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Arkhaika

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A Trajetória do Sol e Lua

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ArkhaikA

ArkhaikA

Gerente editorialRoger Conovalov

EdiçãoJD Lucas

RevisãoCirlene Doretto

Projeto Gráfico Lura Editorial

DiagramaçãoLura Editorial

CapaLura Editorial

Catalogação na Fonte do Departamento Nacional do Livro (Fundação Biblioteca Nacional, Brasil)

Miari, AlecioArkhaika: a trajetória do Sol e Lua/ Alecio Miari

ISBN: 978-85-86261-42-8

1. Ficção. . I. Título.

Índice para catálogo sistemático: I. Ficção. B869.3

Explore o site:www.arkhaika.com.br

Todos os direitos desta ediçãosão reservados a Alecio Miari

Publicado pela Lura Editorial.Rua Rafael Sampaio Vidal, 291 São Caetano do Sul - SP - Cep 09550-170. Tel: (11) 4221-8215E-mail: [email protected]

É proibida a reprodução, total ou parcial, do conteúdosem prévia autorização do autor da obra. ArkhaikA

A l e c i o M i A r i

A t r a j e t ó r i a d o S o l e L u a

ArkhaikA

A l e c i o M i A r i

A t r a j e t ó r i a d o S o l e L u a

Agradeço ao Tolkien por me mostrar o início do caminho...

SUMÁRIO

776 -1 / ARKHAIKA

776 -2 / PRESENTE DE OTHON

776 -3 / ASSEMBLEIA DE BACO E REDIL DOS ARQUEIROS

776 -4 / JORNADA DE OTHON

777 -1 / CASAMENTO ARRANJADO

777 -2 / MEU TESTE FINAL

777 -3 / DÚVIDAS E QUESTIONAMENTOS

777 -4 / DESENVOLVIMENTO DE LUNA

778 -1 / DIAS DE SURPRESAS

779 -1 / NASCEM DUAS FILHAS

779 -2 / EMBARCAMOS PARA NOSSA JORNADA

779 -3 / UM JOGUINHO PARA ESQUECER O PASSADO

779 -4 / A TRAVESSIA CONTINUA

779 -5 / TRIMIA

779 -6 / ASSUMO MINHA NOVA REALIDADE

780 -1 / INÍCIO

780 -2 / SUSTENTABILIDADE PLANETÁRIA

780 -3 / DÁ PARA VOLTAR PARA CASA?

780 -4 / A GRANDE ESCALADA

780 -5 / QUE OS JOGOS COMECEM

780 -6 / OUTROS POVOS?

781 -1 / O CONHECIMENTO DE ALEKSANDRO

781 -2 / SOU LÍDER POR NATUREZA

781 -3 / VOU TORRAR MESMO, E DAÍ?

781 -4 / A NOVA FAG

781 -5 / DEVEMOS SEMPRE ESTAR PREPARADOS

781 -6 / ABRINDO NOVOS CAMINHOS

781 -7 / BACO CHEGA A TRIMIA

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781 -8 / OS DESTINOS DESTA VIDA

781 -9 / TODA AÇÃO POSSUI UMA REAÇÃO

782 -1 / ETERNEA

782 -2 / TRAIÇÃO

782 -3 / . . .

782 -4 / REFÚGIO

782 -5 / ACORDANDO NA BASE REBELDE

782 -6 / A INVASÃO

782 -7 / OS PRÓXIMOS PASSOS

782 -8 / TÃO PERTO E TÃO LONGE

782 -9 / BRAVOS HERÓIS

782 -10 / ENFIM ETERNEA

782 -11 / JOGO DA VIDA REAL

782 -12 / PÃOZINHO REVELA SEGREDO

EPÍLOGO

NOTA DO AUTOR

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Alecio MiAri

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ANO 776 — 1

ARKHAIKA

Destino... Você já se questionou sobre o que o trouxe até este exato

momento?

Em que você realmente acredita? As escolhas que você fez já estavam

predeterminadas? Estariam gravadas, no tecido universal, cada detalhe de

sua história?

Mais um dia terminava e nós estávamos voltando para casa com os

fartos alimentos que a terra tinha nos oferecido. Era o terceiro leitão que

caía na armadilha de Othon esta semana, além dos dois patos que eu havia

abatido com minhas flechas, mais cedo.

Othon olhou para mim com aquele ar de superioridade que ele ado-

rava demonstrar e disse:

— Parabéns, irmãozinho! Sua pontaria está quase aceitável.

— Sem essa! Você só cuida das armadilhas porque não sabe nem en-

caixar a flecha no arco.

— Sua língua está ficando afiada também!

— Você também está melhor nas armadilhas, até que enfim elas co-

meçaram a funcionar nos animais ao invés de somente nas frutas silvestres.

— Ah moleque, não se esqueça de quem manda aqui! Ainda sou o

mais velho! — ele bradou.

Ele bagunçou meus cabelos e me deu um soco, daqueles que você

sente o braço latejar; acelerou o passo e me deixou para trás carregando

os patos, o arco e a mochila com as cinco flechas restantes, teria de fazer

mais, depois.

Gosto muito de Othon, sempre foi meu grande companheiro nas ca-

çadas e mentor sobre os pensamentos da vida. Logo menos, quando com-

pletar vinte anos, ele terá de embarcar para sua jornada e ficarei sozinho.

Não sei o que será de mim, aqui, sem ele; sentirei muitas saudades de nos-

sas longas conversas e de seus pensamentos. Apesar de, termos, somente,

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ArkhAik A

três anos de diferença, ele parece tão mais sábio e mais vivido do que eu!

Realmente deixará um buraco em nossa família.

Quer dizer, graças ao meu pai, não haverá tempo para digerir esta au-

sência de Othon, já que ele definiu com seu amigo, Hector, que eu deveria

casar com a filha dele, Luna, quando fizéssemos dezoito anos. O acordo é

comum entre as famílias do vilarejo e consiste na união dos filhos, com a

constituição de uma nova família.

Ou seja, devo constituir família em um prazo máximo de dois anos e

abandonar tudo e todos para poder me dedicar à nova etapa de minha vida,

que logicamente já foi predefinida, também.

Assim que eu estava chegando em casa, avistei Othon. Ele era um

palmo mais alto que eu, possuía o mesmo cabelo castanho-claro que eu. A

nossa principal diferença eram meus olhos azuis que contrastavam com os

castanho-escuros dele. Ao me avistar, ele esboçou aquele sorrisinho carac-

terístico dele que precedia algum comentário zombeteiro:

— Demorou, hein? Os “dedos mais rápidos” não possuem as “pernas

mais rápidas?"

— Cala boca. Você me deixou sozinho carregando esta montoeira de

coisas. Trazer só um leitãozinho é fácil!

— Que orgulho! Meu irmãozinho está virando um homem! Tá bom,

tá bom... te ajudo a limpar os patos, vamos lá...

Pendurei meu arco na parede do quarto e encostei a aljava com as

flechas no chão. Apesar da simplicidade, nossa casa foi erguida com pedras

sólidas — blocos que quase dão a impressão de serem tijolos, trazendo um

aspecto de “cabana de alvenaria” e proporcionam um conforto sem igual;

não deixa a chuva entrar, mantém o calor dentro quando o frio sopra ner-

vosamente lá fora, além de não ficar abafado quando o dia está quente.

Saí do quarto e fui encontrar Othon, ele já estava depenando o pri-

meiro pato, em cima da mesa que fica na parte de trás de casa. Peguei o

facão e fiz o mesmo.

— Apolo, como você está se sentindo?

— Sobre o que?

Alecio MiAri

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— Em relação a... finalmente chegar minha hora... em você ficar sozi-

nho com a mãe... em se casar...

Pergunta difícil. Minha cabeça começou a jorrar informações e ideias

e eu não consegui expressar nenhuma. Nunca havia parado para pen-

sar nisso. Não queria pensar nisso! Sempre me enganei com pensamen-

tos como “Ah, faltam mais de cinco anos ainda.”; “Ah, ainda têm quatro

anos”; “Mais de dois”; “Seis meses”.

— DROGA! JÁ!?

Othon não se aguentou:

— E?

— Não.

— Depois de toda esta eternidade, foi essa a melhor resposta que você

encontrou?

— É que sempre achei que esta data estava longe. Os poucos lampejos

que me vinham sobre esta questão passavam rapidamente, e logo em se-

guida, eu me esquecia.

— Sabe, eu não o culpo. Acho que de uma forma ou de outra eu agi da

mesma maneira. Minha ansiedade por descobrir novos mundos é imensa e

tentei não pensar muito na minha partida. Mas, agora que está tão próxima

imaginei o que passa pela sua cabeça, vou sentir sua falta.

— Não gosto desta realidade, quero outra ideia de vida, outras possi-

bilidades...

Alguns segundos de silêncio se passaram, pareceram uma eternidade.

Dessa vez fui eu quem não suportou a ausência de som:

— Othon, você acredita em destino?

Acho que ele não esperava este tipo de pergunta já que ele parou o que

estava fazendo e levantou a cabeça, parecia muito pensativo:

— Como assim? Por que você me pergunta uma coisa dessas? Lógico

que acredito em destino, toda a nossa sociedade vive em função do destino,

ele é o que nos move e nos orienta. É por causa dele que minha jornada se

aproxima e é por causa dele que você ainda terá uma história importantís-

sima aqui, antes de ir reencontrar a mim e a nosso pai.

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ArkhAik A

— É que eu fico pensando se nós não temos direito de escolher o que

queremos fazer da vida.

— Mas o que mais você poderia escolher? Esta é uma vida perfeita, que

possui um equilíbrio absoluto. Cada um de nós desenvolve as habilidades

que fomos predestinados a possuir e com a idade certa partimos para nossa

jornada. Sempre foi assim e sempre será. É dessa maneira que espalhamos o

bem e o conhecimento por toda a galáxia, nosso povo recebeu esta dádiva

e a cumprimos com muita honra.

— Eu sei, eu sei... Acho que esta situação do casamento que me dei-

xa um pouco enervado. Eu penso se não tenho escolha alguma. Eu fui

predestinado a, já no meu nascimento, ser prometido à Luna, casar com

dezoito anos e ter pelo menos um filho, treinar arco e flecha durante todo

o período que eu estiver aqui para depois embarcar em minha jornada? É

isso mesmo? Qual a razão disso tudo?

— Entendo você e seus questionamentos, eu mesmo já tive os meus.

Você se sente como se a razão para fazer isso não fosse aceitável, como se

esta nossa vida devesse significar algo mais. Acalmei meus anseios buscan-

do explicações.

A razão disso tudo é a nossa grande história: “A evolução de Arkhaika”.

Foi neste ponto de nossa existência que evoluímos e conseguimos encon-

trar a luz e a verdadeira razão de nossa existência.

Neste momento, as palavras de nossa mãe quebraram sua linha de

raciocínio, trazendo-o de volta ao agora:

— Othon, venha aqui me ajudar, por favor?

E assim ele foi ver o que nossa mãe queria e eu terminei de limpar

os patos. Quando acabei de cortá-los em cubinhos, separei os que iríamos

usar para comer hoje e o que guardaríamos para amanhã. Aparentemente

não precisaremos caçar amanhã, talvez apenas uma volta na horta para

pegar alguns legumes e frutas... Deixei os cubos de pato com minha mãe

na cozinha.

— Cadê o Othon? — perguntei a ela.

— Pedi para ele fazer uma coisa para mim, daqui a pouco ele volta.

— Qualquer coisa estou no meu quarto.

Alecio MiAri

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Saí correndo e fui direto procurar no criado-mudo, sei que o guardei

no primeiro dia de aula, quer dizer, desde o primeiro dia de aula. Nunca

mais o peguei, não sei porquê, mas nunca tive curiosidade de olhá-lo, estu-

dá-lo. Para falar a verdade acho que tenho algumas ressalvas com toda essa

história, ela é muito vaga e... ACHEI!

A Evolução de Arkhaika

Dia 18

Mês OutubrO

anO: 480

EvEntO: Data da parceria entre o planeta Arkhaika e o Sistema Leezu.

No princípio era um pontinho minúsculo, praticamente imperceptí-

vel. Porém ele foi aumentando, ficando maior, maior, maior... jogan-

do sombras nas pessoas que estavam nos gramados verdes de Arkhai-

ka. Então, passou a encobrir boa parte da luz solar, trazendo noite

para o dia claro e levando escuridão para todos os lados, até que, a

gigantesca nave intergaláctica foi avistada pela primeira vez pousan-

do no enorme descampado ao lado do centro da cidade. A área de 5

Km² ficou pequena para abrigar a enorme máquina que, apesar de

toda a sua luminosidade, não emitia ruído algum.

A grande nave branca veio a ser conhecida como “Devaneio” e sua

estrutura mais parecia uma enorme barca, com milhares de janelas

circulares enfeitando toda a sua extensão, de ambos os lados, dando

a impressão de que haviam treinado tiro ao alvo nela. Acima de toda

essa estrutura erguia-se uma enorme caixa retangular, também branca,

com as bordas todas arredondadas, onde se encontrava a cabine de

pilotagem e todo o controle dos processos da nave.

Sem tocar o chão, planando um metro acima do gramado verde,

abre-se um compartimento enorme no centro de sua estrutura, domi-

nando metade de sua extensão, de cima para baixo, formando uma

enorme rampa de acesso, ligando a nave ao chão.

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ArkhAik A

O pânico e desconfiança, causados inicialmente, foram atenuados ao

vermos que os seres que saíram dali eram idênticos a nós. Vestiam

roupas brancas e justas, uma espécie de couro sintético, que fazia com

que transmitissem a sensação de quietude e serenidade.

Foram feitas as apresentações formais de ambos os lados, em seguida,

eles apresentaram seu discurso de paz, prosperidade e disseminação de

cultura em prol da evolução de todas as raças. Ao ouvir os objetivos

daqueles seres, organizamos uma grande comemoração para celebrar

sua chegada e seus fins pacíficos.

Após o período de festa firmou-se um acordo de colaboração mútua,

que incluía a transferência recíproca de recursos entre os dois povos,

de modo a beneficiar a ambos. Destacamos os principais pontos de

tal documento:

“Quis o destino que as duas culturas, tão distintas entre si, se encontras-

sem em um momento tão importante da história, cercado por tamanha

força, virilidade e estímulo.”

I. Arkhaika, cuja população se sustenta com o uso dos próprios recursos

naturais, respeitando sempre a capacidade de absorção do planeta em

renovar tais ativos e;

II. Leezu, cuja nação possui imenso conhecimento tecnológico e tem como

objetivo conhecer novos povos e disseminar seu enorme conhecimento

propõem:

1. Uma parceria que envolva a transferência do que cada povo tem de

melhor a oferecer, agregando conhecimento para ambos e disseminando

suas culturas universo afora.

2. Arkhaika cederá recursos humanos anualmente: todos os homens que

completarem a idade de vinte anos ingressarão em uma jornada que terá

como objetivo fazê-los transmitir o que possuem de melhor (habilidades e

Alecio MiAri

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conhecimentos). A nave Devaneio virá à Arkhaika recepcionar os Arkha-

ínos que se enquadrarem em tais requisitos.

3. Leezu cederá recursos e conhecimentos tecnológicos: a cada ano, quando

a Devaneio vier à Arkhaika, a nação Leezu deixará maquinário, equi-

pamentos e equipes especiais que ensinarão os Arkhaínos a utilizarem a

tecnologia e lhes transmitirão conhecimento.

Jogo o livro na cama, pensativo.

Isso foi no ano de 480 e atualmente estamos em 776. Trezentos anos

depois e ainda fazemos a mesma coisa? O mesmo procedimento ano após

ano, década após década, século após século? Como pode uma coisa des-

sas? Não podemos escolher mais nada? Estamos todos predestinados a

cumprir este ciclo?

— Filho, não me ouviu não? Vamos jantar.

Minha mãe estava parada na porta de meu quarto olhando para mim,

eu nem notei que ela se aproximou até ali.

— Desculpe mãe, não prestei atenção.

Assim que disse isso ela saiu. Guardei o livro no criado-mudo e fui

para a cozinha. Vou jantar e depois dormir; acordarei cedo para fazer mais

flechas, amanhã.

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ArkhAik A

ANO 776 — 2

PRESENTE DE OTHON

Produzir flechas era uma antiga arte de nossa família, ensinada geração

após geração e foi assim que acabei aprendendo. Vou até nosso bambuzal,

analiso e escolho os bambus mais retos, lisos e firmes dentre aqueles mais

novos que sejam fortes e ao mesmo tempo flexíveis. Os melhores encon-

tram-se com a idade entre três e cinco anos. Corto sete bambus bem rentes

ao chão, tentando ao máximo deixar os brotos e raízes intactos. Cada um

deles dará uma média de três flechas, por isso, terei ao final do processo,

quase vinte. Mais as cinco que sobraram de ontem, um total de vinte e cinco

para uma casa já bem abastecida de alimentos, é um número bom!

Pego um bambu. Primeiro corto todos os galhos dele e um ou outro

nó maior. Após, corto o bambu em tamanhos de aproximadamente 40 cm,

os quais meço pelo meu antebraço e minha mão, e assim, tenho três fle-

chas: uma fina, uma média e uma mais grossa, com 5mm, 10mm e 15mm

de diâmetro, respectivamente. Cada uma receberá uma ponteira diferente

de acordo com sua finalidade: longo alcance ou alta precisão.

Começo a trabalhar na primeira flecha: lixo os nós para deixá-los mí-

nimos fazendo com que o corpo fique o mais liso possível. Trabalho árduo

e chato.

Assim que fico satisfeito faço um buraco circular na ponta da flecha

na parte da frente — esta, por ser fina receberá uma das pequenas — insiro

uma ponteira dentro como se a ponta do bambu a estivesse abraçando, e

amarro a sua volta com uma cordinha bem fina, menor que um barbante,

porém mais resistente que costumo adquirir lá na cidade.

Fazer as ponteiras é outro trabalho chato, mas tenho bastante em es-

toque e por isso não preciso me preocupar por hora.

Viro a flecha para trabalhar a parte de trás. Talho uma cavidade reta de

um lado ao outro do diâmetro na traseira do bambu, aí será o ponto de en-

caixe na corda do arco e não pode ser nem muito estreita nem muito larga,

Alecio MiAri

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pois no momento do lançamento, a flecha não pode sair com dificuldade

do arco nem “ficar dançando”, desgovernada.

Pego a caixa com minhas penas de peru — sempre que abato um re-

carrego meu estoque —, pego uma pena e a corto na transversal bem em

cima da haste, obtendo então duas metades. Corto a pena em um formato

de meia ponta, deixando um vão livre no início e no final da haste. Meço-a

na flecha 5 cm acima do final dela — a ideia é que essa meia ponta encaixe

na parte de trás partindo do lado mais fino para o mais grosso — e para isso

faço dois buraquinhos no bambu, bem nos pontos que a pena começa e

termina. Repito o processo do outro lado do bambu para a outra metade.

Inserindo as duas pontas nestes buracos, faço-a acompanhar a extensão da

flecha e prendo ambas com a mesma corda utilizada para a ponteira.

Meu trabalho final da parte de trás:

Para todo o processo demorei uns vinte minutos. Faltam somente de-

zenove flechas, ou seja, levarei mais umas seis horas até terminar. Vou ficar

o dia inteiro aqui.

Os minutos passam e as pilhas de flechas aumentam. Dois montes

vão se formando: um com flechas finíssimas e muito leves com ponteiras

menores, porém mais grossas, que servirão para disparos longos. O outro

com flechas mais “gordinhas” e não tão leves quanto as primeiras, com

ponteiras mais longas, porém mais finas e afiadíssimas, para tiros curtos de

alta precisão.

— Apolo, podemos falar?

Queria parar, já estava com o saco cheio de fazer flechas, mesmo sa-

bendo que era um trabalho necessário. Respondi sem sequer tirar os olhos

do talho que fazia na traseira do bambu:

— Claro, Othon, o que manda?

— Podemos dar uma volta?

20

ArkhAik A

Travei.

Larguei a flecha do jeito que estava e me levantei para acompanhá-lo.

Othon só pedia para “dar uma volta” quando o assunto era extremamente

sério — havia sido convidado em somente duas oportunidades para cami-

nharmos e em ambas os assuntos eram de extrema importância. A primeira

foi sobre a minha convocação para a assembleia onde eu finalmente rece-

beria as orientações sobre o meu destino. A segunda era para me colocar a

par dos fatos sobre o meu casamento arranjado. Em ambas circunstâncias

eu tinha quinze anos. Desde que nasci eu já era prometido, porém quis

meu pai e seu amigo que nós pequenos só fossemos informados quando

completássemos a idade de quinze anos. Valeu paizão!

Nos dois casos Othon fez questão de me levar para uma caminhada

ao longo da floresta para me explicar, da melhor maneira que conseguiu,

quais seriam meus destinos e a razão pela qual eu deveria cumpri-los com

toda a honra do mundo.

Por isso não sabia o que esperar desta nova caminhada. A única cer-

teza é que teria alguma relação com meu destino — sempre tem, indepen-

dente da notícia ser boa ou ruim é sempre relacionado ao Destino.

Somente depois de nos afastarmos bastante de onde eu estava fazendo

flechas, foi que ele resolveu iniciar a conversa:

— Você sabe que estou para partir. Que minha jornada está para co-

meçar.

“De novo isso, saco!”

— Sim, Othon. Sei disso. Mas desembucha logo, pare de dar voltas e

fale logo o que você quer. Ele me olhou dando risada e continuou:

— Paciência nunca foi uma de suas virtudes, né? Calminha aí, deixa

eu estruturar todo o meu pensamento e depois você fala, tudo bem?

— Ok, me desculpe. Ficarei em silêncio.

— Ótimo. Como eu ia dizendo, minha jornada está próxima e penso

eu, que esta ideia não lhe agrada tanto. Estou certo sobre isso?

— Não sei bem como será a vida após você ir, isso me deixa confuso.

— Não me refiro à minha ida e sim à ideia de termos uma jornada a ser

cumprida. Sinto que você não se sente confortável com esta situação e que

Alecio MiAri

21

é difícil de aceitá-la, por isso quero compartilhar meus ideais com você. Já

tive muito receio sobre tudo isso, sobre o real significado de minha vida e

de minha jornada. Busquei as respostas certas sobre estes temas por longo

período, porém só obtive a tranquilidade quando encontrei na verdade as

perguntas corretas.

Perguntas corretas? Que doideira é essa do Othon? — Não deu tempo

de questionar, assim que franzi as sobrancelhas, ele percebeu que eu iria

começar o interrogatório e continuou sua linha de raciocínio:

— As respostas certas só vêm através das perguntas corretas. Respos-

tas que não o satisfazem significam que não são as suas verdades e que

foram respondidas às perguntas erradas. O grande ponto crucial em minha

vida se deve às perguntas: “Que vantagens essa jornada agrega para nós

Arkhaínos? Como podemos capitalizar estas vantagens?” — E foi assim que

enxerguei minha missão, meu objetivo. Dessa maneira que pude aceitar o

meu Destino.

Ok, ok. Palavras bonitas e pensamento filosófico profundo, mas não

consegui encontrar lógica. Novamente Othon interveio para concluir seu

discurso:

— Desde pequenos somos predestinados a treinar e desenvolver deter-

minada habilidade que nos foi incumbida. No seu caso o arco e flecha, no

meu a matemática. São conhecimentos muito úteis aqui em nosso planeta,

que nos ajudam a sobreviver de maneira sustentável. Assim vivemos nossa

vidinha e nossos costumes por quase quinhentos anos. Mas faltava algo,

faltava podermos compartilhar todo conhecimento adquirido com outras

raças, só não sabíamos como. Quando os Leezu vieram até nós, consegui-

mos ligar os pontos e enxergar a grande oportunidade de nossa existência.

Nós tínhamos o conhecimento sustentável, eles tinham o conhecimento

espacial. A partir daí pudemos dar melhor sentido às nossas vidas. Eles nos

levam aos confins do espaço com o grande objetivo em comum: o de espa-

lhar a paz e disseminar nossa cultura entre as raças.

Muitas informações a serem processadas, precisarei pensar com muita

calma nisso tudo. Minha cabeça começou a explodir de perguntas, milhões

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ArkhAik A

de questionamentos a serem feitos em tão pouco tempo e quando abro a

boca só sai um simples:

— Você tem medo?

— Acho que não. Receio do inexplorado sim, mas medo não. Já aceitei

minha condição e tenho em mente que ela é necessária para a minha evo-

lução pessoal, bem como sei que serei útil para os que eu puder conhecer.

Sim, isso faz sentido. Por que termos medo de algo que só traz benefícios?

É simplesmente uma simbiose perfeita e inesgotável, essa é a identidade de nossa

raça. Usar os recursos do planeta, porém sempre o respeitando com o intuito de

nos mantermos em constante harmonia. — pensei. Ele então finalizou nossa

caminhada com uma agradável surpresa:

— Apolo, antes de eu partir quero deixar um presente que possa te dar

forças para continuar a seguir seu caminho.

Ele tira a mochila das costas e se agacha de costas para mim. Quando

se levanta e se vira está segurando um pano por entre as mãos. Um pano

grande de cor verde musgo, salpicado em tonalidades acinzentadas, e com

um capuz. Uma capa! Mas a capa mais linda que já vi em minha vida! Pego

de suas mãos e ao movimentá-la, sua bicoloridade faz com que pareça que

tenha vida própria, um brilho interno pulsante. Nunca vi este tipo de te-

cido antes...

— Othon... é linda! Como... como você a conseguiu?

— Digamos que tive ajuda de uns amigos para arrumar o tecido. De-

pois disso foi somente pedir à costureira do centro para trabalhá-lo.

— Mas que tecido é esse? Nunca vi nada igual!

— Ele vem do planeta de Lesóvia, um povo amigável com grande dom

para a camuflagem. Eles desenvolveram grande habilidade na arte de pro-

duzir tecidos que imitam diversos meios. Este é usado para ambientes de

floresta fazendo com que a pessoa passe invisível. E mesmo sendo finíssimo

e muito leve, ele é extremamente resistente.

O tecido liso e macio, muito suave e de ajuste perfeito, realmente é

feito às minhas medidas. Visto-a e me sinto confortavelmente bem, nunca

pensei que poderia ter acesso a algo dessa magnitude. Deparo-me com dois

bolsos internos, um de cada lado, bons esconderijos.

Alecio MiAri

23

— Mas como você a conseguiu? Para termos acessos a materiais de ou-

tras raças não necessitamos de expressa autorização perante a assembleia?

— perguntei.

— Sim, há necessidade da autorização, mas não a possuo, e esse é o

ponto que queria chegar. Com esta capa tento te dar dois presentes: o pri-

meiro é ela propriamente dita, uma bela roupa para seu casamento. O se-

gundo é entender que apesar de termos nosso destino traçado, nós somos

os responsáveis em como segui-lo, com isso você começa a pensar e não

somente a agir por imposição. Regras são feitas para serem seguidas, porém

cada um pode muito bem avaliá-las e entender quais podem ser quebradas

ou distorcidas. Além do mais, podemos fazer uma análise do impacto que

esta quebra terá em nossas vidas e até onde estamos dispostos a assumir tais

consequências.

— Caramba, Othon! Sabia que isso vai contra tudo que você sempre

defendeu né? Que tipos de consequências você se refere?

Ele voltou a caminhar dando uma meia risada:

— Na verdade meu pensamento é esse, mas nunca deixei transpa-

recer. Esta capa por exemplo, quebrei uma pequena regra que não trará

consequência alguma para nosso povo, menos ainda para nossa família.

Fiquei amigo do Paco, um Leezu tripulante da Devaneio, e vi uma chance

de conseguir deixar para você um presente legal antes de partir. Foi ele

quem me ajudou a intermediar a troca de alguns livros de Matemática

pelo tecido com o povo de Lesóvia. Assim que eu estiver naquela nave

indo cumprir minha jornada, sei que terei deixado um pequeno legado.

Lembre-se sempre: Vencedores fazem as coisas acontecerem, perdedores

esperam que aconteçam.

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ArkhAik A

ANO 776 — 3

ASSEMBLEIA DE BACO E REDIL DOS ARQUEIROS

Apreensão, angústia, expectativa, desejo. Uma mistura de sentimen-

tos antagônicos que se mesclavam fundindo-se em uma massa heterogê-

nea, tudo isso dentro do meu estômago. A sensação era a de que ele estava

sofrendo as devastações de um furacão e de uma chuva, tudo ao mesmo

tempo. Pelo menos quando eu estava naquele tablado diante da Assem-

bleia era isso tudo e mais um pouco o que eu sentia. Olhando agora daqui

de cima tenho propriedade para dizer o que o Baco está passando lá em-

baixo enquanto aguarda sua nomeação. Após longa expectativa chegou o

grande dia em que ele é apresentado formalmente ao nosso povo com a

indicação de seu caminho.

Era assim, nossa tradição. Quando o garoto completava quinze anos

ele recebia a convocatória da Assembleia para que comparecesse na data

estipulada, com o intuito de receber o caminho que seguiria dali em diante.

Na essência, a criança já tinha uma noção de qual seria seu caminho já que

ela vinha sendo avaliada e pontuada ao longo dos anos.

A Assembleia desenrolava-se dentro do único centro tecnológico de-

senvolvido em toda Arkhaika, uma grande área que foi disponibilizada

para a nação Leezu. Eles criaram um megacomplexo tecnológico de treina-

mento, chamado de Ynke, onde as crianças passavam por avaliações anuais

sobre os mais variados temas. Desde testes psicológicos até de resistência

física. Com base em seus desempenhos ao longo dos anos, era possível tra-

çar um perfil de cada criança elencando suas maiores habilidades e direcio-

nando-as a um treinamento mais intenso que focasse em suas capacidades

e forças. No meu caso, fui direcionado para o arco e flecha há dois anos;

provavelmente Baco será também.

Uma arena octogonal com mais de dez fileiras de assentos para cima,

abrigava o povo para o segundo maior evento do ano, perdia somente

para o recrutamento da grande jornada dos garotos de vinte anos. Toda a

Alecio MiAri

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estrutura era feita de um metal muito resistente e brilhante, contrastando

com as vestimentas rudimentares e o costume de nosso povo. O iniciado

encontrava-se lá embaixo, no tablado central, e os juízes, que consistiam

em três Arkhaínos e três Leezu’s, ficavam em um dos cantos do octógono

com todo o histórico da criança, prontos para darem seu parecer.

Cada criança era chamada individualmente, os juízes faziam algumas

observações sobre seus pontos fracos e exaltavam seus pontos fortes, aí

então davam o veredicto.

— Você demonstrou falta de paciência e de concentração nas atividades

teóricas. Sua falta de perseverança neste tipo de aprendizado e seu baixo rendi-

mento indicaram que toda e qualquer ligação com os ensinamentos históricos,

matemáticos, herbológicos e geológicos são, com toda a certeza deste mundo,

seus grandes pontos falhos.

Eu ria sozinho. Quanta baboseira só para dizer que o Baco é um zero à

esquerda em todas as lições. Toscos!

— Em compensação, o entusiasmo demonstrado em atividades físicas,

como corrida, sobrevivência, tiro ao alvo e natação, fizeram com que suas quali-

dades e seus pontos fortes surgissem e clareassem nossas mentes. Devido a estes

acontecimentos, concluímos que para um desenvolvimento sadio o seu destino é

juntar-se ao Redil dos Arqueiros.

E é nesse exato momento que toda a musculatura sai do estado de ri-

gidez proporcionando uma sensação de alívio, de paz interior. A adrenalina

bombeada para todo o organismo começa a se dissipar deixando somente

um rastro de cansaço e desgaste físico e mental. Nesta hora o corpo ainda

encontra-se abobado e a mente não consegue raciocinar direito. Apenas no

dia seguinte, após uma boa noite de sono, é que o Baco realmente entende-

rá e assimilará tudo o que aconteceu hoje.

Com o término da cerimônia, me dirigi ao local em que Baco estava,

queria cumprimentá-lo:

— Parabéns Baco! Seja bem-vindo à nossa trupe! Até que enfim poderá

trocar aquelas “coisas” que você chama de armas por verdadeiros arcos e

flechas.

— É, bem... obrigado!

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ArkhAik A

— Não está nem sentindo as pernas não é mesmo?

— Na verdade, não.

— Relaxa cara! Você vai se acostumar com a ideia e quando começar

realmente seu treinamento passará a não sentir suas pernas. Até amanhã.

Falei que o cara fica desnorteado? Certeza que vai me perguntar de-

pois sobre o que nós conversamos.

— Bom dia, novatos! Bem-vindos ao Redil dos Arqueiros! O destino os

trouxe aqui com o intuito de aprimorarem suas habilidades. Para tanto, vo-

cês precisarão de muita atenção e dedicação, pois passaremos os próximos

cinco anos juntos. Peço o empenho de todos no que tange à boa educação,

ao respeito mútuos para que possamos conviver harmoniosamente ao lon-

go deste período.

Esta era a Franny que conhecíamos. Muito direta, exigindo alto em-

penho de seus pupilos, mas sempre tratando todos com grande educação e

respeito. Uma mulher nova, na casa dos seus trinta e poucos anos, assumiu

este cargo quando o marido teve de ingressar em sua jornada, deixando-a

sozinha aqui em Arkhaika. Com um sentimento de inutilidade preenchen-

do seu grande tempo ocioso, resolveu se envolver em atividades que trou-

xessem maior satisfação pessoal e sensação de ajuda para com os próximos.

Esta não é a grande missão de nossa raça? Por que somente os homens

podem seguir tal orientação?

Continuou seu pequeno discurso de saudação:

— Hoje é o primeiro dia de vocês e tentaremos passar todos os passos

que serão seguidos de agora em diante, além é claro de formalizar as apre-

sentações. A cada ano vocês terão um aprendizado específico que será mui-

to detalhado e, por consequência, muito maçante. Mas esse procedimento

é necessário para que cheguem próximo da perfeição.

Realmente o cronograma do Redil era bem chato, no princípio. Cada

nova turma era composta de cinco a dez pupilos e passariam o primeiro

ano praticamente só na teoria. Fundamentos básicos de postura e de respi-

ração, e ainda técnicas de relaxamento. Praticamente a única coisa que não

Alecio MiAri

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era teórica era o aprendizado de como confeccionar uma flecha, que era

entediante. Como os garotos iniciavam seu aprendizado com quinze anos

e treinavam por cinco anos até ingressar para a jornada, éramos divididos

em equipes de acordo com a idade das turmas:

1. Pupilo — Teoria e chatice mortais! Aprende-se aqui técnicas de ras-

treamento, de ocultação, de observação e de sobrevivência, além, é claro,

da produção de flechas.

2. Aprendiz — Início dos trabalhos com arco. Primeiras flechas são

lançadas nos alvos. Ajustes de posicionamento, ensinamentos de mira e

controle da respiração.

3. Mediano — Conhecida também como a “dedos sangrentos”, esta é

a equipe onde o treinamento é mais intenso, centenas de flechas são dis-

paradas diariamente. Os dedos sangram, os músculos enrijecem e os calos

começam a sobrepor as bolhas estouradas.

4. Eminente — Teste final! Cada garoto é deixado sozinho em um

local afastado da floresta e deve retornar utilizando todo conhecimento

adquirido ao longo de seu treinamento. No trajeto, enfrentam várias ad-

versidades e desafios.

5. Mestre — Estes são os mais altos graduados arqueiros de toda Arkhai-

ka — estamos falando sobre algo em torno de cinco a dez guerreiros. Eles

são os responsáveis por auxiliar o treinamento dos pupilos que ingressaram

este ano, acompanhando e orientando, além de serem os responsáveis por

dificultarem ao máximo o teste Final dos Eminentes.

Atualmente sou um Mediano e realmente já estou começando a criar

grandes calos nos dedos. Os exercícios são extremamente desgastantes,

mesmo com uma dedeira protegendo as articulações da mão na hora da

puxada do arco. Tiro atrás de tiro. Tiro rápido e tiro demorado. Tiro longo e

tiro curto. Tiro de pé e tiro de joelho. Certa vez Othon fez uns cálculos para

descobrir quantas flechas eu estava lançando e chegou às seguintes con-

clusões: Cerca de 200 flechas são lançadas diariamente durante o treino de

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ArkhAik A

quatro horas, totalizando 1400 na semana, quase 4500 no mês. Só de ouvir

isso tudo já comecei a ficar com dor de cabeça. Se tivessem me avisado que

teria de lançar cerca de 4500 flechas por mês nos alvos, e retirá-las após os

lançamentos, nem levantaria da cama.

Toda a musculatura dos braços e ombros dolorida. Não dá nem tem-

po de sentir a dor de ontem pois a de hoje se sobrepõe. Para imaginar um

pouco do que é essa sensação, é só pensar em uma constante dormência no

corpo, aquela que não acaba nunca.

— Então, o que está esperando Apolo? — Franny me fulminava com

o olhar porque não prestava atenção. — Vai ficar aí olhando o nada o dia

inteiro? Já falei para se mexer, só os Mestres e Pupilos aqui comigo para eu

passar as orientações sobre o treinamento. Os Medianos podem ir direto

para o centro de tiros iniciar os lançamentos do dia.

— Sim, senhora. Desculpe, com a sua licença.

Chego ao centro de tiros e Baird já está acelerado como sempre. Duas

flechas já estão fincadas no alvo. Greg ainda está encordoando o arco.

— Baird! Você não sente dor não? Pega mais leve no treino.

— Não adianta falar com ele, Apolo, o bicho acha que enfrentaremos

monstros das profundezas e que por isso temos que estar o mais preparados

possível.

— Querem parar vocês dois? Me dedico com afinco pois, além de achar

sim que temos de estar preparados para tudo e todos, não gosto de ficar le-

vando as carcadas que o Apolo toma da Franny. Falando nisso, onde você

estava com a cabeça durante a apresentação dos Pupilos? Você estava aéreo

e não moveu uma palha sequer quando fomos dispensados pela Franny.

— Estava pensando em como sou muito melhor que você, mesmo

fazendo metade do treinamento.

Arranco o arco de Baird, pego uma flecha e praticamente não miro,

só puxo o arco e solto. No momento que ela é lançada, viro-me para enca-

rar Baird com aquele meu sorrisinho presunçoso sabendo que isso o irrita

profundamente.

Ficamos nos encarando por alguns segundos, olho no olho, até que

ele não aguenta:

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— Ah, pro inferno você, Apolo! Não sei como consegue fazer isso!

Preciso treinar!

Ele arranca o arco da minha mão e se dirige ao alvo para recolher as

três flechas que estão cravadas ali. As duas que ele lançou estão enterradas

no segundo círculo enquanto que a minha encontra-se milimetricamente

posicionada no centro da circunferência menor. Adoro deixá-lo puto da

vida, nunca erro esse tipo de lançamento e ele sempre tem vontade de que-

brar o arco em dois, por causa do ódio que ele sente em relação à minha

arrogância.

Apesar disso, trata-se apenas de uma brincadeirinha... Baird, Greg e eu

somos toda a equipe de Medianos desse ano. Nossa cumplicidade, respeito

e confiança mútuos dispensam palavras. Tenho para com eles muita consi-

deração e ouço muito o que eles têm a dizer, pois este ano é decisivo já que

nosso teste se aproxima.