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O FASCÍNIO DO ORIENTE SOB O SIGNO DO DRAGÃO Amílcar Martins 1 Amílcar Martins, Ph.D. Ciências de Educação, Artes, Montreal Professor do Departamento de Educação e Ensino a Distância Coordenador do Mestrado em Arte e Educação Investigador do CEMRI – Centro de Estudos das Migrações e Relações Interculturais Universidade Aberta [email protected] Fórum: O Fascínio do Oriente Lisboa, 10 de Junho de 2010 10:00h-17:00h O FASCÍNIO DO ORIENTE SOB O SIGNO DO DRAGÃO 1 2 Texto: Amílcar Martins Fotos: Frank Regourd RESUMO 3 Propõe-se um olhar retroactivo sobre uma experiência do Dia do Buda, centrada no universo do ritual chinês do “Dragão Embriagado” e que jogámos em Macau, nos anos de 2000 e 2001, nos templos, nos mercados e nas ruas, com os membros da Associação Geral dos Operadores do Peixe Fresco de Macau. A forma descritiva scripto-visual desenvolve-se através de uma metodologia de abordagem holística, procurando explorar-se o percurso da vivência do “eu” na sua relação com o “outro”. A trajetória seguida neste jornal de bordo, e o objecto resultante da narrativa, acentua o desejo de se prosseguir e aprofundar as relações ludo-dramáticas e teatrais menos frequentadas, tendo como base o fluxo da preservação da tradição, conjugado com o fluxo da impermanência, da contemporaneidade e da inovação. O desafio prospectivo e futurante que subjaz a este fascínio oriental, é mediado pela força sedutora e mágica do dragão, e inspirado pela criatividade e pela vitalidade das relações interculturais luso-chinesas vivenciadas pelos habitantes de Macau. 1 Parte deste artigo foi publicado com o título “DO ENCANTO DE MACAU AO RITUAL DO DRAGÃO EMBRIAGADO” (Texto: Amílcar Martins; Fotos: Frank Regourd, in Jornal Macau Hoje, Macau, 19 de Maio de 2000). 2 Esta foto, de Lou Kam Lit, foi publicada pelo Gabinete da Comunicação Social do Governo da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), em Dezembro de 2000, incluída numa coleção de 20 postais ilustrados que celebrava o primeiro ano do regresso de Macau à Mãe Pátria. 3 ArteNauta Chinês sob o Signo do Dragão (Desenho de Teresa Alexandrino).

O FASCINIO DO ORIENTE SOB O SIGNO DO DRAGAO

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Propõe-se um olhar retroactivo sobre uma experiência do Dia do Buda,centrada no universo do ritual chinês do “Dragão Embriagado” e que jogámos em Macau, nos anos de 2000 e 2001, nos templos, nos mercados e nas ruas, com os membros da Associação Geral dos Operadores do Peixe Fresco de Macau.

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O FASCÍNIO DO ORIENTE SOB O SIGNO DO DRAGÃO Amílcar Martins 1

Amílcar Martins, Ph.D. Ciências de Educação, Artes, Montreal Professor do Departamento de Educação e Ensino a Distância Coordenador do Mestrado em Arte e Educação Investigador do CEMRI – Centro de Estudos das Migrações e Relações

Interculturais Universidade Aberta

[email protected]

Fórum: O Fascínio do Oriente Lisboa, 10 de Junho de 2010

10:00h-17:00h

O FASCÍNIO DO ORIENTE SOB O SIGNO DO DRAGÃO 1

2 Texto: Amílcar Martins

Fotos: Frank Regourd

RESUMO

3

Propõe-se um olhar retroactivo sobre uma experiência do Dia do Buda, centrada no universo do ritual chinês do “Dragão Embriagado” e que jogámos em Macau, nos anos de 2000 e 2001, nos templos, nos mercados e nas ruas, com os membros da Associação Geral dos Operadores do Peixe Fresco de Macau.

A forma descritiva scripto-visual desenvolve-se através de uma metodologia de abordagem holística, procurando explorar-se o percurso da vivência do “eu” na sua relação com o “outro”. A trajetória seguida neste jornal de bordo, e o objecto resultante da narrativa, acentua o desejo de se prosseguir e aprofundar as relações ludo-dramáticas e teatrais menos frequentadas, tendo como base o fluxo da preservação da tradição, conjugado com o fluxo da impermanência, da contemporaneidade e da inovação. O desafio prospectivo e futurante que subjaz a este fascínio oriental, é mediado pela força sedutora e mágica do dragão, e inspirado pela criatividade e pela vitalidade das relações interculturais luso-chinesas vivenciadas pelos habitantes de Macau.

1 Parte deste artigo foi publicado com o título “DO ENCANTO DE MACAU AO RITUAL DO DRAGÃO EMBRIAGADO” (Texto: Amílcar Martins;

Fotos: Frank Regourd, in Jornal Macau Hoje, Macau, 19 de Maio de 2000). 2 Esta foto, de Lou Kam Lit, foi publicada pelo Gabinete da Comunicação Social do Governo da Região Administrativa Especial de

Macau (RAEM), em Dezembro de 2000, incluída numa coleção de 20 postais ilustrados que celebrava o primeiro ano do regresso de Macau à Mãe Pátria.

3 ArteNauta Chinês sob o Signo do Dragão (Desenho de Teresa Alexandrino).

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O ENCANTO DE MACAU

HOJE – EM DIA DE BUDA

AMIGOS CHINESES INICIARAM-ME AO VINHO DE ARROZ

BEBI-O EM POTES DE BARRO NO JOGO DO DRAGÃO

BRINQUEI A SÉRIO PELAS RUAS E MERCADOS DE MACAU

SAUDEI A DIVINDADE NOS ALTARES VERMELHOS

CUMPRI COM FERVOR A ORGIA DIONISÍACA DO RITUAL ANTIGO

LEMBRO-ME — EMBRIAGOU-ME O DRAGÃO

AGORA, EM FASE DE RETORNO À VIDA DE TODOS OS DIAS

O MEU CORPO É HABITADO PELO RITMO DO TAMBOR...

Membros da Associação Geral dos Operadores do Peixe Fresco de Macau

num dos intervalos do Ritual do Dragão Embriagado

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Ritual do Dragão Embriagado numa das ruas de Macau

O ENCANTO DE MACAU

Foi no final daquela memorável festa no Estádio de Taipa do dia 21 de

Dezembro de 1999 – O Encanto de Macau — que conheci de perto o grupo

da Associação Geral dos Operadores de Peixe Fresco de Macau, através da

sua participação na expressiva performance conhecida pelo “Dragão

Embriagado”.

O mega-espectáculo comemorava o retorno de Macau à Mãe Pátria e havia

sido realizado por mais de 12 000 pessoas de várias gerações e etnias de

Macau e da China.

Do lado do céu e do espaço cénico passaram artistas e atletas praticantes das

mais diversas disciplinas: saltos de paraquedistas; sons percutidos nos

tambores às centenas; inúmeras coreografias dançadas por milhares de

bailarinos; artes marciais e “ginásticas doces” rigorosamente controladas;

cantores acompanhados por coros ou exprimindo-se individualmente; e a

fechar os gigantescos dragões voadores coloridos e insuflados de exuberante

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e exponencial alegria, como se tivessem sido investidos pelo poder

simbólico festivo de milhões e milhões de chineses que, em directo,

acompanhavam o pujante acontecimento através dos écrans televisivos.

Eram também muitos milhares os que criavam a moldura humana nas

bancadas do estádio macaense. Eu assisti do lado da bancada a todo o

espectáculo com estupefacção e demograficamente reconhecido na minha

diferença e pequenez étnica. Havia nos espectadores um evidente

contentamento pela grandiosidade e espectacularidade de todos os artefactos

culturais e artísticos apresentados. O espectáculo era realmente fantástico

pela cuidada e continuada articulação entre os números das diversas

representações. Todos eles procuravam contribuir para realçar o conto

festivo do Regresso de Macau à Mãe Pátria e, simultaneamente, comemorar

o nascimento da Região Administrativa Especial de Macau da República

Popular da China.

Ocorre-me que, após a narrativa do espectáculo já contada, pude finalmente

deslocar-me até ao imenso espaço cénico para contactar alguns dos grupos

participantes, fotografá-los, e sentir o modo como a festa se exprimia do

lado de lá. É então que o “Era uma vez...” da minha estória começa.

O grupo do “Dragão Embriagado” reteve de forma especial a minha atenção.

Os seus movimentos, entre a dança e as tradicionais formas coreográficas

matinais chinesas, ligados também por uma forte característica expressiva

histriónica dos seus actores, impressionaram-me desde o início. Pude

perceber, progressivamente, que para além da estrutura regular da percussão

dos tambores e do gongo metálico, havia também um largo espaço para a

improvisação dos actores. E foi justamente esse gerir lúdico da tensão entre

a estrutura rítmica constante e previsível da percursão, e o sentido da

improvisação do jogo dramático mais ou menos espontâneo da parte dos

actores, que acabaria por induzir uma curiosidade crescente da minha parte.

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De resto, esse meu interesse dever-se-ia ter comunicado de forma explícita,

designadamente pelo gesto pulsante e captador do meu olhar mais ou menos

permanente através da câmara fotográfica, ou, porventura, de forma mais

subliminar pela via da energia materialmente invisível que circulava entre

todos os sujeitos e agentes do jogo.

Como que adivinhando o desejo que em mim se desenvolvia, os actores

dragonados induziam também, subtilmente, o modo da minha integração no

jogo.

Auspiciosamente o encontro desenvolvia-se entre nós e o testemunho lúdico-

simbólico do dragão dos cornos longos era-me transmitido. Depois

chegavam os golos do vinho de arroz e passávamos então para as

improvisações dos frente-a-frente a dois, a três, ou de todo o grupo.

Podíamos então reter na memória de todos nós o sentido auspicioso daquele

encontro dos dragões embebedados pela magia e pelo encanto de Macau.

Entretanto, o convite para participação na próxima festa era-me lançado.

Ritual do Dragão Embriagado numa das ruas de Macau

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HOJE – EM DIA DE BUDA Em 11 de Maio de 2000 foi feriado em Macau. A escolha das autoridades

locais alterou a matriz do calendário dos feriados dos anos anteriores e

trouxe para a cena mais pública o Dia do Buda. Lembro-me bem do

momento da revelação pública, ainda em 1999, da lista dos feriados

validados para a Região Administrativa Especial de Macau. O Dia do Buda,

com as honrarias de feriado macaense, também lá estava, agora, e então,

pela primeira vez.

E este aspecto revelar-se-ia fundamental uma vez que ele permitiria

encontrar uma enorme disponibilidade da população para o encontro festivo

que o dragão evoca. E, claro, a festa do “Dragão Embriagado”,

eminentemente ligada a Buda e ao Budismo, poderia beneficiar da presença

de todos aqueles que o desejassem. E muitos foram.

Ritual do Dragão Embriagado numa das ruas de Macau

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AMIGOS CHINESES INICIARAM-ME AO VINHO DE ARROZ A experiência que me é proposta pelos membros da Associação Geral dos

Operadores de Peixe Fresco de Macau parece fazer jus ao poeta chinês Bai

Juyi quando dizia:

Tão difícil conseguir um amigo!

Participámos ambos nos mesmos exames,

Trabalhámos ambos nos mesmos lugares,

Unidos por laços mais fortes que a matéria.

O dragão e o vinho de arroz foram os mediadores desta criação de

esperança. Vejamos como.

Dragão alimenta-se de oferendas

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BEBI-O EM POTES DE BARRO NO JOGO DO DRAGÃO O vinho de arroz é também parente da cerveja. Casam-se bem os dois

álcooles e, misturadamente, bebem-se de cada vez um pouco, nos potes, em

malgas de arroz, ou, directamente, dos gargalos das garrafas. Enche-se de

cheia a boca nos limites. Depois borrifa-se para os ares como fogo a rebentar

dos panchões. Claro, infestam-se os ares de um perfume nauseabundo e

abundante.

Inventam-se de seguida os movimentos que se (des)acertam.

(Des)ritmadamente tropeça-se em si mesmo. Recuperam-se no ar umas

costas de outro para descansar. Prolonga-se o gesto na linha generosa e fértil

de um braço de apoio – minha mão. Trata-se do reencontro em estado ébrio,

bêbado, embriagado. Finge-se tão bem que se frequenta a aura do opiarium.

A Dança do Dragão Embriagado

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BRINQUEI A SÉRIO PELAS RUAS E MERCADOS DE MACAU Pois é, diz a verdade verdadinha do ditado popular que é a brincar que a

gente se entende. E di-lo bem. Tal como Fernando Pessoa dizia da criança

que o seu modo de brincar é alimento do seu próprio ser em crescimento. Às

vezes pergunto-me porque nos distraímos, adultos, e interrompemos esse

crescimento junto da realidade ficcional.

Bendita essa idade errada da vida,

(...) quando se nega a realidade por brincar

a cousas que o não são.

Sem dúvida, a magia é muito mais forte do que o aço. Por isso, ganha

sentido fecundo o provérbio chinês que ensina:

Diz-me e eu esquecerei;

Ensina-me e eu lembrar-me-ei;

Envolve-me e eu aprenderei.

Aprender assim a razão profunda dos meus-nossos brincares a sério,

ganhando a felicidade e a liberdade da transcendência pelos templos e pelas

ruas e mercados de Macau: Kwan Tai; A-Ma; S. Domingos; Patane;

Mercado Vermelho; Yau Hon; Tamagnini Barbosa;... E cito, epicamente, do

meu amigo Frank Regourd: Dans le coeur du dragon Macao nous

appartient.

A Dança do Dragão Embriagado

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SAUDEI A DIVINDADE NOS ALTARES

VERMELHOS

Em cada lugar visitado

havia um altar budista para

venear e venerar

transculturalmente. Por

isso, curvando-nos

respeitosamente três vezes

em cada lugar, de mãos

postas ou de dragão

elevado, as bênçãos eram

pedidas à divindade. Ritmo

ternário, pois então, a

derramar-se nas preces.

Inspiro-me na poesia do

quanto mais poético mais

verdadeiro, e encontro-me,

de novo, na encruzilhada

da sintonia Pessoana:

Quanto mais eu sinta, quanto mais eu sinta como várias pessoas,

Quanto mais personalidades eu tiver,

Quanto mais intensamente, estridentemente as tiver,

Quando mais simultaneamente sentir com todas elas,

Quanto mais unificadamente diverso, dispersadamente atento,

Estiver, sentir, viver, for,

Mais possuirei a existência total do universo,

Mais completo serei pelo espaço inteiro fora (...)

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A Dança do Dragão Embriagado

CUMPRI COM FERVOR A ORGIA DIONISÍACA DO RITUAL ANTIGO Tudo se liga na expressão budista, teatreira, pantomineira e rítmico-

bailarínica, que se oferece à partilha de todos. Sim, trata-se de uma orgia, um

bacanal dos sentidos na direcção da multiplicação de possíveis. Atente-se

como ao vinho de arroz e ao seu aroma envolvente, aos que dele se investem

e dele recebem o seu testemunho, quase tudo é permitido:

• É o verter espiralado em excessos de gerúndio embriagante;

• É o flexibilizar do gesto em trajectos nunca antes sulcados;

• É o coreografar dos templos, das ruas e dos mercados com a calígrafa

dança vermelha ao peito;

• É o empolar do riso elevando-o a gargalhada suprema;

• É o toque, em secantes ou tangentes no mais além, que fica à mercê

dos jogadores;

• É o lúdico das alturas que se aproxima mais.

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Por tudo isto, é bem sentida a aventura da viagem que, como dizia Miguel

Torga: o que importa é partir não é chegar!

A Dança do Dragão Embriagado

LEMBRO-ME — EMBRIAGOU-ME O DRAGÃO Ah! Embriagou-me o dragão com a força mitológica dos seus moveres

festejantes pelo mar, pela terra e pelo céu. Embriagou-me o dragão com os

seus cornos toureadores na arena dos templos, das ruas e dos mercados.

Embriagou-me o dragão com os seus feitiços estonteantes e suspensos

algures. Embriagou-me o dragão no jogo brincado da busca de mais além.

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A cerveja ou o vinho de arroz no ritual da dança que celebra o Dragão Embriagado

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AGORA, EM FASE DE RETORNO À VIDA DE TODOS OS DIAS O mundo todo abarco e nada aperto, de Luís de Camões, bem poderia ser o

mote inspirador do retorno ao quotidiano. É que se trata mesmo de beber o

elixir que a vida nos oferece para, nessa dádiva da cartografia fecunda da

diversidade humana, traçar a rota do contacto e do aprender a viver juntos,

simultaneamente apreendendo-nos e revelando-nos.

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Amílcar Martins, membro da Associação Geral dos Operadores do Peixe Fresco de Macau,

no ritual da dança do Dragão Embriagado

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O MEU CORPO É HABITADO PELO RITMO DO TAMBOR... Após vários dias da experiência do dragão em mim, a vibração do tambor

ressoa ainda no meu corpo. Foi como se houvera passado pela fase de

iniciação de um ritual que passou a integrar todo o meu ser em

(des)construção. Poderei dizer que passei à categoria dos dragonados

bêbados, embriagados, ébrios. Elegeram-me seu membro os antigos

dragonados.

Perdoar-me-ão os meus pares chineses pelas formas inábeis de me dizer,

culturalmente longínquo das suas convenções.

Porém, perto de mim, de dentro de mim, pulsa no meu peito a memória de

uma experiência generosa, fecunda e pujante do dragão interactivo e criador

pelos templos, pelas ruas e pelos mercados de Macau. Pois, a partir deste

agora-gerúndio do Dia do Buda, o hálito da pia baptismal dos golos

extravagantes do vinho de arroz untou meu corpo e habita o meu espírito.

Tal como se disse na exposição alusiva ao Ano Novo Lunar do Dragão,

realizada no Jardim Lou Lim Ieoc (2000), ao penetrar-se no espírito fecundo

do dragão, damo-nos conta que ele veicula para a nossa vida um poderoso

fluido energético. Ei-lo, através de uma tessitura de princípios-guia: a

inovação; a assimilação; a compatibilidade; a progressividade; a

flexibilidade; e a singularidade. (Ver desenho de Teresa Alexandrino: ArteNauta

Chinês sob o Signo do Dragão, pág. 17).

— Viva o Long! Viva o Dragão!

— Ergam os vossos cálices, as vossas malgas, ou tão somente os

vossos copos, e continuem a beber pelo Ano do Dragão, o Ano do

Long!

— Kon pui!

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ArteNauta Chinês sob o Signo do Dragão

Desenho de Teresa Alexandrino

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AMÍLCAR MARTINS, Ph.D. Ciências de Educação, Artes, Montreal Professor no Departamento de Educação e Ensino a Distância Coordenador do Mestrado em Arte e Educação Investigador no CEMRI – Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais Universidade Aberta Rua da Escola Politécnica, nº 147 1269-001 Lisboa Portugal

Portal da Universidade Aberta: www.univ-ab.pt Email: [email protected] Canal do youtube: www.youtube.com/amilcarmartins1

CURRICULUM VITAE

AMÍLCAR MARTINS é Philosophiae Doctor (Ph.D.) em Ciências de Educação – Didáctica das Artes, pela Université de Montréal, Québec/Canadá, onde obteve igualmente o Mestrado em Educação (M.Ed.) – Didáctica das Artes. É Licenciado em Teatro com o curso de Actores/Encenadores pela Escola Superior de Teatro do Conservatório Nacional de Lisboa. As suas áreas de interesse de pesquisa científica, cultural e pedagógico-didáctica concentram-se na Arte-Educação; Didáctica e Cultura Artística; Expressão Dramática e Teatro; Contadores de Histórias; Formação de Artistas, Animadores, Professores e Educadores de Infância; Narrativas Digitais; Relações Interculturais.

Dirigiu, coordenou ou participou em múltiplas iniciativas artístico-culturais, pedagógico-didácticas e/ou científicas em vários países, nomeadamente em Portugal, Espanha, França, Angola, Brasil, Canadá, Estados Unidos da América, Macau, República Popular da China, Japão e Filipinas. De entre as várias actividades artístico-culturais que desenvolveu destaca-se a sua actividade no campo da dança, do teatro, da rádio, da televisão e da apresentação e encenação de espectáculos e eventos culturais de vária natureza. Foi investigador do Centre d’études ethniques / Centre de langues patrimoniales de l’Université de Montréal, professor convidado na Universidade de Macau e director de Estudos de Mestrado na Universidade Aberta Internacional da Ásia (Macau, China). Na Universidade Aberta, em Lisboa, tem orientado a partir dos anos 2000, nos graus de licenciatura ou em programas de pós-graduação e mestrado, as seguintes disciplinas e/ou seminários: Educação pela Arte, Didáctica das Expressões, Seminário (incluindo as áreas temáticas da Expressão Dramática, Expressão Corporal, Voz e Dicção, Multiculturalidade/Interculturalidade e Rituais e Festas), Tecnologia e Pedagogia de Produtos Educacionais Áudio, Didáctica das Expressões e das Artes, Comunicação na Sala de Aula, Animação de Bibliotecas, Animação e Didáctica das Expressões Artísticas, Voz e Dicção, Discursos Artísticos e Contextos Educativos, Tendências Contemporâneas em Arte e Educação. É autor-coordenador do manual de Didáctica das Expressões, Lisboa: Universidade Aberta, 2002. É autor do livro Actividades Dramáticas nos Jardins de Infância Luso-Chineses de Macau, Macau: Fundação Macau e Direcção dos Serviços de Educação e Juventude, 1998. É co-autor do livro Le portugais langue internationale: une langue en héritage, une langue en devenir, Montréal: Université de Montréal e Confederação dos Organismos Portugueses do Québec, 1994. É igualmente autor, entre outros, da série televisiva Arte e Educação: A Magia da Palavra, 2008; Arte e Educação: A Magia da Música, 2009; Arte e Educação: A Magia da Expressão Plástica, 2009; e Arte e Educação: A Magia da Dança, 2010, no prelo (em colaboração com Ana Macara). Publicou igualmente dezenas de artigos, editados em livros de actas, em jornais e em revistas, sobre: Educação luso-chinesa em Macau; Cultura e educação artística; Relações interculturais em contextos de diversidade cultural; Rituais dramáticos em Macau-China, no Japão e nas Filipinas; Narrativas artísticas digitalizadas; Contadores de histórias e expressões culturais. É professor auxiliar no Departamento de Educação e Ensino a Distância e investigador do CEMRI – Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais da Universidade Aberta. É membro da direcção da APROTED – Associação de Professores de Teatro na Educação. É consultor internacional do Instituto Nacional de Formação Artística do Ministério da Cultura de Angola. Coordena o Mestrado em Arte e Educação da Universidade Aberta.