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Modelo de avaliação PNAIC: relações entre universidade e escola na formação continuada Priscila B. da Silveira 1 1 Programa de Pós Graduação Em Educação Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Porto Alegre RS Brazil [email protected], Abstract. This paper describes the assessment model proposed by Pacto pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) about continuing training. The study has the purpose to understand the legal program requirements and compose relations about practices of teachers involved in the network formation. The assessment program proposed has the prospect to ensure the teaching qualification and learning process. The evaluation perceptions has showed consistency within the network formation. Resumo. O presente artigo tem como objetivo refletir sobre o modelo de avaliação proposto pelo programa Pacto pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) com base em uma cadeia multiplicadora de formação continuada. O trabalho buscou compreender as determinações legais do Programa e compor relações entre práticas dos sujeitos envolvidos na cadeia de formação a partir de entrevistas semiestruturadas. A avaliação proposta pelo programa tem a perspectiva formativa e tem como objetivo garantir a qualificação do processo de ensino e aprendizagem. As percepções sobre avaliação demonstraram consonância dentro da cadeia de formação. 1. Introdução Com a mudança de organização do Ensino Fundamental e o ingresso das crianças de seis anos, houve a necessidade de reflexão sobre o que se espera da escolarização inicial. Com isso, o aumento dos programas de formação continuada promovidos pelo Ministério da Educação (MEC) permitiu uma maior aproximação entre os profissionais da Educação Básica e os docentes que atuam em universidade. O presente artigo se produz a partir dos estudos sobre avaliação no ciclo de alfabetização em relação às implicações da formação continuada de professores promovida pelo Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). O trabalho busca entender como práticas de avaliação da aprendizagem de professoras do final do ciclo de alfabetização dialogam com a avaliação proposta pelo PNAIC através de uma cadeia multiplicadora de formação continuada Este modelo que será apresentado não se trata da avaliação do ensino superior, mas de responsabilidade das universidades enquanto formadoras de profissionais da escola básica. É preciso considerar que o PNAIC é um programa recente, a formação continuada iniciou em 2013. Este estudo ainda está em andamento, portanto suas considerações são provisórias.

Modelo de avaliação PNAIC: relações entre universidade e escola

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Modelo de avaliação PNAIC: relações entre universidade e

escola na formação continuada

Priscila B. da Silveira1

1Programa de Pós Graduação Em Educação – Universidade Federal do Rio Grande do

Sul (UFRGS) – Porto Alegre – RS – Brazil

[email protected],

Abstract. This paper describes the assessment model proposed by Pacto pela

Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) about continuing training. The study

has the purpose to understand the legal program requirements and compose

relations about practices of teachers involved in the network formation. The

assessment program proposed has the prospect to ensure the teaching

qualification and learning process. The evaluation perceptions has showed

consistency within the network formation.

Resumo. O presente artigo tem como objetivo refletir sobre o modelo de

avaliação proposto pelo programa Pacto pela Alfabetização na Idade Certa

(PNAIC) com base em uma cadeia multiplicadora de formação continuada. O

trabalho buscou compreender as determinações legais do Programa e compor

relações entre práticas dos sujeitos envolvidos na cadeia de formação a partir

de entrevistas semiestruturadas. A avaliação proposta pelo programa tem a

perspectiva formativa e tem como objetivo garantir a qualificação do

processo de ensino e aprendizagem. As percepções sobre avaliação

demonstraram consonância dentro da cadeia de formação.

1. Introdução

Com a mudança de organização do Ensino Fundamental e o ingresso das crianças de

seis anos, houve a necessidade de reflexão sobre o que se espera da escolarização

inicial. Com isso, o aumento dos programas de formação continuada promovidos pelo

Ministério da Educação (MEC) permitiu uma maior aproximação entre os profissionais

da Educação Básica e os docentes que atuam em universidade.

O presente artigo se produz a partir dos estudos sobre avaliação no ciclo de

alfabetização em relação às implicações da formação continuada de professores

promovida pelo Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). O trabalho

busca entender como práticas de avaliação da aprendizagem de professoras do final do

ciclo de alfabetização dialogam com a avaliação proposta pelo PNAIC através de uma

cadeia multiplicadora de formação continuada

Este modelo que será apresentado não se trata da avaliação do ensino superior,

mas de responsabilidade das universidades enquanto formadoras de profissionais da

escola básica. É preciso considerar que o PNAIC é um programa recente, a formação

continuada iniciou em 2013. Este estudo ainda está em andamento, portanto suas

considerações são provisórias.

Buscou-se problematizar as concepções de avaliação das professoras

universitárias e das professoras da rede para entender como estão se construindo os

modelos de avaliação nos primeiros anos da implementação do PNAIC. Os ciclos de

alfabetização e a progressão continuada são mudanças que trazem implicações diretas

para as práticas avaliativas e para o trabalho docente, pois implicam um repensar da

função da avaliação da aprendizagem.

O artigo tenta compreender as concepções de avaliação a partir da

implementação do PNAIC sob a perspectiva dos sujeitos envolvidos na formação

continuada do programa. O trabalho se propõe a dialogar com as ações e determinações

legais do programa, e as práticas das professoras1 de uma cadeia multiplicadora de

formação continuada em relação à avaliação do ciclo de alfabetização.

2. Percurso metodológico

A pesquisa caracteriza-se como qualitativa. A abordagem metodológica deste estudo

configura-se como exploratório/ descritivo. O estudo exploratório busca familiarizar o

pesquisador com um fenômeno cuja compreensão não está dada de imediato. Gerhardt

e Silveira (2009) explicam que as pesquisas descritivas podem ter a finalidade de

descrever as características do fenômeno.

Dessa forma, procedeu-se a exploração e a descrição do Programa a partir da

análise documental dos cadernos de formação do PNAIC. Em sequência, foram

realizadas entrevistas semiestruturadas com professoras envolvidas no Programa de

formação continuada.

A seguir apresenta-se um Diagrama de Venn com a representação do marco

conceitual da pesquisa. A Figura 1 demonstra os principais temas que foram articulados

no estudo para responder as questões da investigação.

1 Durante o texto o uso de “professoras” no feminino porque no estudo todas as participantes eram

mulheres

Figura 1 - Diagrama de Venn com desenho do estudo. Fonte: autora.

A análise documental do estudo tratou de estudar os documentos do PNAIC,

especificamente cadernos de formação propostos pelo programa, com o objetivo de

gerar dados sobre como se concretizou a proposta na prática escolar cotidiana e como

está sendo construído o conceito de avaliação no contexto do ciclo. Os eixos de análise

dos materiais do Programa foram: avaliação, ciclo de alfabetização e formação de

professores. O objetivo desta análise foi compreender como está sendo proposta a

avaliação do ciclo de alfabetização a partir da formação continuada.

O seguimento da pesquisa foi realizar entrevistas semiestruturadas com

professoras envolvidas na formação continuada do Programa para identificar como

estão se constituindo práticas avaliativas ao final do ciclo. Os sujeitos desta pesquisa

foram professoras que constituíam uma cadeia multiplicadora na formação continuada

(formadora, orientadora de estudo e alfabetizadoras). O acesso a essa rede de docentes

foi possível através de uma entrevista com uma fonte privilegiada, coordenadora do

programa em uma das universidades parceiras do PNAIC, a universidade Federal de

Santa Maria (UFSM). A Coordenadora indicou que a escolha da cadeia de formação

deveria seguir o critério de serem trabalhos considerados de sucesso na proposta do

ciclo de alfabetização.

Segue abaixo um desenho da sequência das entrevistas com a cadeia de formação

continuada:

Figura 2 - Cadeia multiplicadora de formação. Fonte: autora.

Para manter em sigilo a identidade das participantes, elas foram citadas neste

artigo como: Formadora, Orientadora, Alfabetizadora A e Alfabetizadora B. Na Figura 2

é possível observar que a cidade na qual as professoras da rede trabalhavam foi

intitulado município L. As entrevistas foram estruturadas a partir de questões sobre os

temas: avaliação, ciclo de alfabetização e formação continuada. Os encontros com as

docentes duraram aproximadamente uma hora.

O material coletado nas entrevistas foi transcrito e analisado a partir de três eixos

analíticos: Contribuições sobre avaliação na relação escola e universidade; Avaliação

na formação continuada; e Práticas avaliativas de uma cadeia de formação continuada

do PNAIC.

3. O programa PNAIC e sua proposta de avaliação

O PNAIC é um compromisso entre Governo Federal e os estados e municípios, com o

objetivo de alfabetizar todas as crianças até os oito anos de idade. O programa foi

organizado a partir de quatro eixos de atuação: 1 - Formação continuada presencial para

os professores alfabetizadores e seus orientadores de estudo; 2 - Materiais didáticos,

obras literárias, obras de apoio pedagógico, jogos e tecnologias educacionais; 3-

Avaliações sistemáticas; 4 - Gestão, mobilização e controle social.

A formação continuada é organizada por universidades públicas parceiras do

PNAIC. No Rio Grande do Sul temos duas universidades que são sede das formações: a

Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e a Universidade Federal de Pelotas

(UFPel). Neste estudo a UFSM foi o recorte realizado para atingir o objetivo de

entrevistar a rede de professoras.

A universidade forma os orientadores de estudo, professores da rede; a partir

disso, cada orientador tem sob sua responsabilidade aproximadamente 30 professores

alfabetizadores. Os orientadores são responsáveis por: ministrar o curso de formação;

acompanhar a prática pedagógica de seus professores; avaliar frequência; manter

registros de atividades; apresentar relatórios à universidade.

De acordo com o caderno de formação de professores do programa a

organização dos cursos é a seguinte:

[...] carga horária de 120 horas por ano, cuja metodologia propõe

estudos e atividades práticas. Os encontros com os professores

alfabetizadores serão conduzidos por Orientadores de Estudo. Os

Orientadores de Estudo são professores das redes, que farão um curso

específico, com 200 horas de duração por ano, ministrado por

universidades públicas. É recomendável que os Orientadores de

Estudo sejam selecionados entre a equipe de tutores formados pelo

Pró-Letramento no município ou estado. No Pacto Nacional pela

Alfabetização na Idade Certa serão desenvolvidas ações que

contribuam para o debate acerca dos direitos de aprendizagem das

crianças do ciclo de alfabetização; para os processos de avaliação e

acompanhamento da aprendizagem das crianças; para o planejamento

e avaliação das situações didáticas; para o conhecimento e uso dos

materiais distribuídos pelo Ministério da Educação, voltados para a

melhoria da qualidade do ensino no ciclo de alfabetização. (BRASIL,

2012c, p. 24)

O PNAIC teve como referência outros programas de formação continuada que

ocorreram antes de sua implementação, o Programa de Formação Continuada para

Professores de Séries Iniciais do Ensino Fundamental (Pró-Letramento), de acordo com

os estudos de Gatti, Barretto, André (2011) foi constituído em 2005, organizado para

orientar o trabalho de professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental com o

objetivo de assegurar uma melhoria na qualidade da aprendizagem da leitura/escrita e

matemática. Também houve o Programa de Formação de Professores Alfabetizadores

(Profa), que foi implementado a partir de 2001, com o objetivo de constituir um modelo

para formação continuada de alfabetizadores, buscando como referência as situações e

problemas encontrados na prática docente.

Os cadernos de formação defendem a necessidade de se garantir uma formação

continuada para docentes que já atuam nas escolas e redes municipais e estaduais.

Nesse sentido, o Programa busca garantir o direito à formação continuada a todos os

professores alfabetizadores, tendo como referência a realidade da sala de aula.

(BRASIL, 2012a).

[...] é necessário definir as políticas de formação com base nos

resultados das avaliações realizadas e garantir que na formação

continuada o cotidiano da sala de aula, ou seja, a prática docente, seja

objeto central de atenção. A teorização da prática deve constituir o

eixo nuclear das ações formativas (BRASIL, p.13, 2012a).

Para contemplar o acompanhamento da formação continuada, os orientadores

devem voltar para universidade e discutir com os formadores sobre o andamento das

formações com os alfabetizadores e redefinir os próximos encontros. Nesse sentido, a

proposta visa tratar as necessidades docentes a partir de situações-problemas da sala de

aula.

A avaliação é um dos eixos estruturantes do PNAIC e está apresentada a partir

de três aspectos principais: 1- Avaliações processuais, discutidas no curso de formação

para serem desenvolvidas continuamente pelo docente junto aos alunos; 2 - Os

professores devem utilizar um sistema informatizado para inserir os resultados da

Provinha Brasil sobre cada aluno, no início e no final do 2º ano, com o objetivo de

acompanhar o desenvolvimento da aprendizagem das crianças e repensar estratégias

visando alfabetizar todos os alunos até o final do ciclo. 3 - Avaliação Nacional da

Alfabetização (ANA), é uma avaliação para o 3º ano do ciclo, foi organizada e

coordenada pelo Inep, com o objetivo produzir indicadores do processo de alfabetização

nas escolas públicas brasileiras.

A formação continuada do Programa está subsidiada à concepção de avaliação

progressista. De acordo com o documento:

Ao se adotar uma concepção mais progressista, pode-se considerar a

avaliação como uma ação que inclui os vários sujeitos, ou seja, como

uma ação intencional que se dá de modo multidirecional. Dessa forma,

o que se busca é um sistema integrado de co-avaliação, no qual

docentes, discentes e equipes de profissionais da escola e de outros

sistemas avaliam e são avaliados. (BRASIL, 2012b, p.07).

A proposta de avaliação do PNAIC é formativa, pois visa colaborar no

desenvolvimento da criança considerando a aprendizagem como um direito do aluno. O

Programa busca romper com a lógica punitiva e excludente da avaliação escolar. Como

pode ser observado a seguir:

[...] a avaliação precisa ser feita para garantir as aprendizagens e não

para punir os que não aprenderam — como outrora acontecia nas

escolas de todo o mundo. O foco é em uma avaliação formativa,

voltada para a redefinição permanente das prioridades e planejamento

contínuo do fazer pedagógico. As avaliações diagnósticas utilizadas

para conhecer as crianças e detectar quais saberes elas já dominam são

pontos de partida para planejar estratégias para aproximá-las da escola

(BRASIL, 2012a, p. 22).

Nesse sentido, a organização do ciclo de alfabetização como um bloco

sequencial pelo qual não haverá retenção do aluno dentro desses três anos exige uma

avaliação de acompanhamento do processo de aprendizagem. Segundo o Programa, o

planejamento pedagógico é considerado uma ferramenta vital para o processo de

avaliação “[...] avaliação possibilita ao docente uma compreensão do processo de

construção das aprendizagens pelos estudantes e de reflexão sobre as estratégias de

ensino”. (BRASIL, 2012b, p.08).

A perspectiva da avaliação formativa visa qualificar o processo de

aprendizagem do aluno. A prática avaliativa deve continuamente acompanhar o aluno e

repensar estratégias para intervir de modo a garantir que o educando aprenda. A

proposta do PNAIC está em consonância com as ideias de Luckesi (2011, p. 101): “A

avaliação da aprendizagem existe propriamente para garantir a qualidade da

aprendizagem do aluno. Ela tem a função de possibilitar uma qualificação da

aprendizagem do educando”.

A partir da proposta de avaliação formativa, a relação professor e aluno pode ser

mais horizontal. As práticas avaliativas são instrumentos para reflexão sobre os

objetivos atingidos e sobre as próximas ações que visam garantir a aprendizagem dos

alunos. Nesse sentido, a organização do ciclo de aprendizagem propõe uma

continuidade do processo de aprendizagem.

O objetivo do Programa é garantir as aprendizagens dos alunos para superar a

exclusão e evasão escolar. As concepções do PNAIC estão vinculadas com as posições

teóricas de Perrenoud (2004) que define ciclo de aprendizagem do ponto de vista da

educação como direito, e não excludente. Como pode ser observado nas palavras do

autor:

A condição de tal desenvolvimento profissional é, evidentemente,

perceber o interesse e a pertinência de uma organização da

escolaridade com ciclos plurianuais, sabendo que não se trata de um

fim em si mesmo, mas de um meio de tornar a escola mais justa e

eficaz. (PERRENOUD, 2004, p.18).

4. Conhecendo uma realidade: a cadeia multiplicadora de formação

Conforme foi demonstrado na metodologia, foram realizadas cinco entrevistas: uma

com a coordenadora do programa na UFSM, como fonte privilegiada, e também houve

acesso a uma cadeia multiplicadora de formação continuada do PNAIC, composta por

quatro entrevistas: uma formadora (universitária), uma orientadora de estudo

(professora da rede) e duas alfabetizadoras.

A seguir apresentam-se as docentes entrevistadas:

Coordenadora: professora há 17 anos na UFSM do Programa de Pós Graduação em

Educação, Mestrado e Doutorado. Coordena o PNAIC há 3 anos, desde o início do

programa, dezembro de 2012.

Formadora: É formada em Pedagogia, tem Especialização em Educação Infantil,

Mestrado em Educação, Doutorado em Educação pesquisando o Ensino Superior e

Escola Básica e Pós- Doutorado em resiliência docente, ainda em andamento. Participa

da formação do PNAIC desde o início.

Orientadora: Sua formação inicial é magistério, a graduação em Ciências Físicas e

Biológicas, Especialização em Gestão Escolar e Coordenação Pedagógica. Com 15 anos

de profissão, trabalha na rede estadual e na rede municipal de ensino. Também trabalha

com o PNAIC desde o início da formação continuada.

Alfabetizadora A: Formada em pedagogia nos Anos Iniciais e EJA, fez Especialização

em Educação Interdisciplinar. Trabalha há 6 anos como professora. Participou dos três

anos de formação do PNAIC. Atualmente trabalha com uma turma de 3º ano.

Alfabetizadora 2: Formada em Pedagogia, cursa Especialização em Psicopedagogia,

também é professora de informática, além de ser professora da rede municipal.

Participou da formação do PNAIC no ano de 2015.

As contribuições sobre avaliação na relação escola e universidade evidenciaram

as perspectivas docentes em consonância com a proposta do Programa que visa

qualificar o processo de aprendizagem dos alunos. Destaca-se o protagonismo docente

como possibilidade de qualificação das estratégias e das experiências em sala de aula.

As professoras indicaram construir a prática avaliativa através da reflexão e do

compartilhamento de experiências.

A formadora aponta o acompanhamento das orientadoras através de feedbacks

que elas apresentam em seus relatórios:

Os relatórios que são enviados, esses relatórios eles são o que? Um

exercício reflexivo sobre tua própria prática como orientadora, então

precisa se articulado essa ideia de que não depende do outro....

depende do outro, mas depende também de mim porque para o outro

eu também sou o outro, então esse deslocamento, essa transposição

de papéis precisa ser assumida e na educação há uma tendência

muito grande de que sempre o de fora pode vir pra dentro e dizer o

que deve ser feito.... por que? Porque nós que abrimos espaço pra

isso né... alguém só toma teu espaço se tu não ocupaste este espaço,

porque ninguém ocupa o mesmo espaço [...]. (FORMADORA).

O município L, representado pela orientadora de estudos, organiza a formação

continuada vinculada com a hora-atividade das professoras do ciclo de alfabetização.

Com isso, é garantido esse horário da formação para as docentes, na hora atividade a

turma de cada alfabetizadora fica sob responsabilidade de um oficineiro.

A orientadora destaca que além da garantia da hora-atividade, o município L

também organizou um currículo unificado:

[...] então está sendo garantido aí dois direitos do profissional

que primeiro é o direito à formação continuada, segundo que é

da hora atividade né então as duas propostas estão nesse

mesmo momento. E a gente faz esses encontros, quando não

conseguimos fazê-lo presencial, no grupo de encontro, os

professores do ciclo planejam juntos. Juntos por quê? Porque o

currículo da rede municipal [...] foi construído para o ciclo de

alfabetização, então não existe um currículo para o 1º ano, outro

para o 2º e outro para o 3º, é um currículo unificado então com a

ideia justamente de iniciar a proposta.... o desenvolvimento dos

direitos de aprendizagem das crianças, aprofundar no 2º ano e

consolidar. Então se a gente pensa o direito que a criança lá do ciclo

de alfabetização à leitura, ele não é próprio da criança do 1º ano ou

do 2º ou do 3º, ela é de todas as crianças do ciclo, então é um mesmo

direito que tem que ser introduzido, aprofundado e consolidado.

Então é dessa forma que se construiu o currículo do ciclo de

alfabetização, um currículo unificado. (ORIENTADORA).

Eu acho que foi a qualificação da minha prática [...] Mas quando

você precisa de alguma forma ensinar alguém, e esse alguém precisa

aprender, isso se torna diferente, enquanto só eu aprendia tudo bem,

eu posso dar conta. Daí quando essa demanda aumentou, o PNAIC

me ajudou de alguma forma. Se o meu planejamento estava de forma

adequada com aquela proposta que é apresentada pelos direitos da

aprendizagem e que forma, se a forma como estava realizando essa

metodologia também tava adequada, acho que foi isso a grande

melhoria qualificar minha prática. (ALFABETIZADORA B).

Em relação à avaliação também foi destacado a oportunidade de refletir sobre

práticas avaliativas em um espaço de formação continuada como direito do profissional.

Nesse sentido, a cadeia de formação investigado demonstrou buscar estratégias para

integrar os docentes com o objetivo de pensar coletivamente sobre as ações da

avaliação da aprendizagem.

A orientadora apontou três pontos relevantes da organização da formação

continuada no município investigado: (1) conquista da confiança desses profissionais

(2) pertencimento de grupo (3) formação como um direito do profissional. Sendo assim

faz parte da formação a orientadora ir até as escolas das alfabetizadoras para

acompanhar o trabalho que está sendo realizado no ciclo:

Existe a necessidade desse acompanhamento, não é algo imposto, é

algo necessário. Então acho que essa é outra diferença a abertura

que foi dada para esta avaliação. Além disso, os professores tem um

momento de relato, da mesma forma como nós nas nossas formações

temos esse momento, na formação na rede municipal das

experiências, do que está sendo produzido, das dificuldades, dos

desafios, então a gente também avalia a fala dos profissionais, então

além de visualizar, de perceber em sala de aula a gente também

escuta muito, porque acho que é momento de troca, momento de

compartilhar. (ORIENTADORA).

O trabalho na formação continuada parte de pensar junto com os professores

sobre como estão construindo suas práticas avaliativas:

[...] não adianta tu dizer “é assim que se faz!” ou “É dessa forma

que se faz”, é refletir sobre isso... como a gente está fazendo? Está

dando resultado? por que eu estou avaliando o aluno? pra que serve

a avaliação? Então vamos refletir sobre isso! E é a partir dessa

reflexão que as práticas foram se modificando. Então quando o

profissional percebe ou tem a necessidade de fazer de forma

diferenciado é que as coisas realmente acontecem.

(ORIENTADORA).

Todas as professoras apontaram a avaliação formativa como destaca no trabalho

no PNAIC. Entre as entrevistadas, apenas a formadora não especificou os critérios

avaliativos, pois esta professora destacou como a avaliação não deve acontecer.

Em relação à avaliação, a coordenadora aponta seis aspectos principais

propostos pelo PNAIC: (1) as capacidades que deveriam ser avaliadas no primeiro ano,

no segundo e terceiro ano; (2) trabalho de continuidade; (3) diária; (4) diagnostico; (5)

a criança pela criança, não a criança comparada ao todo; (6) avaliar cada criança, o

crescimento daquela criança.

A professora também destacou outros aspectos a observar enfatizando a

necessidade da avaliação diária:

Não adianta reprovar uma criança e continuar com a mesma

metodologia de trabalho. [...] Isso é uma coisa que me indigna

porque só ter o prazer de reprovar... “Ai eu fiz o meu trabalho! Eu

reprovei”, não, quando reprova uma criança... a reprovada também é

o professor alfabetizador, é o secretário municipal, é o prefeito, é a

câmara dos vereadores, é a comunidade como um todo, é a família

que reprova junto com aquela criança... A gente tem batido muito:

avaliação semanal, diária de acompanhamento

.(COORDENADORA).

De acordo com a orientadora a avaliação deve ser diagnóstica, formativa e

contínua:

(1)diagnóstica, a partir desse diagnóstico ela ter uma visão

(2)formativa porque não basta apenas eu diagnosticar; (3)contínua,

constante durante todo processo, então não cabe mais a avaliação

entendida apenas como o retorno do que o professor ensinou; 4)cada

aluno tem um desenvolvimento,uma caminhada. uma vivencia e que a

gente não pode olhar de uma mesma forma [...].(ORIENTADORA).

[...] nós temos que entender a avaliação como forma de entender

onde aquela criança está naquele momento, e ela serve até para que

cada professor possa reorganizar a sua prática o seu planejamento,

porque o planejamento deve estar adequado ao processo à fase que a

criança está. (ORIENTADORA).

As alfabetizadoras também apontaram a avaliação formativa como parte de um

trabalho no qual as práticas avaliativas visam acompanhar a aprendizagem através da

observação constante:

Eu acho que ainda é uma avaliação mais ampla que ela é mais fácil

de você entender o que acontece com cada um, então não é só a nota

que interessa, não é só a prova que interessa, é o desempenho em sala

de aula, é o que o aluno me responde em sala de aula... às vezes ele

fica tão nervoso na hora de uma prova que ele não vai me dizer

exatamente o que ele sabe, então eu acho que o ciclo de avaliação no

ciclo é muito bom, eu acho muito bom! (ALFABETIZADORA A).

É o primeiro processo ali de avaliação é essa como eu te falei a

diagnóstica no inicio do ano né a partir dela que a avaliação tem a

importância que a partir dela eu vou tomar como ponto de partida do

meu trabalho, eu vou planejar a partir do resultado que eu tive com

essa avaliação né e sempre eu vou adequar também a minha

demanda dos meus alunos a partir da avaliação, por isso que ela é

tão importante, por isso eu tenho que realizar ela no inicio do ano, eu

não posso começar e fazer um planejamento sobre meu aluno ideal,

eu preciso fazer um planejamento a partir de um aluno real, eu vou só

conhecer meu aluno real a partir do ato de avaliar.

(ALFABETIZADORA B).

Na entrevista com a formadora foram destacados aspectos de como não deve ser

a avaliação, mas pouco a formadora descreveu qual é sua a postura avaliativa no

programa:

[...] tu não pode simplesmente profetiza e trabalha o ano inteiro pra

realiza essa profecia no final do ano, então esse resultado no final do

ano ele só vai ser positivo porque, embora os processos de avanços

sejam diferenciados, todo mundo pode crescer, todo mundo pode ser

avaliado neste ritmo de crescimento que é seu.... a dificuldade é do

professor em perceber essas diferenças. (FORMADORA).

As professoras da cadeia de formação destacaram a dificuldade da compressão

entre o final do ciclo de alfabetização com o 4º ano do ensino fundamental. As

professoras mencionam a necessidade de uma articulação com 4º ano. Como pode ser

observado nos excertos a seguir:

[...] quando chega do 2º ano pro 3º esse tem sido um problema muito

sério pra nós universidades porque as pessoas ainda acham que tem

que reter os alunos e não fazer esse trabalho com o 4º ano, mas

algumas experiências a gente tem valorosas assim... a gente tem

municípios que pegaram a formação do Pacto que é pro 1º, pro 2º e

3º ano, elas pegaram professores do 4º, do 5º e do 6º ano e botaram

em formação continuada, mesmo não sendo obrigatória.... eles

botaram esse profissionais a trabalhar, a receber formação

continuada em serviço. Isso pra mim foi um ganho.

(COORDENADORA).

[...] todos aderiram, inclusive alguns professores do 4º ano, que não

entram no ciclo de alfabetização, já procuraram para participar dos

momentos de formação em virtude do que vem sendo trabalhado e

que percebem esse trabalho dentro da escola. (ORIENTADORA)

Nós do ciclo, aqui do 1º ao 3º, a gente tem essa forma de avaliar aí

chega lá pra minha colega do 4º ano ela não vai entender da mesma

forma que eu entendi, ela não vai saber por que aquele aluno que

ainda não tá lendo fluentemente foi aprovado, foi né, então eu acho

que essa formação deveria continuar pros outros professores até pra

eles entenderem o porque do ciclo, de todo o avanço dos alunos.

(ALFABETIZADORA A).

[...] aí também o 4º e 5º ano tem algumas propostas que utilizam já

vai ser uma diferença na proposta por isso desse ciclo vou iniciar vou

concluir, não reter, possibilitar que o aluno consiga realizar todo esse

processo. (ALFABETIZADORA B).

Através dos excertos das entrevistas, é possível observar um esforço de toda a

cadeia de formação em compreender as necessidades da implementação do ciclo e as

dificuldades de articular a avaliação do final do ciclo com o 4º ano. É preciso

considerar que o 3º ano é o primeiro momento em que os alunos poderão ser retidos

dentro do ciclo, por isso o empenho em articular o acompanhamento do ano seguinte ao

ciclo se torna essencial para o monitoramento das aprendizagens dos alunos.

Apesar da proposta dos materiais do PNAIC que indicam a acompanhamento

dos processos de ensino e aprendizagem a partir de um trabalho conjunto, as

professoras demonstram que ainda não foi possível integrar esse processo de

acompanhamento como equipe de professores e escola. Além disso, a organização de

co-avaliação na qual os professores também são avaliados, ainda não foi evidenciado.

5. Considerações provisórias

O presente trabalho objetivou analisar a proposta do PNAIC e as perspectivas da cadeia

multiplicadora de formação sobre avaliação. Destaca-se que o PNAIC por se tratar de

um Programa de nível nacional não é uma realidade representativa, pois vai se aplicar

sobre uma base muito heterogênea de experiências de ensino e condições de

escolarização. Nesse sentido, as considerações deste artigo também não são

representativas.

Nas entrevistas, a avaliação formativa foi apresentada como uma continuidade

da proposta dos documentos do PNAIC, pois foi destacado o objetivo de avaliar para

garantir a qualificação do processo de ensino e aprendizagem. Nesse sentido, as

professoras têm uma perspectiva da avaliação em consonância com o Programa em sua

proposta avaliativa que não se separa do planejamento.

As professoras indicaram a necessidade de articulação entre os professores no

acompanhamento da avaliação dos alunos, por exemplo, na passagem entre o final do

ciclo e o 4º ano. Esta questão também estava em consonância entre as professoras da

cadeia multiplicadora. Com isso, é possível indicar que as professoras da universidade

estão dialogando com os problemas encontrados pelas alfabetizadoras na escola. Porém

parece que a ideia do exercício de um sistema integrado de co-avaliação proposto no

programa ainda não foi construída na prática docente.

Outro destaque foi o empenho do município L e da orientadora da rede em

organizar o currículo unificado e garantir a hora atividade. Esse é um ponto relevante da

formação continuada, pois permite o direito do profissional em continuar a formação

docente ao longo de sua carreira. Nas falas das entrevistas assim como nos cadernos do

PNAIC foi possível perceber a proposta de formação permanente. Este parece ser um

ponto relevante na implementação do Programa, pois a integração com as redes é

imprescindível para que o PNAIC pode ser concretizado.

Neste artigo foi levantado um olhar sobre a relação entre a proposta e a prática

avaliativa em uma cadeia de formação do PNAIC, porém as considerações demonstram

a complexa relação da avaliação para promover a qualidade das aprendizagens.

Referências

Brasil. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CEB nº 7, de 14 de dezembro

de 2010 – Fixa Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9

(nove) anos. Brasília, 2010.

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Apoio à Gestão Educacional. Pacto pela Alfabetização na Idade Certa. 2012a.

“Avaliação no Ciclo de Alfabetização: reflexões e sugestões”. Brasília, DF.

__________. Ministério da Educação. Secretária da Educação Básica. Diretoria de

Apoio à Gestão Educacional. Pacto pela Alfabetização na Idade Certa. 2012b.

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