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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO O ROMPIMENTO DO PARADIGMA EMISSOR-RECEPTOR E A CONCEPÇÃO DE PROSUMER NA ERA DA COMUNICAÇÃO DIGITAL EM REDE Alan Q. Costa Ana Alice Vercesi Candice Heimann Diego de S. Mendes Else Lemos Fabiana Grieco C. de M. Vetritti Fernando da S. Pardo Karina V. Santos Lilian C. Bacich Martins Luiz Carlos Paloschi Marcelo O. da Cruz Maurício B. da C. Felício Rafael V. Pereira Renato Almada Alonso Roxana L. Varela Sepúlveda Solange Ugo Luques São Paulo 2013

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO

O ROMPIMENTO DO PARADIGMA EMISSOR-RECEPTOR E A

CONCEPÇÃO DE PROSUMER NA ERA DA

COMUNICAÇÃO DIGITAL EM REDE

Alan Q. Costa

Ana Alice Vercesi

Candice Heimann

Diego de S. Mendes

Else Lemos

Fabiana Grieco C. de M. Vetritti

Fernando da S. Pardo

Karina V. Santos

Lilian C. Bacich Martins

Luiz Carlos Paloschi

Marcelo O. da Cruz

Maurício B. da C. Felício

Rafael V. Pereira

Renato Almada Alonso

Roxana L. Varela Sepúlveda

Solange Ugo Luques

São Paulo

2013

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ALAN Q. COSTA

ANA ALICE VERCESI

CANDICE HEIMANN

DIEGO DE S. MENDES

ELSE LEMOS

FABIANA GRIECO C. DE M. VETRITTI

FERNANDO DA S. PARDO

KARINA V. SANTOS

LILIAN C. BACICH MARTINS

LUIZ CARLOS PALOSCHI

MARCELO O. DA CRUZ

MAURÍCIO B. DA C. FELÍCIO

RAFAEL V. PEREIRA

RENATO ALMADA ALONSO

ROXANA L. VARELA SEPÚLVEDA

SOLANGE UGO LUQUES

O rompimento do paradigma emissor-receptor e a concepção de prosumer

na era da comunicação digital em rede

Primeira versão do texto coletivo apresentado como parte dos requisitos para obtenção de créditos na disciplina “Novas Lógicas e Literacias Emergentes no Contexto da Educação em Rede: Práticas, Leituras e Reflexões” (PPGCOM-USP).

Orientadora: Profª. Drª. Brasilina Passarelli

São Paulo

2013

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................................ XX

1 DA MODERNIDADE À PÓS-MODERNIDADE (MODERNIDADE LÍQUIDA):

MUDANÇAS SOCIAIS E NO CAMPO DO SABER ..................................................... XX

1.1 A Modernidade ....................................................................................................... XX

1.1.1 Razão, ciência e saber ................................................................................... XX

1.1.2 A crise da razão............................................................................................. XX

1.2 Pós-Modernidade .................................................................................................... XX

2 O PARADIGMA DO RECEPTOR: POSSIBILIDADES DE PARTICIPAÇÃO NO

MODELO DE COMUNICAÇÃO ................................................................................... XX

2.1 Cenário ................................................................................................................... XX

2.2 A comunicação de massa ........................................................................................ XX

2.3 Modelo emissor-receptor......................................................................................... XX

2.4 Teoria do Agendamento: agenda-setting e espiral do silêncio .................................. XX

2.5 Novas literacias no contexto da autocomunicação de massa .................................... XX

2.6 Videogames: prazer ou aprendizagem? ................................................................... XX

2.7 Era da Internet: interatividade e formação de redes ................................................. XX

3 A FIGURA DO PROSUMER: CONCEITO, CARACTERÍSTICAS E

MOTIVAÇÕES ................................................................................................................ XX

3.1 Convergência das mídias e emergência de redes sociais: ruptura definitiva da

barreira entre consumidores e produtores de conteúdo ................................................... XX

3.2 Prosumer: conceituação .......................................................................................... XX

3.2.1 Outras nomenclaturas para o consumidor que também produz ....................... XX

3.3 Cultura participativa e inteligência coletiva: alterações provocadas pela presença

do prosumer ................................................................................................................... XX

3.3.1 Empresas e novas mídias: mudanças necessárias para sobreviver .................. XX

CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... XX

REFERÊNCIAS ............................................................................................................... XX

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INTRODUÇÃO (PROVISÓRIA)

Internet, Web e redes sociais contribuíram para ampliar as possibilidades de

participação efetiva das pessoas no desenvolvimento e circulação de conteúdos pelo mundo.

Além disso, o entremear das velhas mídias com as novas mídias fez com que a fronteira entre

emissor e receptor se tornasse praticamente inexistente.

Diante do breve contexto apresentado, por meio de análise preliminar de

nomenclaturas que possuíam o propósito de designar um consumidor atuante e produtor,

optou-se pela escolha do termo prosumer – cunhado por Alvin Toffler há mais de trinta anos

– que agrupa as palavras producer e consumer (em português, respectivamente, produtor e

consumidor) como um dos elementos principais para o desenvolvimento do presente texto

coletivo.

Dividido em três capítulos, o trabalho monográfico – fruto do entrecruzamento das

diferentes formações e habilidades dos participantes da disciplina “Novas Lógicas e Literacias

Emergentes no Contexto da Educação em Rede: Práticas, Leituras e Reflexões”, do Programa

de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Universidade de São Paulo – tem como

objetivo geral compreender, por meio de revisão bibliográfica, o surgimento do conceito

prosumer e sua relação com o rompimento do paradigma emissor-receptor.

Nesse sentido, o primeiro capítulo abordará as alterações no campo do saber e em

características como a individualidade, tempo e espaço provocadas pela transição da

Modernidade (Modernidade Sólida) para a Pós-Modernidade (Modernidade Líquida). Com o

propósito de articular as principais ideias sobre o assunto, serão utilizados como referenciais

teóricos: Jean-François Lyotard (2008) e Zygmunt Bauman (2001).

No segundo capítulo, utilizar-se-ão as teorias da comunicação de massa para

demonstrar a evolução nas formas de tratamento do consumidor e como o receptor passou a

ter papel mais ativo no novo mundo da comunicação – cada vez mais calcado nas inovações

tecnológicas. Com base em obras de Manuel Castells (2003) e Mauro Wolf (2005), pretende-

se fornecer ao leitor um arcabouço teórico suficiente para introduzir o tema central do estudo:

o surgimento da figura do prosumer a partir da quebra do paradigma emissor-receptor.

Por fim, o terceiro capítulo apresentará o motivo da escolha pelo termo prosumer para

caracterizar o consumidor que também produz conteúdo, sua origem, definição, características

e outras nomenclaturas (produser, eu-mídia, usuário-mídia e consumidor 2.0) que já foram –

ou continuam sendo – utilizadas para definir essa mudança do até então passivo receptor para

um produtor ativo de conteúdo. Essa discussão terá como suporte o novo ambiente

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tecnológico em que a sociedade está inserida, que se caracteriza pela realização de atividades

norteadas pela tríade: convergência das mídias, cultura participativa e inteligência coletiva.

Alvin Toffler (1980, 1990), Axel Bruns (2008a, 2008b), Beth Saad (2003), Clay Shirky

(2011), Don Tapscott e Anthony Williams (2007), Henry Jenkins (2009), Inês Amaral (2012),

José Manuel Corona Rodríguez (2012), Jose Octavio Islas-Carmona (2008), Carolina Terra

(2011) e Marcelo Jacques Fonseca et. al. (2008) serão alguns dos referenciais teóricos

balizadores no desenvolvimento dos temas supracitados.

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1. DA MODERNIDADE À PÓS-MODERNIDADE (MODERNIDADE LÍQUIDA):

MUDANÇAS SOCIAIS E NO CAMPO DO SABER

Toda mudança em um contexto comunicacional mais amplo é antes de mais nada e,

sobretudo, uma mudança da própria condição social e da racionalidade de uma época. Assim

foram todas as grandes revoluções tecno-comunicativas, desde a introdução da escrita no séc.

V a.C., o advento dos caracteres móveis e a invenção da prensa de Gutemberg, o que

culminou na difusão da cultura dos livros e meios impressos, o surgimento dos meios

eletrônicos de comunicação e a consolidação da cultura de massa, bem como o atual convívio

com as formas sociais de comunicação em redes digitais.

Partindo desse pressuposto, para compreender as mudanças sócio-comunicacionais de

nosso tempo, julgamos ser necessário primeiramente observar de perto a própria condição

social contemporânea. É no contexto social que se dão os contornos do que se denomina hoje

de Sociedade em Rede (CASTELLS, 2003) e sua repercussão nos sujeitos engajados nas

tramas comunicacionais contemporâneas. Há apenas poucas décadas, em uma sociedade

preenchida quase exclusivamente por veículos de comunicação de massa, ao indivíduo

comum, situado do outro lado das telas televisivas, do rádio ou dos impressos, distante dos

meios de produção e distribuição de bens simbólicos midiatizados, era vislumbrada a figura

do "Receptor" (tema exclusivo de nosso próximo capítulo). Atualmente, com a mudança no

panorama comunicacional, inaugurada pelo surgimento e popularização dos meios digitais,

em especial a internet, a imagem do Receptor passa a ser repensada, visto sua

incompatibilidade com o modelo comunicacional atual, mais interativos e descentralizado, em

que as condições de produção, recepção e circulação de bens simbólicos se faz disponível a

todos aqueles conectados à rede mundial de computadores.

Esta guinada comunicacional se inter-relaciona com a própria condição de nosso

tempo, denominada por alguns pensadores como Pós-Modernidade (LYOTARD, 2008) ou

Modernidade Líquida como prefere o sociólogo polonês Zigmunt Bauman (2001). Sendo

assim, compreender o panorama das mudanças sociais presentes em nosso tempo é

fundamental para situarmos uma nova imagem do sujeito contemporâneo entrelaçado aos fios

e nós da Rede. É nesta perspectiva que este capítulo se insere, traçando um voo panorâmico

sobre a passagem da Modernidade à Pós-Modernidade ou Modernidade Líquida, no intuito de

fornecer ao leitor uma imagem do terreno sob o qual se delineiam as bases ou pilares para a

discussão da emergência de uma nova forma de atuar socialmente na comunicação, agora em

rede.

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1.1 A Modernidade

O desejo revolucionário de realizar o Reino de Deus... é o início da história Moderna (Walter Benjamin)

A Modernidade ficou conhecida como o período de amplas transformações sociais,

políticas, culturais que insurge após a idade média, tendo com eixo central a crença na

racionalidade humana e no progresso social e tecnológico regido pela ciência. Apesar de

encontrar suas raízes no séc. XVII, com a ascensão do pensamento de filósofos/cientistas

como René Descartes e Francis Bacon, é no séc. XVIII, com as revoluções francesa e inglesa,

bem como o início do movimento Iluminista, que essa visão de mundo ganha corpo e solidez

social. No séc. XIX a Modernidade vive seu apogeu, no seio de um mundo marcado pela

racionalidade e pleno desenvolvimento das ciências e tecnologia, surgindo em meados do séc.

XX e início do XXI as tensões de seu esgotamento, ou, ao menos, uma ampla revisão crítica.

O projeto Moderno demarca, ante de tudo, um rompimento de visão de mundo pela

superação de um passado obsoleto (aos olhos modernos), sustentado na tradição, na mitologia

e na ordem divina ou cosmológica como orientadoras da humanidade. Em outras palavras,

baseada no conhecimento narrativo, como diria Lyotard (2008). Este período representa,

portanto, uma retomada da razão humana para a condução dos homens rumo a sua própria

história, que não mais é designada por mandamentos divinos ou pelas forças (sobre)naturais

do mundo. Deste modo, a Modernidade assume a imagem que Prometeu representava na

mitologia grega. Segundo os ditos gregos foi Prometeu quem roubou o fogo dos deuses e o

entregou aos homens, assegurando a estes um poder racional que os diferenciaria de todas as

espécies. O fogo dos deuses, assim, permitiu aos homens a capacidade de conhecer. É nesta

direção que Benjamin (2002, p. 18) conceitua a Modernidade como “o desejo revolucionário

de realizar o Reino de Deus”, contudo, não mais pelos desígnios divinos, mas pela força

racional do homem de conhecer o mundo e a si mesmo, podendo assumir os rumos da história

a partir do domínio da natureza.

Em uma visão filosófica Habermas (1990) postula que a modernidade funda um

mundo novo que se distingue do antigo por sua abertura ao futuro, acompanhando ideais

como revolução, progresso, emancipação, desenvolvimento etc. No campo sociológico

Anthony Giddens (1991) aponta que o principal fato a caracterizar a Modernidade é a

suposição da reflexividade indiscriminada. Bauman (2001) também se filia a esta definição,

pontuando que o eixo central da Modernidade é a compulsiva e obsessiva sede em nome do

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novo e aperfeiçoado futuro. No mesmo sentido, Lyotard (2008) indicará os traços da

modernidade a partir da pretensão científica de se dizer sólida, exigindo pra sí a prerrogativa

de todo o saber do mundo. O projeto Moderno tirou as crenças do caminho da humanidade e

assumiu a razão como guia. Por este motivo Bauman (2001, p. 36-37) aponta que:

[...] no limiar da era moderna fomos emancipados da crença no ato da criação, da revelação e da condenação eterna. Com essas crenças fora do caminho, nós, humanos, nos encontramos ‘por nossa própria conta’ - o que significa que, desde então, não conhecemos mais limites ao aperfeiçoamento além das limitações de nossos próprios dons herdados ou adquiridos, de nossos recursos, coragem , vontade e determinação [...] Ser moderno passou a significar, como significa hoje em dia, ser incapaz de parar e ainda menos capaz de ficar parado [...] Ser moderno significa estar à frente de si mesmo, num Estado de constante transgressão.

Nesta direção, pode-se dizer que a razão não é exatamente um elemento novo na

história da humanidade, mas a partir do séc. XVII esta assume uma centralidade jamais

encontrada na história, posto que até a era Moderna sua função se restringia a compreender

um mundo previamente ordenado e unificado, seja pela ordem divina, ou pelas tradições,

como nos casos das monarquias.

A Modernidade, para Bauman (2001), tratou de suprimir as lealdades tradicionais, ou

hábitos costumeiros que impediam uma vida mais liberal (liberalismo econômico), por meio

da destruição dos obstáculos que impediam a via racional do cálculo e da sedimentação de

uma nova ordem social alicerçada na economia, denominada por ele de Modernidade sólida,

que permitiu instalar o liberalismo e o capitalismo, mas tornou rígida qualquer perspectiva de

mudança desse cenário. Encontra-se, então, entre Bauman e Lyotard o paralelo da

intransitorialidade que se pretende a Modernidade, em busca de uma descoberta verdadeira,

desveladora de toda a essência universal, cerceando com limites e contornos toda a

experiência do cientista com base em um método reprodutível e verificável do mundo.

A Modernidade modificou diferentes esferas do social, no campo político-econômico

observou-se a ascensão da burguesia, que passa a legitimar sua ascensão através não só das

artes mas também do conhecimento que a ciência lhe trouxe, e da indústria moderna, que

buscava da descrição e prescrição científica um caminho seguro ao progresso positivista, além

de fazer ver um novo modo de produção material da vida, o capitalismo. A política também

foi impactada sob a organização dos Estados Nacionais, em oposição aos burgos, feudos e

outras delimitações espaciais fundada na tradição monárquica, Estados estes que encontram

também na solidez da ciência moderna a sua própria legitimação pelo discurso emancipatório

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do saber, caminho esperado para a evolução da sociedade. Nos termos de Lyotard (2001, p.

51), “O Estado pode despender muito para que a ciência possa figurar como uma epopeia:

através dela ele ganha credibilidade, cria o assentimento publico de que seus próprios

decisores têm necessidade”.

Na arte, a Modernidade rompe com a autoridade sagrada e os temas teocêntricos,

retomando valores estéticos da antiguidade clássica. No campo comunicacional, o surgimento

de uma ordem racional e comercial que estrutura a difusão de informações passa a ser

legitimada sob o símbolo do nascimento de uma imprensa gradativamente livre das amarras

com a Igreja ou o Estado (THOMPSON, 2008).

1.1.1 Razão, ciência e saber

Se na Modernidade a razão representaria o pensamento autônomo, a capacidade de

pensar sem a tutela das explicações mitológicas, é ela própria a condição de libertação da

tradição e o conhecimento o eixo para a construção de um saber “seguro e indubitável”.

Portanto, a libertação dos homens pela razão e o progresso social e tecnológico devem ser

conduzidos pela razão humana, mas não qualquer razão, como aquela advinda da

contemplação pura, na antiguidade. É preciso o desenvolvimento de um instrumento seguro,

onde a racionalidade possa imperar sobre os sentidos e as paixões - elementos que desviam os

homens do conhecimento. Nasce ai a relação entre a racionalidade, o método e a ciência.

É somente o método que, para Descartes (1985), pode assegurar um ordenamento do

mundo em objetos acessíveis à razão. Além de ordenado, os fatos da natureza devem também

ser objetivados, dado que é na subjetividade humana que os erros persistem, daí a hegemonia

da linguagem matemática na descrição científica. Assim, a razão científica, criada sob os

auspícios da Modernidade, deve buscar ordenar os fenômenos do mundo para encontrar suas

coerências internas, dissipadas pelas aparências. A conclusão derivada deste pensamento é de

que um mundo ordenado pelo método científico e objetivado pela linguagem matemática

pode ser dominado ou administrado pelas mãos humanas e estar, portanto, a seu serviço.

Por este motivo, “O discurso do Método” de René Descartes é considerado um dos

textos fundante da filosofia da consciência moderna e da ciência positivista. Para Descartes, o

método tem a função de estabelecer a certeza como critério de verdade e garantia de

conhecimento. Nesta lógica, “ser é ser representável, é ser objetivável numa representação e

tudo aquilo que escape ou se furte a uma representação clara e distinta estaria assim destituída

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de estatuto ontológico ou, pelo menos, teria sua realidade posta em suspeição”

(FIGUEIREDO, 1995. p. 138).

Assim, Lyotard (2008) soma-se ao coro, ao olhar para a Modernidade como a busca de

uma grande lógica, uma recursividade metódica e diacrônica capaz de reduzir as forças sob a

égide do pensamento asséptico e imparcial do cientista daqueles idos tempos.

O racionalismo inaugurado na Modernidade, calcado na noção de objetivação do

mundo, tem na máquina seu símbolo máximo, refletindo-se nas correntes deterministas da

ciência. Para se compreender o mundo deve-se proceder como no estudo de um maquinário,

desmontando-se as partes, desunindo as peças e as analisando separadamente. A emergência

do relógio passa a ser metáfora para o universo e o mundo social. O relógio é a primeira

máquina automática aplicada à fins práticos, permitindo a regularidade do movimento, da

produção e o automatismo social. Conquanto neste cenário se fortalece a modernidade,

Lyotard (2008) tratará do pensamento corrente à época, quando o determinismo seguia

conquistando adeptos na academia e na sociedade em geral. Para o autor (Lyotard, 2008, p.

99),

O determinismo é a hipótese sobra a qual repousa a legitimação pelo desempenho: definindo-se este por uma relação input/output, deve-se supor que o sistema no qual faz entrar o input encontra-se num estado estável; ele obedece a uma ‘trajetória’ regular através da qual pode-se estabelecer a fusão contínua e derivável que permitirá antecipar convenientemente o output.

É desta visão de regularidade e ordenamento que o “industrialismo" pode ser

constituído e posteriormente associado ao principal modo de interação dos seres humanos. A

estabilidade ansiada pela ciência é, em tal medida, a mesma pela qual se pagam os industriais

modernos. A regularidade, o compasso, a métrica perfeita para que não se arrisque mais o

capital. Para Giddens (1991), nas culturas pré-modernas a vida dos humanos estava vinculada

aos movimentos e disposições da natureza, mas com a indústria moderna há uma ruptura em

relação às formas de vida tradicionais, gerando o "ambiente criado" que, embora físico, não é

mais apenas natural, mas regido por uma ordem social imposta, fundada no racionalismo.

Esse modelo de inteligibilidade serviu a ascensão de uma sociedade burguesa e

acreditava estar conduzindo os homens a um ordenamento social rumo a perfeição, dado que

no mundo-máquina se imaginava ser possível a previsão dos movimentos sociais, a partir do

conhecimento de suas partes. Para Fensterseifer (2001, p. 65 ) o mecanismo se supõe imune à

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degradação, ao desgaste, à irreversibilidade, à complexidade ou ao aleatório, sugerindo um

“universo científico neutro, poeticamente estável e eternamente sem perigos”.

A tradição de uma ciência baseada no método experimental e dedutivo permitiu

solidificar a ideia de que exatidão e precisão são sinônimos e valores modernizantes. É sob as

bases desse mundo ordenado pelo cálculo e crença numa progressão linear rumo a um futuro

tecnologicamente aperfeiçoado que Bauman (1999; 2001) acredita ter se solidificado em um

modo social estruturante, fundado na segurança, previsibilidade e harmonia.

Com base nas leis dos homens e da cálculo se pôde fundar cidades racionalizadas, com

vias urbanas planejadas e limites estanques “capazes” de manter as mazelas distantes dos

centros e regiões comerciais. O corpo humano passa a ser conhecido em sua anatomia e

fisiologia em maior profundidade, gerando premissas que permitem o controle de doenças,

sua previsibilidade e cura, além de hábitos racionais para higienização do corpo individual e

social, sua preparação para a guerra ou, ainda, sua domesticação para suportar as horários de

trabalho fabril. O trabalho passa a ser regrado por ciclos temporais bem delimitados e

controlados, bem como pela fragmentação das tarefas produtivas. Os espaços geográficos são

delimitados pelos Estados Nacionais. Enfim, a lista de aspectos humanos afetados pela ciência

moderna passa a ser ilimitada. A razão impera por meio do cálculo e da ciência,

desembocando nos recantos mais profundos das formas de organização humana.

Contudo, a promessa da libertação do homem das amarras da tradição pela via

racional, foi evidenciando pouco a pouco encerrar em sí própria novas formas de opressão,

não mais operadas pelo acaso ou desígnios divinos, mas pelo próprio ímpeto de progresso

voraz de razão.

1.1.2 A crise da Razão - Modernidade e sociedade de massa

O mundo ordenado pela razão, ciência e a técnica fizeram emergir imensas conquistas

e contribuições sociais, mas não garantiram o progresso linear ao qual seu otimismo inicial se

propunha. Embora o desenvolvimento da ciência tenha, desde o séc XIX, alçado voos cada

vez mais altos, é certo também que grandes mazelas sociais continuam a existir e não dão

sinais de desaparecer dos horizontes humanos.

A racionalidade Moderna nos legou um discurso científico hermético e uma premissa

de dominação em nome do progresso econômico, ao custo alto da exploração e segregação

humana, trazidas à luz em exemplos como a legitimação social da escravidão por critérios

científicos-racionais (embora tenha sido também em nome do progresso e da racionalidade

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que tenhamos refutado os regimes escravocratas no séc. XIX e XX) ou as duas grandes

guerras mundiais e o surgimento e avanço de regimes totalitários de diferentes ordens no

decorrer de praticamente todo séc. XX.

O modo de vida orientado à razão e ao progresso se revelou contraditório a sí mesmo e

tão mitologizante ou opressor quanto à tradição a qual tentou expurgar. O mito se inverte e se

torna a crença irrefletida na ciência e na objetivação do mundo, tese amplamente difundida

pelos teóricos da Escola de Frankfurt, em especial Horkheimer e Adorno. Assim, a crença na

racionalidade humana foi sendo minada, ao passo que os grande projetos de libertação

humana também eram impactados por novas ditaduras.

Bauman (2001) é categórico em afirmar que a perspectiva da libertação humana foi

sendo gradativamente apresentada como uma bênção mista, na medida em que se

representava uma nova possibilidade de aprisionamento em projetos futuros, ou mesmo

redirecionada ao plano das liberdades individuais, de modo que o engajamento em prol de

uma liberdade coletiva foi sendo deixada de lado pelos indivíduos contemporâneos.

A descrença no poder libertador da razão deu lugar ao medo repressor do controle

totalitário em nome da ordem e do progresso social. Enquanto os anos modernos se passaram

à luz da ciência, que jogava constantemente às sombras todo e qualquer saber que não se

produzisse dentro dos círculos dos especialistas, conduziu-se a sociedade a um caminho

metricamente reto e concreto, ainda haverá os que indicarão a crise dentro de sua arquitetura

totalizante. Lyotard (2008) resgatará o pensamento fundador da ciência, em Platão,

relembrando seu caráter narrativo, e como tal, excluído da própria ciência metodológica.

Desde seus primórdios, então, estaria a ciência atrelada ao saber narrativo. Seu ritual

de legitimação recria a Ágora e pede aos comuns, aos especialistas, a validação do enunciado

para que tenha, então, a partir da dialética e do discurso proponente, o valor e o rótulo de

saber científico. No círculo humano encontra-se, há séculos, um dos filtros mais evidentes da

irracionalidade dos limites modernos. O saber, frio e distanciado, que se pretendia isolar do

mundo dos sentidos, está a se legitimar pelo consentimento do outro, pelo filtro humano, pelo

grupo que pode estar regido por diversos outros vieses que não apenas a narrativa ou o

descuido metodológico. Avaliando o desmantelamento da legitimidade científica, Lyotard

(2008, p. 188-189) constatará que não só o consenso se mostra ultrapassado, como tem seu

contraponto na justiça, em reconhecimento dos jogos de linguagem e da legitimidade da

heterogenia. Na dissolução dos contornos antes sólidos tanto do saber quanto dos objetos da

ciência moderna, e com isso, também a redefinição do processo de legitimação, é que se

vislumbrará a emergência da Pós-Modernidade.

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1.2. Pós-Modernidade

No falecimento das grandes narrativas se verá o surgimento da Pós-Modernidade

Lyotardiana. Nem mais é a ciência a detentora do saber, nem o saber científico está mais

pautado única e exclusivamente nos ideais de elevação do homem ou da busca pela verdade

ou em busca da performance e da eficiência. O aprofundamento científico de outrora, que

tentava apreender uma realidade ao seu esgotamento, agora salta entre temas rasos, apilhado

pela velocidade das transformações. Em crise, o determinismo angustia-se para tentar

enfrentar a natureza, sua adversária secular, e começa a perder espaço para os pequenos

relatos, para os antigos limites liquefeitos, para as espumas de Sloterdijk, para o trânsito, para

a fluidez.

O referente cristalino que se buscara deixa de existir. A certeza não é mais a promessa

da ciência, mas sim um assentimento local, sempre à berlinda da falseabilidade popperiana,

minando o grande relato científico, sua credibilidade e, mais a fundo, seu modo de se

legitimar, já que em novos tempos, “o consenso não é senão um estado das discussões e não o

seu fim” (Lyotard, 2008, p.118).

As verdades perpétuas já cedem lugar ao conhecimento localizado, temporário,

transigente. A grande narrativa habermasiana cederá lugar ao pensamento agonístico de

filósofos como Wittgenstein, olhando para o fim da narrativa sólida e o início de uma busca

constante de significados nos jogos de linguagem. O processo de legitimação agora não se

enclausurará mais em instâncias do alto comando das academias e será percebida inclusive

dentro da transitoriedade dos lances que se produzem no campo do saber. Mais do que uma

determinação sistemática, tanto pesquisa quanto transmissão de conhecimento se mostrarão

transformadas. A dúvida volta ao centro da ciência, mas não para bloquear o homem, mas

para tentar compreendê-lo em um processo ainda mais dinâmico, não estanque.

Mas há ainda o contraponto em uma sociedade tão veloz e que apresenta

superficialidades em muitos aspectos, também pelo desterramento da certeza e dos limites.

Neste cenário de relações fugazes e múltiplas, Lyotard (2008, p. 119) acaba por temer o

discurso monolítico da totalização pelo temor, ou em sua outra face conhecida, o controle. O

autor dirá que

Quanto à informatização das sociedades, vê-se enfim como ela afeta esta problemática. Ela pode tornar-se o instrumento ‘sonhado’ de controle e de

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regulamentação do sistema do mercado, abrangendo até o próprio saber, e exclusivamente referido pelo princípio de desempenho.

Nota-se que, então, não mais o Estado se poria em ação para exercer este controle, mas

sim o mercado e sua lógica de penetração e domínio. Em contraponto a este temor, adiante

trataremos do pensamento do economista Don Tapscott, que a despeito dos temores mais

catastróficos, percebe as qualidades do novo sujeito em rede. Lyotard (2008, p. 120) concluirá

sua obra trazendo, ainda, uma visão sobre a desconstrução da totalização do mercado que

haveria de destronar a ciência de outrora.

Acreditando que a informatização da sociedade possa também trazer, de certa forma,

maior visibilidade e acesso os subsídios necessários para a tomada de decisão com

“conhecimeto de causa”, o autor indicará um caminho pelo qual o público deva ter acesso à

informação completa, fazendo alusão à transparência pretendida pelos sistemas de troca de

informação e comunicação da pós-modernidade.

Os jogos de linguagem serão então jogos de informação completa no momento

considerado. Mas eles serão também jogos de soma não nula e, nesse sentido, as discussões

não correrão o risco de se fixar jamais sobre posições de equilíbrio mínimos, por esgotamento

das disputas. Pois as disputas serão então constituídas por conhecimentos (ou informações) e

a reserva de conhecimentos, que é a reserva da língua em enunciados possíveis, é inesgotável.

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2 O PARADIGMA DO RECEPTOR: POSSIBILIDADES DE PARTICIPAÇÃO NO

MODELO DE COMUNICAÇÃO

2.1 Cenário

A compreensão acerca do processo que se estabelece durante a comunicação é alvo

recorrente de estudiosos e pesquisadores de diversas áreas do conhecimento. Por essa razão, é

comum a identificação de autores de diferentes correntes teóricas em trabalhos acadêmicos

que circundam temas como mediação, recepção, meios de comunicação, entre outros. De

maneira mais assertiva, é possível dizer que, no campo da comunicação, há uma biografia

extensa no que diz respeito ao programa de leitura de pesquisadores que se dedicam ao

trabalho de reconhecimento do fluxo de comunicação existente no âmbito dos meios de

comunicação e da esfera pública.

Embora para a elaboração do presente trabalho tenha sido utilizada uma série de

referências bibliográficas relacionadas ao tema, mais especificamente sobre comunicação e

internet, é importante destacar o caráter pontual de sua construção. Por uma questão de

prioridade em termos de teorias e visões que dessem maior ênfase ao cerne da questão do

ecossistema comunicativo, foram selecionadas para consulta as obras de maior proximidade

com os temas abordados na disciplina “Novas Lógicas e Literacias Emergentes no Contexto

da Educação em Rede: Práticas, Leituras e Reflexões”.

Sendo assim, o presente capítulo, que tem como objetivo identificar de que maneira o

processo de comunicação ocorre tendo como ponto de partida o paradigma do receptor,

considerando suas possibilidades e limites de participação no modelo de comunicação, por

meio da promoção de um ambiente cognitivo marcado pela mudança na produção de

significado com a introdução da internet, é uma visão possível, uma visão do conjunto do

processo comunicativo que trabalha com o conceito dos processos.

Não cabendo a ele, portanto, uma avaliação que estabelece critérios rígidos de

interpretação acerca dos conceitos teóricos apresentados, mas sim uma visão de um trabalho

coletivo de conclusão de curso que se esmera em trazer subsídios para o debate sobre o modo

como se relacionam os polos do processo de comunicação, emissor e receptor. O trabalho

pode ser interpretado como um documento produzido na busca de levar a uma reflexão sob a

ótica da interface da comunicação e educação, não somente como áreas em contato, mas

como campo de estudo que se constrói e fortalece, conforme o desenvolvimento de seus

eixos.

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Com uma dedicação à questão do processo entre emissor e receptor, e voltando-se aos

estudos da “educação para os meios”, o texto utiliza referências de Edgar Morin, Manuel

Castells, Mauro Wolf e McLuhan.

2.2 A comunicação de massa

XXXXXXXX.

2.3 Modelo emissor-receptor

XXXXXXXX.

2.4 Teoria do Agendamento: agenda-setting e espiral do silêncio

XXXXXXXX.

2.5 Novas literacias no contexto da autocomunicação de massa

Devido a vários aspectos das redes de comunicação e o caráter multimídia dos textos e

hipertextos na sociedade em rede, os quais influenciam as formas de se relacionar em todos os

campos da vida social, nos quais a comunicação se torna global e local, genérica e

customizada e em constante transformação, as organizações nas quais as relações de poder

são institucionalizadas têm sido desafiadas a todo momento por este novo formato de

sociedade e todas as implicações que decorrem dos novos modos de produção, reprodução e

distribuição da informação. Assim, cada vez mais redes de comunicação verticais são

substituídas por redes horizontais interativas através da disseminação da comunicação

wireless (CASTELLS, 2007).

Partindo deste pressuposto, é importante analisar a constante transformação no papel

das literacias que emergem no contexto da sociedade atual, bem como é necessário considerar

algumas mudanças no paradigma da comunicação na sociedade em rede. Um dos principais

argumentos de Castells (2007) é que o surgimento da autocomunicação de massa (mass self-

communication), através da internet, celulares, das mídias digitais e de uma série de outras

ferramentas, promoveu o desenvolvimento de redes horizontais de comunicação interativa, as

quais conectam o local e global, proporcionando a comunicação de muitos para muitos de

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forma sincrônica e assincrônica, em oposição à sociedade industrial, centrada na mídia de

massa e caracterizada pela comunicação e distribuição de mensagens de mão única, de um

para muitos, como é o caso da televisão por exemplo. Sendo assim, uma das principais

características da autocomunicação de massa seria o poder de “autogerar conteúdos, sua

emissão autodirecionada, e a autosseleção em sua recepção em uma rede de muitos para

muitos” (Ibid., 2007, p. 246, tradução minha), o que possibilitaria uma interação global e uma

diversidade ilimitada, as quais constroem e reconstroem a produção de sentidos local e

globalmente na mente do público.

Assim, o foco desta modalidade de comunicação estaria na agência do indivíduo, o

qual deixa de ser um mero sujeito passivo para exercer sua autonomia e participação ativa nas

redes de comunicações. Lankshear & Knobel (2005) afirmam que as novas formas de

literacias estão focadas na diversidade linguística e cultural e seu impacto crescente nas novas

formas de comunicação tecnológica tem modificado as demandas em relação às habilidades

dos indivíduos nas dimensões linguística e cultural, assim como nas práticas sociais. Já em

relação ao mercado de trabalho, Cope & Kalantzis (2000) afirmam que a era Pós-Fordismo

substituiu a velha estrutura hierárquica desenvolvida por Henry Ford através do modelo de

técnicas de produção em massa, caracterizado pelo trabalho repetitivo e o uso de mão de obra

não qualificada na linha de produção. Desta maneira, na era Pós-Fordismo o que se observa

cada vez mais nas relações de trabalho é modelo de hierarquia horizontal, caracterizado pelo

trabalho em equipe, no qual trabalhadores polivalentes ou “multitarefas” se identificam com a

visão, missão e valores corporativos, assim como são responsáveis e comprometidos com a

política da empresa.

Além disso, Castells (2007) alega que a autocomunicação de massa torna-se uma

ferramenta pela qual movimentos sociais constroem sua autonomia e confrontam o poder

institucionalizado através de suas iniciativas e projetos. Nesta visão, os movimentos não se

originam na tecnologia, porém usam a tecnologia como meio ou como forma de construção

social e para o desenvolvimento da autonomia.

Um exemplo acerca das novas formas de interação na sociedade em rede é o conceito

de espaços de afinidade (affinity spaces), os quais seriam espaços onde o diálogo e a interação

de culturas ocorrem através de práticas sociais (GEE, 2004). Para Gee, estes espaços de

afinidade são locais onde as pessoas interagem umas com as outras e dividem experiências e

práticas ou um assunto em comum, isto é, elas se reúnem para compartilhar uma afinidade ou

interesse para a realização de um objetivo, não importando sua raça, gênero, idade ou classe

social. Além disso, tais espaços podem ser reais ou virtuais, como por exemplo, em um

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ambiente da internet, por meio de uma rede social ou um blog, ou ainda uma mistura dos dois

tipos de ambientes, real e virtual. Castells argumenta que os blogs constituem sistemas de

autocomunicação de massa, nos quais as redes de compartilhamento de informações tornam

possíveis a circulação e a reformatação de qualquer conteúdo digital. Segundo o autor, apesar

de muitos blogs serem de conteúdo pessoal (cerca de 52%), isto é, somente para satisfazer

uma vontade do criador, e apenas alguns deles serem direcionados para outros receptores

(cerca de 32%), qualquer informação postada na rede torna-se “uma garrafa boiando no

oceano da comunicação global” (CASTELLS, 2007, p.247, tradução minha), a qual pode ser

recebida e reprocessada de diversas e inesperadas maneiras.

Neste panorama, novas formas de literacias se fazem necessárias para que haja a

interação entre pessoas com diferentes repertórios e culturas, mas muitas vezes com um

objetivo em comum. Gee (2004) também defende o conceito de design de redes pelo qual as

pessoas devem estar conectadas a outras redes de pessoas variadas e desconhecidas, pois

nesses tempos de mudanças rápidas e constantes, se o indivíduo está conectado apenas com

pessoas ou organizações iguais a ele mesmo, ou seja, todos nessa rede possuem os mesmos

conhecimentos em comum, não há nada para ser aprendido. Por outro lado, estar conectado

com pessoas ou organizações de outras áreas é fundamental, pois tudo o que é diferente

reflete novas maneiras de se pensar a realidade das coisas, assim como sugere novas práticas

as quais podem nos ajudar a constituir novas organizações de pensamento ou mindsets

(LANKSHEAR & KNOBEL, 2005). Tais organizações de pensamento surgem na interface

entre literacias, tecnologias e práticas sociais. Gardner (1993), em sua teoria das inteligências

múltiplas, corrobora essa pluralidade do intelecto e defende a importância do reconhecimento

da variedade de inteligências humanas para que possamos, através da percepção das várias

combinações de inteligências, aprender a lidar melhor com os problemas que nos deparamos

mundo afora.

2.6 Videogames: prazer ou aprendizagem?

Em se tratando dos videogames, as intervenções do indivíduo manifestam as redes

horizontais de comunicação de forma clara na sociedade em rede. As pesquisas de Gee (2005)

acerca dos videogames demonstram uma série de habilidades que desenvolvem a agência e a

autonomia do sujeito na interface entre literacias, tecnologia e práticas sociais. Segundo ele,

os videogames auxiliam a construção de uma série de habilidades, como o pensamento, a

reflexão e o comprometimento, já que os jogadores tornam-se coautores da estória e

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interagem com a mídia, fazendo interferências a todo momento na sequência da narrativa,

fatores estes que reiteram a autonomia e a participação ativa do jogador. Deste modo, as

literacias que emergem no contexto dos games muitas vezes são depreendidas intuitivamente,

uma vez que nem sempre os jogadores têm consciência de que estão aprendendo, já que estão

simplesmente se divertindo.

Dentre as habilidades que se desenvolvem através dos videogames, Gee1 destaca sete

em evidência. São elas:

1. Interatividade – os jogadores atuam como cocriadores do universo em que estão

inseridos, de modo que suas ações e decisões fazem com que eles se sintam

sujeitos ativos e não apenas consumidores passivos;

2. Customização – os jogadores são capazes de personalizar o jogo de acordo com

seu estilo e interesses pessoais, como por exemplo, escolher o grau de dificuldade,

ou mesmo optar por diversos tipos de personagens com características diversas;

3. Fortalecer identidades – bons jogos oferecem diversos tipos de identidades que

conectam o jogador e o personagem virtual de alguma maneira;

4. Problemas bem ordenados – problemas iniciais fornecem subsídios para que o

jogar aprenda a lidar com futuras situações mais complexas no decorrer do jogo;

5. Frustrações agradáveis – bons jogos ajustam os níveis de frustração para que os

jogares tenham um feedback de suas performances, porém com a conscientização

de que os desafios são possíveis de ser superados;

6. Jogos são criados em torno de um ciclo de expertise – jogos são construídos por

meio de práticas de ciclos repetidos e testes de habilidades adquiridas com tais

práticas. Após isto, um novo desafio é criado através de uma nova prática e um

novo teste;

7. “Profundo” e “Justo” – um jogo é justo quando é desafiador e leva ao sucesso

sem que ateste falhas virtuais sobre as quais o jogador não tenha controle. É

profundo, quando as estruturas do jogo tornam-se gradativamente complexas à

medida que o jogador as compreenda e possa dominá-las.

Portanto, observa-se que várias dessas habilidades apontadas por Gee dialogam com as

características da autocomunicação em massa de Castells (2007), como por exemplo, os

1 In: Gee on Video Games and Learning. Disponível em <http://newlearningonline.com/new-learning/chapter-9-

learning-communities-at-work/james-gee-on-video-games-and-learning/> Acesso em 30/05/2013.

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conceitos de interatividade, customização e a questão da identidade na sociedade em rede.

Assim, muitos desses conceitos apreendidos através dos videogames poderiam ser

transferidos para outros contextos a fim de desenvolver novas literacias para a solução de

problemas. A questão é: será que os indivíduos são capazes de fazer essa transferência de

literacias consciente ou inconscientemente para situações de vida real?

2.7 Era da Internet: interatividade e formação de redes

XXXXXXXX.

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3. A FIGURA DO PROSUMER: CONCEITO, CARACTERÍSTICAS E

MOTIVAÇÕES

O terceiro capítulo deste trabalho monográfico debate mais fortemente a figura do

prosumer, um consumidor que também adquiriu o direito de produzir conteúdo, e que tem

mudado a relação entre empresas e públicos. Suas principais características e as motivações

que fazem com que armazene, crie e compartilhe informações, principalmente com auxílio da

Internet, também serão abordados neste capítulo.

Para isso, criou-se uma estrutura com três partes, sendo que duas delas incluem itens

com assuntos mais específicos. No primeiro deles, tratar-se-á da convergência das mídias e a

popularização das redes sociais como elementos fundamentais para a ruptura definitiva do

paradigma emissor-receptor. A discussão é norteada pela articulação das ideias de Dannah

Boyd e Nicole Ellison (2007), Henry Jenkins (2009), Raquel Recuero (2009) e Rich Gordon

(2003).

A segunda parte apresenta os principais conceitos sobre esse consumidor e produtor,

simultaneamente, e dedica-se exclusivamente a oferecer o histórico e definir o termo

prosumer frente a diversas outras opções e abordagens que são explicitadas nesse item. Para

apresentar esses temas, foram utilizados os seguintes referenciais teóricos: Alvin Toffler

(1980), Axel Bruns (2008a, 2008b), Carolina Terra (2011), além de Don Tapscott e Anthony

Williams (2007).

A terceira e última parte, que também conta com uma subdivisão, trata da cultura

participativa e da inteligência coletiva como características imprescindíveis para o surgimento

do prosumer, figura que provocou diversas mudanças na forma de relacionamento com

empresas, construção de conhecimento e revitalização de produtos midiáticos. A articulação

desses temas teve como base as obras de: Beth Saad (2003), Henry Jenkins (2009), Pierre

Lévy (1998) e Clay Shirky (2011).

3.1 Convergência das mídias e emergência de redes sociais: ruptura definitiva da

barreira entre consumidores e produtores de conteúdo

É frequente a utilização do termo “convergência” sempre que se fala de tecnologia.

Mas qual seria a melhor definição para esse processo? O professor universitário Rich Gordon

(2003) recorre a diversos momentos históricos para demonstrar as múltiplas maneiras de

aplicação da nomenclatura.

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Com origem no mundo das ciências ditas “duras”, o termo foi usado pela primeira vez

no fim do século XVII e início do século XVIII pelo cientista inglês William Derham, ao

mencionar a convergência e divergência dos raios, medindo-se o intervalo entre a velocidade

do flash e do som do fenômeno.

No século XX, iniciou-se a aplicação do termo na economia, para descrever a

convergência das economias nacionais inseridas na economia global e na política, em que se

introduzia a convergência entre os sistemas norte-americano e soviético.

Foi a partir da década de 1960, no entanto, que se começou a priorizar o uso do termo

relacionado às tecnologias de informação e comunicação (TICs), principalmente devido ao

desenvolvimento mais intenso de máquinas computacionais e redes. No final da década de

1970, o cientista Nicholas Negroponte já falava em um entrecruzamento entre as indústrias de

computação, cinema e impressão que alteraria diversas estruturas da sociedade. Porém, foi no

início da década de 1980 que o Doutor em Artes Ithiel de Sola Pool, ao tratar das tecnologias

da liberdade, popularizou o termo “convergência” e profetizou que as inovações tecnológicas

contribuiriam para diversas mudanças sociais, principalmente no que tange ao

compartilhamento de textos, conversas e notícias de maneira digital (GORDON, 2003).

Em meados da década de 1990, o termo já era utilizado até em notícias de jornais e as

empresas foram forçadas a entender que a mídia corporativa entraria em rota de colisão com a

mídia alternativa e transformaria a produção, distribuição e consumo de informações.

Inicialmente, a propagada “convergência” se dava apenas na troca de conteúdos entre

emissoras de televisão e redações de jornais impressos que pertenciam ao mesmo

conglomerado. Com o tempo, todavia, a expressão foi utilizada em sentidos tão diversos, para

operações tão diferentes, que acabou se banalizando (GORDON, 2003).

Henry Jenkins (2009), na tentativa de retomar valor ao termo, assume no livro

“Cultura da Convergência” que a nomenclatura é antiga, mas extremamente útil, devendo

ganhar novos significados no cenário atual. Nessa perspectiva, explora uma das facetas mais

importantes da expressão, o fluxo de conteúdos por diversas plataformas de maneira

simultânea, em decorrência do entrelaçamento das velhas mídias com as novas mídias. O

autor ressalta como entende o termo:

Por convergência refiro-me ao fluxo de conteúdos através de múltiplas plataformas de mídia, à cooperação entre múltiplos mercados midiáticos e ao comportamento migratório dos públicos dos meios de comunicação, que vão a quase qualquer parte em busca das experiências de entretenimento que desejam. Convergência é uma palavra que consegue definir transformações

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tecnológicas, mercadológicas, culturais e sociais, dependendo de quem está falando e do que imaginam estar falando. (JENKINS, 2009, p. 29)

Não se trata apenas de uma convergência de equipamentos, como um celular que

possui acesso a canais de TV, emissoras de rádio, Internet, entre outras funções, mas da troca

de informações e conteúdos em diversos canais, com múltiplos modos de acesso e interação.

Por assim dizer, “A convergência envolve uma transformação tanto na forma de produzir

quanto na forma de consumir os meios de comunicação” (JENKINS, 2009, p. 44). Qualquer

pessoa com acesso à Internet, portanto, se torna um participante da cultura da convergência,

obviamente com diferentes graus de influência.

Produtores das grandes emissoras de televisão e veículos de comunicação mais

tradicionais acreditavam que o telespectador apenas queria receber o conteúdo

confortavelmente sentado no sofá de sua sala. Porém, o que se percebeu é que a participação

efetiva dos “consumidores” só não ocorria devido à falta de canais disponíveis para que

interagissem com a programação. Com o advento da Web, a interação cresceu

vertiginosamente, muitas vezes dando origem a novas criações coletivas e revitalizando

filmes, textos e obras artísticas até então esquecidas (JENKINS, 2009).

As redes sociais, nessa seara, também se tornaram importantes aliadas para a geração

de uma ruptura definitiva da antes bem delimitada relação entre consumidores e produtores de

conteúdo. Elas se originam do que Recuero (2004, p. 7) denomina de softwares sociais:

“sistemas que visam proporcionar conexões entre as pessoas, gerando novos grupos e

simulando uma organização social”. Esses softwares são popularmente conhecidos como sites

de relacionamentos ou redes sociais on-line.

A autora ainda aponta dois elementos básicos formadores de uma rede social: os

atores-indivíduos, instituições ou grupos – e suas conexões (RECUERO, 2009b, p. 23). Uma

rede, afirma Recuero, é “uma metáfora para observar os padrões de conexão de um grupo

social, a partir das conexões estabelecidas entre os diversos atores.” (RECUERO, 2009b, p.

24). Caracterizadas por possuírem ambientes sem barreiras ou censuras, acabam por

possibilitar o engajamento cívico e oferecer instrumentos para o compartilhamento de

conteúdos entre pessoas.

Uma vez que o número de comunidades virtuais, redes sociais e de usuários tem-se

expandido e crescido enormemente, essas comunidades têm-se tornado objeto de estudo de

diversos pesquisadores (RIDINGS, GEFEN, 2004; SCARABOTO, 2006; ALMEIDA,

MAZZON e DHOLAKIA, 2008) interessados em conhecer desejos, atitudes e simbologias

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que são revelados e discutidos dentro dessas comunidades, bem como a grande influência que

ocorre na tomada de decisão de um consumidor particular ou de um grupo, refletindo e

estimulando mercados. As comunidades virtuais e suas redes sociais apresentam ampla gama

de efeitos culturais, incluindo a influência no comportamento do consumidor (KOZINETS,

2002).

Isso ocorre principalmente porque as redes sociais têm como característica primordial

a presença de pessoas para a sua constituição. Sem elas, toda a estrutura tecnológica que dá

suporte para o seu funcionamento torna-se inútil. Uma rede social, por mais aplicativos e

funções que possua, não sobrevive sem participantes reais para abastecê-las com conteúdo,

interação e troca social, porque se pressupõe que cada um dos nós, presentes em sua

configuração, “representam cada indivíduo e suas conexões, os laços sociais que compõem os

grupos. Esses laços são ampliados, complexificados e modificados a cada nova pessoa que

conhecemos e interagimos” (RECUERO, 2009a, p. 25).

É válido ressaltar, no entanto, que as redes sociais mais populares disponíveis na Web

geralmente precisam ter características mínimas de funcionamento para cumprir sua função,

são elas: registro de perfil público no sistema; visualização de informações de amigos na rede;

e compartilhamento livre de informações entre usuários pertencentes à lista de conexões

(BOYD; ELLISON, 2007; RECUERO, 2009a).

As redes sociais formadas no ambiente digital começaram a se popularizar em 1997,

com a criação da SixDegrees.com, que permitia a criação de perfis, comunidades e

mensageiros instantâneos, além de entrar em contato com amigos e interagir com suas

postagens de conteúdo. Desde então, até o ano de 2002, surgiram a AsianAvenue e Ryze.com,

sendo a última a única a ter um pouco mais de importância, por ter contribuído para a criação

do LinkedIn, em 2003. No mesmo ano, MySpace e Hi5 foram fortemente disseminadas e

iniciaram o sucesso de adesão por parte do público que se concretizou em 2004,

principalmente pelo Orkut, no Brasil, e Facebook, no mundo. Youtube, em 2005, e Twitter,

em 2006, fecharam o ciclo de sucesso até o momento (BOYD; ELLISON, 2007).

Segundo Beth Saad, a evolução desses meios digitais, em que a apropriação se torna

cada vez mais fácil e intuitiva, fez com que a livre informação dê mais poder à pessoa que

participa desse novo ambiente:

Ao longo da evolução dos meios digitais como mídia informativa, assistimos a uma espécie de revalorização do valor da informação na sociedade contemporânea, principalmente por parte do leitor ou do usuário, que passam a ter voz e opinião na cadeia informativa. Cada vez mais, o usuário tem, em seus dispositivos eletrônicos, ferramentas que potencializam suas opções de

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escolha de conteúdos para compor sua cesta informativa e, assim, ampliar sua condição intelectual e de conhecimento sobre o ambiente. (SAAD, 2003, p. 145)

Nesse contexto, o consumidor de informação não deixa de produzir também, conforme

aponta Lévy (1996, p. 63): "O consumidor não apenas se torna coprodutor da informação que

consome, mas é também produtor cooperativo dos ‘mundos virtuais’ nos quais evolui”.

Dentro da perspectiva de uma cultura de convergência, conforme apontado por Jenkins

(2009), diversas experiências culturais mostram as potencialidades desse novo processo de

comunicação e produção de sentidos. Entre os exemplos apontados pelo autor está a análise

da narrativa transmidiática trazida pelos produtos relacionados à trilogia Matrix, classificados

como entretenimento para a era da convergência, pois integram múltiplas formas de texto, que

vão desde exibições cinematográficas, passando por histórias em quadrinhos divulgadas via

Internet, games para computador e um jogo online para múltiplos jogadores em massa

(JENKINS, 2008, p. 134). Esse tipo de narrativa, segundo o autor, surge como reação à

própria convergência; é uma estética que exige dos seus consumidores uma participação ativa.

É diante dessa perspectiva que se inicia a discussão sobre a figura do prosumer,

preliminarmente definido aqui como a junção entre uma pessoa que consome, mas que

também produz conteúdo. A partir dessas características dos prosumers, percebe-se que o

reconhecimento desse tipo de consumidor dentro do processo de produção/consumo é de

grande importância para os gerentes de marketing, pois representam canais de comunicação

importantes para criar atitudes e demandas. Eles refletem e estimulam mercados, através de

sua participação e poder de comunicação (NUNES, RODRIGUES, 2005). Além disso, o

entendimento do comportamento dos prosumers pode gerar insights úteis para o entendimento

das novas tendências no comportamento do consumidor e práticas de marketing (TROYE e

XIE, 2007). Segundo Langer (2007), são os prosumers os principais responsáveis pela

inovação de produtos, num sentido mais restrito, e pela produção de cultura de consumo, num

sentido mais amplo. A origem e aplicação do termo serão discutidas mais detalhadamente no

próximo item deste texto coletivo.

3.2 Prosumer: conceituação

O termo prosumer foi cunhado por Alvin Tofler, escritor americano especialista em

apontar tendências para o futuro, em 1980, quando publicou o livro A Terceira Onda. No

entanto, a primeira discussão sobre o assunto aconteceu quando Marshall McLuhan e

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Barrington Nevitt sugeriram em uma obra de 1972, Take Today, que, com a tecnologia

elétrica, o consumidor se tornaria um produtor. Essa ideia avançou para o que Toffler chamou

prosumer e foi retomada em 1996 por Tapscott em sua obra Economia Digital (2010, p. 251 e

408).

O conceito de prosumer é interpretado, nas obras consultadas, de forma semelhante,

mas apresenta desdobramentos de acordo com as considerações feitas por cada autor. Quando

McLuhan e Nevitt abordaram esse tema em 1972, não chegaram a propor um termo específico

para o fenômeno que então vislumbraram, o que Toffler fez deliberadamente ao falar em um

prosumer.

O termo prosumer mostrou-se de difícil tradução, pelo fato de ser uma aglutinação.

Assim, nas obras que traduzem o termo para o português, destacam-se as seguintes

ocorrências: 1) prosumidor (Islas-Carmona); 2) prossumidor (A Terceira Onda, de Alvin

Toffler). Há também obras que, embora traduzidas para o português, conservam o termo em

inglês, como é o caso de Tapscott (2010), que cunhou o substantivo prosumption para definir

o fenômeno por meio do qual que os prosumers produzem e consomem. Esse termo foi

traduzido para “prossumo”, entre aspas. Para os propósitos deste trabalho, adotaremos os

termos prosumer e prosumption, mantendo os demais usos nas transcrições dos originais

consultados.

João Távora, tradutor da oitava edição de A Terceira Onda (1980), de Alvin Toffler,

usada aqui como referência, adotou o termo "prossumidor" como tradução de prosumer, do

original, The third wave. Nessa obra, Alvin Toffler se utiliza da metáfora das ondas em

mudança que colidem para prever profundas transformações em aspectos comunicacionais,

tecnológicos, econômicos e socias de uma nova civilização. O autor caracteriza, analisa e faz

previsões sobre as transformações sob o impacto do que ele chama de a “Terceira Onda” na

maré da história - altamente tecnológica, mas anti-industrial -, considerando Primeira Onda

aquela lançada pela revolução agrícola, e a Segunda Onda, pela revolução industrial.

No capítulo intitulado “O Advento do Prossumidor”, Toffler chama a atenção para a

figura do “prossumidor”, termo que funde “produtor” e “consumidor”, comentando que essa

figura já existia na sociedade agrícola, baseada em produção para uso, pois as pessoas

consumiam o que elas próprias produziam. Em oposição, na sociedade industrial, baseada em

produção para troca, houve a criação do mercado, uma economia que separou o produtor do

consumidor.

Toffler propõe uma maneira de pensar a economia com dois setores: o Setor A, aquele

do trabalho não pago, invisível, fantasma, em que as pessoas fazem para si mesmas, suas

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famílias, sua comunidade – o setor de prossumo. O Setor B, por sua vez, é aquele em que a

produção de serviços é para venda ou troca no “mercado”, o setor visível da economia, que

separa produtor de consumidor.

Durante a Primeira Onda agrícola, o Setor A é enorme, e o Setor B é mínimo. Na

Segunda Onda, industrial, há o contrário: o Setor A é pequeno (prossumidor invisível) e o

Setor B é imenso, o que fez com que muitos economistas esquecessem da existência do Setor

A. No final da Segunda Onda, entretanto, há o desaparecimento progressivo da fronteira entre

produtor e consumidor e, na Terceira Onda, a crescente significação do prossumidor,

tranformando o mercado e a vida das pessoas, que fazem por si mesmas o que antes outros

profissionais faziam. Toffler afirma:

Muitos dos mesmos dispositivos eletrônicos que usaremos em casa para fazer trabalho remunerado também tornarão possível produzir mercadorias ou serviços para nosso próprio uso. Neste sistema o prossumidor, que dominou as sociedades da Primeira Onda, será trazido de volta ao centro da ação econômica – mas numa Terceira Onda, em base de tecnologia. (TOFFLER, 1980, p. 275)

Considerando o ano em que foi escrita, 1980, anterior ao desenvolvimento, em 1989,

do modelo aberto da Internet pelo cientista britânico Tim Berners-Lee, “como uma ferramenta

acadêmica que permitiria aos cientistas compartilhar informações” (PASSARELLI, 2008),

parte das previsões de Alvin Toffler sobre o prosumer em base tecnológica se confirmaram e

inspiraram diversos estudos posteriores sobre essa figura que funde “produtor” e

“consumidor”. O autor ainda retoma e desenvolve o termo prosumer em obra posterior,

Powershift, de 1990, em que desenvolve o termo, prevendo que, algum dia, os clientes

poderiam também pressionar botões que ativariam processos de produção remotos.

Segundo Xie, Bagozzi e Troye (2008), os prosumers são pessoas bem informadas, em

constante procura de conhecimentos e desenvolvimento de competências em todos os

aspectos de interesse do seu dia-a-dia. Estão ativamente envolvidos na criação de valor e

benefícios para seu próprio consumo. Conforme Piller e outros (2005), os prosumers atuam

como co-designers ou parceiros na criação de valor, uma vez que eles se apropriam de

atividades e processos que costumavam ser de domínio exclusivo de empresas. Valendo-se

das novas tecnologias, eles interagem e influenciam quem os rodeia, antecipando tendências

(PILLER e outros 2005; XIE, BAGOZZI e TROYE, 2008).

Com estas novas transformações tecnológicas experimentadas nas últimas décadas,

tem-se um cenário ideal para a emergência de uma geração ultraconectada, criativa e que tem

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o compartilhamento com base essencial para as formas de interagir e compartilhar. Isso se dá,

entre outros fatores, porque há mais ferramentas disponíveis e de uso cada vez mais

profissional acessíveis a um número crescente de indivíduos. (TAPSCOTT, 2010, p. 252).

O simples fato de que os consumidores estão ativamente envolvidos na criação de

valor e benefícios para seu próprio consumo está alinhada com a visão pós-modernista de que

o consumidor é um participante da personalização de seu próprio mundo, agindo e

determinando os significados e as funções dos objetos, baseado no seu sistema simbólico

(FIRAT, DHOLAKIA, 2006). Dessa forma, os consumidores, em lugar de meramente destruir

valores, produzem outros, comprometidos em diversas ações sociais, interpretativas e

produtivas que resultam em produtos, símbolos, sinais e benefícios psicossociais.

Para compreender de forma mais aprofundada o contexto em que os prosumers

ganham força, Tapscott, em “A hora da geração digital: como os jovens que cresceram usando

a Internet estão mudando tudo, das empresas aos governos”, publicado em 2010, apresenta

parte das conclusões do projeto de pesquisa “The Net Generation: a Strategic Investigation”,

realizado pela New Paradigm/nGenera entre 2006 e 2008. No estudo, cerca de 10 mil

representantes de diferentes idades, de todo o mundo, participaram de entrevistas,

presencialmente e pela Internet.

Nesta obra, o autor retoma as discussões sobre o que define como prosumption, o que

já fora objeto de discussão em outro livro de sua autoria, The Digital Economy (1996).

Segundo ele, vivemos um momento que oportuniza o compartilhamento e a ascensão das

redes de influência, e compreender esse contexto é determinante para a definição do

prosumer.

Xie, Bagozzi e Troye (2008) definem prosumption como as atividades de criação de

valor realizadas pelo consumidor que resultam na produção de produtos que eles

eventualmente consomem e que constituem suas experiências de consumo. Certos fatores

podem incrementar a propensão de prosumption; entre eles, avanços tecnológicos, aumento de

acesso à Internet etc. Porém, outros fatores podem reduzir essa inclinação de prosumption.

Dessa forma, a complexidade da tecnologia (componentes eletrônicos em carros e em outros

produtos) pode dificultar às pessoas leigas realizar por elas mesmas certos trabalhos,

desencorajando comportamentos de prosumption (TROYE e XIE, 2007).

Tapscott explica as origens do termo prosumer. Segundo o autor (2010, p. 251), de

Marshall McLuhan (1970) a Alvin Tofler (1983), além de sua obra The Digital Economy

(1995) e o livro Wikinomics: how mass collaboration changes everything (2006). Segundo o

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autor, em todos os momentos em que essas ideias vieram à tona, tinham como foco o futuro e

a ideia de que produtor e consumidor se fundiriam. E esse “futuro” chegou.

Tapscott apresenta dados demográficos fundamentais para o entendimento contextual

que oportuniza a emergência dos prosumers, situando e caracterizando as gerações da

seguinte forma:

- Geração Baby Boom (1946-1964): forte economia pós-guerra, famílias confiantes,

muitos filhos. Esperança, otimismo, paz e prosperidade. Ascensão da televisão,

onipresença da “telinha”. (TAPSCOTT, 2010, p. 23-25).

- Geração X (Baby Bust ou Geração de Retração da Natalidade) (1965-1976): queda da

natalidade. Bem-instruídos, enfrentaram alta taxa de desemprego. Comunicadores

agressivos, centrados na mídia. Quanto ao uso do computador, seus integrantes mais

jovens têm hábitos parecidos com os da Geração Internet. Segundo o autor, “... a

Geração X considera o rádio, a tevê, o cinema e a Internet como mídias não

especializadas, disponíveis para que todos acumulem informações e apresentem seu

ponto de vista.” (TAPSCOTT, 2010, p. 26).

- Geração Internet / Geração Y / Geração do Milênio (jan. de 1977 a jan. de 1997):

ascensão do computador, da Internet e de outras tecnologias digitais. Transição do HTML

para o XML, para a colaboração, criação de conteúdo, comunidades virtuais: “Enquanto

as crianças da Geração Internet assimilaram a tecnologia porque cresceram com ela, nós,

como adultos, tivemos de nos adaptar a ela – um tipo diferente e muito mais difícil de

processo de aprendizado.” (TAPSCOTT, 2010, p. 29).

- Geração Z / Geração Next (jan. de 1998 até o presente): nativos digitais, nasceram

imersos no contexto tecnológico de múltiplas telas e redes interativas.

A Geração Internet vê menos tevê e a vê de forma diferente, seletiva; também é

investigativa, buscando checar informações em tempo real. É criadora e remixadora de

conteúdos, e está ultraconectada ao celular. O e-mail é considerado por essa geração um

conceito ultrapassado, sendo visto como algo formal e apenas de uso profissional. O dia a dia

é compartilhado por meio das redes sociais on-line. Trata-se de uma geração que interage com

múltiplas telas. A questão da mudança nas formas de percepção e interação com a tela da

televisão é um ponto de atenção para o autor: o controle está agora nas mãos de todos.

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Tapscott fala sobre a emergência de um novo cérebro, de uma mente mais flexível,

adaptável e hábil em várias mídias. Trata-se não mais de um espectador que recebe

informações passivamente, mas que coleta informações, questiona-as e sintetiza-as para

criar algo novo. (2010, p. 122). Tem-se uma imersão tecnológica: TVs, computadores e

smartphones convivem e são o meio pelo qual a Geração Internet busca informações,

conversa com amigos e se conecta com o mundo.

Toda a reflexão proposta por Don Tapscott está baseada no que ele chama de “oito

normas da Geração Internet”, atitudes que diferenciam a Geração Internet das demais

gerações. São elas:

1. Liberdade para experimentar coisas novas, escolher o que consumir, onde trabalhar,

como trabalhar. “Os jovens insistem na liberdade de escolha.” (2010, p. 95).

2. Customização dos produtos e das experiências de compra, customização da mídia e do

próprio emprego/descrição de cargo.

3. Escrutínio, sempre buscando checar informações. “Deve-se oferecer à Geração

Internet informações amplas e facilmente acessíveis sobre os produtos.” (2010, p. 100).

Neste tópico, o autor alerta para o escrutínio inverso, ou seja, para o fato de esta geração

não atentar que as informações privadas oferecidas por ela livremente na rede podem se

tornar prejudiciais, expondo-a a riscos e danos de imagem (TAPSCOTT, 2010, p. 101).

4. Integridade como sinônimo de lealdade e transparência. Segundo Tapscott (2010, p.

105), os jovens da Geração Internet esperam trabalhar para e consumir de empresas que

ajam honestamente. Num tempo em que há abundância de informação, qualquer vacilo é

amplamente criticado por meio das redes sociais on-line. Esta norma é particularmente

controversa se considerarmos que recentes episódios de denúncia a grandes marcas de

moda por práticas trabalhistas análogas a escravidão não afetaram o crescimento dessas

empresas, tampouco a percepção de seus consumidores, que embora incomodados com os

fatos, não chegam a romper os vínculos ou deixar de consumir. Nesse sentido, a

expectativa de integridade não chegaria a abalar propriamente o consumo, mas talvez a

confiança.

5. Colaboração, principalmente por meio de tecnologias digitais, formando-se novas

comunidades que podem produzir. “Os jovens da Geração Internet são colaboradores

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naturais.” (TAPSCOTT, 2010, p. 110). Segundo o autor, os consumidores da Geração

Internet estão cada vez mais criando produtos e serviços em parceria com as empresas.

Em 1995, ao falar sobre esse assunto no livro The Digital Economy, Tapscott cunhou o

termo prosumption (“prossumo”); no entanto, o momento oportuno para que essa

integração acontecesse é agora, pois a Internet oferece, hoje, a possibilidade de que

indivíduos possam criar, compartilhar, formar comunidades, colaborar e inovar. Em

1995, os ambientes virtuais estavam ainda se consolidando e, do ponto de vista

tecnológico, havia muitas lacunas. “Portanto, o ‘prossumo’ era uma ideia prestes a

acontecer, esperando uma geração que tivesse um instinto natural de colaboração e

coinovação.” (TAPSCOTT, 2010, p. 111-112).

6. Entretenimento é associado a quase todas as experiências da vida, a começar pelo

trabalho, “porque a Geração Internet acredita que deve gostar do que faz para viver.”

(TAPSCOTT, 2010, p. 113).

7. Velocidade é uma expectativa natural para quem está acostumado a respostas

instantâneas. A Geração Internet está acostumada à velocidade: uma mensagem deve ser

respondida rapidamente, um produto deve ser entregue rapidamente, enfim, é um

ambiente instantâneo que gera ansiedade. No âmbito profissional, “Muitos integrantes da

Geração Internet gostariam que suas carreiras progredissem com a mesma velocidade do

resto de suas vidas.” (TAPSCOTT, 2010, p. 116).

8. Inovação é um modo contínuo para a Geração Internet, que “foi criada em uma

cultura de invenção. A inovação acontece em tempo real.” (TAPSCOTT, 2010, p. 117).

Tapscott traz uma reflexão sobre como a Geração Internet impacta também a

educação: há um grande abismo que existe entre o ambiente digital em que os estudantes

estão submersos e o sistema educacional projetado para a Era Industrial (2010, p. 150); os

modelos padronizados e unidirecionais de ensino não mais atendem aos desafios

contemporâneos; estão em ascensão problemas como o aumento da evasão escolar, a queda

da qualidade no ensino e os desafios para atrair estudantes. Segundo o autor, a economia

global e a era digital requerem novas capacidades, e o aprendizado se dá ao longo da vida.

Para ele, a capacidade de aprender é mais importante do que nunca. (2010, p. 155-156). Essa

geração requer mudanças das instituições tradicionais – escola, mercado de trabalho,

política.Para o autor, por causa dessa geração, “as organizações precisam repensar muitos

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aspectos de como recrutam, remuneram, desenvolvem, supervisionam e colaboram com

eles.” (2010, p. 51).

Um dos aspectos relevantes da obra de Tapscott diz respeito aos impactos dessa

geração sobre o mercado e o consumo; segundo o autor (2010, p. 51), a Geração Internet não

apenas tem poder de compra e influência: ela espera que as empresas criem experiências e

canais de interação. Como as formas pelas quais essa geração exerce influência mútua são

novas, “a mídia tradicional é ineficaz para atingi-los. [...] Em vez de consumidores, eles

querem ser ‘prosumers’ – coinovando produtos e serviços com os fabricantes.”.

O autor complementa essa ideia mais adiante, ao criticar os consagrados 4 pês de

marketing, preço, praça, produto e promoção, pois essa geração quer comprar em qualquer

lugar, momento ou oportunidade que for mais conveniente. Sobre o conceito de Marketing

2.0, ele pode ser caracterizado pelo ABCDE, que corresponde aos termos Ubiquidade, Marca,

Comunicação, Descoberta e Experiência. Sobre ubiquidade, Tapscott reforça a ideia de que a

mobilidade permite que se compartilhe informação em qualquer lugar, a qualquer momento.

A questão da marca também é debatida por ele: ela passa a ser mais que palavra ou imagem, e

se converte em uma arquitetura baseada em integridade, honestidade, confiabilidade,

consideração e transparência. A comunicação sai do modelo de promoção, mídia

unidirecional e padronizada, para um modelo multidirecional, dialogal. O preço perde o status

de inalterável e passa a ser negociável - "Quando compradores e vendedores trocam mais

informações, o preço se torna fluido." (TAPSCOTT, 2010, p. 257). Por fim, a experiência

com produtos, serviços e eventos gera colaboração e engajamento: ..."os prosumers da

Geração Internet querem estar envolvidos na coinovação dos produtos e, se você deixar,

estarão preparando o terreno para que as experiências ricas e duradouras ocorram."

(TAPSCOTT, 2010, p. 256).

Segundo Xie, Bagozzi e Troye (2008), os prosumers são pessoas bem informadas, em

constante procura de conhecimentos e desenvolvimento de competências em todos os

aspectos de interesse do seu dia-a-dia. Estão ativamente envolvidos na criação de valor e

benefícios para seu próprio consumo. Conforme Piller e outros (2005), os prosumers atuam

como co-designers ou parceiros na criação de valor, uma vez que eles se apropriam de

atividades e processos que costumavam ser de domínio exclusivo de empresas. Valendo-se

das novas tecnologias, eles interagem e influenciam quem os rodeia, antecipando tendências.

As principais características encontradas nos prosumers são descritas a seguir (EURO

RSCG WORLDWIDE, 2004; PILLER, SCHUBERT e KOCH, 2005; XIE, BAGOZZI e

TROYE, 2008; LANGER, 2007):

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1. Criam seu próprio estilo de vida: gostam de se sentir no controle da suas vidas e são

proativos. Procuram dicas e palpites de todas as fontes e montam seus estilos de vida em

função de suas necessidades. São autodeterminados e dominam a tecnologia. Conforme

Xie, Bagozzi e Troye (2008), eles criam suas próprias experiências subjetivas, as quais,

por sua vez, geram os benefícios pessoais e os valores sociais para os prosumers.

2. Não se deixam prender por estereótipos: não se autolimitam a rótulo ou lugar. As

suas escolhas não seguem padrões ou pressões sociais. Eles procuram criar padrões de

comportamento e auto-imagens ideais segundo o seu ponto de vista (XIE, BAGOZZI e

TROYE, 2008).

3. Fazem escolhas inteligentes: estando bem informados, sabem o que está disponível e

o que oferece maior valor para eles. Utilizam a tecnologia para comunicar-se com sua

rede de contatos e procurar o que têm de melhor em relação a seus interesses. Nesse

sentido, Troye e Xie (2007) acrescentam que as suas atitudes no processo de escolha vão

além do conhecimento das diversas marcas e dos atributos dos produtos, avaliando as

possíveis conseqüências e os reais benefícios de sua escolha.

4. Abraçam a mudança e a inovação: não somente aceitam as inovações, mas também

eles as acolhem, entusiasmam-se em explorá-las e procuram ver oportunidades nelas. São

os primeiros em adotar as novas tecnologias, mas não as aceitam de forma incondicional;

eles querem ser os primeiros a aderir às novidades que acrescentam valor (EURO RSCG

WORLDWIDE, 2004; LANGER, 2007).

5. Vivem aqui e agora: prosumers sabem lidar com os conflitos gerados pelas pressões e

os prazeres do dia-a-dia, tentando encontrar os meios para desfrutar o presente melhor do

que nunca. Eles se sentem mais capazes de viver o agora, sabendo que eles possuem

aquilo de que necessitam para lidar com o quê vier quando vier (LANGER, 2007).

6. Estão conectados e interagem: possuem o poder da conectividade e da interatividade

(FIRAT e DHOLAKIA, 2006). São capazes de acessar a informação sem limitações de

espaço e de tempo. Possuem a capacidade de enviar sugestões, reclamações e trocar

informações e opiniões. Possuem enorme capacidade de influenciar quem os rodeia.

7. Prosumers se valorizam: possuem alta auto-estima e se permitem momentos de

autoindulgência (FIRAT e DHOLAKIA, 2006).

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8. Escolhem o design: quer seja um objeto de designer nomeado, o visual de sua casa, a

seleção de ingredientes para uma refeição, o equipamento que usam. Prosumers tentam

colocar seu pensamento, senso de estilo e assinatura em tudo o que eles fazem e

escolhem.

9. Preocupam-se com a saúde: especialmente quando se trata da própria saúde ou a de

uma pessoa próxima. Questionam médicos e pedem segundas opiniões e, para isso,

procuram estar bem informados e a par do conhecimento (EURO RSCG WORLDWIDE,

2004).

10. Valorizam o que funciona: interessam-se pelos resultados mais do que pelo esforço

necessário para alcançá-los (EURO RSCG WORLDWIDE, 2004).

11. São árbitros das marcas: eles estão à procura de valor nas marcas. Percebem sua

presença ou ausência e alertam os outros disso. São criteriosos e julgam os produtos em

função do valor que proporcionam sem se prender a marcas (TROYE e XIE, 2007).

12. Querem saber como fazer: procuram saber como fazer as coisas em lugar de confiar

em outros para fazer isso. São afiados em aprender, afiados em compartilhar seu

conhecimento com outros (XIE, BAGOZZI e TROYE, 2008).

Em Wikinomics: how mass collaboration changes everything, Don Tapscott e Anthony

D. Williams (2007, p. 124-150) trataram da questão dos prosumers partindo da premissa de

que os consumidores hoje são também os produtores, ou seja, prosumers, retomando a

introdução do termo na obra de Tapscott (The Digital Economy, 1996), ao falar sobre

"prosumption" para descrever como a distância entre produtores e consumidores estaria

evaporando.

A primeira crítica trazida pelos autores em Wikinomics é sobre a confusão entre o

entendimento do conceito de prosumer e a centralidade do cliente, esta sendo a oferta de

produtos básicos que os clientes/consumidores podem modificar parcialmente, como

customizar um carro, por exemplo. No modelo de prosumption, os consumidores/clientes

participam da criação de produtos de forma ativa e contínua. Um dos exemplos ilustrativos é

o Second Life, em que o consumidor inova e coproduz os produtos que também consome.

Em outras palavras, os clientes fazem mais do que customizar ou personalizar seus produtos; eles podem se auto-organizar para criar o seu próprio. Os usuários mais avançados, na verdade, não mais esperaram por um convite para transformar um produto em uma plataforma para as suas

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próprias inovações. Eles simplesmente formam suas próprias comunidades de prosumers online, onde compartilham informações relacionadas ao produto, colaboram em projetos customizados, envolvem-se no comércio e trocam dicas, ferramentas e partes de produtos. (TAPSCOTT & WILLIAMS, 2007, p. 126) (Tradução livre)2

Ao falar sobre o Second Life, os autores mencionam que, embora ele seja uma

plataforma infinita para inovação, e não um produto, essa nova geração de prosumers trata o

mundo como um lugar para criação, não consumo. (TAPSCOTT & WILLIAMS, 2007, p.

127).

Um dos casos apresentados por Tapscott e Williams (2007, p. 129) é o do designer de

calçados John Fluevog3, que criou o calçado "opensource", em que consumidores submetem

desenhos para avaliação por parte de Fluevog, e os melhores são produzidos. Ele não oferece

contrapartidas em royalties ou remuneração financeira, ou mesmo em direitos de uso

comunitários, mas se compromete simplesmente a adornar o sapato escolhido com o nome de

seu criador.

Alguns dos aspectos reforçados pelos autores para caracterizar o comportamento dos

prosumers são: inovação e coinovação, capacidade sofisticada de criar e lidar com aplicativos,

fortalecimento da cultura do remix (que não é nova, porém hoje acontece em escala muito

maior), criatividade para produzir música, arte e invenções sem depender de grandes grupos

econômicos, cultura open source, e a ideia de que "nós somos a mídia" (TAPSCOTT &

WILLIAMS, 2007, p. 143).

Os principais pontos destacados por Tapscott & Williams (2007) são: 1) Prosumption

é mais que customizar; 2) A perda de controle sobre produtos, plataformas e formas de

interação é um fato; 3) Os prosumers buscam produtos e plataformas que possam modelar,

reconfigurar, editar; 4) O negócio real para prosumers não é criar produtos acabados, mas

ecossistemas de inovação; 5) Os prosumers desejam compartilhar os frutos de sua criação.

Os prosumers e sua inserção na sociedade são aspectos discutidos por outros autores,

Islas-Carmona (2008), Amaral (2012) e Rodriguez (2012). Islas-Carmona (2008) apresenta o

prosumer inserido na “sociedade da ubiquidade”, aquela em que a comunicação é para todos,

em qualquer momento e em qualquer lugar. Nesse aspecto, as figuras do emissor e do receptor

exibem, nos dias atuais, segundo o autor, diferentes limitações em suas capacidades 2 Do original: In other words, customers do more than customize or personalize their wares; they can self-organize to create their own. The most advanced users, in fact, no longer wait for an invitation to turn a product into a platform for their own innovations. They just form their own prosumer communities online, where they share product-related information, collaborate on customized projects, engage in commerce, and swap tips, tools, and product hacks. (TAPSCOTT & WILLIAMS, 2007, p. 126). 3 Disponível em: <http://www.fluevog.com/files_2/os-1.html>. Acesso em: 03 mai. 2013.

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explicativas. A ecologia dos meios se distingue por conceber ênfase ao estudo das tecnologias

e dos ambientes comunicativos que podem ser considerados, afirma o autor ao citar McLuhan,

extensões do homem, prolongações humanas à medida que estabelecem contato com o meio

em que este homem está inserido. O autor enfatiza essa questão ao afirmar que, com o

desenvolvimento dos meios de comunicação, “é possível perceber como progressivamente o

meio é transformado com o propósito, nem sempre consciente ou deliberado, de fazê-lo mais

parecido ao homem” (p.30). Dessa forma, pode-se compreender as mudanças ocorridas nas

sociedades, decorrentes da adaptação das pessoas às novas dinâmicas dos processos

comunicativos que se estabelecem nas sociedades contemporâneas.

A “sociedade da ubiquidade” envolve um uso expressivo das comunicações digitais

móveis para garantir o acesso de qualquer pessoa, em qualquer momento e em qualquer lugar

a uma ampla gama de informações. A educação também sofre essas consequências,

configurando-se em uma “educação móvel” (p.30), em que toda pessoa pode acessar aos

recursos de aprendizagem e que promove, dessa forma, mudanças profundas, não só na

educação, mas também nas instituições educativas. Essas mudanças na aprendizagem

ocasionam a alfabetização digital que, de acordo com o autor (p.30), resultam na

“transformação de ordinários cibernautas em prosumidores”.

Segundo o Islas-Carmona, o prosumer assume comportamento distinto do que se

observa nos simples usuários da Internet, destacando-se a forma com que ele se relaciona com

o conhecimento e como ele colabora em rede. A capacidade de buscar respostas, manifesta

pelos prosumers, representa uma evidência da forma independente em que ele se relaciona

com as informações, pois está claro que ele deixa de ser um usuário passivo, como observado

nos simples usuários. A colaboração, da mesma forma, resulta em um comportamento

fundamental, pois ele passa a ser um consumidor crítico que, além de posicionar-se diante de

irregularidades percebidas, denuncia e evidencia as questões éticas envolvidas em práticas

inescrupulosas, por exemplo.

Amaral (2012) afirma que a nova criatividade colaborativa promove a ação coletiva e,

em particular, a ação dos prosumers, uma vez que diferentes plataformas permitem que não-

especialistas publiquem conteúdos para uma grande audiência, potencialmente global, pois

não há fronteiras territoriais que impossibilitem o alcance dessas plataformas. Assim, as

ferramentas de mídia social que apresentam modelo de publicação, partilha e comunicação

orientada para uma estrutura coletiva têm “transformado a maneira como as pessoas

comunicam e interagem online” (p.133). Além disso, a autora cita Shirky e afirma que as

novas ferramentas sociais também promovem novas configurações de agregação de

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indivíduos e de formação de grupos e, enfatiza ainda, a colaboração exigiria mais participação

do utilizador do que a partilha de objetos sociais, o que implica em uma agregação de

participantes, enquanto a colaboração passa a criar uma identidade de grupo. Após citar outras

teorias sobre o tema, Amaral (2012, p.135) aponta que a ideia comum entre elas está no fato

de que “a inteligência humana está diretamente relacionada com a vida social e que a

interconexão de indivíduos, proporcionada pela técnica, potencializa a maximização do

conhecimento em uma escala coletiva”, transformando a maneira como as pessoas

comunicam e interagem com os outros online. E, nessa concepção, prosumer torna-se o

conceito-chave que descreve essa mudança de paradigma.

O consumo, comenta a autora ao citar Jenkins, se tornou um processo coletivo e, nesse

novo paradigma, a mudança passa pela convergência, cultura participativa e inteligência

coletiva. A convergência dos meios altera os modelos de consumo e produção e, nessa

configuração, encontramos os novos produtores/consumidores, ou seja, os prosumers. A Web

social permite o aumento das comunidades de prosumers organizados e que desafiam esse

papéis tradicionais de produtores e consumidores; o “conteúdo criado pelo utilizador orienta-

se para uma espécie de jornalismo coletivo à medida que novas ferramentas promovem redes

baseadas em metadados e práticas sustentadas por objetos sociais” (p.137). Torna-se tênue,

segundo a autora, a fronteira entre o privado e o público.

Rodriguez (2012) afirma que a grande diferença entre os receptores do passado e os

usuários atuais que se estabelecem nos sistemas e redes sociais trata-se do rompimento das

barreiras entre consumo e produção. O autor identifica o conceito prosumer a partir das

hipermediações e do hipertexto. A teoria das hipermediações, apresenta o autor citando

Orozco, se concentra em pensar nas mudanças que acontecem nos meios de comunicações e

como essas mudanças influenciam a forma com que entendemos as interações nos espaços

midiáticos. Essa teoria, segundo o autor (p.68), centra-se nas experiências comunicativas dos

atores sociais e nos processos de produção, consumo e significado das tecnologias da

informação e sua formulação decorre da teoria do hipertexto e seus postulados sobre o

funcionamento da Internet. A hipertextualidade permite, segundo o autor (p.69), “que cada

usuário estabeleça de forma personalizada, seu andar y estar”. Cada usuário constrói seu

caminho possibilitando novas formas de organização da informação e, assim, torna-se

evidente a participação ativa dos prosumers nesse ecossistema informacional atual.

De acordo com o exposto, o conceito prosumer pode ser considerado a nova

denominação do papel assumido pelos sujeitos que interagem com as mídias sociais e trata-se

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de um termo que precisa ser estudado para favorecer a compreensão dos papéis sociais desses

autores conectados em rede.

3.3 Cultura participativa e inteligência coletiva: alterações provocadas pela presença do

prosumer

O movimento de crescente evolução tecnológica acessível trouxe um novo perfil de

consumidor, cada vez mais atraído para dentro do processo de produção e desempenhando

uma nova significação na relação de consumo. A incorporação dos hábitos do usuário na

convergência das mídias como um influenciador e protagonista do processo comunicacional

trouxe um novo cenário em uma renegociação e reconfiguração de poder entre produtores e

consumidores. Neste sentido, o prosumer interage em um conjunto de regras subjetivo,

coletivo e em comunidades que se formam, dissolvem e são novamente construídas de forma

exponencial.

Para Clay Shirky (2011) os esforços divididos sem controle gerencial produzem

crenças arraigadas que trabalho sério é feito por pessoas adequadas, remuneradas com

gerentes que dirigem o trabalho. No entanto, indivíduos agindo como um grupo mesmo que

não coordenados é uma forma de autogerenciamento que cria um valor real. O valor pessoal é

o valor que recebemos por estar ativos em vez de passivos, por ser criativos em vez de

consumistas.

O atual cenário traz a relação em círculos colaborativos considerando não só o

componente de consumo, mas os efeitos da emoção humana como parte deste inventivo à

transação. A interação do consumidor com o produto e o desenvolvimento cognitivo estudado

na economia comportamental revela que o interesse não está somente no ter, mas também no

compartilhar. No entanto, segundo Shirky, esta emoção intrínseca que agrupa por diversas

razões pessoas motivadas não somente pela recompensa financeira, mas por fazerem parte de

algo em seu excedente cognitivo, basea-se em um sentimento de conexão e de ter sua voz

ouvida.

Esse novo formato nas relações de consumo traz novos desafios para quem deseja

oferecer seu produto, já que o prosumer dita as regras e tem um novo parâmetro referencial de

pesquisa e divulgação. Os antigos usuários tornaram-se participativos e fornecem a matéria

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para o excedente cognitivo4, onde não somos mais o alvo, mas parte legítima individual ou

coletivamente. A nova geração procura o mouse na televisão. A mídia inclui possibilidades de

consumir, produzir e compartilhar lado a lado e essas possibilidades estão aberta a todos.

Presencia-se atualmente uma cultura de participação tão intensa, que as pessoas já

conseguem se antecipar aos avanços tecnológicos, por exemplo, reformulando e aprimorando

softwares que acabam de ser lançados. O consumo, que se fazia presente de maneira

individualizada, agora é interligado em rede. Se, usando apenas a televisão, o homem se

isolava do mundo, agora, com auxílio do computador, enquanto assiste à programação, a

pessoa se insere em uma comunidade, interagindo com outros indivíduos (JENKINS, 2009).

Isso porque o ciberespaço permite, por meio da oferta de instrumentos de construção

cooperativa, um contexto comum para grupos numerosos de pessoas geograficamente

dispersos, conforme coloca Lévy. Não se trata apenas de um mero transporte de mensagens,

mas de uma situação comunicacional em que cada um é capaz de contribuir

[...] para modificar ou estabilizar, de uma negociação sobre significações, de um processo de reconhecimento mútuo dos indivíduos e dos grupos via atividade de comunicação O ponto capital aqui é a objetivação parcial do mundo virtual de significações entregue à partilha e à reinterpretação dos participantes nos dispositivos de comunicação todos-todos. Essa objetivação dinâmica de um contexto coletivo é um operador de inteligência coletiva, uma espécie de ligação viva que funciona como uma memória, ou consciência comum (LÉVY, 1996, p. 113-114).

A Wikipédia (enciclopédia on-line) é um exemplo claro da participação que pode

gerar benefícios. Por seguir um modelo em que qualquer pessoa, independentemente da

formação, pode editar o conteúdo disponibilizado, pressupõe-se que o sistema não é 100%

confiável, como de fato não o é. Todavia, diferentemente do que se pode pensar, a diferença

de erros em comparação com uma obra impressa e tradicional como a Enciclopédia Britânica,

principalmente no que tange a verbetes científicos, é muito pequena, como aponta estudo

realizado pela Revista Nature, em 2005. Não se pode levar a comparação como uma verdade

absoluta nos dias de hoje, uma vez que as amostras não são generalizáveis e já se passaram

quase dez anos da coleta de dados, mas ao menos se indica um caminho para possíveis

produções coletivas benéficas para a população, desde que se siga um conjunto de normas de

compartilhamento de conhecimento, como o seguido pela enciclopédia on-line (GILES, 2005;

JENKINS, 2009).

4 Excedente cognitivo é o tempo, energia, atitudes gastos entre as oito horas de trabalho e oito para dormir (oito

horas para fazermos o que quisermos) e os meios para usá-lo (SHIRKY, 2011).

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Para analisar tal fenômeno, Jenkins retoma as chamadas comunidades de

conhecimento, já escaneadas por Pierre Lévy (1998, p. 54), em que os indivíduos colocam seu

conhecimento a serviço de um objetivo comum, um fim coletivo, do qual emerge uma

inteligência alavancada, que combina a expertise dos membros de uma determinada

comunidade. São afiliações que se dão voluntariamente, dissociadas de localidade e

temporalidade; são temporárias e estratégicas para determinadas finalidades (como o caso dos

fãs do reality show “Survivor”, explicitado na obra). Um verdadeiro exercício, segundo

Jenkins, de epistemologia popular.

Peter Walsh (2003, p. 87) também é trazido para o debate por Jenkins pela proposta de

quebra do paradigma do expert, que pressupõe um corpo de conhecimento, dominado por um

indivíduo – o expert -, integrado a um clube de pessoas que possuem algum conhecimento

versus as que não o possuem. Esse conhecimento é adquirido por meio de regras: provas,

notas, graduações, e foi aceito em um determinado ritual. A inteligência coletiva, como coloca

Jenkins, pressupõe que todos têm algo a contribuir; cada participante ou comunidade

estabelece suas próprias regras para dominar ou disseminar determinado conhecimento; não

possui credencial determinada e muito menos uma graduação estabelecida (JENKINS, 2008,

p. 85-86).

É nesse sentido que a cultura participativa se relaciona diretamente com a postura mais

ativa que o prosumer exerce. De acordo com Henry Jenkins (2009, p. 30): “Em vez de falar

sobre produtores e consumidores de mídias como ocupantes de papéis separados, podemos

agora considerá-los como participantes interagindo de acordo com um novo conjunto de

regras, que nenhum de nós entende por completo”.

A partir dessa cultura participativa surge a “inteligência coletiva”, expressão utilizada

por Pierre Lévy (1998) para caracterizar a forma como todas as pessoas podem colaborar com

uma habilidade ou recurso específico que possua, contribuindo para o consumo, disseminação

ou desenvolvimento de algo novo, fazendo frente ao poder midiático tradicional, pelas

próprias palavras do autor “uma utopia realizável”. Nessa perspectiva, até mesmo um

telespectador que simplesmente descreve o que vê na televisão para outros participantes de

uma comunidade de fãs pode dar início a um processo de renovação de um produto ou

processo comunicacional, incentivando a participação de outras pessoas.

Jenkins ressalva, no entanto, que estaríamos ainda em uma fase de aprendizado dentro

dessa cultura em que comunidades do conhecimento e a comunicação todos-todos permite

essa partilha e todos esses exercício de epistemologia. O desenvolvimento de uma cultura

com capacidades democráticas ampliadas e uma vasta compreensão global depende, conforme

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pontua o autor da capacidade de aprender e da diversidade por compartilhamento de ideias,

fatores que podem ser reduzidos de forma acentuada quando se permanece em um círculo de

interações que divide as mesmas convicções (JENKINS, 2009, p. 305).

Outro ponto importante apontado pelo autor é que, no momento atual, caracterizado

principalmente pelas mudanças das antigas regras impostas pelo poder midiático, empresas

precisam repensar sua relação com os consumidores. Ao citar as comunidades de spoilers5 do

reality show Survivor ou a revitalização de Star Wars realizada por fãs6, práticas que

poderiam se aplicar à mobilização política, ao trabalho ou à educação, Jenkins (2009) retrata

que as empresas não devem tentar censurar a criatividade dos públicos, alegando propriedade

intelectual e tratando-os como uma ameaça econômica, mas aproveitar a oportunidade para

valorizar ainda mais o seu produtos pelos fãs e se tornar admirada e defendida por essas

pessoas (lovemarks), tema que será discutido no próximo subitem deste trabalho monográfico.

O futuro deste cenário é incerto. Seus aspectos positivos e negativos surgem com a

mesma velocidade desta evolução. Um monitoramento a fim de prever uma reação é instável,

uma vez que parte do controle desta nova expressão do usuário prosumer não está nas mãos

de nenhuma classe ou membro, mas no próprio fluir.

Nosso principal desafio não é decidir para onde queremos ir, mas permanecermos firmes enquanto vamos para lá. A invenção de ferramentas que facilitam a formação de grupos é menos uma formação tecnológica que um evento, algo que já aconteceu. Em consequência, o importante não é saber se essas ferramentas vão espalhar ou remodelar a sociedade, e sim como o farão. (SHIRKY, 2008 p. 260)

3.3.1 Empresas e novas mídias: adaptações necessárias para sobreviver

A relação entre organizações e seus públicos, brevemente introduzida no item anterior,

foi alterada a partir do momento em que o consumidor deixou de ser passivo e passou a

interferir nas ações e resultados das empresas. As informações disseminadas pela mídia

comercial ainda exercem forte influência na sociedade, mas desde que apropriadas por

5 Comunidades de spoilers são basicamente grupos que pesquisam e disseminam informações verdadeiras – ou não – sobre determinado programa, antecipando-se à transmissão original veiculada na TV, por exemplo. Se por um lado, pessoas que acompanham essas comunidades possuem informações privilegiadas e conseguem manter um distanciamento do programa, por outro lado, nunca vivenciam a experiência completa de assistir a um programa pela primeira vez e serem surpreendidos (JENKINS, 2009). 6 Fãs criaram roteiros, games, quadrinhos, entre outras manifestações artísticas, muitas vezes com interpretações criativas e de qualidade comercial, a partir do filme Star Wars, atividade também conhecida como fan fiction (JENKINS, 2009).

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prosumers, são modificadas e tornam-se outros produtos e processos comunicacionais

(JENKINS, 2009).

E, se essa estética não é proposta ativamente pelas marcas, franquias e produtoras

culturais, as próprias comunidades de conhecimento se encarregam dessa produção, conforme

o autor explicita em suas análises em relação aos fãs da saga “Stars Wars”, que se

preocuparam em reinventar narrativas para a série enquanto são ativamente estimulados ou

desestimulados (por meio de restrições) pelos criadores e produtores da narrativa em suas

mais diversas mídias; e pelas comunidades on-line que recriam, editam e gerenciam

produções literárias relacionadas à história do bruxo “Harry Potter”.

O caminho inverso, todavia, também passa a acontecer. Informações discutidas em

comunidades organizadas por fãs, por exemplo, são incorporadas pela cultura predominante.

Esse fluxo de baixo para cima é extremamente útil para a mídia de radiodifusão, por exemplo,

uma vez que, com o poder de amplificação que possuem, utilizam-se da diversificação de

ideias presentes na cultura participativa e aumentam as chances de lucrarem com públicos até

então inexplorados pelas organizações.

Beth Saad ressalta que as empresas midiáticas, por terem sido por tantos anos

dominantes como fontes de informação e acreditarem no desequilíbrio entre produtores e

consumidores, ainda não conseguiram adaptar totalmente sua visão no relacionamento com os

seus públicos. Além da instantaneidade, o tempo real e o acréscimo de um novo meio de

distribuição (Web), as organizações terão de lidar com as seguintes características do

ambiente:

● Ruptura do predomínio do polo de emissão. ● Criação de canais de informação e conversação independentes das fontes

formais. ● Alto grau de envolvimento e personalização por parte dos usuários. ● Alto grau de articulação coletiva. ● Facilidade de comunicação e expressão pela concentração, no mesmo

ambiente digital, de ferramentas de produção de conteúdo e de preparação e diálogo. (SAAD, 2003, p. 250)

Adaptar-se a essas mudanças não é algo simples, pois passa por uma redefinição

estratégico-estrutural-organizativa da empresa, tendo contato direto com alterações da cultura

da organização. Precisa-se entender rapidamente que o domínio da informação não será

retomado pela empresa e que, por consequência, produtos e serviços também sofrerão

mudanças (SAAD, 2003; JENKINS, 2009). Nesse contexto, Walter Bender, diretor-executivo

do MIT Media Lab, destaca a importância que a tecnologia teve para facilitar o acesso à

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informação e provocar mudanças na forma de conduzir e produzir, além de ressaltar que como

cada organização irá se relacionar com esses novos públicos poderá definir o futuro de seus

negócios:

O papel dos consumidores já não é mais somente consumir. Suas expectativas mudaram. São eles agora parte do diálogo – estão engajados no tipo de discurso que antes ocorria muito além de sua esfera de ação. A mídia digital está longe de engendrar um mundo fragmentado, povoado por interesses próprios e míopes. Em vez disso está libertando em cada um de nós nosso desejo básico de compartilhar, que às vezes se traduz em compartilhamento de informação, de ideias políticas e sociais, ou de bens e serviços. O processo iniciou-se e de fato é uma mudança de paradigma: o consumidor está se tornando criador. Como os negócios reagem a esse novo nível de engajamento e dele se apropria é o desafio para a próxima década. (BENDER, 2003, p. 13)

É válido ressaltar, portanto, que as exigências de interação dos prosumers precisam ser

respeitadas, uma vez que é mais fácil que esses públicos procurem concorrentes que permitam

sua participação do que se mantenham fiéis ao modelo antigo de centralização corporativa do

conteúdo (SAAD, 2003; JENKINS, 2009). Para Henry Jenkins, esse entendimento do novo

ambiente tecnológico em que está inserida é condição sine qua non para a sobrevivência da

empresa:

O público, que ganhou poder com as novas tecnologias e vem ocupando espaço na intersecção entre os velhos e os novos meios de comunicação, está exigindo o direito de participar intimamente da cultura. Produtores que não conseguirem fazer as pazes com a nova cultura participativa enfrentarão uma clientela declinante e a diminuição dos lucros. As contendas e as conciliações resultantes irão redefinir a cultura pública do futuro. (JENKINS, 2009, p. 53)

Só diante dessas condições poderão se tornar lovemarks, empresas que adquirem

“amor” e admiração de seus públicos, sendo defendidas arduamente nos momentos mais

difíceis e recebendo sugestões de aperfeiçoamento quando estão em boa situação. Além de se

adaptarem à cultura participativa, essas organizações também precisam buscar públicos mais

passionais e propensos à mensagem corporativa. O uso da emoção para se aproximar das

pessoas é frequente, uma vez que quase todo ser humano procura constantemente novas

ideias, inspirações e experiências para fazer parte do coletivo. Quando se atinge o objetivo, as

ameaças da participação do público são reduzidas e as empresas ganham fortes aliadas, até

mesmo com ideias criativas para novos produtos e serviços, fortalecendo suas marcas e

praticamente garantindo a sobrevivência (JENKINS, 2009).

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