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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARINSTITUTO DE CINCIAS DA ARTE - ICA
PS-GRADUAO LATU SENSUESPECIALIZAO EM SEMITICA E CULTURA VISUAL
FERNANDA DE OLIVEIRA MARTINS
LETRAS QUE FLUTUAMO abridor de letra e a tipografia vitoriana
Belm2008
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FERNANDA DE OLIVEIRA MARTINS
LETRAS QUE FLUTUAMO abridor de letra e a tipografia vitoriana
Trabalho de Concluso de Cursoapresentado ao curso de Especializaoem Semitica e Cultura Visual do Institutode Cincias da Arte (ICA) da UniversidadeFederal do Par (UFPA), como requisitoparcial para obteno do grau deEspecialista.
Orientadora: Profa. Dra. Valzeli Sampaio
Belm2008
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FERNANDA DE OLIVEIRA MARTINS
LETRAS QUE FLUTUAMO abridor de letra e a tipografia vitoriana
Trabalho de Concluso de Curso apresentado ao curso de Especializao em
Semitica e Cultura Visual do Instituto de Cincias da Arte (ICA) da UniversidadeFederal do Par (UFPA), como requisito parcial para obteno do grau deEspecialista.
Orientadora: Profa. Dra. Valzeli Figueira Sampaio
Belm, 15 de dezembro de 2008
Conceito Final__________________________
Banca Examinadora:
____________________________________________________
Orientadora: Profa. Dra. Valzeli Figueira SampaioUniversidade Federal do Par
____________________________________________________
Prof. Dr. Orlando Franco ManeschyUniversidade Federal do Par
____________________________________________________
Profa. Dra. Lvia Lopes BarbosaUniversidade Federal do Par
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De repente os olhos so palavras.
Pablo Neruda
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DEDICATRIA
Ao caboclo da Amaznia, ribeirinho, e, em especial,aos Abridores de letras que me permitiram navegarem seu universo.
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AGRADECIMENTOS
Ao Joo Meirelles, sempre companheiro.
Harumi e Yuri, que me tornaram umapessoa melhor.
todos os que, direta ou indiretamente,acompanharam-me nesta aventura.
Em especial Edna e Lvia, que muito meapoiaram, seja com seu carinho ou leituraatenta.
minha orientadora, Prof. Valzeli Sampaio.
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SUMRIO
LISTA DE FIGURAS
RESUMO
ABSTRACT
INTRODUO .................................................................................................. 12
1 DE VOLTA AO COMEO
1.1 Nota histrica sobre tipografia ..................................................................... 18
1.2 O desenvolvimento das letras romanas ...................................................... 23
1.3 O desenvolvimento do livro ......................................................................... 271.4 A tradio humanista ! evoluo da estrutura das letras romanas ............. 28
1.5 Sobre nomenclatura ! as partes da letra .................................................... 33
1.6 A tipografia vitoriana ! a vontade de falar mais alto .................................... 36
1.7 Anlise formal do tipo decorativo vitoriano .................................................. 42
2 A LETRA DECORATIVA AMAZNICA - DE ONDE VEIO?
2.1 Exemplos similares em outros pases ......................................................... 45
2.2 Panorama do sculo XIX na Amaznia ....................................................... 48
2.3Leitura e visualidade .................................................................................... 57
2.4 A fonte digital ............................................................................................... 61
2.5 Procedimentos para a criao de uma fonte digital .................................... 64
3 LETRAS QUE FLUTUAM
3.1 Os barcos, as letras e os abridores de letras anlise formal..................... 67
3.2 Anlise do material coletado ........................................................................ 70
CONCLUSO .................................................................................................... 85
BIBLIOGRAFIA ................................................................................................. 87
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Exemplo de puno que gera o molde tipogrfico.................................................19
Figura 2 - Modelo da prensa de Gutenberg............................................................................20
Figura 4 - Desenvolvimento das minsculas - as minsculas carolingeas............................24
Figure 5 - Estilos caligrficos da Idade mdia.........................................................................26
Figura 6 - Detalhe da evoluo formal das letras....................................................................29
Figura 7 - Garamond, 1530 (baseada em Janson) .................................................................30
Figura 8 - A fonte Caslon, 1722 ...............................................................................................31
Figura 9 - Fournier....................................................................................................................32
Figura 10 - A fonte Baskerville.................................................................................................32
Figura 11 - A fonte Bodoni .......................................................................................................33
Figura 12 - As partes das letras...............................................................................................34
Figura 13 - Evoluo das serifas. ............................................................................................35
Figura 14 - Bodoni, fat facee Egpcia, de cima para baixo. ...................................................36
Figura 15 - As formas evoluem a partir da Bodoni para Fat face...........................................37
Figura 16 - De Fat facesurgem as serifa quadradas exageradas..........................................38
Figura 17 - e na seqncia... comeam as sombras ..............................................................38
Figura 18 - Exemplos de tipos decorativos vitorianos.............................................................40
Figura 19 - Cartaz de teatro, 1915. ..........................................................................................41
Figura 20 - Evoluo das serifas, das serifas egpicias para as serifas toscanas ................43
Figura 21 - Bodega em Vila dos Palmares, Par, 2007..........................................................45
Figura 22 - Estncia em Outeiro, Belm, Par........................................................................46
Figura 23 - Fileteado argentino ................................................................................................46
Figura 24 - Chivas, nibus populares na Colmbia, circulam pelo interior.............................47
Figura 25 - Barcos a vapor , foto de Hubner. ..........................................................................49
Figura 26 - Folha de rosto do Album do Estado do Par de 1898..........................................51
Figura 27 - Nota de mil ris ......................................................................................................52
Figura 28 - lbum do Par - 1908, impresso em Paris ...........................................................53
Figura 29 - O Guarani - pera de Carlos Gomes ...................................................................54
Figura 30 - Rtulo de fumo ......................................................................................................55
Figura 31 - Barcos do Mississipi..............................................................................................55
Figura 32 - Curua, 2006, foto da autora.................................................................................56
Figura 33 - Soure, 2007. Foto Smia Batista ..........................................................................57
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Figura 34 - Belm 2005, foto Fernanda Martins......................................................................57
Figura 35 - Legibilidade: letra amarela sobre branco..............................................................61
Figure 36 exemplos do caracteres da fonte digital..............................................................64
Figura 37 - mapa das localidades pesquisadas ......................................................................67
Figura 38 - nomenclatura das partes das letras, utilizada pelo abridor de letra.....................69
Figura 39 - Sem serifa..............................................................................................................71
Figura 40 - serifa quadrada superior e inferior ........................................................................71
Figura 41 - Serifa quadrada superior e toscana inferior..........................................................71
Figura 42 - Serifas toscanas ....................................................................................................72
Figura 43 - Sombra inferior direita ........................................................................................72
Figura 44 - Sombra inferior esquerda...................................................................................72
Figura 45 - Sombra superior direita ......................................................................................73
Figura 46- Sombra superior esquerda..................................................................................73
Figura 47 - Exemplo de letra cursiva .......................................................................................73
Figura 48 - Cores .....................................................................................................................74
Figura 49 - Exemplos de enfeites ............................................................................................75
Figura 50 - Exemplos considerados os mais relevantes.........................................................76
Figura 51 - Direo das sombras.............................................................................................77
Figure 52 - Exemplos de cores ................................................................................................78
Figura 53 - Caracteres apresentam a mesma extenso comparado ao modelo ...................79
Figura 54 - Letra U invertida ....................................................................................................80
Figura 55 - M no chega a linha de base ................................................................................80
Figura 56 - Exemplos de vista de ambos os lados das embarcaes....................................82
Figura 57 - Exemplo encontrado no Igarap das mulheres - Macap....................................84
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RESUMO
Considerando que, dentre as diversas manifestaes da cultura amaznica, est a
tradio popular de pintar os nomes nos barcos de uma maneira particular, o
presente trabalho se prope realizar um primeiro registro da tipografia desses
barcos, com o objetivo de conhecer a sua origem, a sua rea de abrangncia e os
mtodos empregados pelas pessoas que se dedicam a esta atividade
profissionalmente. Busca confirmar a existncia de semelhanas entre a tipografia
clssica e a tipografia decorativa dos barcos amaznicos e compreender a influncia
da primeira sobre a ltima, atravs de anlise formal desta manifestao popular soba tica da tipografia clssica. Visa, ainda, identificar e analisar a influncia do
computador nesta atividade. Para alcanar tais objetivos, este estudo faz anlise
comparativa entre o material obtido atravs de pesquisas de campo e registros
fotogrficos e os estilos levantados da tipografia clssica. Detecta paralelos entre
ambos, identificando tipografismos, conceito de Manuel Sesma que trata da
plasticidade da letra. Esta anlise conclui pelo entendimento de que h relao
formal entre as letras decorativas vitorianas do sculo XIX e o estilo encontrado nasembarcaes ribeirinhas da Amaznia. Conclui ainda que, a partir de apropriao
deste estilo, se desenvolveu um estilo prprio regional que parte do fazer
tradicional amaznico.
Palavras-chaves: Barcos amaznicos, tipografia popular, tipografia vitoriana,
tipografismo
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ABSTRACT
Among Amazon cultural manifestations is the popular tradition to paint boat names.
Names are painted in boats in a very particular way. The present study aims at
producing a first account on boat typography. The intention is to learn from where this
letter style originates, its geographic area, who are professionally dedicated to the
activity among other issues. This work also formally analyzes this popular
manifestation through the eyes of classical typography. The intention is to find out the
similarities between classical lettering and the Amazon boats! decorative typography.
For that, we made field research expeditions and photographic studies followed by
comparative analysis. This paper also study and analyze the influence of the
computer age in the boat typography. There is strong evidence that there is a
parallelism between classic typography styles and the Amazon boat typography.
Amazon boat typography can be interpreted as typographism, a concept created by
Manuel Sesma that considers letter!s plasticity. The conclusion is that there is a
formal correlation between XIX Century Victorian Decorative Letters and the style
observed in the Amazon traditional boat lettering. By appropriating Victorian Agestyle, the Amazon River boat letter painters developed their own unique style. This
style now can be considered as part of the Amazon local tradition.
Keywords: Amazonian boats, typography, popular typography, vitorian typography,
tipografism.
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INTRODUO
Uma semana depois de chegar a Belm, pela primeira vez, do incerto trapiche do
Porto da Palha, atravessei o rio Guam, acompanhando um grupo em demanda
comunidade de Boa Vista do Acar. Viagem curta. Corriqueira, para quem no um
viajante. Enfadonha, para quem vem buscar seu po-de-cada-dia na Belm
metrpole. Surpreendente, para uma forasteira, para quem urubus, mars, paneiros
de aa, uxi, caranguejos, montanhas de matapis e fardos de patchuli apresentam
novas palavras, frases construdas de maneira diversa, onde o tu, corretamente
empregado, impe-se na nova geografia.
Belm, o nico lugar do Planeta onde o roxo vida l fora companhia segura da
morte onde o roxo freqenta as todas refeies ao lado do amarelo da farinha e do
branco da tapioca. Ao mesmo tempo, Belm explode nas cores, no excesso de luz e
de umidade, no excesso de novas palavras, a Belm de todas as letras estranha,
suja, cheira, provoca, incomoda, instiga.
Aos poucos, a viajante que sou copia os ritmos, as mars, distingue a Amaznia
ribeirinha da cultura popular, que tem seus prprios caminhos, suas prprias
linguagens, seus prprios alfabetos daquela que copia, recopia e mal-copia, que
corre atrs das metrpoles alheias a sua geografia.
Este estudo resultado deste embate, deste estranhamento, do olhar viajante. De
quem busca novas referncias, de quem procura compreender o que ser umhabitante local sem o preconceito, sem o extico, sem o estranhamento. Reconhecer
as pessoas e seus tempos, as lides das mars, o que comum, o que tradicional,
o que banal, o que goma, o que farinha, o que manicuera e o que vira tucupi.
Da mirada de quem chega Amaznia pela primeira vez imprimem-se novos
cdigos, as linhas flutuam, os sotaques tornam as palavras outras. Aprende-se
rpido que o Esturio do Amazonas, do Tocantins e Araguaia, do Guam, do Acar,do Moju e de tantos caminhos escrevem paisagens a cada mar. So terras cadas.
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So terras conquistadas. So repaisagens repaginadas, onde as cartas nuticas so
histrias em quadrinhos, que precisam ser reescritas e revistas a cada novo ciclo.
Nesta viagem pelo primeiro grande rio, o Guam, que pequeno diante de um Xingu
ou um Madeira ou um Negro, a primeira emoo ao ver o primeiro p-p-p,
ostentando uma letra nova, um chamado novo, um novo cdigo que eu no sabia
existir.
Deste momento em diante, de maneira sistemtica, a viajante que fui, ou que sou,
pois viajar estado de esprito e no estado de lugar ou de tempo, percebi que o
olhar estrangeiro permite vislumbram novas letras, novos cdigos, e persegui, no
cais do Ver-o-Peso, no Igarap das Mulheres, na escadinha, no trapiche de Icoaraci,
no Flutuante de Manaus e em tantas outros encontros de guas e terras, um novo
alfabeto amaznico, to genuno e endmico como suas espcies vegetais e
animais. Este novo alfabeto, fruto de embates culturais que me fez decidir pela
viagem para procurar seus significados, origens e sabedorias.
As letras abriram-me novas pginas da Amaznia. Mquina fotogrfica em punho,
caderno de notas, tornei-me pescadora de letras. Volta e meia, parentes e amigos
passaram diante de letras que me chamam pelo nome, e me enviam, igualmente, as
letras que encontram, trofus atracados nos trapiches da regio.
Aos poucos, pude perceber que esta seria manifestao popular genuna,
provavelmente originria de uma tipografia mais elaborada. Ainda que Joo deJesus Paes Loureiro, ao tratar da potica amaznica, rapidamente discorresse sobre
as embarcaes amaznicas, falando, inclusive, sobre as letras de barco, ao buscar
referncias na literatura, nada encontrei; ao que o prprio Joo Jesus confirmou ser
de grande interesse estudar o tema. Alis, foi este estudioso da Amaznia quem
primeiro me falou dos abridores de letras, os mestres que pintam os alfabetos
ribeirinhos.
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Este estudo pretende registrar e documentar a tipografia das embarcaes
ribeirinhas da Amaznia. Compreenda-se tipografia como o conjunto de sinais
alfabticos. Claramente, por seu carter manual, manuscrito, no escolar, deveria
ser alcunhado tecnicamente de caligrafiaou de lettering. Nos limites deste estudo
deve ser compreendido como o resultado da potica das letras, do emprego do
alfabeto, enquanto cdigo para comunicar, o que outros denominam de tipografia
vernacular. Paulo Vaz, prefaciando o livro Tipografia Popular(MARTINS, 2007, pg.
X), sugere um termo para esta arte popular, tipografia potica.
A bibliografia da rea, bastante restrita e recente, ainda no logrou definir
terminologia adequada para descrever esta realidade e, aqui, esta no a
preocupao. Talvez seja este um caminho possvel de estudo terico, e que dever
receber maior ateno futuramente. No nosso caso, optamos por empregar o
conceito mais amplo, qual seja, o de tipografia.
Definiremos [...] tipografia como um conjunto de prticas subjacentes criao e utilizao de smbolos visveis relacionados aos caracteresortogrficos (letras) e para-ortogrficos (tais como nmeros e sinais depontuao) para fins de reproduo, independentemente do modo comoforam criados (a mo livre, por meios mecnicos) ou reproduzidos.(FARIAS, 1998, p. 11-12).
O objetivo geral resgatar a tradio ribeirinha de pinturas dos nomes de barcos da
Amaznia. A inteno realizar um primeiro registro que procure conhecer a sua
origem, a sua rea geogrfica, seus componentes formais, buscando compreender,
igualmente, os mtodos empregados pelas pessoas que se dedicam a esta atividadeprofissionalmente.
A importncia deste estudo resulta da ameaa de desaparecimento desta tradio,
que merece registro no cenrio da tipografia brasileira. Igualmente, este estudo
pretende verificar se h relao entre esta manifestao popular e a tipografia
clssica e, se h alguma relao histrica entre estas. Pretende, da mesma maneira,
verificar se existe e, quais so, as relaes entre a Tipografia Vitoriana do sculo
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XIX e o letreiro dos barcos. Neste caso, a proposta realizar a anlise formal das
letras encontradas frente tradio tipogrfica.
De igual maneira, busca documentar fotograficamente esta manifestao tradicional,
bem como, compreender como se d o fazer dos profissionais envolvidos na
tipografia dos barcos, os Abridores de letras, homens, todos homens.
O estudo se prope a realizar o levantamento de alguns dos centros urbanos
servidos por via fluvial do vale do Amazonas, onde ainda se manifesta esta tradio.
Mais especificamente, trabalharemos em algumas das cidades ribeirinhas da calha
do Rio Amazonas. Primeiramente, nas trs capitais do eixo central do rio Amazonas,
Belm, no Estado do Par; e Macap, no Estado no Amap, nas extremidades de
seu esturio; e Manaus, no Estado do Amazonas, na barra do rio Negro e o
Solimes, onde o rio Amazonas recebe seu nome definitivo. Posteriormente,
trataremos de ncleos urbanos de menor porte, como os trs centros no entorno de
Belm, a saber, Curu e Marud (municpio de Marapanim), no Nordeste Paraense
e Abaetetuba, no baixo Tocantins e rio Par.
Esta monografia visa, ainda, verificar, dentre os estilos surgidos aps a
sistematizao da tipografia, se existe um determinado estilo que apresente
caractersticas formais que se relacione com o estilo das letras decorativas dos
ribeirinhos amaznidas. Este trabalho ser complementado pela anlise, sob a tica
da estrutura tipogrfica, do peso, da largura, da extenso e, igualmente, de outros
aspectos apresentados, tais como a forma, os ornamentos e o emprego das cores.
Para realizar estes objetivos ser necessrio fotografar, selecionar e organizar o
resultado da pesquisa de campo. Como pesquisa primria, sero feitas entrevistas
com profissionais dedicados a abrir letra de barcos. Ao mesmo tempo, ser revisada
a bibliografia sobre o tema e sobre casos semelhantes no mundo. Este material ser
analisado luz dos estilos clssicos. Para esta pesquisa, este trabalho apoiou-se,
dentre outros autores, principalmente, nos estudos de Adrian Frutiger, sobre odesenvolvimento das formas do alfabeto, Nicolete Gray, em seu trabalho sobre
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tipografia ornamental e Lawson e Tracy, no que diz respeito tipografia, sobretudo a
do perodo vitoriano. Este estudo contou, ainda, com o concurso de Sesma sobre o
Tipografismoe de Joo Meirelles Filho sobre o universo amaznico .
Acreditamos, assim, que ser possvel, contribuir para a valorizao e o resgate de
uma tradio popular ribeirinha em desaparecimento. O modo de vida dos
ribeirinhos, habitantes do vale do Amazonas determinado pelo ritmo das guas,
seja das estaes de cheia e seca, respectivamente inverno e vero, seja as mars
cotidianas e as correntes fluviais. O rio sua estrada, sua rua, como propunha
Leandro Tocantins, seu canal de comunicao, sua ligao com o mundo, e o barco,
o meio que propicia a comunicao.
O ribeirinho vive em relao constante com a natureza, aprendeu a sobreviver em
meio hostil. Desta relao com as guas e as matas desenvolve uma cultura nica,
plena de significados, herdeira das matrizes atemporais, mito-poticas e grafas das
culturas da floresta tropical. Deste caldeiro de lnguas, que deixa Babel sem fala,
onde ainda resistem representantes de 400 Naes de falares e saberes distintos,
carregando os 100 sculos de ocupao humana no vale amaznico, que amolda
a tabatinga ribeirinha, o barro primeiro, que animou o mineral. neste contexto, das
manifestaes da cultura popular amaznica, datradio de pintar nomes em barcos
de maneira to peculiar, para que flutuem e levem e tragam, que esta obra deve ser
compreendida.
Nossa pesquisa concluiu que os exemplares mais preservados e, qui, mais
elaborados desta tradio, estariam em Macap, tendo como epicentros os trapiches
irrequietos e inconstantes de igaraps urbanizados, o Igarap das Mulheres e o
Igarap Fortaleza, este ltimo divisando Santana e Macap. Igarap, palavra de
origem Tupi, Y (G)ara P o caminho da canoa , o ideograma de gua
fresca, ensombrada, limpa, sinnimo de pequeno curso d!gua. Em geral se refere
ao trecho de um rio de sua nascente at o ponto em que se apresenta em maior
volume, onde s as canoas, os casquinhos podem navegar. Nas margens do
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Amazonas e dos grandes rios o igarap sinal de porto seguro, de guas calmas,
de dormitrio para barcos que enfrentam o rio-mar.
Segundo Joo Meirelles Filho, em seu Livro de Ouro da Amaznia, Ediouro, 2007, 5a
Edio, navegam na Amaznia cerca de cem mil barcos, em sua maioria
embarcaes acanhadas, de pequeno porte, construdos artesanalmente para o uso
familiar, do perto. Dentre estes encontram-se desde barcos de madeira,
confeccionados por estaleiros familiares e de modestas dimenses, tradio de pai
pra filho, tal qual o de abridores de letras, at embarcaes mais modernas,
construdas em metal, em estaleiros industriais. Os barcos populares de madeira
constituem-se, provavelmente, em mais de dois teros da frota amaznica. So
estes os que mais se utilizam desta tradio tipogrfica. So embarcaes a motor,
ou a remo, lanchas, pesqueiras, traineiras, boiadeiros, regates; simples
casquinhos, ubs, catraias, chalupas, saveiros, escunas e igarits at os grandes
barcos regionais, como so conhecidos os barcos de maior porte, que realizam o
papel equivalente ao de nibus(em sua acepo da palavra em latim omnibus
para todos).
Este trabalho encontra-se dividido em trs captulos, assim distribudos: no captulo
primeiro trataremos da histria da tipografia, principalmente sob a tica do
desenvolvimento das formas das letras. O segundo captulo dedica-se a
compreender o contexto em que se insere a tipografia dos barcos e, de que maneira,
conecta-se com a tipografia vitoriana e, finalmente, no terceiro captulo
procederemos anlise formal do material pesquisado.
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De volta ao comeo
1.1 Nota histrica sobre tipografia
Neste captulo apresentamos breve histrico sobre a evoluo da tipografia, desde
sua inveno no Renascimento, at o sculo XIX. Neste perodo, a tipografia
possibilitou a difuso do conhecimento ao permitir a impresso de maior quantidade
de livros em menor tempo do que os escribas do Sculo XV poderiam lograr. Para
compreender a manifestao encontrada nos barcos da Amaznia e sua relao
com a Tipografia Vitoriana h que se entender no somente a importncia daTipografia enquanto tcnica de impresso mas tambm a Tipografia entendida como
evoluo formal das letras, e como esta evoluo se inseriu neste processo tcnico.
A rpida evoluo da tcnica tipogrfica fez com que o livro impresso
amadurecesse, criando caractersticas prprias e se distanciando do livro
manuscrito. O sculo XIX, com suas transformaes sociais e tecnolgicas, tambm
influenciou a tipografia, resultando em grande ruptura. Esta adquire novo papel, seja
com a industrializao e a publicidade, seja com o novo estilo, denominado de
Vitoriano. Acreditamos que a tipografia vitoriana aquela que maior influncia
exerce sobre os letreiros estudados.
A tipografia, entendida como a tcnica de impresso em tipos mveis, tal qual a
conhecemos, fruto da habilidade de Johannes Gutenberg. Este, ao perceber a
crescente necessidade de produzir mais livros, reuniu diversas tcnicas de seu
tempo em um novo produto. Contemporneo dos escribas, que produziam livros
nicos, elaborados manualmente, o sistema de impresso com tipos mveis
desenvolvido por Gutenberg era capaz de produzir um maior nmero de exemplares
de um mesmo ttulo, em menor tempo que as oficinas dos escribas de sua poca.
No se pode dizer, no entanto, que Gutenberg tenha inventado a imprensa. Os
chineses j imprimiam mais de sete sculos antes, em 853 d.C., por meio de placas
de argila cozida, que continham muitos caracteres. Em 1040 d.C., Pi Sheng
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introduziu a impresso em unidades mveis, realizando incises em blocos de argila
mida e depois cozidos. O princpio logo foi aprimorado ao se utilizarem blocos de
madeira. Posteriormente empregou-se o bronze, que depois de esculpidos, eram
entintados e pressionados em papel macio. (MAN, 2004, p. 114 - 115)
A noo de que imagens avulsas, sinais e letras podiam ser impressos empapel com um carimbo parece ter ocorrido no primeiro ano do sculo V. Nosculo VIII, China, Japo e Coria estavam todos imprimindo livros feitos detacos de madeiras ou pedra entalhados, que atravs dos sculos levou assombrosa aventura da impresso. (MAN, 2004, p. 114 - 115)
O mrito de Gutenberg estaria em unir diversas tcnicas de seu tempo em um nico
sistema de produo. Ele se apropriou de tcnicas da ourivesaria para esculpir
punes de metal. Estas punes seriam utilizadas na cunhagem de matrizes de
letras. Cada matriz, por sua vez, era colocada em um molde, que daria origem a
diversas unidades idnticas de uma mesma letra. Depois de fundidos, os conjuntos
de letras, os tipos, seriam agrupados em linhas e, a seguir, em conjuntos de linhas,
formando um determinado texto. A grande vantagem do sistema de Gutenberg,
distintamente do sistema chins, que estes tipos, aps utilizados, poderiam ser
desmontados e reempregados em novos textos. Assim, tratar-se-ia de um sistema
mais eficiente e barato, facilitado pelo alfabeto romano, que diferentemente do
chins, possui apenas 26 caracteres bsicos.
Figura 1 - Exemplo de puno que gera o molde tipogrfico.
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Outro aspecto de seu sistema de impresso foi o desenvolvimento de uma tinta com
as qualidades fsico-qumicas adequadas para entintar os conjuntos de tipos mveis
e, transferir a imagem destes para uma pgina de papel. Para que isto ocorresse, de
uma forma mais prtica e rpida, Gutenberg usou uma prensa de vinhos adaptada
para esta funo, tambm adaptada por ele. Este sistema foi elaborado durante o
perodo de 10 anos, entre tentativas e erros.
Figura 2 - modelo da prensa de Gutenberg
importante ressaltar que Gutenberg tambm pensou como estas unidades (os
tipos) se organizariam espacialmente no papel, assim como, considerou o espao
destinado a cada caractere, que deveria estar contido na unidade fsica do tipo de
metal (este espao o que chamamos entreletra). O impressor levou em conta,
ainda, a maneira pela qual as letras se organizariam em linhas e entrelinhas,
elementos necessrios para a plena realizao da leitura de um texto.
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Curioso lembrar que, parte da evoluo tcnica da mecnica da impresso,
poucas modificaes ocorreram nos ltimos quinhentos anos, na base do sistema
tipogrfico. Apesar da introduo das mquinas rotativas, dos computadores e do
CTP (Computerto-plate, tecnologias que permitem que o arquivo finalizado do
designer seja enviado digitalmente e impressione a chapa de impresso), ainda
tratamos a profisso com a mesma nomenclatura de Gutenberg so os corpos, as
entreletras, as entrelinhas. Da mesma maneira, os programas digitais utilizam a
mesma nomenclatura e princpios de 1450: o tamanho do corpo de um caractere
ainda inclui, alm da linha de base, altura de x, ascendente e descendente, o espao
real (fsico) da entrelinha, detalhe este desnecessrio no mundo virtual.
conhecida a histria de como Gutenberg se endividou e praticamente foi falncia
em conseqncia deste projeto, sendo obrigado a transferir aos seus credores todo
o resultado de suas pesquisas. Trabalhou por vrios anos em sigilo absoluto e,
desta maneira, conseguiu imprimir uma edio da Bblia, (chamada de 42 linhas,
porque cada coluna continha 42 linhas de texto), entre 1444 e 1445. A Bblia,
impressa em Mainz, atual Alemanha, exigiu dois anos de trabalho de seis homens.
Esta a primeira grande obra da tipografia, levada a cabo com esta nova tecnologia
tal qual a conhecemos. (FRUTIGER, 2001 p17)
Para aperfeioar seu invento e, por questes econmicas, durante os quase 10 anos
de pesquisas, Gutenberg foi obrigado a pedir emprstimos. Para poder pag-los,
imprimia pequenos livros e vendia-os em feiras populares. No entanto, incapaz de
saldar suas dvidas, foi processado por seu scio capitalista, Fust, e teve queentregar suas mquinas e tudo o que havia produzido como forma de pagamento.
Segundo Man (2004, p.189-213), Gutenberg foi obrigado a sair de Mainz. Mudou-se
para Eltville onde sua famlia tinha razes, e ali faleceu em 1468. Ainda conseguiu
manter uma prensa simples e seria contemplado com um penso, permitindo-lhe
viver com algum conforto. Seu feito foi, por muitos anos, atribudo a Fust e a seu
genro, Schoeffer.
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Os livros impressos por Gutenberg apenas pareciam com os livros manuscritos e
no teriam o mesmo valor daqueles; a vantagem residia na tiragem. Gutenberg era
capaz de produzir uma grande quantidade de exemplares para poca, cerca de 200,
e em menor espao de tempo, o que compensaria o menor valor.
Segundo Frutiger (2002 p.16), quando, em 1440, Johannes Gutenberg criou seus
caracteres, semelhana das escrituras gticas utilizadas nos paises germnicos,
foi para reproduzir o tamanho dos livros manuscritos. Os livros do tempo anterior a
Gutenberg eram feitos mo, como resultado do trabalho de diversos profissionais
ligados aos Mosteiros, os copistas, os iluminadores, os ilustradores. Depois do
sculo XIII, j ao final da Idade Mdia, os escribas saram dos conventos, foram para
as cidades e universidades, trabalhando em oficinas especializadas.
O surgimento das universidades e uma nova classe social dependente da leitura,
criou um pblico leitor vido por livros. Estes manuscritos tinham uma esttica
prpria, letras apertadas, cheios de ligaduras e abreviaes, entrelinhas justas para
economizar papel ou pergaminho, ambos raros e caros. O trabalho dos escribas era
feito em uma espcie de linha de produo. Havia os que preparavam o pergaminho,
alguns riscavam as pginas, outros escreviam os textos, depois vinham as
iluminuras ilustraes e ornamentos feitos mo e coloridas, que ocupavam
margens e espaos entre colunas. Era costume que os iluminadores tambm
ornamentassem as letras iniciais de cada captulo, as capitulares. Outros artesos
ainda viriam, para acabamentos, como costura e encadernao.
Ao desenvolver o primeiro livro impresso, Gutenberg no se arriscou a criar algo
totalmente novo, que fosse rejeitado pelo pblico leitor. Fez um livro que, em tudo,
assemelhava-se ao manuscrito, em aparncia, em tamanho, no tipo de letra, nas
colunas margens. Da mesma forma, deixou os espaos reservados para as
iluminuras e gravuras, tinham o mesmo acabamento. Entretanto, em menos de 50
anos houve grande evoluo na tcnica e a tipografia mudou a feio desta poca.
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1.2 O desenvolvimento das letras romanas
A letra romana, usada no mundo ocidental, tem sua forma e estrutura baseada nas
letras monumentais romanas, inscritas nos monumentos de mrmore e chamadas
Capitalis Monumentalis. Usadas somente em maisculas, sua forma desenvolveu-se
em razo das ferramentas utilizadas para grav-las. Primeiro se desenhavam as
letras com um pincel chato, para que depois fossem cortadas com cinzel. Seu
exemplo mais famoso, pela excelncia nas estrutura das letras, a Coluna de
Trajano, do sculo III, localizada em Roma. (Figura 3)
Os romanos, diferentemente das culturas que dominaram o mundo anteriormente,
difundiram a escrita e a usaram como forma de expanso e manuteno de seu
imprio. Havia por todos os cantos do Imprio monumentos, atestando a sua
grandiosidade. Saber ler no era mais um privilgio de reis e escribas, como
anteriormente. O latim era falado por um nmero maior de pessoas, inclusive por
representantes de povos ocupados. A leitura foi difundida e a cultura clssica era
valorizada. Desta forma, o povo estava ciente da fora e inteligncia romana atravsde seus monumentos e da difuso de sua cultura. Alm de textos em monumentos
informes, e de leis, o equivalente a um peridico, ou jornal, eram divulgados em
murais nas paredes das cidades.
Este uso cotidiano da comunicao escrita gerou um volume cada vez maior dedocumentos e, por conseqncia, o que modificou-se ao longo do tempo, novos
Figura 3 - Detalhe da coluna de Trajano
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estilos de letras. A rstica, escrita mais fluda, mais rpida e mais adaptada aos
instrumentos usados nestas superfcies pincel e pena era empregada nos murais
e documentos.
Figura 4 - Desenvolvimento das minsculas - as minsculas carolingeas
Se no apogeu do Imprio Romano escrevia-se somente com letras maisculas, a
sua forma foi se alterando lentamente ao longo dos sculos, por necessidade de
fluidez e velocidade, at surgirem propriamente letras minsculas. As minsculas
somente assumiram sua verdadeira forma por volta do Sculo VII, poca do
Imperador Carlos Magno.
Dentre seus feitos, Carlos Magno realizou uma reforma na educao para unificar e
fortificar seu imprio. Ao cargo desta funo estava o monge Alcuin, de York, atual
Inglaterra. Alcuin, a partir dos estilos existentes, chamados de unciais e semi-
unciais, desenvolveu um estilo de letra prprio para identificar os documentos de
Carlos Magno. Este estilo de letra foi importante, porque criou minsculas com
identidade prpria, diferenciando-as das maisculas, representando uma evoluo
formal, e por esta razo, chamadas de minsculas carolngias.
As escritas gticas sucederam s Carolngias. As pr-gticas surgiram por
volta do sculo XI, ainda arredondadas, e se espalharam por toda a Europado Norte e Central onde se desenvolveram e diversificaram em funo dasculturas e poca que foram utilizadas. Os hbitos de leitura fizeram que a
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Textura, que uma gtica de frma, se convertesse na grafia tradicional doslivros religiosos e litrgicos, a Bastarda a do comrcio e a Cursiva, a dasatas notariais e administrativas, ainda que no exclusivamente.(FRUTIGER, 2002, p.16)
A estrutura e a forma das letras de um alfabeto, entendido aqui como sistema grfico
de representao, independentemente da cultura a que pertence, maisculas ou
minsculas, romanas ou arbicas, sempre esteve ligada a instrumentos utilizados na
escrita e, ao suporte onde se realizavam. Suportes e instrumentos, da mesma
maneira, esto relacionados disponibilidade de material em determinado local
geogrfico. Por exemplo, no deserto da Mesopotmia, o material para a escrita mais
fcil de se encontrar era a argila, suporte da escrita cuneiforme. No Egito, onde oNilo possua margens alagveis, existia grande quantidade de junco, planta da qual
se retira o papiro.
A estrutura da letras latinas tambm foi influenciada pelos suportes e instrumentos
utilizados. Os romanos escreviam esculpindo em pedra com cinzis e,
posteriormente, em papiro com pincis e penas de ganso. A pedra levou
predominncia dos traos verticais e horizontais nas maisculas. A inclinao de 15graus da pena cria contraste entre as hastes, gerando barras horizontais finas e
hastes verticais grossas. A evoluo da escrita posterior aos romanos seguiu este
padro por sculos. Desta maneira, a tipografia ser influenciada pela caligrafia.
Devido ao relativo isolamento entre os centros de cultura e poder da poca
medieval, muitos estilos de caligrafia se desenvolveram em diferentes centros.
Frana, Inglaterra, Itlia possuam estilos de caligrafia prprios.
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Figure 5 - Estilo caligrficos da Idade mdia
Entre os estilos de letra mais utilizados em 1450, estava o gtico Textura, utilizado
nos paises germnicos, o modelo utilizado por Gutenberg nos primeiros livros
impressos. Havia outros, ainda, como Bastarda, Fraktur, Rotunda.
As escrituras gticas sucedem a Carolngia. As pr-gticas, ainda bem
arredondadas, apareceram na Normandia ao final do sculo XI, depois daconquista da Inglaterra por William, o Conquistador (1066). Mas tarde seestenderam, principalmente na Europa do norte e Europa central, ondeevoluram e se diversificaram em funo das culturas que as utilizavam edas pocas.Os hbitos de leitura fizeram que a gtica de forma (Textura) seconvertesse na grafia tradicional dos livros religiosos e litrgicos; aBastarda, na de comercio; e a Cursiva, a das atas notariais eadministrativas (se bem que no exclusivamente).Quando, em 1440, Johannes Gutenberg inventou a tipografia (quer dizer, aimpresso mediante tipos metlicos, mveis e reutilizveis), cirou seuscaracteres a semelhana das escrituras gticas utilizadas nos paisesgermnicos para reproduzir os livros manuscritos. (FRUTIGER, 2001, p.16-
17) (Traduo da autora, grifos do autor).
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Na Itlia, durante o Renascimento, por sua vez, os documentos eram escritos em um
estilo chamado Cancelaresco ou Chancelaresco. Este era o estilo usado nos
documentos oficiais da diplomacia Papal, derivado de chancelaria. Os escrivos
aprendiam, e deveriam usar de forma unificada, uma caligrafia padro, que
caracterizava os documentos, bulas, cartas das autoridades da Igreja para governos
ou diferentes sedes da Igreja.
1.3 O desenvolvimento do livro
Segundo Lawson (2005, p. 370), desde o momento em que se deu forma s letra as
pessoas raramente se contentavam em permitir que suas criaes permanecessem
em sua forma pura. A necessidade do embelezamento personalizado irresistvel.
Os livros produzidos na era medieval so testemunhas da capacidade dos escribas,
rubricadores e iluminadores em pintar, ornamentar e enriquecer as letras, segundo
as maiores possibilidades estticas que suas habilidades permitiam. A sobrevivncia
de muitos textos antigos se deve muito mais aos apelos decorativos, que a seu
contedo. Com a inveno do livro impresso estas prticas continuaram de uma
forma menos pessoal e em ritmo e decrescente. Durante o perodo dos Incunabula
1455 at 1500 os impressores ainda reservavam espao em suas pginas para os
iluminadores as decorarem e as embelezarem. Quando este costume foi
descontinuado, no sculo XVI, os impressores forneceram seus prprios,
elementos decorativos, na forma de letras iniciais (capitulares), bordas, fios, filetes e
flores, perpetuando a tradio de ornamentao da pgina.
O primeiros livros impressos mimetizaram os livros manuscritos, impondo poucas
mudanas ao que se conhecia. Havia uma demanda crescente de livros, o que levou
impresso com tipos mveis a espalhar-se pela Europa como rastilho de plvora.
Aprendizes eram enviados s tipografias, e depois de alguns anos viajavam para
outros locais e abriam suas oficinas. Desta forma, em menos de cinqenta anos, as
oficinas de impresso se expandiram por boa parte da Europa. Por volta de 1500
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haviam sido impressos mais de 27.000 edies, o que representaria mais de dez
milhes de livros. Os livros impressos durante este perodo inicial, entre 1450 e
1500, so denominados de incunbula, derivado do latim do bero.
Neste perodo, aperfeioaram-se as tcnicas de impresso e, rapidamente, os
impressores tiraram partido das vantagens que a tcnica oferecia. O livro impresso
se distancia do manuscrito e assume identidade prpria. Esta nova personalidade
surge em funo da possibilidade de inserir notas de rodap, pginas de rosto,
numerao de pginas e, por conseqncia, ndices e referncias cruzadas.
Desde que se tornara possvel reproduzir textos pgina a pgina, e numeraras pginas, tambm se tornou possvel oferecer aos leitores uma rpidavisualizao do texto, tanto nas folhas de rosto (que tambm permitiu aoimpressor divulgar sua prpria criao) quanto em ndices. Um ndice no um mero recurso; pode ser a eptome de um livro, sua essncia, exisbindo oprocesso mental, o julgamento, mesmo a criatividade (pois o indexadorpode decidir sobre categorias e subcategorias, e fazer refernciascruzadas). A imprensa foi a responsvel por este avano. (MAN, 2004, p.259-260).
importante lembrar que, no apenas a estrutura do livro muda, bem como as letras
tambm evoluem. Se no incio estas mimetizam o estilo gtico, com o tempo buscam
formas mais eficientes, tanto para a economia do papel, como para garantir maior
legibilidade. Nicolas Jenson, em 1476, j fundia em metal letras com aspectos
totalmente diversos dos primeiros tipos. Estas eram influenciadas pelas letras dos
calgrafos, com aspecto similar quelas que conhecemos hoje. Estes novos estilos
de letras so denominados de humanistas. So assim denominadas uma vez que
so inspiradas no estilo cursivo, empregado pelos letrados do Renascimento italianoque, curiosamente, por sua vez, inspiravam-se no estilo carolngio dos sculos X e
XI.
fato que a impresso com tipos mveis permitiu a ampliao do acesso cultura.
O surgimento da imprensa cria, pela primeira vez, a noo de pblico consumidor,
ou seja, de um conjunto de indivduos com os mesmos anseios de aquisio ou
fruio de bens. Ainda que no se possa chamar este fenmeno de massificao,uma vez no pode ser comparado aos bilhes de indivduos, expostos aos meios de
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comunicao de massa da atualidade, podemos afirmar que este seu prenncio.
Muitos autores acreditam que o invento de Gutenberg gerou a primeira revoluo
tecnolgica do mundo ocidental e que, a partir da tipografia e da disseminao do
conhecimento que esta possibilitou, nunca mais a cultura ser a mesmo.
1.4 A tradio humanista - evoluo da estrutura das letras romanas
A estrutura formal das letras romanas sempre esteve ligada caligrafia. As
mudanas formais tm estreita relao com a evoluo da tcnica de cunhar os
tipos. medida que o desenvolvimento da tecnologia permite traos mais finos, o
desenho das letras se modifica. Isto sem esquecermos os demais aspectos tcnicos
que, igualmente, evoluram com o passar do tempo, tais como melhorias na
qualidade da tinta, na qualidade do papel e nas prensas de impresso.
Figura 6 - Detalhe da evoluo formal das letras
Assim, Jenson, utilizou em 1470 uma estrutura formal prxima que conhecemos
hoje. Trinta anos mais tarde, em 1501, Aldus Manutius e Francesco Griffo,
inspirados na escrita cursiva da poca, criaram e imprimiram livros com um tipo mais
inclinado. Tratava-se de outra estrutura de letras, diferente das anteriores, com
formas que se acomodam mais prximas uma s outras. Os tipos criados por Griffo,
projetadas para economizar espao, resultam em livros menores e mais baratos, e
so denominados de grifados ou itlicos.
Em 1530 Claude Garamond, contratado por Robert Estienne, aperfeioa e inicia o
processo de dissociar o desenho dos tipos da dependncia caligrfica. Foi o primeiro
gravador de tipos (punchcutter) a trabalhar independentemente das editoras. Nesta
poca haviam tipos romanos e tipos itlicos, pertencentes a uma mesma famlia,
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mas de alfabetos independentes, no projetados para atuar em conjunto. Cada
gravador criava seu prprio tipo, em um tamanho especfico, resultando que cada
tipo vinha em seu prprio tamanho, dificilmente harmonizando com outros tipos.
Atualmente, o estilo do tipos criados por Garamond (fig 5) o mais usado em livros
no Ocidente.
Figura 7 Garamond, 1530 (baseada em Janson)
A primeira sistematizao do fazer tipogrfico que se teve notcia foi a de Geoffroy
Tory. Este publicou o primeiro manual, que tornava a tipografia compreensvel e
reprodutvel para outros impressores e escultores de letras, a Champ Fleury. Fez
uma normatizao tipogrfica da lngua francesa, dos usos de acentos, cedilha e
apstrofes. Relatou a histria da tipografia e das propores das letras romanas
baseadas na figura humana.
No final do Sc. XVII Grandjean recebeu a encomenda para a criao da famlia
Romana do Rei, Roman du Roi, desenhada a partir dos princpios cientficos
definidos por uma comisso da Academia de Cincias da Frana e reservada para o
uso exclusivo da Imprensa Real. A primeira obra que utilizou a letra Romana do Rei
denominava-se As Condecoraes, publicada pela primeira vez em 1702.
Grandjean recebeu os estudos apresentados em grandes pranchas gravadas emcobre, contendo os quadriculados onde cada letra se inscrevia subdivididos em 2314
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partes. O gravador se esforou para adaptar o desenho para o diminuto tamanho
dos tipos de imprensa e manteve o essencial proposto: caracteres com eixo vertical
com serifas horizontais, solenes. Suas itlicas rompem definitivamente com itlicas
humansticas de Grifo. (Mandel, 2006, p 121-125). Na Inglaterra Caslon, em 1722
(fig 6), fundiu os primeiros tipos ingleses para impresso de textos em ingls, tipos
ainda formalmente prximos das Garamonds. Note-se que, at ento, os livros eram
impressos em latim.
Figura 8 - A fonte Caslon, 1722
Segundo Lawson (2005, p.371-372) foi apenas no final do sculo XVII que o
conceito de embelezar as iniciais em letras romanas comeou a ser investigado
pelas empresas fundidoras de tipos de metal (typefoundries). As letras
ornamentadas se tornaram comuns apenas na metade do sculo XVIII,
principalmente devido ao fundidor francs Pierre Simon Fournier. Seu Manuel
Tipographique, de 1764, exibe uma variedade de letras ornamentais que parecem
parcialmente inspiradas por sua preocupao com os numerosos flores e bordas
que desenhou.
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Figura 9 - Fournier
O ingls John Baskerville humanizou Granjean, em 1754. Com requinte acentuou a
diferenas entre hastes finas e grossas alterando o eixo para quase vertical,
diferente do estilo anterior, as serifas comeam mais grossas e afinam, se libertando
dos resqucios da pena. Sua itlica influenciada pelas cursiva comercial apresenta
grande distino, so chamados os tipos transicionais
Figura 10 - A fonte Baskerville
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Bodoni A tipografia moderna do sculo XIX
A partir do sculo XVIII com o desenvolvimento da gravura em cobre, as letras
manuscritas comearam a ser impressas em chapas de cobre. Este procedimento
permitia um resultado de grande requinte. Este fato acabou influenciando os
criadores e gravadores de tipos que inspirados pelas formas de letras gravadas em
buril nas chapas que possuam traos finos e delicados.
Por volta de 1798 o italiano Gianbattista Bodoni desenha e publica um tipo inovador,
com grande controle em seus traos, remates finos e que significou uma revoluo
para a comunidade tipogrfica. Na Frana, os Didots, uma famlia com grande
tradio tipogrfica criam letra semelhante, que se converte letra padro para a
literatura clssica do sculo XIX. Apresenta o maior contraste j existente em um
tipo de metal, isto , uma grande diferena de espessura entre as hastes verticais e
horizontais, o eixo agora vertical sem nenhuma lembrana do traado da pena, da
caligrafia. Sua maior caracterstica so as serifas extremamente finas. O estilo de
tipos criado por Bodoni ou Didot, foi o ponto de partida, o modelo de onde sebasearam as mudanas nos tipos do sculo XIX. Frutiger (2002, p.28)
Bodoni
ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUVWXYZ
abcdefghijklmnopqrstuvwxyz
1234567890
Figura 11 - A fonte Bodoni
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1.5 Sobre nomenclatura as partes da letra
Para um bom entendimento do desenvolvimento das descries formais preciso ter
clareza sobre o que discorreremos. Para descrever os tipos decorativos do sculo
XIX importante que fiquem claros alguns conceitos e terminologias tipogrficas. A
caracterstica mais importante dos tipos decorativos a mudana de proporo na
relao de espessura entre as hastes (traos verticais) e as traves (traos
horizontais), a alterao das serifas e finalmente a introduo de enfeites. Hastes
so os traos verticais dos caracteres. No importa se na altura da minscula,
chamada altura de x, na descendente ou ascendente. Os caracteres esto sempre
apoiados em uma linha imaginria, a linha de base, como a letra x (minscula)
uma das nicas a ser totalmente reta, sem projees, tomada com referncia para
identificar a altura das minscula. As hastes descendentes so as partes da letra
que se projetam abaixo desta linha imaginria e ascendentes as que se projetam
acima da altura de x (fig.9) .
Figura 12 - As partes das letras
O que so as serifas? Serifas so os remates, a terminao dos traos das letras.
Segundo Edward Catich, em seu livro The Origin of the Serifs, 1941, sua origem
est relacionada s letras monumentais romanas e ao fato destas letras serem
primeiro pintadas e depois cortadas na pedra. O primeiro profissional desenha a
letra com o pincel chato e d o acabamento com um trao horizontal, que geraria um
corte onde o pincel havia feito a terminao da letra. (JEAN, 2000, p.66) H uma
segunda teoria que reza que o corte em 45 e a terminao seriam para evitar aconcentrao de gua congelada no inverno que causaria o rompimento das
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paredes das letras nos monumentos. Inicialmente ligada tradio da letra
monumental e da caligrafia, sua forma foi sendo alterada ao longo do tempo
paralelamente evoluo do domnio da tcnica de cunhar e fundir tipos de metal.
De acabamentos mais imprecisos e grosseiros, como o alfabeto Jenson antes de
1500, evolui para remates finos e delicados poca de Bodoni no sculo XIX, j
liberados porm da camisa de fora da tradio caligrfica.
Figura 13 - evoluo das serifas.
Muito cedo, no sculo XIX, a partir das grandes mudanas que ocorreram a partir
das revolues francesa em 1789 e industrial por volta de 1848, um novo cenrio
econmico se apresentou gerando novas necessidades. O surgimento das indstrias
movidas a vapor, as cidades, o consumo, a propaganda. Este momento levou osfundidores de tipos ingleses a produzir novos modelos de tipos criados para
enfatizar suas caractersticas exclusivas, com o nico propsito de atrair ateno.
Os antigos modelos no eram exuberantes o suficiente para as novas exigncias de
apresentao da propaganda e surgiram fontes encorpadas, com serifas quadradas
chamadas egpcias e posteriormente as sem serifa, chamadas de grotescas.
Tambm se alteram o tamanho e a espessura das serifas, e a relao entre a
largura da haste e a largura do tipo. A mudana nesta relao, que significa o
rompimento definitivo da tipografia com a caligrafia, cria primeiro tipos
exageradamente estendidos e depois, na nsia de inovaes, muito condensados.
As hastes mais grossas tem uma rea maior e por esta razo propiciam o
surgimento de enfeites aplicados dentro das mesmas. Est aberto o caminho para
os tipos decorativos, ou Vitorianos.
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Figura 14 - Bodoni, fat facee Egpcia, de cima para baixo.
1.6 A Tipografia Vitoriana Tipografia comercial, a vontade de falar mais alto.
At o incio do sculo XIX o fazer tipogrfico sempre esteve voltado para a produo
de livros. O processo tipogrfico era um processo pr-industrial, com diferentes
profissionais se ocupando de diversas fases da produo. A revoluo industrialinfluenciou e transformou ainda mais este processo, surgindo o que chamamos a
impresso comercial, job printing ou commercial printing. Os fundidores de tipos
descobriram que virtualmente qualquer design incomum poderia ser comprado por
tipgrafos para serem usados em anncios, cartazes, folhetos e embalagens. No
incio eram verses que se desenvolveram a partir dos estilos da Didot e Bodoni, em
segundo momentos surgiram as fontes egpcias, mas os designers logo deixaram de
alterar as fontes existentes e passaram a criar tipos mais singulares e bizarros.
A necessidade de difuso das notcias expandiu a intensidade e velocidade dos
jornais e peridicos. A excelncia e tradio foram deixados de lado em favor da
diferenciao, da novidade, do impacto. Se antes os fundidores eram procurados por
sua excelncia em cunhar tipos romanos com esttica impecvel, a revoluo
industrial gerou uma nova era onde clientes buscavam impacto, fora, e novidade a
uma velocidade cada vez maior para que preenchesse as necessidades da
propaganda emergente. Embora os tipgrafos tradicionais evitassem o ornamento,
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uma nova extirpe de profissionais no vinculados ao ofcio da tipografia, poca
chamados de artistas comerciais um sucedneo do que seriam os designers de
hoje, criava frequentemente exemplares nicos, feitos mo, para uso em uma
grande variedade de material impresso.
Inicialmente os impressores usaram os tipos existentes para cumprir esta funo
mas estavam limitados pelo tamanho e falta de impacto dos alfabetos existentes,
mais voltados para a impresso de livros. Ainda assim misturavam muitos tipos
diferentes, usavam corpos exageradamente grandes e pesados. Surge uma nova
textura de pgina.
Figura 15 As formas evoluem a partir da Bodoni para Fat face
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Figura 16 De Fat facesurgem as serifa quadradas exageradas
Figura 17 - e na seqncia... comeam as sombras
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nesta poca que surge a mquina de impresso vapor e o papel em bobina, que
possibilitaro a impresso de grandes tiragens, de jornais dirios. O jornalismo e a
publicidade se expandem, aliados s feiras internacionais, tudo muda rapidamente.
Os primeiros tipos criados para suprir esta necessidade apresentam um grande
contraste entre haste horizontal e vertical e serifas finas. Por exagerar a espessura
das hastes verticais estes novos tipos foram chamados Fat face. A tipografia
Bodoni (criada por Gianfrancesco Bodoni em 1798), havia rompido com a tradio
tipogrfica ao propor tipos com serifas lineares extremamente finas e um contraste
extremo, isto , traves horizontais final e hastes verticais grossas num eixo
totalmente vertical, desatrelando definitivamente a tipografia da tradio manuscrita.
Eixo a diferena entre as horizontais e verticais de uma letra, causada na caligrafia
pelo ngulo da pena. O girar da pena para um angulo horizontal (0) leva a traos
verticais grossos e horizontais finos. Esta relao de espessura se mantinha na
tipografia apesar de no mais existir um instrumento fsico que gerasse esta relao
de propores.
Seu uso por si s j indica um manifesto liberdade tipogrfica. Assim as Fat
Faces eram uma nova variedade de tipos usados com o objetivo de serem mais
expressivos, mais marcantes. Compostos inicialmente de letras grossas com serifas
exageradamente grandes ou exageradamente grossas, e posteriormente sem
serifas, foram criados especificamente para a impresso comercial e no para livros.
A partir deste momento o tipo de impresso se libertou da tradio e se tornou um
seguidor da moda
(ROMERO, 2005, p.4).
Depois das Fat Faces surge, entre 1810 e 1815, um novo estilo as slab serif
(linha inferior da figura 6 na pgina anterior) ou serifas quadradas. Tambm
chamadas Egpcias, provavelmente pelo fato do Egito estar na moda, aps os
descobrimentos dos tesouros arqueolgicos durante a conquista do Egito por
Napoleo. Elas se caracterizam por apresentar espessura semelhante entre a
hastes verticais e horizontais e por suas serifas retangulares. Segundo Nicolete Gray
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(1977, p11) as egpcias so a inveno mais brilhante deste sculo e talvez a mais
completa e concisa expresso da cultura dominante deste curto perodo.
Mas revoluo na forma e estrutura continua pois h um mercado que demanda
novidades. As empresas de impresso comercial precisam de novos modelos em
um ritmo cada vez mais rpido. As empresas que fornecem tipos, as type foundries
ou fundidoras de tipos criam internamente centenas de novos tipos para este
mercado. Se antes desenhistas especializados desenvolviam os tipos, agora so
funcionrios da empresa, muitas vezes sem a formao adequada, que criam e
produzem estes estilos. As alteraes, seja nas estruturas das letras como na
relao entre as espessura das hastes, no eixo, no peso, no tamanho das serifas,
continuaram. Inmeros estilos novos de serifas so criados.
Figura 18 - exemplos de tipos decorativos vitorianos
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O fato das hastes terem se tornado mais largas abriu espao para o surgimento de
enfeites e decoraes dentro da letra. A presso do mercado consumidor incentivou
a criatividade na elaboraes destes enfeites e decoraes, cada vez mais
exagerados. Contrastes, sombras que se projetam, outlines, tudo era bem-vindo. A
estrutura tradicional da letra romana algo do passado, agora quanto mais
decorativo melhor.
Esta foi uma poca de grandes lucros para as casas fundidoras de tipos, que
criavam e vendiam tipos de impresso para clientes vidos por novidades. As fontes
deste perodo, quase um sculo entre 1810 e 1900 chamado de tipografia
vitoriana. No exemplo abaixo podemos notar como se configua um impresso tpico
da poca, a mistura de diferentes estilios de tipos utiizados. O titulo MISS CAVELL
est composto em uma Fat face, porm sem serifa, tambm chamada grotesca.
Figura 19 - Cartaz de teatro, 1915.
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At ento tipografia era a arte de imprimir livros. A partir deste momento surge a
chamada Tipografia Comercial (comercial printing) que segue paralela impresso
de livros at hoje.
1.7 Anlise formal do tipo decorativo vitoriano
O estilo decorativo que chamamos aqui de tipografia vitoriana, assim denominado
por ter sido contemporneo do reinado da Rainha Vitria, que durou 63 anos, entre
1837 e 1901. Alm de ter sido o mais longo de um monarca britnico, este perodo
representa a esttica dominante no sculo XIX, poca da revoluo industrial, do
florescimento do comrcio global e do surgimento da publicidade.
Steven Heller (2004, p.370-371) em Linguagens do Design: Compreendendo o
Design Grfico mostra o papel e o carter comercial dos anncios:
A tipografia decorativa, ornamentada ou inovadora remonta ao incio dosculo XIX e da Revoluo Industrial. O comrcio estava expandindo suasfronteiras. Uma forma primitiva de anncio impresso substituiu o
comerciante como vendedor ambulante primrio de mercadorias
Segundo Alexander Lawson em Anatomy of a Typeface,
Aps 1800, os ingleses adotaram as letras ornamentais que lhes pareciama expresso ideal da industrializao transformando o tradicional ofcio daimpresso em um atraente moderno negcio. Por volta de 1850 asfundies do resto da Europa e dos Estados Unidos distribuam com vigortipos decorativos, mas em funo da enorme concorrncia as formas dostipos se degeneraram, perdendo sua relao com os modelos clssicos quesobreviveram at esta poca. Durante a segunda metade do sculo XIX asfundidoras americanas lideraram a produo de tipos displaysornamentais.
Desta forma, conforme indicado, devido ao comercialismo galopante daimprensa comercial de publicaes efmeras do sculo XIX as letrasornamentais romperam radicalmente com o charme dos estilos do sculoXVIII. (LAWSON, 1990, p.371-373) (Trad. da autora deste trabalho)
o rompimento definitivo com as regras clssicas da tipografia e a liberao da
criatividade na manipulao das estruturas formais das letras. Muda a relao entre
a espessura das hastes verticais e horizontais, o contraste. Muda a extenso das
letras, mudam as serifas e no espao oferecido pela hastes mais grossas comeam
a aparecer desenhos, decoraes cada vez mais exageradas.
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Existem algumas principais caractersticas no tipo decorativo, a primeira dela o uso
intensivo das maisculas, principalmente porque somente elas oferecem rea para
decorao sem comprometer a legibilidade, a segunda a espessuras de hastes
nunca imaginadas anteriormente. So extremamente grossas, bolds, pela mesma
razo, o espao onde ocorrem as decoraes. O elemento decorativo a
caracterstica mas importante e por esta razo chamado de vitoriano.
Ainda encontramos letras divididas em duas partes, o surgimento de serifas
diferenciadas, o uso da sombra e da linha de contorno. As serifas, antes pequenas
terminaes nas letras que favoreciam a leitura, tornam-se retas e grandes,
chamadas egpcias, com grande variao de espessuras. A conexo, a passagem
da haste horizontal para a serifa, antes suave e delicada, se torna abrupta, seca. A
partir da surgem variaes nas serifas como pontas e bicos, como demonstra a
figura 19.
Figura 20 Evoluo das serifas egpicias para as toscanas
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O estilo vitoriano foi considerado a ovelha negra da histria da tipografia, ignorada
pelos livros assim como so os milhares de tipos digitais criados aps o surgimento
do computador. O exagero estilstico e o desapego tradio clssica da tipografia
faz com que os estudiosos ignorem os produtos desta poca, fato que explica a
razo de existir pouca literatura sobre o tema e a dificuldade para seu estudo
aprofundado. Durante a metade do sculo XIX a prtica emergente de fabricar
matrizes a partir de eletrlise, inveno que propiciou uma onda de plagiarismo,
elevou o descrdito das "fat faces; percebeu-se que as fat faces, as grotescas e
as serifas quadradas ou egpcias facilmente se prestavam ao embelezamento e
portanto estes estilos foram rapidamente modificados e decorados, uma vez que
como j mencionado, tipos em negrito, pesados, grossos possuam uma grande
rea que favorece a decorao.
Se o reino dos tipos decorados no tivesse sido invadido pelo excessivodemanda comercial da nova classe de empreendedores industriais possvel que os tipos ornamentais pudessem ter se desenvolvidos dentro datradio do livro. Mas a presso da competio entre as vrias fundidoraslevou aos exageros no design das letras, o que contribuiu para a baixaestima que este gneros possui este entre os historiadores da tipografia.
(LAWSON, 1990, p. 375-376. Trad. da autora deste trabalho)
Ao nos depararmos com os barcos ribeirinhos da Amaznia no foi possvel deixar
de cogitar a influncia do estilo decorativo vitoriano. O estilo de pintura de letras
encontrado nas embarcaes amaznicas apresenta caracterstica muito prximas,
como a utilizao de tipos com hastes espessas, similares as Fat faces, serifas
quadradas, sombras, utilizam de decorao no miolo da letra e por esta razo
parece ter paralelos com estilo decorativo vitoriano descrito neste captulo.
Apresenta, por outro lado, caractersticas que nos parecem ter sido desenvolvidas
na regio. Seriam os alfabetos ribeirinhos uma apropriao do estilo vitoriano? Como
poderiam ter migrado do meio grfico para o barco? H evidncias de fatos
histricos ou mesmo materiais que nos possibilitem fazer esta relao? A
contemporaneidade entre a tipografia vitoriana e o ciclo da borracha e a Belle
poqueno faz crer que estariam relacionados e nos levou a esta pesquisa.
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2.1 A letra decorativa amaznica - de onde veio?
O presente levantamento foi realizado a partir de viagens realizadas entre 2004 e
2007 e portanto foi limitada aos destinos viajados. Foi possvel encontrar exemplos
de pinturas de barcos com referncias formais ligadas a Tipografia Vitoriana por toda
a calha do rio Amazonas, Manaus, Amap e Par (Belm, Abaetetuba, Cotijuba,
Curu, Marud/Algodoal, Santarm, Juruti), porm em busca nos portos de So
Lus e Fortaleza no foi possvel encontrar exemplares similares nos levando a
concluir que este estilo que pode ser considerado como uma expresso pertencente
cultura amaznica. importante citar que exemplos tambm so encontrados nas
cidades, em fachadas de lojas populares.
Figura 21 - Bodega em Vila dos Palmares, Par, 2007
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Figura 22 - Estncia em Outeiro, Belm, Par
2.4 Exemplos similares em outros pases
H exemplos de estilos de pinturas com influncias da poca vitoriana, similares ao
encontrado na Amaznia, na Colmbia, nas Chivas, nibus populares interurbanos
e tambm na Argentina, no fileteado.
Figura 23 - Fileteado argentino
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Figura 24 - Chivas, nibus populares na Colmbia, circulam pelo interior.
Estes dois estilos de pintura, entretanto, no se restringem s pinturas de letras e
sim a todo um cdigo visual ornamental, que tem como maior caracterstica a de
cobrir com fios, ornamentos, letras e imagens todo o veculo e no apenas identific-lo. H tambm no Brasil a tradio de enfeitar a carroceria do caminho, que usa o
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pincel chato como no Fileteado argentino. Este surgiu na Argentina com a imigrao
italiana no incio do sculo XX, na pintura de caminhes e posteriormente dos
nibus. Interessante notar que todos estes estilos so utilizados em meios de
transporte populares, entendendo que o barco a forma principal de transporte na
Amaznia.
Atravs da pesquisa, foi possvel verificar que abridor de letra dos barcos da
Amaznia possui um cdigo simblico comum encontrado em toda regio. Apesar
destes autores clamarem por estilos prprios, possvel concluir que estes
elementos no so individuais e fazem parte um universo maior, de uma cultura
local. A partir da apropriao de um modelo pertencente a uma poca, a dos tipos
decorativos do sculo XIX, desenvolveu-se um sistema de signos locais pertencente
a este grupo, conectado regionalmente atravs do rio. Dentre os elementos deste
sistema de cdigos podemos citar o uso exclusivo das letras maisculas, a diviso
do miolo dos caracteres, separados em sua metade superior e inferior e coloridos
em tons diferentes, uso de sombras, fios, paleta de cores e principalmente o usos da
decorao do miolo das letras criando um conjunto harmnico.
2.2 Panorama do sculo XIX na Amaznia
Os portos do Brasil foram abertos em 1808 com a vinda de D.Joo VI e sua corte
para o Brasil. Particularmente na Amaznia, a navegao foi liberada aps 1867. A
primeira companhia de navegao da Amaznia foi fundada pelo Visconde de Mau
com a abertura do Rio Amazonas ao comrcio mundial, aps um longo perodo de
presses internacionais.
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Figura 25 - Barcos a vapor , foto de Hubner.
Segundo Mrcio de Souza, uma viagem do Rio de Janeiro para Lisboa em 1790
durava noventa dias; uma entre Belm e Lisboa na mesma poca durava trinta dias;
j outra entre o Rio de Janeiro e Belm podia durar at cinco meses.
naqueles tempos de navegao a vela, a transposio do cabo Branco erapraticamente impossvel e perigoso. Assim, para os que vinham do AtlnticoNorte, as rotas mais propcias eram aquelas que, seguindo as correntes,
levavam diretamente ao Atlntico Sul e ao litoral do Brasil, ou as quelevavam ao Caribe e ao esturio do rio Amazonas. (SOUZA,2005, p.53)
Em 11 de janeiro de1853, foi inaugurada a linha fluvial entre Belm e So Jos do
Rio Negro (hoje, Manaus), pelo primeiro vapor que pertenceu a Companhia de
Comrcio e Navegao do Amazonas, ampliando o comrcio e fazendo surgir na
orla vrios trapiches. Em 1866, criada a Companhia Fluvial do Alto Amazonas. No
ano seguinte, surge a Fluvial Paraense. Em 1874, ocorreu a fuso da Companhia de
Comrcio e Navegao, com a Companhia Fluvial do Alto Amazonas, surgindoassim, a Amazon Steam Navigation Company.
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Quanto ao movimento de embarcaes e cargas durante os meados do sculo XIX,
a rea porturia de Belm apresentou significativo crescimento em suas atividades,
de 78 embarcaes em 1840 para 292 em 1880. Em 1889 seu cais era nada mais
que uma srie de trapiches pertencentes a vrias Companhias de navegao.
partir de 1870 o ciclo da borracha se intensifica chegando a seu auge na primeira
dcada de 1900. A borracha chega a representar 25% das exportaes brasileiras.
(MEIRELLES FILHO, 2004, p.124) Este perodo de florescimento econmico
chamado de Belle poque.
Sobre o ciclo da borracha e a Belle poque, Joo Meirelles Filho em seu Livro de
Ouro da Amaznia diz :
Um dos poucos resultados que permanecem para a regio oaparelhamento de Belm e Manaus como cidades modernas, como jamaisse vira no Brasil. As cidades recebem calamento, paisagismo, luz eltrica,bondes. Alguns destes servios chegam a estas cidades antes que a capitaldo pas, o Rio de Janeiro. Manaus guarda como lembrana edifciospblicos como o Teatro Amazonas, o Palcio do Governo, o MercadoMunicipal e o prdio da Alfndega. Belm moderniza seu porto, constri oTeatro da Paz e diversos prdios pblicos. Nas duas cidades famlias
abastadas constroem palacetes. Durante algumas poucas dcadas Manause Belm conhecem o luxo e a extravagncia de uma elite, ao lado damisria generalizada. (MEIRELLES FILHO, 2004, p.125-126)
As elites da Amaznia do final do sculo XIX, enriquecidas, vivem em casas
luxuosas, vestem roupas vindas de Paris, eram influenciadas pelos padres culturais
europeus que promoveu h um grande fluxo de mercadorias vindas da Europa.
Em funo desta agitao cultural podemos influir a existncia de grande aflunciade material grfico vinda da Europa para o Brasil. Se estabelece em Belm o
fotgrafo Augusto Fidanza,em 1867, poca das solenidades que marcaram a
abertura dos portos da Amaznia ao comrcio exterior (SCHOEPP, 2005 p 39).
Fidanza realiza vrios lbuns publicitrios para o governo Paraense, impressos na
Europa.
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Figura 26 - Folha de rosto do Album do Estado do Par de 1898
Estes lbuns, (fig 26), introduzidos por italianos ligados a Cia. de Navegao Ligure
Brasiliana, Arhur Caccavoni em Belm e Arturo Luciani em Manaus, so exemplos
da expanso da publicidade e disseminao da informao que vive a Amazniadeste momento, onde a prosperidade se faz sentir em todos os setores da
economia. Assim como os livretos publicados pelas companhias de navegao, os
anncios das casas aviadoras, bancos, empresas de importao e exportao,
impressos na Europa so exemplos de uso da tipografia decorativa (SCHOEPP,
2005 p 36). Em Manaus tambm se estabelece outro fotgrafo, Hubner&Amaral.
Hubner compraria o estabelecimento de Fidanza em Belm, aps do falecimento do
mesmo.
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O Ciclo da borracha trouxe como conseqncia o povoamento da Amaznia, o
florescimento de uma elite cultural e o desenvolvimento dos transportes fluviais da
regio. (ARRUDA, 2003, p. 70). importante notar que esta grande movimentao
econmica e efervescncia cultural contempornea ao surgimento e
desenvolvimento da tipografia vitoriana na Europa e Estados Unidos, este estilo
rapidamente tomou conta do cenrio internacional e seguramente aportou na
Amaznia.
Figura 27 - Nota de mil ris
Portanto podemos levantar algumas hipteses de pontos de contato entre os
Abridores de Letras e as letras decorativas do perodo Vitoriano.
A fora da tipografia local e a influncia da arte tipogrfica europia e americana
atravs de jornais, publicidade, embalagens de produtos e cartazes. H registros de
fotos de fachadas dos estabelecimentos comerciais onde pode se observar letras
com sombras.
O Par foi um dos primeiros estados a possuir uma tipografia, que funcionou no
Estado em 1818, executando trabalhos de impresso de documentos oficiais. Era de
propriedade particular, montada com dificuldades por Joo Francisco de Madureira,
(que mais tarde juntou o apelido Par ao de Madureira) nascido na vila do Acar,
hoje municpio paraense. Os trabalhos grficos eram executados com tipos de
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madeira, produzidos pelo prprio Madureira Par como era apelidado, sem que o
mesmo tivesse obtido a mais simples lio sobre essa profisso. (Rizzini, 1977 e
HALLEWELL,2005, p.191). Depois de Madureira, Felipe Patroni imprimiu pela
Imprensa Liberal, em 1822, O Paraense o primeiro jornal do Par em 1822, o
quinto jornal do pas.
Figura 28 - lbum do Par - 1908 impresso em Paris
A influncia dos impressos culturais, impressos na Europa e Estados Unidos vindos
para a regio em funo da efervescncia cultural reinante, sobretudo os cartazes
de peras (figura 29) e os lbuns do Governo, (figura 28).
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Figura 29 - O Guarani - Opera de Carlos Gomes
Com o avano da circulao e comercializao de produtos embalados colocou a
populao em contato com modelos de letras do estilo vitoriano. A permisso da
instalao das tecnologias de impresso no Brasil apos 1808 posteriormente odesenvolvimento da litografia, possibilitou a impresso de rtulos de mercadorias
altamente atrativos aos consumidores com o uso de ilustraes e diversos estilos de
letras comuns poca. Em O Design Brasileiro antes do design, (CARDOSO, 2005.
p.41) encontramos a seguinte descrio:
Uma das principais caractersticas dos impressos deste momento aprofuso de desenhos de letras numa pea. [...] No rtulo de fumo Ramon
Anido os textos foram escritos em diversos estilos tpicos da poca: otoscano (presente nos dizeres Superior Fumo de Minas, Importados do Riode Janeiro e Garantido por, Especialidadee Rio de Janeiro), o sem-serifa(em Ramon Anido e nos textos laterais) e o tridimensional (em Artigas).(obs. Itlicos da autora citada)
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Figura 30 - Rtulo de fumo
O contato e passagem de barcos a vapor americanos, especialmente os do
Mississipi que possuem a tradio de usar letras decorativas como identificao
Figura 31 - Barcos do Mississipi
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importante salientar que a cultura da letra pintada mo, informal, ainda
passvel de ser encontrada com freqncia nas ruas de Belm, e das outras capitais.
Letreiros pintados pelos abridores ainda prevalecem em relao aos luminosos
industriais, principalmente na periferia das cidades. Entretanto j possvel
identificar nestes locais uma forte influncia das imagens geradas pelo computador,
mais fcil identificar letras similares fontes digitais includas nos sistemas
operacionais.
Nota-se que uma tradio, uma manifestao cultural. Difcil mesmo
compreender qual o caminho percorrido, se as letras das fachadas, dos impressos
se bandearam para os barcos ou vice-versa.
Figura 32 - Curua, 2006, foto da autora
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Figura 33 - Soure, 2007. Foto Smia Batista
Figura 34 - Belm 2005, foto Fernanda Martins
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2.3 Leitura e visualidade
A riqueza visual da tipografia decorativa vitoriana pode ser comprovada pelos
recursos utilizados pelos seus criadores. As letras decorativas do sculo XIX,
sempre maisculas, grossas, passam a apresentam fios de contorno, o que permite
inmeros enfeites em suas hastes. As serifas cresceram a ponto de se tornar mais
grossas que as hastes, ou se diversificaram com inmeros remates: duplos, triplos,
as serifas toscanas. Uma das tcnicas mais populares foi a simulao da
tridimensionalidade atravs de sombras. Os letreiros dos barcos apresentam estas
mesmas caractersticas acrescidas do uso de um cdigo cromtico especfico e a
predominncia da diviso das letras em duas partes.
Beatrice Warde (in HELLER, 1999, pg 56), em seu famoso manifesto sobre a clareza
e a legibilidade na tipografia, diz a tipografia deve transparente como uma taa de
cristal.
Peo que imaginem perante vocs uma garrafa de vinho e duas taas uma de ouro macio, lavrada com a filigrana mais requintada e outra de
cristal, do mais fino e transparente- os verdadeiros apreciadores de vinhoescolhero, a meu ver, a taa de cristal, porque nela tudo esta pensadopara revelar, e no esconder, a beleza de seu contedo.
Ela sugere que a tipografia deve ser isenta, apenas o suporte para o contedo. Para
ela, o profissional que compe o texto deve faze-lo de forma a auxiliar a leitura, no
deve portanto criar interferncias, enfeites, rudos na leitura. Esta definio,
entretanto, no se aplica aos Abridores de letras que do mais valor ao resultado
visual atravs das interferncias que impem s letras que pintam nas
embarcaes. Ao estilo do Abridor de letra tampouco se aplicam as clssicas
discusses da Tipografia tradicional, sobre legibilidade e leiturabilidade do texto.
Legibilidade o termo usado quando discutimos a clareza de cada caractere.
Para os estudos da tipografia, legibilidade a qualidade que permiteidentificar e reconhecer caracteres. A legibilidade de uma determinada letradiz respeito ao seu desenho a habilidade do leitor em identifica-la. Sendoassim a velocidade de reconhecimento do caractere que define seu graude legibilidade. J a leiturabilidade estabelecida de acordo com a duraoda leitura. Se um texto diagramado em um livro pode ser lido sem
dificuldade ou sobressaltos, pode-se dizer que sua tipografia tem boaleiturabilidade. (MARTINS, 2007, p.32)
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Estes conceitos se referem percepo, reconhecimento e compreenso dos
signos. Uma letra deve ser legvel, porm mesmo uma letra legvel pode ser utilizada
em condies que afetem sua leitura. Como exemplo de condies que devem ser
levadas em conta podemos citar a falta de contraste entre a letra e o papel, o
tamanho de letra selecionado para um determinado texto, a entreletra, a entrelinha,
o comprimento da linha. O estilo dos abridores, onde predomina o exagero de
enfeites, cores, fios e sombras afeta a legibilidade e leiturabilidade do texto. Este
aspecto nos permite concluir que a funo semntica dos letreiros dos barcos
menos importante que a funo visual, que a identificao da imagem surge em
primeiro lugar e apenas em segundo momento a leitura enquanto significado do
texto.
Segundo Paes Loureiro, (2000, p. 174) os letreiros dos barcos amaznicos possuem
tanto a funo comunicante como a funo esttica em si.
Se nos barcos o pintor no se reconhece artista produtor de beleza e no assume a autoria de seu
trabalho, o mesmo no acontece com o pintor de letras. O "abridor de letras", como gostam de se
auto-intitular. So especialistas em escrever nomes nas embarcaes, nas casas comerciais, nas
tabuletas do comrcio, trabalhando para um mercado e apresentando intuitiva marca publicitria. Dele
a letra nasce como "poiesis", como mundo re-feito. So signos que mantm uma configurao
significante prpria em que a letra letra como unidade de um letreiro, e objeto esttico autnomo,
no sentido em que, exibindo-se como signo mltiplo e aberto, condensa sobre si mesmo as atenes
do receptor. So letras-telas que, feito espao pictrico mtico podem conter dentro deste, tanto um
adorno geometrizante, como uma paisagem desenhada. Assim, tanto remetem ao contexto frasal em
que se vem inseridas em uma funo comunicantemente, como retm a mensagem em si mesma.
a letra-signo-objeto, em uma verdadeira epifania. Letra que pode ser tela, cenrio, guardi da
natureza, suporte plstico do mundo. A letra como alegoria. A letra como mito. Diminuta catedral
barroca e letra beira o kitsch. Mas no resvala. Vocabulrio para os olhos, seu sentido o da praxis
informativa. Mas uma praxis tambm potica. Como ntida metfora do barco, a letra leva em seus
tombadilhos e pores uma densa carga de figuras, signos, paisagens. Os sinais do mundo. A funo
comunicativa alterna-se com a funo potica, tanto capaz de passar adiante como reter em si a
mensagem. Letra que passagem para o outro e letra narcsica. Desejo de comunicar e objeto de
contemplao. Corpo de tatuagens. Celebrao do imaginrio. Fulgurao. No propriamente letra
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de escrever, mas letra em que se escreve. Letra desalfabetizada na funo no discursiva de suporte
de cores.
O objetivo maior da criao dos abridores no a leitura mas o reconhecimento, a
palavra/imagem. A partir da apropriao de um sistema existente, a tipografia formal
em seu estilo vitoriano, o caboclo amaznico cria um cdigo prprio pertencente
regio onde vive e resultado da sua relao com este meio. A materialidade da letra,
a identidade que est em jogo.
importante ressaltar o aspecto