – Hospital da Prelada | Jorge Lains, Dr – Coimbra – Hospital Rovisco Pais | Pedro Lemos Pereira, Dr – Coimbra – Hospital Universitário de Coimbra | Raul Maia e Silva, Dr – Porto | MEDICINA DESPORTIVA | Domingos Gomes, Dr – Porto – CESPU | João Beckert, PhD – Lisboa – Centro de Medicina Desportiva de Lisboa | José Ramos, Dr – Porto – Clinica de Gondomar | Nelson Puga, Dr – Porto – Futebol Clube do Porto | Paulo Beckert, Dr – Lisboa – FPF – Clínica Cuf Alvalade | Pedro Saraiva, Dr – Coimbra – Associação Académica de Coimbra | MEDICINA GERAL E FAMILIAR | José Maria Henriques, Dr – Vila Nova de Gaia – Unidade de Saúde Familiar de Santa Marinha | MEDICINA INTERNA | Jorge Ruivo, Dr –Lisboa – Hospital de Santa Maria | ORTOPEDIA | Diogo Moura, Dr – Coimbra – HUC | Hélder Pereira, Dr – Vila do Conde – Hospital da Póvoa do Varzim | Henrique Jones, Dr – Setúbal – Clínica Dr. Henrique Jones | José Lourenço, Dr. – Porto | Paulo Amado, Dr – Rio Tinto – Hospital Lusídas Porto | Pereira de Castro, Dr – Lisboa – SPAT; Desporsano, Clínica de Desporto | RADIOLOGIA | Joaquim Agostinho, Dr – Viseu – Hospital São Teotónio FICHA TÉCNICA | Diretor e Editor BASIL VALENTE RIBEIRO | Diretor adjunto PEDRO LEMOS PEREIRA | Sub-diretor JOSÉ RAMOS | Editor adjunto HENRIQUE JONES | Produção REVDESPORTIVA,LDA | Design e Paginação JOSÉ TEIXEIRA | Fotografia da capa: Federação Portuguesa de Canoagem | Impressão MULTITEMA – Porto | Propriedade REVDESPORTIVA, LDA. Rua do Sobreiro 225, Canidelo 4400-590 V N Gaia. | Telefone/Fax – 227810869 | E-mail: [email protected] | www.revdesportiva.pt | Periodicidade Bimestral | Tiragem 6000 exemplares | Depósito Legal 304182/09 | ISSN 1647-5534 | Publicação Registada no Instituto da Comunicação Social sob o n.º 125758 | A reprodução parcial ou integral de texto ou ilustrações da Revista de Medicina Desportiva Informa é proibida. A Revista de Medicina Desportiva informa é uma publicação de âmbito nacional, de publicação bimestral e de caráter médico-científico. Tem como objetivo divulgar conteúdos médico-des- portivos através de temas de revisão e de investigação, assim como publicar “Casos Clínicos” relacionados com a prática da Medicina Desportiva. Divulga ainda reuniões científicas reali- zados em Portugal e no estrangeiro. Esta Revista respeita a Constituição Portuguesa e orienta-se por critérios de isenção e de rigor científico, compromisso ético e respeito deontológico.

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Revista de Medicina Desportiva informa Setembro 2017 · 1

Entrevista: José Luís – Massagista do F C Porto 2

FMUP/ComentáriosSedentary Behavior, Cadence and Physical Activity Outcomes after Knee Arthroplasty 3

“Síndrome gastrointestinal” induzido pelo exercício: a propósito de uma recente revisão

sistemática 4

Tema: Cãibras Musculares Associadas ao Exercício: Etiologia, Prevenção e Tratamento 5

Caso clínico: Lesão Muscular no Futebolista – A Propósito de Dois Casos Clínicos 8

Resumos: 3.as Jornadas de Medicina Desportiva do Rio Ave F C 10

Sociedade Portuguesa de Artroscopia e Traumatologia Desportiva 22

Investigação: Injeção Intra-articular no Tratamento da Osteoartrose do Joelho:

Corticoesteroide, Ácido Hialurónico, PRP ou Nenhuma? Um Estudo Prospetivo a 6 Meses 23

Tema: Instabilidade Glenoumeral Traumática do Ombro 27

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grande paixão pelo clube têm sido algumas das

razões. É um exemplo que acontece no F C Porto,

mas poderia acontecer noutro clube qualquer.

Ainda recentemente o Rio Ave F C homenageou

publicamente o enfermeiro Leonel que tantos

anos serviu o Sporting. O Dr. Narciso andou lar-

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Dr. Dias Costa já não sabe há quantos anos anda

no Arouca. Há ainda muitos mais exemplos de

longevidade e de dedicação, mas alguns já nos

deixaram. De facto, o departamento médico, que

fica lá no fundo do corredor, já na zona pouca

iluminada, é constituído por elementos tecnica-

mente bem formados, mas bem apetrechados

da componente humanitária, que todos recebe

e acolhe, que ouve e consola, que diagnostica,

tranquiliza e trata. O Zé Luís tem sido tudo isto,

mas tem sido também um exemplo de convi-

vência, que sabe contemporizar e tolerar. Esta é

uma justa homenagem prestada nesta edição da

Revista. Que belo exemplo! Obrigado Zé Luís.

Basil Ribeiro, Diretor

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BimestralAno 8Número 05

Setembro 2017www.revdesportiva.ptPreço – 2,50€

COMISSÃO CIENTÍFICA: CARDIOLOGIA | António Freitas, Dr – Lisboa – Centro de Medicina Desportiva | Miguel Mendes, Dr – Lisboa – Hospital de Santa Cruz | Ovídio Costa, PhD – Porto – Faculdade de Medicina do Porto | Teles Martins, PhD – Lisboa – Departamento de Saúde Naval | Veloso Gomes, Dr – Faro – Hospital de Faro | CIRURGIA GERAL | Bernardo Vasconcelos, Dr – Lisboa – Serviços Clínicos da Portugal Telecom | DERMATOLOGIA | Osvaldo Correia, PhD – Porto – Epidermis – Centro de Dermatologia | FILOSOFIA DA MEDICINA | Manuel Sérgio, PhD – Lisboa | FISIATRIA | Páscoa Pinheiro, PhD – Coimbra – Faculdade de Medicina de Coimbra | FISIATRIA/HIDROLOGIA CLÍNICA | Pedro Cantista PhD – Porto – Centro Hospitlar do Porto | FISIOLOGIA | Gomes Pereira, PhD – Lisboa – Faculdade de Motricidade Humana | José Alberto Duarte, PhD – Porto – Faculdade de Desporto do Porto | GASTRENTEROLOGISTA E HEPATOLOGISTA | Rui Tato Marinho, PhD – Lisboa – Faculdade de Medicina de Lisboa | IMUNOALERGOLOGIA | André Moreira, PhD – Porto – Hospital de S. João | MEDICINA DESPORTIVA | J. L. Themudo Barata, PhD – Covilhã – Universidade Beira Interior | João Paulo de Almeida, PhD – Lisboa | Luís Horta, PhD – Lisboa – Hospital Curry Cabral | Maria João Cascais, PhD – Lisboa – Nova Faculty of Lisbon | MEDICINA INTERNA | Teixeira Veríssimo, PhD – Coimbra – Faculdade de Medicina de Coimbra | NUTRIÇÃO | Vitor Hugo Teixeira, PhD – Porto – Faculdade de Ciências da Nutrição | ORTOPEDIA | Fernando Fonseca, PhD – Coimbra – Faculdade de Medicina de Coimbra | João Espregueira-Mendes, PhD – Universidade do Minho; Director Clínico da Clínica do Dragão – Universidade do Minho | João Gamelas, PhD – Lisboa – Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa | José Carlos Noronha, PhD – Porto – FPF; Ordem da Trindade | Leandro Massada, PhD – Porto – Centro de Medicina Desportiva do Porto | PEDIATRIA | Carla Rêgo, PhD – Porto – Instituto CUF Porto. Faculdade de Medicina da UP. | PNEUMOLOGIA | Robalo Cordeiro, PhD – Coimbra – Faculdade de Medicina de Coimbra | PSICOLOGIA | Sidónio Serpa, PhD – Lisboa – Faculdade de Motricidade Humana | REUMATOLOGIA | Carlos Vaz, PhD – Porto – Hospital de S. João. | COMISSÃO DE COLABORADORES: FISIATRIA | Gonçalo Borges, Dr – Porto – Hospital da Prelada | Jorge Lains, Dr – Coimbra – Hospital Rovisco Pais | Pedro Lemos Pereira, Dr – Coimbra – Hospital Universitário de Coimbra | Raul Maia e Silva, Dr – Porto | MEDICINA DESPORTIVA | Domingos Gomes, Dr – Porto – CESPU | João Beckert, PhD – Lisboa – Centro de Medicina Desportiva de Lisboa | José Ramos, Dr – Porto – Clinica de Gondomar | Nelson Puga, Dr – Porto – Futebol Clube do Porto | Paulo Beckert, Dr – Lisboa – FPF – Clínica Cuf Alvalade | Pedro Saraiva, Dr – Coimbra – Associação Académica de Coimbra | MEDICINA GERAL E FAMILIAR | José Maria Henriques, Dr – Vila Nova de Gaia – Unidade de Saúde Familiar de Santa Marinha | MEDICINA INTERNA | Jorge Ruivo, Dr –Lisboa – Hospital de Santa Maria | ORTOPEDIA | Diogo Moura, Dr – Coimbra – HUC | Hélder Pereira, Dr – Vila do Conde – Hospital da Póvoa do Varzim | Henrique Jones, Dr – Setúbal – Clínica Dr. Henrique Jones | José Lourenço, Dr. – Porto | Paulo Amado, Dr – Rio Tinto – Hospital Lusídas Porto | Pereira de Castro, Dr – Lisboa – SPAT; Desporsano, Clínica de Desporto | RADIOLOGIA | Joaquim Agostinho, Dr – Viseu – Hospital São Teotónio

FICHA TÉCNICA | Diretor e Editor BASIL VALENTE RIBEIRO | Diretor adjunto PEDRO LEMOS PEREIRA | Sub-diretor JOSÉ RAMOS | Editor adjunto HENRIQUE JONES | Produção REVDESPORTIVA,LDA | Design e Paginação JOSÉ TEIXEIRA | Fotografia da capa: Federação Portuguesa de Canoagem | Impressão MULTITEMA – Porto | Propriedade REVDESPORTIVA, LDA. Rua do Sobreiro 225, Canidelo 4400-590 V N Gaia. | Telefone/Fax – 227810869 | E-mail: [email protected] | www.revdesportiva.pt | Periodicidade Bimestral | Tiragem 6000 exemplares | Depósito Legal 304182/09 | ISSN 1647-5534 | Publicação Registada no Instituto da Comunicação Social sob o n.º 125758 | A reprodução parcial ou integral de texto ou ilustrações da Revista de Medicina Desportiva Informa é proibida.

A Revista de Medicina Desportiva informa é uma publicação de âmbito nacional, de publicação bimestral e de caráter médico-científico. Tem como objetivo divulgar conteúdos médico-des-portivos através de temas de revisão e de investigação, assim como publicar “Casos Clínicos” relacionados com a prática da Medicina Desportiva. Divulga ainda reuniões científicas reali-zados em Portugal e no estrangeiro. Esta Revista respeita a Constituição Portuguesa e orienta-se por critérios de isenção e de rigor científico, compromisso ético e respeito deontológico.

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2 Setembro 2017 www.revdesportiva.pt

Rev. Medicina Desportiva informa, 2017, 8 (4), p. 2En

trev

ista

José LuísMassagista do F C Porto

Entrou no F C Porto em 1953!… Ainda se lembra? Como chegou ao clube?

Sim, lembro-me. Um funcio-nário do clube foi para a tropa e eu entrei a substituí-lo para transportar num triciclo os equipamentos dos jogadores do Campo da Rua da Constituição para a lavandaria no Estádio das Antas.

Nessa altura o massagista e a massagem eram elementos determinantes no tratamento do jogador…

Antigamente era o que havia!... além disso tínhamos o “forno” com lâm-padas de carvão e um aparelho de ultrassons, por isso a massagem era sempre utilizada e fundamental.

Mas, entretanto, o tratamento do jogador mudou muito. O que gostaria de realçar?

(Sorrisos…e mãos na cara) Mudou tudo!... e para melhor. Mas já naquela época tínhamos um depar-tamento moderno onde já se incluía, no antigo estádio das Antas, um apa-relho de Rx e um dentista com todo o material necessário.

A TAC e a RMN são recentes. Fazer o diagnóstico de uma lesão há 30-40 anos era certamente muito difícil, não era?

Com o Dr. Sousa Nunes utilizávamos muito o Rx e as fraturas eram logo diagnosticadas e tratadas no nosso

Departamento. Hoje em dia é muito mais fácil diagnosticar as lesões!

Os suplementos alimentares acompanham o atleta atual. Como era antigamente, o que tomavam mais?

Sim, mas na altura, e em especial no ciclismo (fiz 15 voltas a Portugal e três voltas à Espanha), eu já era o responsável pela alimentação, for-necia-lhes grandes quantidades de massa com um bife de 300 gramas. Durante as corridas preparava sacos de fruta cristalizada, bem como a fruta da época. Preparava ainda as bebidas com algumas vitaminas já existentes na época, em particular a vitamina C.

P.f., conte uma ou duas histórias engraçadas ocorridas ao longo desta já longa carreira.

Uma delas passou-se com o Juary! Tinha como hábito, sempre que me cumprimentava diariamente, dar-me um beijo na orelha… Um dia, e por-que já estava à espera desse beijo, coloquei Finalgon (que arde muito) na minha orelha, ele caiu que nem um patinho, ficou com os lábios a arder e até hoje nunca mais brincou dessa forma (largos sorrisos).

Um dia, numa competição inter-nacional, o José Mourinho pediu-me para dar o grito no balneário antes de entrarmos em campo. Estávamos em Lens, mas naquele dia esqueci--me do nome da localidade onde estávamos e disse: “estamos aqui em Paris de França…” Claro que isto provocou grandes gargalhadas e depois o Deco perguntou-me:

"Então, Zé...? Em Paris de França?" A minha resposta foi: “Que queres? Apagaram-se-me as velas…”. A boa disposição foi geral, os jogadores e o staff entraram em campo a rir e, no final, ganhámos mais uma elimina-tória num trajeto que só parou em Sevilha com a conquista da Taça UEFA.

Como conciliou a vida profissional com a vida familiar?

Foi difícil! A minha mulher é que sofreu e foi a vítima! Eu passava muitos períodos fora de casa, por vezes 15 dias seguidos, sobretudo nas corridas de ciclismo. Mas mesmo no futebol tive ocupação diária, incluindo os fins-de-semana para prestar apoio nos jogos de diversas modalidades. Tinha pouco tempo para a família. Às vezes, durante as férias, a minha mulher ia sozinha para o campismo com os meus filhos. Apesar de tudo isso, consegui dar-lhes educação e formá--los a todos, agora estão indepen-dentes e, felizmente, bem na vida.

Está há 64 anos no clube e com 83 anos de idade. Quantos anos mais pensa lá continuar?

Não sei, mas espero andar por cá enquanto mantiver esta mentali-dade, me sentir útil e tiver prazer em servir este grande clube, que é a minha família, e enquanto Deus me der saúde.

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Revista de Medicina Desportiva informa Setembro 2017 · 3

Comentário a artigo do Journal of Medicine & Science in Sports & ExerciseSedentary Behavior, Cadence and Physical Activity Outcomes after Knee Arthroplasty1

Este artigo, publicado em 2017 na revista oficial do American College of Sports Medicine, e escrito por Sandra Webber, investigadora do College of Rehabilitation Sciences da Universidade de Manitoba, Canadá, compara os padrões de sedenta-rismo e atividade física de pacientes com artrose avançada do joelho, com os de aqueles submetidos a artroplastia total do joelho há apro-ximadamente um ano, concluindo que, embora os doentes refiram menos dor e apresentem melhor função após a cirurgia, o seu com-portamento sedentário não se altera, deixando-os em risco aumentado de virem a sofrer de obesidade, diabetes e doença cardiovascular.

Com efeito, a alta prevalência da gonartrose no idoso e a incapacidade que esta habitualmente condiciona, faz do joelho a articulação mais vezes submetida a artroplastia total. Este procedimento resulta habi-tualmente numa melhoria clinica

significativa. No entanto, alguns trabalhos recentes2,3,4 têm chamado a atenção para a inexistência de melhoria significativa do nível de atividade física destes doentes, nomeadamente quando compa-rado com a população em geral do mesmo grupo etário.

Estão descritas variadas formas de quantificação dos níveis de atividade física e comportamento sedentário através de processos de autoava-liação e mesmo de monitorização objetiva da atividade, com recurso a instrumentação especial, como os acelerómetros e pedómetros.

Neste trabalho, os autores coloca-ram em prática um estudo, no qual uma amostra de participantes foi recrutada via telefone da lista de espera para cirurgia de artroplastia total do joelho (n=40) e outra da lista de doentes já operados há cerca de um ano (n=40). Como condições necessárias para participar definiram a inexistência de antecedentes de outra artroplastia e a manutenção de capacidade de marcha durante pelo menos três minutos. Os participantes foram avaliados através do questio-nário LASA (Longitudinal Aging Study Amsterdam) sobre o comportamento sedentário, de medições e da pesa-gem, para avaliação do índice de massa corporal, perímetro abdomi-nal, etc., e através da monitorização da sua atividade física com recurso aos instrumentos acima citados.

Os resultados, após análise estatís-tica, revelaram não existirem diferen-ças significativas no comportamento sedentário entre o grupo de doentes em lista de espera e aquele operado há um ano. Além disso, ambos os

grupos revelaram, nos parâmetros de atividade física avaliados, resultados inferiores aos da população em geral, o que representa sem dúvida um achado importante.

Podemos encontrar algumas limi-tações neste estudo, como a hetero-geneidade dos participantes, o seu reduzido número ou a tendência que poderá existir no grupo pré-cirurgia para subestimar o tempo de seden-tarismo ou sobrestimar o nível de atividade. No entanto, existe uma certa consistência nos resultados obtidos, visto que não se afastam significativamente dos obtidos por outros autores, em avaliações destes parâmetros efetuados em doentes afetados por artrose do joelho.

Aparentemente, este artigo não coloca em causa a utilidade da artroplastia total do joelho no trata-mento da gonartrose avançada, quer em termos de alívio da dor, quer em melhoria da função do joelho. Em minha opinião, as lições a tirar da sua leitura centram-se na neces-sidade de adotar estratégias, no período peri-operatório, para induzir alterações no estilo de vida dos doentes de forma a retirar o máximo benefício da cirurgia a que foram submetidos, diminuindo os níveis de sedentarismo, melhorando a sua qualidade geral de vida e atuando especificamente na prevenção da doença cardiovascular. Essas estraté-gias poderão passar por campanhas de sensibilização da população em geral para a prática de exercício físico ou programas de informação com folhetos ou palestras multi-disciplinares de esclarecimento a efetuar antes da cirurgia.

Prof. Doutor Manuel GutierresProfessor de Ortopedia da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto

O que andamos a ler

Prof. Doutor Ovídio CostaCardiologista. Faculdade de Medicina do Porto

Nesta rúbrica pretendemos dar notícia de artigos recentes ou que merecem ser (re)lidos e comentados. Será uma página aberta a todos os colegas que pretendam colaborar descrevendo ou comentando temas de medicina desportiva.

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4 Setembro 2017 www.revdesportiva.pt

associada ao exercício nos fenóme-nos de alteração da permeabilidade, motilidade e absorção.

Estudos previamente publicados avançaram com dados relativos à incidência de sintomas digestivos associados ao exercício. No traba-lho de Worobetz LJ2 (produzido em inquérito perante uma prova euro-peia de atletismo) revelou uma pre-valência de 81% de sintomas diges-tivos entre os atletas. Um estudo mais recente baseado em inquérito a ultramaratonistas, publicado por Stuempfle KJ, documentou uma prevalência de 96% (a mais elevada entre os dados publicados).3 Estes dados sugerem uma possível relação entre a intensidade/duração do exer-cício e os efeitos clínicos no sistema digestivo. Este é um dos aspetos fun-damentais abordados nesta revisão, ao contrário de trabalhos prévios de revisão focados na orientação clínica dos atletas com patologia digestiva4,5.

De acordo com o trabalho, a “sín-drome gastrointestinal” associado ao exercício físico pode ser subdividido nas suas manifestações em duas vias: alteração da resposta circulató-ria/vascular (e consequente aumento da suscetibilidade a isquemia) e nas respostas neuroendócrinas (com hiperestimulação do sistema nervoso simpático). Os fenómenos isquémi-cos são mediados maioritariamente pela diminuição do fluxo sanguíneo mesentérico induzida por hiperati-vação simpática e redução do óxido nítrico. Tal culmina no aumento da permeabilidade instestinal (com endotoxinemia e diminuição da capacidade absortivas), na expressão de mediadores pro-inflamatórios (pela ativação da expressão do gene de NF-kB) e na alteração do trânsito gastrointestinal (orocecal e gastro-duodenal). A identificação da media-ção molecular permite inferir novos biomarcadores capazes de otimizar o diagnóstico. Perante sintomas com provável origem cólica, o doseamento da calprotectina fecal e a pesquisa de sangue oculto podem ser capazes de identificar alterações inflamatórias / isquémicas decorrentes do exer-cício, conforme sugerido em alguns estudos (de forma pouco robusta). Tratam-se de ferramentas comu-mente usadas na pratica clínica em outros contextos (p.e. no seguimento da doença inflamatória do intestino

- DII). No entanto, denota-se a sua baixa especificidade, com neces-sidade de investigação de outros biomarcadores específicos do epitélio intestinal para esta situação clínica.

A “síndrome gastrointestinal” poderá ter efeitos deletérios mais acentuados em doentes com antece-dentes de patologia gastrenterológica. Estudos prévios descrevem a preva-lência de atividade física nos doentes com doença de Crohn apenas entre os 30-42%.6 A atividade física de alta competição/alta intensidade muitas vezes encontra-se limitada pelos sintomas da doença (como artralgias ou fadiga). Se por um lado, os indiví-duos com DII têm um maior risco de desenvolvimento de endotoxinemia clinicamente significativa durante a atividade física, vários são os traba-lhos que destacam a importância da atividade física regular no controlo de sintomas. Destaca-se o recente trabalho de Lykouras, D. que demons-tra similaridade de função cardio-pulmonar durante o exercício entre dois grupos de doentes: com doença clinicamente ativa ou clinicamente inativa.7 Dados os benefícios prova-dos do exercício moderado no con-trolo de sintomatologia na DII, estes pacientes devem ser impulsionados a manter atividade física regular.

Bibliografia

5. Costa RJS, Snipe RMJ, Kitic CM, et al. Syste-matic review: exercise-induced gastrointestinal syndrome-implications for health and intestinal disease. Aliment Pharmacol Ther 2017; 46:246-265.

6. Worobetz LJ, Gerrard DF. Gastrointestinal symptoms during exercise in Enduro athletes: prevalence and speculations on the aetiology. N Z Med J 1985; 98:644-6.

7. Stuempfle KJ, Hoffman MD. Gastrointestinal distress is common during a 161-km ultrama-rathon. J Sports Sci. 2015; 33(17):1814-21.

8. Paluska SA. Current concepts: recognition and management of common activity-related gastrointestinal disorders. Phys Sportsmed 2009; 37:54-63.

9. Casey E, Mistry DJ, MacKnight JM. Training room management of medical conditions: sports gastroenterology. Clin Sports Med 2005; 24:525-40, viii.

10. Rawsthorne P, Shanahan F, Cronin NC, et al. An international survey of the use and attitudes regarding alternative medicine by patients with inflammatory bowel disease. Am J Gastroenterol 1999; 94:1298-303.

11. Lykouras D. Physical Exercise in Patients With Infammatory Bowel Disease. Journal of Crohn’s and Colitis 2017; 11(8):1024.

Para além do médico especialista de ortopedia, um papel importante fica assim também reservado aos profissionais de saúde da área da reabilitação (fisiatras, fisioterapeutas, enfermeiros e mesmo treinadores pessoais) que, pela relação próxima que também podem desenvolver com o doente, estão numa posição privilegiada para adotarem estraté-gias de intervenção, no sentido de o estimularem e motivarem para a prática de exercício físico regular.

Bibliografia

1. WEBBER, S. C., S. M. STRACHAN, and N. S. PACHU. Sedentary Behavior, Cadence, and Physical Activity Outcomes after Knee Arthro-plasty. Med. Sci. Sports Exerc. 2017; 49(6): 1057–1065.

2. Arnold JB, Walters JL, Ferrar KE. Does phy-sical activity increase after total hip or knee arthroplasty for osteoarthritis? A systematic review. J Orthop Sports Phys Ther. 2016; 46(6):431–42.

3. Kahn TL, Schwarzkopf R. Does total knee arthroplasty affect physical activity levels? Data from the osteoarthritis initiative. J Arthroplasty. 2015; 30(9):1521–5.

4. Paxton RJ, Melanson EL, Stevens-Lapsley JE, Christiansen CL. Physical activity after total knee arthroplasty: a critical review. World J Orthop. 2015; 6(8):614–22.

Prof. Doutor Guilherme MacedoDiretor do Serviço de Gastrenterologia do Centro Hospitalar S. João; Professor da Faculdade de Medicina do Porto

“Síndrome gastrointestinal” induzido pelo exercício: a propósito de uma recente revisão sistemática

Recentemente foi feita revisão sobre os aspetos fisiopatológicos e a cor-respondente relevância clínica dos sinais e sintomas gastrointestinais associados à prática do exercício físico.1 Baseado na revisão da litera-tura publicada, o artigo foca-se no impacto da lesão do trato digestivo

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Revista de Medicina Desportiva informa Setembro 2017 · 5

Tem

a 1 Cãibras Musculares

Associadas ao Exercício: Etiologia, Prevenção e TratamentoDra. Carla Soares1, Dra. Joana Soares2, Dra. Beatriz Leite da Cunha1

1Interna de Formação Específica em Medicina Geral e Familiar na USF São Vicente, ACES Tâmega II, 2Licenciada em Ciências da Nutrição, Faculdade de Ciências da Nutrição da Universidade do Porto

RESUMO / ABSTRACTAs Cãibras Musculares Associadas ao Exercício (CMAE) são uma das principais queixas entre atletas durante a prática de exercício físico e um dos problemas mais comuns a requerer cuidados médicos. Várias teorias têm sido propostas para a origem das CMAE, mas o seu mecanismo continua pouco claro. Os objetivos desta revisão são descrever as atuais evidências científicas na base das diferentes teorias das CMAE e definir a melhor abordagem em termos de prevenção e tratamento.

Exercise-Associated Muscle Cramps (EAMC) are one of the most common complains among athletes during exercise and frequently require medical care. Many theories have been discussed but the aeti-ology is still unclear. The aim of this review is to summarize the evidence regarding EAMC aetiology, prevention and treatment.

PALAVRAS-CHAVE / KEYWORDSCãibras musculares, exercício físicoMuscle cramps, Physical exercise

Rev. Medicina Desportiva informa, 2017, 8 (5), pp. 5–7

Introdução

As cãibras musculares apresentam-se como uma das queixas médicas mais comuns, sendo que a maioria das pessoas refere já as ter experienciado, pelo menos uma vez ao longo da sua vida.1 Define-se cãibra muscu-lar como uma contração muscular súbita, localizada, involuntária e dolo-rosa, passível de ocorrer em qualquer músculo corporal, e na qual é visível e palpável a contração de parte ou da totalidade dos músculos afetados.2,3 Podem surgir na sequência de uma variedade de fatores, porém, nesta revisão apenas serão abordadas as cãibras musculares associadas ao exercício, uma vez que apesar da sua elevada prevalência ainda pouco se sabe sobre a sua etiologia.4

Cãibras musculares associadas ao exercício

As CMAE ocorrem durante ou imediatamente após o exercício físico.3 Este é um dos problemas mais comuns que afetam os atletas,

necessitando por isso de atenção médica.4 Vários estudos demonstram que esta problemática se estende a praticamente todas as modalidades, com especial prevalência em pro-vas de endurance, como maratonas e triatlo4-6, e que afetam preferen-cialmente os músculos dos pés e gas-trocnémios, seguidos dos músculos isquiotibiais e quadricípite.3

Fatores predisponentes

Os principais fatores de risco de CMAE são a idade avançada, o ele-vado índice de massa corporal (IMC), maus hábitos de alongamentos nos momentos peri-exercício, história familiar de cãibras e condições pre-judiciais do treino/competição, como o condicionamento físico inade-quado, a alta intensidade e a longa duração dos exercícios.3,5,7

Etiologia

Várias teorias foram descritas para a origem de CMAE. Atualmente

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6 Setembro 2017 www.revdesportiva.pt

considera-se que têm na sua génese uma “tríade” fatorial: desidratação, desequilíbrio eletrolítico e fadiga neuromuscular.4,5,8,9 As duas pri-meiras teorias são as mais antigas e surgiram da necessidade de explicar a ocorrência de CMAE em indiví-duos que trabalhavam sob elevadas temperaturas, como os mineiros. O aumento da temperatura corporal, acompanhado pela sudorese exces-siva, leva a uma contínua contração do compartimento de fluido extrace-lular, aumentando assim a pressão mecânica nos terminais nervosos e a concentração de neuroquímicos excitatórios no interstício, pro-vocando cãibras.8,10,11 Contudo, a desidratação, por si só, não é sufi-ciente para causar CMAE, surgindo a associação a uma das teorias mais comummente difundidas pela comunidade científica: a depleção eletrolítica. Segundo esta teoria, na origem das CMAE está a diminuição da concentração sérica de eletró-litos, como o magnésio, potássio, sódio e cloro.7,9 Com o desenvolvi-mento do trabalho científico neste campo, depressa se percebeu que não existiam diferenças entre as concentrações séricas da maioria dos eletrólitos no final do exercício comparativamente ao início, entre os grupos de atletas que sentiram CMAE durante o exercício e os grupos controlo que não sentiram qualquer cãibra.7,9 Vários resultados levaram à conclusão de que apenas o sódio e, mais tarde, também o potássio, estariam de facto envolvi-dos na fisiopatologia das CMAE.8,10

Ainda em busca do pleno escla-recimento quanto à etiologia desta problemática, surge mais tarde uma nova hipótese, a qual sugere que as alterações no controlo neuromuscu-lar a nível da medula espinhal, resul-tantes da fadiga muscular, podem

ser o principal fator associado ao desenvolvimento de CMAE.8,10,11 Ao contrário das anteriores, esta teoria associa-se às características e condições do exercício reali-zado e à condição física do atleta. Em concordância,

um estudo realizado por Schwellnus et al12 comparou as concentrações séricas de eletrólitos e o peso corpo-ral de 210 triatletas a competirem no triatlo Ironman, antes e depois da competição, e com distinção entre os 43 atletas que relataram CMAE no momento da prova e os restantes que não relataram. Os resultados, que demonstraram não existirem diferenças significativas entre estes dois momentos e entre os dois grupos de atletas, adicionam força à evidência de que a desidratação e o balanço de eletrólito sérico alterado não são causas de CMAE.12 Em vez disso, estão em risco de sofrer CMAE atletas de resistência que compitam a um ritmo acelerado, realizando um trabalho muscular muito intenso.12

As evidências científicas que fundamentam as teorias da desi-dratação e a depleção de eletrólitos surgem comummente de observa-ções clínicas infundadas e que não oferecem mecanismos fisiopato-lógicos plausíveis.4 Por sua vez, as evidências científicas na base da hipótese de fadiga neuromuscular baseiam-se em estudos realizados em modelos humanos de cãibras musculares, estudos epidemiológi-cos em atletas com cãibras e dados experimentais em animais, tendo por isso maior validade científica. Embora seja claro que mais evidên-cias serão necessárias para apoiar esta teoria, os dados das pesquisas mais atuais apresentam-na como o principal mecanismo fisiopatológico para a etiologia das CMAE.4,8,10,11

Prevenção e tratamento

Por se tratar de uma condição dolorosa e temporariamente incapa-citante para o atleta, tanto a preven-ção como o tratamento se revelam de extrema importância.13 O maior esclarecimento quanto às causas

das CMAE permitirá à comunidade médica e científica a elaboração de recomendações mais específicas e efetivas.13 Até lá, é crucial ter em consideração que uma prevenção eficaz das CMAE passa, inevita-velmente, pelo controlo dos seus fatores de risco.11

As CMAE surgem, habitualmente, nos grupos musculares mais recru-tados durante o exercício, por sobrecarga ou cansaço extremo.14 Assim, como medida preventiva, é determinante que seja feito um condicionamento físico adequado do atleta antes de provas ou treinos mais intensos, e que a introdução de novos exercícios ou modifica-ções mecânicas seja gradual.5,7,14 Ajustes à configuração e seleção do equipamento (por exemplo, assento de bicicleta, posição do punho, calçado), biomecânica e técnicas de relaxamento também podem ajudar a evitar ou atrasar CMAE.14 A manutenção de um correto estado de hidratação e equilíbrio de sódio sérico é outra das estratégias com-provadas para evitar cãibras durante o exercício.5,14 Idealmente, as perdas de sódio e água pela transpiração devem ser suficientemente compen-sadas durante a atividade para evi-tar défices mensuráveis .5 Em casos específicos, como atletas com uma sudorese mais intensa (por exemplo, superior 2,5L e 2500mg de Na+ por hora) ou um aporte sódico inferior ao habitual na sua ingestão diária, a ingestão das bebidas energéticas comerciais ou o aporte sódico obtido pelas refeições não é suficiente.14 Deve ser calculado individualmente o teor de sódio a acrescentar às solu-ções ingeridas, para que a reposição seja o mais completa possível.14 Atualmente é recomendada a adição de 0,3 a 0,7 g/L de sal às bebidas ingeridas pelos atletas de forma a prevenir CMAE, podendo esta recomendação subir até às 6 g/L nos atletas de elevado risco.10,11

Ao primeiro sinal de CMAE, o atleta deve alongar passivamente o grupo muscular afetado6,7,9,14 e tomar de imediato uma solução com alto teor de sal (por exemplo, 0,5L de uma bebida energética, com 3,0gr de sal adicionado, consumido de uma só vez ou ao longo de 5-10 minutos), uma vez que tem comprovada eficá-cia no alívio destas cãibras e impede

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que evoluam para uma condição mais grave e debilitante.14 Massa-gem, contração ativa do grupo mus-cular antagonista e/ou colocação de gelo no(s) músculo(s) afetado(s) têm também sido aceites pela comuni-dade científica como estratégias váli-das para tratamento das cãibras.14 Revertida esta condição, os atletas podem, habitualmente, retomar de imediato o treino ou a competição de forma eficaz, sem cãibras muscu-lares ou sintomas de contração.14 A continuação da atividade na mesma intensidade provavelmente não seria possível se a sobrecarga muscular ou fadiga fosse o único ou princi-pal fator contribuinte para a cãibra muscular, ressalvando o importante papel da reidratação e reposição dos níveis de sódio sérico.12

Após o exercício, é necessário repor os restantes défices de água corporal e de eletrólitos, com particular ênfase na ingestão de sal, de modo a ajudar a reter e distribuir o fluido ingerido, para que que todos os comparti-mentos de fluidos sejam convenien-temente restaurados. A reidratação intravenosa com solução salina nor-mal ou hipertónica pode ser necessá-ria se a CMAE for grave ou acompa-nhada de uma condição clínica mais grave, como a hiponatrémia.14

Os suplementos ricos em potássio, alimentos ou outros suplementos minerais, como cálcio, não são indi-cados e normalmente não fornecem qualquer alívio dos sintomas.14,15

Quanto a tratamentos farmaco-lógicos, há evidências comprovadas da efetividade da quinina no trata-mento de CMAE.16 Contudo, trata-se de um agente com diversos efeitos adversos associados, pelo que só deve ser prescrito quando se trata de cãibras extremamente debilitantes e após o atleta ser informado destas condições.16

Perante o surgimento de CMAE, o médico ou profissional de saúde que acompanhe o atleta deve, para além de considerar os sinais e sintomas clínicos e o tempo e circunstâncias que levaram ao surgimento das cãibras, fazer um estudo da história familiar de cãibras, tentando detetar uma eventual predisposição para esta condição, o que lhe permitirá adequar de uma forma mais espe-cífica e individualizada as medidas preventivas.9,14

Conclusão

Os estudos que relacionam a ocor-rência de CMAE e o desequilíbrio eletrolítico provocado pela prática de exercício físico têm-se mostrado, até aos dias de hoje, inconclusivos e de pouca utilidade.2 A validação desta teoria passa, inevitavelmente, pela medição das concentrações séricas de sódio e potássio após o exercício em atletas com e sem CMAE. Porém, resultados díspares não nos permi-tem concluir quanto à existência de eventuais diferenças estatistica-mente significativas entre grupos de atletas e quanto à magnitude de impacto dessas diferenças. Não há, portanto, estudos com evidência que nos permita utilizar, com segurança, esta teoria como medida de diagnós-tico, nem que nos forneçam indica-ções práticas e concretas de como agir perante CMAE.2

A teoria da fadiga neuromuscu-lar, apesar de não completamente esclarecida e de carecer de maior comprovação científica, apresenta evidências de maior validade.4,8,10,11

A abordagem mais coerente até hoje encontrada passa por evitar a fadiga muscular prematura.17

A falta de consenso quanto às teorias descritas para a origem das CMAE dá origem a diferentes abordagens para esta problemática. Até que novas pesquisas sejam realizadas e forneçam um maior esclarecimento sobre este tema, as recomendações, tal como descritas anteriormente, devem ser baseadas numa complementação das diferen-tes teorias.14

Os autores declaram não haver conflitos de interesses.

CorrespondênciaCarla [email protected]

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8 Setembro 2017 www.revdesportiva.pt

Lesão Muscular no Futebolista – A Propósito de Dois Casos ClínicosDr. Nuno Loureiro1,4,5, Dr. Diogo Gomes2,5, Dr. Carlos Sales3,4,5, Dr. Rui Dias3,5

1Médico Especialista em Medicina Desportiva e Medicina Física e de Reabilitação; 2Interno de Formação Específica de Medicina Física e de Reabilitação – Hospital de Braga; 3Fisioterapeuta; 4Clinica do Dragão Espregueira Mendes Sports Centre – FIFA Medical Centre of Excellence; 5Departamento Médico F C Paços Ferreira.

Cas

o cl

ínic

oRev. Medicina Desportiva informa, 2017, 8 (4), pp. 8–9

Introdução

A lesão muscular representa o tipo de lesão com maior inci-dência no futebol (cerca de 45% no total), ocorrendo geralmente por mecanismo indireto1 e afetando maioritariamente

quatro músculos – bicípite femoral, reto femoral, adutor longo e gémeo interno.1-4 Destes, o mais frequen-temente afetado é o bíceps femo-ral1,2,4-6, nomeadamente a sua cabeça longa, um músculo pertencente ao grupo muscular dos isquiotibiais e com características particulares: biarticulado, duas porções (cabeça longa e cabeça curta), dupla inerva-ção, predomínio de fibras musculares tipo II e com função extremamente importante na desaceleração excên-trica da extensão do joelho durante a fase de balanço da marcha/corrida.5,6

As lesões musculares dos isquioti-biais terão pior prognóstico quando envolverem o bicípite femoral,4 forem mais proximais e com mecanismo de lesão por estiramento, com determi-nado tipo de atingimento muscular2,7 (intratendinoso > miotendinoso > intramuscular > miofascial) e tanto pior quanto maior o número de dias que o atleta apresente dor / descon-forto na marcha com claudicação associada.5 As lesões musculares que afetam outros músculos são raras e geralmente não causam limitação funcional relevante.1

Apesar de muito frequentes e bas-tantes estudadas, alguns comporta-mentos da evolução desta patologia são ainda incompreendidos, onde em grande medida a individualidade de cada atleta deve ser considerada. Dos múltiplos fatores que contribuem para o seu aparecimento (fatores de risco) destaca-se a metodologia

inadequada de treino, a lesão muscu-lar prévia, a idade e os desequilíbrios musculares relevantes.3,5,6,8

Relativamente à classificação deste tipo de lesões, de referir que o modelo convencional (Grau I, Grau II e Grau III) nos parece desatuali-zado.7,9 A que nos parece ser mais completa (sem necessariamente o ser) e que nos consegue dar mais alguns parâmetros que ajudam no prognóstico é a classificação de Pollock et al (British Athletics Muscle Injury Classification), a qual classi-fica as lesões musculares baseado em achados de ressonância magné-tica e de acordo com o tamanho e localização da lesão dentro do mús-culo (intratendinoso, miotendinoso, intramuscular e miofascial).2,7

Quanto à sua forma de trata-mento, deve seguir-se um padrão individualizado, respeitando o processo de cicatrização e as suas 3 fases (inflamatória, proliferativa e maturação), devendo a progressão e a integração do atleta em treino / jogo ser baseada em critérios objeti-vos (clínicos, imagiológicos, fun-cionais e com uma boa gestão das cargas físicas pré-treino/treino).4,5,8

Apresentamos de seguida dois casos clínicos sobre lesões muscula-res, com atingimento do mesmo músculo, ambas no seu terço distal, no membro não dominante e com comportamentos clínicos distintos.

Caso clínico 1

• Atleta profissional de Futebol (Clube 1.ª Liga Portuguesa)

• Idade: 26 anos

• Posição no campo: defesa lateral• Membro dominante: esquerdo• Antecedentes relevantes: lesão

miotendinosa proximal no bicí-pite femoral (cabeça longa) direito quatro meses antes do apareci-mento deste episódio.

• Anamnese: Dor de aparecimento súbito na face póstero-lateral da coxa direita durante sprint, no aquecimento de jogo oficial. Par-ticipou em 90 minutos desse jogo, apenas com ligeiro desconforto local nas acelerações máximas.

• Objetivamente (às 48h após lesão) com dor moderada (EVA: 5) na palpação e alongamento (EVA: 2) dos isquiotibiais.

• Ecografia músculo-esquelética (às 48h após lesão) (fig.1): Lesão mus-cular miofascial no 1/3 distal da cabeça longa do bicípite femoral, com hiato de rotura de cerca de 1,2cm, edema perilesional que se estendia longitudinalmente por cerca de 4cm e seroma associado de 2cm a dissecar a cabeça longa da curta do bicípite femoral.

Pausa desportiva: três dias.

Nota: Desde a paragem desportiva sempre disponível para treino / jojo e sem queixas álgicas musculares relevantes (EVA: 0).

Caso clínico 2

• Atleta profissional de Futebol (Clube 1.ª Liga Portuguesa)

• Idade: 27 anos• Posição no campo: defesa central• Membro dominante: direito• Antecedentes relevantes: lesão

miofascial proximal no bicípite femoral (cabeça longa) esquerdo quatro meses antes do apareci-mento deste episódio.

Figura 1

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Revista de Medicina Desportiva informa Setembro 2017 · 9

• Anamnese: Dor de aparecimento súbito na face póstero-lateral da coxa esquerda durante sprint, aos 15 minutos de jogo oficial. Parti-cipou em 90 minutos desse jogo com desconforto local nas acelera-ções máximas e alongamento dos isquiotibiais à esquerda.

• Objetivamente (às 48h após lesão) com dor moderada (EVA:5) na palpação, alongamento (EVA: 4) e contração resistida (EVA:4) dos isquiotibiais.

• Ecografia músculo-esquelética (às 48h após lesão) (fig.2): Lesão mus-cular miotendinosa no 1/3 distal da cabeça longa do bicípite femo-ral, com hiato de rotura de cerca de 0,4cm e edema perilesional que se estende longitudinalmente por cerca de 3cm.

Objetivamente (ao 5.º dia pós-lesão) com dor ligeira na palpação e con-tração resistida (EVA: 2).Pausa desportiva: 10 dias.

Nota: Desde a paragem desportiva sempre disponível para treino/Jogo e sem queixas álgicas musculares relevantes (EVA: 0).

Discussão / Conclusão

De facto, estes dois casos clínicos revelam bem quanto o comporta-mento das lesões musculares é mul-tifatorial. Se por um lado temos duas lesões no mesmo músculo, ambas no 1/3 distal, em coxas não dominantes, em atletas da mesma idade, com a lesão a ocorrer em contexto de jogo, com o mesmo médico e fisiotera-peuta a fazerem o acompanhamento das lesões, também é verdade que o facto de os atletas terem perso-nalidades diferentes, tipos de lesão

diferentes (miotendinosa vs miofas-cial) condiciona o prognóstico e a disponibilidade para o treino / jogo.

O caso clínico número 1, pelas dimensões da lesão (hiato com 1,5cm), com complicação associada (seroma), poderia levar a maior preo-cupação. No entanto, sabemos que este tipo de lesão tem bom prognós-tico, em função das queixas álgicas do atleta, necessitando somente de vigilância clínica e imagiológica.

Quanto ao caso clínico número 2, apesar de ser uma lesão minor, com um hiato de 0,4cm, mas tratando-se de uma lesão miotendinosa pode, de facto, dar maior sintomatologia e ser mais incapacitante do que a lesão do caso 1, mas também não é mentira e a nossa experiência assim o comprova que vários atletas com lesões deste tipo conseguem treinar/jogar ininterruptamente. O facto de ser uma lesão no 1/3 distal da cabeça longa do bicípite femoral confere um melhor prognóstico em comparação com uma lesão mais proximal. Nestes dois casos o que na realidade aconteceu (e tal como seria de esperar) foi a disponibilidade a curto prazo para o atleta com a lesão miofascial e o maior tempo de inca-pacidade para o atleta com a lesão miotendinosa, mesmo tratando-se de uma lesão muito mais pequena em termos de dimensão.

Em virtude deste comportamento várias questões se levantam:

Será que a sensibilidade à dor não afeta a disponibilidade para o treino e jogo?

Será que o facto de os atletas terem personalidades distintas, tal não terá afetado a disponibilidade para o treino e jogo, ou seja, será que se o atleta do caso 1 tivesse a mesma lesão do caso 2 não conse-guiria jogar? E se o atleta do caso 2

tivesse a lesão do atleta do caso 1 estaria disponível para o treino?

Será que a influência do atleta no plan-tel/equipa não interfere com a disponibilidade para treino?

Será que a posição contra-tual do atleta não

interfere com a disponibilidade para treino?

Não haverá outros fatores para além do músculo lesionado, tipo de lesão, porção do músculo e tipo de atleta a ter em conta quando falamos em prognóstico de lesão muscular?

Decerto haverá ainda muito a descobrir acerca de lesões mus-culares, mas sem dúvida que o mesmo tipo de lesão, no mesmo músculo, com o mesmo tamanho, tem comportamentos diferentes em dois atletas diferentes e no mesmo atleta consoante a altura da época, posição contratual e se o atleta é a opção inicial do treinador ou não, ou seja, a componente psicológica torna-se fundamental também aqui no manejo desta patologia. Portanto, a avaliação e as tomadas de decisão devem ter em conta o atleta como um todo, devendo ser analisado o contexto biopsicossocial, caso a caso e a decisão partilhada entre o atleta, departamento médico e departa-mento técnico.

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Figura 2

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10 Setembro 2017 www.revdesportiva.pt

Res

um

os 3.as Jornadas de Medicina Desportiva do Rio Ave F C03 de junho de 2017Organização do evento e coordenação dos resumos: Dr. Basil Ribeiro

Tema 1: Patologia da coluna vertebralModerador: Prof. Doutor António OliveiraDiretor do Serviço de Ortopedia, Centro Hospitalar do Porto

Espondilólise e espondilolistese no atleta jovem

Dr. Armando CamposServiço de Ortopedia do Centro Hospitalar do Porto

A espondilolise/listesis é a causa mais importante de lombalgia no atleta jovem, atribuída a lesões ana-tómicas. A espondilólise corresponde a um defeito da pars interarticularis de uma vértebra e a espondilolis-tese corresponde ao deslizamento de uma vértebra em relação a outra. Estas lesões são comuns em atletas que participam em desportos que implicam hiperextensão da coluna, como os ginastas. A incidência da espondilose na raça caucasiana

está avaliada de 3-6%, sendo mais prevalente em jovens atletas. Na lise ístmica e na espondilolistese grau I a progressão da listese é rara após a maturidade óssea e, na literatura, não está definido qual a progressão considerada significativa. O estudo de Frennered et al. verifica pro-gressão superior ou igual a 20% em apenas 4% com idade inferior a 16 e com 7 anos de seguimento. Não foi possível correlacionar a progressão da listese com outras variáveis como manutenção do desporto nem com achados radiológicos, exceto com a espinha bífida. Existe consenso nos estudos publicados em que a progressão ocorre predominante-mente no surto de crescimento da

puberdade. Quando sintomático, o atleta jovem refere lombalgia de

baixo grau, que é exacerbada com a hiperextensão da coluna e por atividades que implicam atitudes hiperlordóticas, como a ginástica e a natação. Pode também referir dor com o impacto no solo (corrida e salto) e diminui-ção da flexibili-dade da muscula-tura posterior da coxa. Pode tam-bém ser consta-tada uma postura hiperlordótica e contratura da

Rev. Medicina Desportiva informa, 2017, 8 (5), pp. 10–21 fáscia toracolombar. As alterações neurológicas ou radiculopatia são raras.

O diagnóstico faz-se com radio-grafias convencionais quando é visível o defeito da pars. O sinal patognomónico scotty dog é visível nas incidências oblíquas. Na fase aguda/subaguda, a RMN pode reve-lar precocemente sinais de lesão da pars, com presença de edema ósseo. Na literatura não existe consenso quanto aos benefícios do tratamento cirúrgico nestes doentes que são muitas vezes atletas e não preten-dem terminar a carreira ou dimi-nuir a performance. A controvérsia prolonga-se sobre qual a melhor técnica cirúrgica. De facto, nos poucos estudos publicados, verifica--se que a maioria defende o trata-mento conservador que abrange o repouso com interrupção temporária do desporto e uso de ortótese até seis meses, bem como a reabilitação fisiátrica. A reparação óssea espon-tânea pode ocorrer na espondilolise em fase precoce e maioritariamente com defeito unilateral da pars. No entanto, os resultados clínicos e

retorno às atividades não se corre-lacionam com a consolidação óssea, verificando-se bons a excelentes resultados em 78-96% dos casos, com 25-37% de reparação óssea. A opção pelo tratamento cirúrgico verifica-se, geralmente, nos casos sintomáticos resistentes às atitudes conservadoras, progressão da espon-dilolistese ou alterações neurológi-cas. Tem indicação a reconstrução da pars nos casos sintomáticos que pretendem manter o mesmo tipo de atividade, reservando-se a artrodese para os casos onde já existe uma listese igual ou superior a II. Estão descritas na literatura variadas téc-nicas cirúrgicas para esta patologia, com bons resultados clínicos globais, continuando problemática a indi-cação cirúrgica. Não existem linhas

Fig. Caso clinico (futebolista)

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orientadoras relativamente quando é permitido ao atleta regressar ao desporto após cirurgia, estando ligado não só à preferência do cirurgião, mas também à ausência de queixas e à evidência radiográ-fica de fusão óssea conseguida.

As lesões traumáticas da coluna cervical

Prof. Doutor Ricardo Rodrigues-PintoUnidade vertebromedular, Serviço de Ortopedia do Centro Hospitalar do Porto

As lesões traumáticas da coluna cervical no desporto são extrema-mente comuns, variando de lesões minor, como entorses e lesões musculares até lesões catastróficas, ameaçadoras da vida e/ ou associa-das a lesões medulares. Apesar de serem mais frequentes em desportos de contacto, como rugby e futebol americano, as lesões da coluna cervical podem também surgir em atletas que praticam despor-tos sem contacto como ginástica, equitação, desportos motorizados e mergulho. Podem resultar de trau-matismos cervicais de alta energia (mais frequentemente carga axial) ou como consequência de pequenos traumatismos que afetem doentes com lesões crónicas, como estenose cervical. A avaliação no campo do atleta com suspeita de lesão da coluna cervical e com queixas de dor e rigidez cervical deverá sempre incluir um exame neurológico. Na presença de alterações estruturais e/ou neurológicas a coluna cervical do atleta deve ser imobilizada com um colar cervical rígido e o atleta deve ser transferido para uma unidade hospitalar para avaliação clínica e radiológica e tratamento.

As lesões mais frequentes no atleta são as entorses e lesões musculares, que se caracterizam por dor e espasmo muscular na ausência de lesão óssea. Os sin-tomas radiculares transitórios (burners ou stingers) que resultam da neuropraxia das raízes nervosas ou do plexo braquial, caracterizam--se por dor e parestesias com ou sem alterações da força muscular;

são unilaterais e sem um padrão de distribuição definido, resolvendo espontaneamente em minutos ou poucos dias, mas podendo fre-quentemente recidivar. A estenose cervical é uma lesão crónica que pode resultar de cargas axiais repe-tidas com a coluna cervical fletida com consequente perda progressiva da lordose cervical e alterações estruturais do corpo vertebral. Os doentes com estenose cervical encontram-se em risco aumentado de, após pequenos traumatismos, sofrerem lesões medulares. Um tipo específico de lesão medular desportiva é a tetraplegia transitó-ria ou neuropraxia medular, que se caracteriza pela alteração ou perda transitória da sensibilidade e força muscular nos quatro membros e que poderá durar poucos minutos até 48 horas. A patologia discal cervical aguda, nomeadamente hérnias cervicais, é relativamente pouco frequente sendo acompa-nhada de dor e espasmo muscular, associados a sintomas de com-pressão radicular ou medular. Mais frequentemente, a patologia discal cervical é crónica, manifestando--se por discopatias sem herniação ou lesão neurológica. As fraturas ou lesões disco-ligamentares da coluna cervical podem ser tratadas conservadora ou cirurgicamente dependendo da estabilidade da lesão e da existência de lesões neurológicas associadas. No caso do tratamento cirúrgico, a esta-bilização é frequentemente con-seguida através da artrodese dos segmentos afetados. O regresso à atividade depende da patologia subjacente. No caso das lesões ligamentares, fraturas e/ou luxa-ções, que tenham sido submetidas a artrodese cervical considera-se que os doentes com artrodeses acima do nível de C4 deverão aban-donar a competição, assim como aqueles com artrodeses abaixo de C4 envolvendo 3 ou mais níveis. Os doentes submetidos a artrode-ses a dois níveis abaixo de C4 têm contraindicação relativa para o regresso à competição devendo esta ser ponderada de acordo com o tipo de desporto e a clínica do doente. As artrodeses a um nível abaixo de C4 não contraindicam o regresso à atividade desportiva. No que diz

respeito às patologias com défices neurológicos associados (mesmo que transitórios), nomeadamente a tetraplegia transitória, o abandono da competição deverá ser conside-rado, uma vez que frequentemente existem patologias subjacentes (estenose congénita ou adquirida, síndrome de Klippel-Feil ou ins-tabilidade cervical) que acarreta-rão um risco aumentado de novo evento neurológico. Em todos os casos, os regressos à competição só poderão ocorrer após a resolução dos défices neurológicos, com-pleta união ou fusão da fratura, na presença de mobilidade completa e indolor da coluna cervical e normal força muscular paravertebral e nos membros. Em conclusão, a patolo-gia traumática da coluna cervical pode abranger lesões pouco graves e de rápida recuperação até lesões dramáticas com défices neuroló-gicos que poderão terminar com a carreira desportiva do atleta e ter implicações em toda a sua vida futura. Os clínicos envolvidos na avaliação destes doentes devem possuir um conhecimento profundo sobre as patologias mais frequen-tes bem como das indicações e métodos para estabilização da coluna cervical e transferência para unidades hospitalares onde a sua avaliação e tratamento poderá ser realizada.

Reabilitação do atleta com patologia da coluna vertebral

Dra. Helena FernandesHospital CUF – Porto

Um dos objetivos principais da Medicina Desportiva é a prevenção de lesões, sendo fundamental o exame médico-desportivo. Quando surge uma queixa / lesão, o pro-cesso da reabilitação desportiva é bem complexo, já que além da resolução da queixa / tratamento da lesão, do restabelecimento da função e da retoma desportiva, também é necessário evitar a reci-diva do quadro e o aparecimento de outros quadros patológicos

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relacionados. A reabilitação da lesão de um atleta tem assim que incluir, não só o diagnóstico da lesão tecidular, mas também o diagnóstico da alteração bio-mecânica associada. A biomecâ-nica da coluna vertebral é muito complexa, não só por estarem em permanente equilíbrio a sua mobi-lidade e estabilidade, mas também pelo facto de o tronco assegurar a ligação entre os membros em posi-ção bípede. Estas funções são leva-das ao extremo no desporto, onde as cadeias cinéticas e os sinergis-mos musculares são rentabiliza-dos ao máximo. A estabilização estática do eixo vertebral é efe-tuada através das vértebras, discos intervertebrais e ligamentos, e a estabilização dinâmica é realizada por três camadas de músculos e pelas fáscias. Distalmente à grade costal, os elementos que esta-bilizam a face ântero-lateral do tronco são sobretudo os múscu-los abdominais e as fáscias, que constituem um verdadeiro “colete de forças”. Nesta região do tronco, que só possui o ráquis como suporte ósseo, são de particular importância o músculo multifidus, o músculo transverso do abdómen e a fáscia toracolombar. Assumem também função de estabilizadores o diafragma e o pavimento pélvico. A correta ação conjunta destas diferentes estruturas permite otimizar a sua função, incluindo

a distribuição das cargas. Para a execução eficiente do papel do ráquis / tronco nos gestos des-portivos, é também importante que exista mobilidade articular adequada a nível das ancas e dos ombros, bem como força muscular, flexibilidade e coordenação apro-priadas a nível de músculos como o grande dorsal, grande peitoral, reto anterior, glúteos, isquiotibiais e adutores. As regiões cervical e lombar, sendo as mais móveis do ráquis, são os locais mais vul-neráveis a lesões agudas e tam-bém onde mais frequentemente surgem patologias crónicas, no contexto de sobrecarga estrutural. Os quadros patológicos são muito diversos. Ao atleta com patologia da coluna vertebral deve ser efe-tuado um exaustivo exame obje-tivo global, dando especial atenção à pesquisa de défices, desequilí-brios e assimetrias. O programa de reabilitação é então delineado (sempre de acordo com cada qua-dro / atleta), visando o controlo sintomático, a recuperação das mobilidades articulares, o reequi-líbrio muscular e a normalização dos padrões de recrutamento neu-romuscular. Podem ser utilizados agentes físicos e técnicas manuais, o reforço muscular deve incluir exercícios excêntricos, devem ser utilizados exercícios pliométricos e os gestos desportivos devem ser cuidadosamente treinados.

Tema 2: As tendinopatias do joelhoModerador: Dr. Hélder Pereira

Três tendinites do joelho

Dr. Nuno LoureiroClínica do Dragão – Espregueira-Mendes Sports Centre – FIFA Medical Centre of Excellence – Porto.

O joelho é uma das principais articulações acometidas por pato-logia no desporto, nomeadamente no futebol, principalmente pelas caraterísticas desta modalidade – corrida com mudanças constantes de direção, movimentos de acelera-ção/desaceleração, saltos, impactos repetidos no solo/bola e impacto direto com adversário. Das muitas estruturas anatómicas (articulares/peri-articulares) que fazem parte do joelho, vamo-nos centrar nos tendões como estruturas frequentemente envolvidas em processos de dor/limi-tação funcional, seja por alterações estruturais e/ou funcionais. Conside-ramos as alterações funcionais mais frequentes e difíceis de identificar e tratar, já que exigem a aborda-gem do atleta como um todo, o que nem sempre é “confortável” para o examinador, seja por questões de formação, seja porque muitas vezes “vê” o atleta de forma segmentar,

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permanecendo “refém” de um exame auxiliar de diagnóstico (e aqueles atletas que apresentam alterações estruturais nos exames complemen-tares e não apresentam dor ou limi-tação funcional?). Tal como noutras áreas da Medicina, a histopatologia destas “lesões” não é completamente compreendida, sendo a presença de células inflamatórias, respeitante ao tipo e quantidade em cada estadio da “lesão”, um dos pontos de maior discórdia, razão pela qual nos parece mais sensato usar o termo – tendino-patia para designar estas lesões, ao contrário de tendinite ou tendinose. Uma palavra para as tendinopatias reativas (muitas vezes apresenta-das na forma de tenossinovite) que podem ocorrer maioritariamente por traumatismo direto e/ou aumento agudo de carga de treino. Relativa-mente aos fatores de risco (e como para a grande maioria das lesões músculo-esqueléticas), podemos referir que não há apenas um fator a contribuir para o aparecimento das queixas, mas sim um conjunto, sendo que a metodologia inadequada de treino, desequilíbrios musculares, défices de amplitudes articulares, défices de controlo neuromotor, alterações da estabilidade lombopé-lvica, alterações posturais e a idade nos parecem os mais relevantes. A apresentação clínica da patologia tendinosa segue, na grande maioria dos casos, um padrão contínuo, em que inicialmente a dor peri-articular aparece após a atividade física, ou na manhã seguinte ao esforço, para posteriormente aparecer durante o exercício, com carácter cada vez mais limitativo para a prática do desporto em questão. Objetivamente é importante observar o atleta como um todo e centrado nas suas altera-ções estáticas e dinâmicas, podendo apresentar-se localmente com dor na palpação do corpo do tendão, na sua inserção no osso e/ou na sua junção miotendinosa. Quanto ao tratamento

(e baseado nas premissas prévias) é a identificação do(s) evento(s) desencadea-dores/mecanismo lesional ou estruturas alteradas a mon-tante e/ou a jusante do joe-lho; o respeitar a biologia dos tecidos; o estabelecer pro-gramas individualizados de reabilitação com progressões

baseadas em critérios; a boa periodi-zação das cargas; o correto programa de treino muscular (com ênfase no trabalho excêntrico); o “ouvir” o corpo do atleta, tratando a “pessoa” como um todo e não o “exame” são todos aspetos fundamentais para a dimi-nuição da sintomatologia e resolu-ção do quadro clínico. Haverá então lugar para o tratamento cirúrgico nas tendinopatias? Pensamos que (e apesar de não haver consenso na lite-ratura sobre quando e como operar) um “bom” tratamento reabilitador respeitando os critérios de progressão e de reintegração em treino nos dará um melhor resultado final do que o tratamento cirúrgico, não tendo a cirurgia “lugar” no tratamento destas patologias, mesmo num jogador profissional de futebol. Concluindo: a dor próxima ao tendão é muito comum no desporto, não sendo uma patologia fácil de tratar, pela difi-culdade em “perceber” as estruturas primariamente afetadas. Para isso é fundamental visualizar o atleta como um todo, tratando a causa da sua dor (mais do que a consequência) com um programa reabilitador multidis-ciplinar individualizado que correta-mente aplicado evitará uma cirurgia despropositada na grande maioria dos casos.

Tratamentos: quais as evidências de eficácia?

Dr. Carlos RioClínica Dr. Carlos Rio – Braga e Viana do Castelo

As lesões tendinosas agudas e cró-nicas degenerativas são situações clínicas frequentes, especialmente em atletas. A tendinopatia degene-rativa, que muitas vezes precede a rotura tendinosa, é considerada

por muitos autores como uma falência do processo regenerativo e caracteriza-se por espessamento, hipervascularização, degeneres-cência mucoide, nódulos ectópicos de estrutura óssea ou cartilagínea e desorganização da sua matriz. Em termos terapêuticos é comum iniciar-se pela administração de anti-inflamatórios não esteroides, que apresentam pouca evidência na influência histológica e bioquímica na patogénese da tendinopatia, inibindo até o seu processo regene-rativo (curto prazo – razoável; longo prazo – mau), ou pela corticotera-pia, a qual apenas pode ajudar no controle da dor e do edema na fase inflamatória, sendo de resto pouco evidente (curto prazo – bom; longo prazo – mau). A medicina física e de reabilitação tem uma ação inques-tionável (crioterapia, calor superfi-cial ou profundo, eletroterapia de baixa e média frequência, laser-terapia, vibroterapia, massagem e técnicas para ganho de amplitudes, fortalecimento muscular, reeduca-ção propriocetiva). As ondas de cho-que pertencem ao grupo da vibrote-rapia, implementando uma onda de choque com características próprias (impulso com pico ascendente rápido seguido de onda refratária), com efeitos neurais, desintegração e neovascularização. Podem ser focais (eletromagnéticas, eletrohidráulicas e piezoelétricas) e radiais, de indu-ção pneumática (curto prazo – bom; longo prazo – bom). A mesoterapia é uma técnica médica que consiste na aplicação manual ou instrumental (pistolet), com agulhas de 4, 6, 10 e 13mm e diâmetros de 4/10 e 3/10 sobre a pele (epidérmica, intradér-mica profunda ou hipodérmica), de pequenas gotas de uma mistura de injetáveis escolhidos de acordo com as necessidades terapêuticas – lidocaína, piroxicam, tiocolquico-sido, enzimas proteolíticas, produtos vitaminados (curto prazo – bom; longo prazo – mau). A aplicação de sistemas transcutâneos de nitro-glicerina 5 mg/dia (glicerol trini-trato – GTN) no ponto doloroso dá origem à formação de óxido nítrico, facilitando a proliferação fibro-blástica e consequente síntese de colagénio (curto prazo – mau; longo prazo – razoável). A punção seca (dry needling), superficial (nos tecidos

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que cobrem a lesão) ou profunda (atravessando a lesão) agride com a agulha e promove a estimulação da secreção de peptídeos opioides endógenos (encefalinas...), gate--control e tem ação sobre sistema nervoso autónomo (curto prazo – bom; longo prazo: – razoável). A eletrólise percutânea intratissular (EPI), que consiste na aplicação de corrente galvânica através de uma agulha de acupunctura – elétrodo negativo, cátodo – sob controle eco-gráfico, sobre a região degenerada produz uma reação eletroquímica, desencadeando processo inflamató-rio e necrose celular. Esta situação acarreta fagocitose e reparação tissular. Dá origem a um processo inflamatório (72 horas), que permite regeneração tissular, depois à fase proliferativa (8.º dia), aumentando a proliferação celular, fibroblástica, à fase de sintetização (14.º dia), incrementando depósito de matriz extracelular e, finalmente, à fase de remodelação e modulação (21.º dia). Outro tratamento é a ozonoterapia, que utiliza uma mistura gasosa de 95% O2 e 5% ozono. Aumenta a oxigenação celular e a respiração tissular, potencia as capacidades metabólicas, tem efeito anti-infla-matório no sistema musculoesque-lético, incrementa a vasodilatação e a circulação sanguínea, liberta fatores de crescimento, melhora a capacidade antioxidante e a res-posta imunitária, é antisséptica e modeladora da via nocicetiva (curto prazo – bom; longo prazo – bom). Os dispositivos médicos de colagé-nio (proteína mais abundante no organismo – 5-6% do peso corporal) estão a ganhar grande números de adeptos. Confere boa capacidade regenerativa (curto prazo – razoá-vel; longo prazo – bom). Sangue total autólogo reúne concentração de plaquetas – 225.000 por µl – 4% de plaquetas (fator de crescimento derivado das plaquetas (PDGF) que implementa regeneração tendinosa. Bom para controle nociceptivo, edema e mecanismos celulares. Estimula proliferação fibroblástica, osteoblástica e condrocítica, assim como vascularização e metabolismo loco-regional (curto prazo – mau; longo prazo – razoável) O plasma rico em plaquetas (PRP – 1.400.00 por µl – 80% de plaquetas) estimula

a proliferação de células mesen-quimatosas, síntese de colagénio e angiogénese, fulcrais para reparação tissular tendinosa. Do sangue total autólogo o concentrado plaquetário contém variadíssimos fatores de crescimento (curto prazo – bom; longo prazo – bom). A solução de proteínas autólogas, os agentes esclerosantes, como o polidocanol, as metaloproteinases da matriz, que são enzimas que degradam componentes da matriz tendinosa, são outras atitudes terapêuticas a considerar. Faltam respostas a certas perguntas básicas, mas de acordo com experiências efetuadas, contando também com a do pró-prio, foi possível demonstrar que as diferentes modalidades terapêuticas abordadas promovem uma melhoria significativa no quadro clínico das tendinopatias. Muitas dúvidas ainda vão persistindo especialmente face às soluções de proteínas autólogas (aprotinina e proloterapia), as quais, certamente, a curto prazo ficarão melhor esclarecidas.

Tendinopatias do joelho: quando operar?

Prof. Doutor António SousaHospital de S. João – Porto

No joelho existem quatro estru-turas tendinosas, cujos processos inflamatórios podem resultar em limitação da prática desportiva: ten-dão rotuliano (TR), banda ileotibial (SBIT), tendão quadricipital (TQ) e tendões da pata de ganso (PG). Des-tas, a inflamação que atinge o TR (jumpe’rs knee) é a de maior impor-tância pela elevada prevalência e limitação funcional nas modali-dades com salto. Segundo Ferreti (2002) apenas 10% dos doentes beneficiam de tratamento cirúrgico. A SBIT beneficia raramente de trata-mento cirúrgico, após nove meses de falência do conservador (Mar-tens, 1989). A TQ tem maioritaria-mente tratamento conservador, com indicações muito raras para excisão do tecido degenerativo e eventuais calcificações (Ferreti 1985). Os

processos inflamatórios da PG têm ainda indicação mais rara para bur-sectomia (Abeles, 1983). São indi-cações para cirurgia do TR: rotura, falência do tratamento conservador (seis meses), sendo importantes a demanda funcional do atleta e a motivação. Encontramos procedi-mentos abertos e artroscópicos. Os gestos mais comuns descritos na literatura são a fenestração do ten-dão, a tenotomia, o desbridamento de tecidos degenerativos e também gestos ósseos (osteoplastia), como as microfraturas, a excisão da face não articular do polo inferior da rótula ou a resseção deste. Do ponto de vista teórico, estas publicações sugerem taxas de sucesso entre 60-90% nas vias aberta e artroscó-pica, resultados globais ligeiramente melhores na via artroscópica, com retorno mais rápido e menor mor-bilidade, complicações muito raras, melhores resultados nos gestos ósseos, na mobilização precoce, na excisão da neovascularização e não encerramento do peritendão. Contudo, os estudos de revisão não confirmam alguns destes pressu-postos. Coleman 2000, num estudo retrospetivo não encontra diferença estatística entre a tenotomia por via aberta ou artroscópica, com taxas de sucesso de 81 e 96%, respetiva-mente, e retorno ao nível de 50% em ambas. Cucurulo, em 2009, num estudo também retrospetivo e multicêntrico, não encontrou diferenças entre a técnica aberta e a artroscópica, com tenotomia e/ou osteplastia. Marchegiani, em 2013, publicou uma revisão sistemática (21 estudos com follow-up médio de 32,5 meses) e também não observou diferenças entre as técnicas aberta ou artroscópica (taxa de sucesso de 85 e 87% e retorno ao nível 79 e 77%, respetivamente). Casey, em 2015, numa revisão de estudos publica-dos entre 2000 e 2014, encontrou as taxas de sucesso de 81 e 91%, retorno ao nível competitivo de 77 e 81% e tempo de recuperação de 5,6 e 5 meses, respetivamente, mas sem diferenças com significado estatís-tico. Brockmeyer, em 2017, numa revisão sistemática entre 2000 e 2015, encontrou taxas de sucesso de 87 e 91%, retorno ao nível de 78 e 82% e tempo de recuperação de 8,3 e 3,9 meses, respetivamente, e

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também sem diferenças com valor estatístico. Conclui-se que o trata-mento cirúrgico das tendinites em redor do joelho tem muito raras indicações na TQ e da PG. Na SBIT o tratamento cirúrgico é raro, mas estará indicado na falência do trata-mento conservador e nas situações clinicas de atrito comprovado ao nível do epicôndilo. Na TR o trata-mento cirúrgico está indicado na falência do tratamento conservador, sendo mais frequente nos casos de atingimento do polo inferior da rótula. Os resultados são semelhan-tes entre via aberta e artroscópica. A tenotomia, com desbridamento dos tecidos degenerados e a osteo-plastia, é o gesto mais importante. A taxa de sucesso varia de 60-90%, o retorno ao mesmo nível entre 50-85% (menor na alta competição). O não encerramento do tendão e a ausência de imobilização pós-ope-ratória favorecem os resultados. O retorno à competição é possível em cerca de 50% dos casos aos 6 meses, com complicações muito raras.

Tema 3: O tornozeloOrganização da SPAT; coordenação Dr. Henrique JonesModerador: Dr. Manuel Vieira da SilvaDiretor do Serviço de Ortopedia do Hospital de Braga

Instabilidade lateral do tornozelo

Dr. Manuel Resende SousaResponsável médico das modalidades do Sporting Clube de Portugal – Lisboa

Epidemiologia. A entorse em inversão ocorre em média 1/10000 indivíduos/dia e 50% destas estão relacionadas com o desporto. Ocorre num 1/3 dos casos em treino e 2/3 em competição. Atletas com entorse prévia duplicam o risco de recorrência dentro de um ano. À 12.ª semana apenas 60 a 90% dos atletas retomam o nível competitivo prévio. O tratamento inadequado leva a queixas residuais e instabi-lidade crónica. Avaliação clínica. É fundamental uma triagem inicial para exclusão de lesões mais graves e proteção do atleta. O Gold-standard para classificação do grau da entorse

é a avaliação ao 5.º dia pós-entorse. Cicatrização. A fase inflamatória dura 10 dias e nesta altura deve cumprir-se o Rest Ice Compression Elevation (RICE) para reduzir a dor e edema e evitar o agravamento da lesão. A fase proliferativa tem a duração de 6 semanas a 3 meses. Deve ser estimulada a mobilização controlada para correta orientação das fibras de colagénio. A fase de remodelação decorre até um ano após a lesão. Provavelmente os nossos atletas estão a retomar a atividade antes da cicatrização ade-quada dos tecidos. Recomendações. É recomendável o uso de ortótese semi-rígida ou tape na fase aguda como método de prevenção de recorrência. A fisioterapia deve con-sistir na realização de exercícios de equilíbrio, proprioceção, força e coor-denação e estes exercícios devem ser incluídos no treino regular. O programa de reabilitação tem uma duração média de seis semanas, reduz o risco de recorrência, mas não previne a 1º entorse. Tratamento cirúrgico. Enquanto que o trata-mento cirúrgico é consensual na instabilidade crónica, o tratamento funcional é preferível ao tratamento cirúrgico nas entorses agudas. Contudo, na revisão realizada por Kerkhoffs verifica-se uma menor instabilidade objetiva após o trata-mento cirúrgico. Assim, no atleta de alta competição o tratamento ideal deve ser ponderado de forma indivi-dual. A cirurgia tem como objetivo a redução da instabilidade objetiva. Preconiza-se a reparação ligamentar anatómica sempre que possível e na ausência de tecidos adequados proceder à reconstrução anatómica com enxerto. A artroscopia deve ser realizada no mesmo tempo para diagnóstico e tratamento de lesões associadas. Conclusões. A avaliação clínica aos cinco dias é o melhor método diagnóstico. O RICE é o tra-tamento de eleição nos dias iniciais seguida de imobilização funcional e programa individualizado de fisiote-rapia. No atleta de alta competição o tratamento ideal deve ser ponderado de forma individual. A reparação ligamentar aguda na entorse grau III em atletas profissionais pode dar melhor resultados: igual tempo de recuperação e redução do risco de recorrência.

As lesões da cartilagem do astrágalo

Dr. Paulo AmadoHospital Lusíadas do PortoOporto Foot & Ankle Group

O tratamento das lesões osteocon-drais do astrágalo continua a ser um desafio nos tempos atuais para os ortopedistas. Trata-se de uma pato-logia muito frequente na traumato-logia desportiva, pois muitas destas lesões aparecem em consequência de entorses do tornozelo, sendo esta uma das lesões mais frequentes no desporto em várias modalidades.

Porquê é que tratamos as lesões osteocondrais do astrágalo (LOA)? Não só pela dor que podem provocar, mas essencialmente pelo facto de poderem evoluir para uma artrose do tornozelo, essa sim, uma patolo-gia incapacitante. Há uns anos atrás pensava-se que a LOA era derivado da deficiente fusão dos núcleos de crescimento ósseo, pelo que se chamavam stocondrites dissecantes. Hoje sabemos que estas lesões são na sua grande maioria, cerca de 90 %, derivadas de uma lesão traumática, por entorse ou impacto.

O entorse pode desencadear uma força deslizante e decapante sobre a cartilagem e produzir uma fissura da cartilagem, ou até mesmo uma fratura da cartilagem, a qual não é visível no rx. Mas pode simplesmente provocar uma área de edema ósseo, que pode resolver ou evoluir para uma necrose localizada e provocar uma LOA. O astrágalo é uma estru-tura óssea com deficiente irrigação sanguínea, pois não tem inserções musculares por onde caminham as artérias para o osso, apenas tem liga-mentos. Se no entorse houver rotura de um ligamento, pode provocar rotura de uma artéria e daí um défi-cit marcado de irrigação do astrágalo.

Existem variados trata-mentos conser-vadores (AINES, glucosamina, condroitina, repouso, imo-bilização), mas

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de resultados limitados em muitos dos casos. Atualmente estudam-se as vantagens de tratamentos ino-vadores, como as ondas de choque ou aplicação de PRP e de fatores de crescimento plaquetário. Na nossa experiência pessoal, iniciamos a aplicação em casos selecionados de PRP, mas de alta concentração celular de medula óssea direta e não como se faz em muitos locais de colheita de sangue periférico de uma veia. Essa tecnologia inovadora só foi possível graças ao desenvolvimento de um trocater especial de colheita de medula óssea efetuado com anestesia local, perte ncente ao nosso arsenal cirúrgico, em colaboração com centros de investigação suíssos e franceses. No entanto, apesar dos esforços, em muitos casos temos de recorrer à cirurgia e sempre que possível por artroscopia do tornozelo. Sempre que possível o primeiro tra-tamento cirúrgico deve ser artroscó-pico, quer por via anterior, quer via posterior do tornozelo para melhor alcançar a lesão condral. Aí, após uma limpeza articular efetuada por um shaver, podemos proceder a umas “micro-fracturas”, como no joelho, ou a perfurações. No astrágalo devemos usar mais vezes as perfurações, pois existe a necessidade de atingir uma área vascular, que no astrágalo nem sempre será fácil, pois só assim se poderá produzir uma fibrocartilagem, substituta da cartilagem real. Muitas destas técnicas foram adaptadas do tratamento de lesões osteocon-drais no joelho. No entanto, existem diferenças comparativamente com o joelho, tais como o relevo da super-fície do astrágalo, o déficit vascular do astrágalo entre outras. O êxito cirúrgico ronda ocorre em cerca de 60 a 85% das vezes. Explico aos doente, comparando com o ato de semear relva. Posso ter boa semente, boa terra, boa água e exposição solar, mas depois verifico que a relva não cresce uniforme ou não cresce mesmo em muitas áreas. O mesmo pode aconte-cer aqui nas LOA.

Existem ainda outros tratamentos, tais como enxertos cartilagíneos, aplicação de matrizes de colage-nio, com ou sem células, enxertos maciços de osteocartilagineos, onde a experiência e o bom-senso levam à melhor escolha para o paciente. O futuro trará muitas novidades, pois

existe um campo de investigação dinâmico, mas até aqui com poucos frutos aplicáveis na realidade. Será a engenharia de tecidos ou a melho-ria e facilitação do uso de enxer-tos frescos de cadáver que podem melhorar em muito as soluções que o cirurgião ortopédico pode optar no tratamento de uma LOA. A experiên-cia que hoje o nossa equipa cirúrgica reuniu ao longo dos já muitos anos de tratamento destas lesões, permite--nos afirmar que já temos boas soluções, com as limitações inerentes a este tipo de lesões cartilagíneas. É essencial a experiência e aquisição de tecnologia atual. Não nos podemos esquecer também da formação em cadáver que nos permite investigar novas técnicas e transmitir a quem nos procura esses ensinamentos.

A rotura do tendão de Aquiles: a culpa é do osso?

Dr. Duarte Sousa1, Ft. José Teixeira2, Dr. Hélder Pereira1

1Departamento de Ortopedia do Centro Hospitalar Póvoa Varzim / Vila do Conde 2Departamento médico do Rio Ave F C. Vila do Conde.

O tendão de Aquiles é o maior e mais forte tendão do corpo humano. É formado pela confluência dos músculos gastrocnémio e solear. A artéria tibial posterior irriga a porção proximal e distal do tendão e a arté-ria peronial irriga a porção medial do tendão (2 a 6cm da sua inser-ção).1 Não está envolvido por uma verdadeira membrana sinovial, mas por um paratendão, que é altamente vascularizado.2 O Aquiles, em con-traste com o paratendão, tem duas zonas de relativa hipovasculariza-ção: uma na zona de inserção óssea e outra 2 a 6cm proximal à inserção. O tendão de Aquiles geralmente rompe 3 a 4cm proximalmente à sua inserção no calcâneo. Esta

localização geralmente relaciona-se com a referida zona hipovascular.3,

4 A rotura do Aquiles é responsável por 20% de todas as lesões tendino-sas.5 Noventa a 100% destas lesões ocorre durante a flexão plantar ativa e súbita.6, 7 Mecanismos pro-postos incluem: apoio sobre um pé enquanto o joelho é estendido, como acontece com os sprinters no início da corrida (53% das lesões); dorsiflexão súbita do pé, como colocar o pé em falso num buraco (17%); dorsiflexão forçada de um pé em flexão plantar (10%).8 A bursa superficial do tendão de Aquiles localiza-se entre a pele e o tendão e a bursa retrocalcânea localiza-se entre o Aquiles e o calcâneo postero--superiormente.9 A deformidade de Haglund refere-se à protuberância óssea póstero-superior / lateral do calcâneo, que provoca impingement da bursa retrocalcânea e a inserção do Aquiles, o que pode provocar lesão dos mesmos. Quando se torna sintomático é referido como sín-drome de Haglund.10 A deformidade de Haglund pode predispor à rotura do tendão.11

Os doentes geralmente referem um “tiro” no calcanhar, seguido de dor com a flexão plantar e difi-culdade em deambular. Um terço dos pacientes refere ter sintomas pródromos antes da ruptura.17 O diagnóstico de rotura pode ser feito com mais de dois critérios do exame físico: teste de Thompson positivo, diminuição da flexão plantar, gap palpável e aumento da dorsiflexão do tornozelo passiva.18 O teste de Thompson é positivo em mais de 90% dos casos agudos.6 No entanto, em 25% dos casos o diagnóstico passa despercebido.6 Pode ocorrer que devido a um hematoma na região do tendão ou se a compressão no teste de Thompson for dema-siado elevada, este pode recrutar os flexores plantares secundários, dando origem a um falso negativo.6

A radiografia é pedida para excluir fraturas concomitantes (fratura avulsão de fragmentos ósseos do calcâneo) ou calcificações do tendão. A ressonância é o exame gold stan-dard para o planeamento cirúrgico.10

O tratamento de eleição, quando falha o tratamento conservador, é a cirurgia endoscópica. Esta permite melhor visualização e controlo dos

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Revista de Medicina Desportiva informa Setembro 2017 · 19

atos sobre as estruturas envolvidas, diminui muito a agressão cirúrgica, diminui as complicações e acelera o retorno à atividade. Contudo, a ten-doscopia, calcaneoplastia endoscó-pica ou outros gestos endoscópicos no tratamento destas patologias deve ser realizado em centros com experiência nesta área.

É fundamental que haja um protocolo de reabilitação adequado

pós-operatório, sobretudo quando o objetivo é o retorno à atividade desportiva de alta competição. O reforço muscular e propriocetivo é adaptado de forma progressiva e perso-nalizada aos objetivos estabelecidos para cada atleta.19

Bibliografia

Restante Bibliografia em: www.revdesportiva.pt (A Revista Online)

Reabilitação da entorse tibiotársica

Prof. Doutor João Pinheiro, Dr. João Branco, Dr. Pedro FigueiredoCentro Medicina Física e de Reabilitação Hospitalar de Coimbra

Introdução – Trata-se de uma pato-logia frequente, com uma incidência diária na comunidade de 1/10.000 indivíduos, representando 38-45% das lesões desportivas e 15-25% das lesões

musculoesqueléticas, sem diferença entre os géneros. Existem relatos na literatura de incidências de 0.02 a 34.83/1000 horas de exercício físico (variável segundo as modalidades). Tem um forte impacto desportivo, jus-tificando perto de 1/6 da interrupção competitiva. A idade e prática de exer-cício irregular aumentam a suscetibi-lidade lesional. A entorse ocorre em 90 a 95% no compartimento lateral, 10 a 30% apresenta risco de cronicidade e 50% apresentam potencial risco de recidiva.1-3

Trata-se de uma patologia com enquadramentos múltiplos e diver-sos, nomeadamente a diversidade de locais de atendimento (do hospital … ao campo e balneário), a hetero-geneidade de propostas terapêuticas (da abstenção à cirurgia), onde uma opção terapêutica pode determinar um prognóstico estrutural e fun-cional muito díspar e onde o risco de complicações é valorizável (no imediato e a longo termo). Após um traumatismo três opções terapêu-ticas podem ocorrer: a funcional (ortótese de estabilização e reabilita-ção) / evidência crescente, a orto-pédica (imobilização rígida e reabi-litação) e a cirúrgica (intervenção e reabilitação). Os problemas imedia-tos após a entorse (1.ª semana) são a dor (mecânica +++), os déficits de amplitude articular, de força muscu-lar e o propriocetivo, o descondicio-namento ao esforço e a deterioração desportiva. As fases de cicatrização tissular compreendem a fase infla-matória (3 dias), a de proliferação precoce (4-10 dias), a de proliferação tardia (11-21 dias) e de remodelação e maturação (60-90 e mais dias).4 São objetivos dos programas de reabili-tação interferir nas diferentes fases do processo terapêutico. Na fase inflamatória (dias) com o controlo de dor e inflamação e criando condi-ções de estabilidade para cicatriza-ção tissular. Na fase de cicatrização (semanas) com o controlo da dor e inflamação, assegurando a estabi-lidade estrutural e promovendo a atividade cinesiológica (força e pro-prioceção). Na fase de readaptação (semanas – meses) com o controlo da dor e inflamação, com atividade cinesiológica (força e proprioceção), com condicionamento ao esforço, ao gesto e à retoma desportiva bem como na prevenção lesional.5,6

Figura 1: Avaliação clínica sistematizada do T. Aquiles na zona não-insercional (late-ral, medial e dorsal), junto às eminências ósseas e junto à inserção.

Figura 2: Visão técnica de calcaneoplastia endoscópico e resultados intra-operató-rios imediatos na redução da tuberosi-dade posterior do calcâneo

Tabela 1: Fatores de risco de Tendinopatia do Aquiles6, 12-16

Fatores de risco intrínsecos Fatores de risco extrínsecos

Sexo: masculinoFármacos: corticoides, quinolonas, estatinas

Idade avançada Aumento súbito da intensidade do treino

Diminuição da vascularização do tendão Calçado desgastado ou inadequado

Degeneração do tendão

Fraca flexibilidade gastrocnémio-sóleo

Fatores anatómicos• Pé cavo (maior ângulo de inclinação do calcâneo)• Hiperpronadores (Rotação interna na tíbia;

Rotação Externa – Joelho – provoca elevada tensão no tendão de Aquiles)

• Excesso de peso

Doenças inflamatórias: ex: Espondilopatias seronegativas

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20 Setembro 2017 www.revdesportiva.pt

Programa terapêutico – O programa decorre no âmbito do controlo da dor e inflamação, da retoma de amplitudes articulares, na retoma dos parâmetros cinéticos de força e proprioceção, na introdução e con-trolo do exercício físico e na preven-ção da recidiva.5-10

2.1 – Terapêutica antiálgica e anti--inflamatória, utilizando o pro-tocolo RICE (repouso, crioterapia, compressão, elevação), os agentes farmacológicos (analgésicos e anti--inflamatórios tópicos ou sistémicos ou a infiltração local), os agentes físicos (iontoferese, ultrassom, tens, laser, magnetoterapia…) e os agentes cinesiológicos (massagem manual). Verificamos baixa evidência para todos estes agentes particularmente no âmbito dos anti-inflamatórios e agentes de eletroterapia.2.2 – Retoma de amplitudes, força e proprioceção – Com a introdução progressiva das técnicas cinesiológi-cas de retoma de mobilidade articu-lar, no respeito pela dor espontânea e proteção dos elementos capsuloli-gamentares. Utilizam-se técnicas de mobilização articular passiva, mobi-lização articular ativa e técnicas de facilitação neuromuscular proprio-cetivas. A retoma da força muscular compreende a utilização de trabalho muscular analítico (particularmente dos músculos fibulares e tibiais laterais), nomeadamente estático, dinâmico concêntrico e dinâmico excêntrico e de trabalho muscular global. A retoma da estabilidade propriocetiva utiliza a estimulação propriocetiva em cadeia cinética aberta e posteriormente em cadeia cinética fechada, com trabalho de posição e de movimento, com e sem controlo exterocetivo / sensorial. A reeducação postural (postura, equi-líbrio, coordenação e proprioceção) é também essencial na retoma de performance competitiva e decisivo na prevenção da recidiva. Tratam-se de intervenções cinesiológicas com evidência crescente e indicadores de qualidade terapêutica. 3 – Controlo de qualidade / retoma desportiva e prognóstico – Utiliza diferentes indicadores, nomeada-mente sintomas e sinais (dor, edema, laxidão), a mobilidade articular (particularmente a dorsiflexão), a força muscular manual ou isociné-tica (fibulares laterais, tibial posterior,

a estabilidade funcional (testes de desempenho propriocetivo), o desem-penho postural (posturografia dinâ-mica), os testes de autoperceção (de estabilidade, de retoma competitiva), o desempenho específico de elemen-tos cinéticos e a performance des-portiva. A prevenção lesional funda-menta-se na estimulação da atividade propriocetiva e neuromuscular e no fortalecimento analítico dos músculos fibulares laterais. Existe evidência que demonstra a eficácia destes progra-mas, em diferentes grupos etários.4 – Sequelas lesionais – As sequelas ocorrem em 5-33 % dos casos (inde-pendentemente do tratamento inicial), verificando-se que 34% apresentam novo episódio de entorse e que 15-64% referem não ter recuperado total-mente após um ano. A dor crónica de diversas etiologias, a instabilidade articular, a deterioração da confiança, a perda de performance desportiva e a osteoartrose precoce são os aspetos clínicos mais referidos.11-13 5 – Falsas entorses, com dor e instabilidade mantidas – São refe-ridos um conjunto de problemas clínicos muitas vezes simulando ou que sendo inicialmente interpreta-dos com entroses comprometem a retoma funcional. Os mais frequen-tes são a lesão isolado da sindes-mose tibiofibular, a entorse lateral de Chopart (médio-társico), a luxa-ção aguda dos músculos fibulares laterais, a fratura do maléolo lateral / medial, a fratura da base do V meta, a lesão osteocondral do tálus e as sinostoses do tarso / barras sinos-tósicas na criança e adolescente. 6 – As evidências na reabilitação do tornozelo – O imobilizar potencia a cicatrização anatómica e a esta-bilidade estática e não imobilizar acrescenta facilidade de retoma funcional, mas acrescenta risco de complicações. O interesse do pro-grama de reabilitação sistematizado e organizado, sustentado no diag-nóstico etiopatogénico.A finalizar refira-se a baixa evidên-cia terapêutica dos anti-inflamató-rios, particularmente na fase aguda. No entanto, a sua evidência cresce como elemento importante no con-trolo e prevenção da inibição mus-cular artrogénica. As componentes cinéticas neuromotoras (força, pro-prioceção e postura) são decisivas no processo de retoma e na prevenção

lesional. De salientar ainda a baixa evidência dos agentes físicos (parti-cularmente eletroterapia), particu-larmente acrescida numa utilização isolada de cada agente, não sistema-tizada no âmbito de um programa compreensivo fundamentado no diagnóstico etiopatogénico14,15.

Bibliografia

Restante Bibliografia em: www.revdesportiva.pt (A Revista Online)

Tema 4: O joelhoModerador: Dr. Alcindo SilvaHospital da Arrábida – Vila Nova de Gaia

A lesão do menisco: um novo paradigma

Dr. Ricardo Santos Pereira1, Prof. Doutor José Carlos Noronha2

1Serviço de Ortopedia – Centro Hospitalar de Vila Nova Gaia-Espinho, EPE; 2FPF – Unidade e Saúde e Rendimento – Porto

Os meniscos têm merecido cada vez mais respeito, pois a sua exérese gera inevitavelmente lesões degenerativas. Cada vez mais se tenta preservá-los: suturando-os ou evitando-se fazer a sua exérese. São estruturas muito importantes na estabilização articu-lar e distribuição de carga, sendo o menisco externo mais importante, porque permite a congruência articu-lar num compartimento femorotibial que é incongruente (côncavo-con-vexo). Ainda assim, a lesão do menisco interno é cerca de três vezes mais frequente – a menor mobilidade deste menisco justifica a maior incidência de rotura. O correto diagnóstico da lesão meniscal passa pela colheita cui-dadosa da história clínica (com espe-cial atenção ao mecanismo lesional, localização dos sintomas, bloqueios, falhas e limitações da mobilidade) e realização do exame físico e de exa-mes complementares de diagnóstico, nomeadamente a RMN.

Somente as lesões meniscais instáveis podem justificar menis-cectomia parcial e apenas se as queixas coincidirem com o exame clínico e com a imagem da RMN. Se possível, deverá ser privilegiada a sutura meniscal à meniscectomia. As indicações para sutura meniscal são as roturas recentes, em doentes

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Revista de Medicina Desportiva informa Setembro 2017 · 21

jovens e em zonas periféricas, uma vez que o sucesso da sutura está for-temente influenciado pela presença de vascularização. Na tentativa de preservar ao máximo os meniscos, cada vez mais são tentadas suturas mesmo em zonas de menor vas-cularização, sendo, no entanto, de prever falência nesses casos. Outro fator a considerar é a necessidade de reconstrução concomitante do ligamento cruzado anterior, uma vez que nestes casos o prognóstico da sutura é muito superior.

O maior inconveniente da sutura meniscal é o maior tempo de recu-peração (cerca de quatro meses) em comparação com a meniscectomia (cerca de um mês), mantendo risco importante de falência mesmo após esse período prolongado de suspensão da prática desportiva. Assim, na deci-são da melhor opção de tratamento no atleta, para além dos fatores biológicos, terão de ser tidos em conta vários outros fatores – influência do treinador/empresário, fase da carreira, contrato ou época, entre outros.

Em doentes relativamente jovens após meniscectomias extensas, o transplante meniscal poderá ser con-siderado. No entanto, apesar do seu elevado custo, os meniscos sintéticos não têm apresentado bons resulta-dos a longo prazo e alguns estudos apontam para que o transplante meniscal com aloenxerto possa des-poletar uma reação imunológica que acelera a artrose. As matrizes celu-lares (scaffolds) estão a ser alvo de investigação e poderão constituir o futuro da substituição meniscal. Nos casos em que as alterações degene-rativas predominam, outras medidas terapêuticas poderão ser associadas (infiltração com corticoides, plasma rico em plaquetas, células mesenqui-matosas ou viscossuplementação), com resultados geralmente satisfa-tórios, mas muito variáveis de estudo para estudo. Ressalve-se que a infil-tração com corticoides tem indica-ção esporádica nos casos de sinovite ou derrame persistente. Por fim, a sobrecarga resultante da meniscec-tomia geralmente evolui progressiva-mente para artrose. As osteotomias poderão ser realizadas nos casos de artrose unicompartimental com des-vio axial, mas a artroplastia (unicom-partimental ou total) acaba por ser o destino final de muitos dos joelhos

meniscectomizados. Estas cirurgias só deverão ser consideradas após o término da carreira desportiva.

A patologia patelofemoral

Dr. Gonçalo Borges2, Dr. José Luís Carvalho2

1Hospital da Arrábida – Vila Nova de Gaia2Hospital da Prelada – Porto

A dor patelofemoral (DPF) ou síndrome da dor patelofemoral caracteriza-se por queixas álgicas localizadas à face anterior do joelho, de instalação insidiosa, exacerbada em condições de aumento do stress patelofemoral, nomeadamente em situações de squatting, subida de escadas e corrida. É um processo crónico de etiologia multidimensio-nal. The 4th International Patellofemoral Research Retreat definiu DPF como o termo mais adequado. Corresponde a 25% das queixas de gonalgia em Medicina Desportiva, comum em jovens adolescentes (prevalência de 7-28% e incidência de 9.2%) e mais comum nos corredores de fundo.

O clássico alinhamento rotuliano aberrante e maltracking corresponde a um fator de risco e não o factor de risco. Os fatores de risco anátomo--funcionais conhecidos são o maltra-cking rotuliano e/ou hipermobilidade, fraqueza quadricipital, atraso na ativação do músculo vasto medial oblíquo (VMO) e inflexibilidade de tecidos moles (quadricípite femo-ral, isquiotibiais, gastrocnémio e banda iliotibial). Do ponto de vista de tecidos moles, a tensão excessiva nos restritores laterais do joelho está habitualmente implicada no maltracking rotuliano. A disfunção por tensão excessiva/encurtamento da banda iliotibial também resulta num tracking rotuliano aberrante e aumento de stress lateral na pate-lofemoral. O défice de flexibilidade do quadricípite femoral, isquiotibiais e gastrocnémio são fatores de risco. Em cadeia cinética fechada, todo o membro inferior influi no movimento e padrões de stress da patelofemoral. A biomecânica do core, anca, torno-zelo e pé é de considerar na etiologia e tratamento da DPF. A disfunção dos músculos da anca, a rotação interna

do fémur e a rotação externa da tíbia são fatores de risco importantes. A fraqueza dos músculos da anca, nomeadamente dos abdutores (ABD) e rotadores externos (RE), condiciona a subsequente rotação interna do fémur e aumento do stress patelo-femoral pela lateralização rotuliana sobre a tróclea. É mais importante o papel de performance neuromuscu-lar no controlo dinâmico da rotação interna do fémur que a força estática dos ABD e RE. A excessiva pronação do pé também predispõe ao aumento do stress patelofemoral. O diag-nóstico é clínico. Em ortostatismo, vemos genu varum ou genu valgum, excessiva rotação interna do fémur, Inward-pointing patella ou Squinting patella, fraqueza de ABD e RE da anca, rotação externa da tíbia, valgismo do calcâneo/ pé pronado e hiperlaxidão articular. Em pedestação podemos inspecionar o tracking rotuliano, avaliando o J-sign test e o Grasshopper eyes sign. Avaliar sinais inflamatórios, a contração isométrica do VMO, a atrofia ou atraso na ativação VMO em relação ao vasto lateral, avalia-ção do ângulo Q, Mediolateral glide test, Rabot e Grind test, Tilt rotuliano, ângulo poplíteo, Ober test e Ely test são observações obrigatórias. O tra-tamento é habitualmente é conser-vador: agentes físicos para controlo da dor e tratamento fisiátrico, sendo o fortalecimento quadricipital uma pedra basilar. A fraqueza dos ABD e RE da anca é comum, logo o forta-lecimento destes músculos chave é fundamental. A ligadura funcional é útil (a McConnell taping technique – maior benefício e evidência). As órtóteses rotulianas são importantes na diminuição imediata da dor, mas apresentam benefício duvidoso a longo prazo. Concluindo: a DPF cons-titui uma causa de gonalgia comum e muitas vezes incapacitante, espe-cialmente em mulheres e corredores, tendo uma origem multifactorial. O sucesso do tratamento depende da compreensão da multiplicidade dos fatores de risco para a patologia, bem como a maneira como se relacionam sinergisticamente entre si. Para além das correções biomecânicas preconi-zadas, a modificação da atividade até uma zona pain-free é essencial.https://issuu.com/misericordiado-porto/docs/sindrome_de_dor_pate-lofemoral_hp_

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19. Gross, C.E. and J.A. Nunley, 2nd, Acute Achi-lles Tendon Ruptures. Foot Ankle Int, 2016. 37(2): p. 233-9.

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22 Setembro 2017 www.revdesportiva.pt

ES

Mais informações em:

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30 Nov e 1 Dez de 2017

CONGRESSODA SPAT

Apoio:

TÁDIO DO MARÍTIMO,FUNCHAL, MADEIRA

Sociedade Portuguesa de Artroscopia e Traumatologia Desportiva

Faltam três meses para o início do XIII Congresso da SPAT. Iremos até ao Estádio do Club Sport Marítimo, na ilha da Madeira, o qual, depois de renovado, ficou com condições extraordinárias para a prática do futebol e para a receção de eventos científicos. Nota-se entusiasmo e grande expetativa, pois à qualidade do programa científico (e social) e dos palestrantes, associa-se a visita a uma ilha muito bonita, que tem na sua capital, o Funchal, um glamour quase insubstituível. Serão dias de ciência, mas também de relaxamento. Um dos Presidentes do Congresso, o Dr. Horácio Sousa, anda eufórico e refere que “é uma honra enorme ter oportunidade de poder contribuir para a organização deste XIII Congresso da SPAT, o mais importante a nível nacional em rela-ção à artroscopia, que pela primeira vez se realiza na Madeira”, para logo de seguida referir que “é um prazer redobrado poder receber este evento e ainda poder ser anfitrião de tantos amigos que fomos conhecendo e aprendendo a admirar ao longo de todo o nosso percurso profissional.” Este desabafo de gratidão é garantia do seu empenhamento na organiza-ção do Congresso. Entretanto, o Dr. Henrique Jones, Presidente da SPAT e co-Presidente do Congresso, anda

entusiasmado, pelo que correspon-damos ao seu apelo, pois “é com enorme prazer, e redobrada consi-deração, que convido todos aqueles que fazem da artroscopia”, tanto mais que “Os temas são aliciantes, os nossos convidados são referên-cias mundiais e todos os alicerces estão criados para um evento que, certamente, irá enriquecer o nosso património científico, cultural e social.” E o Dr. Henrique Jones, que é um homem que partilha e não guarda apenas para si, sabe ser grato e reconhecer a envolvência de outras pessoas na organização de tão grande evento, pelo que sabe que “nada disto seria possível sem a colaboração dos órgãos sociais da SPAT, à qual me orgulho de presidir e, sobretudo, do meu amigo e co--Presidente neste Congresso, o Dr. Horácio Sousa, colega madeirense de inquestionável notoriedade profis-sional e social, da região, a quem presto, desde já a minha homena-gem e agradecimento.” As condições para um Congresso de sucesso cien-tífico e social estão garantidas. Falta agora a nossa adesão e participação ... que serão, certamente, enormes!

Dr. Basil Ribeiro

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Revista de Medicina Desportiva informa Setembro 2017 · 23

Injeção Intra-articular no Tratamento da Osteoartrose do Joelho: Corticoesteroide, Ácido Hialurónico, PRP ou Nenhuma? Um Estudo Prospetivo a 6 MesesDr. José Luís Carvalho1,4, Dr. Tiago Lopes1,3, Dr. Gonçalo Borges2,4

1Interno de formação específica; 2Assistente hospitalar. 1,2Medicina Física e de Reabilitação. 3Centro Hospitalar de Trás os Montes e Alto Douro. 4Hospital da Prelada. Porto

RESUMO / ABSTRACTIntrodução. A osteoartrose (OA) é a forma mais comum de doença articular, dependendo de fenómenos de wear and tear e mecanismos inflamatórios. O objetivo deste estudo é comparar a eficiência dos corticoesteroides, ácido hialurónico e plasma rico em plaquetas em relação a um placebo, no tratamento minimamente invasivo da gonartrose moderada. Material e Métodos. Uma população de 84 doentes com o diagnóstico de OA moderada do joelho foi distribuída por 4 grupos de 21 doentes, de acordo com a intervenção intra-arti-cular (IA) a realizar: Grupo A (ácido hialurónico [AH]), Grupo B (plasma rico em plaquetas [PRP]), Grupo C (corticoesteroide [CS]) e Grupo P (lidocaína). As medidas de outcome analisa-das foram dor (VNS) e função (WOMAC), antes da intervenção, ao 1.º, 3.º e 6.º meses após a intervenção. Resultados. Todas as intervenções avaliadas demonstraram benefício estatis-ticamente significativo ao 1.º, 3.º e 6.º mês em relação ao placebo, quer em termos de dor, quer em termos de função. O CS apresentou melhores resultados ao 1.º mês e a 6 meses de follow-up o AH e o PRP demonstraram o maior benefício. Discussão e Conclusão. Este estudo demonstra que todas as intervenções avaliadas apresentam benefício estatisticamente significativo a curto e a médio prazo em relação ao placebo, em termos de dor e de função. Este estudo vai continuar até aos 18 meses de follow-up de forma a aferir dos resultados a longo prazo destas intervenções.

Introduction. Osteoarthritis (OA) is the most usual form of joint disease. It depends on wear and tear mechanisms but also inflammatory pathways. The aim of this study is to compare three types of minimally invasive procedures commonly used for the treatment of moderate knee osteoarthritis, either between them or with placebo. Methods. Selec-tion of a cohort of 84 patients with the diagnosis of moderate knee OA, distributed in 4 distinct groups of 21 patients each: Group A (intra-articular hyaluronic acid [HA]), Group B (intra-articular platelet rich plasma [PRP]), Group C (intra-articular corticosteroid [CS]) and Group P (lidocaine). Analyzed outcome measures were pain (VNS) and function (WOMAC), before the intervention, 1st, 3rd and 6th months after the intervention. Results. All the analyzed interventions demonstrated statistically significant benefit in pain and function regarding placebo at 1st, 3rd and 6th months. CS demonstrated better results at 1st month. At 6th month of follow-up HA and PRP showed greater benefit. Discussion and Conclusion. This study shows that all the analyzed interventions demonstrate statistically significant benefit at short and medium term, regarding pain and function. The long-term benefit will be assessed at 18 months of follow-up.

PALAVRAS-CHAVE / KEYWORDSOsteoartrose do joelho, injeção intra-articular, corticoesteroides, ácido hialurónico, plasma rico em plaquetasKnee osteoarthritis, intra-articular injection, corticosteroids, hyaluronic acid, platelet-rich plasma

Inve

stig

ação

Rev. Medicina Desportiva informa, 2017, 8 (5), pp. 23–26

Introdução

A osteoartrose (OA) é uma patologia degenerativa progressiva com um impacto extraordinário do ponto de vista de dor e de impacto funcional

na população. A OA do joelho é francamente prevalente, atingido doentes em várias faixas etárias, nomeadamente indivíduos de meia--idade e de idade mais avançada. No entanto, também tem uma

expressão importante em idades mais jovens de populações espe-cíficas, como é o caso dos atletas de alta competição, expostos a sobrecarga articular de frequência e intensidade muito acima do nor-mal durante várias décadas. Apesar desta alta prevalência da patologia, não existem guidelines específicas aprovadas pelas principais Organiza-ções Médicas Mundiais para abordar e retardar a degradação lenta, mas inexorável da estrutura articular. Os principais fatores de risco relaciona-dos com o desenvolvimento da OA incluem a idade, obesidade, história de traumatismo ou lesões do joelho, status pós-menopausa na mulher, anormal alinhamento articular e determinados fatores genéticos.1

Do ponto de vista fisiopatológico, a OA é uma patologia mais complexa do que inicialmente se pensava, não dependendo apenas de fato-res biomecânicos e de sobrecarga articular, pois processos altamente ativos de inflamação e remodeling articular estão presentes nos vários estádios da doença. Durante as fases de remodeling ativo potenciadas por processos inflamatórios locais, a qualidade de matriz extracelular é comprometida devido à rápida taxa de turnover e consequente compo-sição atípica da neo-matriz.2 Neste sentido, existe uma relação direta entre um ambiente inflamatório e alterações na função das células, conduzindo a um ciclo evolutivo de síntese ineficaz de matriz extra-celular articular e alterações na sua composição. Esta alteração na matriz extracelular relaciona-se com a maior predisposição à falência na sua função de suporte mecânico das células da cartilagem articular, com maior facilidade no dano tecidular por efeitos biomecânicos e traumá-ticos, cujos efeitos cumulativos con-duzem à progressão da OA. As cito-cinas inflamatórias e as moléculas proteolíticas aparentemente estão na génese desta relação inflamação--remodeling e progressão da doença, desencadeando processos que conduzem à alteração e destruição da matriz extracelular e adulteração do normal funcionamento homeos-tático do ambiente intra-articular, na medida em que os condrócitos e as células sinoviais alteram o seu fenótipo quiescente em resposta a

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24 Setembro 2017 www.revdesportiva.pt

um anormal microambiente infla-matório.3 As citocinas pró-inflama-tórias mais influentes no processo patofisiológico da OA são a inter-leucina (IL)-1b, fator alfa de necrose tumoral (TNF-a) e IL-6, aumentando a expressão de genes catabólicos e pró-inflamatórios e alterando secun-dariamente a estrutura e função da matriz. Subsequentemente, estas citocinas intensificam e mantêm a doença ativa pela indução da pro-dução de outras citocinas inflama-tórias, nomeadamente a IL-8, IL-15, IL-17, IL-21.4,5 Este microambiente inflamatório influencia sobrema-neira a ação de enzimas proteolíti-cas, nomeadamente metaloprotei-nases da matriz (MMP)-13 e MMP-1. Durante a degradação da cartilagem, levada a cabo por estas enzimas, são libertados vários componentes da matriz, como agrecanos, colagénio e fragmentos de fibromodulina, que per se contribuem para a manuten-ção da produção de citocinas infla-matórias.6 Este ciclo de inflamação e destruição articular é exponenciado pelo aumento de expressão dos genes de ciclooxigenase (COX)-2 e prostaglandina E e da ação destas moléculas sobre a ativação e produ-ção adicional de MMPs.7

O tratamento da OA não é con-sensual, apresentando abordagens farmacológicas, agentes físicos, correções cinesiológicas e biome-cânicas, injeções intra-articulares e tratamento cirúrgico. Tem-se verificado nos últimos anos uma grande evolução na exploração

de procedimentos não cirúrgicos, minimamente invasivos, na abordagem da OA do joelho, de forma a diminuir o quadro álgico, otimizar a mobilidade e função com consequentes ganhos em saúde. Os tra-tamentos minimamente invasivos mais comuns

são as injeções intra-articulares (IA) de fármacos, dispositivos médicos ou produtos autólogos com poten-cial regenerativo.

O objetivo deste estudo, com um follow-up de 6 meses, é comparar três tipos de procedimentos minima-mente invasivos habitualmente pre-conizados no tratamento da gonar-trose, nomeadamente injeção IA de corticoesteroide (CS), ácido hialuró-nico (AH) e plasma rico em plaquetas (PRP) em relação a um placebo.

Material e Métodos

Uma população de 84 doentes com o diagnóstico de OA do joelho grau II/III Kelgreen-Lawrence foi distri-buída por quatro grupos distintos de 21 doentes, de acordo com a inter-venção intra-articular (IA) a realizar, nomeadamente: Grupo A (injeção IA de AH, elevado peso molecular, 4 mL, Synocrom ForteÒ), Grupo B (inje-ção IA de PRP, segundo o protocolo Prolo30KitÒ, com colheita de 5mL de sangue autólogo, centrifugação única a 320rpm durante 5 minutos, obtendo-se com 2mL de PRP pobre em leucócitos, com concentração de plaquetas 5 a 7 vezes a baseline do doente e efetuando-se a injeção IA sem ativação externa), Grupo C (injeção IA de CS, 2mL de acetato de metilprednisolona, 40 mg/mL, Depo-medrol) e Grupo P (injeção subcutânea de 2mL de Lidocaína a 2%). As medidas de outcome analisa-das foram a dor (avaliada por uma

escala numérica visual (VNS) entre 0 e 10) e função (avaliada pela escala WOMAC), antes da intervenção, ao 1.º, 3.º e 6.º meses após a intervenção. O programa utilizado para fazer a análise estatística foi o IBM-SPSS. Para a comparação dos quatro momentos, foi utilizada a técnica estatística de ANOVA Medidas Repetidas.

Resultados

Em relação ao Grupo A, obteve--se benefício clinica e estatistica-mente significativo (p<0.001), quer em redução de dor (VNS média), quer em otimização funcional (WOMAC médio): VNSinicial 7,29; VNS1ºmês 3,38; VNS3ºmês 3,33; VNS6ºmês 5,57; WOMACinicial 62,29; WOMAC1ºmês 28; WOMAC3ºmês 31,71; WOMAC6ºmês 43,81.

No que concerne ao Grupo B, também se obteve benefício clinica e estatisticamente significativo (p<0.001): VNSinicial 7,43; VNS1ºmês 4,14; VNS3ºmês 4,24; VNS6ºmês 5,38; WOMACinicial 59,43; WOMAC1ºmês 31,71; WOMAC3ºmês 36,90; WOMAC6ºmês 44,38.

O Grupo C também apresentou benefício estatisticamente signifi-cativo (p<0.001), com maior ganho clinico-funcional ao 1.º mês, que foi progressivamente diminuindo, mas que se manteve estatistica-mente significativo ao fim dos 6 meses: VNSinicial 7,48; VNS1ºmês 3,33; VNS3ºmês 5,95; VNS6ºmês 5,95; WOMACinicial 42,14; WOMAC1ºmês 25,71; WOMAC3ºmês 38,48; WOMAC6ºmês 38,48.

O Grupo Placebo não demons-trou alterações estatisticamente significativas nas duas medidas de outcome analisadas: VNSinicial 7,48; VNS1ºmês 6,95; VNS3ºmês 6,95; VNS6ºmês 6,95; WOMACinicial 54,05; WOMAC1ºmês 56,43; WOMAC3ºmês 56,43; WOMAC6ºmês 56,43.

Quadro extraído de: http://www.morei-rajr.com.br/revistas.asp?fase=r003&id_materia=4766

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Revista de Medicina Desportiva informa Setembro 2017 · 25

Discussão e Conclusão

A literatura atual, mas também a nossa experiência, têm demons-trado efeitos positivos das injeções IA na abordagem da OA do joelho. A perceção de que este benefício está relacionado com o real efeito modificador da doença ou também dependente de um efeito placebo já não se encontra tão bem esclarecida. Para além deste facto, não sabemos até ao momento quando e quais os fármacos / produtos biológicos a usar, CS, AH ou PRP. O mecanismo subjacente à eficácia anti-inflamató-ria dos CS em ambiente intra-articu-lar é multifactorial, no entanto neste contexto específico está relacionado com o bloqueio da opsonização dos antigénios, adesão leucocitária e diapedese das citocinas do endoté-lio capilar. Ao mesmo tempo, este potente anti-inflamatório diminui

os efeitos da IL-1, reduz a libertação de leucotrienos e de prostaglandi-nas e inibe a ação das MMPs e da síntese de imunoglobulinas.8 Os CS habitualmente mais utilizados na terapêutica intra-articular são a triamcinolona, a betametasona e a metilprednisolona, habitualmente considerados de esteroides de ação média a longa.9 A duração de ação do ponto de vista intra-articular é controversa e pouco taxativa, exis-tindo estudos que apontam efeitos entre 1 a 24 semanas.

No que concerne ao AH, este dis-positivo médico é um glucosamino-glicano de alto peso molecular cons-tituído por unidades repetidas de N-acetilglucosamina e ácido gluco-rónico.10 Encontra-se habitualmente presente na camada mais superficial da cartilagem humana e constitui o principal componente do líquido sinovial.11 É produzido pelos sinovió-

citos do tipo B, condrócitos e fibroblas-tos.12 O peso molecular médio do AH do líquido sinovial de um indivíduo normal varia entre os 5 e os 7 × 106 Da. Num joelho com OA o peso molecu-lar do HA no líquido sino-vial encontra--se diminuído na ordem dos 33-50%.12 O pressuposto teórico da injeção intra--articular de AH ou viscossuple-mentação defende que esta interven-ção melhora a elasticidade da cartilagem, otimiza a vis-cosidade do líquido sino-vial e conse-quentemente

obtém ganhos em termos de lubri-ficação e capacidade de absorção de choque/carga.8 No entanto, até à data, não existem dados franca-mente conclusivos e evidentes do seu mecanismo de ação. Poderá estar também envolvido na atenua-ção de vias inflamatórias, dimi-nuindo fenómenos de fagocitose, produção de prostaglandinas e fibronectina.12

O PRP é um produto biológico com interesse na medicina regenerativa pelo seu potencial em modular a evo-lução das lesões musculoesqueléticas e osteoarticulares. O PRP não é mais que plasma autólogo com uma con-centração significativamente mais elevada de plaquetas e fatores de crescimento associados em relação ao plasma fisiológico. A concentração de plaquetas numa solução de PRP habitualmente corresponde a 4 a 7 vezes a concentração base do sangue periférico do indivíduo, sendo que alguns autores defendem que con-centrações inferiores ou superiores a este intervalo são pouco efetivas ou mesmo deletérias, inibindo o processo de regeneração.13 Classi-camente o PRP é classificado em quatro categorias, de acordo com o seu conteúdo em leucócitos e fibrina, nomeadamente PRP puro ou pobre em leucócitos, PRP rico em leucóci-tos, PRP puro com fibrina e PRP rico em leucócitos e fibrina.14

Os factores de crescimento habi-tualmente presentes numa solução de PRP incluem IGD-1, PDGF e TGF-b, entre outras moléculas de interesse anabólico e anti-inflamatório.15

Estes fatores atuam a nível dos condrócitos, promovendo a síntese da matriz extracelular da cartila-gem, aumentando o crescimento e migração celular nas áreas de lesão e facilitando a transcrição de proteí-nas. O IGF-1 tem efeitos anabólicos a nível da articulação, estimulando a formação de colagénio do tipo II, pro-teoglicanos e outros componentes da matriz extracelular, com franco benefício do ponto de vista fisioló-gico, pela sua ação na promoção da adesão entre condrócitos e inibi-ção dos fenómenos de proteólise a nível do microambiente da matriz extracelular. Por sua vez, o PDGF e o TGF-b estimulam a produção de condrócitos, sendo que este último fator tem demonstrado efeito na

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26 Setembro 2017 www.revdesportiva.pt

promoção da diferenciação entre células tronco mesenquimatosas articulares em condrócitos.16 Para além deste efeito a nível do metabo-lismo articular, o PRP também tem demonstrado eficácia no controlo de citocinas inflamatórias, nomeada-mente NFk-B e IL-6.15 Neste sentido, o propósito racional para o seu uso na OA do joelho é justificado pela libertação supra-fisiológica destes fatores de crescimento plaquetários na cartilagem articular com lesão, estimulando e acelerando dessa forma a natural cascata inflamató-ria e os processos de proliferação e regeneração tecidulares, mediando ao mesmo tempo a resposta anti--inflamatória.17

Este estudo, com uma popula-ção de doentes com OA moderada, demonstra que todas as interven-ções IA avaliadas produziram bene-fício estatisticamente significativo a curto e a médio prazo em relação ao placebo, quer em termos de dor, quer em termos de função. Percebe--se que, como expectável, o CS apresenta melhores resultados ao 1.º mês e que perde muito do benefício logo ao 3.º mês, mas que ao final de 6 meses ainda apresenta ganhos positivos significativos. A médio prazo, segundo este estudo, o AH e o PRP serão as melhores alternativas terapêuticas na abordagem desta patologia. Este estudo apresenta várias limitações: não constitui um ensaio clínico randomizado, a população foi selecionada com base numa amostra de conveniência, a escala de dor (VNS) e a escala funcio-nal (WOMAC) baseiam-se em dados subjetivos e, até ao momento, apenas podemos retirar conclusões relativas a esta população de doentes a curto e a médio prazo. Neste sentido, este estudo vai continuar com reavalia-ção das medidas de outcome aos 12 e 18 meses de follow-up, para aferir do real potencial destas intervenções a longo prazo. Serão necessários mais estudos randomizados para corro-borar a validade destes resultados a curto, médio e longo prazo.

O autor declara não haver conflitos de interesse.

Correspondência para:José Luís CarvalhoServiço de Medicina Física e de Reabilita-ção, Hospital da Prelada, [email protected]

Bibliografia

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Regulamento das Comunicações Livres para o Congresso da SPAT

1. As propostas devem ser originais e os temas apresentados deverão ser no âmbito das temáticas em discussão reportando descobertas de pesquisa relevantes

2. O resumo deve ser escrito em português e em inglês e a data limite para o envio é até 24/10. Enviar para [email protected]

3. Deve incluir título, introdução, objetivos do estudo, metodologia, resultados, conclusões e biblio-grafia e não exceder 500 palavras

4. Os resumos deverão ser enviados em formato PDF e obedecer aos itens seguintes: letra Times New Roman, tamanho 12, margem direita e esquerda de 3cm, e superior e inferior de 3cm, espa-çamento entre linhas 1,5; sem espaçamento entre parágrafos; alinhamento justificado

5. Os autores devem colocar os nomes completos, com indica-ção do autor que apresentará o trabalho e a respetiva forma de contacto por e-mail; o número de autores não poderá ultrapassar cinco; pelo menos um dos auto-res tem de estar inscrito e com pagamento efetivado quando o resumo for aceite. A falta de pagamento implica a eliminação do resumo proposto; será emitido um certificado por participante. Os trabalhos com autores mem-bros das Comissões do evento poderão ser aceites, mas não serão submetidos a concurso. Apenas o 1º autor será informado da aceitação ou recusa

6. As Comunicações Livres realizar--se-ão no dia 30/11

7. A melhor comunicação será premiada e será apresentada no Congresso da ESSKA em 2018

8. A seriação dos trabalhos é da total responsabilidade do júri de avaliação e da sua decisão não cabe recurso

9. O prémio será atribuído, apenas aos autores ou co-autores que estiverem presentes na sessão de encerramento. Se o (s) autor (es) ou co-autor (es) não estiverem presentes, perdem o direito ao respetivo prémio

10. Mais informações em www.spat.pt

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Revista de Medicina Desportiva informa Setembro 2017 · 27

Instabilidade Glenoumeral Traumática do OmbroDr. Bruno Direito Santos1, Dr. Nuno Ferreira2,3, Dr. Nuno Sevivas2–5 1Interno de formação específica Hospital de Braga; 2Especialista em Ortopedia e Traumatologia Hospital de Braga 3Hospital Privado de Braga 4Clínica do Dragão 5Escola de Medicina do Minho e ICVS (Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde)/3B’s – Laboratório Associado

RESUMO / ABSTRACTA luxação anterior do ombro é muitas vezes complicada de instabilidade recorrente que ocorre em mais de 60% dos casos. A instabilidade deve-se a uma translação exagerada da cabeça do úmero sobre a glenoide que causa sintomatologia. Várias alterações anatómicas contribuem para a sua recorrência, como as lesões de Bankart e de Hill-Sachs. Por ser um evento traumático frequente em ambiente desportivo, o seu reconhecimento e avaliação clínica são de máxima importância. No atleta, o tratamento cirúrgico é frequentemente recomendado pelo impacto positivo no desempenho desportivo e na prevenção de recidiva.

The anterior shoulder dislocation is sometimes the cause of recurrent instability that can occur in more of 60% of the cases. The instability is caused by an excessive translation of the head of the humerus over the glenoid that causes symptoms. Several anatomic alterations are responsible for this recurrence, such as the Bankart and the Hill-Sachs injuries. Since it is a frequent traumatic event on sports environment, there should be great attention on the diagnosis and on the clinical evaluation. In the athlete, the surgical treatment is frequently recommended because of the positive outcome on sports performance and on the prevention of the recurrence.

PALAVRAS-CHAVE / KEYWORDSInstabilidade glenoumeral, luxação do ombro, técnica de Bankart, técnica de Bristow-LatarjetGleno-humeral instability, shoulder dislocation, Bankart procedure, Bristow-Latarjet procedure

Tem

aRev. Medicina Desportiva informa, 2017, 8 (5), pp. 27–29

Introdução

A instabilidade glenoumeral (IGU) anterior traumática é uma das apre-sentações clínicas mais frequentes e debilitantes a afetar o complexo articular do ombro. A incidência da luxação traumática do ombro na população geral é de 8-24 em cada 100.000 pessoas/ano. Apresenta uma apresentação etária bimodal nas 2.ª e a 6.ª décadas de vida. O sexo mascu-lino é três vezes mais afetado que o sexo feminino e aproximadamente 90% das luxações ocorrem no homem jovem e atleta.1,2 Além da disfunção e das possíveis complicações associa-das, a taxa de recidiva após o primeiro episódio de luxação do ombro chega aos 80% e 50% na segunda e terceira décadas de vida, respetivamente.3,4 A probabilidade e a quantidade de epi-sódios de recidiva são inversamente proporcionais à idade aquando do primeiro episódio.5,6

Patofisiologia

O ombro é uma articulação depen-dente tanto de estruturas dinâmicas

como estáticas para manter a con-gruência, a estabilidade e a mobili-dade completa. Os estabilizadores estáticos incluem os ligamentos glenoumerais (sendo o ligamento glenoumeral inferior – LGUI – aquele que tem uma função mais impor-tante na estabilidade), o labrum glenoideu, a pressão negativa intra--articular e as superfícies articulares da cabeça do úmero e da glenoide. Os estabilizadores dinâmicos consis-tem nas estruturas miotendinosas peri-articulares: a coifa dos rota-dores (músculos supra-espinhoso, infra-espinhoso redondo menor e subescapular), músculo deltoide e a longa porção do bicípite.7

A IGU resulta da translação exces-siva da cabeça do úmero em relação à glenoide resultando em sintoma-tologia associada a perda de função por dor e apreensão. A hiperlaxidão diferencia-se de instabilidade por ser um estado constitucional do indivíduo sem que esteja necessa-riamente associado a disfunção. Em alguns casos a hiperlaxidão pode ser uma vantagem para determi-nada atividade desportiva, porém está frequentemente associada a

instabilidade após traumatismos minor.8

O fenómeno de luxação resulta em alterações estruturais patoló-gicas que determinam a clínica e o prognóstico. A lesão mais frequente é a avulsão do labrum ântero-infe-rior no qual está inserido a banda anterior do LGUI, também denomi-nada lesão de Bankart. A recorrên-cia da instabilidade resulta numa deformação plástica deste ligamento e consequente incompetência na manutenção da congruência articu-lar aquando da abdução e rotação externa (movimento frequente nos desportos de remate).3 A estrutura óssea da glenoide nesta localiza-ção pode sofrer perdas ou avulsões ósseas secundárias à luxação (lesão de Bankart óssea).9 A maioria dos doentes com episódios repetidos de IGU apresenta uma impressão óssea na margem póstero-lateral da cabeça umeral (lesão de Hills-Sachs). Esta lesão pode impactar a cabeça umeral no rebordo da glenoide e predispor a instabilidade articular quando o defeito é superior a 30% da superfície articular umeral.10

A rotura pós-traumática da coifa dos rotadores, a fratura da grande tuberosidade do úmero ou lesões neurovasculares são raras no indi-víduo jovem e atleta, observando-se essencialmente após os 60 anos de idade.11

Classificação

Classicamente, a definição da IGU visou a descrição da direção, a gra-vidade da luxação e o seu caráter temporal, sem, no entanto, terem sido estritamente definidos crité-rios com reprodutibilidade inter e intra-observador. Matsen e Johnson agruparam a IGU em dois cenários clínicos frequentes: Traumatic, Uni-lateral, Bankart lesion, Surgical stabi-lization (TUBS) ou Atraumatic, Multi--directional, Bilateral, Rehabilitation, inferior capsular shift (AMBRI).12 Este agrupamento compreende extremos de apresentação clínica e não pres-supõe contextos partilhados (e.g. IGU unilateral após traumatismo minor ou atraumática e com necessidade de estabilização). A dificuldade em estratificar ou agrupar a IGU deve--se à variabilidade na apresentação

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clínica, na recorrência e no grau de disfunção envolvida.13 O sistema de classificação FEDS (Frequency, Etiology, Direction, Severity), descrito por Kuhn em 2010, reduz a descrição da insta-bilidade aos parâmetros Frequência, Etiologia, Direção e gravidade tendo demonstrado boa variabilidade intra e inter-observador.14

Episódio de luxação – apresentação clínica

A manifestação mais frequente da IGU em contexto desportivo é a luxação traumática anterior da articulação GU. É uma verdadeira urgência ortopédica devido às possí-veis complicações neurovasculares e articulares associadas à incongruên-cia articular. O principal mecanismo de trauma é a aplicação de uma força posterior no membro em extensão, abdução e rotação externa, deslocando a cabeça do úmero anterior e inferiormente à apófise coracoide. No contexto traumático agudo, o doente segura o membro afetado com a mão contralateral e objetiva-se limitação funcional severa, dor e deformidade (vazio subacromial e tumefação deltopeito-ral) no ombro afetado (Figura 1).15

A avaliação inicial do doente com suspeita de luxação anterior do ombro consiste na avaliação neurovascular no membro afetado pelo risco de dano no nervo axilar, o mais frequente (Figura 2), nervo radial, plexo braquial ou vasos axi-lares.3 Deve ser iniciada analgesia

endovenosa e o doente deve ser colocado em posição confortável. Em nenhum momento devem ser tentadas manobras de redução pre-viamente à realização de estudo ima-giológico e de explicar ao doente o procedimento padrão de tratamento.

O estudo imagiológico inicial em contexto de urgência consiste na radiografia convencional com uma incidência ântero-posterior e uma incidência em perfil para confirmar a luxação GU. As incidências de perfil mais comuns são a axilar, em Y ou de Lamy, sendo esta última a preferida por evitar a mobilização do membro afetado.15 A radiografia convencional é também o exame de escolha para confirmar a con-gruência articular após redução. A TC é o método de eleição para avaliar lesões concomitantes em contexto agudo (fratura da grande tuberosidade, colo do úmero ou da superfície glenoideia e lesão óssea de Bankart).16

O tratamento padrão do episódio de luxação do ombro após redução bem sucedida e confirmada é a imobilização do membro em rota-ção interna (existe ainda alguma polémica se a posição mais eficaz na prevenção de novos episódios deve ser em rotação interna ou externa) durante três semanas com reabilita-ção muscular peri-articular precoce.4 A idade, a demanda funcional do membro afetado, o desporto de alta competição e a altura da época em que ocorre a lesão são fatores deter-minantes na ponderação de um tratamento cirúrgico inicial.17

Instabilidade recorrente – apresentação clínica

No doente que se apresenta em contexto eletivo, com IGU associada a múltiplos episódios de luxação ou com sensação de microinstabilidade, dois aspetos devem ser visados no estadiamento da instabilidade: a sensação de apreensão e a limitação funcional com impacto na perfor-mance desportiva.17 A avaliação clí-nica analisa o impacto na atividade do membro, a presença de dor e de limitação no arco de mobilidade. Objetivamente, a presença do sinal do sulco e um teste de apreensão positivo são altamente preditivos de instabilidade significativa.17 O caráter recidivante verificado em indivíduos jovens deve-se à hiperla-xidão de base, ao regresso precoce à atividade desportiva, à prática de modalidades de contacto, à realiza-ção ineficiente de reabilitação peri--articular e a uma maior lesão cap-suloligamentar no primeiro episódio de luxação.18 A microinstabilidade resulta de traumatismos repetiti-vos e de baixa energia decorrentes de movimentos acima da cabeça e no limite do arco de mobilidade, verificando-se adicionalmente lesões associadas (rotura do supra e do infra-espinhoso e rotura do labrum posterior e superior).19

O estudo complementar inicia--se com radiografia convencional: três incidências ântero-posteriores (membro em rotação interna, em neutro e em rotação externa) e a incidência de perfil.18 A TC permite a quantificação e o impacto das lesões ósseas associadas na instabilidade

Fig. 1 – Luxação traumática aguda do ombro esquerdo. O doente segura o membro afetado com a mão contrala-teral e visualiza-se uma deformidade evidente com vazio subacromial (seta) e tumefação deltopeitoral no ombro afe-tado, o esquerdo.

Fig. 2 – Potencial risco de lesão de nervos (https://www.physio-pedia.com/Shoul-der_Dislocation)

Fig. 3 – Artro-Rm do ombro. Visualiza-se perda óssea de aproximadamente 25% do rebordo anterior da glenoide.

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GU podendo ser necessária para estadiamento terapêutico. A RM permite a avaliação de lesões mio-tendinosas, condrais e labrais, assim como localizar as lesões ligamenta-res inerentes que comprometem a estabilidade articular. É, por isso, e sobretudo se associada a contraste intra-articular (artro-RM), o exame de eleição para avaliação do LGUI e da cápsula articular ântero-inferior, estruturas mais frequentemente lesionadas na instabilidade GU recidivante (Figura 3). Além disso, é essencial excluir lesões associadas na medida que podem ser incluí-das num tratamento cirúrgico, como as lesões do labrum superior que se estendem de anterior para posterior (lesão SLAP) ou a avulsão perióssea da inserção do LGUI (lesão ALPSA).16,20

Tratamento

O tratamento cirúrgico tem como objetivos a resolução dos episódios de luxação, a melhoria funcional e da performance desportiva, mas também a prevenção de artropatia degenerativa associada à instabi-lidade e aos episódios repetidos de luxação GU.21 A indicação e opções cirúrgicas para correção da IGU são ainda alvo de debate face ao elevado número de técnicas descritas ao longo do tempo. Apesar de frequen-temente se optar pelo tratamento conservador no primeiro episódio de luxação, a estabilização cirúrgica poderá estar indicada no subgrupo de doentes jovens com necessidade de retorno a uma atividade despor-tiva de alta competição.21,22 Os pro-cedimentos melhor descritos, maior taxa de sucesso e maior tempo de acompanhamento na literatura são as técnicas de Bankart e de Bristow--Latarjet, classicamente realizadas por via aberta. Contudo, atualmente são realizadas preferencialmente por via artroscópica com igual taxa de sucesso cirúrgico, menor agressi-vidade das estruturas peri-articula-res, menos dor associada e melhor recuperação funcional.23

A técnica de Bankart, também descrita na literatura como “anató-mica”, visa a reinserção anatómica das estruturas capsuloligamentares lesionadas enquanto a técnica de

Bristow-Latarjet está preferencial-mente indicada quando o risco de recorrência previsto é maior, com defeitos ósseos glenoumerais de maiores dimensões, visando a trans-ferência da apófise coracoide e do tendão conjunto que nela se insere (com os tendões coracobraquial e porção curta do bicípite) para o bordo anterior da glenoide.7 A reci-diva pós-operatória pode ser anteci-pada através da avaliação de fatores de risco e das características das lesões associadas à IGU. O Instability Severity Index Score (ISIS), descrito por Pascal Boileau, tem em conta a idade, o grau e o tipo de deporto praticado, a presença de hiperlaxidão e a presença de lesões ósseas no úmero ou na glenoide. Caso o score pré--operatório seja igual ou superior a 6, está indicada a técnica de Bristow--Latarjet dado a técnica de Bankart estar associada a taxas de recidiva de 70% neste grupo de doentes.18 Existe, no entanto, uma tendência para realização da técnica de Latar-jet em atletas por estar associada a melhor e maior retorno à prática desportiva prévia, principalmente em desportos que impliquem mobi-lização do ombro acima da cabeça.24 Atualmente, existe uma tendência para indicar a técnica de Bristow--Latarjet, inclusive em valores mais baixos do score ISIS (>3), porque dá uma segurança maior e uma taxa de recidiva inferior.

Conclusão

A instabilidade glenoumeral é fre-quente no contexto desportivo tendo um impacto importante no desem-penho do atleta. O reconhecimento do episódio de luxação é mandatório devido às complicações neuro-vasculares e articulares possíveis. O tratamento cirúrgico é muitas vezes antecipado no atleta com alta demanda funcional por estar asso-ciado a menores taxas de recidiva.

Os autores declaram não haver conflitos de interesse ou económicos.

Correspondência para: Nuno SevivasServiço de Ortopedia e Traumatologia – Hospital de BragaSete Fontes, São Victor; 4710-423 Braga

Bibliografia em: www.revdesportiva.pt (A Revista Online)

O programa geral

Sete sessões temáticas1. LCA: o que há de novo? 2. LPFM: o que há de novo? 3. Tornozelo: conceitos atuais. Ins-

tabilidades e lesões condrais do tornozelo

4. Ombro: conceitos atuais 5. Osteoartrose e lesão meniscal 6. Traumatologia desportiva: espe-

cificidades e dificuldades7. Anca: conflito femoroacetabular

Três conferências1. Reconstrução capsular superior –

Prof. Doutor Stefan Greiner 2. O que eu aprendi nas últimas

duas décadas de LCA. O que fiz? O que abandonei? O que vol-tei a fazer? – Prof. Doutor João Espregueira-Mendes

3. Desporto e gonartrose precoce: o papel do desporto na etiolo-gia, progressão e tratamento na gonartrose – Prof. Doutor Jacques Menetrey

Três cross-fires1. Primeiro episódio de luxação do

ombro: Tx cirúrgico vs. Conser-vador

2. Tratamento cirúrgico da recidiva luxação recorrente do ombro: Aberto vs. Artroscopia

3. Luxação acromioclavicular grau III. Tx cirúrgico vs. Tx conservador

Três sessões de comunicações: uma selecionada e duas livres

Duas sessões específicas: para enfermeiros e para fisioterapeutas

Painel do Futebol: apoio médico; lesão; final de carreira. A visão do atleta, do médico, do treinador, do dirigente desportivo e da tutela

Três cerimónias1. Cerimónia de Abertura2. Cerimónia de Homenagem da

SPAT e entrega de prémios para melhor comunicação e poster

3. Cerimónia de Encerramento

Assembleia geral ordinária da SPAT (30/11 – 18:00)

Inscrições online: www.eventos.bayer.pt

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30 Setembro 2017 www.revdesportiva.pt

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O médico ortopedista Hélder Pereira foi distinguido com o Prémio Jan Gillquist Scientific Award pelo 2.º melhor trabalho de investigação (de entre os milhares apresentados de todo o

Mundo), no XVII Congresso Mundial da maior Sociedade Internacional de Ortopedia, realizado em Xangai, na China, em maio. Esta distinção está seguramente entre as mais importantes da Ortopedia e Trau-matologia Desportiva Portuguesa no plano internacional. Este trabalho foi realizado em colaboração com os Drs. Kenneth Hunt e Pieter D’Hooghe da Universidade de Denver (EUA). Foi reconhecido pela ISAKOS (Internatio-nal Society of Arthroscopy, Knee Surgery and Orthopaedic Sports Medicine) pelo seu impacto no desenvolvimento técnico do tratamento das lesões ligamentares do tornozelo, as quais são das mais frequentes lesões trau-máticas, particularmente no des-porto. O Dr. Hélder Pereira enaltece o trabalho de excelência de toda uma equipa, com elementos de vários can-tos do Mundo e, sobretudo, o apoio que sempre tem tido do Serviço de Ortopedia do Centro Hospitalar Póvoa de Varzim – Vila do Conde e do Grupo de Investigação 3 Bs da Universidade do Minho. The role of calcaneofibular ligament (CFL) injury in ankle instability: Implications for surgical management foi o trabalho premiado e será publicado na revista americana Arthroscopy.

A Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Faculdade de Medi-cina do

Porto estabeleceram uma parceria destinada à formação de médicos, enfermeiros e fisioterapeutas com interesse no apoio ao jogador de futebol. De acordo com a nota de

apresentação publicada no site da FPF, são objetivos desta ação “dotar médicos, enfermeiros e fisioterapeutas de conhecimentos e competências em áreas específicas da emergência médica, da avaliação e tratamento de lesões e doenças, do antidoping e do funcionamento de um departamento médico.” São dois programas de formação con-tínua, um destinado a médicos e o outro destinado a fisioterapeutas e a enfermeiros. Desenvolver-se-ão em regime presencial (pelo menos 75% de presenças na sala de aula) ou à distância (pelo menos 75% das aulas assistidas por videoconfe-rência) e decorrerá entre outubro 2017 e junho 2018. Os formadores são quase na totalidade elemen-tos envolvidos ao apoio médico de seleções nacionais de futebol. Mais pormenores deste curso, que se pretende afirmar “no contexto do UEFA Football Doctor Education Programme”, podem ser consultados no site da FPF (http://www.fpf.pt/pt/News/Todas-as-not%C3%ADcias/Not%C3%ADcia/news/12967).

Decorreram no dia 3 de junho as 3.as Jornadas de Medicina Desportiva do Rio Ave F C no auditório dos Hospitais Senhor

do Bonfim, em Touguinhó – Vila do Conde. Foram 126 dos inscritos que levantaram as pastas no secre-tariado e puderam beneficiar de informação médico-desportiva e de troca de opiniões e de experiências. Estiveram organizadas em quatro áreas temáticas: coluna, tornozelo (esta na dependência da SPAT), joe-lho e tendão. Houve ainda algumas sessões práticas que cativaram o interesse dos previamente inscritos. A organização, apesar do baixo custo de inscrição, ofereceu o almoço de trabalho. Estas Jornadas tiveram o patrocínio científico da SPMD, da SPOT e da SPAT. Destaque ainda para a grande colaboração do hospital, que tudo fez para que os participan-tes se sentissem bem. De facto, o excelente auditório, o imenso parque de estacionamento e a bela

vista para o exterior contribuíram, e muito, para o sucesso do evento. O sr. Manuel Agonia, Presidente do Con-selho de Administração teve muita responsabilidade para que tal aconte-cesse. A data das próximas Jornadas está já marcada e espera-se que em maio de 2018 mais participantes beneficiam deste evento científico.

Foi publicado em junho no British Journal of Sports Medicine (DOI: 10.1136/bjsports-2017-097758) um artigo com a apresentação da plata-forma de prescrição de exercício do Diabetes em Movimento® (Romeu Men-des, Nelson Sousa, Marcos Agostinho, Victor Reis & José Themudo-Barata. Diabetes em Movimento® – a Portu-guese web-based platform to support exercise prescription by medical doc-tors). Esta plataforma de prescrição de exercício físico foi desenvolvida no âmbito do Diabetes em Movimento®, um programa comunitário de exercí-cio físico para pessoas com diabetes tipo 2, e pode ser usada para apoiar a prescrição de exercício especial-mente no contexto da prevenção e tratamento das doenças crónicas não transmissíveis. Foi inspirada na prescrição eletrónica de medicamen-tos e permite construir um programa personalizado a partir de uma base de dados de exercícios (com o apoio de fotografias e vídeos), editar os parâmetros básicos de prescrição (frequência semanal, duração, séries, repetições e intensidade), selecionar recomendações para a prevenção de eventos adversos, e ainda ajustar a dose de insulina nos dias de exer-cício. Todos os exercícios são muito simples e podem ser realizados ape-nas com uma cadeira, duas garrafas de água cheias com areia e uma bola de mão. No final é possível impri-mir o programa de exercício para entregar ao utente, como se de uma “receita de estilo de vida” se tratasse. A sua utilização, embora gratuita, é reservada para médicos registados em Portugal. Drs. Marcos Agostinho (foto) e Romeu Mendes.

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Revista de Medicina Desportiva informa Setembro 2017 · 31

Neste boletim da SPMD publica-se um excelente artigo de revisão sobre conteúdos da área da otorrinolarin-gologia (ORL) sob a coordenação do prof. Doutor Óscar Dias da Facul-dade de Medicina de Lisboa. Os con-teúdos são “A importância da ORL no desporto”, “A prática desportiva e a otorrinolaringologia” e “Obstrução nasal e desporto”. Apesar de todos os temas abordadas serem impor-tantes, deve realçar-se a abordagem que se dá à “tentativa de identificar previamente fatores predisponen-tes”, “a prática de mergulho e a pato-logia ORL”, as patologias do ouvido externo e médio, assim como a obs-trução nasal, onde a hipertrofia das adenoides e o desvio do septo mere-cem realce. É por de mais sabida, mas menos vezes identificada e poucas vezes tratada a patologia obstrutiva do nariz, com consequên-cias sobre o rendimento desportivo, aspeto também abordado neste texto, o qual se lê de forma fácil e possui riqueza pedagógica. O texto integra-se nas atividades do Centro de Investigação ORL da Faculdade de Medicina de Lisboa e poderá ser lido no site da SPMD.

O 10.º Congresso da Federação Euro-peia de Associations de Medicina Desportiva (EFSMA) será realizado em Portugal, no Centro de Congres-sos do Estoril, de 16 a 18 de novem-bro próximos. É de facto uma honra e motivo de orgulho que um con-gresso tão importante se realize no nosso país, pelo que todos que pode-rem devem satisfazer o desejo do sr. Presidente da EFSMA, o Dr. André Debruyne, o qual refere na sua men-sagem o desejo de os lá encontrar, pois “Esta grande reunião interna-cional abordará um amplo espectro de conhecimento científico e de investigação no domínio da Medi-cina Desportiva e das Associações

de Medicina Desportiva”. Os temas incluem conteúdos médicos (pato-logias crónicas, cérebro, a atleta feminina, o rastreio de doenças cardíacas, etc.), mas também da nutrição, do controlo do treino e da patologia musculoesquelética. Num dos dias haverá o FIMS Team Phy-sician Course (parte I de manhã e à tarde a parte II), assim como o FIMS Team Physician Instructor Course. Haverá ainda a possibilidade de fazer Apresentações orais e partici-par no elegante Programa Social. Os associados da SPMD beneficiam de um generoso desconto na tarifa de inscrição. Depois do 9.º Congresso Europeu de Medicina Desportiva da FIMS, realizado no Porto em 1997, mais um evento de elevado prestígio se realizará no nosso país.

Foi exata-mente há 20 anos que se realizou no Porto o 9.º Congresso Europeu de Medicina Desportiva da FIMS. A organização foi do F C Porto

e liderada pelo diretor desta Revista, o Dr. Basil Ribeiro. Estiveram presentes quase quatro centenas de participan-tes, oriundos de diversos países, que ao longo de quatro dias partilharam conhecimentos, por vezes em três sessões simultâneas. Na altura era Presidente da FIMS o Dr. Eduardo de Rose que apresentou a conferência inaugural, sendo a de encerramento feita pelo saudoso Prof. Doutor Falcão de Freitas. O Dr. Robert Malina fez uma conferência sobre o crescimento e a maturação. Houve vários simpó-sios, assim como sessões de “Contro-vérsias”. Já nessa altura se discutiu o tratamento conservador ou cirúrgico do tendão de Aquiles ou do ligamento cruzado posterior. A mulher no desporto, a lesão do LCA, alergia e desporto, a nutrição, a cardiologia, a biomecânica foram alguns dos temas apresentados. Também houve workshops: o exame da coluna, o teste de esforço, o exame do ombro, etc. O programa social foi generoso e incluiu visita às Caves Vinho do Porto, passeio

de barco no Rio Douro, jantar na Bolsa do Porto, receção na Câmara Munici-pal, ida à discoteca, visita a Fátima e ás Grutas, e tudo incluído no preço da inscrição. Antes do Congresso, a comissão executiva da FIMS reuniu alguns dias no Hotel das termas em Vidago. Deslumbrante! Agora, em Cascais, 20 depois, temos outro grande evento. Estamos bem.

A American Orthopaedic Society Sports Medicine (AOSSM) criou este programa destinado a ajudar pais, treinadores, outros cuidadores de saúde e atletas, para que possam saber mais sobre prevenção, tra-tamento e consequências a longo prazo sobre as lesões traumáticas e de sobrecarga crónica. De facto, as estatísticas são preocupantes. Neste site refere-se que “entre os atletas de 5 a 14 anos de idade, 28% dos jogadores de futebol americano, 25% de beisebol, 22% de futebol, 15% de basquetebol e 12% de softball já sofreram lesões enquanto pratica-vam os seus desportos, … as quais contribuem para quase 40% de todas as lesões desportivas tratadas nos hospitais … e a taxa e gravidade aumentam com o evoluir da idade”. Preocupante nestas idades jovens é que “as lesões de sobrecarga são responsáveis por quase metade de todas as lesões desportivas no ensino secundário”. No site é possível encontrar PDFs com dicas preventi-vas para 25 desportos, os quais são de fácil e rápida leitura. Há ainda PDFs centrados em temáticas, como o LCA, a concussão ou a tríada femi-nina. O In the Game é uma e-newsletter publicada quatro vezes por ano com artigos simples para atletas e pais, cuja assinatura é gratuita. Há ainda a possibilidade do Get involved, atra-vés da adesão à equipa, divulgação ou fazer um donativo (o doador terá o seu nome no site), assim como da participação no Blog. Este site já pode ser consultado na Revista em: www.revdesportiva.pt.

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32 Setembro 2017 www.revdesportiva.pt

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nd

a SetembroNew Insights in the Treatment of Chronic Ankle Instability

Local: Bordéus, França

Congreso Internacional de Ciencias de la Actividad Física, el Deporte y la Salud

Local: San Miguel de Tucumán, Argentina

10éme Congrès Commun SFMES-SFTS

Local: Marselha, França

ACSM – Team Physician Course

Local: S. Diego – EUA

Essentials of Sports Medicine: From Sideline to the Clinic (Team Physician Course)

Local: San Diego, Califórnia

4th Saúde Atlântica, ISAKOS e ESSKA International Meeting

Local: Porto – Portugal

I Congreso Internacional en Prevención y Readaptación Física Interdisciplinar

Local: Granada, Espanha

Comprehensive Hip Arthroscopy: Cartilage, Impingement, and Beyond

Local: Rosemont, Ill, EUA

Developments in doping – keeping sport clean

Local: Londres, Reino Unido

Primary Care Sports Medicine 2017

Local: Vermont, EUA

54.º Congreso Nacional de la Sociedad Española de Cirugía Ortopédica y Traumatología (SECOT)

Local: Barcelona, Espanha

Twin Cities Sports Medicine Conference 2017

Local: Mineapolis St. Paul, EUA

VII Congreso Iberoamericano de Nutrición

Local: Cuzco, Perú

4.º Encontro de Medicina desportiva

Local: Vilamoura

OutubroJornadas de Medicina Desportiva do Vitória de Guimarães

Local: Estádio D. Afonso Henriques, Guimarães

2nd Biennal ESSKA-ESA Meeting: 360º Around Shoulder Instability

Local: Cracóvia, Polónia

4th International Symposium on Intra-Articular Treatment

Local: Praga, República Checa

II World Conference of Sports Physiotherapy

Local: Belfast, Irlanda do Norte

Congrès National de Traumatologie

Local: Grenoble, França

Shoulder Tips & Tricks: Arthroscopy to Rehabilitation

Local: Rosemont, Ill, EUA

British Association of Sport & Exercise Medicine and Faculty of Sport & Exercise Medicine Conference 2017

Local: Bath, Reino Unido

Congreso Peruano de Ortopedia y Traumatologìa

Local: Lima, Perú

International Scientific Conference on Applied Sports Science (ISCASS)

Local: Alexandria, Egito

The Cutting Edge 2017: Arthroscopic and Open Shoulder Techniques in the Athlete’s Shoulder

Local: Rosemont, IL – EUA

ESSKA EKA Open Meeting: Innovation in degenerative knee surgery

Local: Berlim, Alemanha

XXI Congreso Internacional de Nutrición

Local: Buenos Aires, Argentina

48.º Congreso Nacional de Podología

Local: Salamanca, Espanha

European Medical Fitness Congress

Local: Barcelona, Espanha

Advanced Comprehensive Knee Ligament Course and Related Surgery

Local: Rosemont, Ill, EUA

German Congress of Orthopedic and Trauma Surgery

Local: Berlim, Alemanha

37.º Congresso Nacional de Ortopedia e Traumatologia – SPOT 2017

Local: Coimbra

International Congress on Sports Sciences and Research

Local: Funchal, Madeira

NovembroQue hay de nuevo en la Traumatologia de los deportes de nieve?

Local: Madrid, Espanha

ESSKA-ESMA Open Meeting: Stop Sports Injuries

Local: Munique, Alemanha

Congresso SOFCOT

Local: Paris, França

AIESEP International Conference

Local: Pointe à Pitre, Guadeloupe

6.º Congreso Mundial del Deporte Escolar, Educación Física y Psicomotricidad

Local: La Corunha, Espanha