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PRÉMIO PESSOA INVESTIGAÇÃO PREMIADA. A cientista Maria Manuel Mota (42 anos), do Instituto de Medicina Molecular, do Porto, foi distinguida com o Prémio Pessoa 2013, pela Investigação na área da malária. A distinção é atribuída a uma personalidade que «tiver sido protagonista de uma intervenção particularmente relevante e inovadora na vida artística, literária ou cientifica do pais». O Prémio Pessoa vai na 27.' edição ea vencedora receberá um cheque no valor de 60.000 euros

Press Review page©mio-Pessoa.pdf · 2018. 3. 20. · Um "avi-so ao país e ao Governo", salientou. ... mestrado em imunologia e con-cluiu o doutoramento na Univer-sity College de

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  • PRÉMIO PESSOA

    INVESTIGAÇÃO PREMIADA.A cientista Maria Manuel Mota (42 anos),do Instituto de Medicina Molecular,

    do Porto, foi distinguida com o Prémio

    Pessoa 2013, pela Investigação na área

    da malária. A distinção é atribuída a uma

    personalidade que «tiver sido

    protagonista de uma intervenção

    particularmente relevante e inovadora

    na vida artística, literária ou cientifica

    do pais». O Prémio Pessoa vai na 27.'

    edição e a vencedora receberá um

    cheque no valor de 60.000 euros

  • MARIA MANUEL MOTA Fez a parte final da formação noestrangeiro, mas está há anos em Portugal, onde se afirmoucomo uma das mais importantes cientistas mundiais no estu-do da malária. Com 42 anos, é desde ontem a mais jovemvencedora do Prémio Pessoa, foto alberto frias P

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  • Maria Manuel Mota A cientista, que estuda a malária, é a mais jovem vencedora do prémio

    "Estamos cada vez maisperto da vacina da malária.Mas não é para amanhã"

    Maria Manuel Mota, ontem à tarde, no local de trabalho (Instituto de Medicina Molecular, Lisboa), horas após o anúncio do Prémio Pessoa fotoalberto frias

  • uando recebeu o tele-r fonema de Francisco

    Pinto Balsemão, nanoite de quinta-feira,Maria Manuel Motaestava a "preparar ojantar". Durante se-

    k y gundos, pensou que-^ seria sobre qualquerassunto relacionado com o Expresso. Acientista portuguesa, de 42 anos, umasdas mais premiadas e prestigiadas em to-do o mundo entre os investigadores damalária, faz parte do conselho editorialdo jornal — órgão de consulta da admi-nistração e da direção, composto por fi-

    guras de diferentes sectores, que reúne

    periodicamente.Afinal, o contacto de Balsemão era pa-

    ra lhe comunicar que vencera o PrémioPessoa 2013 — uma iniciativa conjuntado Expresso e da Caixa Geral de Depósi-tos — , o mais importante galardão queem Portugal distingue personalidadesda Cultura, Artes ou Ciência. "Foi umasurpresa total".

    Mas receber prémios não é propria-mente uma novidade para a investigado-ra do Instituto de Medicina Molecular,de Lisboa. Três exemplos, entre vários,ilustram o reconhecimento da comuni-dade científica: em 2004, foi um dos 25jovens cientistas galardoados com o Eu-

    ropean Young Investigator Award, demais de um milhão de euros; no ano pas-sado, o European Research Council deuà sua equipa de investigação 1,5 milhõesde euros; Maria Manuel foi o primeiroportuguês a ganhar o estatuto de Inter-national Scholar do prestigiado HowardHughes Medicai Institute.

    Desta vez, o galardão vai além do cir-cuito científico da investigação de umadoença que mata todos os anos mais deum milhão de pessoas. "Uma coisa é aavaliação pelos meus pares. Candidato--me e quando recebo um prémio era al-

    go que esperava. É a comunidade cientí-

    fica que acredita no que faço", disse on-tem Maria Manuel Mota ao Expresso.Com o Prémio Pessoa, atribuído por ini-ciativa do júri, "é a sociedade portugue-sa a acreditar no que faço".

    O júri explicou as razões da distinção.Lembrando que a malária é hoje "umadas causas principais de mortalidade anível mundial", Balsemão salientou queo trabalho da equipa liderada por MariaManuel "tem desenvolvido investigaçãofundamental com vista a esclarecer osmecanismos pelos quais o parasita se de-senvolve no hospedeiro humano".

    A investigadora troca por miúdos em

    que consiste o seu labor. "O nosso lemaé compreender o inimigo para o atacar.O que é que o nosso organismo ofereceao parasita?", questiona, retoricamente.A chave é intervir nas causas, ao invés deagir somente na resposta às consequên-cias. "A nossa estratégia é cortar a fontede alimentação do parasita", assenta.

    A ciência subordinada à ética

    O estudo liderado pela investigadora "é

    indispensável para o desenvolvimentode estratégias de tratamento e preven-ção" da malária, "nomeadamente atra-vés da vacinação", destacou Balsemão.Se a vacina é a terra prometida desta de-manda, a data de chegada é resposta pa-ra um milhão de dólares. Afinal: quãoperto já estamos da vacina? Ou quão lon-ge ainda estamos?

    "Respondo das duas formas", diz pron-tamente Maria Manuel. "Com os avan-ços feitos nos últimos 15/20 anos, esta-mos cada vez mais perto, só podemosestar... Mas não estamos assim tão per-to, não é para amanhã", esclarece. "Éimportante transmitir isso às pessoas.Por vezes, com o entusiasmo, prome-tem-se coisas impossíveis de cumprir".

    Como o anúncio, de um laboratório bri-tânico (feito há dois meses), de que a pri-meira vacina poderá entrar no mercado

    em 2014 (ou 2015), Maria Manuel expli-ca, para bom entendedor: "Essa vacinasó tem 30% de eficácia. E na comunidadecientífica discutimos se, em termos éti-

    cos, faz sentido introduzir uma vacina sócom 30% de eficácia. Se não tiver 90%,nunca poderá erradicar a malária".

    Além da "produtividade científica" de"excecional qualidade", o júri destacououtra faceta de Maria Manuel, desde on-tem a mais jovem premiada com o Pes-soa: "O seu empenhamento entusiásticono que se pode chamar cidadania daciência" (é presidente da Associação Vi-ver a Ciência, que tem "como objetivoencorajar a filantropia em Portugal").

    Este é mais um plano em que MariaManuel Mota dá cartas, agora com maistrunfos. "É muito importante para darvisibilidade à ciência, sobretudo no con-texto atual".

    E este, sendo de crise para todos, é-otambém naturalmente para a Ciência,com cérebros nacionais em fuga. Balse-mão contorna a questão de saber se a es-colha do Prémio Pessoa 2013 pode teruma leitura no atual quadro do debate po-lítico. Salienta, no entanto, que um "fatorconsiderado" na escolha foi "a permanên-cia em Portugal de Maria Manuel Mota",que "recentemente teve um convite mui-to tentador" para trabalhar fora do país.

    Já outro membro do júri, a investigado-ra Maria de Sousa, a pedido de Balse-mão, traduziu tudo em fórmulas claras,como é apanágio da linguagem científi-ca. Salientando que Maria Manuel fazparte de "um tecido de jovens cientistas

    portugueses que inspiram os novos a que-rer fazer ciência" — "ela é excecional,mas não exceção" — , o membro do júricontrapôs a este quadro de excelência "u-ma administração da Ciência que nestemomento é insuficiente, para não dizerem alguns casos incompetente". Um "avi-so ao país e ao Governo", salientou.

  • Elementos do júri durante o anúncio do vencedor, feito por Francisco PintoBalsemão, ontem, ao meio-dia, no Palácio de Seteais, Sintra fototiago miranda

  • Investigação

    Estudoda maláriavale PrémioPessoaa Maria MotaCIÊNCIA PAG. 26

  • PERFIL

    MARIA MOTA> Fez o mestrado

    na Universidade

    do Porto e o doutora-mento na UniversityCollege de Londres,

    em 1998> Tem 42 anos> É investigadora do

    Instituto de MedicinaMolecuLar

    da Universidade

    de Lisboa

    > Desbravou cami-nho na investigaçãosobre a maláriae é uma referênciamundial na área.Tem tido financia-mentos internacio-nais importantes

    Estudo sobre malária valePrémio Pessoa a Maria MotaDistinção. Cientista abriu o caminho na investigação da malária e é reconhecida pelo júri doprémio pela excelência do seu trabalho e também pelo seu empenho na cidadania da ciência

    FILOMENA NAVES

    Quando todos apontavam numúnico sentido, o de desenvolvernovos fármacos para combater amalária, Maria Manuel Mota foipor outro lado e com isso abriuuma nova via para a compreensãoda doença. Fez várias descobertassobre o processo de infeção causa-do pelo parasita da malária, o plas-modium, e sobre as particularida-des do hospedeiro que determi-nam o curso da doença e com issotornou-se uma referência a nívelmundial na área. Ganhou prémiosnacionais e internacionais e verbas

    importantes para o seu trabalho eontem somou mais uma distinçãoao seu já vasto currículo: o PrémioPessoa.

    O júri do prémio realçou o seutrabalho inovador na investigação

    sobre a malária, "uma das causasprincipais de mortalidade a nívelmundial", sublinhando que "o gru-po que constituiu tem desenvolvi-do investigação fundamental comvista a esclarecer os mecanismospelos quais o parasita se desenvol-ve no hospedeiro humano". A "sua"produtividade científica de exce-cional qualidade" e "o seu empe-nho entusiástico no que se podechamar de cidadania da ciência"são também sublinhados pelo júri.

    Maria Manuel Mota, de 42 anos,estudou na Faculdade de Ciênciasda Universidade do Porto, fez omestrado em imunologia e con-cluiu o doutoramento na Univer-sity College de Londres, em 1998.Fez ainda um pós-doutoramentona New York University MedicaiCenter, nos Estados Unidos, termi-nado em 200 1, e depois foi investi-

    gadora no Instituto Gulbenkian deCiência. Desde 2005 é investigado-ra principal do Instituto de Medici-na Molecular (IMM) da Universi-dade de Lisboa, onde continua adesenvolver o trabalho que já aconduziu a várias descobertas.

    Entre elas, a que o processo deinfeção, que começa nas células do

    fígado, não é nada linear, e que agenética do hospedeiro tambémtambém tem um papel - a suaequipa identificou um grupo de

    genes que favorecem a infeção.Conseguiu ainda, juntamente comoutras grupos, identificar algunscompostos novos que podem terum papel decisivo para prevenir ainfeção pelo parasita.

    Para Maria de Sousa, cientista ee membro do júri do galardão, Ma-ria Mota representa "um tecido de

  • jovens cientistas portugueses queinspiram os novos a querer fazerciência", mas sublinha que "háuma administração da Ciência,neste momento, que, pode dizer--se, é insuficiente".

    A diretora do IMM, a investiga-dora Carmo Fonseca, também elaPrémio Pessoa em 2010, falou deum "orgulho muito especial" paraO instituto. Com Lusa

    REAÇOES

    A investigadora MariaManuel Mota representa aexcelência científica ao servi-

    ço da humanidade . O pré-mio é um estímulo paraa comunidade científica"

    ASSUNÇÃO ESTEVES

    PRESIDENTE DA AR

    Éo reconhecimento do mé-rito pessoal de Maria Mota,mas também da ciênciaportuguesa e da sua impor-tância para o País"

    MIGUEL PRUDÊNCIO

    CIENTISTA DO IMM

    ENTREVISTA:MARIA MOTA

    Investigadora e Prémio Pessoa 201 3

    "Começaa haver

    problemas definanciamento"Tem recebido inúmeros prémiospelos seus trabalhos inovadoresna área da malária. Qual é a im-portância do Prémio Pessoa?Aprimeirareação foi de grande sur-presa. Não imaginava sequer, pen-sei que este seria um prémio parauma pessoa mais velha. Mas é fan-

    tástico porque é um prémio muitotransversal. Os outros que tenho re-cebido com a minha equipa são pré-mios científicos, dados pelos nos-sos pares, no âmbito da comunida-de científica. Este é atribuído pelasociedade portuguesa. Sinto-memuito honrada. Há aqui esse outronível, que é o da atribuição destadistinção por parte da sociedade àcomunidade científica. Nas últimasdécadas, a ciência e a comunidadecientífica desenvolveram-se muitoem Portugal. O País apostou em nóse este é um reconhecimento doscientistas e do seu trabalho porparteda sociedade portuguesa. É um pré-mio para todos nós.

    Vai utilizar a verba na sua investi-gação, como tem feito com os ou-tros prémios?Ainda não pensei nisso, mas decerteza que esse dinheiro vai sermuito bem gasto.Disse que Portugal apostou naciência e na sua comunidade cien-tífica. O País continua a fazê-10,nesta altura?Estamos a viveruma situação preo-cupante. Espero que essa apostacontinue porque, se isso não acon-tecer, o que temos agora, a ciência,as equipas e a sua renovação per-der-se-ão. Temos de ter a capacida-de de atrair os mais novos para quehajarenovação. Espero que este pré-

  • mio também seja esse incentivopara que a sociedade portuguesacontinue a apostar em nós.Vive-se uma situação preocupan-te. Em quê concretamente?O País vive com cortes e a área daciência também. É necessário queestes cortes não sejam cegos e re-conheço que tem havido um gran-de esforço para que não sejam com-pletamente cegos. A Espanha, porexemplo, estáaviveruma catástro-

    fe a esse nível. Nós não. Mas istonão pode durar muito mais.Começa a haver menos projetos eproblemas de financiamento.Temos de ter a capacidade de ultra-

    passar isto.O que está a fazer agora na sua in-vestigação na malária?Temos como lema compreendero inimigo para o atacar e é isso quetemos feito e continuamos a fazer.

  • Maria Mota: "Este prémio é paraa minha geração de cientistas"Há quase 19 anos que investiga o parasitada malária. Ontem, Maria Mota viu o seutrabalho reconhecido com a atribuiçãodo Prémio Pessoa 2013MaláriaNicolau FerreiraO entusiasmo de Maria Mota man-tém-se intacto. Sentiu-o quando, no5o ano da escola, viu uma célula numlivro. Sentiu-o quando teve um mo-mento "eureka" na semana passada,com uma ideia nova que lhe surgiuquando olhava para resultados expe-rimentais. Desde 1995, no início dodoutoramento no University Collegede Londres, que a investigadora de42 anos dedica este entusiasmo aoestudo da malária. Ontem, a cientis-ta, líder há oito anos de uma equipano Instituto de Medicina Molecular(IMM), em Lisboa, foi galardoadacom o Prémio Pessoa 2013.

    "É a primeira vez que recebi umprémio que não vem do mundo daciência, mas da sociedade em geral",diz Maria Mota ao PÚBLICO. "Sinto-me muito honrada e um grande senti-do de responsabilidade. Este prémioé para a minha geração de cientistasem quem Portugal apostou, que fezo doutoramento lá fora e voltou. Éum sinal importante da sociedadeque diz: 'Não queremos perder estaspessoas. Confiamos em vocês.'"

    A malária é hoje um tema na berra.A doença continua a matar cerca deum milhão de pessoas todos os anos,mas há uma grande aposta na suainvestigação. Há 20 anos havia maismortes e a investigação era velha."É incrível como houve uma modi-ficação completa no paradigma da

    investigação. Quando comecei, eraum campo um bocado morto, nãohavia dinheiro, os laboratórios de pa-rasitologia eram velhos, as pessoaseram antigas."

    Qual a razão para se aventurar

    neste tema? Durante o mestrado deimunologia, que fez ainda na Uni-versidade do Porto onde terminoua licenciatura em biologia, Maria Mo-ta deparou-se mais de perto com oestranho mundo dos parasitas emgeral. "Entusiasmou-me esta ideia deuma célula estar dentro de outra cé-lula, modificá-la, haver um combate.Mas ao longo da evolução, este com-bate passou a ser mais a um braço-de-ferro quase entre amigos, onde àsvezes se cede e outras não."

    A cientista aceitou depois um con-vite para o doutoramento em Lon-dres na área da malária, onde se de-

    parou com um parasita altamentecomplexo. A malária pode ser causa-da por algumas espécies de parasitasdo género Plasmodium. O mais co-nhecido é o Plasmodium falciparum,que provoca a maior mortalidade.

    Este parasita unicelular é trans-mitido pelas fêmeas dos mosquitosanófeles que picam as pessoas. Oparasita é introduzido na correntesanguínea, viaja até ao fígado ondese instala numa célula. Aqui, multi-plica-se em milhares de células, quese libertam para o sangue. 0 parasitaintroduz-se depois nos glóbulos ver-melhos, onde volta a multiplicar-se.É quando o Plasmodium se libertadas células sanguíneas que as pes-soas manifestam os sintomas da ma-lária: febres altas, dores de cabeça,mal-estar, dores no corpo, às vezesmorte. Os parasitas voltam a infectaroutros glóbulos vermelhos. Algunsdos novos parasitas mudam de for-ma e, quando são sugados por outromosquito anófeles, reproduzem-se eo ciclo recomeça.

    O Plasmodium, tão complexo, foi

    conseguindo adaptar-se aos medi-camentos. As várias tentativas devacinas desenvolvidas nunca resul-taram. "Todas as equipas estavamobcecadas na produção de uma va-cina. Perderam-se décadas de inves-

    tigação, onde não se aprendeu nadasobre o parasita", diz a investigadoraportuguesa.

    Mas algo mudou a meio da décadade 1990. Maria Mota ficou marcadapor uma capa da revista Nature sobrea malária, na qual se mostrava que adoença estava a matar mais. Houvecongressos, o nascimento, em 1994,da Fundação Bill & Melinda Gates,com uma grande aposta na luta con-tra a malária e um rejuvenescimentona investigação.

    Em 1999, Maria Mota foi para oCentro Médico da Universidade deNova lorque depois de terminar odoutoramento, onde fez a sua pri-meira grande descoberta que saiu narevista Science: "Provo que o parasitaatravessa várias células do fígado até

    se instalar numa delas." O fenómeno

    já tinha sido observado por outroscientistas, explica a cientista, masfoi desprezado. "Mas eu vi-o com osmeus próprios olhos."

    A cientista voltou em 2002 paraPortugal, onde esteve no InstitutoGulbenkian de Ciência, em Oeiras.Em 2005, transferiu o seu labora-tório para o IMM e começou a daraulas na Faculdade de Medicina daUniversidade de Lisboa.

    Maria Mota fala-nos dos resultados

    que a marcaram mais: a descobertade que os ratinhos que produzemmaiores quantidades da enzima he-me-oxigenase-1 estão mais protegidosda malária cerebral (a forma mais pe-rigosa desta doença), mostrando quea susceptibilidade à doença se devea uma característica do hospedeiro(nós próprios) e não do parasita; adescoberta de que a mesma enzima

    protege os hospedeiros durante a fa-se sanguínea, ao mesmo tempo que é

  • essencial para a entrada do parasitano fígado; ou a observação de queos bebés têm um mecanismo que osimpede de voltarem a ser infectados

    pelo parasita quando já estão infecta-dos, mesmo se tornam a ser picados,ao contrário dos adultos.

    Em Janeiro do próximo ano, aequipa de Maria Mota publicará maisuma novidade. Pensava-se que o sis-tema imunitário humano só atacavaa malária quando o parasita atingiaa fase sanguínea, mas afinal ataca emata alguns dos parasitas quandoainda estão no fígado.

    "Olhamos para o hospedeiro e ten-tamos compreender o que este bichonos faz. O parasita está dependentede nós", diz Maria Mota, resumin-do o trabalho da equipa. A cientistadefende que há agora muitas maispessoas a investigar nesta doença e,por isso, uma maior probabilidadede surgir uma ferramenta poderosapara a combater. Mas também nuncase compreendeu tão bem a comple-xidade da malária. "Estamos a olhar

    para uma grande heterogeneidade depessoas [atingidas pela malária] e de

    parasitas. É preciso várias ferramen-tas [vacinas, fármacos] para atacar asdiferentes fases do parasita."

    A produtividade científica de MariaMota "é de excepcional qualidade",diz a acta do júri do Prémio Pessoa,que vai na 27 a edição. "É igualmentede sublinhar o seu empenhamentoentusiástico no que se pode chamar

    de cidadania da ciência. Maria Motaé fundadora e presidente da Associa-

    ção Viver a Ciência, que tem comoobjectivo encorajar a filantropia emPortugal." António Damásio, HannaDamásio, Manuel Sobrinho Simõesou Maria do Carmo Fonseca foramoutros cientistas galardoados em edi-

    ções anteriores.Para a imunologista Maria de Sou-

    sa, membro do júri, citada pela Lusa,Maria Mota representa "um tecidode jovens cientistas portugueses queinspira os novos a querer fazer ciên-cia": "Por cima dessas pessoas, há oaviso ao país, e ao Governo, de quehá uma administração da ciência,que é insuficiente, para não dizerem alguns casos incompetente."

    Maria Mota ainda não sabe o quefazer com os 60 mil euros do prémio."Tenho a certeza de que será utiliza-do para a equipa ter maior liberdadee criatividade", responde a cientis-ta, que considera a sua vinda paraPortugal responsável pelo sucessoque teve. "Na última década, che-gou imensa gente da minha geraçãoa Portugal com questões muito inte-ressantes, e queriam partilhá-las. Naminha equipa, tenho membros fan-tásticos, estudantes muito entusias-mados, que se estivessem em Cam-bridge iriam querer estar nas equipasdos premiados com o Nobel."

    Para a investigadora, a ciência por-tuguesa está "à beira do precipício",devido à crise e à forma como se es-

    tá a gerir a investigação. Admite quejá teve uma oferta para sair do país,mas por decisão familiar acabou porficar. "Estes convites são um óptimosinal para Portugal, o problema é seo fluxo é só num sentido."

    Por cá, a cientista está agora, jun-tamente com Miguel Prudêncio, líderde outra equipa no IMM, a desenvol-ver uma vacina contra a malária, queteve financiamento da Fundação Ga-tes. No laboratório, está-se tambéma tentar compreender como é que oparasita da malária utiliza os nutrien-tes do hospedeiro para se alimentar.O momento da descoberta é o quedeixa Maria Mota mais feliz: "De re-pente, a minha cabeça faz a ligação. É

    fantástico, é para isso que existimos,para descobrir coisas novas, é o pro-pósito da humanidade."

    "Na últimadécada, chegouimensa gente daminha geraçãoa Portugal comquestões muitointeressantes,e queriampartilhá-las", diz ainvestigadora

  • Maria Mota, de 42 anos, há mais de dez que lidera uma equipa que estuda a malária

  • CIÊNCIA ¦ PESQUISAS SOBRE MALÁRIA E FILANTROPIA CIENTÍFICA VALEM GALARDÃO

    "O prémio é paratoda uma geração"¦ Investigadora Maria Manuel Mota, de 42 anos, venceu o Prémio Pessoae dedicou-o à nova vaga de cientistas que, tal como ela, voltaram a Portugal

    Instituto de Medicina Molecular

    "Fechar torneira a parasita"- A investigadora portuguesa

    revolucionou o estudo da mala -ria com uma nova abordagemcentrada no ser humano e nãono mosquito que dâ origem àdoença. "O parasita vive à nossacusta e a nossa ideia foi percebero que é que nós lhe fornecemos

    para o alimentar e tentar fecharatorneira ao parasita", afirmouao CM Maria Manuel Mota,acrescentando: "Queremos

    perceber porque é que das 400milhões de pessoas infetadas

    por ano, um milhão morre e asoutras sobrevivem." Um outroprojeto do Instituto de Medici-na Molecular para descobriruma vacina contra a maláriaé chefiado por Miguel Prudên-cio, que já pertenceu ao grupoda premiada. O projeto recebeufinanciamento de 900 mil eurosdafundaçãoßillGates. ¦

    • BERNARDO ESTEVES

    MariaManuel Mota

    ainda não se tinha re -feito da surpresa devencer a 27a edição do

    Prémio Pessoa quando falou aoCM. "Nuncamepassoupelaca-beça ganhar. Isto vai motivar aminha equipa a andar para afrente . Mas é sobretudo um pré-mio para toda uma geração de

    investigadores que o País apoioucom bolsas no es-trangeiro e que vol-tou para dar um em-

    purrao enorme aciência portuguesa"afirmou a investiga -

    dora, natural de VilaNova de Gaia e quefez licenciatura emBiologia e mestradoem Imunologia naUniversidade do Porto.

    Prosseguiu os estudos em In-glaterra e nos Estados Unidos e

    regressou a Portugal há 11 anos,chefiando atualmente o grupode vinte cientistas que estudaa malária no Instituto de Medi-cina Molecular, em Lisboa. A

    cientista avisa para os perigosatuais. "Por causa da crise, esta-mos sempre à beira do precipí-cio, e há o risco de tudo o que foiconstruído ser destruído" diz.

    Além da investigação sobrea malária, a investigadora foipremiada pela atividade de fi-lantropia científica, como fun-dadora da Associação Viver aCiência.

    Maria Manuel Mota, de 42anos, ainda não pensou no quefará com os 6 o mil euros do pré -mio, mas garante que este valor

  • "vai ajudar" na investigação queestá a desenvolver. A investiga-dora foi felicitada pelo Governo e

    pelo Presidente da República,Aníbal Cavaco Silva. ¦

  • Pessoa. Um prémio paraa filantropia científica deMaria Manuel Mota

    Investigadora principal do Instituto de Medicina Molecular recebeu

    ontem o Prémio Pessoa. E uma autoridade mundial no estudo da maláriaFILIPE MORAIS

    Foi a primeira cientista a mudar o rumo

    no estudo da malária e concentrou-seno ser humano em vez do parasita quecausa a doença. A investigação que de-

    senvolveu em Lisboa trouxe-lhe o reco-

    nhecimento da comunidade científica e

    hoje é uma autoridade mundial neste

    campo. Aos 42 anos, Maria Manuel Mota,

    investigadora principal do Instituto de

    Medicina Molecular (IMM), recebeu esta

    sexta-feira o Prémio Pessoa. O júri afir-ma que a investigadora percebeu a "impor-tância da filantropia científica" e vê-a

    como uma referência de um "tecido de

    jovens cientistas portugueses que inspi-

    ra os novos a querer fazer ciência", dis-

    se Maria de Sousa, uma das juradas quedecidiu o prémio de 2013.

    O júri era presidido por Francisco Pin-to Balsemão e contava ainda com osnomes de Faria de Oliveira (vice-presi-

    dente), António Barreto, Diogo Lucena,

    Eduardo Souto Moura, João Lobo Antu-

    nes, José Luís Porfírio, Maria de Sousa,Mário Soares, Rui Magalhães Baião, Rui

    Vieira Nery e Viriato Soromenho Mar-

    ques. No anúncio do prémio destacam

    "o empenho entusiástico" de Maria Manuel

    Mota "no que se pode chamar de cida-

    dania da ciência", já que a investigado-ra fundou e é presidente da Associação

    Viver a Ciência, que "tem como objecti-

    vo encorajar a filantropia em Portugal".A directora do IMM, Maria do Carmo

    Fonseca, explicou que a cientista foi "pio-

    neira, em todo o mundo, no campo da

    malária", já que todos os investigadorestinham seguido sempre a mesma linha

    de estudo. Maria Manuel Mota, "muito

    jovem, foi a primeira a seguir um cami-nho diferente. Decidiu focar-se no serhumano e perceber do que o parasitaprecisava para infectar o ser humano.Essa abordagem inédita veio a revelar-

    -se correcta".Maria do Carmo Fonseca, que também

    já recebeu este prémio, deixa um aviso"ao país e ao governo. Há uma adminis-

    tração da ciência, neste momento, que,

    pode dizer-se, é insuficiente, para não

    dizer, em alguns casos, incompetente" e

    acrescenta que a Prémio Pessoa de 2013

    veio "dizer à comunidade que, se nosfocarmos no hospedeiro, temos manei-

    ras distintas e inovadoras de combater a

    doença". Por isso, hoje em dia "é reco-nhecida a nível mundial por ter tido esta

    ideia nova e ter alterado o rumo da inves-

    tigação a nível mundial", com um traba-

    lho feito a partir de Lisboa. Chegou a serconvidada para dirigir um instituto emNova lorque, mas "ela disse que não, que

    conseguiria fazer investigação sem res-

    trição em Lisboa. Acima de tudo, a ciên-cia portuguesa está de parabéns", acres-centou a presidente do IMM.

    Por sua vez, a premiada disse à Lusaficar "muito satisfeita que a sociedade

    portuguesa considere que a nossa equi-

    pa está a fazer um bom trabalho, quemerece ser reconhecido, e que isso tem

    impacto no país. Dá-nos entusiasmo e

    uma vontade de continuar a fazer o quepodemos fazer melhor: descobrir algu-ma estratégia para combater a malária".

    Maria Manuel Mota dedicou o prémioa "toda a comunidade científica portu-

    guesa ou cientistas a fazer ciência em

    Portugal", mas deixa um alerta: a ascen-são da ciência no país "não pode desa-celerar e obviamente que, nas condições

    que o país está a atravessar, a ciênciatambém sofre com isso". Com Lusa

  • Em resumo

    Anúncio foi feitoem Seteais

    Esta foi a 27." edição do

    prémio atribuído pelo jornal

    "Expresso" e pela CaixaGeral de Depósitos.Francisco Pinto Balsemão

    é o presidente do júri

    60000O valor do prémio atribuído

    a Maria Manuel Mota é de

    60 mil euros. O objectivo

    passa por destacar

    personalidades nacionais da

    cultura, artes ou ciência.

    IMUNOLOGIAMaria Manuel Mota nas-

    ceu no Porto, em Abril de

    1971, e licenciou-se naUniversidade do Porto em

    Biologia. Fez depois um

    mestrado em Imunologia,o doutoramento em Para-

    sitologia Molecular na

    University College of Lon-

    don e um pós-doutora-mento no New York Medi-

    cai Center.A cientista acabou por

    regressar a Portugal e foi

    investigadora principal do

    Instituto Gulbenkian da

    Ciência. Desde 2005,

    ocupa o mesmo cargo no

    Instituto de Medicina

    Molecular. É docente na

    Faculdade de Medicinada Universidade de Lis-

    boa. Este ano já publicoudez artigos científicos em

    revistas da especialidade.

    'Temos de tentar

    que fiquem por cá1

    Prestígio O presidente do

    júri, Francisco Pinto

    Balsemão, destaca "a

    compreensão dos

    processos" estudados porMaria Manuel Mota esublinhou que esta pode seruma forma de manter

  • cientistas de destaque no

    país. "Temos de tentar que

    fiquem por cá. Ou, pelo

    menos, se forem, que

    possam voltar. A própriaMaria Manuel Mota estevelá fora e voltou. É preciso

    que estejam cá e prestigiema ciência portuguesa."

  • MARIA MANUEL MOTA, INVESTIGADORA PIO

    Especialistaem malária

    ganha PrémioPessoa 2013

  • A investigadora queinspira os outros

    • Maria Manuel Mota distinguidacom Prémio Pessoa por pesquisassobre malária e filantropia científica• Mais nova galardoada é de Gaiae representa geração que regressoua Portugal depois de estudar fora

    Helena Norte

    Maria Manuel Mota, 42anos, foi distinguida com oPrémio Pessoa 2013. É umadas maiores especialistas anível mundial em maláriae representa uma geraçãode cientistas que inspira osnovos a fazer ciência.

    Estavaa jantar com

    a família quando otelefone do mari-do tocou. "O meu

    estava sem bateria e nem meapercebi. Quando ele me dis-se que o dr. Balsemão queriafalar comigo, fiquei muito ad-mirada", contou ao JN.

    O espanto foi maior quandorecebeu a notícia do prémio."Fiquei uns segundos semreação, sem dizer nada. Nãoestava nada a contar."

    Natural de Vila Nova deGaia, a investigadora do Ins-tituto de Medicina Molecu-lar (IMM) da Universidadede Lisboa é a mais nova e asexta mulher contempladaem 27 edições do PrémioPessoa. "Confesso que pen-sava que era um prémio sóatribuído a pessoas mais ve-lhas".

    Maria Manuel Mota repre-senta "um tecido de jovenscientistas portugueses queinspira os novos a querer fazer

    ciência", afirmou a cientistaMaria de Sousa, membro dojúri do prémio que anualmen-te distingue uma personalida-de da cultura, arte e ciênciaem Portugal.

    Maria de Sousa sublinhouainda a iniciativa de filantro-pia científica da premiada:"Criou uma coisa muito co-mum nos Estados Unidos,uma associação [AssociaçãoViver a Ciência] em que as pes-soas dão dinheiro para apoia-rem. Não temos essa tradiçãoem Portugal. Temos que ter,em tempos em que é muito di-fícil financiar".

    Tal como outros da sua gera-ção, Maria Manuel Mota pros-seguiu os estudos fora - fez odoutoramento no Reino Uni-do e o pós-doutoramento nosEUA-, mas depois quis regres-sar a Portugal. "Se fosse hoje,com esta crise, talvez tivessedúvidas em voltar", admite acientista que integra umaequipa do IMM que estuda amalária. O projeto que visacriar uma vacina para a doen-

    ça recebeu uma bolsa da Fun-dação Bill e Melinda Gates novalor de um milhão de dólares.

    Questionada se a investiga-ção científica em Portugalestá em risco com os cortesnos financiamentos, a cientis-

    ta assume estar "preocupada"porque trata-se de uma"ameaça real", mas acredita

    que "temos ferramentas parasobreviver".

    Apesar das dificuldades,"vale a pena" investigar. Con-tinuar a buscar respostas paraperguntas antigas ou para asque surgem de cada novoavanço. "O meu trabalho éresponder a perguntas. E é isso

    que me motiva", conta. E detodas as perguntas, há umaque a fascina. "Porque é que os

    parasitas gostam tanto do fí-gado humano? Antes de che-

    gar ao sangue, o parasita temuma fase silenciosa, de setedias, em que se multiplica 30mil vezes. Isto acontece por-que o ambiente no fígado épropício. Se conseguíssemoscompreender a razão, contro-laríamos a doença."

    O interesse da investigado-ra na malária não é de agora."A Maria, muito jovem, foi aprimeira a seguir um caminhodiferente. Decidiu focar-se noser humano e perceber do queo parasita precisava para infe-tar o ser humano. Essa aborda-

    gem inédita veio a revelar-secorreta", explica Maria do Car-mo Fonseca, diretora do IMMe também ela galardoada como Prémio Pessoa em 2010. •

    "Gostava depercéberporque é queo parasita damalária gostatanto do nossofígado"

    Maria Manuel MotaPrémio Pessoa

    SABER MAISDoutoramento foraMaria Mota, 42 anos, licen-ciou-se em Biologia pelaUniversidade do Porto, fezo mestrado em Imunologiana mesma universidade edoutorou-se em Parasitolo-gia Molecular no UniversityCollegede Londres. A se-guir, fez um pós-doutora-mento no New York Medi-cai Center. Regressa depoisa Portugal.Prémio de 60 mil eurosO Prémio Pessoa, no valorde 60 mil euros, é uma ini-ciativa do "Expresso" e daCaixa Geral de Depósitos evisa distinguir uma perso-nalidade da cultura, arte eciência cuja obra se salien-te num determinado ano.

  • "E igualmente desaudar o seuempenho em prolda divulgação eestímulo paraciência junto dogrande público "Assunção EstevesPres. Assembleia República

    "O MEC regozija-sepelo facto de este

    prestigiadogalardão nacionalter reconhecidomais uma vez aciência portuguesaMinistério da Educaçãoe Ciência"A juventude dapremiada e aelevada qualidadedo trabalho (...)constituem

    exemplo para todosos jovens cientistas"Maria do Carmo FonsecaDiretora IMM

    "E o reconhecimentodo mérito pessoalda professora MariaMota, mas tambémda ciênciaportuguesano seu todo"

    Miguel PrudêncioInvestigador IMM

    "E o reconhecer deuma investigadoraextremamentecriativa que foipioneira em todoo Mundo no campoda malária"Maria do Carmo FonsecaDiretora IMM