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    PERSPECTIVAS PARA O MARCO LEGAL DO TERCEIRO SETOR

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    PERSPECTIVAS

    PARA OMARCO

    SETORLEgALdO TERCEIRO

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    So Paulo2009

    PERSPECTIVAS

    PARA OMARCO

    SETORLEgALdO TERCEIRO

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    GIFE Grupo de Institutos, Fundaes e EmpresasAv. Brig. Faria Lima, 2413 1 andar Jardim Amrica01452-000 So Paulo SPTel./Fax: (55-11) 3816-1209e-mail: [email protected]

    2009 GIFE Grupo de Institutos, Fundaes e Empresas

    GIFE Grupo de Institutos, Fundaes e Empresas

    Conselho de Governana Gesto 2009/2011

    Denise Aguiar Alvarez Fundao Bradesco (Presidente)Ana Amlia Campos Toni Fundao FordDavid Saad Fundao Victor Civita

    Hugo Guimares Barreto Filho Fundao Roberto MarinhoJos Paulo Soares Martins Instituto GerdauLuis Paulo Saade Montenegro Instituto Paulo MontenegroMaria Alice Setubal Fundao Tide SetubalMauricio Medeiros Fundao OdebrechtRenata de Camargo Nascimento Instituto de Cidadania EmpresarialSamara de S e Benevides Werner Oi FuturoSergio Amoroso Fundao OrsaValdemar de Oliveira Neto Fundao Avina

    Conselho Fiscal Gesto 2009/2011

    Geraldo Arajo Instituto O BoticrioIzalco Sardenberg BM&F BovespaLaura Oltramare Grupo SantanderReginaldo Jos Camilo Fundao Ita Social

    SecretrioGeral

    Fernando Rossetti

    Perspectivas para o Marco Legal do Terceiro Setor

    Programa Marco Legal do Terceiro Setor e Polticas Pblicas

    Renato Jaqueta Benine (Coordenador, abr/2008 abr/2009)Glucia Veith de Melo Souza (Estagiria, jul/2008 dez/2008)Eduardo Pannunzio (Coordenador, set/2005 mar/2008)Aline Gonalves de Souza (Estagiria, jan/2007 mai/2008)

    Superviso geral

    Fernando Rossetti

    CoordenaoEduardo Pannunzio, Renato Benine e Andre Degenszajn

    Redao

    Elisa Rodrigues Alves Larroud (Captulo 1), Flvia Regina de Souza Oliveira (Captulo 2),Eduardo Pannunzio e Aline Gonalves de Souza (Introduo, Captulos 3 e 4, e Concluso)

    Preparao e reviso de texto

    Priscila Akemi Beltrame, Katia Gouveia Vitale

    Edio e projeto grfco

    Edies Jogo de Amarelinha / Aeroestdio

    Impresso

    RR Donnelley

    ISBN: 9788588462137

    Agradecemos o apoio da Fundao Ford e da Fundao W.K.Kellogg que viabilizaram esta publicao.

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    Introuo 7

    Captulo I TRANSPARNCIA E CONTROLE SOCIAL (Accountability) 11

    1. PANORAMA REGULATRIO ATUAL 11

    1.1. Pessoas jurdicas sem fns lucrativos 12

    1.1.1. Associaes 12

    1.1.2. Fundaes privadas 12

    1.2. Ttulos e certifcaes 131.2.1. Declarao de Utilidade Pblica Federal (UPF) 13

    1.2.2. Registro no Conselho Nacional da Assistncia Social (CNAS) 14

    1.2.3. Certifcado de Entidade Benefcente de Assistncia Social (Cebas) 14

    1.2.4. Organizao da Sociedade Civil de Interesse Pblico (Oscip) 15

    1.2.5. Organizao Social (OS) 16

    2. ANLISE CRTICA 17

    2.1. Desequilbrio entre Estado e demais pblicos 18

    2.2. A inconstncia das obrigaes 19

    2.3. A dicil composio de atuao e accountability 202.4. Como valorizar a diversidade? 21

    3. PROPOSTAS DE APERFEIOAMENTO 21

    Captulo II LIBERDADE DE ORGANIZAO E FUNCIONAMENTO 27

    1. PANORAMA REGULATRIO ATUAL 27

    2. ANLISE CRTICA 29

    3. PROPOSTAS DE APERFEIOAMENTO 34

    S U M R I O

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    Captulo III IMUNIDADES E ISENES TRIBUTRIAS 391. PANORAMA REGULATRIO ATUAL 39

    1.1. Hipteses de imunidade tributria no terceiro setor 40

    1.2. Hipteses de iseno tributria no terceiro setor 41

    1.3. Propostas de alteraes legais em curso 41

    2. ANLISE CRTICA 422.1. Insegurana jurdica: a tnica da dimenso tributria 43

    2.2. Imunidades e isenes como instrumentos de omento 44

    2.3. O alcance restrito da imunidade tributria 45

    2.4. Limitaes imunidade: universalidade, gratuidade e exclusividade 46

    2.5. Limitaes iseno: a proibio de remunerao de dirigentes 46

    2.6. Incertezas na tributao de atividades econmicas 47

    2.7. A necessidade de ampliar a transparncia 48

    3. PROPOSTAS DE APERFEIOAMENTO 48

    Captulo IV INCENTIVOS FISCAIS PARA INICIATIVAS DE INTERESSE PBLICO 53

    1. PANORAMA REGULATRIO ATUAL 53

    1.1. Incentivos fscais para doaes a organizaes da sociedade civil 54

    1.2. Incentivos fscais para doaes a undos pblicos 54

    1.2.1. Doaes aos undos dos direitos da criana e do adolescente 55

    1.2.2. Doaes ao Fundo Nacional de Cultura 55

    1.3. Incentivos fscais para projetos de interesse pblico 55

    1.3.1. Incentivos fscais na rea da cultura 55

    1.3.2. Incentivos fscais na rea do desporto 561.4. Incentivos fscais estaduais e municipais 57

    1.5. Propostas de alteraes legais em curso 57

    2. ANLISE CRTICA 58

    2.1. As unes dos incentivos fscais 59

    2.2. A questo da contrapartida do contribuinte 59

    2.3. Deduo da base de clculo ou abatimento sobre o imposto devido? 59

    2.4. O universo restrito de potenciais utilizadores dos incentivos 61

    2.5. O tempo das doaes ou patrocnios 61

    2.6. A insufcincia de incentivos para organizaes da sociedade civil 61

    2.7. A disputa por incentivos fscais no interior do terceiro setor 62

    2.8. Centralizar ou descentralizar o uncionamento dos incentivos? 63

    2.9. Polmicas sobre a doao vinculada e a instituio vinculada 63

    2.10. O dfcit de transparncia 64

    3. PROPOSTAS DE APERFEIOAMENTO 64

    Consieraes fnais 69

    Viso gIFE o marco leal o terceiro setor Carta de Curitiba 70

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    7A existncia de um ambiente regulatrio moderno, claro e estvel ator undamental para promovera expanso e qualiicao do investimento social privado em qualquer pas. Com base nessa premis-

    sa, o GIFE (Grupo de Institutos, Fundaes e Empresas) desenvolve, desde o incio de 2003, uma ini-

    ciativa destinada a contribuir para o apereioamento da legislao brasileira relativa ao terceiro se-

    tor: o Programa Marco Legal e Polticas Pblicas.

    Em maio de 2006, o oco de atuao do Programa oi reinado com a aprovao da Carta de Curi-

    tiba Viso GIFE do Marco Legal do Terceiro Setor(anexo p.70), um documento que estabelece os

    cinco temas que a rede GIFE identiica como prioritrios no processo de apereioamento do marcolegal do terceiro setor: (1) liberdade de organizao e uncionamento para as organizaes da socie-

    dade civil; (2) transparncia e controle social (accountability); (3) imunidades e isenes tribut-

    rias; (4) incentivos iscais para iniciativas de interesse pblico; e (5) segurana jurdica, na qualida-

    de de tema transversal1.

    Na sequncia, a im de azer um levantamento preliminar das principais questes relacionadas

    a esses temas, o GIFE promoveu, no segundo semestre de 2006, duas rodadas de discusso que

    contaram com a participao de representantes de associados do GIFE, organizaes parceiras e

    especialistas2.

    A partir dessas discusses, o GIFE elaborou esta nova verso da publicao original. Trata-se deum documento mais aproundado que, em relao a cada um dos temas indicados na Carta de Curiti-

    ba, contm (1) uma descrio concisa de como a legislao brasileira aborda a matria; (2) a identi-

    icao e anlise dos principais entraves e oportunidades; e (3) um conjunto de propostas concretas

    de apereioamento do respectivo ambiente regulatrio, incluindo medidas legislativas, administrati-

    vas e/ou de autorregulao.

    Os captulos que se seguem, portanto, acompanham essa ordem de exposio. O primeiro, sobre

    transparncia e controle social, oi elaborado pela consultora Elisa Rodrigues Alves Larroud. O se-

    I N T R O D U O

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    gundo, reerente liberdade de organizao e uncionamento para as organizaes da sociedade ci-

    vil, icou a cargo da advogada Flvia Regina de Souza Oliveira. Os dois ltimos captulos, que abordam

    os temas das imunidades e isenes tributrias e incentivos iscais para iniciativas de interesse p-

    blico, oram estruturados pela equipe do Programa Marco Legal e Polticas Pblicas do GIFE, composta

    na poca pelo advogado Eduardo Pannunzio e pela estagiria Aline Gonalves de Souza.

    importante ainda destacar que uma verso preliminar deste documento oi debatida numa reu-nio especial do Grupo de Ainidade em Marco Legal do GIFE, realizada em 27 de junho de 2007, que

    contou com a participao de alguns dos maiores especialistas em direito do terceiro setor no Brasil2.

    As crticas e sugestes recebidas na ocasio serviram para enriquecer consideravelmente o conte-

    do desta publicao3.

    O presente documento oi, ainda, submetido consulta dos associados do GIFE entre os dias 17 e

    30 de setembro de 2007. Essa etapa serviu no apenas para receber novas contribuies em relao

    ao texto, mas tambm para legitimar o seu contedo dentro dessa que a principal rede de investi-

    dores sociais privados do pas.

    Ironicamente, a insegurana jurdica, aqui abordada, aetou tambm o processo de elaboraodesta publicao. As constantes expectativas de alterao do ambiente regulatrio do terceiro setor

    diicultaram o echamento deste documento, que passou por diversas revises para se adaptar s

    mudanas implementadas. Embora conscientes do risco de esta publicao tornar-se deasada pouco

    tempo aps a sua concluso, optou-se pela sua publicao mesmo na iminncia de novas reormas.

    O GIFE acredita que as questes aqui apresentadas so estruturais e permanecem vlidas, visando

    uma reviso prounda do atual ambiente regulatrio do terceiro setor.

    Espera-se que este documento no apenas oriente a atuao de advocacy do GIFE ao longo dos

    prximos anos em relao melhoria do marco legal do terceiro setor, mas tambm que sirva de re-

    erncia e contribua para a deinio de uma agenda comum capaz de aglutinar os esoros de todosaqueles que j estejam engajados ou queiram participar desse processo parlamentares e outros

    agentes pblicos, organizaes da sociedade civil, acadmicos, empresas, meios de comunicao e

    a sociedade em geral.

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    Notas do captulo

    1 C. GIFE. Carta de Curitiba Viso GIFE do Marco Legal do Terceiro Setor (online). Disponvel em .

    2 Participaram do encontro: Ana Carolina Bittencourt (Instituto Pro Bono), Daniela de Aquino Coelho (Fundao Abrinq pelos Direitosda Criana e do Adolescente), Eduardo Szazi (Soiatti, Szazi, Bechara Advogados), Elisa Rodrigues Alves Larroud (FGV/SP), EsterGammardella Rizzi (Fundao Abrinq pelos Direitos da Criana e do Adolescente), Felipe Barboza Rocha (Pinheiro Neto Advogados),Fernando Ayres (Pinheiro Neto Advogados), Flvia Regina de Souza Oliveira (Mattos Filho, Veiga Filho, Marrei Jr., Quiroga Advogados),Gerson Pacheco (Fundo Cristo para as Crianas), Helga Lutzo Bevilacqua (advogada), Iradj Eghrari (gere Cooperao em Advo-cacy), Judi Cavalcanti (Fundao Tide Setbal), Las Vanessa Figueiredo Lopes (Figueiredo Lopes & Golieri Advogados Associados),Marcos Fuchs (Instituto Pro Bono), Maria Lcia Guardia (Natura), Maria Nazar Lins Barbosa (FGV/SP, OAB/SP), Maurcio Chapinoti(Pinheiro Neto Advogados), Maurcio Jayme e Silva (Rubens Naves, Santos Jr., Hesketh Escritrios Associados de Advocacia), PaulaRacanello Storto (Figueiredo Lopes & Golieri Advogados Associados) e Valria Trezza (advogada), alm de parte da prpria equipe doGIFE (Aline Gonalves de Souza, Cinthia Sento S, Eduardo Pannunzio e Fernando Rossetti). A todos eles, os sinceros agradecimentosdo GIFE.

    3 Entre as contribuies, vale destacar as concluses extradas da oicina Regulating or CSO Accountability: Transnational Issues,conduzida em parceria por GIFE, FGV, International Center or Not-or-Proit Law (ICNL) e Charity Commission do governo britnico, naAssembleia Geral da CIVICUS em Glasgow, em maio de 2007.

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    C A P T U L O I

    Transparncia e controle social (accountability)

    As organizaes da sociedade civil esto cada vez mais presentes no Brasil, atuando na proviso debens e servios pblicos, e no controle da ao do Estado e de empresas. O interesse pblico de sua

    atuao decorre no s das inalidades a que se propem e do impacto de suas aes, mas tambm dacrescente inluncia que exercem e dos recursos pblicos que acessam. Tal conjunto de poderes exige

    um equilbrio em relao aos deveres das organizaes, permitindo que se reconheam suas responsa-bilidades e avancem suas contribuies na construo de uma sociedade mais justa e sustentvel.

    a partir da juno de poder e dever que se chega a um conceito amplo e ao mesmo tempo

    prtico de accountability (ou responsabilizao): pode-se considerar a accountability como umarelao em que uma parte tem o dever de prestar contas de seus atos e decises outra, que, por sua

    vez, tem o poder de controlar a primeira e aplicar-lhe consequncias se houver impropriedades ouinadequaes em relao aos atos e s decises da primeira ou na sua prestao de contas.

    A prtica de accountability pelas organizaes da sociedade civil, apesar de ser um esoro com-

    plexo, acarreta uma srie de vantagens: aprimora o desempenho e a aprendizagem das organizaes,e aumenta a coniana do pblico e a capacidade das organizaes de mobilizar recursos para sus-

    tentar o cumprimento de sua misso. undamental, portanto, que a legislao aborde esses poderes e deveres de maneira adequada,

    de modo a ir alm da noo de controle para eetivamente omentar os avanos que decorrem da

    prtica de accountability. O presente captulo se dedica a examinar o tratamento dado ao tema naregulao das organizaes da sociedade civil, no intuito de ornecer subsdios para a proposio e

    discusso de medidas que possam apereioar o respectivo marco regulatrio.

    1. PANORAMA REgULATRIO ATUAL

    A legislao brasileira estabelece diversas regras aplicveis s organizaes da sociedade civil. Algu-

    mas tratam da constituio e do uncionamento das dierentes ormas jurdicas das organizaes

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    sem ins lucrativos; outras regulam especiicamente a obteno e manuteno de ttulos e certiica-

    dos acessveis a elas. Alm disso, h um sem-nmero de normas a respeito dos benecios iscais que

    podem ser gozados por essas organizaes. Este captulo examina o panorama relativo aos dois pri-

    meiros grupos, visto que os temas de imunidades e isenes tributrias e de incentivos iscais sero

    abordados nos captulos III e IV desta publicao. Na presente seo, procura-se descrever sucinta-

    mente como a legislao brasileira aborda o tema da accountability das organizaes da sociedadecivil, apontando quais so seus deveres em relao a seus respectivos pblicos e aos corresponden-

    tes poderes dos mesmos.

    1.1. Pessoas juricas sem ins lucrativos

    Todas as pessoas jurdicas, para que adquiram existncia legal, so obrigadas a registrar seus atos

    constitutivos, prevendo o modo de administrao da organizao e o destino de seu patrimnio caso

    seja dissolvida1. So obrigatrias tambm, para regularidade iscal, a inscrio no Cadastro Nacional

    da Pessoa Jurdica (CNPJ)2 e a matrcula no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS)3.Alm disso, as pessoas jurdicas devem regularmente ornecer inormaes a dierentes rgos

    pblicos: Secretaria da Receita Federal (SRF), so obrigadas a apresentar anualmente a Declarao

    de Inormaes Econmico-Fiscais da Pessoa Jurdica (DIPJ)4; quando possuem empregados, a apre-

    sentar anualmente a Relao Anual de Inormaes Sociais (RAIS) ao Ministrio do Trabalho e Empre-

    go (MTE)5, alm de, mensalmente, a Guia de Recolhimento ao Fundo de Garantia do Tempo de Servio

    e Inormaes Previdncia Social (GFIP) ao INSS6. Vale apontar que as pessoas jurdicas esto sujei-

    tas, a qualquer tempo, iscalizao pela SRF7.

    1.1.1. AssociaesAs associaes so obrigadas a determinar estatutariamente as responsabilidades de seus dirigen-

    tes e membros ao preverem o modo de constituio e de uncionamento dos rgos deliberativos, a

    orma de gesto administrativa e de aprovao das respectivas contas, os requisitos para a admis-

    so, demisso e excluso dos associados e quais so seus direitos e deveres. Devem, adicionalmen-

    te, preservar a competncia privativa da assembleia geral de destituir os administradores e alterar o

    estatuto8. Alm disso, como pessoas jurdicas sem ins lucrativos, as associaes esto proibidas de

    distribuir lucros.

    Se dissolvidas9

    , as associaes devem destinar o remanescente do patrimnio lquido entidadede ins no econmicos designada no estatuto ou, na sua omisso, por deliberao dos associados,

    instituio municipal, estadual ou ederal, de ins idnticos ou semelhantes 10.

    1.1.2. Fundaes privadasAs undaes privadas so obrigadas a registrar seus atos constitutivos tambm na Curadoria de

    Fundaes do Ministrio Pblico de sua comarca, que velar por elas 11. Desse modo, cada estado

    pode determinar as normas de iscalizao e prestao de contas aplicveis s undaes no mbito

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    de sua jurisdio12. uniorme, em todo caso, a proibio de distribuio de lucros, tal como ocorre

    com as associaes.

    A alterao de seu estatuto social exige deliberao de dois teros dos membros competentes para

    geri-la e represent-la (conorme estabelecido em seu estatuto), e no poder contrariar ou desvirtuar

    os ins da organizao. Se a votao no or unnime, necessrio requerimento ao Ministrio Pblico

    para que se d cincia minoria vencida, a im de que esta possa impugn-la (se desejar) no prazo dedez dias. Em caso de dissoluo, que pode ser requerida por qualquer interessado e/ou pelo Ministrio

    Pblico, seu patrimnio dever ser incorporado a outra undao que se proponha a im igual ou seme-

    lhante, designada pelo juiz, desde que no haja disposio em contrrio no estatuto social13.

    1.2. Ttulos e certiicaes

    A seguir, so destacadas exigncias vinculadas a cinco das principais certiicaes previstas na legis-

    lao brasileira.

    1.2.1. Declarao de Utilidade Pblica Federal (UPF)A declarao de uma organizao como de Utilidade Pblica Federal (UPF)14 certiicao vinculada ao

    exerccio predominante de atividades de educao, pesquisa cientica, culturais ou ilantrpicas obri-

    ga-a ao seguinte:

    a) no remunerar os cargos de sua diretoria ou conselho;

    b) no distribuir lucros, boniicaes ou vantagens a dirigentes, mantenedores ou associados, sob

    nenhuma orma ou pretexto;

    c) ao pleitear a certiicao, apresentar relatrios quantitativos e qualitativos das atividades desen-

    volvidas e das receitas e despesas dos ltimos trs anos;

    d) anualmente, apresentar um relatrio circunstanciado dos servios que houverem prestado co-

    letividade, assim designada, ao Ministrio da Justia (MJ);

    e) em caso de subveno por parte da Unio, publicar a demonstrao da Receita e despesas realiza-

    das no perodo anterior; e

    ) em caso de uso de incentivos iscais para doadores, ornecer a estes declarao de que aplica

    integralmente os recursos recebidos na realizao de seus objetivos sociais, no distribuindo lu-

    cros, boniicaes ou vantagens a dirigentes, mantenedores ou associados, sob nenhuma orma

    ou pretexto15.

    As organizaes podem ter suas declaraes cassadas por meio de processo instaurado para

    esse im, baseado em representao documentada do rgo do Ministrio Pblico ou de qualquer in-

    teressado da sede da organizao, ou pelo Ministrio da Justia, por sua iniciativa16.

    O processo de cassao poder ser instaurado no caso de as organizaes no cumprirem os

    itens a, b ou d anteriores se icar provado que no atendem mais aos requisitos (de ter persona-

    lidade jurdica, estar em eetivo uncionamento, servir desinteressadamente coletividade e no re-

    munerar a diretoria ou conselheiros) ou no caso de se negarem a prestar servio compreendido em

    seus ins estatutrios.

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    1.2.2. Registro no Conselho Nacional da Assistncia Social (CNAS)O registro no Conselho Nacional da Assistncia Social (CNAS)17 obriga uma organizao ao seguinte:

    a) possuir declarao de UPF;

    b) atuar em assistncia social, educao, sade, cultura18 ou deesa de direitos dos beneicirios da

    Lei Orgnica da Assistncia Social (Loas);

    c) no remunerar os cargos deliberativos, consultivos ou iscais;d) prever estatutariamente que:

    i. no distribui resultados, dividendos, boniicaes, participaes ou parcela do seu patrim-

    nio, sob nenhuma orma;

    ii. aplica seus recursos e eventual resultado operacional integralmente em territrio nacional, e

    na manuteno e no desenvolvimento de seus objetivos institucionais;

    iii. seus diretores, conselheiros, scios, instituidores, beneitores ou equivalentes no recebem

    vantagens ou benecios, direta ou indiretamente, em razo das competncias, unes ou

    atividades que lhes sejam atribudas; e

    iv. destinar o eventual patrimnio remanescente a entidade congnere registrada no CNAS ou aentidade pblica em caso de dissoluo ou extino;

    e) ao pleitear a certiicao, apresentar relatrios quantitativos e qualitativos das atividades desen-

    volvidas; e

    ) a qualquer tempo, apresentar inormaes e documentos solicitados pelo CNAS.

    Tais organizaes podero ter seu registro cancelado se inringirem qualquer disposio da Reso-

    luo que regulamenta o registro, se seu uncionamento tiver sorido soluo de continuidade ou se,

    por meio de processo administrativo, icar comprovada irregularidade na gesto administrativa.

    1.2.3. Certiicado de Entidade Beneicente de Assistncia Social (Cebas)Uma organizao que possui o Certiicado de Entidade Beneicente de Assistncia Social (Cebas) 19

    est obrigada ao seguinte:

    a) possuir declarao de UPF;

    b) possuir registro no CNAS;

    c) estar inscrita no Conselho de Assistncia Social do municpio, estado ou Distrito Federal da sede;

    d) comprovar atuao em assistncia social, educao, sade ou deesa de direitos dos beneici-

    rios da Loas;

    e) comprovar a no remunerao dos cargos deliberativos, consultivos ou iscais;

    ) prever estatutariamente que:

    i. aplica seus recursos e eventual resultado operacional integralmente em territrio nacional, e

    na manuteno e no desenvolvimento de seus objetivos institucionais;

    ii. seus diretores, conselheiros, scios, instituidores, beneitores ou equivalentes no recebem

    vantagens ou benecios, direta ou indiretamente, em razo das competncias, unes ou

    atividades que lhes sejam atribudas; e

    iii. destinar o eventual patrimnio remanescente a entidade congnere registrada no CNAS ou a

    entidade pblica em caso de dissoluo ou extino.

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    g) ao pleitear a certiicao, apresentar relatrios de atividades, balanos patrimoniais, demonstra-

    tivos do resultado e de mutao (movimentao) do patrimnio dos trs ltimos exerccios, devi-

    damente auditados, se aplicvel;

    h) a cada trs anos, renovar a certiicao;

    i) aixar placa indicativa, em local visvel, em que conste: Esta entidade tem Certiicado de Fins Fi-

    lantrpicos concedido pelo Conselho Nacional de Assistncia Social para prestar atendimento apessoas carentes; e

    j) aplicar as subvenes e doaes recebidas nas inalidades a que estejam vinculadas.

    Tais organizaes podero ter seu certiicado cancelado pelo CNAS a qualquer momento se verii-

    cado o descumprimento dos requisitos estabelecidos no decreto que dispe sobre a concesso do

    certiicado ou no disposto na resoluo que estabelece regras para a concesso do mesmo 20.

    1.2.4. Organizao da Sociedade Civil de Interesse Pblico (Oscip)Uma organizao qualiicada como Organizao da Sociedade Civil de Interesse Pblico (Oscip)21 est

    obrigada ao seguinte:

    a) atuar num dos objetivos previstos22 no artigo 3o da lei que instituiu o ttulo;

    b) no distribuir, entre seus scios ou associados, conselheiros, diretores, empregados ou doadores,

    eventuais excedentes operacionais, brutos ou lquidos, dividendos, boniicaes, participaes

    ou parcelas do seu patrimnio, que devem ser integralmente aplicados na consecuo do respec-

    tivo objeto social;

    c) prever estatutariamente que:

    i. observa os princpios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade

    e da eicincia;

    ii. adota prticas de gesto administrativa para coibir a obteno de benecios e vantagens pes-

    soais em decorrncia da participao em processos decisrios;

    iii. possui conselho iscal ou rgo equivalente, competente para opinar sobre relatrios de de-

    sempenho inanceiro e contbil e operaes patrimoniais realizadas, o qual dever emitir pa-

    receres para os organismos superiores da organizao;

    iv. remunera ou no os dirigentes que atuam eetivamente na gesto executiva da organizao;

    v. adota normas de prestao de contas que incluem princpios undamentais de contabilidade,

    Normas Brasileiras de Contabilidade, a publicidade de relatrios de atividades e demonstra-

    es inanceiras e a realizao de auditoria em caso de realizao de termo de parceria;

    vi. seu patrimnio lquido ser transerido a outra Oscip em caso de dissoluo; e

    vii. em caso de perda da certiicao, o respectivo acervo patrimonial disponvel, adquirido com

    recursos pblicos durante o perodo em que perdurou a qualiicao, ser transerido a outra

    Oscip;

    d) ao pleitear o registro, apresentar balano patrimonial e demonstrao do resultado do ltimo

    exerccio;

    e) no encerramento de cada exerccio iscal, dar publicidade, por qualquer meio eicaz, ao relatrio

    de atividades, s demonstraes inanceiras, s certides negativas de dbitos com o INSS e com

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    o Fundo de Garantia do Tempo de Servio (FGTS), colocando os documentos disposio para

    exame de qualquer cidado, mediante requerimento;

    ) anualmente, realizar prestao de contas instruda com:

    i. relatrio de execuo de atividades;

    ii. demonstrao de resultados do exerccio; e

    iii. certides negativas de dbito com o INSS e com o FGTS.g) em caso de uso de incentivos iscais para doadores, ornecer-lhes declarao de que aplica inte-

    gralmente os recursos recebidos na realizao de seus objetivos sociais, no distribuindo lucros,

    boniicaes ou vantagens a dirigentes, mantenedores ou associados, sob nenhuma orma ou

    pretexto23; e

    h) em caso de celebrao de termo de parceria:

    i. apresentar ao Poder Pblico, ao trmino de cada exerccio, relatrio sobre a execuo do objeto

    do termo de parceria, comparando as metas propostas com os resultados alcanados, acom-

    panhado de prestao de contas dos gastos e receitas eetivamente realizados; e

    ii. realizar auditoria independente caso o montante isolado ou agregado de recursos seja igual ou

    superior a R$ 600.000,00.

    Adicionalmente, em caso de celebrao de termo de parceria, obrigatria a consulta prvia aos

    conselhos de polticas pblicas correspondentes rea de atuao do objeto do termo de parceria (se

    houver), os quais acompanharo e iscalizaro a execuo do termo de parceria, em conjunto com o

    respectivo rgo do Poder Pblico com o qual o mesmo tiver sido celebrado. O termo de parceria deve

    prever os critrios objetivos de avaliao de desempenho a serem utilizados, mediante indicadores

    de resultado, e os resultados devem ser analisados por uma comisso de avaliao composta por

    dois membros do respectivo Poder Executivo, um da Oscip e um indicado pelo correspondente Conse-

    lho de Poltica Pblica, quando existente. Os responsveis pela iscalizao devem cientiicar o cor-

    respondente Tribunal de Contas e o Ministrio Pblico a respeito de qualquer irregularidade ou ilegali-

    dade no uso de recursos pblicos, sob pena de responsabilidade solidria.

    A qualiicao poder ser cancelada se a organizao deixar de preencher os requisitos legais,

    aps deciso proerida em processo administrativo, instaurado de ocio ou a pedido de qualquer cida-

    do (desde que amparado por evidncias de erro ou raude), na Secretaria Nacional de Justia do

    Ministrio da Justia, ou em processo judicial de iniciativa popular ou do Ministrio Pblico.

    1.2.5. Organizao Social (OS)Uma organizao qualiicada como Organizao Social (OS)24 est obrigada ao seguinte:

    a) atuar em ensino, pesquisa cientica, desenvolvimento tecnolgico, proteo e preservao do

    meio ambiente, cultura ou sade;

    b) dispor estatutariamente sobre:

    i. a natureza social de seus objetivos inerentes respectiva rea de atuao;

    ii. a inalidade no lucrativa, com obrigatoriedade de investimento de excedentes inanceiros no

    desenvolvimento das prprias atividades;

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    iii. a proibio de distribuio de bens ou de parcela do patrimnio lquido em qualquer hiptese;

    iv. a constituio de um conselho de administrao como rgo de deliberao superior e de uma

    diretoria como rgo de direo, estipulando-se a composio e as atribuies de ambos e a

    participao, no primeiro, de representantes do Poder Pblico e de membros da comunidade

    de notria capacidade proissional e idoneidade moral;

    v. a obrigatoriedade de publicao anual, no Dirio Oicial da Unio, dos relatrios inanceiros edo relatrio de execuo do contrato de gesto;

    vi. o direito de o dirigente mximo participar das reunies do conselho de administrao, ainda

    que sem direito a voto;

    vii. a orma de aceitao de novos associados, no caso de associao; e

    viii. a incorporao integral do patrimnio, dos legados ou das doaes que lhe oram destinados,

    bem como dos excedentes inanceiros decorrentes de suas atividades, ao patrimnio de outra

    OS ou ao patrimnio da Unio, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municpios, na proporo

    dos recursos e bens por estes alocados, em caso de extino ou desqualiicao;

    c) no remunerar os membros de seu conselho de administrao por tal atribuio;

    d) em caso de celebrao de contrato de gesto, apresentar ao Poder Pblico, ao trmino do exer-

    ccio ou a qualquer momento, relatrio pertinente execuo, comparando as metas propostas

    com os resultados alcanados, acompanhado da prestao de contas correspondente ao exerc-

    cio inanceiro.

    A elaborao do contrato de gesto deve observar os princpios da legalidade, impessoalidade,

    moralidade, publicidade, economicidade e eicincia. O contrato deve prever expressamente os cri-

    trios objetivos de avaliao de desempenho a serem utilizados, mediante indicadores de qualida-

    de e produtividade, e seus resultados devem ser analisados periodicamente por comisso de ava-liao indicada pela autoridade supervisora, composta por especialistas de notria capacidade e

    adequada qualiicao. O responsvel pela iscalizao do contrato de gesto o rgo supervisor

    da rea de atuao.

    As organizaes podero ser desqualiicadas pelo Poder Executivo quando se constatar o des-

    cumprimento das disposies contidas no contrato de gesto, o que importar reverso dos bens

    destinados a elas sob o regime de permisso de uso e dos valores entregues para uso da Organiza-

    o Social. A desqualiicao ser precedida de processo administrativo, respondendo os dirigentes

    da Organizao Social, individual e solidariamente, pelos danos ou prejuzos decorrentes de sua

    ao ou omisso.

    2. ANLISE CRTICA

    Com base na exposio eita na seo anterior, possvel identiicar alguns dos aspectos mais com-

    plexos da regulao brasileira para a accountability das organizaes da sociedade civil, especial-

    mente no que se reere, entre outros aspectos, a governana, transparncia, participao de dieren-

    tes pblicos, avaliao de desempenho, prestao de contas e acesso a recursos pblicos.

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    2.1. desequilbrio entre Estao e emais pblicos

    A partir do exame anterior, nota-se acilmente que h um desequilbrio entre os poderes nas mos do

    Estado e os poderes dos demais pblicos interessados para demandar accountability das organiza-

    es. H diversas normas que preveem os deveres das organizaes para com o Estado, mas poucas

    abordam sua accountability em relao a outros pblicos. No entanto, se interesse pblico aqueleque concerne sociedade, ento as relaes de accountability tambm devem operar nesse mbito.

    Ocorre que as relaes de accountability das organizaes da sociedade civil com outros pblicos

    que no o Estado (tais como beneicirios, doadores, equipe, conselheiros ou colaboradores) tm,

    salvo raras excees, previses meramente genricas, reletidas nos poderes disponveis socieda-

    de como um todo.

    Entre tais poderes, as obrigaes de transparncia nas inormaes so o principal mecanismo

    para exigir accountability das organizaes. Cabe lembrar, porm, que h uma grande dierena entre

    o direito de adquirir, mediante pagamento de uma taxa, a cpia de um documento num cartrio (pre-

    sumindo-se que j se saiba em qual) ou, ainda, de acompanhar regularmente o Dirio Oicial, e o deexaminar um documento colocado disposio pela prpria organizao.

    Nesse sentido, cabe explorar tambm a ampliao do acesso dos cidados a inormaes j deti-

    das pelo Poder Pblico ou seus parceiros privados a respeito de organizaes da sociedade civil e/ou

    repasse de recursos pblicos, em cumprimento ao princpio da publicidade determinado pela Consti-

    tuio Federal25.

    Alm disso, h grande discrepncia entre os poderes do Estado e os dos demais atores no que se

    reere legitimidade para requerer medidas punitivas: apenas rgos da Administrao Pblica po-

    dem requerer a desqualiicao de organizaes registradas no CNAS, que possuem o Cebas ou que

    so qualiicadas como OS. Felizmente, no caso das organizaes de UPF e das Oscips, h previso deque qualquer cidado pode tomar a iniciativa de reportar irregularidades e pleitear a perda da certii-

    cao. O mesmo ocorre com a possibilidade de requerer a dissoluo de undaes. No tocante

    possibilidade de punio de dirigentes por malversao de recursos pblicos, porm, os procedimen-

    tos s podem ser iniciados por rgos da Administrao Pblica.

    Neste ponto, vale reletir sobre a possibilidade de interpretao extensiva das normas reerentes

    aos atos de improbidade administrativa. As sanes previstas em relao a atos de improbidade ad-

    ministrativa aplicam-se tambm aos atos praticados por agente pblico contra o patrimnio de orga-

    nizao que receba subveno, benecio ou incentivo, iscal ou creditcio, de rgo pblico. Alm

    disso, equipara-se a agente pblico aquele que induza ou concorra para a prtica do ato de improbida-de ou dele se beneicie sob qualquer orma, direta ou indireta26.

    Cabe lembrar que constituem atos de improbidade administrativa no s os que causem enri-

    quecimento ilcito ou gerem prejuzo ao errio, mas tambm os que atentem contra os princpios da

    Administrao Pblica, inclusive negar publicidade a atos oiciais ou deixar de prestar contas quan-

    do obrigado a az-lo. Vale salientar que qualquer pessoa pode iniciar o correspondente procedi-

    mento administrativo para que seja instaurada investigao destinada a apurar a prtica de ato de

    improbidade.

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    Em virtude de seu escopo, os contratos apresentam maior complexidade de procedimentos do

    que os convnios; requentemente ocorre, porm, o uso inadequado do convnio para contratar rela-

    es em que o Estado e a organizao da sociedade civil tm interesses distintos e no comuns

    presumivelmente para evitar tal complexidade, mas potencialmente erindo, por consequncia, o

    princpio da isonomia.

    Alm disso, h casos em que as regras de governana das organizaes no so suicientes paraassegurar a prevalncia do interesse pblico. Dois exemplos bastante evidentes tratam da destina-

    o do patrimnio em caso de dissoluo da organizao: (i) nas associaes, permitido restituir

    aos associados contribuies que tenham eito ao patrimnio, desde que o estatuto assim disponha

    ou os associados deliberem-no assim, os associados e respectivos sucessores podem reaver quo-

    tas ou raes ideais do patrimnio social para o qual hajam aportado; (ii) situao semelhante ocor-

    re com as undaes, cujo estatuto pode dispor que o patrimnio no ser incorporado ao de outra

    undao, podendo ser restitudo aos instituidores29. Tal risco praticamente no ocorre em relao s

    organizaes certiicadas: com exceo da declarao de UPF, as demais certiicaes exigem que o

    patrimnio remanescente, em caso de dissoluo, seja transerido a uma organizao similar.Por im, a inconstncia das obrigaes tambm pde ser observada em recente vaivm na legis-

    lao brasileira: a Medida Provisria n. 446, promulgada em 7 de novembro de 2008 e em vigor at 10

    de evereiro de 2009, gerou alteraes nos processos de concesso e renovao do Cebas e no bene-

    cio iscal das contribuies para a Seguridade Social30.

    Alguns de seus dispositivos tinham o condo de dar maior eicincia aos procedimentos adminis-

    trativos: a medida tornava automtico o exerccio da iseno leia-se imunidade a partir da conces-

    so do Cebas (sem depender de pedido adicional da organizao), permitindo que a Secretaria da

    Receita Federal autuasse organizaes que descumprissem os requisitos de concesso, com pode-

    res de suspender o benecio a partir da data da inrao apurada (sem depender de cassao me-

    diante representao perante o CNAS). Em outros aspectos, porm, a norma se mostrava contrapro-

    ducente e inconstitucional: previa requisitos adicionais para a concesso do Cebas e exigia a ciso de

    organizaes com mais de uma rea de atuao e receita superior a R$ 2.400.000,00.

    Adicionalmente, a medida deeriu todos os recursos pendentes mais de 7 mil de renovao do

    certiicado, de modo que o poder pblico deixou de veriicar se tais organizaes ainda cumpriam ou

    no os requisitos de sua concesso. Consequentemente, h razovel dvida com relao a quais or-

    ganizaes atualmente de ato azem jus ou no aos benecios decorrentes de sua certiicao in-

    certeza esta que poder ser apenas parcialmente remediada quando chegar o prximo momento de

    renovao dos correspondentes certiicados, pois at o momento no se prev soluo para o pero-

    do em que organizaes permanecerem indevidamente certiicadas.

    2.3. A icil composio e atuao e accountability

    importante lembrar que a prtica saudvel e slida da accountability implica o investimento de

    uma quantidade considervel de tempo e outros recursos para seu aprimoramento, e que os resul-

    tados so alcanados a longo prazo. Alm disso, as organizaes requentemente tm diversas

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    relaes de accountability, s vezes at concorrentes (por exemplo, se envolvem desempenhos

    ou prticas incompatveis entre si), correndo assim o risco de priorizar um conjunto de pblicos

    em detrimento dos demais.

    Desse modo, um dos desaios enrentados na regulao para a accountability a preservao da

    autonomia das organizaes. Apesar de compartilharem com o Estado a inalidade pblica de suas

    aes, tais organizaes se distinguem do Estado precisamente por serem de natureza privada, ope-rando, portanto, de maneira bastante distinta (e possivelmente mais gil). Esse atributo deve ser

    valorizado e no prejudicado pela regulao. Por outro lado, justamente a liberdade conerida

    pelo carter privado das organizaes que causa temor: se no h controle sobre uma atuao de in-

    teresse pblico, como pode haver responsabilizao?

    Cumpre, assim, equilibrar a preservao da autonomia das organizaes com as necessidades de

    responsabilizao decorrentes do carter pblico de sua atuao. Para tanto, preciso conciliar a

    prtica da accountability com a atuao da organizao, por meio dos valores que promove, de modo

    que o investimento eetivo de cada organizao seja proporcional s suas condies (isto , dar o

    passo do tamanho da perna) e evolua juntamente com a prpria organizao. Cabe inclusive contem-

    plar a possibilidade de oerecer capacitao em gesto e accountability para organizaes em condi-

    es mais precrias.

    2.4. Como valorizar a iversiae?

    Uma das caractersticas mais conhecidas das organizaes da sociedade civil o ato de ormarem

    um conjunto extremamente heterogneo. Se, por um lado, isso representa uma enorme vantagem,

    pois permite a maniestao de dierentes abordagens e grupos de atores, por outro, corresponde

    a um signiicativo desaio: como construir um marco regulatrio coerente que d conta de tama-

    nha abrangncia?

    Nesse aspecto, cabe rever as orientaes sugeridas por Bresser Pereira e Cunill Grau31 para o apri-

    moramento do aparato regulatrio, entre as quais vale destacar as seguintes: (a) adotar critrios

    procedimentais para a aplicao de recursos pblicos; e (b) estabelecer critrios pblicos para ava-

    liao de desempenho, contemplando no s eiccia e eicincia, mas tambm a satisao de valo-

    res pblicos. Essas orientaes ajudam a construir um marco regulatrio que zele pelo interesse p-

    blico sem comprometer a diversidade do universo de organizaes da sociedade civil, pois enatizam

    os processos e os resultados sem discriminar os atores envolvidos.

    3. PROPOSTAS dE APERFEIOAMENTO

    Algumas possibilidades de aprimoramento da regulao das organizaes da sociedade civil no

    tocante sua accountability podem ser traadas nas propostas a seguir. Estas propostas so ela-

    boradas como orientaes gerais a serem observadas e acompanhadas de potenciais medidas

    para concretiz-las:

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    a) de maneira geral, deve-se ampliar as oportunidades dos cidados de demandaraccountability

    das organizaes:

    i. esta proposta pode se traduzir, de modo mais especico, na extenso dos artigos 4o, VII, b,

    e 17 da Lei n. 9.790/99 a todas as undaes, organizaes certiicadas e aquelas que aces-

    sam recursos pblicos em outras palavras, trata-se de ampliar a aplicao do princpio da

    publicidade de modo que as undaes, organizaes certiicadas e aquelas que acessam re-cursos pblicos (e no apenas as Oscips) coloquem disposio seus documentos oficiais

    para exame por qualquer cidado e que o acesso a todas as inormaes pertinentes a tais

    organizaes torne-se eetivamente pblico;

    ii. da mesma maneira, esta proposta pode se traduzir na extenso dos artigos 7o e 8o da Lei n.

    9.790/99, do artigo 4o, caput e pargrao nico, do Decreto n. 3.100/99 e do artigo 4 o, caput

    e 1o e 2o, da Portaria MJ n. 361/99 a todas as organizaes certiicadas na prtica, isso

    corresponde a assegurar que qualquer cidado seja parte legtima para requerer a perda da

    certificao de organizaes certiicadas (no apenas de undaes, UPFs e Oscips), desde

    que amparado por evidncias de erro ou raude;iii. uma terceira orma de realizar esta proposta consiste em exigir apublicidade dos dados deti-

    dos pelo Poder Pblico e seus parceiros privados a respeito das organizaes da sociedade

    civil, inclusive com relao ao repasse de recursos pblicos a elas, ou seja, trata-se de deman-

    dar o cumprimento, desde a atuao do Estado, do princpio da publicidade estabelecido no

    artigo 37 da Constituio; e

    iv. alm disso, a concretizao desta proposta pode ocorrer pela interpretao das normas ree-

    rentes a atos de improbidade administrativa de maneira extensiva a todas as organizaes

    que direta ou indiretamente acessam recursos pblicos do que j decorre o direito de qual-

    quer cidado requerer uma investigao de improbidade.b) de modo geral, deve-se ampliar a obrigao das undaes e organizaes certiicadas de compro-

    vadamente assegurarem a prevalncia do interesse pblico em sua atuao:

    i. esta proposta pode corresponder, em termos concretos, extenso das normas aplicveis s

    Oscips no que se reere adoo deprticas de gesto administrativa, necessrias e suicien-

    tes a coibir a obteno, de orma individual ou coletiva, de benecios ou vantagens pessoais,

    em decorrncia da participao no respectivo processo decisrio (Lei n. 9.790/99, art. 4o, II);

    ii. outra maneira de realizar tal proposta anterior consiste em assegurar a participao de die-

    rentes pblicos na tomada de decises e na avaliao da organizao uma inspirao pos-

    svel encontra-se na composio das comisses de avaliao dos termos de parceria, com-

    postas por dois membros do Poder Executivo, um da Oscip e um indicado pelo correspondente

    Conselho de Poltica Pblica, quando existente (Lei n. 9.790/99, art. 10, 2o, III); outra inspi-

    rao encontra-se na Lei n. 9.637/98, artigos 2o, I, d, e 3o, I, a a e, e III, que estabelecem a

    participao, no rgo colegiado de deliberao superior, de membros natos representantes

    do Poder Pblico e de entidades da sociedade civil deinidos no estatuto (os quais devem, em

    conjunto, compor mais de 50% dos membros do Conselho), bem como de pessoas de notria

    capacidade proissional e idoneidade moral, entre outros;

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    iii. uma terceira maneira de concretizar tal proposta pode se traduzir na ampliao da observn-

    cia aos princpios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade e da

    eicincia, prevendo essa obrigao para as undaes e organizaes certiicadas, tal como

    j ocorre para a qualiicao como Oscip e para a elaborao do contrato de gesto das OSs

    note-se que tal medida tambm pode evitar o risco apontado na seo anterior a respeito da

    destinao do patrimnio das associaes e undaes; eiv. a realizao desta proposta tambm pode corresponder a exigir que as relaes contratuais

    entre o Estado e as organizaes da sociedade civil preservem o princpio da isonomia, de

    modo a prevenir o uso imprprio e abusivo dos convnios em lugar dos contratos ou dos ter-

    mos de parceria.

    c) de modo geral, deve-se ampliar a prtica da avaliao do desempenho das organizaes;

    i. esta proposta pode corresponder aplicao, nas demais modalidades de acesso a recursos

    pblicos, do disposto no artigo 10, 2o, III, da Lei n. 9.790/99 (que estabelece que o termo de par-

    ceria prever expressamente os critrios objetivos de avaliao de desempenho a serem utiliza-

    dos, mediante indicadores de resultado) ou do disposto no artigo 10, 7o

    , I, da Lei n. 9.637/98(segundo o qual o contrato de gesto prever expressamente critrios objetivos de avaliao de

    desempenho a serem utilizados, mediante indicadores de qualidade e produtividade).

    d) como princpio, deve-se adequar a legislao de maneira a equilibrar a autonomia das organiza-

    es da sociedade civil com as necessidades de responsabilizao pela sua atuao pblica, e

    valorizar a diversidade do universo de organizaes da sociedade civil, sem prejudicar sua res-

    ponsabilizao:

    i. uma das possibilidades para alcanar este objetivo consiste em explorar o desenho de normas

    que oquem processos e resultados, sem discriminar os atores envolvidos;

    ii. outro caminho sugerido consiste em contemplar a possibilidade de aprimoramento da prticade accountability pelas organizaes conorme a evoluo de suas condies; e

    iii. esta proposta tambm pode corresponder, em termos concretos, oerta de oportunidades de

    capacitao em gesto e accountability para organizaes de menor porte e experincia.

    e) inalmente, os deveres das organizaes e os poderes dos dierentes pblicos devem constar de

    normas claras e especicas, para que sua aplicao no ique sujeita a interpretaes que variam

    conorme a convenincia do agente.

    As presentes propostas devem ser objeto de mobilizao e articulao de organizaes da socie-

    dade civil com membros do Poder Legislativo e outros pblicos, de modo a assegurar que a legislao

    resultante seja ruto de interlocuo e dilogo, abrangendo dierentes perspectivas e tendo aplicao

    actvel.

    Esse processo naturalmente exige que o aprimoramento da regulao seja gradual, passando por

    negociaes e relexes conjuntas entre dierentes atores, de modo que caber priorizar as propostas

    ao longo do tempo. Nesse sentido, os princpios gerais propostos correspondem a metas de longo

    prazo, mas sua eetivao pode ocorrer por partes, em horizontes mais curtos, por meio das medidas

    concretas sugeridas. Alm disso, algumas medidas podem antes ser objeto de autorregulao do se-

    tor, preparando o caminho para uma alterao legislativa mais madura. O quadro adiante sugere o

    horizonte de tempo em que tais propostas de apereioamento podem ser alcanadas:

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    PRAZO

    PROPOSTA CURTO MDIO LONGO

    a) ampliar os poderes dos cidados: autorregulao reorma legal

    i. disponibilidade de documentos para examepor qualquer cidado

    autorregulao reorma legal

    ii. legitimidade de qualquer cidado pararequerer a perda da certiicao

    reorma legal

    iii. publicidade dos dados pblicos reorma legal

    iv. improbidade administrativa extensiva reorma legal

    b) assegurar a prevalncia do interessepblico:

    autorregulao reorma legal

    i. prticas de gesto para coibir vantagenspessoais

    autorregulao reorma legal

    ii. participao de dierentes pblicos natomada de decises e na avaliao

    autorregulao reorma legal

    iii. observao dos princpios da legalidade,impessoalidade, moralidade, publicidade,economicidade e da eicincia

    autorregulao reorma legal

    iv. preservao da isonomia nas relaescontratuais reorma legal

    c) ampliar a prtica da avaliao dodesempenho:

    autorregulao reorma legal

    i. uso de indicadores de resultado /indicadores de qualidade e produtividade

    autorregulao reorma legal

    d) preservar a autonomia e valorizara diversidade:

    autorregulao reorma legal

    i. normas ocadas em processos e resultados reorma legal

    ii. evoluo da prtica de accountabilityconorme as condies das organizaes

    autorregulao reorma legal

    iii. capacitao em gesto e accountabilitypara organizaes de menor porte eexperincia

    reorma legal

    e) adotar normas claras e especicas autorregulao reorma legal

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    Notas do captulo

    * Captulo elaborado pela consultora Elisa Rodrigues Alves Larroud, advogada, docente da Escola de Administrao de Empresas de SoPaulo da FGV/SP e da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), e doutoranda em Cincia Poltica da Faculdade de Filosoia,Letras e Cincias Humanas (USP).

    1 C. Cdigo Civil, Lei n. 10.406/02, arts. 45 e 46.

    2 C. Instruo Normativa RFB n. 748/07, art. 10, caput.

    3 C. Lei n. 8.212/91, art. 49.4 C. Instruo Normativa SRF n. 127/98, art. 2o.

    5 C. Portaria MTE n. 205/06, art. 2o, I e II, Consolidao das Leis do Trabalho (CLT) e Decreto-Lei n. 5.452/43, art. 2 o, caput e 1o.

    6 C. Decreto n. 3.048/99, art. 225, IV.

    7 C. Lei n. 8.212/91, arts. 32, III, e 33, caput e 1o.

    8 C. Cdigo Civil, Lei n. 10.406/02, arts. 54, II, III, V e VII, e 59, I e II.

    9 Note-se que a dissoluo compulsria s poder ocorrer mediante deciso judicial transitada em julgado, c. Constituio Federal, art.5o, XVII, XVIII e XIX.

    10 C. Cdigo Civil, Lei n. 10.406/02, art. 61, caput e 1o.

    11 C. Cdigo Civil, Lei n. 10.406/02, art. 66.

    12 Note-se que os ministrios pblicos estaduais do Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Cear, Esprito Santo, Maranho, Minas Gerais, MatoGrosso, Mato Grosso do Sul, Par, Paraba, Pernambuco, Piau, Paran, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Roraima, Rio Grande do Sul,

    Santa Catarina, So Paulo e Tocantins adotaram, mediante convnio com a Fundao Instituto de Pesquisas Econmicas (Fipe), oSistema de Cadastro e Prestao de Contas (Sicap). Trata-se de um instrumento de coleta de dados e inormaes com procedimentosuniormes para a prestao de contas.

    13 C. Cdigo Civil, Lei n. 10.406/02, arts. 67, I, 68 e 69.

    14 C. Lei n. 91/35, regulamentada pelo Decreto n. 50.517/61.

    15 C. Lei n. 9.249/95, art. 13, 2o, III, caput e alneas a a c, e Regulamento do Imposto de Renda, Decreto n. 3.000/99, art. 365, II, b.

    16 C. Lei n. 91/35, art. 5o, e n. 50.517/61, art. 7o.

    17 C. Lei n. 8.742/93 (Lei Orgnica da Assistncia Social Loas) e Resolues CNAS n. 31/99, n. 191/05 e n. 36/09.

    18 Vale notar que cultura a nica categoria de atuao que no consta do rol de atuaes reconhecidas para a certiicao seguinte(Ceas), que exige prvio cadastro no CNAS.

    19 C. Lei n. 8.742/93 (Loas), Decretos n. 2.536/98, n. 3.504/00, n. 4.327/02 e n. 4.381/02 e Resolues CNAS n. 177/00, n. 2/02 e n.107/02.

    20 C. Decreto n. 2.536/98, art. 7o, caput, e Resoluo CNAS n. 177/00, art. 6o.

    21 C. Lei n. 9.790/99, regulamentada pelo Decreto n. 3.100/99 e pela Portaria MJ n. 361/99.

    22 Lei n. 9.790/99, art. 3o: [...] I promoo da assistncia social; II promoo da cultura, deesa e conservao do patrimnio histricoe artstico; III promoo gratuita da educao, [...]; IV promoo gratuita da sade, [...]; V promoo da segurana alimentar enutricional; VI deesa, preservao e conservao do meio ambiente e promoo do desenvolvimento sustentvel; VII promoodo voluntariado; VIII promoo do desenvolvimento econmico e social e combate pobreza; IX experimentao, no lucrativa,de novos modelos socioprodutivos e de sistemas alternativos de produo, comrcio, emprego e crdito; X promoo de direitosestabelecidos, construo de novos direitos e assessoria jurdica gratuita de interesse suplementar; XI promoo da tica, da paz,da cidadania, dos direitos humanos, da democracia e de outros valores universais; XII estudos e pesquisas, desenvolvimento de tec-nologias alternativas, produo e divulgao de inormaes e conhecimentos tcnicos e cienticos que digam respeito s atividadesmencionadas neste artigo.

    23 C. Lei n. 9.249/95, art. 13, 2o, III, caput e alneas a e b, e Medida Provisria n. 2.158-35/01, art. 59.

    24 C. Lei n. 9.637/98.

    25 C. Constituio Federal, art. 37, caput.26 C. Lei n. 8.429/92, art. 1o, nico, e art. 3o.

    27 C. Instruo Normativa STN n. 01/97.

    28 C. Lei n. 8.666/93.

    29 C. Cdigo Civil, Lei n. 10.406/02, arts. 61, caput e 1o, e 69.

    30 Consideraes adicionais sobre tal situao encontram-se nos captulos seguintes desta publicao.

    31 BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos; CUNILL GRAU, Nuria (Orgs.). O pblico no estatal na reforma do Estado. 1. ed. Rio de Janeiro: EditoraFundao Getlio Vargas, 1999.

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    C A P T U L O I I

    Liberdade de organizao e funcionamento*

    O presente captulo tem como escopo apresentar o panorama legal do Brasil no tocante s organiza-

    es da sociedade civil, especiicamente no que diz respeito liberdade de organizao dessas enti-

    dades e seu uncionamento.

    1. PANORAMA REgULATRIO ATUAL

    A Constituio Federal de 1988, que estabeleceu no Brasil um eetivo Estado Democrtico de Direito,prev, em seu artigo 5o, os direitos individuais e coletivos de todo cidado brasileiro. Estabelece, es-

    peciicamente no inciso XVII, a plena liberdade de associao para ins lcitos 1. Ainda na deesa da

    ampla liberdade individual, o texto constitucional, nos incisos XVIII a XXI2, estipula a liberdade de ges-

    to das associaes, o poder de representar seus associados e a liberdade de associar-se e de perma-

    necer ou no associado a uma determinada organizao.

    A Constituio Federal brasileira, que tem por pressuposto a democracia, garante a todos a plena

    liberdade de associar-se, ou seja, garante a todo cidado o direito de escolher seus associados para

    o cumprimento de uma determinada inalidade, sem intererncia do Estado. Desse modo, dentro do

    tema proposto, qual seja, a liberdade de organizao e uncionamento das organizaes da socieda-de civil, essa garantia consagrada constitucionalmente no artigo 5o da nossa Carta Magna represen-

    ta um verdadeiro porto seguro, que pode ser deendido por todos no seu sentido mais amplo.

    importante, para a deesa desse direito individual garantido a todos, estabelecer a sua amplitu-

    de. Conorme ensina Manoel Gonalves Ferreira Filho3, a liberdade de associao compreende no

    apenas o direito do homem de associar-se, como tambm o de aderir a uma organizao j existente.

    Mas, sobretudo, o direito liberdade de associao representa o direito de existncia da associao,

    que, nos dizeres do ilustre jurista, signiica verdadeiramente um direito vida da associao.

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    Assim, tendo como premissa o direito inviolvel liberdade de associao, o Cdigo Civil brasileiro

    estabelece duas ormas associativas para as organizaes da sociedade civil: as associaes e as

    fundaes4. As associaes tm como pressuposto de validade as pessoas, ou melhor, os associa-

    dos, que se organizam para ins no econmicos5. J as undaes tm como pressuposto o patrim-

    nio, que corresponde a uma universalidade de bens com personalidade jurdica.

    o nosso Cdigo Civil que estipula as condies mnimas para a constituio de associaes eundaes, e prev, associado Lei de Registros Pblicos, os requisitos necessrios ao registro des-

    sas pessoas jurdicas no Cartrio de Registro Civil das Pessoas Jurdicas6.

    Nesse sentido, o Cdigo Civil estabelece, entre outros aspectos relevantes, a assembleia geral dos

    associados como rgo soberano das associaes e a limitao das inalidades sociais, no caso das

    undaes, a ins religiosos, culturais, morais ou de assistncia7.

    Alm da legislao civil, de extrema importncia para a questo da liberdade de organizao e

    uncionamento, imprescindvel discorrer sobre a legislao que dispe sobre os ttulos e qualiica-

    es das organizaes da sociedade civil.

    Conorme j delineado no captulo precedente deste trabalho, no Brasil, as organizaes da socie-

    dade civil podem ser reconhecidas pelo Poder Pblico sob diversas ormas. A primeira e mais antiga

    titulao conerida a essas organizaes a declarao de Utilidade Pblica Federal (UPF) instituda

    pela Lei n. 91/35, cujo propsito inicial era apenas uma qualiicao honorica s sociedades civis,

    associaes e undaes constitudas no pas com o im exclusivo de servir desinteressadamente

    coletividade8. Atualmente, o pressuposto dessa titulao mudou drasticamente, sendo pr-requisito

    para benecios iscais das organizaes da sociedade civil o que, em princpio, diiculta sobrema-

    neira a atuao das entidades, como se observar na segunda seo deste captulo.

    Alm da declarao de Utilidade Pblica, que hoje tambm pode ser obtida no mbito estadual emunicipal, as organizaes da sociedade civil podem qualiicar-se como Organizaes da Sociedade

    Civil de Interesse Pblico (Oscip) nos termos da Lei n. 9.790/99. Por meio dessa qualiicao, o Poder

    Pblico reconhece como de interesse pblico as associaes e undaes que realizam as atividades

    previstas no artigo 3o da Lei9. A Lei das Oscips inovou o marco legal do terceiro setor no Brasil, uma vez

    que reconhece as organizaes qualiicadas como verdadeiras parceiras do Estado, alm de trazer

    para o terceiro setor conceitos de governana corporativa e transparncia.

    Por im, importante mencionar o Certiicado de Entidade Beneicente de Assistncia Social (Ce-

    bas), conerido pelo Conselho Nacional de Assistncia Social s organizaes que atuam na rea de

    assistncia social stricto sensu, sade e educao. Esse ttulo, regulado pelo Decreto n. 2536/98,permite s organizaes serem reconhecidas pelo Estado como prestadoras de servios assisten-

    ciais que visam suprir os mnimos sociais garantidos aos cidados brasileiros. Assim, as entidades

    portadoras do Cebas so isentas, tal como entendido pelo Poder Pblico, das contribuies seguri-

    dade social o que tambm gera uma srie de diiculdades no uncionamento das organizaes,

    como ser demonstrado.

    justamente o Cebas o piv das grandes discusses jurdicas enrentadas recentemente pelas

    organizaes da sociedade civil. Com o advento da Medida Provisria (MP) n. 446/08, a insegurana

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    jurdica para essas entidades eleva-se a um patamar nunca visto. A aludida MP, editada em 7 de no-

    vembro de 2008, revogou expressamente o artigo 55 da Lei n. 8.212/91 e tacitamente o Decreto n.

    2.536/98, alm de criar uma nova orma de certiicao para as entidades beneicentes de assistn-

    cia social e regular os procedimentos de iseno de contribuies para a seguridade social. Dentre

    seus artigos mais polmicos, a MP expressamente permitiu a concesso e renovao de todos os

    certiicados cujos processos encontravam-se em trmite perante o Conselho Nacional de AssistnciaSocial e o Ministrio da Previdncia Social.

    A MP perdeu sua validade por alta de recepo pelo Congresso Nacional em 10 de evereiro do

    corrente ano. Desde ento, as entidades da sociedade civil que atuam na rea da assistncia social,

    sade e educao voltaram a ser reguladas pelo Decreto n. 2.536/98. No entanto, encontram-se em

    trmite no Congresso Nacional dois projetos de lei substitutivos MP que visam um novo modelo de

    certiicao para as entidades beneicentes de assistncia social.

    E, graas a essa situao, que ser mais bem explicitada a seguir, as organizaes portadoras do

    Cebas no sabem como agir, o Ministrio Pblico ederal enrijeceu sua atuao e o Executivo aguarda

    a deinio do Legislativo.

    2. ANLISE CRTICA

    No atual panorama legal do Brasil, h uma srie de entraves organizao e ao bom uncionamento

    das organizaes da sociedade civil. No entanto, o principal obstculo enrentado pelas organizaes,

    sem dvida, est na alta de clareza e na omisso da legislao em vigor. Em que pese a quantidade

    de normas vigentes no pas que regulam as atividades das organizaes da sociedade civil, dada a

    complexidade e sobreposio de normas, ainda h muitas dvidas em relao ao que aplicvel sorganizaes, sem risco de eventuais questionamentos, quer seja pelas autoridades iscais tribut-

    rias, quer seja pelo Ministrio Pblico estadual ou mesmo pelos rgos que iscalizam a concesso e

    renovao dos ttulos e qualiicaes que podem ser obtidos pelas organizaes.

    Desse modo, o papel do presente captulo identiicar esses entraves visando melhorar o enten-

    dimento do marco legal das organizaes da sociedade civil.

    O primeiro entrave pode ser notado no prprio Cdigo Civil, que restringe a constituio de unda-

    es aos ins religiosos, culturais, morais e de assistncia. Ainda que se deenda que tais inalida-

    des so amplas e abrangem qualquer atividade pretendida pelo instituidor de uma undao, essa

    premissa, aparentemente inconstitucional, diiculta a criao de novas undaes que podem sorercom uma eventual interpretao restritiva do Ministrio Pblico estadual no tocante ao artigo 62 do

    Cdigo Civil.

    De outro lado, no constitui obstculo por si s a necessidade de ormalizar a constituio legal

    de uma organizao por meio do registro de seu estatuto social em cartrio. Essa obrigao uma

    ormalidade necessria para a aquisio do direito vida das organizaes, bem como para o seu

    reconhecimento como ente responsvel, sujeito, portanto, de direitos e deveres tal como qualquer

    cidado que, para ser assim reconhecido, necessita ser registrado em seguida ao seu nascimento. O

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    que surge como entrave, muitas vezes, o alto custo do registro dos atos societrios para algumas

    entidades, principalmente aquelas organizaes localizadas ora dos grandes centros ou voltadas

    militncia ou deesa dos direitos humanos.

    Ainda sob o aspecto civil, apresenta-se como entrave ao uncionamento das organizaes o avan-

    o do velamento do Ministrio Pblico estadual, em alguns Estados da ederao, s associaes. Sob

    o argumento de que determinadas associaes apresentam objetivos de natureza social ou assisten-cial10, tais como sade, educao e cultura, deende o Ministrio Pblico o acompanhamento e a is-

    calizao dessas organizaes, undamentando sua intererncia nos artigos 127, caput, e 129, III11,

    ambos da Constituio Federal. A iscalizao de associaes j uma realidade, por exemplo, no

    Distrito Federal, onde no possvel constituir uma associao sem a prvia aprovao do represen-

    tante do Ministrio Pblico estadual, tal como ocorre na criao de undaes. A ingerncia do Minis-

    trio Pblico nas associaes deveria ser combatida por toda a sociedade, visto que ere a garantia

    constitucional da liberdade de associao.

    Analisando a questo sob a tica dos ttulos e qualiicaes, as organizaes da sociedade civil

    sorem restrio ao seu uncionamento apenas na medida em que, para serem portadoras das maisdiversas qualiicaes, devem apresentar uma srie de documentos aos mais dierentes rgos da

    Administrao Pblica, muitas vezes com exigncias burocrticas (como a apresentao do relatrio

    de atividades original, com todas as pginas rubricadas, e assinado pelo representante legal da insti-

    tuio no im). Alm da diiculdade presente na burocracia exigida pelo Poder Pblico, h tambm a

    diiculdade em relao ao prazo para a concesso desses ttulos.

    Um exemplo claro dessa diiculdade se veriica na proibio de remunerao dos dirigentes res-

    ponsveis pela administrao das entidades. Para o ttulo de Utilidade Pblica Federal, quando insti-

    tudo, at poderia azer sentido, visto seu carter honorico e sua viso assistencialista do terceiro

    setor do incio do sculo XX. No entanto, a proibio expressa na Lei n. 91/35 oi adotada pela legisla-o tributria, que, exceo das entidades qualiicadas como Oscips, apenas reconhece a imunida-

    de e iseno das organizaes que no remuneram seus dirigentes estatutrios. O mesmo ocorre

    com o Cebas, que concedido apenas s organizaes declaradas como de Utilidade Pblica Federal

    e, consequentemente, que no remuneram seus dirigentes.

    Alm da burocracia, o descumprimento dos prazos previstos na legislao para concesso e reno-

    vao dos ttulos e qualiicaes mais um componente para desestabilizar o uncionamento das

    organizaes, erindo certamente o princpio constitucional da segurana jurdica.

    Um exemplo, observado at o incio de 200912, eram os pedidos de renovao do Cebas no Conse-

    lho Nacional de Assistncia Social. Havia processos em trmite h mais de cinco anos, cujos docu-

    mentos comprobatrios oram elaborados e enviados s autoridades considerando a interpretao

    das normas adotadas poca. No entanto, tais pedidos, muitas vezes, so decididos anos mais tarde,

    sorendo indeerimentos que se undamentam em novos entendimentos e na mudana de interpreta-

    o das normas vigentes. Esse tipo de desdia do Poder Pblico gera, no mnimo, insegurana jurdica

    e o descrdito dos rgos pblicos.

    Como se no bastasse, as autoridades iscais brasileiras muitas vezes extrapolam o limite de sua

    competncia, instaurando um verdadeiro regime de terror nas organizaes ao analisar no apenas

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    os documentos necessrios veriicao de irregularidades tributrias, mas tambm relatrios ge-

    renciais ou documentos dos dirigentes estatutrios das entidades, sob o argumento de que essas

    organizaes so inanciadas pelo Poder Pblico por meio da renncia iscal.

    Ainda em relao aos entraves, importante citar tambm as diiculdades que as organizaes en-

    rentam no seu dia a dia, principalmente no tocante sua autossustentao. A sustentabilidade de uma

    organizao ocorre basicamente de duas ormas: com recursos prprios ou por meio de doaes.A entidade que se inancia com recursos prprios, regra geral, presta servios populao e cobra

    por esses servios. No entanto, atualmente, requente a abertura de inquritos civis para apurao

    de desvio de inalidade, iscalizaes para apurao do montante de tributos que deixou de ser reco-

    lhido aos cores pblicos pelo exerccio de atividade-meio e at abertura de inquritos policiais para

    apurao de crime contra a ordem tributria. Tal conduta ere o princpio da segurana jurdica, cons-

    titucionalmente previsto.

    A presso do Poder Pblico se d por diversos motivos. O primeiro e objeto deste captulo a so-

    breposio de normas existentes. A legislao tributria trata as organizaes da sociedade civil de

    maneira distinta da legislao civil, impondo restries ruio de benecios tributrios que extra-polam a competncia do ente tributante, como ocorre, por exemplo, na deinio de atividades pr-

    prias das organizaes da sociedade civil, base para a cobrana da Contribuio para o Financiamen-

    to da Seguridade Social (Coins). As autoridades iscais entendem como atividades prprias apenas

    aquelas que no tm carter contraprestacional, ou seja, receitas de doaes ou de contribuies de

    associados; todas as demais receitas so sujeitas tributao pela Coins. Ora, atividades prprias de

    uma organizao so todas aquelas previstas no seu estatuto social.

    As organizaes tambm podem se autossustentar com a criao de undos patrimoniais. No Brasil,

    ao contrrio de pases como os Estados Unidos, a legislao totalmente omissa em relao a esses

    undos. E mais: a existncia de undos patrimoniais muitas vezes interpretada como no aplicao dosrecursos da organizao na sua inalidade, o que caracteriza a perda de benecios iscais.

    Alm disso, importante mencionar tambm a relao do Poder Pblico com as organizaes,

    principalmente no tocante transerncia de recursos entre o Poder Pblico e as entidades. Essas

    transerncias podem ocorrer por meio de convnios, termos de parceria ou contratos de gesto.

    Sob o undamento de impedir desvios, muitas vezes a relao entre o Poder Pblico e as organiza-

    es da sociedade civil pautada por critrios e exigncias que so prprios das entidades pblicas,

    o que leva ingerncia do Estado, inclusive, nas questes internas das entidades. Por outro lado, no

    caso especico dos convnios, o que se v a alta de controle, gerando, em alguns casos, a utiliza-

    o dessa orma de parceria para ins que no so relacionados rea social.

    Hoje, o que se v um descrdito na parceria entre o Poder Pblico e a sociedade civil. Foi instau-

    rada a Comisso Parlamentar de Inqurito (CPI) das ONGs exatamente para apurar supostos desvios

    ocorridos nas transerncias de recursos entre o Poder Pblico e organizaes da sociedade civil.

    Atualmente, a CPI das ONGs, que teve seu prazo inal prorrogado para dezembro de 2009, ainda est

    em ase de coleta de inormaes, por meio da solicitao de inormaes Secretaria Nacional de

    Justia, coleta de depoimentos e, sobretudo, quebra de sigilo bancrio, telenico e iscal de diversas

    entidades investigadas.

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    Alm disso, em 2007 oi publicado o Decreto n. 6.671, que dispe sobre normas relativas ao repas-

    se de recursos da Unio mediante convnios e contratos de repasse, buscando nitidamente enrijecer

    o controle dessas transerncias inanceiras.

    Ainda, cumpre mencionar a questo do cadastro de ONGs, que, desde o incio de 2007, uma rea-

    lidade. Por meio da Portaria SNJ n. 23, de 28/12/2006, publicada no Dirio Oicial da Unio, edio de

    2/1/2007, criou-se o sistema eletrnico de prestao de contas. Por esse sistema, todas as entidadesdeclaradas como de Utilidade Pblica Federal ou qualiicadas como Oscip devem cadastrar-se no Ca-

    dastro Nacional de Entidades Qualiicadas no Ministrio da Justia (CNE) para que possam, anual-

    mente, prestar suas contas a esse rgo.

    O cadastro no deve ser visto como um impeditivo ao exerccio do direito constitucional livre

    associao, mas to-somente uma diiculdade burocrtica ao uncionamento das organizaes. Ao

    contrrio, ele pode ser utilizado como uma erramenta importante para a evoluo do terceiro setor

    no Brasil, contribuindo para uma sistematizao de inormaes potencialmente teis a diversas i-

    nalidades, inclusive estatsticas. Apenas, deve-se alertar que as exigncias do CNE precisam respei-

    tar a Constituio Federal e demais normas em vigor para que no se crie uma sobreposio ou umnovo conlito de normas que traga, a sim, prejuzos s organizaes.

    O cadastro est em vigor h dois anos e ainda no atingiu sua plena eicincia devido a alhas

    constantes no sistema que impedem as organizaes de inalizar suas prestaes de contas no pra-

    zo estipulado pelo Poder Pblico, o que gera insegurana por parte das organizaes portadoras do

    ttulo de Utilidade Pblica Federal e da qualiicao como Organizao da Sociedade Civil de Interesse

    Pblico. Apenas a ttulo de exemplo, o CNE/MJ mantm registradas 11.028 entidades portadoras do

    ttulo de Utilidade Pblica Federal. No entanto, at o ltimo dia 20 de abril apenas 1.294 organizaes

    haviam inalizado sua prestao de contas.

    Contudo, necessrio ressaltar que o mesmo entendimento no se aplica ao Projeto de Lei (PL)n. 3.877/04 (proposio originria do PL n. 7/03 e tendo apensos os PLs n. 2.312/03, 3.841/04 e

    3.892/04, entre outros), que, de maneira geral, prev a obrigatoriedade de inscrio de todas e

    quaisquer ONGs13 no Cadastro Nacional de Organizaes No Governamentais (CNO). Reerido PL,

    apesar de inicialmente tramitar em regime de prioridade, encontra-se parado na Cmara dos Depu-

    tados desde agosto de 2007, com seu encaminhamento para anlise da Comisso de Seguridade

    Social e Famlia CSSF e designao de relator. Sua ltima movimentao se deu em dezembro de

    2008, com a mera determinao procedimental de apensamento do PL n. 4.507/08. O reerido PL

    decorre de uma corrente normativa que procura enrijecer o controle sobre as ditas organizaes da

    sociedade civil e suas atividades e, sobretudo, sobre a relao dessas ltimas com o Estado.

    Segundo a proposta desse PL, o CNO seria administrado pelo Ministrio da Justia, a exemplo do que

    ocorre atualmente com o j mencionado CNE. Pelo PL, todas as ONGs deveriam apresentar anualmente,

    ao Ministrio da Justia, uma prestao de contas dos recursos recebidos, advindos de convnios ou

    subvenes de origem pblica ou privada, e de doaes, alm de prestar diversos tipos de inormaes,

    tais como ontes de recursos, inalidades, linhas de atuao, ormas de utilizao dos recursos, poltica

    de contratao de pessoal, qualiicao dos dirigentes e quaisquer outras inormaes que o Ministrio

    da Justia considerar relevantes para sua anlise e avaliao dos objetivos da entidade.

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    nalidade ou no dos PLs por serem projetos de lei ordinria a regular limitaes constitucionais ao

    poder de tributar, pois estabelecem normas para o reconhecimento da iseno leia-se imunidade

    das contribuies seguridade social das entidades beneicentes de assistncia social (artigo 195,

    7o da CF). Apenas para citar um exemplo de patente inconstitucionalidade, o PL n. 3021/08 prev,

    em seu artigo 32, a obrigao de ciso da entidade beneicente que atuar na rea da assistncia so-

    cial e da sade e/ou da educao concomitantemente, com a consequente criao de CNPJs distintospara as diversas reas de atuao da entidade.

    Enim, o maior entrave de nossa legislao atual justamente a alta de legislao. Faltam normas

    coerentes que garantam s organizaes o mnimo de segurana e certeza para sua atuao social,

    to relevante e necessria nossa sociedade.

    Por im, vale mencionar que a legislao brasileira tambm criou oportunidades signiicativas

    para as organizaes da sociedade civil nos ltimos anos. Um bom exemplo disso oi a promulgao

    da Lei das Oscips (que em 2009 completa dez anos de existncia), que qualiica como de interesse

    pblico determinadas aes realizadas pelas organizaes da sociedade civil. Sem violar o artigo 5 o

    da Constituio Federal, a lei introduziu princpios de governana corporativa que deveriam ser segui-

    dos por todas as entidades, como princpios de transparncia e a adoo de prticas de gesto admi-

    nistrativa, necessrios para coibir a obteno de vantagens pessoais, individuais ou coletivas, em

    decorrncia da participao no processo decisrio da entidade.

    Cabe tambm mencionar as Organizaes Sociais (OSs), titulao introduzida pela Lei Federal

    n. 9.637/98. A qualiicao como Organizao Social decorre do Programa Nacional de Publiciza-

    o, que criou um novo conceito de descentralizao administrativa. Por esse novo modelo de ges-

    to pblica, cabe ao Estado transerir para organizaes sociais, por meio de contratos de gesto,

    atividades pblicas executadas por entes estatais. Recentemente, as organizaes sociais ganha-ram uma nova dimenso, principalmente no Estado e Municpio de So Paulo, em que essas orga-

    nizaes tornaram-se verdadeiras parceiras do Poder Pblico, principalmente na rea da sade e

    da cultura. No entanto, mais uma vez cabe ressaltar a resistncia do Ministrio Pblico na imple-

    mentao dos contratos de gesto por meio de questionamentos judiciais o que muitas vezes

    diiculta essa parceria.

    3. PROPOSTAS dE APERFEIOAMENTO

    Para inalizar este captulo, e considerando aquilo j exposto, necessrio apresentar algumaspropostas concretas para a melhoria do panorama legal brasileiro. As sugestes esto divididas

    em grupos de propostas de curto, mdio e longo prazos, conorme exposto a seguir.

    a) propostas de curto prazo:

    i. criar um mecanismo legal para coibir os excessos praticados pelas autoridades iscais, geran-

    do meios de deesa para as organizaes e evitando, consequentemente, sua desestabiliza-

    o. Caso isso no seja possvel, devem ser criados, ao menos, meios de interlocuo com o

    Poder Pblico que visem coibir tais excessos;

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    ii. acompanhar a tramitao do PL n. 3.877/04 e de seus apensos com vistas ao arquivamento

    da proposio (tendo em vista que o Ministrio da Justia j criou o CNE) ou, pelo menos, a

    apresentao de um projeto substitutivo que respeite os princpios constitucionais da liberda-

    de de associao e da segurana jurdica;

    iii. acompanhar a CPI das ONGs, com o intuito de evidenciar que os atos que a ensejaram so

    exceo e no regra, ou seja, que a atitude isolada de algumas entidades do terceiro setor nopode, de maneira alguma, prejudicar a relao do Estado com a sociedade civil;

    iv. propor um debate relexivo visando rediscutir a relao entre Poder Pblico e organizaes da

    sociedade civil a im de reorar a ideia de que a sociedade civil parceira do Estado, transe-

    rindo o oco da alta de controle e da iscalizao mais acentuada das organizaes da socie-

    dade civil para uma viso construtiva da parceria entre Estado e sociedade;

    v. limitar a atuao do Ministrio Pblico ederal pela via da Ao Civil Pblica, mecanismo pro-

    cessual que visa deender e garantir os direitos diusos pertencentes a toda a sociedade, nos

    exatos termos da Lei n. 7.347/85, sendo expressamente vedada sua utilizao para preten-

    ses que envolvam tributos, contribuies previdencirias e ains14;vi. acompanhar projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional visando a modiicao e/

    ou supresso dos artigos que erem direitos constitucionais das organizaes da sociedade

    civil.

    b) propostas de mdio prazo:

    i. visando acilitar o registro pblico de associaes e undaes de uma maneira geral, criar

    mecanismos para reduzir o valor do registro dos atos societrios dessas entidades. O governo

    j havia adotado prtica semelhante ao estabelecer a emisso gratuita de Certido de Nasci-

    mento. Valendo-se da premissa de relevncia da atividade a ser exercida pelas organizaes

    da sociedade civil, pretende-se a reduo do valor cobrado pelos Cartrios de Registro Civil dasPessoas Jurdicas para o registro de associaes e undaes;

    ii. com undamento no artigo 5o, XVII e XVIII, da Constituio Federal, que assegura a liberdade

    de associar-se sem intererncia do Estado, preciso criar mecanismos jurdicos para impe-

    dir a atuao do Ministrio Pblico em relao s associaes. Ao contrrio do deendido pela

    instituio, os artigos 127 e 129, tambm da Carta Magna, em momento algum autorizam tal

    intererncia. Somente possvel a intererncia do Ministrio Pblico nas associaes se

    caracterizado o desvio de inalidade dessa organizao, passando a realizar atividade consi-

    derada ilcita;

    iii. conorme deendido na seo 2 deste captulo, a Lei das Oscips oi uma grande evoluo para

    o terceiro setor brasileiro, uma vez que trouxe para as organizaes a conscincia de atuar de

    maneira transparente e eiciente. Alm disso, trouxe para a realidade do setor princpios de

    governana corporativa e de prestao de contas. Assim, cumpre alterar a legislao civil de

    modo a constar, como ocorre na Lei das Sociedades Annimas, princpios de governana cor-

    porativa para associaes e undaes. importante esclarecer que o cumprimento desses

    princpios pelas organizaes da sociedade civil no pode erir o princpio constitucional da

    liberdade de associao; e

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    iv. rever as normas legais dos convnios, principalmente no tocante criao de mecanismos

    que tornem mais transparente e universal o processo de seleo e que evitem desvios. Em

    outras palavras, concentrar esoros de alterao legislativa para apereioar o mecanismo

    de seleo das organizaes que se qualiiquem para ter acesso aos convnios, bem como

    apereioar as normas de prestao de contas.

    c) propostas de longo prazo:i. um dos principais entraves presentes na legislao do terceiro setor no Brasil a alta de

    unidade existente na legislao em vigor. Assim, prope-se uma reviso de toda a legislao

    atualmente em vigor, visando adequao dos conceitos existentes para evitar questiona-

    mentos iscais, erros de registro, interpretao equivocada e subjetiva por parte dos rgos de

    certiicao que levam ao indeerimento de pedidos de ttulos e qualiicaes, como ocorre em

    rgos como o Ministrio da Justia, conselhos municipais de assistncia social e o Conselho

    Nacional de Assistncia Social;

    ii. a presente proposta visa acilitar os mecanismos de sustentabilidade econmica das organi-

    zaes da sociedade civil: necessrio estabelecer regras para a criao e manuteno deundos patrimoniais para as associaes, tendo em vista que o Cdigo Civil j prev a possi-

    bilidade do undo patrimonial para as undaes, dada a sua natureza jurdica. Essas regras

    devem ser acompanhadas de um regime tributrio adequado, visto que as autoridades iscais

    continuamente interpretam que o supervit no reaplicado nas inalidades das associaes

    caracteriza-se como desvio de inalidade. Alm disso, para incentivar a criao dos undos

    patrimoniais, a legislao do Imposto de Transmisso Causa Mortis e Doao (ITCMD) precisa

    ser alterada, criando-se um incentivo iscal transmisso de bens Causa Mortis a entidades

    sem ins lucrativos; e

    iii. no mesmo sentido, devem-se criar regras claras sobre a desonerao dos servios prestadospelas organizaes da sociedade civil. Trs regimes distintos poderiam ser institudos: deso-

    nerao total, parcial e tributao integral. Os regimes devem estar diretamente relacionados

    inalidade da organizao, ou seja, se o servio prestado aquele previsto como atividade-im

    no estatuto social da organizao (por exemplo, entidade educacional que mantm curso de

    ensino mdio), a atividade deve ser totalmente desonerada, como j prev o regime tributrio

    em vigor; se o servio prestado meio para a realizao da atividade-im e est diretamente

    relacionado a esta, o servio deve ser desonerado (por exemplo, a escola proissionalizante

    que mantm um ateli de costura ou uma padaria); e se o servio prestado para a gerao de

    renda dissociado da inalidade social da entidade deve ser tributado, com alguns benecioscomo reduo de base de clculo ou alquota, dada a relevncia da atividade-im realizada pela

    organizao (como exemplo, pode-se citar a entidade que descobriu em sua propriedade uma

    mina de gua mineral e comeou a comercializ-la).

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    Notas do captulo

    * Captulo elaborado pela consultora Flvia Regina de Souza Oliveira, coordenadora do Curso de Direito para o Terceiro Setor da FGV/SP eadvogada do escritrio Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados.

    1 Art. 5o Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentesno Pas a inviolabilidade do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos seguintes: [...] XVII plenaa liberdade de associao para ins lcitos, vedada a de carter paramilitar; [...].

    2 Art. 5o

    [...] XVIII a criao de associaes e, na orma da lei, a de cooperativas independe de autorizao, sendo vedada a interernciaestatal em seu uncionamento; XIX as associaes s podero ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensaspor deciso judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trnsito em julgado; XX ningum poder ser compelido a associar-se ou a perma-necer associado; XXI as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, tm legitimidade para representar seus i liados

    judicial ou extrajudicialmente; [...].

    3 FERREIRA FILHO, Manoel Gonalves. Comentrios Constituio Brasileira de 1988. 2. ed. rev. e amp. So Paulo: Saraiva, 1997, 42-43.

    4 Art. 44. So pessoas jurdicas de direito privado: I as associaes; II as sociedades; III as undaes; IV as organizaes reli-giosas [includo pela Lei n. 10.825, de 22/12/2003]; V os partidos polticos [includo pela Lei n. 10.825, de 22/12/2003]. 1 o Solivres a criao, a organizao, a estruturao interna e o uncionamento das organizaes religiosas, sendo vedado ao Poder Pbliconegar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessrios ao seu uncionamento [includo pela Lei n. 10.825, de22/12/2003]. 2o As disposies concernentes s associaes aplicam-se subsidiariamente s sociedades que so objeto do Livro IIda Parte Especial deste Cdigo [includo pela Lei n. 10.825, de 22/12/2003]. 3o Os partidos polticos sero organizados e uncionaroconorme o disposto em lei especica [includo pela Lei n. 10.825, de 22/12/2003].

    5 Art. 53. Constituem-se as associaes pela unio de pessoas que se organizem para fins no econmicos. Pargrao nico. No h,entre os associados, direitos e obrigaes recprocos. (destaques acrescidos.)

    6 Art. 45. Comea a existncia legal das p