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8/6/2019 Barry Haton_entrevista Jun 2011_os Portugueses http://slidepdf.com/reader/full/barry-hatonentrevista-jun-2011os-portugueses 1/8 entrevista BarryHatton 0 oodesenrascanço, macoisamagnÍfica queosgdosda *troilra não sabem Portugalêpaís odeixaandarobota-abako, odekaparaamanhão quepodesazerhoje, do desenrasca,osrêsefes. aomesmoempo Quinto Irnpério e *os cafres aEuropa" nodizerdePadreAntónioVieira. Os ortugues " sãoexcessivamente entimentais, omhorrorà disciplina, ndividualistas, alve semdar por isso,falhoseespíritoecontinuidadede enacidadea acção' a descriçãode 1938pertence Salazar. m2O11, omosomos? BarryHattonira-nos smedidaso iwoOsPortugueses. EntreüstaAnabelaotaRibeiroFotografiaedroCunha

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entrevista

BarryHatton0 oodesenrascanço,

macoisamagnÍficaqueosgdosda*troilra nãosabemPortugalêpaís odeixaandarobota-abako,odekaparaamanhão

quepodesazerhoje,do desenrasca,os rêsefes. ao mesmoempo QuintoIrnpérioe*oscafres a Europa"nodizerdePadreAntónioVieira.Os ortugues"sãoexcessivamenteentimentais,omhorrorà disciplina,ndividualistas,alvesemdarpor isso,falhoseespíritoecontinuidadede enacidadea acção'

a descriçãode 1938pertence Salazar. m2O11,omosomos?BarryHattonira-nos smedidaso iwoOsPortugueses.EntreüstaAnabelaotaRibeiroFotografiaedroCunha

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arry Hattoné inglês,licenciou-se no Verão de 1985no lCng'sCol lege , em Germânicas ,escreveu com LuísaBeltrão,sua sogra, a biografia deMariade Lourdes Pintasilgo.É

correspondentedaAssociatedPressem Lisboadesde 1997.Quando escreveu OsPortugueses,quisfazerum retratomoderno do paísonde vivehá 25 anos. Neleentram uma famíliaportuguesacom quem come carne de porco depois damatança, leituras de Eduardo Lourenço,Jorgede Sena,notas de um Moleskine.Escreveueminglês,para estrangeiros que lhe perguntam:"Diz-melá outra vezonde é que dissestequeera Portugal?" Não conhecem, nem podemcompreender um povo que inaugura umaportentosa obra de engenharia com umafeijoadapara 15mil pessoas. Falodiariamentecom analistas,que não sabem nada, mas falamsobrePortugalcomo se soubessem. Só sabem

os números, são pós-matemáticos."Os números não nos deixam ficar bem.Depoisde 15meses de espera, assinou com aSignal Books,de Oxford. Asair, em Portugal,pela Clubedo Autor,a edição portuguesa.

Vê-se ogo que não é português. Nunca dizmaldos portugueses.E vê-se ogoque conheceos portugueses:um portuguêspode dizer tudo

do vizinhodo lado, mas ai do estrangeiro quese atreva afazer o mesmo. É um estrangeiroquase português. SubscreveUnamuno quan-do este diz: "Quantomais lá vou,mais querolá voltar."

No capítulo referenteaoZê Povinhodescre-ve os portugueses como sendo simultanea-mente "amistosos e irascíveis, deferentese indómitos, apáticos e humildes, duros eousados, compassivos mas irados, submis-sos e belicosos, sempre à espera que a sortelhes sorria, boa companhia, conciliadores,diplomáticos, efusivos,espontâneos".O livroestá muito fundado em coisasque jáforam ditas pelos portugueses, pensadores,filósofos,entre os quaisoJoão Medina,que es-creveumuitosobreo ZéPovinho.OZê Poünhosintetizaessa personagem portuguesa, com to-dos essesadjectivos,a contradiçãoenorme.

É uma figura que tem cerca de 1OOanos, érústico e boçal. Sobretudo nesta fase pós-Europa e pós-revolução, queremos acreditarque evoluímos dela.O livrocomeça com os lusitanos.Quando seolhapara todos estesséculos,consegue-se eraqueles raços, aqueles veiosno mármore, ascoisasque estãono sangueportuguês JúlioCé

sar disse: É um povomuitoestranho,que nãose governanem sedeixagovernar."Hojeem diaum políticodiria a mesma coisa. Hámuita coisaque vem de trás. Duranteos Descobrimentosos portugueses agruparam-seàvolta do Estado- continua a ser assim. Adoramo Estado ("oEstadovai tomarcontade nós");e queixam-sede que o Estadopaga as suas contas "em parte,tarde ou nunca",comose dizia noperíodo dosDescobrimentos.É um traçoamor-ódio.

Isso é uma visão catastrofista, não do quesão os portugueses, mas do futuro dos por-tugueses. Se é assim há 600 anos, significaque não temos emenda.Falandode uma coisa actual,da crisee do res-gate financeiro:estas medidas são como umpenso rápido numa perna partida, como se dizem inglês.Se Portugal quer mudar mesmo, vaiter de mudar a sua maneira de viver. Vailevargerações,não vaimudar com um acordo como FMIe a zona euro.

Mudar a maneira de viver quer dizer imple-mentar reformas de fundo?Atéque ponto os portugueses querem mudar?Se querem ser ricoscomo os alemãese os suí-ços, os holandeses e os escandinavos, êm deentrar ao trabalho às oito da manhã trabalhar

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às seis, antar às sete e estar na cama àsve. Éessavida que os portugueses querem?hoque não. (Se quiserem, vou-me embora,u para outro país [riso].)Por outro lado,estaaçãoque cresceu com a União Europeia,quea,que tem contacto coma Internet, com osros paÍses, em outras comparações para fa-(comose viu com osprotestos da "geraçãoàca").Um dos factoresque contribuíram para5 de Abril foia interligação com ospovos daopa, os turistas, os portugueses emigran- Esse ipo de contactosmuda mentalidades.itodevagarinho, mas muda. Essa mudançaajudar a destapar os portugueses, que estãoito abafados pelas estruturas rígidas da so-dade. É um florescerque vem com o tempo,vai ser de um dia para o outro.

ropósitoda primeirapossibilidade,debalharmos comoum alemãoou um suí-ejantarmosàs setedatarde: mesmoqueséssemossso,a verdadeé que emos con-õesclimatéricas- que têm importância

pital - que inviabilizamo projecto ou o

nam muitodifícil.rna udo maisdificil, é verdade.Cadapaísmde ogaras suas artas.CadapaÍs em osus ontos ortese os seuspontos racos.Ostuguesesêm mensasqualidades, mbora

portuguesesãoachemmuitosso.ComoonistrodosNegócios strangeiros,uísAma-disseno ano passado: Sóoiço dizer mal

Portugalem Portugal."BoaventuraSousantos,num livrosobre a autoflagelaçãoostugueses,alade uma máconsciênciapor

usa a passividade,ue odos econhecemsnãoconseguemmudar.

isteuma autoflagelaçãoepensarmosemenquantopovo.Mas,a título indiüdual,ue existe é uma flagelaçãodo outro, edo próprio. Raramenteos portugueses

em: 'iA.culpa é minha e a responsabili-deé minha."nando essoa izque,numgrupode cincotugueses, culpadoé sempreo sexto.

mosmuito bonscríticos de nósmesmos.ade Queirósé o exemploacabadode co-é possível,e de forma contundente,ar-ar o portuguesinho.muitopoucaentrega emocrática.Joséilada "nãoinscrição",de aspessoas ãopar-

parem.Vou daro exemploda minhasogra.renteaoprédiodela,em Lisboa,a câmarahaconstruídoumedifÍcio novo;cincoanosoisaindaestavamá os andaimes.A minharaqueixou-se,adaaconteceu.Então ezabaixo-assinadoelo prédio;ninguémquisinar. inhamodosmedo.edo",palavra crucial. Nãopor acaso,vrodeJosé Gilem que se fala da o'não-crição"tem por tÍtulo Portugal,oMedoExistir.utracoisa uevemde rás.Aspessoas en-

mquea democracia só rvotarde doisemsanos nãoé nadadisso.O VillaverdeCa-l fezum estudonos anos1990e descobriusó rêspor cento dosportuguesesinham

umavezenviadouma cartaa um directorum ornalcom a suaopinião.Issoé outrasaqueestáa mudarcomos emaike coma

vageração.) s pessoas ão vêemsoluçãoavésda suaparticipaçãodemocrática.

Medode quê?Medode ser mal visto,defazer igurade par-vo.uma pessoaevantaavoz epensaquevaiser ridicularizada.Medode ser castigado. osolhosdosportugueses, poderestácáem ci-ma, elesestãocá em baixo. Opowerdistanceindexé enorme.Aspessoas ão pensamquetêmalguma nfluênciaem nada.O medovemde rás, da ditadura "émelhor icarcaladinho,estámalmasainda ode icarpior").Nosnqué-ritosde opiniãoosportugueses izemsemprequeamaiorpreocupaçãoeles er emprego.Mesmoquando ecebem saláriomínimo,me-nos de 5OO urospor mês.É a mentalidade:"Tenhopouco,maspelomenosenho sto." Éo medode entar r maisalém.Masao mesmotempo,e voltamosàs contradições,sportu-gueses ue foramnos anos1960paraFrançanem falavamrancês,nunca inhamsaídodopaís;eraprecisoumacoragem igante.Ospor-tugueses onseguem,mas nãoacreditamqueconseguem.

Temosuma baixaauto-estima.

Claro.Falomuitobem de Portugalno livro,achoqueé umpaísóptimo.Estoucâhâ25anos,já me oramoferecidos mpregos m Novaor-que,em Londres,m Bruxelas,sempre issequenão.Alémde nãoserumapessoa ue querentrarparao trabalhoàsoito da manhã,prefirouma vidamaisdescontraída.

No livro,dedica um capítulo a um textode Antero de Quental, que se refere a umperíodo muitoanterior. O diagnósticoquefazdo país poderia ser feitoem relaçãoaosnossosdias.Querresumiro conteúdodes-se exto?Eo Discursoo DeclíniodosPovosbéricos.An-tero foibuscaras aízesdoproblemamuito láatrás.Falada Inquisição,do poderda IgrejaCatólica.Do"conservadorismoreligiosonsta-ladopelaContra-Reforma,uesufocouopen-samento nventivo nospaíses atólicoscomoPortugal".Eleémuitomaiseloquentequeeu!,esse iscurso brilhante.

O centralismocatólicoacaboupor implicarum fechamentode portas. Houveuma de-bandada dejudeus, de espíritos nventivos,do que faziaa diferença.Foium grandepasso trás.ForamparaAntu-érpiae ornaram icososholandeses.inham

oknowhow,a sabedoria, dinheiro.Portugal,sópara icarbem na fotografiacom os reisca-tólicos, ezmala sipróprio.

A nívelpolítico,Antero falade uma centra-lidade"impostapor períodosde governoabsoluto,que encorajou a submissãoe a'resignação".IJmagrossaparte dos portu-gueses continua a viver da relação com oEstado,submissose resignados.Foium problemano fimdo séculoXIX:que-riamdespedirumadata de funcionáriospú-blicose não conseguiram,orquese ossemparao desemprego,ão haviaoutro emprego.Ondeé quepodiamserabsorvidos? ão enhonenhumaeceitamágica.spequenas médiasempresas, ue sãoaosmilharesem Portugal,[pertencema] pessoas omboas deias,quequeremcrescer, ue queremarriscar o queé umacoisa araemPortugal e quesevêemconfrontadosomobstáculosueo mpedem.Do Estado, o fisco,da Segurança ocial, as

leisquesãodecididas aAssembleiaaRepú-blica.Essemedovemdo caminhobloqueado.Vemdo Estadomonolítico,quase afkiano.Nãodá paraentrar, nãose encontraa porta.Seseencontrar,saise por outraportasem chegarondesequer.Éo processo 'O Castelo.

Antero aponta uma terceirarazão para odeclínio."Osistemaeconómicogerado pe-la era dos Descobrimentos,de intoxican-te abundância, afastou os portugueses dagestão financeira prudente e do trabalhohonesto."Percebemosomesmo]agora omos undosdaUniãoEuropeia,s aisquase Omil milhõesuevieramnosúltimos3Oanos,equemuitasvezesforam malgastos. oramparabridgeso nowhe-re,paÍaaquelasobraspúblicasqueservemamuitopoucagente. ntónioBarreto isse ue oium conviteao esbanjamento à corrupção.

Repetidamenteemosoportunidadesde re-fundar as coisas, azê-las,se não a partir dozeÍo,com óptimascondiçõesà partida.

Emborano princípioPortugal osseo bomalunodoJacques elors.Aceitouudo.Haviauma sede e mudança.Os ermoserammuitogenerosos ninguémsepodiaqueixar.

Vintee cinco anos depois, não temos nemdinheironem reformasprofundasfeitas.Nemum povomuitomais nstruído.

Epassámos e bom alunoa pioraluno. Istoé uma coisaque nos humilha,na sua opi-nião?Não,demonstra uea UniãoEuropeia umpro-jectoque enta ratarumconjuntodepaíses omhistóriasculturasmuitodiferentesomose os-seum sópaís.Éprecisoer em contaque êmhistóriasiferentesmaneiras evivere azerascoisas iferentes. eviaavermaispaciênciaoma culturadecadapaís-membro.ortugalãovaireagrr scondiçõesaUniãoEuropeiaamesmamaneiraqueosalemães, s ranceses. spaísesdo Nortesãomuitodiferentese tentam mporuma maneiradeserquenãoéportuguesa.

Apesarde ser uma corrida entre atletasque têm característicasdesiguais,a ver- *

55OsportuguesesadoramoEstadoequeixam-sede queoEstadopagaassuascontas*emparte,tardeoununcd"comoseünanopeúododosDescobrimentos.Éumtraçoamor-ôdio

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e é que repetidamente não chegamos aoda competição, ou chegamos em último.issoperguntava se sto não é uma coisacolectivamente nos humilha.

a se osse mportante para os portuguesesgar em primeiro lugar. Se não é uma cor-em que estão muito empenhados, achonão.

introdução do seu livro, conta que quan-

explicou à sua filha, que é portuguesa,nese deste projecto, ela pediu que nãoretratasse como uns saloios. Há um mí-o de vergonha pelo que somos e pela fi-

a que fazemos, mesmo que não seja umasa na qual nos empenhamos muito.ora não conhecem Portugal, não conhe-

m os portugueses. Falo quase diariamen-om analistassobre coisas económicas enceiras, e nenhum deles fala português,hum delesconheceo povoportuguês.Umadeias que tive comeste ivro foiexplicar-

s como são. Essa coisa de nos retrataremmo saloiosé o que se vê nos filmes.A per-agem portuguesa é sempre o labrego, oigudo, com bigode.

Zê Povinho.ealidadeé muito diferente, embora com asacterísticasque sempre houve. A imagem

out of date.

ntudo, quando lá fora ouvem falar denos últimos anos,é quase sempre pelases razões..Mas dou o exemplo do Euro 2OO4:o-os estádios estavam prontos a tempo. Odiode Wembley,em Londres, estavadoiss atrasado. Quem é o inútil que não sabe

struir um edifício?sabia disso.esse é outro problema dos portugueses:pouca noção do "lá fora". O escândaloas despesas os deputados do Parlamentoês (estavam a pôr como despesas a cons-ão de uma casinha e de um jardim) foi vergonha enorme. Se ivesse acontecido

Portugal, os portugueses tinham dito queera a república das bananas, que isto erarceiro Mundo. Oproblema é que notíciasasnão chegamaos portugueses. Leio mui-ornais ingleses, e os casos de corrupção,

má gestãoe falta de empenho nos serviçoslicossão casosde todos os dias.

Portugal, as palavras acusatórias sãoetudo para os polÍticos e para a grandeaça. Se se for chico-esperto, se se con-uir contornar o sistema, pelo contrário,

olhado com bonomia.hápouco tempo, o homem que fugiaaosostos era o grande herói!Aquele que con-iadar a volta ao Estado, e evitavapagar 5Os em impostos,era o campeão. Andar notede velocidadenas estradas ou conseguircionar sem pagar são pequenas vitóriasia-a-dia.

da disso é uma grande aventura. Co-naquele verso de O'Neil: "Em Portugalentura termina na pastelaria." Parecetudo tem uma escala de bairro.abam por fugir do país para fazer umaa maior.

É frequenteno estrangeiro,de repente, queos portugueses sejam motivode orgulho,engrandeçam.n Portugalque os apouca?Sim.E muitosufocante rigidezda sociedade,o pessimismo.Maspoderesultar,e vê-se uequandovãopara oraresulta.Osportuguesessão rabalhadoresmuitobem vistos,desdeosanos196O,m França.Asmultinacionaisueestãoem Portugaladoramos rabalhadoresportugueses. sportuguesesonseguem,êmde passar acreditarqueconseguem.É forçosofalar da qualidadedas elites,dosque organizam,dos que apontam directri-zes. Tambémnão temosa organizaçãoquenos permite trabalhar com osoutros, fazerum trabalhoprodutivo.Aselites êm medode perderaquelacoisaaque estãoagarradas.Deixaralguém subirécorrero perigode perdera suacoisinha.Emrelaçãoà organizaçáo, comoa históriadosforcados:êm sucesso orqueseunemà voltade umobjectivo.Masnãoé uma característicaportuguesa, associativismo.or ssoé queocarsharing,paravirparaa cidade,nuncavaifuncionarem Portugal.

Relatao episódiode um ogo de futebolen-tre portuguesese ingleses;estes,que erammenoscapacitadosà partida, acabaramporvencerapenasporquese uniram.Osportuguesesêm mais alento,masnão oaproveitamunindo-se,organizando-se,araatingirum objectivoconjunto.Nesseogo,nós,os ngleses,ramos mbocadinhomais elhos,não estávamosm muitoboascondiçõesÍsi-cas,masconseguimosencer.Osportugueseseramjogadoresmagníficos,ram odosdotipoCristianoRonaldoriso].

Consegueperceber araiz desta dificuldadeque temos em ser organizadose em traba-lharmosuns com os outros?É aincl. Écadaum por si.

Não umpor todos,mas cadaum por si?Sim.Não seia resposta essa ergunta,voupensando, epoisdigo.Os usitanosutavammuitoem conjunto,antoquantosei.NosDes-cobrimentos,motivaçãoraa riqueza.Um ca-pitãorancês, operíododosDescobrimentos,descreveu sportuguesesomo sendomuitoambiciosos.uando epensa ue oramüstosdessamaneira,pareceestranho.

Aambiçãoé mal vistaem Portugal.Umapessoa ue entachegaralém éporqueseachamelhorqueos outros.

E é melhornivelarpor baixo.Há umasériede expressões om umacargapejorativaparaosquesobemsocialmente.Alpinistasocial"é um bom exemplo.Aspessoas entem-seameaçadas orque outras conseguemo queelasou não conseguemou nãose propõemconseguir.Ouporque sentem que são ame-açadasquando outras chegam á.Aspessoas abem ualé oproblemae Portugal,osportuguesesabemmuito melhordoqueeuquaissãoos problemasde Portugal.Sabemoque era precisofazer;masnão fazem.É maisumavezaquela rase:Aculpaé dele!"

Dequalquermodo,e voltandoàs contradi-ções,são nexcedíveisquandotêm um ad-

55Aosolhosdosportugueses, poderestâcáemcimaelesest:iocáembaixo.Aspessoasnãopensamquetêmalgumainfluênciaemnada.Omedovemdetrás,daditadura

)9versário,um líder,um objectivo.Na Expo-98,veioumaplacade vidrogiganteparao Oceanário,oJapão.Quandoa puse-ram,faltavamdoiscentímetros. oio arquitec-to americanoqueestava frentedooceanárioqueme contou:afinaleramos aponeses uesetinhamenganado nãoosportugueses.

Nenhumportuguêsacreditarianessahistó-ria.Os aponesesnão se enganam.Euma faltade autoconfiança,e crençanaspossibilidadese Portugal.

Apropósito da Expo,há uma históriaquetalvez nosdeflna enquanto povo: fazer ainauguraçãode uma obra de engenhariabrutal,como é a PonteVascoda Gama,comuma feijoada.Para15milpessoasriso].

Essa argalhadaé elucidativa.Fazera felioa-da só ocorreriaa um português,não é?Claro.É castiço,óptimo.Osportuguesesabemmuitobem azero conúüo. Devezemquando,com os meuscunhados,vou vero BenficaaoEstádiodaLuz;a melhorparte paramimsãoaquelas uashorasantesdo ogo,a comercou-ratos,bifanasea beber mperiais.Todaagentebem-disposta,oda agentea falar.

Seestivésse-mos em Inglaterra,estava chover,estávamosapagarmensodinheiroporumpinÍ,a comidaera umaporcaria.Chegaa um pontoem queumapessoaem de escolhero queé quequer:ser maispobremas eliz,ou ricoe nfeliz.

Depoisdo jogo do Benfica,vai para a suavidae trabalhapara uma empresaestrangei-ra. Ogrossodos portugueses rabalha paraempresasportuguesas,com produtividadereduzida. Oproblema é que não consegui-mos um equilíbrioentre os couratose o la-do castiço,a produtividadee o mínimoderiqueza.É verdade"Umapessoa ê comoaspessoas i-vemno nterior...Éabissal difeiençaentreolitoralou ascidades o nterior.Osportuguesessabemque a produtividadeé um problema,mas ninguémse esforçamuitoparamudar.Algunsesforçam-se,êm sucesso, omoaJerónimoMartins.Ogrossodas empresas,@

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55especialmentes do Estado, ivemde fazerosuficienteparasobreviver.Entãonão se po-demqueixar.

O desafiodas Descobertas,AristidesSousaMendesna SegundaGuerra,a mobilizaçãopró-Timornos anosmaisrecentes.É espan-toso,quandodo nada emos estaserupçõesespontâneas, usadiae brilhantismo.Porqueé que istonão nos dá mais vezes?Faltasolidez, onsistênciaa acção.Vai udodar ao mesmo ítio,ao medo.ÀdesconfianÇa,à faltade apetiteparacorrerriscos.

Salazar, umacarta enviadaà Coca-Cola,m196O:O senhorarrisca-sea introduziremPortugalaquiloque detestoacimade tudo,o modernismoe a famosa ficiency."Disseque Portugalera um sítiopacato,quequeria quefrcasse ssim,que inha medodoprogresso, uenão queriaqueos camiões aCoca-Cola udassemritmode vida dospor-tugueses.Uma coisaaindamais nteressanteé quea minhamulher,queé portuguesa,m-

presária de algum sucessoe com uma menta-lidade "muito lá fora", tenha dito: "perceboSalazar. O que estava adizer tem aver com osvalores, com a maneira como queremos vi-ver." Osportugueses não querem vivercomoos americanos, gostam da maneira de viverem Portugal. Queixam-semuito, mas gostam.Se os portugueses não gostassem da vida emPortugal,já tinham mudado. Gostam de ir al-moçar durante uma hora e meia, duas horas,à sexta-feira.

À sexta?Todos os dias são sexta-feiraem Portugal.Osportugueses chegamtarde ao trabalho e depoisflcamlá mais tempo a falar... Nofim do mês,queixam-se que recebem pouco e que lá foraé melhor.

Não são grandes adeptos da mudança. Te-mem-na.É aquela coisa de agarrar uma bóia de salva-ção, "pelo menos tenho isto, pode não sermuito...".

Salazar foi a grande mossa no Portugal doséc. XX?Se não fossem os 48 anos de ditadu-ra, seríamos hoje um país substancialmentediferente? As raízes são muito anteriores eisso apenas veio tornar ainda mais funda anossa depressão?Apassividadeá lá estava.Umditador comoSa-lazar não teria sobrevivido, como sobreviveupoliticamente,por tanto tempo, sem um povoque aceitava sso.Houvequem lutassecontra, ese se perguntasse haviamuitagente que gostavade ter mudado.Maspara um mandãoter sucessoé precisopessoas ue aceitemser mandadas.Aagressividadee o medo de levantar avoz foramcalcados.

Quais são as grandes fracturas à nossa iden-tidade, os grandes acontecimentos que mar-caram traços no nosso modo de ser? O se-bastianismo é determinante?Os Descobrimentos, sem dúvida. Osebastia-nismo,também. Aparte interessantedo sebas-tianismonão é aquela de que as pessoas alam- de que o rei vaivoltar das brumas para nossalvar.O interessanteé que isso não exiç nadados portugueses!Ogajovem ou não vem, issoé com ele. Ficoaqui à espera, no sofá, a beber'Jolas"e a ver televisão,na boa.

Está a falar de passividade.Quando estava afazer a reportagem dos 25Oanos do Terramoto de Lisboa e andava pelaMouraria e Alfama, perguntava às pessoas narua se não tinham medo de que houvesseoutroterramoto; diziam: "Pode ser, mas o futuro aDeus pertence." Osperitos em emergênciasedesastres naturais ficavamdoidos com isso.Sendo assim,as pessoasnão se previnem con-tra o desastre. O dia de amanhã a Deus per-tence, é verdade, mas a minha casaé um bemque me pertence; issonão quer dizerque nãopossa azer nada na minha casa.Há um outro exemploque vai no mesmo sen-tido, o de os portugueses serem os que maisapostam nos ogos de sorte. É uma demissão,em certo sentido, daquilo que cada ndivíduopode fazerpelo seu destino.Tudo o que é bom vaicair-medo céu, vaicair-me no colo,ficoà espera. E as pessoaspensamque a mudança começa no outro.

DouoexemplodoEuro2OO4:odos os estádiosestavamprontosatempo.0estádiode\Membley,emLondres,estavadoisanosatrasado.Queméoinútilquenãosabeconstruirumedificio?

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mo deslocar essecentro de decisão dotropara sipróprio?estecontacto com as culturas á fora,sim-smente.O ntercâmbiocom o estrangeiro

muito forte, diário. Épor aíquePortugalvaiudar, mas vai ser muitogradual.Secalharnguémdá por issono dia-a-dia,mas numaração ai ser diferente.

diferente?Énormal dizermos dosovensrtugueses que são alheados da política,enãotêm culturageral, quesão mprepa-dos. Todavia, cada vez maispessoas êm

m nívelde escolaridade superior ao dosuspais, e uma abertura ao mundo comaalaqueles nunca sonharam.rtugalnunca eve antos icenciadosna suatória,mas continua a haver abandono es-lar.Osmeus ilhosandaram odosna escolablica;ontam-meistórias e alunosquenãoerem rabalhar, nãoqueremestudare quepoispensam ue êm direito a coisas.

o êm deveres e têm direitos.

ma coisaque vem depois do 25 de Abril741.odaagente alados direitos,ninguémanos seusdeveres.Odeverde serbom cida-o,de serbom trabalhador, e serbompai,m estudante.

asosportuguesesêm uma óptimaideiadepróprios.Achamque são bons cidadãos,nspaise bons trabalhadores.m, a culpa é dos outros, o outro êque azl.

ndemosa olharpara nós, ndividuale co-tivamente, comoos bons da história.

m.MasnosDescobrimentossportuguesesaramquatromilhõesde escravosatravésAtlântico.Foia maior emigração orçadadatóriadohomem.O iwode AnaBarradasalaso.Osportuguesesão sabem sso,dizem

enas: Descobrimoso mundo,começámoslobalizaçâoJ'

oolhamosparao sofrimentoque nfli$mos?sDescobrimentos,a guerracolonial.scravatura a üolênciaqueexerciamquando

egavam novaserras era dos espanhóis, osrtugueses,os ngleses, osholandeses. osglesesá se alamuito,por causade filmes,

iwos, das atrocidadesque houve noQué-contraos Mau-Mau.Os ranceses ,zerammesma oisana Arçlia. Osbelgas o Congo.

mPortugal,êm deiadequese alassem issoiammal vistos.Nãoqueremicar vulneráveis,criticadospor estrangeiros.Masenfrentaras ealidades judamuitoumpaísa abrir-se,m empurrãoparaa rente.Quandoaspesso-conseguemalardisso,conseguemalardetrascoisas, oquenãogostam apolítica,naciedade, ademocracia.Abre umabrecha.

éagora alámossobretudo domedo.Ain-não falámos nenhuma vez de inveja, aticapalavracomque Camõesencerra Ossíadas.Osportuguesesdizemque são n-osos- que o outro é invejoso, nunca o

óprio,bem entendido.enãoposso er, nãoquero queos outros e-am.Ficoaqui com asminhascoisinhas ficontentinho."O"inho"vem ambémde umastração avidadesentirquenãoconsegue

lharemmuito, se se esforçarem,ouparem,investirembem, arriscarem,vãoconseguirchegar á.Olhamparaa pessoa ue em [comdesconfiançal:Deveter conseguidoaquiloatravésda malandrice,ou tem uma cunha."Tema ver com a frustração de nãoacreditarqueconsegueer a mesma oisa.

Portugal tem duas características que serelacionam comessa;uma delas é não seruma sociedademeritocrática,a outra é tudopassar impune. Senada à volta funciona,porque é que hão-de conseguir?A ustiçaé um dosgrandesproblemas.Todasessas oisasbarram o caminho. Lá vemoutraveza frustração.Eameritocracia:mesmoquenosesforcemosmuito, nãovaleapena,nãovaidar a lado nenhum.Quem em podernão vailargáìoe vai impedirqueoutros ovenham irar. É aquela oisado bairro, metaforicamente.Osmédicosêm o seubairro,osmagistradostêm o seubairro,osprofessores niversitáriostêm o seubairro. Cada mvive noseubairro,e todos defendemaquilo com unhase dentes

contraquementrar.E dentro do bairro comem-sevivos,se pos-sível.Sim.Edepoisosbairrossãocadavezmaispe-quenos, téchegar obairro maisportuguês ePortugal: português entrodo seuautomóvel.O comportamento:dtar com os outros,nãoter paciência,não ter civismo, não respeitarsinaisde trânsitonem imitesde velocidade."Soueu contraomundo."É umasituação ndedáparaaliviaralguma aiva,algumarustração.AquelegestoqueoZéPoünho azé ogestoqueosportuguesesazemuns aosoutros odos osdias. O comportamentono automóvelé o cú-mulo disso.Parece ma mutaçãoparaquemnão conhecea culturaportuguesa.

Se alasse com os senhores datroika, queproblemas lhes diria para atacar mais doque tudo?A ustiça,a educação, ndehá poderesnsta-lados. Masa troilcaem de aprenderque is-so não sevai fazeratravês e um tratado, umpapelassinado.Éuma mudançaculturalquetem de existir.

Jáchegámos tempo suficienteda entreüstapara perceber que não responde comoum

português.Tem uma enormepreocupaçãoem serprecisonas espostas.Osportuguesessão mais detalhados,adjectivam mais.As entrevistas omportugueses odemserumbocado ongas risos].Tambémé uma coisajornalística.Os ngleses ão muitopráticos,aquiloé pão,pão,queijo,queijo.Istojá está,vamospassar próxima"é uma coisa nglesa.Nãoperdemtempo nasconversas e corre-dor. É o espírito uteranodo rabalho,rabalho,trabalho(emboradepois das cinco vãoparaos copos).Osuniversitáriosportugueses, sjovensportugueses,omeçam serassim.Vãomuito lá fora,escrevem e uma maneiramaisimediata, ocada,vãodar aulasem Espanha,França, nglaterra,EstadosUnidos.

Enquanto isso, outros, e nodizer de MarkTwain, estão"insolentementefelizes".Foinuma visita aos Açores.MarkTwain des-creveo modo comoas pessoas iviam em

tinuavamcom umsorrisonacarae como gozopelavidaque osportuguesesêm. O antar ealmoçar ora, o conúvio,a ertúlia,sãoaalegriade viverqueosportuguesesêm. Têmristeza,mas êmjoy in their heart.

Têm o fado...E oie devivreao mesmotempo. Parecequeuma coisanãobatecertacom a outra,mas êm.Têmmuita resistência,ãomuito fortes,adap-táveis.Têmo"desenrascanço",queé umacoisamagníficaqueosgajosdatroika nãosabem,eque os analistas á foratambém não sabem.Deviamsaber.Osportuguesesmostramqueconseguem, ó alta destapar quelepotencial.Vaidemorar mais umageração,masnão mepreocupocom Portugal.

Écomo oJacinto,a personagemd'AsCidadeseasSerra.s,que mesmo que diga que tudoestá mal - e no seu caso náo dizque tudoestá mal - acabapor ficar.Osportugueses izem mal de Portugal,dizemmaluns dos outros, masadoramPortugal.

Como alguém da nossa amíliaque não su-portamos,mas que é da nossa amília.Osportugueses ostammesmo,mesmode Por-tugal. Sepudessemicarcá, rcavam.

Fazemosa entrevista num hotelde cincoestrelas,há estrangeiros,políticose empre-sários. Na mesa do lado,com um ar muitopato-bravo,falavamalto, tinham uma roupademasiado engomada,um deles escarrava.Sentiaqueleembaraçoque os portuguesessentemquandoum de fora estápara chegare nãoqueremos azer raca figura. Somos n-corrigíveis?TêmsidoncorrigÍveis.Oportuguês ãodá muito o braço a torcer,para ser corrigido. Essamudança,quandovier, vemde dentro. Essamudançaque tem de haverem Portugal emde virde baixoparacima, em de seraocontrá-riodoque em sidoatéagora.Osportuguesesestãosempreà esperaque caia udo o que ébom de cimaparabaixo.Osportuguesesêmde deixarde esperarpelamudança, êm deserelesa mudar.

Seos paísessão comoas pessoas,no casode Portugal,ainda êoZê Povinhoquemnosidentifica melhor?

Sim. É fascinantecomo continuam a ser tãopertinentesaquelascaracterísticas. ão-deficar mais ortes, fazempartedomakeupbio-lógicode umpovo.

Mantém-seo "Toma!",masdeixámos de sertão barrigudos e deusar chapéu.O 'oToma!"continua,mas em de ser menosconclusivo,em depoderserultrapassado. emde haveroutra maneirade encararas elaçõesde uns com os outros. O"Toma!"podeficarparaaquelesquecontinuam a não merecerrespeito.

Há uma frasepreferida paratraduzir a es-sência dosportugueses?Há. O meupoeta preferido,em qualquer ín-Sua,é o lMiguel]Torga.Descreve s portu-gueses omo sendoum "pacíficocolectivodepessoas evoltadas".fi