16

Cartas de amor de Paris

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Aos 19 anos, Samantha Vérant conheceu o encantador Jean-Luc em uma curta viagem à França. Eles aproveitaram o clima romântico de Paris e, quando ela voltou para casa, ele escreveu sete lindas cartas de amor – que ela nunca respondeu. Vinte anos mais tarde, à beira de um divórcio e se perguntando em que ponto sua vida começou a dar errado, Samantha encontra as cartas de Jean-Luc. Ela então o procura na internet para enfim responder às cartas com um longo pedido de desculpas atrasado. Então rapidamente descobre que a conexão entre ambos continua tão forte quanto no dia em que ela o deixou sozinho em uma plataforma de trem em Paris.

Citation preview

Page 1: Cartas de amor de Paris
Page 2: Cartas de amor de Paris

Diretor editorial: Luis Matos

Editora-chefe: Marcia Batista

Assistentes editoriais: Aline Graça, Letícia Nakamura e Rodolfo Santana

Tradução: Monique D’Orazio

Preparação: Viviane Zeppelini

Revisão: Geisa Olivera e Mariane Genaro

Arte: Francine C. Silva e Valdinei Gomes

Capa: Rebecca Barboza

Seven letters from Paris: a memoir

Copyright © 2014 by Samantha Vérant

All Rights Reserved.

Published by Sourcebooks, Inc.

Copyright © 2015 by Universo dos Livros

Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1998.

Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer outros.

V853c Vérant, Samantha Cartas de amor de Paris / Samantha Vérant ; tradução de Monique D’Orazio. – São Paulo : Universo dos Livros, 2015. 288 p.

ISBN: 978-85-7930-836-9 Título original: Seven letters from Paris

1- Não-ficção 2-História de Amor 3-Paris/França 4-Romance I. Título II. D’Orazio, Monique

15-0235 CDD 920.7241

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)Angélica Ilacqua CRB-8/7057

Universo dos Livros Editora Ltda.

Rua do Bosque, 1589 – Bloco 2 – Conj. 603/606

CEP 01136-001 – Barra Funda – São Paulo/SP

Telefone/Fax: (11) 3392-3336

www.universodoslivros.com.br

e-mail: [email protected]

Siga-nos no Twitter: @univdoslivros

Page 3: Cartas de amor de Paris

Para Jean-Luc,mon Prince Charmant, que abriu meu coração e me ensinou que

o amor não é complexo como ciência de foguetes.

Page 4: Cartas de amor de Paris
Page 5: Cartas de amor de Paris

Esta é uma história real. Não há personagens ou cenas inven-tadas; no entanto, eu mudei o nome de alguns indivíduos sele-cionados para proteger sua identidade, bem como para prevenir a ameaça potencial de um ataque de coquetéis Molotov atirados para dentro da janela do meu quarto. As conversas não são literais, mas foram reconstruídas a partir da minha memória de elefante e com minhas melhores habilidades. Ainda bem que não vou ter um questionário sobre conjugações do francês neste livro. Algumas sequências de eventos foram compactadas ou omitidas na totali-dade, pois diminuíam o ritmo, não davam fôlego para a presente história ou foram classificadas como ID. (Sim, mesmo num livro de memórias existe algo como informação demais.) Assim, em vez de entrar para o Livro dos Recordes como o livro de memórias mais longo jamais escrito, vou me ater aos detalhes pertinentes e aos fatos que me conduziram numa aventura amorosa de um ano — ainda em andamento. E convido você, caro leitor, a se juntar a mim.

Nota da autora

Page 6: Cartas de amor de Paris
Page 7: Cartas de amor de Paris

Pense nisso como um longo dia inteiro e uma longa noite intei-ra, brilhante e doce, e você quase vai ficar impressionado com sua sorte. Pois quantas pessoas existem e têm a memória de um longo dia inteiro e de uma longa noite inteira, brilhante e doce, para car-regar em seus corações até morrerem?

— Dorothy Parker, The Lovely Leave.

Page 8: Cartas de amor de Paris
Page 9: Cartas de amor de Paris

Eu não sabia como sobreviveria ao desastre.Como a vítima mais recente da demissão de uma empresa intei-

ra, eu era uma diretora de arte desempregada em Chicago, e novas oportunidades de emprego — freelance ou outras — eram difíceis de conseguir. O lobo mau da dívida do cartão de crédito tinha so-prado e bufado e soprado para longe qualquer tipo de liberdade financeira. A raiva e o ressentimento tinham feito sua parte no que havia começado como um casamento feliz. Durante oito anos, eu dividi o quarto de hóspedes com meu cachorro, Ike. Não era de se admirar que meu marido, Chris, e eu não tivéssemos filhos, a não ser um “filho substituto”, peludo.

Meu aniversário de 40 anos estava logo ali, e eu não sabia que direção tomar quando todas as estradas pareciam levar direto para o fundo do poço. Então, na noite de 6 de maio de 2009, encon-trei-me com a única pessoa que eu esperava poder me empurrar para o caminho certo, ou, pelo menos, tirar-me do meu estado de pânico.

Tracey me ouviu reclamar, resmungar e gemer por uma boa meia hora. Então seus lábios se curvaram num sorriso felino. Ela pegou

1

Sete cartas

Page 10: Cartas de amor de Paris

10

a garrafa de Pinot Noir de cima do bar e encheu nossas taças até a borda. Antes que o vinho tinto derramasse por todo lado, peguei meu copo, olhando para ela com desconfiança. Não tinha penas amarelas presas nos lábios de Tracey; no entanto, como depois de ser sua melhor amiga por mais de 25 anos, eu sabia que ela estava aprontando alguma — sempre tramando, aquela Tracey.

— Desembucha, Frajola.— 1989. Vinte anos atrás. Paris.E foi assim que a melodia de nossa conversa deprimente mudou

de uma canção intitulada “Stormy Nights”1 para “Happy Days”,2 e que nos deleitamos com nosso passado, revivendo cada momento glo-rioso, numa louca farra pela estrada da memória. Parecíamos muito com as duas mulheres de meia-idade daquele lendário comercial dos anos 1980, um em que elas ficam se lembrando da viagem que fizeram a Paris com uma xícara de café. Uma mulher diz: “Eu amava aquele garçom”, e as duas riam e suspiravam. “Jean-Luc.”

Porém, nossa aventura parisiense de 1989 não poderia ser com-parada a um simples comercial de café; tinha sido a escapada mais sonhadora que tínhamos experimentado em nossa vida, a nossa maior aventura. La vie en rose, Paris seduziu nossa alma. Não ape-nas ficamos enfeitiçadas pela arquitetura, cultura e arte parisienses de tirar o fôlego, como Tracey e eu encontramos romance nas ruas históricas. Só que o meu Jean-Luc não era um garçom; era um “cien-tista de foguetes” sexy, que falava um inglês quase perfeito, graças ao seu trabalho na indústria aeroespacial e em parcerias internacio-nais. E teríamos sido totalmente relapsas se Patrick (o amigo dele, bonito do mesmo jeito) não tivesse desempenhado um papel im-portante naquela conversa animada.

Ainda sou grata por Tracey e eu não termos nos apaixonado pelo mesmo cara.

Uma faísca acendeu os olhos castanho-escuros de Tracey, que ergueu uma sobrancelha. Ela se inclinou para a frente e sussurrou:

— Você ainda tem as cartas do Jean-Luc?Ela sabia muito bem que eu tinha.

1 Noites de tormenta. 2 Dias felizes.

Page 11: Cartas de amor de Paris

11

— Estão guardadas em algum lugar lá em casa. Por quê?— Porque vamos criar um blog chamado As cartas de amor mais

bonitas do mundo. As pessoas vão mandar as cartas delas para nós, e nós vamos rejeitar ou aceitá-las, comparando-as com as de Jean-Luc. As cartas dele vão ser o parâmetro.

Como uma distração para minha vida desastrosa, a ideia desper-tou meu interesse.

Terminamos nossa garrafa de vinho e discutimos possibilidades para o blog. Concordei em pensar seriamente a respeito, mas não estava convencida por completo do entusiasmo de Tracey. Publicar as cartas de amor de Jean-Luc em um fórum público e compará-las a outras iria desmerecê-las. Eu não mantinha contato com o cara havia vinte anos. E se ele se deparasse por acaso com nosso “blog do amor” e reconhecesse suas palavras? Não seria pelo menos um tiquinho humilhante? Eu, sem dúvida, não ia querer me humilhar. O que eu precisava fazer era encontrar aquelas cartas, dar uma boa lida nelas e depois tomar uma decisão.

Já passava da meia-noite, e eu já estava sem assunto. Talvez tivesse sido o jeito com que eu estava batendo as unhas na taça de vinho que fez Tracey enfim captar a dica.

— Precisa de uma carona para casa? — perguntou ela.— Não, a caminhada vai me fazer bem.— Você decide…— É sério, estou bem.— Pense sobre o blog, Sam. — Tracey deixou seu copo no bal-

cão, me deu um grande abraço e depois foi sacudindo os ombros para fora do restaurante, cantando: “O blog do amor é um velho lugarzinho em que a gente pode blogar juntas. Blog do amor, baby. Blog do amor, beibiiiiiiiiiii”.

Deixo por conta da minha melhor amiga corromper uma músi-ca do B-52s com o único propósito de me fazer rir. Andando meio esquisito, saí do restaurante e corri duas quadras até em casa, pen-sando em desenterrar as cartas de Jean-Luc como minha priori-dade numero uno.

Page 12: Cartas de amor de Paris

12

Eu era uma mulher em uma missão. Quase me matei puxando a primeira caixa de plástico para fora do armário de tralhas. Ela caiu no chão com um baque retumbante, errando minha cabeça por pouco. Felizmente, meu marido estava fora da cidade a negócios; portanto, o barulho não incomodaria ninguém, a não ser os viz-inhos do andar de baixo e meu cachorro. Ike, curioso sobre a co-moção toda, entrou de fininho no corredor, sua respiração era como uma nuvem esverdeada pairando sobre meu ombro. Não importa-va. Acariciando as orelhas aveludadas de Ike com uma das mãos, levantei a tampa da caixa com a outra. Álbuns de fotos. Fotos de modelo da minha infância. Memórias aleatórias do meu passado.

Seis caixas depois, eu ainda estava de mãos vazias e prestes a desistir, quando contei as caixas espalhadas pelo chão. Sete. O número exato de cartas que recebi de Jean-Luc.

Tinha de ser algum tipo de sinal.Porém, com certeza, eu estava me preparando para a decepção.À primeira vista, a última caixa não parecia promissora. Estava

cheia de arquivos, declarações fiscais e demonstrativos de pagamen-to antigos. Mas então prendi a respiração, tirei algumas pastas, e ale-luia, minha busca pela felicidade momentânea foi concluída sob a forma de uma pasta de plástico azul-piscina cheia de cartas antigas. Com dedos cuidadosos, puxei as cartas de Jean-Luc para fora e as inspecionei com atenção. Em estado impecável, pareciam ter sido escritas no dia anterior, apesar dos milhares de dias que tinham se passado. Todas as folhas eram de um lindo pergaminho creme, ador-nado com tinta preta. Comparada à minha letra, que parecia pegada de galinha, a caligrafia de Jean-Luc era poética, artística. Empilhei as cartas em ordem, me enrodilhei no sofá e li:

Page 13: Cartas de amor de Paris

13

Carta Um

paris, 28 de julho de 1989

Minha doce Samantha,

Realmente não sei como começar esta primeira carta. Não por não ter nada a dizer, mas porque tenho tantas coisas para colocar neste papel, que não con-sigo organizar meus pensamentos. Não tenho nen-hum dicionário aqui para escrever o inglês perfeito de Shakespeare, então, desculpe os erros que cometi e os que certamente vou cometer.

Por favor, não pense que é fácil para mim expres-sar meus sentimentos em uma carta, contudo, quando nosso coração bate por alguém, acredito que é mel-hor não esconder. Talvez você pense que é muito cedo para declarar meus sentimentos. Talvez a maioria das pessoas pense que é, contudo não me importa como os outros vivem, porque estou fazendo o que preciso para me expressar para você. Nenhuma antes de você abriu meu coração em tão pouco tempo, contudo, com você, todas as minhas barreiras se estilhaçaram em mil pedaços.

Sam, sei que vai ser difícil para nós mantermos um relacionamento forte, porém na minha vida eu apren-di que “onde há uma vontade, há um caminho”, e acredito nisso. Encontrei em você uma menina gentil com muitas qualidades que podem fazer um homem feliz. Gostei do seu jeito engraçado, do seu tipo de loucura, da sua paixão pela arte, mas principalmente

Page 14: Cartas de amor de Paris

14

eu amei a sua presença ao meu lado. Sinto falta da sua voz. Ela ainda canta em minha mente como um pássaro meigo cheio de felicidade. Você coloca milhares de sóis na minha mente… como uma fada. Por isso, obrigado pelo tempo que compartilhamos juntos, repleto de carinho e alegria.

Seria um desastre se colocássemos um fim nessa paixão entre nós. E sou um homem que não pode viver sem paixão. É a força do meu ser, o melhor que podemos fazer. Senti isso naquela noite no restaurante: uma con-exão silenciosa. Eu precisava falar com você ou ficaria decepcionado comigo mesmo se não soubesse o que poderia acontecer. Assim, por essa paixão, vou tentar o meu melhor para salvá-la. Sinceramente quero viver algo excepcional com você.

Quando seu trem partiu da estação, não perguntei onde você iria ficar em Nice. Fiquei louco, louco por você, é claro. Eu poderia ter ido até você no fim de se-mana. Minha cabeça estava nas nuvens e, hoje, o dia inteiro, fiquei muito irritado comigo mesmo por ter sido tão estúpido. Você me disse para ir junto, mas não pensei no fim de semana. Claro, Sam, eu teria feito isso por você.

Desejo de verdade que essa história seja incrível, român-tica (ééé!) e ao mesmo tempo erótica (hummm!). Eu queria te dar muitos prazeres para você me manter no fundo da sua mente, e estou um pouco frustrado por não ter feito isso. Ainda assim, você continua sendo minha linda meni-na; a menina de quem eu gosto muito. Temos muitas coisas em comum, tanto intelectual quanto fisicamente, e é difí-cil ser atraído pelas duas coisas numa mesma pessoa. Por isso, quando a gente acha essa mulher, não quer deixá-la ir embora. Eu queria muito estar com você, mesmo que seja complicado. Temos de avançar juntos, de mãos dadas, coração com coração, pele contra pele.

Page 15: Cartas de amor de Paris

15

Não posso terminar esta carta. É uma loucura. E eu sou louco também!

As palavras de Jean-Luc eram um afrodisíaco, um alimento para os famintos de amor. Lê-las era melhor do que comer chocolate compulsivamente, e consumi suas cartas com um apetite voraz, cada página era mais bonita, poética e romântica do que a anterior. Suas palavras eram requintadas, cheias de paixão e promessa. Por mais que ele tivesse escrito, eu sentia meu coração batendo a cada palavra. Eu definitivamente precisava de um impulso novo.

Eu admirava sua coragem. Nunca fui alguém de expressar meus sentimentos. Não como ele. E, Deus, naquele momento, o que eu teria feito para ter apenas um mínimo de paixão na minha vida. Mas ali estava eu, no sofá, me perguntando o que tinha aconte-cido, tentando entender em que momento tudo o que eu tinha sonhado um dia simplesmente tinha dado errado. Eu não tinha nada: apenas uma dívida e um casamento morto, culpa e medo. Onde estava tudo o que era meu? Segurei-me às cartas de Jean-Luc.

A ideia de Tracey usar essas cartas como uma espécie de barômetro do amor… bem, o conceito dela havia criado asas e voado janela afora. Eu me encontrei agarrada pelas mãos fortes da culpa e do arrependimento. Em 1989, Jean-Luc me escreveu sete lindas cartas numa tentativa de manter acesa a chama entre nós.

E nunca as respondi.Nem uma palavra.Pas un mot.

Page 16: Cartas de amor de Paris