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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ DOUGLAS JORGE BUZATTO Entre Soldados e Fanáticos Poder Militar e Conflito social – A participação da polícia Militar Paranaense na Guerra do Contestado (1912 -1916)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ DOUGLAS JORGE

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

DOUGLAS JORGE BUZATTO

Entre Soldados e Fanáticos Poder Militar e Conflito social – A participação da polícia Militar Paranaense na Guerra do Contestado

(1912 -1916)

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Curitiba 2007

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

DOUGLAS JORGE BUZATTO

Entre Soldados e Fanáticos Poder Militar e Conflito social – A participação da polícia Militar Paranaense na Guerra do Contestado

(1912-1916) Monografia apresentada ao Departamento de História, da Faculdade de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do Paraná como requisito à obtenção de graduação em História

Orientador: Professor Doutor Dennison de Oliveira.

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Curitiba 2007

DEDICATÓRIA

Dedico a meus pais, pela educação e pelo carinho.

À minha esposa, pela paciência e pelo incentivo.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, pela vida e pela saúde.

Aos professores que, com o seu conhecimento, me ensinaram até aqui.

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EPÍGRAFE

O homem que perde a riqueza, perde muito;

Aquele que perde um amigo, perde mais;

Mas aquele que perde a coragem, perde tudo.

Miguel de Cervantes

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SUMÁRIO

LISTA DE ILUSTRAÇÕES E QUADROS......................................................................... 6

RESUMO................................................................................................................................ 7

ABSTRACT............................................................................................................................ 8

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................. 9

CAPÍTULO 1 – A QUESTÃO DA TERRA......................................................................... 14

1.1 SURGIMENTO DO CONFLITO..................................................................................... 18

1.2 PROBLEMAS SOCIAIS E A BRAZIL RAILWAY COMPANY........................................ 21

1.3 OS CAMINHOS DA MISÉRIA....................................................................................... 23

1.4 MONGES E DEVOTOS................................................................................................... 25

CAPÍTULO 2 – A ORGANIZAÇÃO DO MOVIMENTO................................................. 29

2.1 O CORONELISMO.......................................................................................................... 29

2.2 CONFRONTO CONTESTADO x JUAZEIRO x CANUDOS........................................ 30

2.3 FORMAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES MILITARES NO BRASIL .................................. 32

2.4 O REGIMENTO DE SEGURANÇA DO PARANÁ........................................................ 36

2.5 MOBILIZAÇÃO DO REGIMENTO DE SEGURANÇA DO PARANÁ........................ 37

2.5.1 Desdobramento da Tropa................................................................................................ 38

2.5.2 Expedição ao Irani........................................................................................................... 39

2.5.3 O Armamento da Tropa................................................................................................... 40

2.5.4 O Acidente com a metralhadora...................................................................................... 41

2.5.5 Intimação ao Monge........................................................................................................ 41

CAPÍTULO 3 – CONJUNTO DA CAMPANHA DO CONTESTADO............................ 44

3.1 A BATALHA DO IRANI.................................................................................................. 44

3.2 O DESFECHO DO DOLOROSO COMBATE................................................................. 45

3.3 O BALANÇO DA TRAGÉDIA.........................................................................................46

.3.4 O EXÉRCITO EM AÇÃO................................................................................................ 47

3.5 O PLANO DE CAMPANHA............................................................................................ 49

3.6 BATALHÃO TÁTICO...................................................................................................... 50

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3.7 O ÚLTIMO COMBATE.................................................................................................... 51

3.8 O TÉRMINO DA CAMPANHA....................................................................................... 52

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................. 58

REFERÊNCIAS..................................................................................................................... 60

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES E QUADROS

Figura 1: Divisão política entre PR e SC................................................................................. 14

Figura 2 – Área conflituada..................................................................................................... 18

Figura 3 - Locomotiva da Estrada de Ferro............................................................................. 21

Figura 4 - Tropa de segurança montada pela Lumber............................................................. 22

Figura 5 – Seguranças da Lumber........................................................................................... 23

Figura 6 - Grupo de caboclos dispostos a se defender............................................................ 24

Figura 7 - O monge João Maria............................................................................................... 25

Figura 8 – Embarque da tropa do Regimento de segurança em 1912..................................... 37

Quadro 1- Distribuição dos contingentes................................................................................. 34

Quadro 2 – Efetivos das Polícias Militares e do Exército

no período 1889-1933 (Número absolutos) ........................................................................... 35

Figura 9 – Metralhadora Maxim "modelo 1895"..................................................................... 41

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RESUMO

Este trabalho tem como objetivo analisar os acontecimentos ocorridos no sul do

Brasil, nas fronteiras dos estados do Paraná e Santa Catarina, em uma região que ficou

conhecida como “zona do Contestado” - região de múltiplos interesses, na qual se originaram

problemas significantes - limitando-se aos aspectos referentes à participação do Regimento de

Segurança do Paraná, nos anos de 1912 a 1916. A fundamentação teórica necessária ao

objetivo proposto apoiou-se em literatura específica ao tema, com pesquisa bibliográfica

documental, onde foram consultadas as fontes de dados disponíveis no Museu Histórico do

Paraná e Biblioteca Pública do Paraná, tais como Boletins Internos, Ordens do dia PMPR,

Relatórios de campo, Relatórios do Presidente da Província, Relatórios da Polícia Militar,

Livros de Assentamento do Contingente, Inquéritos Militares, Memorandos, cartas,

telegramas, ofícios e os jornais da época. A metodologia usada foi de análise crítica da revisão

de literatura.

Palavras-chave: História, História do Contestado; Participação do Regimento de Segurança do

Paraná na Guerra do Contestado.

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ABSTRACT

This work has as objective to analyze the events in the south of Brazil, in the

states`s borders of Paraná and Santa Catarina, in a region known as "zone of the Contested

one" - region of multiple interests, in which had originated significant problems - limiting it

the referring aspects to the participation of Arm Paraná, from 1912 to 1916. The necessary

theoretical recital to the considered objective was supported in specific literature to the

subject, with documentary bibliographical research, where the sources of available data in the

Historical Museum of the Paraná and Public Library of the Paraná had been consulted, such

as Internal Bulletins, Orders of day PMPR, Reports of field, Reports of the President of the

Province, Reports of the Military Policy, Military Books of Nesting of the Contingent,

Inquiries, Memorandum, letters, telegrams, crafts and periodicals of the time. The used

methodology was of critical analysis of the literature revision.

Key-Words: History, History of the Contested one; Participation of the Regiment of Security

of the Paraná in the War of the Contested one.

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INTRODUÇÃO

Em 1853, a quinta comarca de São Paulo constituiu-se como a Província do Paraná.

Mantendo os mesmos limites meridionais, passando a ser o legítimo herdeiro dos direitos

paulistas no sul, o Paraná estendia-se na sua parte meridional até o rio Uruguai, limitando-se

com a Província de São Pedro do Rio Grande do Sul.

Até então, não havia um acordo definitivo de limites entre o Paraná e Santa Catarina.

Este acordo, que era negligenciado por parte das autoridades paranaenses, devido a delicados

fatores que culminariam com a Constituição Brasileira de 1891, determinava que os casos de

limites, entre os estados da Federação, seriam resolvidos politicamente.

Saindo o Brasil vitorioso na questão do Contestado com a Argentina, foi definida a

fronteira internacional na região, passando então este espaço territorial a chamar-se de

Clevelândia, com a Lei 362, de 29 de março de 1908. Nessa mesma época, a ferrovia São

Paulo-Rio Grande estava sendo construída, passando pelo território contestado entre Paraná e

Santa Catarina e, com a valorização das terras na região, foi desencadeada uma nova disputa

de terras, que se tornou jurídica.

Finalmente, em 1909 e 1910, o Supremo Tribunal Federal dá ganho de causa a Santa

Catarina, decisão que somente poderia ser executada mediante lei federal. Os ânimos se

exaltam e se inflamam, nos dois Estados, gerando um compromisso do governo do Paraná

com o novo governo provisório do Estado das Missões, visando a recuperação das terras

contestadas. As discussões continuaram longas e difíceis.(WACHOWICZ, 2001).

Esta região contestada ficou praticamente abandonada pelas autoridades paranaenses.

Faltava assistência a seus habitantes - os caboclos posseiros – que viviam na marginalidade,

na ignorância. Com a construção da ferrovia, foram desapropriados e expulsos de suas terras.

Um caos social total.

Ao mesmo tempo, os latifundiários brasileiros – os coronéis - que até então

mantinham um bom relacionamento com esta população cabocla, passaram a hostilizá-la, para

que sua presença não atrapalhasse a valorização e a venda das terras.

Neste abandono, esta população se mobiliza pelo fervor religioso, constituindo assim

uma verdadeira legião de revoltosos - pobres e miseráveis lavradores - que unidos em torno da

figura do “monge”, procura defender seus direitos contra os interesses capitalistas

estrangeiros, lutando pela desapropriação e formando então uma verdadeira rebelião. Depois

da morte do monge e e com a eclosão da crença de sua ressurreição, reuniram-se aguardando

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seu místico retorno, com uma possível instauração de um “reinado de paz”, com justiça e

fraternidade.

Os sertanejos desta região, analfabetos, isolados do resto do país, numa estrutura de

poder coronelista, foram se organizando em torno de uma “irmandade”, que possibilitava uma

resistência às mudanças de interesse capitalista, representadas pelas empresas do grupo

Farquhar, que invadiu abruptamente o seu espaço.

A tensão política e social aumenta cada vez mais, com os mandos e desmandos das

polícias paranaenses e catarinenses, além da guarda policial norte americana, bem fardada e

armada, da Brazil Railway Company, a holding que se instalou no Brasil para a construção da

ferrovia. Ao mesmo tempo, além dos imigrantes recrutados para a construção da mesma,

havia também centenas de presidiários que ali trabalhavam em troca de uma futura liberdade.

O ambiente moral entre a turma de operários desmobilizados misturou-se ao

descontentamento dos habitantes sertanejos. Os assassinatos e assaltos aos trens pagadores se

tornaram um hábito. A proposta dos descontentes foi resistir a essas transformações, mas,

infelizmente, a polícia paranaense tratou-os como usurpadores e, sem maiores tentativas de

conciliação partiu-se para um primeiro ataque, sem estratégia, em 1912 - conhecido como a

Batalha do Irani - que acabou incidindo numa vitória para os posseiros que, insuflados pelo

misticismo, voltaram a combater em novos redutos, tendo esta guerra durado até fins de

1916.

A esta altura dos acontecimentos, perdendo a luta a sua causa primordial, ou seja, a

resistência aliada ao misticismo, o fanatismo deu origem então ao banditismo, onde jagunços

e malfeitores lutavam apenas para saquear e roubar, sem um objetivo definido. É aí que o

governo federal percebe o desperdício de homens e munições ao organizar pequenas

expedições sem êxito. Assim, foi realizada uma verdadeira campanha, a partir de agosto de

1914, onde todo o pessoal e equipamento militar foram organizados somando, ao todo, treze

expedições, onde pereceram dezenas de milhares de vidas, entre oficiais, soldados e caboclos.

Este estudo busca investigar as causas do conflito social que ocorreu na região

contestada e objetiva elucidar como era organizado e constituído o Regimento de Segurança

do Paraná, e as circunstâncias que tornaram possível a sua participação na Guerra do

Contestado. Desta forma, é importante reconhecer qual era a sua função legal perante a

sociedade, quais as funções que supria e como era formado seu quadro de oficiais e praças até

o momento do conflito.

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Para a realização desta investigação, foi consultada uma vasta bibliografia, fontes

documentais, como os boletins internos, ordens do dia, relatórios de campo e livros de

assentamento do contingente, que embora em péssimo estado de conservação – como é o caso

da biblioteca do Museu da Polícia Militar do Paraná, localizada na sede do Quartel do

Comando Geral da Polícia Militar – supriu de forma eficaz esta pesquisa, trazendo elementos

fundamentais que contribuíram para a total compreensão do problema estudado, já que foram

elaborados por indivíduos que estiveram presentes no conflito.

Ressalta-se que, em relação às informações da participação do contingente

massacrado e dos heróis criados nesta guerra, como é o caso do Alferes Joaquim Antônio de

Moraes Sarmento, que hoje é patrono da PMPR, e do próprio Coronel João Gualberto Gomes

de Sá Filho, existem ainda fatos controversos, como as divergências internas entre o poder

civil e militar que se encontram ainda obscuros, podendo dar margem à futuras investigações

mais profundas sobre o assunto.

Da mesma forma, vale salientar a importância dos jornais da época, das duas capitais

dos Estados envolvidos, Curitiba e Florianópolis, que se encontraram disponíveis no Instituto

Histórico, Geográfico e Etnográfico Paranaense, e da bibliografia especializada sobre o

assunto, onde se destacam o livro de Maurício Vinhas de Queiroz, - Messianismo e Conflito

Social - considerado de enorme importância pela rica e detalhada descrição dos fatos,

resultado de uma criteriosa pesquisa, onde se evidencia o conflito da região contestada como

uma crise estrutural, centrada na aceitação do messianismo, como “uma revolta alienada”,

isolada da realidade.

Chamamos a atenção para o autor paranaense Ruy Wachowicz, em sua obra História

do Paraná1, que faz uma interessante contextualização entre os primeiros habitantes desta

região, os conflitos entre tropeiros, bandeirantes e indígenas – que formaram mais tarde a

população cabocla – e a expansão das fronteiras para além da linha de Tordesilhas, com a

definição do limite oeste com o Rio Paraná, fato preliminar de tantas desavenças políticas.

A didática singular deste autor, que procura não privilegiar motivos, relata os fatos

militares, políticos e culturais - aspectos fundamentais antecedentes que originaram os

problemas da região contestada -, apresenta o Paraná como uma “terra de mudanças”, onde

um único fato nunca pode ser responsabilizado pelo desenrolar dos acontecimentos.

.

1 1 WACHOWICZ, op.cit

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Já o autor Duglas Teixeira Monteiro, em seu livro - Os errantes do novo século –

contribui de forma profícua, interpretando os fatos ocorridos como uma análise de uma

comunidade que enfrentou uma imensa crise global, recolocando dentro dos limites

disponíveis os problemas maiores do grupo, adotando um universo mitológico, com seus

respectivos rituais, como é o caso da organização de seu exercito particular, no caso dos

“Doze Pares de França”.

Monteiro reitera ainda, descrevendo enfaticamente as importantes alterações sofridas

por aquele povo, em relação ao mandonismo local, quando fala das “transformações pelas

quais passou o país no plano político e administrativo com o advento da República”.2

No que se refere ao autor Demerval Peixoto, ressaltamos que sua obra, dividida em

três volumes, nos fornece dados pertinentes com fatos históricos da participação da Polícia

Militar Paranenese e Catarinense, tendo sido ele próprio um militar, que esteve presente no

palco da guerra, no período de 1912 a 1916.

Ao tratarmos do Capitão Rosinha – o autor João Alves da Rosa Filho, em sua obras

inéditas - Combate do Irani e Campanha do Contestado – iniciativa da Diretoria Executiva da

Associação da Vila Militar da Polícia Militar do Paraná, que foram publicadas em 1998 e

1999, respectivamente, temos a considerar que este autor contribuiu de forma exaustiva,

inclusive com acervo particular, para o resgate dos episódios da Polícia Militar do Paraná na

Guerra do Contestado , de forma cívica e histórica.

Este trabalho tem como objetivo analisar os acontecimentos ocorridos no sul do

Brasil, nas fronteiras dos estados do Paraná e Santa Catarina, em uma região que ficou

conhecida como “zona do Contestado” - região de múltiplos interesses, na qual se originaram

problemas significantes - limitando-se aos aspectos referentes à participação do Regimento de

Segurança do Paraná, nos anos de 1912 a 1916.

Serão abordados, no primeiro capítulo, a questão da terra, as origens do conflito, a

religiosidade, com a seqüência pertinente aos problemas sociais e econômicos, ou seja, o

messianismo, a irmandade cabocla, o catolicismo rústico, a saga dos monges existentes e

quais foram as diferenças desses monges, a vida dos sertanejos antes do conflito e como e

quando o movimento começou ganhar força.

No segundo capítulo, enfatizando o comando de guerra e a conduta disciplinar dos

militares, será evidenciado o funcionamento interno do aparelhamento do Estado, com seus

2 MONTEIRO, op.cit. p.209.

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conflitos internos e sua responsabilidade perante a lei, assim como eram organizados os dois

lados combatentes. Os problemas entre o poder militar e o poder civil serão enfatizados aqui,

como precedentes das desavenças entre o coronel João Gualberto e o chefe de polícia Carlos

Cavalcanti Filho, para um melhor esclarecimento das proporções que o conflito atingiu em

virtude da opinião contrária dos dois cidadãos, que poderia ter sido minimizada se eles

tivessem entrado num acordo. Ressalta-se a total falta de apoio literário para este assunto.

No terceiro capítulo será mostrado o momento do conflito do Irani, o momento pós-

conflito, os conflitos Caragoatá e Taquaruçu, a organização do Batalhão Tático do Exército,

com as colunas Norte, Sul, Leste e Oeste, com o último combate ao reduto de Santa Maria,

que deu por fim a esta batalha, considerando os reflexos desta Campanha e elucidando, dentro

do possível, os reflexos que a guerra trouxe para o interior da Instituição.

Justifica-se este trabalho como uma pesquisa original dentro do estudo e descrição da

história, no tema escolhido, visando contribuir e problematizar a memória da Instituição

Polícia Militar do Paraná, com o objetivo de esclarecer as especificidades inerentes ao

fundamento dos aparelhos repressivos de Estado, com todos os limites e possibilidades, no

que se refere à sua participação na Guerra do Contestado.

Foi elaborada uma interpretação original sobre estes eventos, caracterizando de que

forma a Polícia Militar do Paraná se organizou e se mobilizou, considerando-se todos os

fatores envolvidos, tais como a função legal da PM perante a sociedade, que necessidades

supria e como era formado seu quadro de oficiais e praças até o momento do conflito,

componentes da mais alta relevância, para o entendimento do conflito, que até hoje não foram

devidamente levados em conta pela historiografia.

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CAPÍTULO 1 – A QUESTÃO DA TERRA.

As fronteiras entre as terras portuguesas e as espanholas, no sul do Brasil, foram

definidas pelo Tratado de Santo Ildefonso (1777), que estabeleceu como pontos fixos e

definitivos na fronteira os rios Uruguai (antigo Goyo-En), o rio Paraná e um trecho do rio

Iguaçu.

Segundo Wachowicz (2001:185), entre os rios Iguaçu e Uruguai o referido tratado

estabelecia que a fronteira passaria pelos rios Peperi-Guaçu (afluente do Uruguai) e pelo

Santo Antonio (afluente do Iguaçu). Entretanto, as expedições mistas – demarcadoras desta

fronteira por parte das duas potências ibéricas nunca chegaram a definir e colocar marcos de

pedra para se saber concretamente quais os rios que receberam estas denominações. Desta

forma, o território compreendido entre os rios Iguaçu e Uruguai não teve definida sua

fronteira.

A comarca de Curitiba ocupava todo o sul da Província de São Paulo. Em 29 de

agosto de 1853, com a Lei Federal 704, o território da comarca é transformado na Província

do Paraná. Sendo assim, as autoridades, na nova província, investem contra Santa Catarina

Figura 1: Divisão política entre PR e SC. Fonte: Martins (2001)

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quando fixam os limites do leste pelo Rio Canoinhas, que corre em direção ao Rio Negro,

desde os campos de Lages. Cria-se uma nova zona de conflito e de terras-de-ninguém quando

o Paraná exige que o vizinho do sul exiba a legislação que lhe garanta a propriedade das terras

contestadas.

Em resposta ao apelo dos catarinenses, em janeiro de 1865 as autoridades do Rio de

Janeiro expedem o Decreto 3.378, que praticamente homologa os “avanços” do Paraná sobre

o território contestado por Santa Catarina. Os limites foram estabelecidos pelo Rio Saí-Guaçu,

Serra do Mar e Rio Marombas, desde a sua vertente até o Canoas e, por este, até o Uruguai.

Pelo Aviso de 14 de janeiro de1879, foi mudado o Rio Marombas pelo Rio do Peixe,

deixando Curitibanos e Campos Novos para Santa Catarina. Esta divisão foi respeitada por

Santa Catarina e pelo Paraná até o Acordo de 1916. Desta forma, o Paraná recuperou o

sudoeste (Palmas e Clevelândia) e perdeu as terras da vertente do rio Uruguai. O Paraná

contentou-se com 20.000 km2 e Santa Catarina com 28.000 km2.

De acordo com Cabral (1979), a questão de limites teria provocado as maiores

dificuldades ao progresso da região, como o desprestígio mútuo das respectivas autoridades.

Contestando-se reciprocamente o direito à posse do extenso território, nenhum dos dois

Estados promoveu, de forma eficaz, o desenvolvimento da região. Limitavam-se apenas a

tomar medidas de caráter administrativo e policial que pudessem servir à afirmação do uti

possidetis, ou o domínio das terras.

Faltava a esta sociedade a solidez de um alicerce econômico, ocasionando o excesso

de agregados de domínio pastoril, conduzindo para a região um número de habitantes sem

profissão definida, gerando a marginalidade. Além disso, ao lado dos elementos humanos

ainda sadios, oriundos das fazendas de onde se fizeram excedentes, outros elementos, saídos

das sarjetas das grandes metrópoles, vindo com a horda das revoluções ou para o trabalho

compulsório do leito ferroviário, transmitiram toda a gama de males que caracterizaram as

doenças sociais (CABRAL, 1919).

No início do século XX, esta região, também conhecida como o território de “Serra-

Acima”, era cruzada por trilhas de burros, em todos os sentidos, numa complexa rede de

picadas e atalhos. Por essas picadas seguiam boiadas, grupos de cavaleiros em viagem com

suas mulas carregadas, varas de porcos, além de grupos de pessoas a pé. Toda a vida

econômica e social da área centralizava-se em determinadas vilas que cresciam lentamente,

com o movimento comercial e a afluência de gente, formando alguns arraiais prósperos e

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umas pequenas cidades compostas por dezenas de milhares de habitantes e desde então, com

tradição secular.

União da Vitória, ou Porto União, ou simplesmente o Porto, a principal cidade

paranaense de Serra-Acima, cobiçada e reinvindicada por Santa Catarina, contava com

quinhentas casas e dois mil e quinhentos moradores (QUEIROZ, 1966). Ao se estabelecer

nesta cidade, como proprietário da Fazenda Passo do Iguaçu, o “coronel” Amazonas

Marcondes, adquirindo também um estabelecimento com lanchas e canoas, tornou-se um

grande intermediário do sal de que necessitavam os distantes criadores de gado. Desta forma,

mandou construir um maior número de embarcações e inaugurou a navegação fluvial no Rio

Iguaçu, a título de baratear o transporte de gêneros de Curitiba.

Já em inícios do século XX, o “coronel” Amazonas dividiu em lotes grande área da

Fazenda Passo do Iguaçu, vendendo-os para colonos de diversas nacionalidades.

União da Vitória era uma região pobre em 1912. Predominavam os “mazombos” ou

filhos de imigrantes acaboclados, que habitavam a baixada, uma zona frequentemente

inundada pelo rio. As casas eram simples e de acordo com Queiroz (1966:33), ...”todo o

casario era de madeira, com telhados em vértice agudo denotando influência norte-européia.

A população em geral descendia de poloneses. ... a cidade havia se constituído em notável

centro de comércio para os sertões palmenses”. Nela não havia nenhuma indústria de vulto,

salvo o beneficiamento elementar da erva-mate, que transitava por ali, dos sertões ao litoral.

O Paraná disputava uma faixa onde se localizava a vila de Canoinhas. Logo após a

Revolução Federalista (destaca-se o episódio do cerco da Lapa, em 14 de janeiro de 1894),

esta vila transformou-se numa república livre, para onde se dirigiam os velhos “maragatos”

derrotados do Rio Grande do Sul, assim como criminosos do Paraná e de Santa Catarina, para

evitar os tribunais ou a justiça privada.

Entre esta população marginal, destacou-se a figura de Joaquim Branco, que, tendo

sido indiciado por homicídio, viu-se obrigado a abandonar sua propriedade em Rio do Bugre,

indo residir em Canoinhas. Quando o monge João Maria apareceu por ali, foi convidado a

estabelecer-se junto de sua casa, onde passaram a concentrar-se centenas de pessoas. Foi

levantada no local uma cruz e uma capela, que deram origem à vila Santa Cruz de Canoinhas.

Tornou-se a “oficina” oficial do monge, de acordo com o jornal Folha do Comércio, de

Florianópolis, de 10 de outubro de 1912.

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Desta forma, sem uma autoridade local, Canoinhas continuou isolada de ambos os

Estados, Paraná e Santa Catarina, “sendo um local absoluto, onde reinava a anarquia ao par da

ignorância de uma gente fanática e pobre” (Folha do Comércio, 12 de outubro de 1912).

Do lado paranaense, depois de União da Vitória, a vila mais importante era Palmas,

com dois mil e quinhentos habitantes. Era o movimentado centro comercial da época.

Exportava erva mate, gado bovino e equino, lã, crinas, queijos e carnes. Importava sal, arroz,

café, farinha, fazendas, ferragens e louças. (QUEIROZ, 1966).

De acordo com uma rígida hierarquia social, as zonas de pastorio – extrativas e

agrícolas – integravam-se na vilas ou fora delas, através de relações que caracterizavam

preponderância por parte dos grandes proprietários rurais, gerando uma dependência pessoal

por parte dos sertanejos. Setembrino de Carvalho, comandante da expedição militar mais

importante, já em 1914, observou a respeito da estrutura social de “Serra-Acima”: “a

diferença de condição entre o proprietário e o camarada era e é de tal sorte manifesta que suas

relações em muito se assemelham às que deveriam existir entre escravos e senhor”

(SETEMBRINO DE CARVALHO, in QUEIROZ, 1966:37).

Nesta região contestada, era reconhecido um esquema básico de hierarquia social,

expresso numa escala de valores sociais, em relação às quais sempre se encontravam pontos

de referência para avaliar o prestígio inclusive daqueles indivíduos que desempenhavam as

ocupações mais raras. Era assim escalonada a sociedade sertaneja:

a) coronéis

b) fazendeiros

c) criadores ou meio fazendeiros

d) lavradores

e) agregados

f) peões.

Cada município tinha o seu chefe político ou “manda-chuva”, que era o “coronel”

por excelência, ligado por “laços de colaboração” e ajuda mútua aos demais “coronéis” da

área e do governo do Estado. Na terra dos “coronéis”, os agregados e os peões podiam servir-

se dos ervais existentes, que garantiam a subsistência, sem maiores problemas. Com a

Proclamação da República, em 1889, a propriedade das terras públicas passou do governo

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federal para os Estados, promovendo com isso a escassez das terras devolutas. Foi assim que a

erva-mate teve seu valor comercial reconhecido e os “coronéis” passaram a coibir a “coleta

abusiva do mate” em terrenos de sua propriedade.

Com estes argumentos podemos considerar que esta região era caracterizada por um

grupo minoritário e proprietário de vastas porções de terras, de um lado. E de outro, um grupo

majoritário, que era formado de ervateiros, ou seja pequenos proprietários ou posseiros,

peões-ervateiros e agregados. A pobreza era generalizada, e de acordo com Auras (2001), “o

cotidiano transcorria através da exploração dos mínimos vitais”.

No que se refere às relações sociais, existia o sistema de “compadrio”, cujo ritual era

legitimado pela Igreja, que tratava de estabelecer um “trato igualitário entre as partes, mas que

a nosso ver apenas evidenciava uma estrutura de dominação. Este catolicismo rústico do

Contestado, desvia o contexto ortodóxico da Igreja Católica, aumentando assim a importância

da figura do primeiro monge João Maria, que vai preencher esta lacuna social, fazendo o

papel de uma autoridade justa, representando o médico, o padre, o professor, o curandeiro,

anunciando a vinda de novos tempos, mais felizes e promissores.

E assim, essa terra-de-ninguém, sem lei nem justiça, mal servida de comunicações,

sem aparelhamento policial e judiciário eficiente, tornou-se o meio ideal para o

desenvolvimento da rebeldia.

1.1 SURGIMENTO DO CONFLITO

Figura 2 – Area conflituada Fonte: http://br.geocities.com/joatan74/sc/contestado09.jpg

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Segundo Rosa Filho (1998), em 1893, jornais catarinenses e da Corte fizeram uma

série de críticas infundadas a respeito de uma possível invasão do Corpo Policial do Paraná,

incitando os cidadãos catarinenses a defenderem suas propriedades, já que o governo

paranaense se mostrava impassível, durante décadas, a respeito dos problemas dos limites

entre os Estados. Estes fatos, embora amainados pela imprensa paranaense e carioca, foram o

começo das agitações nos sertões contestados, marcando o início de seu movimento armado.

Era o sensacionalismo gerando confusão em torno da polêmica, que vinha se

alastrando há longos anos. Aos olhos dos paranaenses, não se tratava de uma horda de

marginais, reunida em torno de um aventureiro e sim a invasão dos catarinenses organizados,

para acabar com o uti-possidetis, elemento de convicção dos direitos do Paraná sobre as terras

contestadas.(CABRAL, 1979). O início das pressões da imprensa para o uso da força policial

se deu em 25 de setembro de 1912.

O Diário da Tarde, em sua edição de 1º de outubro de 1912, estampou em sua

primeira página: “Invasão Catarinense. O Paraná se levantará como um só homem para

defender seus direitos, embora odeie o derramamento de sangue.”(in ROSA FILHO,

1998:17).

O Comércio do Paraná, em sua Chrônica do Dia, de autoria de Generoso Borges,

comentava a vinda dos sertanejos nestes termos:

Sejam, portanto, agentes catarinenses pacíficos rezadores ou bandidos perigosos, não podem ser recebidos em nosso território como elementos aproveitáveis. E nesse caso, o Regimento de Segurança terá de fazer uma manobra a sério para que a tranqüilidade dos habitantes da zona paranaense continue na sua estabilidade.(in ROSA FILHO, 1998:17).

Além da questão de limites, outros problemas vieram a colaborar para o surgimento

da guerra. São eles:

a) a concessão ilegal de terras feitas pelos governos do PR e SC, que procuravam

criar vilas naquela faixa de terra, para poder garantir a sua posse.

b) o surgimento dos coronéis gananciosos, que exerciam forte influência na região.

Formavam sua guarda pessoal com os caboclos armados, constituindo verdadeiros grupos

para-militares.

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20

c) a construção da estrada de ferro São Paulo-Rio Grande que culminou com a

contratação de numerosa mão de obra. Com o final da construção da ferrovia, foi crescente o

desemprego, gerando a marginalidade.

De acordo com Auras (2001), “em 1885, o engenheiro João Teixeira Soares concluiu

a ferrovia Curitiba-Paranaguá, vencendo terrenos cheios de desafios. Como o plano de Viação

do Império previa a construção de uma estrada de ferro ligando o interior das províncias

sulinas, em 1887, Teixeira Soares contratou uma equipe de técnicos e exploradores para

efetuar um reconhecimento da área compreendida entre dois pontos extremos, previamente

escolhidos: ao norte, a vila de São Pedro de Itararé (atual cidade de Itararé), na província de

São Paulo, ao sul, a vila de Santa Maria da Boca do Monte (atual localidade de Boca do

Monte, cerca de 30 km da cidade de Santa Maria, RS)”.

De acordo com Thomé (1980:48-49),

“... em setembro de 1889 o engenheiro requereu a concessão para a construção e posterior exploração da ferrovia, que partiria de São Pedro do Irararé e atingiria Santa Maria da Boca do Monte, solicitando os benefícios estabelecidos em lei e fixando uma exigência fundamental: a cessão gratuita das terras marginais, para serem colonizadas.

A concessão lhe foi dada através do Decreto no. 10.432, de 09 de novembro de 1889,

por D.Pedro II. Levantado o capital necessário com os investidores estrangeiros, a obra foi

iniciada em 1890, mas em junho deste mesmo ano parte da concessão foi transferida para

outra empresa, que assumiu o longo trecho de Itararé a Cruz Alta.

Segundo este mesmo autor, a linha tronco original, compreendida entre Itararé e

Santa Maria chegava aos anos de 1905 e 1905, com apenas 599 km abertos ao tráfego, quando

a concessão original dava o prazo de cinco anos para a oconclusão de todos os 1.403 km.

Exatamente neste momento, o então Ministro de Viação e Obras Públicas – o

catarinense Lauro Muller – promoveu a vinda de Percival Farquhar, empreendedor norte-

americano, “que fundou a Brazil Railway Company, empresa que adquiriu o controle

acionário da Companhia Estrada de Ferro São Paulo – Rio Grande”. (THOMÉ in AURAS,

2001:36).

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1.2 PROBLEMAS SOCIAIS E A BRAZIL RAILWAY COMPANY

Com a expansão da área cafeicultora, surgiu a necessidade de interligar os núcleos

urbanos com a região sul do Brasil, para que fosse possível o abastecimento da região. É neste

momento que a Brazil Railway Company, holding norte-americana, pertencente ao milionário

Percival Farqhuar, se instala na região, através da Southern Brazil Lumber & Colonization

Co. e, além do direito de terminar a estrada de ferro, adquire a concessão de exploração de 15

km de cada margem da estrada, extraindo a madeira da região e comercializando-a no Brasil e

no exterior. Além disso, a empresa ganha o direito de revender os terrenos desapropriados às

margens da estrada de ferro. Esses terrenos seriam vendidos preferencialmente aos imigrantes

estrangeiros que formavam suas colônias no sul do país.

Farquhar, após ter realizado investimentos em Cuba, Guatemala e El Salvador, nos

setores de bondes e energia elétrica, passa a atuar no Brasil a partir de 1904, incentivado pela

política do governo republicano.

Em 1906, foi realizada na cidade do Rio de Janeiro, a 3ª. Conferência Pan-

Americana e, segundo Singer (1977) nessa ocasião:

Propôs-se a construção de uma ferrovia pan-americana, o que entusiasmou Farquhar e o levou a conceber o seu projeto mais grandioso: o de construir um grande sistema ferroviário unificado, sob sua direção, na América do Sul. Para dar início à execução deste plano, Farquhar fundou, com apoio de um sindicato poderoso, (...) a Brazil Railway Co., com um capital de 50 milhões de dólares. Esta companhia estava destinada a ser a firma holding do seu império ferroviário. No mesmo ano de 1906, Farquhar adquiriu para a Brazil Railway a Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande, que tinha a concessão que permitia interligar todo o Sul do Brasil, além de terras no Paraná e Santa Catarina, numa extensão de 6 milhões de acres, para fins de colonização.(...) Farquhar tinha esperança de desenvolver a agricultura comercial na

Figura 3 - Locomotiva da Estrada de Ferro Fonte: http://br.geocities.com/joatan74/sc/contestado06.jpg

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área (tendo em vista abastecer São Paulo) e a exportação de madeira, via Paranaguá”. (SINGER, 1977:381)

Para a construção desta parte restante da ferrovia, que deveria ser rápida (havia sido

concedido mais três anos para o término), a empresa, prometendo salários compensadores,

contratou cerca de oito mil homens, da plebe do Rio de Janeiro, Santos, Salvador e Recife,

que com a hierarquia imposta por um “feitor”, trabalhavam por empreitada. Existem inúmeros

relatos sobre conflitos armados entre o corpo de segurança da empresa e os trabalhadores,

pela falta de pagamento e desmando dos feitores...“A companhia não efetuava os pagamentos

em dia e as condições de trabalho eram mínimas. As manifestações de protestos dos operários

eram reprimidas severamente pelos homens da segurança, que empregavam a violência com

tranquilidade”. (THOMÉ (1980:81)

Estes aspectos estão sendo levados em conta, neste trabalho, para que seja

evidenciada a multiplicidade e variedade do “Complexo do Contestado”, onde fatores internos

e externos contribuíram para o agravamento dos problemas do local, e para que possamos

mostrar a importância do monge neste espetáculo de desajuste e abandono institucional.

Figura 4 - :Tropa de segurança montada pela Lumber Fonte: http://br.geocities.com/joatan74/sc/contestado08.jpg

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A Lumber providenciou ainda a construção de duas grandes serrarias, uma em Três

Barras, considerada a maior da América do Sul, e outra em Calmon, dando início à

devastação da imensa riqueza da região. De acordo com Rosa Filho,

A flora do Contestado era riquíssima e se impunha pela extrema variedade de formas e porte dos preciosos espécimes de suas selvas. A danosa devastação das matas era incessante. Todos os pinherais, imbuias e outras madeiras de lei abundantes na área, foram derrubadas e exportadas para outros países, com lucros fabulosos, ocasionando o desequilíbrio ecológico da região.( ROSA FILHO, 1998:12).

Não somente a construção da ferrovia e a apropriação de terras, num trecho de 30 km

de entorno em toda a sua extensão, foram suficientes para os gananciosos exploradores. Eles

queriam sempre mais.

1.3 OS CAMINHOS DA MISÉRIA

Enquanto os latifundiários e as empresas norte americanas passaram a controlar a

economia local, formou-se uma camada composta por trabalhadores braçais, caracterizada

pela extrema pobreza. Esta situação foi agravada ainda mais com o final da construção da

Figura 5 – Seguranças da Lumber Fonte: Acervo Casa da Memória – Curitiba/PR

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ferrovia, elevando o nível de desemprego e de marginalidade social. Essa população

submetia-se cada vez mais aos mandos e desmandos dos coronéis e da rígida estrutura

fundiária, que não alimentava nenhuma perspectiva de alteração da situação vigente. Esses

elementos, somados à instabilidade e à desapropriação de terras, determinaram uma

transformação brutal. O assassinato entre aquela gente tornou-se um meio fácil de resolver

qualquer pendência, por menor que fosse.

Segundo Rosa Filho ,

Na realidade, a ferrovia veio oferecer milhares de empregos, mas os sertões do Contestado ficaram infestados dos piores elementos. Quando começaram a correr os primeiros trens pela São Paulo-Rio Grande, aumentou a ganância dos exploradores de terras que vislumbravam a possibilidade de enriquecer ilicitamente.(1998:12).

E foi assim que esta situação foi tomando proporções ameaçadoras, De acordo com

Wachowicz,

Os caboclos do Contestado julgavam-se cercados de inimigos: o governo federal republicano, os coronéis papa-terras e seus capangas, a polícia ilegal dos norte-americanos e as polícias legais dos paranaenses e catarinenses. Revoltava e indignava ainda os sertanejos, o fato do governo federal vender extensas regiões em lotes, a preços acessíveis, a imigrantes europeus que ali se fixavam, nada cabendo a eles próprios, nativos da região. (2001:199).

Desolador era o estado desses sertanejos. E, sentindo-se abandonados por todos,

começaram a se revoltar e a culpar o regime republicano pela desgraceira instaurada. Este

Figura 6 - Grupo de caboclos dispostos a se defender. Fonte: http://br.geocities.com/joatan74/sc/contestado13.jpg

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25

estado de tensão facilitou o surgimento de um “líder” que os conduzisse. E ele surgiu na

pessoa de Miguel de Lucena, o monge José Maria.

1.4 MONGES E DEVOTOS

Vale ressaltar que grande número de messias, ou indivíduos que se tornaram o centro

dos movimentos milenaristas, foram conselheiros ou médicos, particularmente eficazes, no

seu sacerdócio. Sendo assim é facil compreender que como eles salvavam a vida de

numerosos indivíduos, era natural que pensassem serem eles os salvadores dos homens.

Os estados do sul – Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul – eram percorridos

desde os meados do século XIX até 1912, por figuras exóticas que a população sertaneja

chamava de monges. Viviam na floresta, dormiam em grutas, com barba crescida, um certo

desleixo, sandálias de couro cru, barrete de pele de onça, com um bordão e um terço

pendurado no pescoço, impressionavam as mentes do povo interiorano. De acordo com

Wachowicz (2001:200), foram três:

O primeiro foi João Maria d´Agostini, imigrante italiano, chegado ao Brasil em 1844. Ao que parece, foi realmente um frei da ordem de Santo Agostinho, pois pregou na matriz da Lapa, em 1845. Percorria os estados do sul, exortando os homens à prática das virtudes e do bem, receitava ervas como remédio a quem solicitasse, dava conselhos aos aflitos que o procuravam e fincava cruzes nos caminhos. Morreu não se sabe como nem quando. Os caboclos atribuíram-lhe milagres e passaram a chamá-lo São João Maria. Para eles, não era possível que um homem tão bom e santo pudesse desaparecer.

Figura 7 - O monge João Maria Fonte http://www.historianet.com.br/imagens/contestado2.jpg

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De acordo com Queiroz (1966), muito mais do que um simples indivíduo, este

primeiro monge – João Maria – tornou-se um mito e um símbolo. A ele foram atribuídos

milagres e prodígios, adaptando-se essas histórias às características de variantes místicas,

peculiares aos municípios interioranos da época, o que caracteriza um “processo de assunção

de personalidade mítica”.

Segundo o autor, isto significa que o indivíduo assume o papel do mito e se identifica

com ele, chegando a perder, em certos casos, a consciência original de si próprio, embora sem

deixar de ser ele mesmo, ou seja, o “companheiro ímpar do povo da serra”. Diante da

insegurança e da violência do cotidiano, a religião era o único privilégio destes pobres

sertanejos.

Essa figura característica do interior era abundante, sendo representada por

“especialistas do sagrado”, tais como curandeiros, benzedores, puxadores de reza, capelões

leigos, entre outros que permitiam ao povo do sertão instituir uma ordem de crenças,

formulando um estatuto do homem sertanejo, num resgate de suas próprias identidades. Era o

catolicismo popular do mundo rústico do Contestado.

Não existem relatos de que João Maria tenha sido profeta, ou que em algum

momento tenha anunciado o fim do mundo. Este fato ficou ao encargo do segundo monge,

que assumiu logo após a morte do primeiro.

Na verdade, era outro João Maria. Chamava-se Anastás Markaff, um imigrante

"nascido no mar e criado em Buenos Aires". Pregava a penitência e profetizava calamidades,

tais como o fim do mundo. Dizia que esta calamidade maior viria precedida de “muitos

castigos de Deus”, como pragas de gafanhotos e de cobras, uma epidemia de chagas e uma

escuridão que duraria três dias.

Muitos sertanejos acreditavam poder escapar das futuras desgraças anunciadas se

rezassem muito ou se usassem pendentes, como patuás. Declarava que a República era

“ordem do demônio”, enquanto a Monarquia era a “ordem de Deus, atribuindo aos sertanejos

rústicos e ignorantes o conceito de monarquia como um sistema de vida oposto ao regime dos

“coronéis”. Tal como o primeiro, não deixou rastro. Desapareceu ainda antes do final da

primeira década do século XX.

Ex-soldado do Exército, desertor, o terceiro monge era mais um rebelde do que um

místico. Surge exatamente quando, em 1911, os primeiros posseiros, que ocupavam a faixa

concedida à Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande, passam a ser expulsos. Miguel Lucena,

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27

veio a se intitular José Maria, dizendo-se irmão do falecido primeiro monge. Ao contrário dos

dois monges anteriores, gostava da popularidade e tinha na cintura uma espada de combate.

De acordo com Queiroz (1966), o Jornal Folha do Comércio, de Florianópolis,

datado de 27 de setembro de 1912, registrou: “Desde João Maria as gentes do interior estão

esperando um novo messias”.

E assim surgiu este novo monge, um curandeiro de ervas que sabia ler e escrever e

conhecia as propriedades medicinais das plantas. Instituiu a Farmácia do Povo e entregava

receitas por escrito, ajudado por vários secretários. Em pouco tempo, aliciou cerca de 700

fiéis ao seu redor: nada mais do que os descontentes e injustiçados, perseguidos e

desempregados, armando-os com espadas, facões e garruchas. Criou os redutos de resistência,

compondo uma guarda pessoal de 24 sertanejos, a quem chamou “os doze pares de França”,

por influência da leitura de da obra de Carlos Magno.

A bibliografia não elucida se os “Pares de França” surgiram por inspiração de Carlos

Magno – considerado como a leitura mais importante da época – ou se por influência das

“Cavalhadas”, festa cristã, onde os personagens se baseavam nos cavaleiros da Távola

Redonda. De qualquer forma, a nova “Instituição Pares de França”, dos redutos, foi

modificada, não em seu tipo de organização, e sim no seu desempenho.

Foram se transformando numa guarda de honra, especializada em manejo de arma

branca, pronta a intervir no corpo-a-corpo dos embates, nas horas decisivas. Formaram um

núcleo selecionado da polícia interna dos redutos, protegendo os comandantes e mais adiante,

era a força que se encarregava de aplicar o terror.

Os “Pares de França”, de acordo com Queiroz (1966), eram formados por vinte e

quatro homens, inclusive o seu comandante, mais o “tamboreiro”, aquele que marcava o

compasso da tropa. Eram armados de garrucha e facão, que sempre constituíram “as armas do

pobres”. Cada integrante segurava uma bandeira branca com uma cruz verde no centro, que

servia para identificá-los. No entrevero, era jogada na face dos adversários, facilitando assim

o seu lado, na luta. O comandante não dava ordens verbais e era seguido cegamente pelos

demais. O “tamboreiro” não transmitia mensagens, sendo o som do tambor o compasso

necessário para excitar os combatentes.

Sua ordem era clara: “não atacar, mas resistir”. Foi assim que o número de seus

adeptos foi tomando vulto, crescendo rapidamente. Entre rezas, ameaçava invadir as cidades

vizinhas, organizando a população à maneira militar.

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Segundo Auras (2001:41)” a expulsão destes posseiros, iniciada em 1911, conferiu

feição e direção a essa numerosa massa marginalizada que, de repente, viu-se destituída da

condição de produzir regularmente seus próprios recursos materiais de subsistência”.Ao

mesmo tempo, as condições vigentes não eram capazes de absorver essa populosa mão de

obra ociosa, já que a produção de erva-mate estava escasseando, em virtude de altas taxas de

exportação.

Foi assim que, organizados e perseguidos, tantos pelas condições adversas, quanto

pelos coronéis e em especial pelo “coronel Albuquerque”, foram rechaçados, pelo fato do

monge não ter atendido um apelo deste coronel, no sentido de curar uma familiar doente.

Este fato ganhou uma enorme repercussão, a nível nacional. Tendo sido o

governador de Santa Catarina ter sido avisado de que os “fanáticos” estariam instaurando uma

monarquia em Taquaruçu, imediatamente enviou um destacamento a Curitibanos.

Desta forma, o monge e seu “exército”, pelo fato deste monge ser oriundo do Irani e

de ter amigos que pudessem lhe dar guarida, seguiram para o Irani. Os coronéis, preocupados

com o ajuntamento de gente armada, pediram ao governo uma solução.

Seguem abaixo algumas das manchetes do jornal Diário da Tarde, de Curitiba:

Dia 25 de setembro de 1912:

- UM NOVO CANUDOS? JOÃO MARIA REVOLUCIONÁRIO QUER

DERRUBAR A REPÚBLICA – OS ANTECEDENTES DO MONGE.

Dia 26 de setembro de 1912:

- UM NOVO CANUDOS? OS FANÁTICOS CHEFIADOS PELO MONGE JOÃO

MARIA – O MOVIMENTO ALASTRA-SE – A ATITUDE DO GOVERNO FEDERAL –

MOBILIZAÇÃO DAS FORÇAS DO EXÉRCITO – ESTÃO PRONTOS 25 CANHÕES –

OS FANÁTICOS ARMAM-SE ABANDONANDO CASAS E FAMÍLIAS.

Foi assim que os curitibanos receberam a notícia de que “os fanáticos” se

estabeleceram em Irani, cuja jurisdição era reinvindicada pelo município de Palmas, que

pertencia ao Paraná. Para defender o seu território o então Governador do Paraná, em 1912,

Carlos Cavalcanti determinou a partida imediata do Regimento de Segurança do Estado.

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CAPÍTULO 2 – A ORGANIZAÇÃO DO MOVIMENTO

2.1 O CORONELISMO

A região do interior de Santa Catarina e Paraná desenvolveu-se muito lentamente a

partir do século XVIII, como rota de tropeiros que partiam do Rio Grande do Sul em direção à

São Paulo. No século XIX algumas poucas cidades haviam se desenvolvido, principalmente

por grupos provenientes do Rio Grande do Sul, após a Guerra dos Farrapos, dando origem a

uma sociedade baseada no latifúndio, no apadrinhamento e na violência. Após a Proclamação

da República, com a maior autonomia dos estados, desenvolveu-se o “coronelismo”.

Isso significava que cada cidade possuía seu chefe local - grande proprietário de

terras - que se utilizava de jagunços e agregados para manter e ampliar seus eleitores,

influenciando a vida política estadual. Havia ainda os conflitos entre os coronéis, envolvendo

as disputas por terras ou pelo controle político no estado.

Dois fortes golpes foram dados contra a população rural do país ainda no século

XIX: a Lei Agrária de 1850 e a Constituição de 1891. Até a imposição da primeira, o simples

apossamento de uma área garantia sua propriedade. Após a lei, as terras passaram a ser de

posse e administração do governo, que faria o que bem entendesse para um melhor

"desenvolvimento" do país. Na Constituição, as terras do Estado passaram a ser de

responsabilidade dos governos estaduais. Estes, por sua vez, distribuíram essas terras aos

coronéis mais alinhados. O sertanejo passou a ser constantemente expulso de sua terra, por

não possuir registro nem em cartório, nem de sesmaria. (FAUSTO, 1995).

Os coronéis também costumavam vender pedaços de terra para os sertanejos. O

problema é que, após o pagamento da última parcela, um grupo paramilitar do coronel

expulsava-os do lote recém-adquirido, ocasionando um conflito pronto para explodir a

qualquer momento.

Um coronel desta região chamado Fabrício Vieira armou os vaqueanos com

“winchesters” formando uma milícia com pretensões de lutar junto com a força militar. Uma

verdadeira tropa de mercenários dispostos a combater as arruaças, contribuindo para

emboscadas de graves consequências, que tiveram reflexos para soluções pacíficas.

Cometeram barbáries e selvageria contra os sertanejos aprisionados, sem o consentimento do

Comando Militar.

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Mais tarde, estes mesmos “fabricianos” vieram a ser distribuídos entre as colunas de

ataque, sendo finalmente enquadrados nos princípios da hierarquia e da disciplina.

(PEIXOTO, 1995).

2.2 CONFRONTO CONTESTADO x JUAZEIRO x CANUDOS

A experiência da guerra e das lutas civis era familiar aos habitantes do sertão do

planalto catarinense. De modo semelhante ao que aconteceu nos sertões do Nordeste e em

outros sertões brasileiros, seguiram-se disputas contra a terra, entre os clãs familiares, em

seqüência às lutas contra os indígenas. Desde o século XVIII a sociedade sertaneja incorporou

padrões de violência endêmica, que vieram à tona de modo ostensivo, por ocasião da Guerra

do Farrapos, além de diversos outros entreveros, ligados à disputa de limites. A estrutura

marcante em todas estas lutas foi o caudilhismo e o coronelismo, que fixava as linhas da

participação dos sertanejos.

De acordo com Fausto (1995), de modo direto – nos casos de Juazeiro e do

Contestado – e menos diretamente – no caso de Canudos – registra-se a presença de certas

relações sociais que assumem uma posição de relevância. Padres e “fiéis”, “coronéis” e

clientes, padrinhos e afilhados, beatos e seguidores, “santos” e devotos – estes são os pares

hierarquizados de relações que definem alguns laços cuja importância, tomados

separadamente, ou nas conexões que entre si mantêm, justifica uma tentativa de análise que,

possivelmente, poderá contribuir para a compreensão desses fenômenos.

Pode-se destacar, nesta discussão, a relação “coronel-cliente”, conexão que só se

mantém pela força de um laço externo: aquele que liga o coronel à oligarquia e ao mesmo

tempo, e por um laço interno: o sertão, com a garantia da estrutura patrimonialista de

dominação. A ruptura de um desses laços seria suficiente para tornar inviável a persistência da

figura do “coronel”.

Segundo Queiroz (in PEIXOTO, 1916:11)

Todo coronel era, via de regra, um dos maiores fazendeiros da sua zona de influência. Os Amazonas Marcondes em União da Vitória, os Arthur de Paula nas beiras do Iguaçu, os Fabrício Vieira de tradição afamada, os Juca Pimpão em Palmas e inúmeros chefes e chefes políticos das hostes paranaenses; os Thomaz Vieira em Canoinhas, os Chiquinho de Albuquerque em Curitibanos, os Henrique Rupp em

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Campos Novos e outros das bandas catarinenses emparelhados àqueles, são todos coronéis da roça, mandões políticos uns e proprietários despóticos outros, em regra preocupados com a dilatação de suas terras e o crescimento complicado dos bandos de seus animais”.

Sob este ponto de vista, a situação criada no Contestado torna-se curiosa, pois ali

dois “coronéis”, figuras centrais na fase inicial vieram a dividir entre si papéis opostos, mas

complementares. Um deles, Henriquinho de Almeida, era ligado por laços de família ao

mandonismo local pré-republicano e tido como “amigo dos pobres”: muitos de sua clientela

estavam entre os rebeldes. Mas era chefe da oposição. O outro, coronel Fabrício, adventício

bem sucedido, era situacionista e relacionado por laços pessoais com elementos da liderança

da oligarquia estadual. No desenvolvimento do conflito, a atuação política de ambos foi

neutralizada pelo comando militar. Romperam-se, por este modo, os vínculos que um deles

mantinha com os sertanejos rebelados.

A figura típica do beato, peculiar ao catolicismo rústico do Nordeste, encontrava, na

ocaião um correspondente no monge José Maria, cuja atuação no sul foi semelhante à de

Antonio Conselheiro. Uma das características que singularizou o movimento do Contestado

com relação a Juazeiro e a Canudos, foi a ausência da personalidade central e marcante de um

líder. José Maria, em Santa Catarina, foi somente o seu iniciador, tendo morrido já no

primeiro combate, (Irani, outubro de 1912), como veremos adiante.

É considerado que os movimentos de Juazeiro, Canudos e Contestado manifestaram-

se no contexto da subcultura rústica. A partir do reconhecimento desta conjuntura, é possível

encontrar um nível intermediário de generalizações que se situe entre as conexões histórico-

concretas e a generalizações sociológico políticas.

Desta forma, podemos considerar que a figura do padre Cícero, em sua condição de

padre, exprime a tensão entre o mundo do sertão e as estruturas eclesiásticas e políticas.

Manter-se bem com a Igreja e, ao mesmo tempo, garantir a permanência da imagem de beato,

inseparável do reconhecimento da legitimidade religiosa dos milagres, foi um dos maiores

problemas que enfrentou. Sua atuação política assumiu características bem peculiares ao

coronelismo.

Enquanto “padrinho”, Cícero mantinha encobertas as circunstâncias criadas pelas

condições de padre e de coronel. Como “beato”, poderia superar as tensões peculiares às

condições de padre, de coronel e de padrinho socialmente superior, marcadas por

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determinações externas do sertão. É após sua morte que alcança a veneração usualmente

dedicada aos “santos” do catolicismo popular.

Ainda, de acordo com Fausto (1995), a religião de Antonio Conselheiro era

estritamente ortodoxa, a despeito de seus adeptos que mantinham os padrões da religiosidade

rústica. Tanto em Cícero, quanto em Conselheiro, a ruptura com a Hierarquia partiu da

própria Hierarquia. Do primeiro pode-se dizer que era um “padre com seguidores”, com uma

inclinação fortíssima para a condição de beato. Do segundo, um “beato com fiéis”, com uma

forte tendência para a condição de padre.

No caso do Contestado, o processo de ruptura deu-se em nome de uma santa religião,

feita de “verdades escondidas pelos padres”, onde uma afirmação subversiva foi radical,

estabelecendo-se uma ruptura do laço “coronel-cliente”, acompanhada de uma afirmação

autônoma de poder.

Desta forma, a morte do monge eleva-o à condição de “santo”, fundando-se a partir

daí uma irmandade, onde não havia coronéis nem padres. Onde a condição de irmão

suplantava em importância a condição de compadre.

Esta é uma breve comparação entre os três movimentos que permite identificar

elementos de homogeneidade entre estes eventos, como um lastro profundo e traço de união

entre diferentes regiões do país, bem como suas singularidades, que os distinguem, além das

familiaridades entre os contextos específicos sociais e históricos onde se desenvolveram. Falta

uma bibliografia especializada no assunto, o que permite um aprofundamento sociológico

muito maior. Nos detivemos aqui, por não ser este o objeto específico de nossa pesquisa,

embora de relevância primordial, para podermos entender a contextualização do problema

social do Contestado.

2.3 FORMAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES MILITARES NO BRASIL

Durante a primeira República, a evolução das forças armadas e seu papel político

foram caracterizados pela intensa luta do Exército para tornar-se uma organização nacional

capaz de planejar e executar uma política de defesa nacional, em seu sentido mais amplo.

Segundo Fausto (1995), esta luta teve várias fases e aspectos: seu ponto crítico foi a

introdução do alistamento universal, com o conseqüente afastamento da Guarda Nacional

como organização rival. O controle semiprivado da força armada, característico da sociedade

ainda predominantemente rural, legado pelo Império, é com isto eliminado. Em contrapartida,

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33

surge um novo inimigo, de origem semelhante ao primeiro, nas polícias militares, controladas

pelas oligarquias estaduais. A superação deste novo obstáculo não seria conseguida neste

período.

Outros aspectos importantes desta transformação foram o crescimento rápido dos

efetivos, sua distribuição mais estratégica no território nacional, melhor treinamento de

oficiais e praças, melhor estruturação interna, centralização do processo decisório e

formulação mais clara dos objetivos da organização.

Observa-se ainda, que estas transformações organizacionais se deram em meio ao

envolvimento político dos militares que, em parte, foi influenciado pelas transformações e em

parte as influenciou.

Na fase inicial das permanentes forças militares européias, em que o grau de

profissionalização e especialização ainda era elementar, o recrutamento era uma variável de

grande importância. Através dele se estabelecia a relação do exército com a estrutura de

classes da sociedade.

Tradicionalmente o corpo de Polícia era recrutado entre a nobreza e os praças entre

as classes baixas. Este mecanismo teve importantes conseqüências políticas ao possibilitar a

identificação entre a oficialidade e os grupos politicamente dominantes e o isolamento da

oficialidade em relação às praças.

Entre os exércitos latino-americanos, o brasileiro é talvez o que herdou, em maior

escala, esta tradição européia. O fato de que a independência do Brasil se tenha verificado

sem grandes lutas e sem grande mobilização militar da população fez com que se preservasse

aqui a estrutura do exército português.

A origem nobre de muitos oficiais do exército português na época da Independência,

é denunciada pelo fato de vários deles terem passado pelo Colégio dos Nobres de Lisboa, pela

Academia de Marinha, ou terem pertencido à instituição do cadetismo3. O Colégio e a

Academia exigiam qualidade de nobreza aos que neles quisessem ingressar. O cadetismo,

criado em 1757, tinha por objetivo favorecer a entrada de nobres no serviço militar através da

concessão de privilégios negados a outros grupos sociais. O candidato a cadete tinha que

demonstrar nobreza de quatro costados e, uma vez no exército, recebia logo privilégios de

oficial e vantagens financeiras. O sistema foi abolido em Portugal, em 1832, por ser

3 Rui Vieira da Cunha. Estudo da Nobreza Brasileira I – Cadetes, Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1966 e General Francisco de Paula Cidade, Cadetes e Alunos Militares Através dos Tempos. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1961.

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discriminatório e anticonstitucional, mas sobreviveu no Brasil até o fim da monarquia, apesar

de padecer, aqui, dos mesmos vícios.

Ao fim do Império, como mostra o quadro 1 o exército distribuía-se em função da

defesa das fronteiras do Rio Grande do sul e Mato Grosso e do policiamento de cidades

costeiras. A segurança interna nas províncias do interior era tarefa da Guarda Nacional, já que

os efetivos policiais eram muito reduzidos. Com a República, algumas mudanças se fizeram

na distribuição de tropas. Foram aumentadas as guarnições, indicando uma tendência de

concentrar forças militares onde se concentrava o poder político. A guarda de fronteiras se

mantém apenas no Sul e o policiamento se torna atribuição das polícias estaduais.

A localização das forças do exército no Império obedecia aos dois objetivos básicos

de guarda de fronteiras potencialmente conflitivas e de controle de certos centros urbanos

litorâneos tradicionalmente inquietos, principalmente a própria sede do governo. No sistema

federal republicano, a distribuição desigual das forças tornou-se politicamente mais séria pela

possibilidade de atritos políticos entre as guarnições e os governos estaduais, seja pela

possibilidade de alianças entre estas duas forças contra o governo federal. No quadro abaixo,

é possível comparar a distribuição de efetivos com a da população.

DISTRIBUIÇÃO DE CONTINGENTES DO EXÉRCITO E DA POPULAÇÃO EM 1888 E 1920 (%)

Província/Estado Contingentes População

1888

Soldados

p/ mil h.

Contingentes População

1920

Soldados

p/ mil h.

São Paulo 3,29 9,66 0,28 8,56 14,99 0,80

Minas Gerais 0,96 22,21 0,03 8,82 19,22 0,64

Subtotal 4,25 31,87 0,11 17,38 34,21 0,72

Bahia 5,26 13,39 0,32 3,60 10,89 0,46

Pernambuco 5,54 7,18 0,63 1,64 7,03 0,33

Rio de Janeiro - 6,11 - 5,22 5,09 1,44

Subtotal 10,80 26,68 0,43 10,46 23,01 0,64

Corte/DF 15,65 3,64 1,31 26,18 3,78 9,70

RGS 31,13 6,26 4,08 21,68 7,12 4,26

Subtotal 46,78 9,90 2,29 47,86 10,90 6,15

Mato Grosso 10,80 0,64 13,67 2,60 0,81 4,52

Outros 27,37 30,91 0,73 21,70 31,07 0,98

Total 100,00 100,00 0,82 100,00 100,00 1,40

Quadro 1- Distribuição dos contigentes Fonte: Relatório do Exército de 1888e Censo de 1890 e 1920. (FAUSTO, 1995).

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De acordo com o Quadro 1, o exército distribuía-se em função da defesa das

fronteiras do Rio Grande do Sul e Mato Grosso e do policiamento de cidades costeiras, como

a Corte, Salvador, Recife e Belém. A segurança interna destas e de outras províncias era

tarefa da Guarda Nacional. Com a República, algumas mudanças se fizeram na distribuição

de tropas.

1889 1920 1933

PROVÍNCIAS

ESTADOS

POLÍCIA EXÉRCITO POLÍCIA EXÉRCITO POLÍCIA

AM 197 217 347 394 -

AL 294 81 1.064 428 561

BA 779 712 3.019 1.545 2.376

CE 315 617 858 657 568

Corte/DF 1.096 1.839 3.987 11.236 5.248

ES 85 54 289 703 951

GO 93 437 483 222 559

MA 332 282 399 756 447

MT 37 1.296 734 1.116 220

MG 1.230 113 2.874 3.787 7.494

PA 447 420 827 1.418 217

PB 254 137 1.061 409 981

PN 124 532 670 2.581 1.269

PE 908 651 1.402 706 2.415

PI 152 100 371 514 520

RJ 690 - 694 2.241 1.143

RN 147 87 535 170 366

RS 780 3.658 2.052 9.304 4.404

SC 132 79 589 727 703

SP 1.424 386 7.538 3.675 6.806

SE 376 77 422 254 697

Acre - - 347 79 268

BRASIL 9.892 11.748 30.564 42.920 38.213

Quadro 2 – Efetivos das Polícias Militares e do Exército no período 1889-1933 (Número absolutos) Fontes: Para a Polícia, Relatórios do Ministério da Justiça de 1889 e 1880, Cendo de 1920 e Anuário Estatístico de 1936. Para o Exército, Relatório de 1888, Censo de 1920 e Anuário de 1936. Os efetivos policiais de GO, PE, RJ, RS para 1889, são de 1880. Não há informação para os efetivos do Exército no RJ em 1889 e da Polícia no AM em 1933.(FAUSTO, 1995).

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Os dados do quadro 2 acima, se comparados aos dados do quadro 1, permitirão

verificar que os efetivos policiais cresceram paralelamente aos do Exército, permitindo

constatar que as forças armadas, na primeira República, tiveram um crescimento rápido de

efetivos, tendo sido a sua distribuição sido feita com maior estratégia, dentro do território

nacional. Decorrentes destes fatores atribuimos uma melhor estruturação interna, com melhor

formulação dos objetivos da instituição, que derivaram o melhor treinamento de oficiais e

praças.

2.4 O REGIMENTO DE SEGURANÇA DO PARANÁ

Através da Lei provincial de 10 de março de 1836 foi criada a Companhia de

Municipais Permanentes, a primeira organização policial do território paranaense. Contava na

época com um comandante e cinquenta praças que deviam permanecer na passagem da Mata

do Sertão, protegendo os viajantes.

Somente em 1837 foi autorizado o recrutamento da Companhia dos Destacamentos

de Polícia para a comarca de Curitiba, sendo de responsabilidade de Silva Machado, o futuro

Barão de Antonina.(CARNEIRO, 1995).

Finalmente, com o decreto imperial de 29 de agosto de 1853 foi emancipada a antiga

comarca de Curitiba, sendo criada a Companhia de Força Policial, com um comandante, dois

oficiais, 12 inferiores, 52 praças e uma seção de cavalaria com um sargento, dois cabos e dez

soldados. O primeiro comandante da nossa Polícia foi Joaquim José Moreira de Mendonça e

foram oficiais Manoel Eufrásio de Assunção (que depois comandaria a companhia por longos

anos) e Jocelin Morocines Borba.

Os quartéis ocupados pelo primitivo corpo de Polícia foram três: primeiro, um

barracão de madeira feito especialmente para alojar as praças e guardar o material, na Praça

Municipal, hoje Praça Generoso Marques. Logo depois virou mercado e por fim o Paço da

Municipalidade, hoje Museu Histórico do Paraná, que se encontra em obras de restauração;

segundo, uma casa no alto da Rua Dr.Murici, nas imediações do Clube Garibaldi. Finalmente,

um barracão de tijolos nas esquinas das ruas Marechal Floriano e Marechal Deodoro.

Após ser designado Regimento de Segurança, passou a ocupar o edifício da

Assembléia Provincial, sendo sua área hoje totalmente ocupada pelo Corpo de Bombeiros,

esquinas das ruas Dr.Muricy e Cândido Lopes. Finalmente, em 1900 passa para o edifício

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37

construído especialmente para o Regimento, nas esquinas da rua Marechal Floriano e Getúlio

Vargas.

2.5 MOBILIZAÇÃO DO REGIMENTO DE SEGURANÇA DO PARANÁ

Figura 8 – Embarque da tropa do Regimento de segurança em 1912 Fonte: Peixoto, 1995, vol. II

De acordo com Rosa Filho, no início do mês de outubro de 1912, o governo do

Paraná recebia as primeiras notícias de que o movimento de José Maria começava a agitar a

região de Palmas e que ele havia rumado para os campos do Irani, armando os “fanáticos”

contra a investida das autoridades que tentassem desalojá-los do seu reduto. De Palmas,

insistentes despachos telegráficos pedindo socorro denotavam o receio da população diante da

iminência de um ataque. A imprensa divulgava o evento como sendo uma invasão velada dos

catarinenses. O governo decidiu agir com toda a prudência possível para não cooperar com

injustificados alarmes. Foi assim que ordenou a mobilização de um contingente de praças da

Polícia Militar, oriundas dos destacamentos de Ponta Grossa e União da Vitória, comandado

pelo Tenente José Agostinho da Silva, fazendo-o seguir, com urgência, à Vila de Palmas.

No dia 13 de outubro de 1912, o Cel. João Gualberto foi convocado a comparecer ao

Palácio do Governo, onde o Dr.Carlos Cavalcanti expôs-lhe a sua decisão de encaminhar ao

Irani um força do Regimento sob o seu comando.

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De acordo com a Ordem do Dia, de 13 de outubro de 1912, foi publicado o seguinte

aviso:

Regimento em Marcha Consoante determinação verbal do Excelentíssimo Senhor Doutor Presidente do Estado, sigo com o pessoal do Regimento presentemente na capital, com exceção dos oficiais e praças empregados externos, com destino à cidade de Palmas, pelo que desarrancha o pessoal arranchado.

A composição da tropa em marcha foi constituída por 158 homens, sendo:

Oficiais: Coronel................................................. 01 Majores................................................. 02 (1 médico) Capitães............................................... 03 Tenentes............................................... 03 (1 dentista) Alferes ................................................. 06 (1 farmacêutico) Praças: 1º Sargento............................................ 01 2º Sargento............................................ 11 Furriel ................................................... 01 Cabos ................................................... 22 Anspeçadas .......................................... 21 Soldados ............................................... 85 Corneteiros ........................................... 02 Total.....................................................158

A força saiu de Curitiba conduzindo somente 17 cavalos e 5 muares. O restante dos

animais seria requisitado na região de Palmas.

2.5.1 Desdobramento da Tropa

Juntamente com o Cel. João Gualberto, seguiu também o chefe de Polícia do Estado,

(parente do Governador: típico das oligarquias estaduais). Conforme Peixoto (1995),

informados de que seria alto o número dos sertanejos armados, essas duas autoridades

divergiram quanto à estratégia, desmembrando a Força que seguiu com apenas poucos

homens para o Irani, ao encontro do Monge. O grosso do Regimento seguiu para Palmas.

Devido à literatura insuficiente e discordante – alguns se referem ao chefe de polícia

civil, que teria embarcado junto com João Gualberto, rumo ao Irani, tendo o seu nome por

vezes confundido e por vezes omitido – e outra parte da literatura afirma que a discordância

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seria entre o coronel João Gualberto e delegado de polícia do município de Palmas, que não

desejava que esta cidade ficasse a descoberto, com a possível invasão dos sertanejos.

Travou-se em Horizonte azeda discussão entre João Gualberto e o Chefe de Polícia. Tinha decidido o primeiro seguir logo no rumo do Irani, enquanto este achava que o Regimento de Segurança deveria prosseguir em direção à vila de Palmas, a fim de garanti-la – como estava nos planos iniciais – de um possível ataque dos fanáticos. Naturalmente o Chefe de Polícia cedeu em parte ao comandante da força, mas este não levou toda tropa consigo; deixou um bom troço, provisoriamente, no lugar do Horizonte.(QUEIROZ, 1966:100).

A verdade é que, embora sem dados contundentes que confirmem a gravidade desta

discussão, salientamos que aqui se deu início uma traiçoeira facção de lideranças originando

assim um conflito entre civis e militares que, se tivesse sido contornada, possivelmente os

fatos teriam sido bem diferentes.

De acordo com Peixoto (1995:94),

“Informados de ser muito elevado o número dos homens que defenderiam o monge, caso a tropa tentasse aprisioná-lo, ficaram divergentes, quanto ao modo de agir, o chefe de polícia e o comandante da Força. Deu-se, então, bem próximo do acampamento dos fanáticos, aquém cerca de doze léguas de Palmas, uma séria desinteligência entre os dois, resultando marchar o Coronel Gualberto apenas com sessenta soldados contra os jagunços”.

O comando da força estava com o coronel João Gualberto, que resolveu agir por sua

conta, sem a concordância do chefe de polícia, que seguiu para Palmas com a maior força do

contingente, além dos víveres disponíveis para toda a tropa.

De acordo com Rosa Filho (1998), esta controvérsia deu origem a um sério

desentendimento entre ambos. O Coronel João Gualberto, bastante irritado com a intromissão

do Desembargador Vieira Cavalcanti em suas decisões, resolveu marchar apenas com um

pequeno contingente, ao alcance do do monge e sua gente, já que não acreditava que os

caboclos fossem traiçoeiros, os quais debandaram de Santa Catarina, sem que tivessem

entrado em choque com a polícia daquele Estado. Mas, sua presunção foi errada, pois àquela

altura José Maria, o monge, já estava prevenido a respeito da força que ia enfrentar. De

acordo com o autor, lamentavelmente, o chefe de polícia desconhecia as várias modalidades

das operações contra forças irregulares. Sua atitude demonstrou que o coronel João Gualberto

não merecia a confiança ilimitada do governo.

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2.5.2 Expedição ao Irani

Sendo assim, na manhã do dia 19 de outubro de 1912, foi selecionada a tropa pelos

seguintes policiais militares:

Oficiais: Cel. João Gualberto Gomes de Sá Filho, Capitão José de Souza Miranda,

Tenente Júlio Antonio Xavier – dentista, Alferes Joaquim Antonio de Moraes Sarmento e

Cantídio da Costa Moreira.

Cabos: João Masteck, Vitor Feliciano de Lima, Fernandino José Perelles, Francisco

Marzani, Marceliano Gonçalves Cordeiro, Abel de Jesus Marques, Leonel Lopes Peres, João

Theodoro Machado e José Francisco Correia de Oliveira.

Anspeçadas Rodolpho Severiano da Paixão, João Veríssimo de Souza, Antonio

Gomes da Silva 2º, Rufino Pierre Cardoso e Francisco de Freitas Vieira.

Soldados: Bento de Castro, Bento Alves da Silva, Ricardo Hypeckmoer, Antonio

Amaro da Assumpção, Antonio Rodrigues dos santos, Júlio César, Manoel Joaquim ribeiro,

André Ferreira, Geraldo Antonio dos Santos, Isidoro Fernandes, Manoel Benedito da Silva,

Bolívar Xavier, Lindolpho Ferras de Jesus, João Abló, João Moraes, Silvestre Casura, Afonso

Amâncio da Silveira, José Marinho dos Santos e Cyrineu Caldeira.

Corneteiros Francisco Thomaz de Aquino e Quintino João Domingos dos Santos.

Afora o comandante, toda a tropa deslocou-se a pé. O meio de transporte mais

eficiente naquela região era o muar, que podia carregar uma carga de até noventa kg e era

encontrado com facilidade. Sendo assim, três muares foram destinados ao transporte da

metralhadora e da respectiva munição.

Conforme Martins (1995),

Um destacamento de 400 praças do Regimento de Segurança do Paraná, sob o comando do capitão do Exército dr.João Gualberto Gomes de Sá Filho, em outubro do mesmo ano, acampou a oito léguas da cidade de Palmas, de onde, no dia 20, à frente de 58 praças de infantaria, algumas de cavalaria e uma metralhadora “Maxim”, partiu do encontro dos rebeldes, entrando nos campos do Irani às seis horas da manhã do dia 22.

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2.5.3 O Armamento da Tropa

O armamento que levavam consistia em velhas e enferrujadas Comblains, usadas

durante a Revolução Federalista em 1893. Em relatório de 1912, o Comandante-Geral

expunha que o estado do armamento era lastimável. Sendo assim, este armamento não

satisfazia às condições do policiamento. Com base na Lei 1401, de 03 de abril de 1912, foi

pedida a substituição pelo modelo Mauser alemão, o que só veio ocorrer no ano seguinte,

depois do Combate do Irani.

A metralhadora Maxim Nordenfelt, na qual era depositada toda a confiança da tropa,

no caso de um ataque inesperado, tratava-se , realmente, de uma arma fabulosa para a época.

Tinha um alcance de 2.500 metros e era municiada com fitas de lona de duzentos tiros cada

uma.

2.5.4 O Acidente com a Metralhadora

Segundo Rosa Filho (1998), a mula que puxava a metralhadora e transportava a

munição era guiada por um soldado e um tropeiro, numa noite fechada, iluminada por um

simples candeeiro. Ao atravessarem um ribeirão cheio de pedras, a mula assustou-se com a

claridade da vela e derrubou a carga no rio. Sem que tivessem tomado a cautela de recolher as

bolsas de couro com a munição, escorrendo a água e retirando os detritos, seguiram viagem.

Figura 9 – Metralhadora Maxim "modelo 1895" Fonte: http://br.geocities.com/armas_brasil/SecXIX/declinio/ArmasFogo/mtr_maxim.gif

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42

Diz Carneiro, “João Gualberto assistiu à postura da metralhadora novamente em

ordem, para a marcha, embora não se preocupasse em fazer escorrer o excesso de água, e

como estivesse clareando o dia, decidiu-se a dar nova ordem à pequena coluna.(1942:221)

2.5.5 Intimação ao Monge

Pela manhã do dia 21 de outubro deste mesmo ano, foi enviada uma intimação ao

Monge José Maria, concebida nos seguintes termos:

ACAMPAMENTO DO REGIMENTO DE SEGURANÇA DO PARANÁ, nos Campos do Irani, em 20 de outubro de 1912. Snr. José Maria: Deveis comparecer a este acampamento com a maior urgência, a fim de explicardes o motivo da reunião de gente armada em torno de vossa pessoa, alarmando os habitantes desta zona e infringindo as leis do Estado e da República. Caso não atenderdes a esta intimação, que me ditam o cumprimento do dever e o sentimento de humanidade, comunico-vos que vos darei, desde logo, franco combate, e a todos os que forem solidários convosco, em verdadeira guerra de extermínio, a fim de fazer voltar, a esta zona do Estado, o regime da ordem e da lei. Avisai a todos que vos acompanham que os considerarei criminosos se não comparecerdes vós ao meu acampamento, a fim de evitar uma terrível desgraça. Comunico-vos, ainda, que, além das forças minhas que vos sitiam por várias estradas, outras expedições vos perseguem também, tornando-se desta forma impossível a vossa fuga ou resistência no território nacional. No caso de vossa resistência às minhas imposições, deveis retirar com urgência as mulheres e as crianças que aí estiverem. (a) Cel.João Gualberto Gomes de Sá Filho, comandante do Regimento de Segurança do Paraná4.

Apesar da decisiva intimação, o monge não a atendeu, talvez por passar despercebida

a circunstância de não estar infringindo nenhuma das leis do Estado ou da República. Ao ler,

comentou com os seus homens:

- Que garantias pode oferecer uma carta escrita a lápis...?

Neste mesmo dia, vinte e um de outubro, o Presidente da Província do Paraná teria

endereçado a Palmas os seguintes telegramas:

4 Carneiro, Davi. Op. Cit, pág.221.

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Desembargador Chefe de Polícia Palmas, Coronel João Gualberto não deve agir antes chegada reforço, e quando o fizer bem esclarecido depois esgotados recursos obter entrega armamento dissolução grupos. Seguem mais vinte homens de cavalaria sob comando Alferes Benedito – Saudações – Carlos Cavalcanti. Desembargador Chefe de Polícia – Palmas. Merecem mais francos elogios governo disciplina, abnegação nossos soldados, que estão prestando sob direção seu brilhante comandante relevantes serviços Estado. Disposições tomadas Coronel Gualberto bem combinadas. Convem manter-se sempre em ligação até Palmas vanguarda exploradora operando sempre bem esclarecidas circunstâncias terrenos e disposição habitantes zonas com as quais deve procurar agir pela persuasão desfazendo embustes de que desejam vítimas. Reforço cinqüenta homens muito conveniente. Aqui ainda disponho duzentos homens entre infantaria e cavalaria. Se for necessário nova remessa força qualquer das armas comunique. Pode responder chefe de polícia Santa Catarina nos termos seu telegrama, acrescentando esclarecimentos necessários sua ação zona jurisdição catharinense; presidente Rio Grande, a quem telegraphei; providência fronteira.

O Cel. João Gualberto parece não ter considerado tais advertências. O Cel. Soares de

volta ao acampamento, com a negativa do monge, insistiu, juntamente com todos, para que o

Cel. João Gualberto não atacasse o bando de sertanejos, já que a força policial era

numericamente inferior, mas de nada adiantaram os apelos.

João Gualberto, embora não contasse com todos os homens que trouxera de Curitiba,

dispunha de um contingente de 70 policiais e depositava muita confiança no trabalho da

metralhadora. Ao receber as ponderações contrárias de Soares, que decidiu não acompanhá-

lo, foi enfático ao afirmar que na manhã seguinte atacaria de qualquer forma. Embora

contassem com péssimas condições de local e armamento, além da precária condição

climática, determinou o ataque. Segundo Davi Carneiro, o monge, sabedor do que se passava

no acampamento militar, preparou-lhe uma emboscada.

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CAPÍTULO 3 – CONJUNTO DA CAMPANHA DO CONTESTADO

3.1 A BATALHA DO IRANI

Na noite do dia 21 de outubro de 1912, foram preparadas trinta alças para amarrar os

sertanejos que fossem capturados. Sob o comando do Coronel João Gualberto, era ensinado

aos praças a maneira correta de amarrar um homem. Na madrugada, lembrando a todos que a

intenção era surpreender os jagunços ainda dormindo, seguiram rumo estabelecendo as senhas

e o dispositivo de marcha.

Era possível somente uma fila indiana, pela estreiteza dos caminhos, carreiros

sinuosos e sulcados pelos aguaceiros. De acordo com Carneiro (1995), o comandante ordenou

que o piquete do Tenente Busse passasse à frente, porque já se divisavam três casas que

supunham ser dos caboclos. Ouviram um tiro. E depois a recepção de mais ou menos dez

homens armados, que investiram contra a força policial. Era só o começo. Eles serviram

apenas como chamariz, embrenhando-se no mato.

Não supondo que iria ser atacado, o Cel. João Gualberto fez com que um praça fosse

até a casa mais próxima a fim de trazer milho para os animais. Juntamente com a sua força,

passaram a debulhar o milho, quando foram acometidos de mais uma investida, numa

balbúrdia infernal. Foi aí que o Cel. percebeu que havia perigo.

Ao preparar a metralhadora para o combate, percebeu-se que as lonas das fitas de

munição estavam encharcadas, devido à queda na água. Apenas três tiros foram detonados,

emperrando a máquina. Foi dada a ordem de combate, sabendo-se de antemão que estavam

perdidos.

Diz Peixoto (1995): “Foi pela manhã de 22 de outubro de 1912 que se realizou este

encarniçado encontro, retalhando-se irmãos brasileiros a cutiladas de afiados facões”.

Segundo Rosa Fº, o adversário apresentava um efetivo cinco vezes superior. O momento era

decisivo. A tropa não podia permanecer na posição defensiva. Gualberto, de imediato,

mandou abrir cerrado fogo contra os fanáticos. Apesar das descargas sucessivas dos

milicianos, os fanáticos avançaram sem trepidar e sem ter um momento de vacilação,

provocando um verdadeiro pandemônio, fazendo com que o estampido de suas “winchesters”,

garruchas, espingardas, pica paus e o som dos berrantes multiplicassem pelas grotas

adjacentes, um estrondo ensurdecedor.

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45

Ainda, segundo Peixoto (1995:96),

Logo ao primeiro ímpeto da força os jagunços, que não possuíam grande quantidade de munição, detiveram-se algum tempo em fraca defensiva, sofrendo vivíssima fuzilaria por parte dos atacantes. De repente, investiram a facão, a foiçadas e a machadadas, em lances furiosos, vindo ao encontro corpo a corpo dos policiais que já se abeiravam do abarracamento, num entrevero encarniçado. Qual uma verdadeira falange de loucos, os matutos se arrojaram sobre os soldados. Os Pares de França puseram em execução, pela primeira vez, as suas diabólicas cabrioladas de esgrimistas. A braços com uma metralhadora enjambrada em meio da arremetida, João Gualberto, mutilado a golpes de facão, tombara como um bravo.

De acordo com Carneiro (1995:311),

O coronel João Gualberto ordena que o alferes Adolfito avance com alguns homens e faça fogo; (agia o centro) depois de estender em linha de atiradores. Nesse instante surgem os fanáticos em massa, alguns a pé, muitos a cavalo, e há violento tiroteio em que toda a força toma parte. Segundo os mais calmos depoentes, investiram pela estiva cem homens a pé, 50 a cavalo, seguido de outros cem por trás da cavalaria. Parte dessa força fez o desbordamento por fora do banhado. O comandante, depois que vira a metralhadora engasgada, fez o que pôde, sem conseguir com que ela funcionasse, e então decidiu abandoná-la. Mandou tocar deitar corpos, tomou o fuzil do soldado Caldeira (que fugiu), e com essa arma fez fogo. A fumaça era tanta que quase nada se via.

3.2 O DESFECHO DO DOLOROSO COMBATE

Com a morte do Cel.João Gualberto, os policiais militares se retiraram e voltaram ao

acampamento de Palmas. O chefe de polícia, tomando conhecimento dos fatos telegrafou ao

Presidente do estado. Foi decretado luto oficial, através do Decreto nº 912, nos seguintes

termos:

O Presidente do Estado do Paraná, tendo tido a pungente notícia de que se travou em Palmas um renhido combate entre um contingente do Regimento de Segurança do Estado, sob o comando do ilustre e bravo coronel João Gualberto de Sá Filho, e a horda chefiada por José Maria, em número superior a quatrocentos homens, bem armados e montados, resultando desta tremenda luta tombarem mortos em seus postos de honra aquele valoroso comandante, os valentes alferes Libindo Borges e Moraes Sarmento e outros heróis, legítimos defensores do brio paranaense, decreta: Artigo Único: - É declarado luto oficial por quinze dias, sendo imediatamente encerrado o expediente das repartições públicas durante três dias e hasteada nas mesmas a Bandeira, em funeral, pelo mesmo espaço de luto. Revogam-se as disposições em contrário. (a) Carlos Cavalcanti de Albuquerque. (Fonte Rosa Filho)

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46

3.3 O BALANÇO DA TRAGÉDIA

Neste combate sanguinário, o balanço foi de treze mortes, entre oficiais e soldados.

O total de feridos também foi de treze. Dentre o grupo do monge, morreram mais de

cinqüenta, entre eles o próprio monge, numa estimativa, por falta de dados oficiais. Muitos

foram gravemente feridos e retirados do campo de batalha, o Irani. Os policiais militares

foram sepultados no próprio local do combate, pelos moradores da região. Os restos mortais

destes bravos, que foram pasto de aves de rapina, ainda jazem no Irani e a eles não foi

dedicada nenhum memorial, no interesse da memória institucional, para que a posteridade os

lembre como bravos e sirvam de exemplo da dedicação extremada ao dever.

A literatura disponível nos fornece dados que sabidamente não retratam fielmente os

acontecimentos deste combate desastroso. Pode-se considerar que o coronel João Gualberto

fosse um bravo, embora tenha se precipitado, sendo imprudente, procurando insurgir-se numa

tentativa de validar sua superioridade frente ao batalhão. Sabe-se que os praças o advertiram,

na véspera, contra o ataque premente, solicitando que esperasse um reforço de policiais, que

estava a caminho.

Os praças estavam sem mantimentos, que teria seguido à Palmas, por ocasião do

desdobramento da tropa. Famintos, molhados, com a munição que fracassou, esses pobres

combatentes ficaram à deriva, quando da excessiva fumaça que permitiu a progressão dos

sertanejos em terreno que eles conheciam como a palma da mão. João Gualberto sequer havia

feito um reconhecimento da área.

Por ocasião do “Paranismo”5, que visava inventar o Paraná criando um sentimento de

pertencimento a uma terra, que até então não possuía sequer a garantia física de seu território

e necessitava de heróis, este coronel foi sepultado com honrarias e condecorações, sem que

sequer se cogitasse que esta derrota foi o estopim de uma luta de longa duração, em que

morreram, lado a lado, milhares de cidadãos brasileiros.

Ficou ressaltada a deficiência do aparelhamento militar do Paraná no primeiro

momento da necessidade de seu emprego, o que resultaria em extermínio em massa, se fosse

uma guerra de maiores proporções. Provou-se uma enorme desorganização de seus elementos

e de seu conjunto.

5 Paranismo: neologismo criado pelo poeta Domingos Nascimento, tendo por significado “natural e amigo do Paraná”, esforçado pelo seu progresso, prestígio e integridade

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.3.4 O EXÉRCITO EM AÇÃO

O desastre da batalha do Irani teve como consequência imediata o deslanchar do

banditismo, desta vez em Santa Catarina. Foi assim que a polícia catarinense desencadeou

várias expedições ao interior da região contestada, sem maiores realizações.

Do lado paranaense, sob o comando de Adalberto de Menezes, partiu de Curitiba

uma companhia do 4º. Regimento com destino a Taquaruçu, onde foi realizado um ataque,

resultando em um soldado morto e doze feridos.

Sentindo a força insuficiente para a ação decisiva, o comandante ordenou retirada, já

que não haviam mais mantimentos e os habitantes da região, temerosos de represálias,

recusavam-se a prestar auxílio.

Somente em 03 de dezembro de 1913, o Regimento de Segurança do Paraná

interferiu novamente com várias diligências com destino a Rio do Peixe, Timbó, Porto União

da Vitória e Rio Negro, sob o comando do tenente João König, do alferes Deocleciano Gomes

de Miranda, José Busse e Ângelo de Mello Palhares.

Em Caraguatá havia uma vidente que transmitia as ordens ao povo reunido: na

ausência do monge, era Maria Rosa, filha de Elias de Souza que recebia as “ordens” do

monge José Maria que, já tendo morrido transmitia o comando à menina de seus quinze anos,

loura, de cabelos crespos, alegre e de extraordinária vivacidade. Seu pai era um antigo

lavrador de terras. Esta “virgem” era analfabeta e era quem andava à frente das procissões,

carregando a bandeira com a cruz verde, emblema da “Irmandade.”

Muitas vezes Maria Rosa permanecia num pequeno quarto escuro, do qual saía para

transmitir ordens para os guerrilheiros. Existem, entretanto, muitas dúvidas quanto à

veracidade de suas informações. Porém, o povo cumpria fielmente as ordens que dela

“emanavam”, sendo considerada a representante da vontade do monge. (QUEIROZ, 1966)

A agitação recomeçava com mais intensidade. Então, um novo ataque dos fanáticos

se deu em Curitibanos, em 03 de janeiro de 1914, partindo para Caragoatá, Calmon,

Papanduva e Itaiópolis, sendo liderados por Henrique Wolland, o temerário

“Alemãozinho”.(CARNEIRO, 1995)

De Taquaruçu a Curitibanos as tropas militares do Exército, a pedido do governo

catarinense, vieram como reforço, quase mil homens apoiados por peças de artilharia e seções

de metralhadoras. Novo movimento militar contra Caragoatá, em 09 de março de 1914, um

duro combate se deu e mais uma vez os sertanejos se vangloriaram da vitória.

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A partir de agosto de 1914, de acordo com Peixoto (1995), “a população curitibana

agitava-se em conseqüência das notícias que eram conhecidas pelas ruas da capital. Supostas

avalanches de fanáticos estavam próximas da cidade, enquanto algumas localidades do

interior ardiam nas chamas do incêndio; os fugitivos desembarcavam diariamente nos trens

provindos do sertão e os telegramas descreviam com exagero o que se passava na região

contestada”.

O Regimento de Segurança do Paraná é novamente mobilizado, seguindo para Rio

Negro, sob o comando de Benjamin Augusto Lage, duzentos e dez praças de infantaria.

(ROSA FILHO, 1998; CARNEIRO, 1995).

Dois dias depois seguiram mais cento e noventa homens, dos quais cinquenta e cinco

de cavalaria, acantonando-se na cidade de Rio Negro, onde fizeram explorações e ficaram na

expectativa. Ao todo, formaram 400 homens.

Nesse momento, o governo do Paraná pede auxílio ao Governo Federal para

estabelecer de volta a ordem na região.

O novo comandante era o General de Brigada Fernando Setembrino de Carvalho,

requisitado pelo Governo do Paraná, ao expedir o seguinte ofício ao mandatário máximo da

Nação, em 29 de agosto de 1914.

Tenho comunicação, hoje confirmada, de que grande número de fanáticos invadiu os distritos de Papanduva e Itaiópolis, da comarca de Rio Negro e São João, município de Porto União da Vitória, neste Estado, e não tendo este Estado forças suficientes para atender a todos os pontos invadidos, visto a grande extensão da linha invadida, tanto mais quando tem fortes destacamentos guarnecendo diversas localidades limítrofes, venho de acordo com o Artigo 6º, parágrafo 3º da Constituição da República, respeitosamente solicitar a V.Exa. a intervenção da força federal, para que o Estado possa restabelecer a ordem na zona conflagrada, atendendo assim as inúmeras solicitações das populações ameaçadas em suas vidas e propriedades. Respeitosas saudações. (a) Affonso Alves de Camargo Vice-Presidente em exercício.

Para os embates que se seguiram foi organizado um Batalhão Tático. Desta forma,

segundo Rosa Filho (1998), o general dividiu suas tropas em quatro colunas que receberam os

nomes dos quatro pontos cardeais por onde deveriam começar sua ação, colunas Norte, Sul,

Leste e Oeste.

A “Irmandade Cabocla”, anteriormente gente pacífica que viu-se, de um momento

para outro, espoliada de seus bens e modestas lavouras, hostilizou sem dúvida um progresso

que lhes trouxe a miséria, tornando-se inimiga do governo que sancionava o ato da

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expropriação. Era mais outra sorte de gente que estava empunhando armas, sob a

denominação de “fanáticos”. Muitos trabalhadores que se viram inesperadamente despedidos

da ferrovia, antes que se tivesse concluído o ramal da linha de S.Francisco, também se

juntaram para protestar. É possível calcular o estado de tensão da zona, contestada por dois

estados que escondia nos seus mais profundos redutos o fanatismo religioso, o banditismo, o

desespero, a reação contra a invasão da propriedade e a politicagem desregrada, tudo

irmanado sob o único rótulo de “fanáticos”. Sabe-se que coexistiam criminosos também fora

dos redutos, que despachavam munições e armas. Desde o início da campanha suspeitava-se

que havia fornecimento clandestino de munição de guerra, que muitas vezes sobrepujou os

dos soldados que, ao mesmo tempo, despediçavam fartamente o tiro de guerra (PEIXOTO,

1995).

3.5 O PLANO DE CAMPANHA

A idéia que foi sugerida ao general Setembrino, de contornar a região em revolta

através de quatro linhas de tropas, encontrava obstáculos, dentre eles a insuficiência de

contingente. De acordo com Peixoto (1995) seria preciso o quíntuplo da tropa para que o

plano fosse satisfatório. As informações que se tinha do adversário divergiam. Mais tarde, o

capitão-chefe do estado-maior da expedição teria declarado a um jornalista:

Para a execução do plano estratégico em mira seria mister o quíntuplo da tropa de que se dispunha e que foi a seguinte: 12, 14 e 16 batalhões de infantaria e 54 de caçadores contingentes dos 14 e 2º. regimento de cavalaria; 2º. pelotão de estafetas e exploradores e 2º. esquadrão de trem; uma companhia do 2º. de engenharia; uma seção do 2º. regimento de artilharia montada; e a 2ª. bateria de obuzeiros. Vieram depois se concentrar, a longos intervalos, os 51, 54, 56, 57 e 58 de caçadores e do 8º. regimento de infantaria; a 4ª. de metralhadoras; o destacamento de cavalaria do então major Leovegildo, composto de contingentes de diferentes unidades; o 9º. de cavalaria e, finalmente duas seções do 20º. grupo da montanha. Uma vez na região agitada, a falta de cartas geográficas da mesma, precisando os pontos dos redutos, e de informações fidedignas impunha-se o dever de ser colocado à margem de quaisquer preocupações o projeto de um ataque; e isso até que fossem obtidos os elementos indispensáveis à elaboração ponderada de um plano capaz de assegurar o sucesso do empreendimento. Deste modo, a concentração visou a defesa dos centros mais populosos, o que ofereceu a vantagem do cerceamento dos recursos ao inimigo. Colimado este, tentou-se o novo objetivo de obstar, tanto quanto possível, que os insurgentes ultrapassassem os limites do cerco que se lhes ia fazendo. Desta feita, operamos a divisão da tropa em quatro linhas tomando os nomes dos pontos cardeais respectivos, e por conveniência das operações ficaram independentes o 54 de caçadores e o 9º. regimento de cavalaria. (PEIXOTO, 1995: 40-41).

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As forças do governo começaram a convergir sobre os redutos e cada coluna,

tornada autônoma. A literatura pesquisada é aqui um tanto controversa, tendo sido

encontradas informações de que a tropa recebeu ordem de destruir tudo à sua passagem. Não

foi bem assim. Existe um espírito de pacificação superior ao de guerra e foram feitas muitas

tentativas de apaziguamento. Eram feitos apelos à população, que eram impressos e afixados

às portas das bodegas, às árvores dos campos, pelas estradas de acesso aos redutos. Diziam o

seguinte:

Apelo.- Fazendo um apelo aos habitantes da zona conflagrada, que se acham em companhia dos fanáticos, eu os convido a que se retirem, mesmo armados, para os pontos onde houver forças, a cujos comandantes devem apresentar-se. Aí lhes são garantidos meios de subsistência, até que o governo do estado do Paraná lhes dê terras, das quais se passarão títulos de propriedade. A contar, porém, desta data em diante, os que não fizerem espontaneamente e forem encontrados nos limites da ação da tropa, serão considerados como inimigos e asim tratados com todos os rigores das leis de guerra. Quartel General das Forças de Operações, 26 de setembro de 1914. General Setembrino de Carvalho.

Assim como os militares que os precederam, Setembrino de Carvalho também

procurou resolver a situação por meios pacíficos, sendo as suas tentativas de conciliação

respondidas por uma onda muito maior de assaltos e saques.

3.6 BATALHÃO TÁTICO

De acordo com Rosa Filho (1998), com o objetivo de colaborar de forma mais

eficiente na manutenção da ordem, o Presidente do Estado do Paraná, em 9 de novembro de

1914, autorizou que o Batalhão de Infantaria fosse organizado como “Batalhão Tático”, sob o

comando do Major Benjamin Augusto Lage, de conformidade com o quadro elaborado pelo

Estado-Maior da Região Militar, sendo nomeados os seguintes oficiais:

Comando e Estado-Maior: Comandante – Major Benjamin Augusto Lage. Ajudante:

Alferes Hermínio da Cunha César. Quartel-Mestre: Alferes Genésio de Carvalho.

1ª. Companhia: Comandante: Capitão Antonio Gomes Ferreira. Subalterno: Alferes

Adeodato de Carvalho.

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2ª.Companhia: Comandante: Capitão José Agostinho da Silva.

Subcmt.: Tenente Floriano Barcellos Bica.

Subalterno: Alferes Luiz Napoleão de Britto Abreu.

3ª. Companhia: Capitão Heitor de Alencar Guimarães.

Subcmt.: Tenente João Busse.

Subalterno: Alferes Deocleciano Gomes de Miranda.

O Batalhão Tático foi integrado às tropas do Exército, incorporando-se à Coluna

Leste, comandada pelo Coronel do Exército Júlio César, sem qualquer vinculação com as

autoridades do Paraná. Era a únida tropa estadual que tinha acesso a toda a zona contestada

pelos dois Estados, tendo sido o seu comando fixado em Rio Negro.

3.7 O ÚLTIMO COMBATE

Pouco a pouco os redutos situados no caminho das colunas Norte, Sul, Leste e Oeste

que avançavam, iam caindo com sucessivas rendições. No final de janeiro de 1915 havia um

só reduto, o de Santa Maria. Nessa mesma época aconteceu o incidente fatal - o primeiro

desastre da aviação militar brasileira -, com a morte do tenente aviador Kirk. O ataque a este

reduto foi feito pelas colunas Norte e Sul. A coluna Leste, da qual fazia parte o Batalhão

Tático da PMPR teve também atuação de destaque, participando na ação conjunta para o

ataque definitivo.

Por ter participado em outras ações relevantes, o Batalhão Tático foi merecedor dos

melhores conceitos do comandante da coluna Leste, desta forma:

“Tendo o Exmo.Sr.Doutor Presidente do Estado tido conhecimento por comunicação do Sr.Cel. Comandante da coluna Leste das Forças em Operações nesta Região Militar, do procedimento altamente honroso do Batalhão do Regimento de Segurança, sob o comando do Major Benjamim Augusto Lage, que infligiu, pela terceira vez, completa derrota aos grupos de fanáticos que assolam este Estado e o de Santa Catarina, merecendo por este procedimento a consideração especial daquele ilustre oficial do Exército Nacional, declara sua Excelência congratular-se com o Regimento e por tal motivo manda que o mesmo oficial seja louvado pelos reiterados atos de bravura que tem praticado, bem como os oficiais, praças e civis sob o seu comando, no desempenho da árdua missão que lhes foi confiada, dando assim cabal prova de que sabem cumprir com exação o seu primordial dever, mantendo integralmente a honra da nobre Corporação a que pertencem”. “Ciente pelo vosso telegrama desta data de conduta altamente honrosa e digna do Batalhão do Regimento de Segurança, que operou em conjunto com as forças do

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Exército, contra os “fanáticos”, tendo feito jus, mais uma vez, ao elevado conceito e elogios do denodado Coronel Comandante da Coluna Leste, sinto-me feliz em louvar com efusão aos bravos oficiais e soldados da milícia estadual, a cuja frente está o destemido Major Benjamim Augusto Lage, soube manter as velhas glórias do Regimento, conduzindo-se ao fogo com serena firmeza e reconhecida valentia”. *Boletim no. 12, de 12 de junho de 1915.

Em janeiro de 1915 estava firmemente estabelecido o cerco em volta dos redutos e a

falta de alimentos castigava aquela gente. A munição estava escasseando também, o que deu

início à uma série de rendições em massa. Era a população exausta, que não suportava mais as

condições precárias da guerra sertaneja.

Esta apresentação não prenunciava, entretanto, o final próximo dos combates. Muitos

embates ainda foram travados, pela coluna sul, com as “cidades santas” sendo tombadas e os

mais ferozes combatentes sendo capturados e presos.

Ao final de janeiro de 1915, os redutos iam caindo a as rendições acontecendo

sucessivamente. Por fim, havia ainda um reduto, o de Santa Maria, que foi atacado pela

Coluna Sul, comandados pelo Tenente Coronel Estilac, em meio a uma procissão dos

jagunços, e teve como resultado o destroçar daquela população cabocla. Diante de uma

resistência desesperada, os “fanáticos” insistiram no ataque, sendo desta vez atacados pela

Coluna Norte, sob o comando do Capitão Tertuliano Potyguara e seus 700 homens, que

atravessaram 114 km de matas, arrasando tudo por onde passava. Foi nesse combate que

Potyguara perdeu 24 homens. Soube-se mais tarde que Maria Rosa – a virgem vidente – teria

combatido com flores no cabelo e morrera com a arma na mão, na travessia do Rio Caçador.

Foi assim que foi dizimado o último reduto dos sertanejos “fanáticos”.

A Coluna Leste, da qual fazia parte o Batalhão Tático da Polícia Militar do Paraná,

também teve atuação no combate, participando da ação conjunta no ataque definitivo. Um

pequeno contingente foi integrado à tropa do Tenente do Exército Heitor Mendes Gonçalves,

que partiu no dia 3 de abril de 1915, da Colonia Vieira, para fazer um reconhecimento no

local. O pelotão da Polícia Militar era comandado pelo alferes José Busse.

3.8 O TÉRMINO DA CAMPANHA

Com a destruição do último reduto – o de Santa Maria - estava terminada a grande

expedição e as tropas federais começavam a rumar para seus respectivos quartéis.

De acordo com Rosa Filho (1999), “num telegrama endereçado ao General

Setembrino, em 5 de abril de 1915, o coronel Estilac informava que do Tamanduá a Santa

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Maria, em todo o vale, inclusive Timbó, reduto dos Santos, Caçador, reduto do Aleixo e Cova

da Morte, foi tudo arrasado, subindo o número de casas queimadas a cinco mil.

Por ocasião do retorno do General Setembrino ao quartel, foram registrados estes

significativos elogios, feitos ao Batalhão Tático:

União da Vitória, 3 de maio de 1915. Felicito o Estado do Paraná na pessoa do seu eminente Presidente pelo regresso do valoroso Batalhão do Regimento de Segurança à sua caserna, depois de pelejar nos sertões rebelados, dando as melhores provas de disciplina, instrução e bravura na campanha contra o fanatismo desvairado, concorrendo nobre e abnegadamente para o restabelecimento da ordem, substituindo a anarquia pela paz, sobre cujo influxo o trabalho e a riqueza florescem. A Milícia Paranaense se impôs à estima e à admiração dos seus concidadão. Saudações efusivas.(a)Gal.Setembrino de Carvalho”.(ROSA FILHO, 1999:23).

Na ordem do dia, de 16 de maio de 1915, pela qual foi dissolvida a Divisão

Provisória, com que o General Setembrino ultimou a Campanha do Contestado, ele fez mais

as seguintes referências ao pessoal da Polícia Militar:

“Desde dezembro do ano findo faz parte do meu quartel-general o Sr.Coronel Fabriciano do Rego Barros, distinto comandante do Regimento de Segurança do Paraná. A fidalguia de suas maneiras, a sensatez de suas opiniões, a habilidade com que se manteve sempre no círculo de seus camaradas do Exército, com o elevado posto de coronel comandante da milícia estadual, cercaram-no das vivíssimas e unânimes simpatias que é-me sumamente agradável aqui patentear. O Tenente João Busse, do Regimento de Segurança do Paraná, que comandou o brioso e disciplinado piquete de cavalaria, gentilmente posto pelo eminente Sr.Dr. Carlos Cavalcanti, Presidente do Estado, à minha disposição, deixou no meu quartel-general, pela sua finíssima educação, trato e espírito de camaradagem, a mais agradável impressão. Oficial inteligente e corajoso, as necessidades do serviço por mais de uma vez fizeram cometer-lhe incumbência arriscada a que deu cabal desempenho, merecendo as mais elogiosas referências.” (ordem do dia, de 16 de maio de 1915, fonte Museu PMPR).

Diante destes registros, podemos constar que as relações políticas entre os oficiais do

exército e os oficiais da polícia se consolidaram, durante o período da Guerra do Contestado,

sendo este um fato favorável para a Instituição. É possível que estes acontecimentos tenham

refletido, posteriormente, para que a Instituição pudesse aumentar o seu efetivo, e conseguir

melhores armas e munições, já que tudo isso é controlado pelo Exército até os dias de hoje.

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Em 19 de dezembro de 1915, foram realizadas comemorações no Quartel do

Regimento de Segurança do Paraná, alusivas ao término da campanha. Houve uma solenidade

de entrega de medalhas aos oficiais e praças feridos no Combate do Irani e durante toda a

Campanha do Contestado. Segue abaixo o discurso por ocasião da entrega das medalhas

(apud rosa FILHO, 1998):

Meus Comandados!... É com orgulho de comandar uma legião de bravos como esta, de tradições tão rutilantes, que vos dirijo estas palavras no dia justamente em que o nobre povo paranaense festeja, com alegria e com entusiasmo, a data magna de sua história. Expoente glorioso da nossa força, da nossa coragem, da nossa energia, o Regimento de Segurança veio crescendo paralelamente ao desenvolvimento da província e, depois, do Estado, assinalando, nas dobras do pavilhão que defende com um denodo dos bravos, os feitos de nossas empreitadas vitoriosas nos domínios da Paz, no terreno das dificuldades, nos campos de batalha. Vanguarda poderosa para defesa de nossos brios, da integridade de nossa terra, a ele o penhor da Ordem, da tranquilidade e do trabalho do nobre povo paranaense. E em sendo assim, meus camaradas, a história desta terra amada confunde-se, na sua sucessão movimentada, com a história deste invicto Regimento de Segurança. Naquele ímpeto patriótico de Floriano Bento Vianna, dando um passo à frente de sua companhia e pedindo a independência do seu torrão, nota-se o valioso germe que, mais tarde, devia fazer de Dulcídio Pereira um herói e de João Gualberto um mártir. Através do tempo, apesar da neblina de anos entrepor-se entre os homens, vê-se acentuar nítido da mesma linha cavalheiresca de indômita bravura, de formidável arrojo e de empolgante destemor. Realizada a nossa aspiração de liberdade, penetrado este rincão augusto na ampla senda do Progresso contínuo, formada a Companhia da Força Policial, depois Corpo de Polícia e mais tarde Regimento de Segurança, prossegui no sereno cumprimento do sagrado dever de ser a galharda atalaia da Liberdade do Paraná, em todas as emergências de suas vidas. Entre o nosso Estado e o Regimento de Segurança existe indestrutível ledice que os dias que passam mais solidificam, mais fortalecem(...) O Paraná tem sessenta e dois anos de vida emancipada; e esses sessenta e dois anos constituem sessenta e dois anos de campanhas indigentes, pelo nosso progresso, pelo nosso adiantamento, pela nossa avançada para as linhas de frente de todas as conquistas materiais e intelectuais. E o Regimento de Segurança tem colaborado nessa obra imortal e fecunda. Incito-vos, camaradas, a que prossigais assim, labutando como soldados e como paranaenses para a felicidade deste torrão abençoado.”

Nesta oportunidade, foram agraciados com a Medalha de Mérito, criada pela Lei no.

1496, de 16 de março de 1915, os seguintes policiais militares que tomaram partes em

diversos pontos do Estado: Tenente Joaquim Antonio de Moraes Sarmento, segundo Sargento

João Mastek, cabos de esquadra Lindolpho Ferraz de Jesus e José Francisco correa de

Oliveira, anspeçadas Antonio Felix Patricio, Francisco de Freitas Vieira, João Roberto dos

Santos, Valério Alves de Oliveira e Álvaro Cardoso de Souza.

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A Medalha de Mérito é a maior condecoração policial-militar instituída até hoje, no

Paraná. Destina-se a premiar os milicianos que se distinguirem ou tiverem se distinguido por

serviços de campanha e outros de total importância, em benefício da ordem pública, ou de

excepcional merecimento, a juízo do Governo.

Nesta mesma data, dando prosseguimento às comemorações, foi inaugurado o retrato

do Presidente do Estado, ainda a gestão de Carlos Cavalcanti de Albuquerque e entrega da

bandeira. Estavam presentes os maiores escalões das autoridades estaduais e estaduais, além

do povo em geral. Tudo isso está descrito na ordem do dia do Boletim Interno da Instituição,

de 19 de dezembro de 1915 , como segue:

“Camaradas! Escolheu o Regimento de Segurança o dia de hoje para homenagear o digno e honrado Presidente do Estado Dr.Carlos Cavalcanti de Albuquerque, inaugurando o retrato de Sua Excelência, no seu quartel. A satisfação que me vai n´alma, em virtude deste fato, torna-se muito maior, porque ao lado da distinta oficialidade desta Corporação, recebendo dela o auxílio da idéia que dá origem ao fato que ora se passa, declaro, sem medo de errar, e com toda convicção, que não existe nesta homenagem a menor partícula de outro qualquer sentimento que não seja o de gratidão. O Excelentíssimo Senhor Doutor Presidente do Estado, estamos certos, receberá esta homenagem com absoluta confiança naqueles que têm sabido cumprir as suas ordens, acatando-as com verdadeiro carinho. Camaradas! Durante o período governamental da distinta personalidade do Excelentíssimo Senhor Doutor Carlos Cavalcanti de Albuquerque, foi que a nossa questão de limites passou pelos momentos mais agudos e perigosos, exigindo uma firmeza que só o pulso de Sua Excelência poderia servir de anteparo aos golpes traiçoeiros vibrados contra a nossa terra; foi também quando a revolta do fanatismo inconsciente manifestou-se em toda a sua intensidade, e ninguém mais sofreu com Sua Excelência do que o Regimento de Segurança, motivo porque me orgulho de dizer, que esta Corporação, sentinela avançada dos direitos paranaenses, soube sempre cumprir com seu dever, sem jamais vacilar, a despeito dos maiores sacrifícios. Entretanto o trato ameno, o carinho, o alto espírito de justiça e a dedicação que a este Regimento têm sido dispensados pelo Senhor Doutor Presidente do Estado, fazem desaparecer todos os sofrimentos e amarguras, para nos lembrar que o poder público do Estado, digno e honrado, é merecedor dos nossos mais profundos reconhecimentos. Viva o Doutor Carlos Cavalcanti! Viva o Estado do Paraná! Viva o Regimento de Segurança!”

A população do Estado, a título de gratidão à Corporação, aproveitou a

comemoração para ofertar uma Bandeira do Brasil ao Regimento de Segurança, ricamente

trabalhada em seda. Ao recebê-la, o Comandante-Geral assim se expressou, em sua ordem do

dia:

“Esse pavilhão nos concita, sempre que para ele respeitosamente voltamos as nossas vistas, a respeitarmos com carinho e acrisolado amor, tudo quanto temos de mais útil

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na vida, e muito principalmente, a defendermos com máximo ardor o nosso querido torrão abençoado. Não podemos e nem devemos, neste momento feliz, nos esquecer, rendendo preito de sincera homenagem, dos grandes vultos, cuja memória veneramos, daqueles que tiveram ideal feliz republicano, como Tiradentes, Deodoro, Benjamim, Floriano e outros vultos homéricos, depositando, de coração, sobre os seus sarcófagos as flores de nossa cordial veneração. Camaradas! Vós que tendes o sagrado dever de defender a todo transe este querido Estado e também a nossa querida Pátria, quando nossos serviços solicitados forem, na senda escabrosa da vida das armas, não vos afasteis do cumprimento de vossos sagrados deveres, procurando sempre serdes bons servidores, não só para o levantamento do nível moral de nossa gloriosa Corporação, como para o engrandecimento de nossa prezada Pátria. Hosanas, pois, ao mais belo Pavilhão do mundo, em cujo centro estrelado, como se adornado fosse pela própria natureza, se vê perpetuado o lema augusto: - ORDEM E PROGRESSO. “(Boletim interno de 19.12.1915).

Após Terem sido homenageados o Coronel Fabriciano do Rego Barros, os oficiais e

soldados, o Major Fiscal interino, os Comandantes do Esquadrão de Cavalaria e Companhias

de Infantaria, os instrutores, oficiais e demais praças, o coronel Fabriciano agradeceu a todos,

como segue:

“Ao meu velho amigo, infatigável auxiliar Sr. Major João Monteiro do Rosário, fiscal interino, louvo e agradeço o eficaz auxílio que sempre revelou a minha administração, com máxima boa vontade, alta competência, inteligência e amor ao trabalho, predicados estes que comprovadamente faz uso, para que o Regimento se mostre sempre disciplinado e instruído, muito tendo concorrido para o realce de nossas festas no dia 19; Aos Senhores Capitão Ajudante Augusto do Rego Barros e Alferes Secretário José Pereira de Moraes, dignos auxiliares do meu Estado Maior, louvo e agradeço a maneira criteriosa e correta com que cumprem as funções de seus importantes cargos, revelando sempre competência, disciplina, instrução e energia, a par de extraordinária boa vontade, muito concorrendo ambos para que o Regimento se mantenha digno da admiração de todos, predicados estes de que muito fizeram uso para o brilhantismo de nossas solenidades de 19; (...) Ao bravo Senhor Tenente Joaquim Antonio de Moraes Sarmento, cujo nome nesta Corporação é sobejamente admirado, louvo e agradeço com todo entusiasmo, os esforços merecedores de minha gratidão com que instrui a arma de infantaria, cujas provas exuberantes foram reveladas a 19, com a apresentação às altas autoridades de uma escola de ginástica e outra de infantaria, que calorosíssimos elogios conquistaram por parte dos assistentes, demonstração evidente do quanto é competente, inteligente e brioso cumpridor de seus deveres, muito realçando o seu excelente método de sublime ensino, captando, tão distinto oficial, não só a simpatia e gratidão de seus superiores, como a admiração unânime de seus subordinados. (...).(Boletim Interno 19.12.1915).

Foram muitos os homenageados e cabe ressaltar aqui a importância o Tenente

Sarmento, no combate do Irani, em 1912, já no posto de Alferes, quando lutou e foi ferido

gravemente, perdendo a sua vista direita direita a golpes de facão. Este fato lhe valeu a

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promoção ao posto de tenente por ato de distinta bravura. Voltou aos campos de batalha, onde

lutou até o final desta Guerra.

Em 1921, foi promovido ao posto de Capitão, por merecimento. Dedicou-se como

instrutor de infantaria, além de inúmeros feitos. Muito culto e apaixonado pela instrução,

melhorou de forma considerável o nível intelectual da Corporação.

Foi promovido a major, tenente-coronel e coronel, falecendo em 1934, tendo sido

consagrado como Patrono da Polícia Militar do Paraná.

Podemos observar que todas as comemorações evidenciavam o lado dos vencedores

e heróis, ocultando assim os conflitos anteriores entre autoridades civis e militares.

Na ordem do dia 60, de 16 de maio de 1915, pela qual foi dissolvida a Divisão

Provisória, foi ultimada a Campanha do Contestado. Em 25 de fevereiro de 1916, assumia

como governador do estado do Paraná, o Dr.Afonso Alves de Camargo, que foi o pacificador

dos limites entre o Paraná e Santa Catarina.

Pelo Decreto nº 473, de 09 de julho de 1917, aprovado pela lei nº 1768, de 17 de

março de 1918, do Congresso Legislativo do Estado, o Regimento de Segurança do Paraná foi

transformado em Força Militar do Estado do Paraná, ficando considerada como tropa auxiliar

reserva da primeira linha do Exército. Foi moldada à feição das diferentes armas das forças

terrestres, tendo o Corpo de Bombeiros como parte de sua estrutura orgânica.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Muito mais que o Exército, a fome e a peste venceram o fanatismo. Baqueados, a

população cabocla se tornou doente, miserável e faminta. Esta campanha durou cinco anos e

causou a morte de mais de 20.000 pessoas. Os sertanejos foram dizimados e dispersados pelas

tropas militares e a questão dos limites foi, finalmente, estabelecida.

A Guerra do Contestado foi a denominação de mais um triste episódio da história

nacional: o embate irregular e duradouro das tropas militares contra a emboscada sertaneja,

quando modernos engenhos de guerra adquiridos para a defesa da Pátria foram investidos

contra os compatriotas. Podemos concluir que as forças armadas, representadas pelos

combatentes, avançaram contrafeitos, sem ardor e sem convicção. Segundo Peixoto

(1995:44), de acordo com palavras oficiais “não tendo como numa guerra externa, o

patriotismo a lhe exaltar o ânimo, não se tratando de um inimigo externo a repelir, não

sentindo o entusiasmo nem os aplausos da Nação aos seus feitos, tiveram de bater com

patrícios transviados do dever, tendo como incentivo apenas o cumprimento desse dever,

compreendendo a necessidade do sacrifício pelo amor à República”. Sendo assim, é possível

concluir que realmente os combatentes foram bravos, principalmente pela sua condição de

inferioridade, sem conhecer o terreno, atraiçoados pela tocaia, pela emboscada e pelos ardis

que favoreceram os interioranos, em detrimento de suas vidas.

De acordo com o então Major Benjamim Augusto Lage, em relato da campanha6:

“A luta fratricida do Contestado foi abafada no sangue irmão. As suas cinzas ainda

hão de perdurar por muito tempo, mas a sua triste recordação será perene para nós e para os

pobres sertanejos que a provocaram”.

Bejamim Augusto Lage foi reconhecido por seus méritos de capacidade,

merecimento e bravura, dando-se as suas promoções da seguinte forma:

Tenente Coronel, por ato de bravura, em 10 de abril de 1915 e Coronel, por

merecimento, ao passar para a reserva, em 20 de junho de 1918.

A Campanha do Contestado apresentou, para as forças em operação, uma das mais

difíceis tarefas, uma vez que a zona conflagrada apresentava uma extensão de quase 50.000

km2 quadrados, por onde os “fanáticos” se espalhavam e, protegidos pela mata espessa do

6 ROSA FILHO, J.A Op. Cit.

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sertão, emboscavam as tropas. Nela, o Exército usou pela primeira vez seus obuses e deram-se

os primeiros vôos.

É verdade que, pela complexidade dos detalhes deste evento, que foram tomando

novas características, à medida do desenrolar da história, não foi possível desenvolver com

total clareza a minúcia dos fatos, pois ao nos determos em alguma particularidade, esta por si

só já dava margem a várias dissertações, tamanha a intensidade dos acontecimentos.

É notório salientar que, após o conflito, a Instituição Polícia Militar do Paraná teve, a

seu favor, várias transformações. Isto se deve, por um lado, por sair vitoriosa, nesta guerra,

como também pela maior aproximação com os altos escalões do Exército. Também foi bem

vista, perante a sociedade da capital, pelo lado do civismo, com a criação de heróis e datas

comemorativas. Já no interior do Paraná, com o retorno da ordem, o que fez com que os

homens de bens e posses de terras, puderam novamente se sentir seguros.

Assim, fica claro que o conjunto das transformações, que sofreu a Instituição Polícia

Militar, foi relevante para a sua afirmação legal como Força Estadual de Segurança Pública,

para a sociedade em geral.

É importante registrar também que a literatura disponível é escassa e contém

aspectos regionais daqueles autores que são catarinenses e daqueles autores paranaenses, pelo

ponto de vista de cada um e, principalmente pela posição estratégica que cada um se

encontrava, além dos valores regionais que quiseram impor à sua obra, além do momento

histórico em que se encontrava o Paraná. Desta forma, aspectos importantes numa obra não

são relevantes em outra.

Esta é uma pesquisa original e deve ser levado em conta o aspecto de decomposição

das obras originais do Museu da Polícia Militar, que aguarda o trâmite legal da Lei Rouarnet

para a restauração do seu acervo. Lembramos que, a partir da restauração destas obras, muitos

fatos, ainda obscuros ou perdidos, poderão ser evidenciados, lembrando que à exceção de

Rosa Filho, nenhuma obra de porte foi organizada por um autor paranense até o presente

momento.

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