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ESCOLA SECUNDÁRIA ARTÍSTICA ANTÓNIO ARROIO ANO LECTIVO 2010/ 2011 PRELÚDIO POESIA À MARGEM DO STRESS Disciplina de Língua Portuguesa Professora Elisabete Miguel Verónica Rodrigues nº24 11ºN

Verónica Rodrigues ~ Prelúdio - Poesia à margem do stress

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- Prelúdio - Poesia à Margem do Stress - Verónica Rodrigues - 11.º ano - turma n - n.º 24 - disciplina de português - Escola Secundária Artística António Arroio - 3.º período - Maio 2011

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ESCOLA SECUNDÁRIA ARTÍSTICA ANTÓNIO ARROIO

ANO LECTIVO 2010/ 2011

PRELÚDIO POESIA À MARGEM DO STRESS

Disciplina de Língua Portuguesa

Professora Elisabete Miguel

Verónica Rodrigues nº24 11ºN

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ÍNDICE

INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 3

CORPO ........................................................................................................................................... 4

Contrariedades .......................................................................................................................... 4

É Amargo o Coração do Poema ................................................................................................. 6

Um Adeus Português ................................................................................................................. 8

Não São Apenas os Relógios ................................................................................................... 10

Álcool ....................................................................................................................................... 11

Minha Senhora de Quê ........................................................................................................... 12

Quem rasgou os Meus Lençóis de Linho ................................................................................. 14

CONCLUSÃO ................................................................................................................................ 15

BIBLIOGRAFIA .................................................................................. Erro! Marcador não definido.

ANEXOS ....................................................................................................................................... 17

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INTRODUÇÃO

Respondendo ao proposto, procurei elaborar uma selecção variada de poemas, de

autores conterrâneos recentes e anteriores, isto entenda-se, no tempo cronológico. Para além

de todos os poemas partilharem a língua portuguesa, partilham também a “língua” da

ansiedade, tema que escolhi para justificar a união. Encontrei neles elementos comuns, alguns

em posições mais inóspitas que outros, quer na forma mais directa, quer no próprio ritmo

dado no momento da leitura, quer em jogos de antíteses existentes na relação entre uns e

outros que, organizados desarrumadamente, constroem uma visão multidimensional e

multidireccional, frenética, nervosa, desconcertante, confusa, adjectivando a ansiedade.

Todo o processo, desde a selecção da temática à pesquisa dos poemas por autor, até à

sua colocação compositiva, nasceu da ideia de criar uma ligação multifacetada e

plurissensorial; teria portanto que escolher um tema que apelasse aos diferentes sentidos e

sentimentos humanos, tinha que ser um tema ambíguo, de contornos tortos que pudesse

examinar da forma que pretendia.

Surgiu-me então a ideia de explorar o tema ansiedade. Em primeiro lugar porque se

adapta, na perfeição, às sensações que queria transmitir, ora porque é um assunto que

facilmente pode ser tratado de variadas formas, ora porque funciona por si só como um

paradoxo, dadas as diferentes fases que assume ao atingir uma pessoa. Em segundo lugar,

considero a ansiedade um tema que funciona em par com a poesia.

Procedi então à pesquisa, seleccionei autores e procurei poemas que, de alguma forma,

representassem a ansiedade; ritmos rápidos e nervosos, como em “Álcool” de Mário de Sá-

Carneiro, inconstância e ideias opostas, como em “Contrariedades” de Cesário Verde (talvez o

seu poema que mais me fascina), a ansiedade de textura crua que nos faz viajar até à morte do

“tu” em “É Amargo o Coração do Poema” de Herberto Helder, o próprio tom ansioso de “Um

Adeus Português” de Alexandre O’neill, o teor homem-máquina do poema “Corredor” de Luís

Veiga Leitão, ou o tom de descrença dado por Ana Luísa Amaral em “Minha Senhora de Quê”.

Acontece tudo à volta da confusão emocional, que, quando não é dada pelo próprio poema, é

dado pela forma como se conjuga com os outros.

Organizei então os poemas em “degraus” inconstantes que procurei que

representassem da melhor forma o desequilíbrio da ansiedade, intercalando ritmos rápidos

com ritmos lentos, momentos de descrença, de desconforto intercalados com poemas com

alguns laivos subtis de esperança e boa disposição, dados em frases como “E estou melhor;

passou-me a cólera.” ou “E como um adolescente/ tropeço de ternura/ por ti”.

Ansiedade subst. f. do lat. anxietáte-, “disposição para a inquietação”; 1-estado de perturbação

psicológica causado pela percepção de um perigo ou pela iminência de um acontecimento desagradável

ou que se receia; opressão; angústia ansiedade. 2-desejo veemente. 3-impaciência.

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CORPO

Contrariedades

Eu hoje estou cruel, frenético, exigente; Nem posso tolerar os livros mais bizarros. Incrível! Já fumei três maços de cigarros Consecutivamente. Dói-me a cabeça. Abafo uns desesperos mudos: Tanta depravação nos usos, nos costumes! Amo, insensatamente, os ácidos, os gumes E os ângulos agudos. Sentei-me à secretária. Ali defronte mora Uma infeliz, sem peito, os dois pulmões doentes; Sofre de faltas de ar, morreram-lhe os parentes E engoma para fora. Pobre esqueleto branco entre as nevadas roupas! Tão lívida! O doutor deixou-a. Mortifica. Lidando sempre! E deve a conta na botica! Mal ganha para sopas... O obstáculo estimula, torna-nos perversos; Agora sinto-me eu cheio de raivas frias, Por causa dum jornal me rejeitar, há dias, Um folhetim de versos. Que mau humor! Rasguei uma epopeia morta No fundo da gaveta. O que produz o estudo? Mais duma redacção, das que elogiam tudo, Me tem fechado a porta. A crítica segundo o método de Taine Ignoram-na. Juntei numa fogueira imensa Muitíssimos papéis inéditos. A imprensa Vale um desdém solene. Com raras excepções merece-me o epigrama. Deu meia-noite; e em paz pela calçada abaixo, Soluça um sol-e-dó. Chuvisca. O populacho Diverte-se na lama.

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Eu nunca dediquei poemas às fortunas, Mas sim, por deferência, a amigos ou a artistas. Independente! Só por isso os jornalistas Me negam as colunas. Receiam que o assinante ingénuo os abandone, Se forem publicar tais coisas, tais autores. Arte? Não lhes convêm, visto que os seus leitores Deliram por Zaccone. Um prosador qualquer desfruta fama honrosa, Obtém dinheiro, arranja a sua coterie; E a mim, não há questão que mais me contrarie Do que escrever em prosa. A adulação repugna aos sentimentos finos; Eu raramente falo aos nossos literatos, E apuro-me em lançar originais e exactos, Os meus alexandrinos... E a tísica? Fechada, e com o ferro aceso! Ignora que a asfixia a combustão das brasas, Não foge do estendal que lhe humedece as casas, E fina-se ao desprezo! Mantém-se a chá e pão! Antes entrar na cova. Esvai-se; e todavia, à tarde, fracamente, Oiço-a cantarolar uma canção plangente Duma opereta nova! Perfeitamente. Vou findar sem azedume. Quem sabe se depois, eu rico e noutros climas, Conseguirei reler essas antigas rimas, Impressas em volume? Nas letras eu conheço um campo de manobras; Emprega-se a reclame, a intriga, o anúncio, a blague, E esta poesia pede um editor que pague Todas as minhas obras E estou melhor; passou-me a cólera. E a vizinha? A pobre engomadeira ir-se-á deitar sem ceia? Vejo-lhe luz no quarto. Inda trabalha. É feia... Que mundo! Coitadinha! Cesário Verde, in O Livro de Cesário Verde

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É Amargo o Coração do Poema

É amargo o coração do poema. A mão esquerda em cima desencadeia uma estrela, em baixo a outra mão mexe num charco branco. Feridas que abrem, reabrem, cose-as a noite, recose-as com linha incandescente. Amargo. O sangue nunca pára de mão a mão salgada, entre os olhos, nos alvéolos da boca. O sangue que se move nas vozes magnificando o escuro atrás das coisas, os halos nas imagens de limalha, os espaços ásperos que escreves entre os meteoros. Cose-te: brilhas nas cicatrizes. Só essa mão que mexes ao alto e a outra mão que brancamente trabalha nas superfícies centrífugas. Amargo, amargo. Em sangue e exercício de elegância bárbara. Até que sentado ao meio negro da obra morras de luz compacta. Numa radiação de hélio rebentes pela sombria violência dos núcleos loucos da alma.

Herberto Helder, de Úlltima Ciência, 1988, in Poesia Toda

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Um Adeus Português

Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz dos ombros pura e a sombra duma angústia já purificada Não tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não podias ficar nesta casa comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesa tão mansa quase vegetal

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Mas tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal Nesta curva tão terna e lancinante que vai ser que já é o teu desaparecimento digo-te adeus e como um adolescente tropeço de ternura por ti Alexandre O'Neill, in No Reino da Dinamarca (1958)

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Não São Apenas os Relógios

Também se pode regressar sem partir. Não são apenas

os relógios que se atrasam, às vezes é o próprio tempo. E todos

os cuidados são então necessários. Há sempre

um comboio que rola a nosso lado sem luzes

e sem freios. E pode faltar-nos o estribo ou já

não haver lugar na carruagem da frente.

Albano Martins, in Escrito a Vermelho

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Álcool

Guilhotinas, pelouros e castelos

Resvalam longamente em procissão;

Volteiam-me crepúsculos amarelos,

Mordidos, doentios de roxidão.

Batem asas de auréola aos meus ouvidos,

Grifam-me sons de cor e de perfumes,

Ferem-me os olhos turbilhões de gumes,

Descem-me a alma, sangram-me os sentidos.

Respiro-me no ar que ao longe vem,

Da luz que me ilumina participo;

Quero reunir-me, e todo me dissipo ---

Luto, estrebucho... Em vão! Silvo pra além...

Corro em volta de mim sem me encontrar...

Tudo oscila e se abate como espuma...

Um disco de oiro surge a voltear...

Fecho os meus olhos com pavor da bruma...

Que droga foi a que me inoculei?

Ópio de inferno em vez de paraíso?...

Que sortilégio a mim próprio lancei?

Como é que em dor genial eu me eternizo?

Nem ópio nem morfina. O que me ardeu,

Foi álcool mais raro e penetrante:

É só de mim que ando delirante ---

Manhã tão forte que me anoiteceu.

Paris 1913 – Maio 4

Mário de Sá-Carneiro, in Poemas Completos. Edição Fernando Cabral Martins,

Assírio&Alvim. 2001

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Minha Senhora de Quê

Dona de quê

se na paisagem onde se projectam

pequenas asas deslumbrantes folhas

nem eu me projectei

Se os versos apressados

me nascem sempre urgentes:

trabalhos de permeio refeições

doendo a consciência inusitada

Dona de mim nem sou

se sintaxes trocadas

o mais das vezes nem minha intenção

se sentidos diversos ocultados

nem do oculto nascem

(poética do Hades quem me dera!)

Dona de nada senhora nem

de mim: imitações de medo

os meus infernos

ANA LUÍSA AMARAL, in Minha Senhora de Quê,

Quetzal, 1999

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Corredor

Cem metros à sombra – temperatura

de tantos corpos e almas em rodagem.

Neste muro cercado, a maior viagem

sob um céu de pedra escura.

Sombras em fila, espectros talvez,

desplantam ecos da raiz do chão.

Lembram comboios que vêm e vão

sob túneis de pez.

E vêm e vão com pés humanos

ressoando movimentos tardos,

levando fardos, trazendo fardos

das horas sem dias e meses sem anos.

E vêm e vão, sempre, sempre a rodar

na linha de railes espectrais,

sem descarregadores na gare,

sem guindastes nos cais

E vêm e vão pela via larga

das redes do sonho e da lembrança,

levando a carga, trazendo a carga

de toneladas de esperança.

luís veiga leitão, in Surrealismo Abjeccionismo

– antologia organizada

por Mário Cesariny de Vasconcelos

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Quem rasgou os Meus Lençóis de Linho

Quem poluiu, quem rasgou os meus lençóis de linho,

Onde esperei morrer, meus tão castos lençóis?

Do meu jardim exíguo os altos girassóis

Quem foi que os arrancou e lançou no caminho?

Quem quebrou (que furor cruel e simiesco!)

A mesa de eu cear, d tábua tosca de pinho?

E me espalhou a lenha? E me entornou o vinho?

_ Da minha vinha o vinho acidulado e fresco...

Ó minha pobre mãe!... Não te ergas mais da cova.

Olha a noite, olha o vento. Em ruína a casa nova...

Dos meus ossos o lume a extinguir-se breve.

Não venhas mais ao lar. Não vagabundes mais,

Alma da minha mãe... Não andes mais à neve,

De noite a mendigar às portas dos casais.

Camilo Pessanha, in Clepsidra

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CONCLUSÃO

Finalizo desta forma o meu trabalho. Os objectivos prescritos foram por mim cumpridos,

de cinco a dez poemas, seleccionei sete, de sete autores distintos, procurei também que como

conjunto isolado não combinassem uns com os outros mas que funcionassem na perfeição

quando aliados ao tema (vejo aqui a ansiedade como miscelânea de sensações marcadas pelas

diferenças evidentes entre as escolhas poéticas); no que toca ao poema de Cesário Verde,

parte integrante obrigatória da composição, escolhi Contrariedades, após leitura de um vasto

rol de poemas de sua autoria, pareceu-me funcionar em parceria com o tema Ansiedade, um

poema que explora diversas fases do sentimento humano, apoiando-se na viagem da

reclamação à conformação.

Nas ilustrações, todas de minha autoria, exceptuando as que se encontram devidamente

identificadas nos anexos, procurei simplicidade mas contraste, traços finos à mão-tremida,

traços firmes, curtos, longos, rápidos de gesto e simples de textura e de cor. Fiz apenas uso da

caneta preta sobre papel branco. Qui-las frias, habitando o paradoxo expressão/ ausência de

movimento. Todas se relacionam de forma íntima com os poemas, um molho de lençóis aos

pés da cama.

Ênfase à primeira ilustração, referente ao primeiro poema. Contrariedades funciona

aqui como um poema introdutivo, o poema que, de todo o grupo que nos leva à definição mais

directa de ansiedade, o poema onde está presente toda a lógica estrutural do trabalho, toda a

diversidade de sensações, todo o desequilíbrio, toda a inconstância é-nos dada pelas palavras

de Cesário. A imagem pretende representar os sentimentos do poeta: a ansiedade, a raiva e a

frustração, que se vão diluindo perante o drama da engomadeira, os olhos semi-cerrados

bamboleiam entre dois estados distintos, o da reclamação e o da conformação, como referi

acima; a expressão é de desconcerto, de cansaço, covas profundas circundam os olhos e a

boca, evidenciam a vida difícil que esta mulher leva. As linhas que escorrem do que será a

camisola da mulher funcionam como símbolo de uma vida exaustiva, cheia de curvas, mas que

termina ainda antes do fim do próprio corpo.

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SITES

A

http://www.astormentas.com

C

http://canaldepoesia.blogspot.com

http://www.citador.pt

I

http://www.instituto-camoes.pt

P

www.poesiaeprosa.blogspot.com

http://poesiaparaninguem.blogspot.com

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ANEXOS

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BREVE INTRODUÇÃO AOS ANEXOS

Com a colocação deste grupo de anexos no trabalho pretendo complementá-lo com

elementos que, de uma forma ou de outra, não podem estar apresentados no corpo. Nesta

secção procurei aprofundar e explorar a temática da ansiedade recorrendo a materiais

diversos.

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Eduardo Luiz (1932-1988)

a mulher e o lobo

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Egon Schiele (1890-1918)

sem título

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Carta simples Hoje quis escrever-te e não consegui. Pesam-me os verbos como pedras nestes dedos, mas vês, é sobre ti que se debruçam as palavras que não saem e nestes olhos a gratidão de saberes sempre quando preciso da tua mão na face, quase materna, quase amante, e azuis os rasgos de ternura de uns olhos castanhos e meigos que me libertam das águas revoltas onde lutam os meus neurónios em batalhas estéreis e sem sentido. Tens sido tu o porto de abrigo que me recolhe nas paisagens desse País que escondes no teu corpo e no teu nome e me dá uma paz profunda e me asseguras na minha infantil insegurança que o passaporte que assinaste para eu aí viver é vitalício e sem encargos, esse País tão infinito onde me quero nacionalizar e ter asilo. Se conseguisse, hoje tentaria explicar-te que as razões da minha insegurança vêm do facto de que quando me multiplico nos jardins que escolho com cuidado a água desaparece sem razão correndo aos poucos para outros rios, desidratando-me os afectos. Sou inseguro e insistente devido à inevitabilidade de que perpetuarás esse ciclo, e que tenhas medo e fujas e ergas muros que ficarei a contemplar com os meus olhos tristes que te dizem tanto sem dizerem nada, excepto não tenhas medo, não fujas, não vás, não sejas um rio onde estas raízes não bebam. Werther Damien Sevahc