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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS, NATURAIS
E DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO, EDUCAÇÃO BÁSICA E
FORMAÇÃO DE PROFESSORES
DAMILA SOARES DE CARVALHO
A CONSTRUÇÃO DE UM CURRÍCULO DE FORMAÇÃO CONTINUADA NA
PERSPECTIVA DA INCLUSÃO ESCOLAR: CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA DO
AGIR COMUNICATIVO
ALEGRE
2018
DAMILA SOARES DE CARVALHO
A CONSTRUÇÃO DE UM CURRÍCULO DE FORMAÇÃO CONTINUADA NA
PERSPECTIVA DA INCLUSÃO ESCOLAR: CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA DO
AGIR COMUNICATIVO
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ensino, Educação Básica e Formação de Professores do Centro de Ciências Exatas, Naturais e da Saúde da Universidade Federal do Espírito Santo como requisito para obtenção do grau de Mestre em Ensino, Educação Básica e Formação de Professores.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Mariangela Lima de Almeida.
ALEGRE
2018
Dedico este trabalho a meus pais, Paulo e Vanilda, ao
Heitor, ao Matheus e a todos os alunos público-alvo
da Educação Especial.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus, meu Criador, pelo infinito e imerecido amor, pela fidelidade e
sustento ao longo desta caminhada, guiando-me e fortalecendo-me em todos os
momentos. Toda honra, toda glória e todo louvor Lhe sejam dados!
Aos meus pais, Vanilda e Paulo, pelo amor incondicional, por acreditarem em mim e
por compartilharem comigo meus sonhos, incentivando-me a seguir em frente.
Ao meu irmão Douglas, pelo carinho, pelo apoio e pelos presentes que me deu: Laura
e Luiza (que está chegando).
À minha Laurinha tão amada, pelos lindos momentos vividos, por sua doce voz e pelo
sorriso inocente de criança que me contagiam e me dão forças.
Aos meus amigos e familiares, que fazem parte da minha vida, por torcerem por mim
e me ajudarem nesta jornada. À minha prima Silvana, por me abrigar e sustentar em
oração. Peço-lhes desculpas pelos momentos de ausência, que muitas vezes se
fizeram necessários.
À minha orientadora, professora Mariangela Lima de Almeida, pela acolhida, pela
ajuda, pelos ensinamentos e incentivo ao longo desta pesquisa. Obrigada pela
confiança e por tantos aprendizados compartilhados.
Aos professores Agda Felipe Silva Gonçalves e Alexandro Braga Vieira, pela
contribuição na elaboração deste trabalho, desde a defesa do projeto.
À professora Denise Meyrelles de Jesus, pela disponibilidade e por contribuir com seu
conhecimento no estágio final desta pesquisa.
Aos professores e alunos da turma 1 do Programa de Pós-Graduação em Ensino,
Educação Básica e Formação de Professores, pelos momentos compartilhados.
A Clayde, Conceição, Dayane e Simone, que comigo formaram o Quinteto Fantástico,
pela amizade que levarei para a vida toda. As conversas e as risadas (muitas risadas)
que compartilhamos foram muito significativas para mim. Minhas idas para o Alegre
não seriam as mesmas sem a companhia de vocês.
Às Musas da Pesquisa-Ação, Fernanda, Islene, Maria José e Nazareth, irmãs lindas
da família Lima de Almeida, que tornaram mais leve e agradável para mim esta
jornada, agradeço pela amizade, pelo incentivo, pela cumplicidade e pelo apoio em
todos os momentos.
Ao GRUFOPEES, com o meu carinho, pelos ensinamentos compartilhados e pelo
crescimento que me proporcionou.
Aos profissionais da Rede Municipal de Educação de Cachoeiro de Itapemirim, pela
participação nesta pesquisa, pela disponibilidade de tempo e atenção e pelo
comprometimento de cada um.
À CAPES, pelo fomento financeiro concedido para a realização deste trabalho.
O Senhor é a minha força e o meu escudo; nele o meu coração confia, e dele recebo
ajuda. Meu coração exulta de alegria, e com o meu cântico lhe darei graças.
Salmos 28:7
RESUMO
Este trabalho analisa as concepções, propostas e ações que se referem à formação
dos profissionais da educação na perspectiva da inclusão dos alunos público-alvo da
Educação Especial na Rede Municipal de Ensino de Cachoeiro de Itapemirim-ES.
Objetiva mapear as políticas municipais relativas à formação continuada desses
profissionais no que se relaciona à escolarização de alunos público-alvo da Educação
Especial; dialogar com os profissionais sobre os processos e perspectivas de
formação continuada sob o olhar da inclusão, considerando conceitos e concepções
teórico-metodológicas; refletir com os profissionais da Rede Municipal de Ensino
sobre o modo como as ações formativas propostas pela Secretaria de Educação se
articulam com as diferentes intencionalidades e demandas do contexto educativo,
bem como se têm constituído em possibilidades para a construção de propostas de
trabalho; construir espaços discursivos entre os diferentes profissionais, buscando,
pela mediação da autora, momentos em que todos possam expor seus argumentos e
suas intencionalidades por meio dos atos de fala, com vistas a alcançarem
entendimento mútuo e consensos provisórios sobre os princípios de currículo de
formação continuada na perspectiva da inclusão escolar. O aporte teórico
fundamenta-se nos pressupostos da Teoria do Agir Comunicativo e nos conceitos de
discurso, entendimentos e consensos. Para tanto, utiliza a metodologia do estudo de
caso e, como instrumentos de coleta de dados, o mapeamento documental,
entrevistas semiestruturadas e encontros de grupos focais. Tem como campo de
investigação a Secretaria Municipal de Educação de Cachoeiro de Itapemirim-ES e,
como participantes, os gestores municipais de Educação Especial, diretores,
pedagogos, professores regentes de turma, professores do atendimento educacional
especializado, cuidadores e pesquisadores da universidade. A coleta e a análise dos
dados constituem-se com base nos pressupostos habermasianos, através de espaços
discursivos nos quais se busca alcançar entendimentos mútuos a partir dos
argumentos e intencionalidades dos diferentes profissionais. A pesquisa evidencia
ações e concepções formativas com características do Agir Instrumental, tais como
as dificuldades em lidar com a diferença, a pouca oferta de propostas formativas para
os professores regentes e gestores escolares por parte da Rede Municipal de Ensino,
a inversão de papéis entre profissionais e a necessidade de incorporação do trabalho
colaborativo. No que tange ao Agir Comunicativo, evidencia a criação de espaços
discursivos como princípios fundamentais na construção de currículo de formação
continuada, tais como espaço discursivo sobre formação na escola e interescolar,
espaço discursivo sobre colaboração família e escola e espaço discursivo sobre
intersetorialidade. Destaca a necessidade de diálogo entre gestão municipal e escola,
objetivando uma formação continuada pensada a partir das demandas da escola, que
envolva todos os profissionais que lidam cotidianamente com a inclusão dos alunos
público-alvo da Educação Especial.
Palavras-chave: Formação continuada. Educação Especial. Currículo de formação.
ABSTRACT
This work analyzes conceptions, proposals and actions concerning the continuous
formation of education professionals under the perspective of Special Education
target-public students’ inclusion in the municipal public schools of Cachoeiro de
Itapemirim, ES, Brazil. It aims to map municipal policies enforcing the continuous
formation of professionals regarding special education target-public students’
schooling; dialoging with the professionals about continuous-formation processes and
perspectives under the inclusion viewpoint, considering both theoretic-methodological
concepts and conceptions; reflecting with professionals about the way Education
Board’s formative actions articulate themselves with the different intents and demands
from the education context, as well as if they have been constituted in possibilities for
the construction of proposals of work; through the mediation of the author, moments in
which all can expose their arguments and their intentionalities through the acts of
speech, with a view to reaching mutual understanding and provisional consensuses on
the principles of continuing education curriculum from the perspective of school
inclusion.Theoretical contribution was grounded on Communicative Action Theory, as
well as on the concepts of speech, understanding, and consensus. For that purpose,
case-study methodology was used, along with data-collection instruments like:
documental analysis, semi-structured interviews, and focal-groups meetings.
Investigation field was the Education Board of Cachoeiro de Itapemirim; participants
were Special-Education municipal managers, school principals, class-monitor
teachers, specialized education-assistance teachers, university staff, and professors.
Data-collection and -analysis were based on Habermas’ assumptions, reaching
agreement in speech-spaces conducting to mutual understanding out of the different
professionals’ reasoning and intents. This research has evidenced formative actions
and formation conceptions presenting Instrumental Action’s features, such as difficulty
in handling differences, few formative proposals for monitoring teachers and Education
Board’s school managers, hard role reversion between professionals and slow
incorporation of collaboration-work. About Communicative Action, speech-spaces’
creation is grounding a continuous-formation curriculum, like speech-spaces around
formation in and between schools, around family-school collaboration, and inter-
sectors speech-space. This work highlights the necessary dialogue municipal
administration-school, aiming at continuous formation out of the school’s demands,
involving all professionals coping in the everyday with Special Education target-public
students’ inclusion.
Keywords: Continuous formation. Special Education. Formation curriculum.
LISTA DE SIGLAS
ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas
AEE Atendimento Educacional Especializado
ANFOPE Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da
Educação
ANPAE Associação Nacional de Política e Administração da Educação
ANPEd Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em
Educação
APAE Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais
BDTD Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações
CAEE Centro de Atendimento Educacional Especializado
CANE Coordenadoria de Atendimento às Necessidades Especiais
CECAPEB Centro de Referência, Pesquisa e Capacitação do Professor de
Educação Básica “Dr. Dirceu Cardoso”
CEIDD Coordenadoria de Educação Inclusiva e do Direito à Diversidade
CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
DT Designação Temporária
EAD Educação a Distância
EJA Educação de Jovens e Adultos
GRUFOPEES Grupo de Pesquisa Formação, Pesquisa-Ação e Gestão em
Educação Especial
GTs Grupos de trabalho
IFES Instituto Federal do Espírito Santo
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
ONEESP Observatório Nacional de Educação Especial
MEC Ministério da Educação
NEE Necessidades Educacionais Especiais
PAEE Público-Alvo da Educação Especial
PAES Pacto pela Aprendizagem no Espírito Santo
PEPP Pesquisa, Extensão e Prática Pedagógica
PNE Plano Nacional de Educação
PNEE-PI Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva
PPGE Programa de Pós-Graduação em Educação
PPGEEDUC Programa de Pós-Graduação em Ensino, Educação Básica e
Formação de Professores
RENAFOR Rede Nacional de Formação Continuada de Professores na
Educação Básica
SEDU Secretaria de Estado da Educação
SEEL/PCR Secretaria de Educação, Esporte e Lazer da Prefeitura da Cidade
do Recife
SEME Secretaria Municipal de Educação
SRE Superintendência Regional de Educação
SRM Sala de Recursos Multifuncionais
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TGD Transtorno Global do Desenvolvimento
UAB Universidade Aberta do Brasil
UFES Universidade Federal do Espírito Santo
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 –
Tabela 2 –
Tabela 3 –
Tabela 4 –
Tabela 5 –
Tabela 6 –
Tabela 7 –
Tabela 8 –
Tabela 9 –
Natureza dos estudos analisados..................................................
Número de matrículas na Educação Básica..................................
Evolução no número de matrículas da Educação Especial...........
Número de Matrículas na Educação Especial - Classes Comuns.
Evolução das SRMs.......................................................................
Formação AEE...............................................................................
Formação Libras Básico.................................................................
Formação Libras Intermediário.......................................................
Formação Cuidadores....................................................................
46
98
100
101
103
138
138
138
138
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 –
Quadro 2 –
Quadro 3 –
Quadro 4 –
Quadro 5 –
Quadro 6 –
Quadro 7 –
Temáticas abordadas nos estudos..............................................
Regiões/Universidade dos estudos abordados............................
Escola de Frankfurt: diferentes pensamentos..............................
Agir comunicativo X agir estratégico............................................
Agir comunicativo fraco e forte.....................................................
Perfil dos participantes da pesquisa.............................................
Mapeamento dos documentos do município de Cachoeiro de
Itapemirim.....................................................................................
44
45
66
70
71
79
106
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 –
Figura 2 –
Convite para o primeiro encontro do grupo focal...........................
Convite para o segundo encontro do grupo focal...........................
85
87
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 –
Gráfico 2 –
Gráfico 3 –
Evolução dos estudos sobre Formação Continuada e Educação
Especial........................................................................................
Porcentagem dos participantes da pesquisa................................
Organograma da Secretaria Municipal de Educação...................
43
78
96
LISTA DE MAPAS
Mapa 1 –
Mapa 2 –
Mapa 3 –
Regiões geoescolares urbanas........................................................
Estado do Espírito Santo..................................................................
Divisão geopolítica do Município......................................................
77
93
94
SUMÁRIO
1
1.1
2
2.1
2.2
3
3.1
3.2
3.3
4
5
5.1
5.2
5.3
5.3.1
INTRODUÇÃO..........................................................................................
DA CONSTITUIÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA ÀS NOSSAS
IMPLICAÇÕES NA PRODUÇÃO DE CONHECIMENTOS SOBRE
FORMAÇÃO DE PROFESSORES............................................................
A EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA INCLUSÃO
ESCOLAR: OS CAMINHOS PERCORRIDOS NESSE PROCESSO.......
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO CONTEXTO DA INCLUSÃO
ESCOLAR: QUE CAMINHOS ESTAMOS SEGUINDO?...........................
QUESTÕES ATUAIS DA EDUCAÇÃO.....................................................
O DIÁLOGO COM OUTRAS PESQUISAS E AS CONTRIBUIÇÕES DO
AGIR COMUNICATIVO NA CONSTRUÇÃO DE UM CURRÍCULO DE
FORMAÇÃO CONTINUADA....................................................................
A FORMAÇÃO CONTINUADA NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO
INCLUSIVA DESENVOLVIDA PELA UNIÃO, PELOS ESTADOS E
PELOS MUNICÍPIOS................................................................................
O CONTEXTO DA PRÁTICA EDUCATIVA E OS INDÍCIOS PARA
ELABORAÇÃO DE CURRÍCULOS DE FORMAÇÃO CONTINUADA.......
UM OLHAR PARA “DENTRO”: O QUE APRENDEMOS A PARTIR DA
PRODUÇÃO DOS GRUPOS DE PESQUISAS DA UNIVERSIDADE.......
O DIÁLOGO NA CONSTRUÇÃO DE CURRÍCULO DE FORMAÇÃO
CONTINUADA NA PERSPECTIVA DA INCLUSÃO ESCOLAR: AS
CONTRIBUIÇÕES DE JÜRGEN HABERMAS.........................................
PERSPECTIVA TEÓRICO-METODOLÓGICA E OS CAMINHOS DA
PESQUISA................................................................................................
A NATUREZA DA PESQUISA...................................................................
OS LOCAIS E OS PARTICIPANTES DA PESQUISA...............................
OS PROCEDIMENTOS DA PESQUISA...................................................
Primeiro momento: levantamento documental e identificação dos
participantes............................................................................................
22
22
30
34
37
41
47
55
62
65
74
74
75
79
80
5.3.2
5.3.3
5.3.4
5.4
6
6.1
6.1.1
6.1.2
6.2
6.3
6.4
6.4.1
6.4.2
6.4.3
6.4.4
6.5
6.5.1
6.5.2
6.5.3
7
Segundo momento: escuta dos profissionais da escola....................
Terceiro momento: potencializando o diálogo por meio do grupo
focal..........................................................................................................
Quarto momento: dialogando com os gestores de Educação
Especial....................................................................................................
PROCEDIMENTOS PARA ANÁLISE DOS DADOS.................................
A FORMAÇÃO CONTINUADA EM CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM-ES:
CONCEPÇÕES E PROPOSIÇÕES..........................................................
O CONTEXTO DA PESQUISA: UM OLHAR PARA O MUNICÍPIO DE
CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM.................................................................
A educação em Cachoeiro de Itapemirim.............................................
A Educação Especial no município de Cachoeiro de
Itapemirim................................................................................................
A FORMAÇÃO CONTINUADA NA PERSPECTIVA DA INCLUSÃO
ESCOLAR PELA VIA DOS DOCUMENTOS NORTEADORES: ENTRE O
DISCURSO TEÓRICO E O DISCURSO PRÁTICO..............................
CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSÃO ESCOLAR:
INTENCIONALIDADES E CONHECIMENTOS.........................................
TENSÕES E DESAFIOS QUE EMERGEM NO COTIDIANO ESCOLAR:
ENTRE O AGIR INSTRUMENTAL E O AGIR COMUNICATIVO..............
Dificuldades em lidar com a diferença..................................................
A inversão de papéis entre os profissionais........................................
A necessidade do trabalho colaborativo entre a sala comum e o
AEE............................................................................................................
Pouca oferta de propostas formativas para os professores regentes
e gestores escolares por parte da Rede Municipal de
Ensino.......................................................................................................
A TEORIA DO AGIR COMUNICATIVO E A CONSTRUÇÃO DE UM
CURRÍCULO DE FORMAÇÃO..................................................................
Espaço Discursivo sobre formação na escola e interescolar.............
Espaço Discursivo sobre colaboração família e escola......................
Espaço Discursivo sobre intersetorialidade.........................................
CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................
82
84
88
89
91
93
95
98
105
113
125
126
129
134
136
145
147
152
153
157
8 REFERÊNCIAS.........................................................................................
APÊNDICES..............................................................................................
APÊNDICE A – Quadro-análise dos estudos............................................
APÊNDICE B – Estudos abordados (2007-2017)......................................
APÊNDICE C – Questões investigadoras: 2º Encontro do Grupo Focal.....
ANEXOS....................................................................................................
ANEXO A – Autorização para a realização da pesquisa...........................
ANEXO B – Protocolo para a autorização da pesquisa.............................
ANEXO C – Autorização concedida..........................................................
164
183
184
185
195
196
197
198
199
22
1 INTRODUÇÃO
A temática de investigação proposta neste estudo reporta-se às possibilidades de
concebermos outras/novas formas de produção de currículos de formação continuada
dos profissionais da educação, capazes de “responder” aos interesses do cotidiano
escolar pela heterogeneidade e pela diferença. Para isso, tomamos o estudo de caso
como potencial investigativo, numa abordagem crítica e sensível que busque, pela
escuta dos diferentes atores do contexto, propiciar entendimentos sobre a relação
entre teoria e práxis na produção de políticas e ações formativas.
Procuramos analisar as intencionalidades impressas nos discursos (teórico e prático)
que fundamentam atualmente as propostas e ações de formação continuada para os
profissionais da educação na Rede Municipal de Ensino de Cachoeiro de Itapemirim-
ES, em busca de consensos possíveis acerca de seus princípios, ideologias,
interesses e conhecimentos produzidos.
Assim, apropriamo-nos da teorização filosófica dos estudos teórico-epistemológicos
que Jürgen Habermas realiza com base na discussão da Teoria do Agir Comunicativo.
Essa apropriação é conduzida em três perspectivas: (a) como aporte epistemológico
e metodológico para, em conjunto com a análise de conteúdo, permitir-nos analisar os
documentos do Município na área de Educação Especial/inclusão escolar; (b) como
perspectiva teórica que nos ajude a interpretar e compreender os discursos dos atores
do contexto (professores, diretores, pedagogos e cuidadores) sobre as concepções,
demandas e ações formativas implementadas atualmente; e (c) como possibilidade
de sustentação teórica e filosófica com vistas a propor um currículo para a formação
continuada que responda aos interesses do contexto socioeducativo desafiado pela
inclusão escolar. Assim, trazemos, neste primeiro capítulo, algumas marcas que
constituem nossa trajetória de pesquisa e os contextos de tensões e possibilidades
das práticas educativas.
1.1 DA CONSTITUIÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA ÀS NOSSAS
IMPLICAÇÕES NA PRODUÇÃO DE CONHECIMENTOS SOBRE FORMAÇÃO
DE PROFESSORES
O interesse e o envolvimento nas discussões concernentes a essa questão marcam
23
os desdobramentos de nossa trajetória acadêmico-profissional, sobretudo as
descobertas da pesquisa educacional propiciadas pelo curso de Pedagogia, a atuação
como estagiária que acompanhava dois alunos público-alvo da Educação Especial
(PAEE), as discussões oportunizadas por disciplinas do curso de mestrado em
Ensino, Educação Básica e Formação de Professores, além das discussões/reflexões
constituídas no grupo de pesquisa “Formação, Pesquisa-ação e Gestão em Educação
Especial” – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(Grufopees-CNPq) do qual participamos.
O interesse pela formação de professores e pela prática docente, diante da
heterogeneidade dos alunos, presentificou-se, ainda, com o percurso acadêmico no
curso de Pedagogia da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). As
possibilidades de reflexões propiciadas com base nas disciplinas oferecidas,
especialmente a de Introdução à Educação Especial, revelaram-nos um arcabouço de
conceitos e princípios essenciais à compreensão da escola como espaço de acesso
ao conhecimento para todos os alunos, inclusive aqueles que constituem o PAEE.
No curso de graduação, as questões relativas ao movimento inclusivo emergiram
como primeiras inquietações investigativas. Por inclusão escolar, estamos referindo-
nos a uma escola que atenda a todos indistintamente e seja repensada em função das
novas demandas da sociedade atual e das exigências de seus novos atores sociais.
Pensar a escola inclusiva é pensar numa escola que precisa
[...] formar seus professores e equipe de gestão, bem como rever as formas de interação vigentes entre todos os segmentos que a compõem e que nela interferem. Isto implica em avaliar e redesenhar sua estrutura, organização, projeto político-pedagógico, recursos didáticos, práticas avaliativas, metodologias e estratégias de ensino (GLAT; PLETSCH; FONTES, 2007, p. 6).
Desse modo, durante nossa trajetória no curso de Pedagogia, foi possível vivenciar
situações em que essas tensões eram expressas no cotidiano da prática educativa.
Por vários semestres, a disciplina de Pesquisa, Extensão e Prática Pedagógica
(PEPP) desafiou-nos a investigar a prática pedagógica pela via da pesquisa. Em um
dos trabalhos realizados na disciplina de PEPP I, foi possível compreender, através
de um estudo exploratório, como essa discussão era/é cercada por dúvidas e desafios
sobre o processo de escolarização do aluno PAEE, resultantes da necessidade de
formação continuada dos profissionais.
24
Concomitante à graduação, tivemos a oportunidade de ingressar em um estágio na
Prefeitura Municipal de Vitória, na função de apoio à Educação Especial. Durante o
período de dois anos, acompanhamos de perto o processo de ensino-aprendizagem
de dois alunos, um com Síndrome de Edwards e outro com Autismo. Tal cenário nos
incomodava, porque muitas vezes os alunos eram invisibilizados em sala de aula,
quando não ficavam restritos à sala de recursos multifuncionais (SRM). Essa
experiência reafirmou nosso desejo de trabalhar com os alunos da Educação Especial
e alertou-nos para a importância da formação de professores nesse processo, a fim
de que os alunos pudessem de fato, além de frequentar o espaço da sala de aula, ter
acesso ao conhecimento historicamente produzido.
Em 2016, com a abertura do primeiro programa de pós-graduação voltado para a área
de ensino no sul do Estado, tivemos a oportunidade de aprofundar as pesquisas na
nossa área de interesse. O Programa de Pós-Graduação em Ensino, Educação
Básica e Formação de Professores (PPGEEDUC) implantado na Ufes (Campus de
Alegre-ES) propõe a disseminação de estudos que contemplem pesquisas voltadas
para as práticas de ensino de Física, Matemática, Ciências Biológicas, Química e
Ciências Humanas na Educação Básica, tendo também como propulsores do
conhecimento os estudos voltados para a formação inicial e continuada de
professores.
Com a inscrição no PPGEEDUC, deu-se nosso ingresso no Grufopees. O grupo
integra atividades de ensino, pesquisa e extensão na Ufes e se dedica ao avanço do
conhecimento sobre a gestão pública em Educação Especial, mediante o movimento
de elaboração de políticas de formação continuada para profissionais da educação na
perspectiva da inclusão escolar.
Assim, é nesse contexto, mais especificamente o de nossa inserção no curso de
mestrado e no grupo de pesquisa, que vamos constituindo nossa pesquisa. Como
professora-pesquisadora em constituição, as buscas pela compreensão dos
processos de formação foram delineando-se a partir do conhecimento e análise de
outras pesquisas.
As pesquisas no estado do Espírito Santo (ALMEIDA, 2016; ALMEIDA; JESUS;
CUEVAS, 2013; JESUS, 2012a, 2012b; JESUS; PANTALEÃO; ALMEIDA, 2015;
VIEIRA; RAMOS, 2012) revelam a preocupação dos setores de Educação Especial
25
das Redes Municipais e Estadual de Ensino em fomentar processos formativos. Entre
2010 e 2012, a Ufes realizou uma pesquisa em parceria com a Secretaria de Estado
da Educação (Sedu) cujo principal objetivo foi oferecer formação continuada para
profissionais gestores públicos da Educação Especial.
Vieira e outros (2011) evidenciam que a formação desses sujeitos se constituiu em
uma ação política capaz de potencializar a formação continuada de outros
profissionais da educação com novas possibilidades, assumindo as angústias vividas
pelos envolvidos no processo de inclusão escolar na perspectiva da Educação
Especial, com propostas e temáticas a serem discutidas coletivamente.
O estudo realizado pelo Grufopees-UFES-CNPq1, de acordo com Almeida (2016),
focalizou os projetos e ações formativas construídos e implementados pelos gestores
pertencentes a três Superintendências Regionais de Educação (SREs)2, a saber:
Afonso Cláudio, Cachoeiro de Itapemirim e Guaçuí. Teve por objetivo analisar os
desafios e as possibilidades na construção de outros modos de conceber e constituir
processos de formação continuada de profissionais da educação e gestores públicos
de Educação Especial.
Apostou-se na potência do trabalho em grupo, intitulado nesta pesquisa de grupo de
estudo-reflexão, em que os participantes e pesquisadores se constituíram na condição
de grupo, traçando objetivos em comum, criando identificações e analisando
especificidades para, a partir daí, iniciar um processo de construção de políticas de
formação para os profissionais da educação (ALMEIDA, 2016).
Assim, a dissertação se constituiu no contexto dessa investigação. Este estudo
justificou-se mediante a análise de produções anteriores do grupo de pesquisa
(ALMEIDA, 2016; ALMEIDA; ALVES; ZAMBOM, 2014; ALVES, 2014; ALVES;
BARROS), as quais destacam a necessidade de potencializar a formação continuada
e a inclusão dos alunos PAEE nos municípios pertencentes à SRE de Cachoeiro de
1 “Processos de formação continuada de profissionais desencadeados pela gestão de Educação Especial: a região sul do estado do Espírito Santo”. Pesquisa financiada pelo CNPq. 2 A Rede Estadual de Ensino no Espírito Santo está organizada em onze SREs, de acordo com as regiões administrativas.
26
Itapemirim-ES3.
Em decorrência da necessidade de estudos apontada pelas produções do grupo de
pesquisa e de nossa implicação direta no município de Cachoeiro de Itapemirim, como
moradora da cidade, cujo percurso escolar (Educação Infantil, Ensino Fundamental e
Médio) se deu na Rede Pública de Ensino, além do interesse em produzir
conhecimentos sobre inclusão escolar dos alunos PAEE, fomos dando forma e
contornos a esse estudo. Inserida no Grufopees, as discussões produzidas pelo/no
grupo nos direcionavam a pensar sobre as ações formativas desenvolvidas no
Município.
Assim, embora a temática da pesquisa emane das demandas do contexto histórico-
social, partilhamos das argumentações de Barbier (1985, p. 106), que afirma: “[...] o
contexto do pesquisador, sua formação, seus grupos de referência, os gostos
intelectuais do momento desempenham papel decisivo [...]” na escolha do objeto de
investigação.
Nesse contexto, surgiram estes questionamentos: Em quais princípios e pressupostos
teórico-metodológicos se sustentam as ações formativas? Há diálogo com as
demandas do contexto das escolas? Os profissionais das escolas municipais de
Cachoeiro de Itapemirim-ES estão sendo ouvidos na composição de um currículo de
formação continuada?
Desse modo, o estudo investigou as ações formativas propostas e implementadas nos
últimos seis anos, no município de Cachoeiro de Itapemirim-ES, com base nas
implicações, demandas e discursos dos profissionais e gestores.
Nesse sentido, nossa pergunta-problema remete a compreender de que forma é
possível construir um currículo de formação continuada a partir do
entendimento mútuo entre os diferentes profissionais que vivenciam, em sua
prática educativa, a inclusão dos alunos com deficiência, transtornos globais do
desenvolvimento (TGD) e altas habilidades/superdotação.
Para tanto, buscamos na concepção de discurso em Habermas (2003) embasamento
3 A SRE de Cachoeiro de Itapemirim é composta por doze cidades; Cachoeiro de Itapemirim, Castelo,
Iconha, Vargem Alta, Muqui, Atílio Vivácqua, Rio Novo do Sul, Mimoso do Sul, Presidente Kennedy,
Itapemirim, Jerônimo Monteiro e Marataízes.
27
teórico para compreender os modos possíveis de construção de currículos pela via do
entendimento mútuo.
Para o filósofo, esse é um momento privilegiado em que os sujeitos (sociais) são
atores-agentes do conhecimento com base no mundo vivido. Assim, interessa-nos, na
perspectiva da racionalidade comunicativa, constituir espaços discursivos entre os
diferentes profissionais de modo que seus argumentos possam fundamentar as
pretensões de validade, a fim de chegarmos ao entendimento mútuo na construção
de um currículo de formação continuada.
Desse modo, temos o seguinte objetivo geral para este estudo:
Analisar as concepções, propostas e ações formativas para os profissionais da
educação diante do processo de inclusão dos alunos com deficiência, TGD e
altas habilidades/superdotação da Rede Municipal de Ensino de Cachoeiro de
Itapemirim-ES, levando em consideração as diferentes intencionalidades dos
sujeitos envolvidos.
Como forma de adensar o processo de produção de conhecimento, delimitamos
quatro objetivos específicos:
• Mapear as políticas municipais, considerando a legislação, os projetos e/ou planos
de trabalho relativos à formação continuada dos profissionais da educação em
relação à escolarização de alunos PAEE.
• Dialogar com os profissionais das escolas e da Secretaria Municipal de Educação
(Seme) sobre os processos e perspectivas de formação continuada voltados à
inclusão, desenvolvidos pela gestão de Educação Especial dos últimos seis anos,
considerando conceitos e concepções teórico-metodológicos.
• Refletir com os profissionais da Rede Municipal de Educação (professores do
ensino regular, professores do Atendimento Educacional Especializado – AEE,
diretores e pedagogos) sobre o modo como as ações formativas propostas pela
Seme se articulam com as diferentes intencionalidades e demandas do contexto
educativo bem como se se têm constituído em possibilidades para a construção
de propostas de trabalho educativo na perspectiva da inclusão dos alunos PAEE.
• Construir espaços discursivos entre os diferentes profissionais, buscando, pela
28
mediação da autora, momentos em que todos possam expor seus argumentos e
suas intencionalidades por meio dos atos de fala4, com vistas a alcançarem
entendimento mútuo e consensos provisórios sobre os princípios de currículo de
formação continuada na perspectiva da inclusão do PAEE.
Cumpre destacar que os objetivos conduzem nosso olhar e análise em diferentes
momentos, a fim de permitir um diálogo entre eles; portanto, não são lineares ao
processo investigativo.
Delimitamos como espaço temporal desta pesquisa o período de 2013 a 2018, por se
tratar do último mandato do prefeito anterior e da atual gestão. O propósito do trabalho
é contribuir para que a Rede Municipal de Ensino de Cachoeiro de Itapemirim-ES e
os processos de formação continuada desenvolvidos avancem no empenho da
inclusão dos alunos com deficiência, TGD e altas habilidades/superdotação.
Assim, utilizamos a metodologia do estudo de caso, que nos permite o
aprofundamento analítico do objeto, buscando entender os encaminhamentos para a
formação continuada, desde a elaboração até a efetivação das propostas. Permite-
nos também imersão na realidade, buscando possíveis caminhos. Estudos recentes
sobre formação continuada de profissionais da educação (CREPALDI, 2008; DIAS,
2012; GRAZIOLA JUNIOR, 2016; NOGUEIRA, 2006; ROCHA, 2013; ROSA, 2002)
têm apostado no estudo de caso como referencial metodológico capaz de contribuir
para o avanço do conhecimento sobre os processos formativos.
Este texto está organizado em sete capítulos. O primeiro, que acabamos de
apresentar, traz a introdução, que aborda o contexto que envolve a pesquisa bem
como sua justificativa e os objetivos que pretendemos alcançar.
O segundo capítulo apresenta um apanhado do processo de inclusão escolar, seu
reflexo na formação dos profissionais da educação e as questões atuais da educação,
tendo em vista o contexto político que estamos vivendo.
O terceiro capítulo compreende um diálogo com outras pesquisas que buscam
potencializar o processo de inclusão escolar através da formação continuada,
levando-nos a conhecer as principais discussões que perpassam essa temática a
4 Atos de fala neste estudo estão impressos nas entrevistas, grupos focais e documentos orientadores.
29
partir do olhar de outros autores.
O quarto capítulo apresenta os fundamentos teórico-filosóficos da pesquisa, baseados
nos pressupostos de Jürgen Habermas na Teoria do Agir Comunicativo e suas
contribuições, ao propormos novos modos de conceber e elaborar currículos de
formação continuada.
O quinto capítulo apresenta a natureza da pesquisa bem como o percurso
metodológico e os caminhos do desenvolvimento.
O sexto capítulo abrange o resultado da análise dos dados coletados, fundamentado
no referencial habermasiano e em diferentes autores que norteiam os discursos sobre
a formação continuada dos profissionais da Educação Especial.
Por fim, o sétimo capítulo traz as considerações finais da pesquisa, apresentando
nossa aprendizagem, apontamentos e encaminhamentos feitos a partir do que
evidenciamos nos diferentes momentos. Dessa forma, buscamos contribuir para o
avanço do conhecimento acerca da construção de currículo de formação continuada,
considerando a prática educativa na diversidade e na diferença.
30
2 A EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA INCLUSÃO ESCOLAR: OS
CAMINHOS PERCORRIDOS NESSE PROCESSO
Tendo em vista o objetivo principal deste estudo, qual seja, de analisar as diferentes
concepções existentes no contexto escolar bem como as diferentes intencionalidades
dos sujeitos envolvidos, com vistas a estruturarmos um currículo de formação
continuada, buscando avançar na inclusão do aluno PAEE, fez-se necessário
estabelecermos um olhar sensível sobre a história da Educação Especial, os
movimentos de avanços e retrocessos, até chegarmos ao movimento de inclusão
escolar numa perspectiva emancipatória pela qual lutamos. Isto porque, ainda hoje,
são presentes no pensamento dos profissionais da educação conceitos simplistas,
ligados a uma teoria positivista, que destoam do que de fato são, tendo como base os
atuais atos legislativos.
Esse processo iniciou a partir dos movimentos sociais de caráter sociopolítico e
cultural, que buscavam resistir e lutar contra a opressão e exclusão dos grupos
minoritários, em um movimento de busca pela liberdade (GOHN, 2011). Decorrente
dessa época, o movimento internacional de inclusão social, que ganhou forças no final
do século XX, defende a ideia de uma sociedade democrática e de igualdade,
independentemente das especificidades de cada indivíduo, na qual todos conquistam
sua cidadania, a diversidade é respeitada e há aceitação e reconhecimento político
das diferenças (MENDES, 2002).
Assim, princípios antes esquecidos, como aceitação, respeito e valorização, passaram
a ser vistos como necessários numa tentativa de homogeneização social e de
construção de uma sociedade mais justa. Dessa forma, os movimentos sociais,
exprimem sua força à medida que, coletivamente, por meio da comunicabilidade,
constroem novas propostas a partir de um diagnóstico preciso da realidade social
(GOHN, 2011).
Nesse propenso horizonte homogeneizador, vimos surgir um vasto conjunto de
documentos que defendem a inclusão dos indivíduos que antes viviam à margem da
sociedade nos espaços escolares. A diferença e a diversidade, por muito tempo,
representaram um dilema a ser enfrentado no contexto escolar, uma vez que todos
aqueles que estavam fora do padrão, do limite aceitável imposto pela sociedade,
também estavam afastados do processo de ensino-aprendizagem.
31
Por se tratar de um movimento social que perpassa os diferentes ambientes, a escola
ganha um importante destaque nesse processo. Desse modo, concordamos com Lima
e outros (2008, p. 3-4), que sublinham princípios importantes para a inclusão,
alegando que
[...] incluir implica considerar que a escola não é uma estrutura pronta, acabada, inflexível, mas uma estrutura que deve acompanhar o ritmo dos alunos, em um processo que requer diálogo nos grupos de trabalho, na relação com a comunidade escolar e com os outros campos do conhecimento, tais como a saúde, o desenvolvimento social, as universidades e outros.
Entre as propostas criadas para ajustar as condições de pessoas excluídas ao longo
do processo histórico, destacamos aqui, como marcos internacionais, a Conferência
Mundial sobre Educação para Todos (1990) e a Declaração de Salamanca (1994).
Esses marcos apontam para a democratização da educação e para a necessidade de
se assegurar acesso, permanência e aprendizagem a todos, independentemente das
particularidades dos alunos.
Mesmo não se referindo propriamente à Educação Especial e tratando a inclusão de
uma maneira mais ampla, esses marcos trouxeram significativos impactos para a
área. No Brasil, destacamos uma nova visão para o processo de escolarização dos
alunos PAEE. Os reflexos desencadeados evidenciaram a falta de uma política
educacional direcionada para esses indivíduos em nosso país e, após anos de
discussão, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN n.º 9.394, de
20 de dezembro de 1996) introduziu no discurso legal o termo necessidades
educativas especiais e ainda afirmou a prioridade do ensino regular a essa parcela da
população.
No entanto, apesar de a LDB e demais atos legislativos provenientes da década de
1990 contribuírem com significativos avanços para a Educação Especial, as melhorias
não foram suficientes para desvincular a Educação Especial brasileira do modelo
assistencialista (MENDES, 2010).
Ao longo da última década dos anos 2000, outros documentos foram surgindo,
voltados para a Educação Especial em uma perspectiva inclusiva. Em nível
internacional, destacamos a Convenção de Guatemala (2001) e a Convenção de Nova
Iorque (2006), que influenciaram a difusão de outros dispositivos legais no Brasil, a
saber: a Resolução CNE/CEB n.º 2, de 11 de setembro de 2001, que institui Diretrizes
32
Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (BRASIL, 2001), e a
Resolução CNE/CP n.º 1/2002, que normatiza a formação de professores,
contemplando conhecimentos da Educação Especial (BRASIL, 2002).
Destacamos aqui um significativo salto para a temática. Os alunos PAEE, que antes
eram atendidos preferencialmente em classes ou escolas especiais, passaram a ser
atendidos extraordinariamente nessas dependências, ou seja, apesar de se preservar
a lógica de integração/segregação, modificou-se a expressividade (GARCIA;
MICHELS, 2011).
Contudo, é possível observar nesses documentos uma concepção muito abrangente
do aluno PAEE. A perspectiva envolta no termo necessidades educacionais especiais
engloba alunos com diferentes particularidades, que vão desde questões congênitas
às de cunho social, cultural e econômico.
Assim, percebe-se que não há uma unanimidade de pensamento sobre educação
inclusiva, destacando-se ideias vinculadas a inclusão referente à deficiência e à
necessidade de educação especial; inclusão como resposta a exclusões disciplinares;
inclusão que diz respeito a todos os grupos vulneráveis à exclusão; inclusão como
forma de promover a escola para todos; inclusão como “educação para todos” e
inclusão como uma abordagem de princípios à educação (AINSCOW, 2009).
Ainscow (2009), ao discorrer sobre como a educação inclusiva deve ser
conceitualizada, destaca que, de modo geral, independente dos seus sentidos, o
objetivo desse processo precisa ser o de eliminar a exclusão social, considerando-se
as diferenças quanto a etnia, idade, classe social, religião, gênero e habilidades,
consolidando-se a educação como princípio básico dos direitos humanos, para
construção de uma sociedade mais justa.
Somente em 2008, com a promulgação da Política Nacional de Educação Especial na
Perspectiva Inclusiva (PNEE-PI), é que houve alteração do alunado a ser atendido pela
Educação Especial, agora compreendido por aqueles que apresentam deficiências,
TGD e altas habilidades/superdotação (BRASIL, 2008a). Outra alteração proposta por
essa legislação refere-se à redefinição do conceito de Educação Especial, que deixou
de estar vinculado à ideia de uma proposta pedagógica para direcionar recursos e
serviços, assumindo a ideia de complementaridade e suplementaridade à escola
33
comum por meio do AEE (GARCIA; MICHELS, 2011). O AEE
[...] identifica, elabora e organiza recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras para a plena participação dos alunos, considerando as suas necessidades específicas. As atividades desenvolvidas no atendimento educacional especializado diferenciam-se daquelas realizadas na sala de aula comum, não sendo substitutivas à escolarização. Esse atendimento complementa e/ou suplementa a formação dos alunos com vistas à autonomia e independência na escola e fora dela (BRASIL, 2008b).
Ainda nesse caminhar de idas e voltas, destacamos o Plano Nacional de Educação
(PNE), meta quatro, que retrocede às conquistas anteriores, visto que,
universalizando a Educação Básica para os alunos PAEE, cede outra vez lugar para
a atuação de instituições especializadas.
Universalizar, para a população de 4 a 17 anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, o acesso à educação básica e ao atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino, com a garantia de sistema educacional inclusivo, de salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços especializados, públicos ou conveniados (BRASIL, 2014, grifos nossos).
Em 2015, a Lei Brasileira de Inclusão foi mais um passo no processo de inclusão e
aceitação dos alunos PAEE, desta vez na Rede Privada de Ensino, que passou a ficar
impedida de efetuar a cobrança de taxas extras na mensalidade desses alunos e a
responsabilizar-se por tudo o que for referente ao processo de ensino e aprendizagem
dessa clientela (BRASIL, 2015).
Considerando tudo o que foi evidenciado, podemos notar que o processo de inclusão
escolar se constituiu como movimento social de luta pela democracia e aceitação das
diferenças, caracterizando-se por muitas contradições no decorrer da história
(GARCIA; MICHELS, 2011).
Dessa maneira, a escola vem tentando constituir-se como espaço propício de
convivência e troca entre os diferentes, possibilitando avanços e crescimento de
ambos os lados. Porém, foram e ainda são vários os problemas enfrentados por esses
sujeitos na busca de inclusão. Se a inclusão dos alunos PAEE já se destacou com
uma tendência assistencialista e de valorização dos aspectos médico e psicológico,
nos dias atuais o grande desafio está em garantir a permanência e a aprendizagem
desses alunos na escola regular.
Ainda hoje, vivenciamos uma escola que se institui e insiste na negação das
34
diferenças, mascarando as múltiplas figurações dos sujeitos que nela vivem o
cotidiano educativo;
[…] uma escola desenhada para promover a homogeneidade e negar a diversidade inerente à pessoa humana. Uma escola que, embora se expanda por meio de um processo de “universalização do ensino”, contribui ainda para a manutenção da exclusão dentro de seus muros, por meio de metodologias descontextualizadas e descompassadas, programações lineares, temporalidade inflexível e categorias, como de sucesso e insucesso, normalidade e anormalidade, atraso e fracasso escolar (ALMEIDA, 2010, p. 19).
Em síntese, vivemos em uma sociedade onde predomina uma racionalidade orientada
aos fins, à padronização, que, ao mesmo tempo em que busca avançar, retrocede no
reconhecimento das diferenças, evidenciando uma lógica tecnicista de progresso. No
entanto, concordamos com Victor, Vieira e Oliveira (2018, p. 17) quando destacam:
Nem de longe, essa empreitada tem sido fácil e desconectada de desafios! Podemos dizer de uma caminhada processual em que os desafios são assumidos como elementos de investigação e motores da composição de várias políticas públicas educacionais e de práticas pedagógicas, situação que desvela a busca por possibilidades para educar na diferença/diversidade, assumindo essas categorias como intrínsecas ao desenvolvimento humano.
Nessa perspectiva, seguimos confiando no que Habermas nos propõe como inclusão
do outro, garantindo a todos a igualdade de direitos: “[...] a ‘inclusão do outro’ significa
que as fronteiras da comunidade estão abertas a todos – também e justamente
àqueles que são estranhos um ao outro – e querem continuar sendo estranhos”
(HABERMAS, 2004a, p. 8).
Assim, tendo em vista todas essas transformações sofridas ao longo dos anos, toda
essa dubiedade no conceito de Educação Especial, que ora avançava no atendimento
desses alunos, buscando para eles autonomia e aprendizagem, ora retrocedia,
alargando o leque de sujeitos embarcados nesse contexto e aproximando-os de um
atendimento clínico e assistencialista, faz-se necessário voltarmos nosso olhar para
os professores e para as políticas de investimento em sua formação, como
intermediários nesse processo de inclusão escolar, como abordado a seguir.
2.1 A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO CONTEXTO DA INCLUSÃO
ESCOLAR: QUE CAMINHOS ESTAMOS SEGUINDO?
Uma vez garantido aos sujeitos PAEE o acesso à escola, um longo caminho precisa
35
ser trilhado para que o direito ao processo de ensino-aprendizagem seja também
assegurado. Um dos grandes desafios para pesquisadores, gestores e professores
diz respeito à formação dos profissionais da educação diante da necessidade de
constituir novas/outras práticas pedagógicas e educativas.
No entanto, não queremos desconsiderar toda a história percorrida no processo de
formação desses profissionais, por isso torna-se necessário um resgate histórico a fim
de identificarmos como se deu esse processo no que tange ao atendimento dos alunos
PAEE.
Como destaca Tardif (2002, p. 15), “[...] o saber dos professores é profundamente
social e é, ao mesmo tempo, o saber dos atores individuais que o possuem e o
incorporam à sua prática profissional, para a ela adaptá-lo e transformá-lo”. Assim,
não podemos negar que o crescimento do número de matrículas dos alunos da
Educação Especial na escola regular mexe com esses docentes.
Ao se referir ao aumento no número de matrículas dos alunos PAEE, Prieto (2007)
destaca que esse crescimento tem levado os órgãos federais, estaduais e municipais
a se preocuparem mais com a qualificação de seus profissionais.
O panorama da evolução dos direitos legais e de matrículas dos alunos com necessidades educacionais especiais nas escolas comuns tem contribuído muito para que a formação dos professores com conhecimentos sobre o atendimento dessa população seja uma preocupação de vulto nacional (PRIETO, 2007, p. 85).
Conforme pudemos observar na fala da autora, a inclusão desses alunos nas escolas
regulares tem ocasionado um movimento de pensar sobre a qualidade desse
atendimento e, consequentemente, de qualificação desses profissionais. No entanto,
a história da formação desses indivíduos segue a mesma perspectiva instrumental
das políticas de inclusão escolar. O artigo 59, inciso 3.o, da LDB reforça esse
pensamento ao destacar que há necessidade de professores capacitados para
integrar os alunos na escola (BRASIL, 1996). Não sendo dessa forma, faz-se
necessária uma formação crítico-reflexiva desse profissional, relacionando aspectos
teóricos importantes para fundamentar a prática docente: “[...] professores com
especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento
especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a
integração desses educandos nas classes comuns” (BRASIL, 1996).
36
Já em 2011, foi assegurado aos profissionais, a partir da PNEE-PI, “[...] IV – formação
de gestores, educadores e demais profissionais da escola para a educação na
perspectiva da educação inclusiva, particularmente na aprendizagem, na
participação e na criação de vínculos interpessoais” (BRASIL, 2011).
No entanto, apesar de reconhecermos que o documento é enfático ao ratificar a todos
os profissionais da escola formação em educação inclusiva, destacamos que este
ainda é um desafio a ser superado. Milanesi (2012, p. 106) destaca que
[...] os cursos voltados para a área da Educação Especial são, em grande parte, oferecidos para os profissionais atuantes nas SRMs, ficando para os professores comuns a possibilidade de acesso às formações somente quando há excesso de vagas. Essa é uma questão de política pública de educação, a qual deve considerar a formação e a valorização de professores e estar, sobretudo, comprometida com o desenvolvimento de profissionais capazes de lidar com a diversidade humana.
Ao questionarmos o que deve ser levado em consideração quando refletimos sobre
formação continuada na perspectiva de uma inclusão escolar, concordamos com
Almeida (2012), quando diz que é preciso considerar que o AEE em salas
multifuncionais nas escolas ou nos centros dedicados a esse atendimento é uma das
possibilidades, e não a única. Ressalte-se ainda que, para atuar em salas
multifuncionais (professor do AEE) ou em salas comuns (professor de classe comum),
se torna urgente e necessário discutir e repensar a formação desses profissionais.
Mesmo reconhecendo os avanços existentes no processo histórico no que concerne
à legislação, entendemos que ainda há muito a fazer a fim de promover a
universalização com acesso, permanência e aprendizagem, oferecendo, além de
acessibilidade ao ambiente físico, materiais adaptados, profissionais qualificados para
desempenharem tal função.
Assim, concordamos com Mantoan (2015), para quem reconhecer as mudanças
ocorridas na política de Educação Especial, com significativos impactos na garantia
de matrícula, no financiamento público em recursos, não significa dizer que problemas
históricos relacionados à garantia do direito à educação dos estudantes PAEE foram
solucionados.
Gatti (2009) destaca:
Nas instituições formadoras, de modo geral, o cenário das condições de formação dos professores não é animador pelos dados obtidos em inúmeros
37
estudos e pelo próprio desempenho de sistemas e níveis de ensino, revelado por vários processos de avaliação ampla ou de pesquisas regionais ou locais. Reverter um quadro de formação inadequada não é processo para um dia ou alguns meses, mas para décadas (GATTI, 2009, p. 95).
Desse modo, observando as transformações ocorridas desde o início do processo de
inclusão social até a chegada à inclusão escolar, temos presenciado um aumento
significativo de ações e pesquisas relacionadas à formação continuada de
profissionais da educação.
Com esse olhar mais amplo sobre o processo de inclusão escolar dos alunos PAEE,
que passou a acolher os alunos antes excluídos dos processos de ensino-
aprendizagem nas escolas regulares de ensino, pela via da inclusão social (MENDES,
2002) e suas reflexões na formação de professores, voltamos nossa atenção para as
questões de ordem política e econômica que emergiram e trouxeram impactos
significativos para a educação nacional e estadual.
2.2 QUESTÕES ATUAIS DA EDUCAÇÃO
Como podemos observar na trajetória descrita acima, temos acompanhado ao longo
dos anos um movimento de inclusão dos alunos PAEE nos espaços escolares e o
avanço na legislação voltada para esse processo. No entanto, como sinalizado,
reconhecemos que há um caminho a ser percorrido a fim de promover a permanência
na escola e a aprendizagem desses alunos, caminho incerto tendo em vista o contexto
político que estamos vivenciando.
Estamos sendo atravessados por projetos carregados de ideologias políticas e de
controle do Estado, que têm ameaçado o direito a uma educação gratuita, laica e de
qualidade. Como exemplo, destacamos os projetos Escola Sem Partido, Reforma do
Ensino Médio e Base Nacional Comum Curricular. O programa Escola sem Partido
elenca seis deveres obrigatórios ao docente, defendendo a ilusória ideia de
neutralidade do conhecimento, impedindo os professores de se expressarem como
sujeitos sociais, históricos e de direitos. Cara (2016), em reportagem publicada,
ressalta que “[...] não é possível [ser neutro] porque qualquer tema que se aborde leva
um juízo de valor do professor, o que é importante”. O que ele não pode fazer é limitar
a aula a seu juízo de valor. Parafraseando Freire (1987), o autor acrescenta que,
38
apesar de apresentar sua visão de mundo, o professor não pode ficar limitado a ela,
abrindo dessa forma um leque de opções para os docentes.
Sobre a Reforma do Ensino Médio, o Governo propôs uma flexibilização da grade
curricular que possibilita ao aluno escolher a área de interesse do conhecimento que
deseja aprofundar. Decorrente desse movimento, foi construída a Base Nacional
Comum Curricular, que traz uma proposta de currículo comum a todas as escolas e
outra flexível. Essa proposta define o que é essencial ao aprendizado do estudante,
possibilitando aos estados uma organização de acordo com as demandas dos alunos,
almejando a valorização de uma formação técnica e profissional. Martins e Carvalho
(2017, p. 70) fazem considerações a respeito:
Analisando a particularidade do capitalismo e neoliberalismo brasileiro, focamos na “Reforma” do Ensino Médio e a instituição de mecanismos de desvalorização do conhecimento escolar, na formação de um currículo entrelaçado por um discurso ideológico que integre as formas de depauperamento do trabalho formal. Não poderíamos deixar de registrar a luta dos estudantes contra o esfacelamento da escola e a resistência aos achaques da mídia burguesa, resultando no maior movimento de ocupações de escolas ocorridos na história do Brasil. Da mesma forma, concluímos nossa reflexão, reafirmando o papel primordial da educação escolar na formação da consciência e personalidade dos indivíduos. A luta pela escola torna-se também uma forma de resistência aos processos de subordinação e obnubilação das consciências individuais aos efeitos devastadores da produção alienada do capital.
Seguindo essa mesma ordem tecnicista e de repressão, vemos no estado do Espírito
Santo a criação de programas, como a Escola Viva e o Pacto pela Aprendizagem no
Espírito Santo (PAES), que buscam desenvolver competências técnicas nos alunos,
sem reflexividade, e elevar o número de indicadores em avaliações de larga escala.
O PAES defende a padronização do currículo, do material didático e da formação de
professores como mecanismo de monitoramento e controle da aprendizagem e da
avaliação.
Assim, temos observado a valorização do modelo de educação pensado pela
racionalidade instrumental, objetivando a produção, com foco no mercado de trabalho
e na mão de obra barata para o desenvolvimento da economia. Quanto menos os
alunos pensarem e quanto menos tiverem fundamentos para refletir de forma crítica
na sociedade, melhor para o Estado, que terá o controle desses indivíduos, que
continuarão como massa de manobra.
39
Com tantos retrocessos, já é possível observar uma redução nos investimentos na
educação em nosso Estado, “[...] com fechamento de 41 escolas públicas e de 6.507
turmas, deixando mais de 60.000 crianças e jovens de 4 a 17 anos fora da escola, o
que fortalece a mercantilização do ensino público e a negação do direito à educação”
(CONFERÊNCIA NACIONAL POPULAR DE EDUCAÇÃO DO ESPÍRITO SANTO,
2018).
Decorrentes desses e de outros retrocessos e cortes na educação pública e de
qualidade em nosso país e estado, observamos reflexos também na escolarização
dos alunos PAEE. Notamos um movimento de combate à inclusão escolar e a
retomada da segregação.
No contexto estadual, políticas de transferências de recursos às instituições privadas conveniadas e/ou filantrópicas têm sido implementadas, desonerando o poder público de suas responsabilidades, conforme previsto nos documentos nacionais, para assegurar a escolarização na escola comum com vistas à efetivação do processo de inclusão escolar (CONFERÊNCIA NACIONAL POPULAR DE EDUCAÇÃO DO ESPÍRITO SANTO, 2018).
Essa alteração pela estrutura da esfera pública se dá pelo progresso do capitalismo e
do incentivo à privatização, até mesmo da Educação, que tem perdido seu caráter
político e formador. Com isso, as grandes organizações têm ganho cada vez mais
autonomia e o Estado vem-se acuando em suas funções. Habermas (2003) ressalta
que esse enfraquecimento permite que a racionalidade sistêmica com fins
estratégicos cresça descontroladamente, restando-nos apenas reproduzi-la.
Temos presenciado um movimento político elaborado de cima para baixo, lutando
contra a Teoria do Agir Comunicativo. Não se ouvem mais as escolas, os estudantes
e a universidade. Assim, como forma de resistir a tudo o que está sendo imposto
autoritariamente, colocamo-nos na condição de romper com a lógica do silenciamento,
tão presente atualmente, que se reflete, entre outras situações, na formação dos
professores.
A ação instrumental orienta-se por regras técnicas que se apoiam no saber empírico. [...] O comportamento da escolha racional orienta-se por estratégias que se baseiam num saber analítico. Implicam deduções de regras de preferências (sistemas de valores) e máximas gerais: estas proposições estão deduzidas de um modo correto ou falso (HABERMAS, 1968, p. 57).
Em contrapartida, Habermas acredita na força da racionalidade comunicativa, pois, de
acordo com o filósofo, a linguagem, além de reproduzir pensamento, carrega a
possibilidade de entendimento, do consenso, da troca e da comunicação entre os
40
diferentes sujeitos, por meio do diálogo e da força do melhor argumento.
Dessa forma, buscamos caminhar no movimento de escuta das escolas e de seus
profissionais para a composição de currículos de formação continuada com viés
democrático e participativo. Para tanto, no capítulo a seguir, realizamos uma retomada
de estudos já realizados, buscando identificar o que vem sendo feito no intuito de
romper em direção a novas possibilidades.
41
3 O DIÁLOGO COM OUTRAS PESQUISAS E AS CONTRIBUIÇÕES DO AGIR
COMUNICATIVO NA CONSTRUÇÃO DE UM CURRÍCULO DE FORMAÇÃO
CONTINUADA
Neste momento, buscamos refletir sobre a formação continuada dos profissionais da
Educação Básica na perspectiva da escolarização dos alunos PAEE. Para tanto, fez-
se necessário voltar nosso olhar para os estudos já realizados, desenvolvendo o que
Vielle (1981), citado por Sánchez-Gamboa (2007), chama de “pesquisa das pesquisas”,
estabelecendo um diálogo com eles e buscando entender, por meio de outros
trabalhos, os principais desafios que perpassam essa temática bem como as
contribuições que nos indicam caminhos a seguir para avançarmos na construção do
conhecimento.
De acordo com Prodanov e Freitas (2013, p. 78), “[...] a revisão de literatura tem papel
fundamental no trabalho acadêmico, pois é através dela que você situa seu trabalho
dentro da grande área de pesquisa da qual faz parte, contextualizando-o”. Assim, no
intuito de estruturarmos uma visão sobre o objeto em destaque – a formação
continuada com vistas à inclusão dos alunos PAEE –, tomamos como ponto de partida
a pesquisa bibliográfica na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações
(BDTD)5 e na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações do Programa de Pós-
Graduação em Educação (PPGE) da Ufes6, utilizando como espaço temporal o
período de dez anos (2007-2017).
Procedemos também a uma busca nas publicações disponíveis no site da Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped)7, referentes aos
grupos de trabalhos (GTs) Formação de Professores (8), Currículo (12) e Educação
Especial (15), e de periódicos que se destacam na área da Educação, a saber:
Cadernos de Pesquisa em Educação, Revista Brasileira de Educação e Revista
Educação Especial. Nesta varredura, selecionamos como data-corte o período de
2012 a 2017.
No que tange à busca na BDTD, utilizamos a combinação de diferentes descritores,
tais como formação continuada, formação em serviço, educação especial, inclusão
5 http://bdtd.ibict.br/vufind/ 6 http://educacao.ufes.br/pos-graduacao/PPGE 7 http://www.anped.org.br/
http://bdtd.ibict.br/vufind/http://educacao.ufes.br/pos-graduacao/PPGEhttp://www.anped.org.br/
42
escolar, prática docente, currículo, currículo de formação continuada e política de
formação continuada, em diferentes combinações.
De modo geral, com o passar dos anos tivemos um crescimento no número de
pesquisas envolvendo as diferentes temáticas, salvo nos dois últimos anos (2016,
2017), em que houve uma queda significativa no total de estudos. Notou-se também
o quão vasta é a bibliografia na área de formação continuada e currículo.
Nos demais ambientes pesquisados (sites do PPGE/Ufes e da Anped), não foi
possível uma busca por descritores, pois esses sites não dispunham do mecanismo
adequado. No entanto, seguimos a mesma lógica usada na busca de estudos que se
relacionassem com o tema desta pesquisa. Assim, selecionamos aqueles que tinham
como título e/ou palavras-chave ao menos um dos termos usados nos descritores
acima citados.
Nas buscas realizadas no site da Anped, abrangemos as últimas três edições do
evento (2012, 2013 e 2015), uma vez que até 2013 os encontros foram realizados
anualmente e, depois de uma alteração, passaram a acontecer de dois em dois anos.
Os trabalhos referentes à última edição (2017) ainda não estão disponíveis para
consulta.
Realizamos, também, uma busca de livros que explicam o processo da pesquisa bem
como produções dos participantes dos grupos, tomando como base a biblioteca
pessoal do Grufopees (Google Drive), uma vez que esta pesquisa de mestrado nasceu
da produção de estudos anteriores de grupos de pesquisas da Universidade que se
voltam para a temática na Educação Especial.
Na primeira etapa de mapeamento das pesquisas, chegamos ao quantitativo de 119
trabalhos, buscando estudos que não destoassem da nossa área de interesse, uma
vez que, no primeiro levantamento, selecionamos pesquisas de diferentes áreas e
assuntos, como ciências da natureza, direito, informática, saúde, entre outros. Essa
primeira varredura foi realizada levando em consideração apenas os títulos dos
trabalhos.
Posteriormente, realizamos a leitura dos resumos dos textos selecionados, buscando
identificar aqueles que discutiam a Educação Especial e a importância da formação
continuada bem como os que tomavam a prática como disparadora nesse processo.
43
Com esse movimento, selecionamos 68 trabalhos cujos textos foram lidos em sua
totalidade (Anexo A). No geral, os estudos enfatizam a temática de formação de
professores com intuito de preparar os profissionais para a Educação Especial. O
Gráfico 1 nos mostra a evolução (ano a ano) dos estudos desenvolvidos.
Gráfico 1 – Evolução dos estudos sobre Formação Continuada e Educação Especial
Fonte: Elaborado pela autora (2017).
Podemos observar que de 2012 a 2015 temos uma concentração de estudos sobre a
temática da formação continuada na área de Educação Especial na perspectiva
inclusiva. Será isso um reflexo das políticas municipais e estaduais que buscaram
atender as diretrizes nacionais a partir de 2008? Os grupos de pesquisa focalizam
essa temática considerando quais aspectos: a formação de professores de sala
comum, a formação de professores de Educação Especial? Assim, no Quadro 1
trazemos as temáticas encontradas nesses estudos. Vale destacar que um mesmo
estudo aborda mais de uma temática, assim o total corresponde ao número de vezes
em que foi discutida no conjunto dos estudos.
Considerando o foco de nosso estudo, grande parte dos trabalhos (dissertações, teses
e artigos científicos) que selecionamos problematizam a formação de profissionais da
Educação. Dessas produções, 19,44% focalizam a formação continuada de
professores de Educação Especial, o que condiz com as políticas adotadas no mesmo
período (2008 a 2018), na qual as diretrizes enfatizam a atuação do professor de
Educação Especial em salas de recursos multifuncionais. No entanto, muitos estudos
buscam refletir sobre a formação do professor de sala comum (16,6%) e outros
destacam o ensino colaborativo como estratégia para formação (2,7%). Esses estudos
32
01
5
1312 12
10
6
4
0
2
4
6
8
10
12
14
2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018
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nos mostram que o foco é a inclusão do aluno PAEE na escola e na sala comum.
Quadro 1 – Temáticas abordadas nos estudos
TEMÁTICAS
TOTAL
Formação de professores
72
Formação continuada de professores sala comum
12 Formação de professores de educação Especial
14
Formação de gestores de educação Especial
8
Formação de gestores escolares
6
Políticas de formação de professores
7
Formação continuada pela via da prática pedagógica
1
Formação em serviço pela via dos grupos 2
Formação docente na relação universidade e escola 1
Formação pela via do ensino colaborativo 2
Currículo de formação continuada 9
Formação continuada dos profissionais da educação 8
Formação e desenvolvimento profissional docente
2
Prática Pedagógica 7
Trabalho colaborativo entre Educação Especial e comum 3 Prática pedagógica inclusiva 2
Trabalho do professor de Educação Especial
1
Políticas Públicas 2
Políticas de educação inclusiva no Brasil 1 Análise de programas de formação 1
Fonte: Elaborado pela autora (2017).
Um dado relevante é o aumento de pesquisas sobre a formação de gestores públicos
de Educação Especial (11,11%). Esses estudos destacam o importante papel do
gestor na elaboração de políticas públicas. Outro dado é que 9,72% dos estudos
discutem a formação dos gestores escolares, principalmente do coordenador
pedagógico ou do supervisor pedagógico. No Quadro 2, apontamos as principais
universidades que vêm destacando-se na realização desses estudos.
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Quadro 2 – Regiões/Universidade dos estudos abordados
Região Norte Universidade Federal do Pará
Região Nordeste Universidade Federal da Bahia Universidade Federal da Paraíba Universidade Federal do Rio Grande do Norte Universidade Federal do Ceará Universidade Federal de Alagoas
Região Centro-Oeste Universidade de Brasília Universidade Federal de Goiás
Região Sudeste Universidade Federal do Espírito Santo Universidade Estadual de Campinas Universidade Federal de São Carlos Centro Universitário Moura Lacerda Universidade de São Paulo Universidade do Estado do Rio de Janeiro Universidade Federal de Ouro Preto Universidade Nove de Julho Unigranrio Universidade Federal de Minas Gerais Universidade Estadual Paulista
Região Sul Universidade do Extremo Sul Catarinense Universidade Federal de Santa Maria Universidade Federal do Rio Grande do Sul Universidade Federal de Santa Catarina Universidade Estadual de Londrina Universidade Estadual do Oeste do Paraná
Fonte: Elaborado pela autora (2017).
Observamos que as Regiões Sul e Sudeste foram as que mais se destacaram quanto
ao número de pesquisas encontradas no que se refere às temáticas abordadas neste
estudo. Já o menor quantitativo foi identificado na Região Norte do país: apenas um
estudo no estado do Pará. Dessa forma, surgem indagações do tipo: Como tem sido
realizada a formação continuada nas cidades do norte do Brasil? Quais os fatores
econômicos e culturais por trás desse resultado? Por que essa discrepância na
quantidade dos estudos?
Essa análise permitiu-nos delimitar dezoito pesquisas que tratam de questões
relacionadas ao objeto deste estudo: inclusão escolar dos alunos PAEE por meio da
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construção de um currículo de formação continuada que envolva os diferentes
profissionais da escola. Tais pesquisas, usadas na ação comunicativa com esta
revisão de literatura, ajudaram-nos a alcançar nosso objetivo. A tabela a seguir nos
mostra a natureza dos estudos analisados.
Tabela 1 – Natureza dos estudos analisados
Natureza Quantidade
Anais de eventos 3
Artigos 3
Capítulos de livros 3
Dissertações 6
Teses 3
Fonte: Elaborada pela autora (2017).
Com base nesse panorama dos estudos, elaboramos o Quadro Análise (Apêndice A)
como metodologia de organização do material, que permitiu entender e situar os
resultados das pesquisas encontradas.
Assim, a partir da análise desses estudos, organizamos os trabalhos em três
categorias que norteiam esta pesquisa: a formação continuada na perspectiva da
educação inclusiva desenvolvida pela União, pelos estados e pelos municípios; o
contexto da prática educativa e os indícios para elaboração de currículos de formação
continuada, e um olhar para “dentro”: o que aprendemos a partir da produção dos
grupos de pesquisa da universidade, as quais nos levaram ao objetivo de analisar as
concepções, propostas e ações formativas para os profissionais da educação em
relação ao processo de inclusão dos alunos PAEE, considerando as diferentes
intencionalidades dos sujeitos envolvidos.
Na primeira categoria, dialogamos com seis estudos: Gonçalves (2008), Lima e
Dorziat (2013), Nóvoa (2012), Padilha (2013), Rocha (2013) e Silva (2016). Na
segunda categoria, conversamos com outros seis autores: Astori (2014), Borges
(2007), Caetano (2007), Rabelo (2012), Vieira (2012), Vilaronga (2014). Na terceira e
última categoria, destacamos as pesquisas de Almeida, Rocha e Silva (2012),
Almeida, Silva e Alves (2017), Almeida, Zambon e Piloto (2014), Honorino, Carvalho
e Almeida (2017), Nogueira, Jesus e Effgen (2012), Silva, Vieira e Senna (2012). Posto
47
isso, nos próximos itens discutiremos, com mais afinco, essas pesquisas.
3.1 A FORMAÇÃO CONTINUADA NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA
DESENVOLVIDA PELA UNIÃO, PELOS ESTADOS E PELOS MUNICÍPIOS
Para este tópico, dialogamos com diferentes trabalhos que abordam a temática da
formação continuada sob a perspectiva das secretarias municipais de educação
(Seme). Uma vez que nos propomos analisar as concepções, propostas e ações
formativas elaboradas e implementadas pela Rede Municipal de Ensino de Cachoeiro
de Itapemirim, precisamos voltar um olhar para outros estudos, considerando o que
vem sendo realizado e os resultados alcançados. Cabe ressaltar que englobamos
neste tópico estudos que se debruçam a analisar programas do Governo Federal e
Estadual, visto que são implementados em diferentes municípios, o que traz à nossa
mente questionamentos de como uma formação pensada num contexto macro reflete
em mudanças no micro.
Um dos estudos abordados foi apresentado na XXXVI Reunião Anual da Anped por
Lima e Dorziat (2013) e trata do recorte de uma pesquisa realizada em três creches e
pré-escolas municipais em Campina Grande-PB. As autoras buscaram analisar as
concepções e as práticas pedagógicas adotadas pelas professoras de salas regulares
(regentes de turma) e do AEE, que desenvolviam atividades com crianças com
deficiência no cotidiano. Tendo em vista as diferenças e particularidades de cada
indivíduo, as pesquisadoras questionaram-se sobre o impacto da política de inclusão
na Educação Infantil, a percepção dos docentes que atuam com os alunos com
deficiência e o modo como o trabalho estava sendo realizado.
Os dados coletados por meio de observação e entrevistas evidenciaram práticas
cotidianas marcadas por situações de exclusão, nas quais era negado às crianças
com deficiência participar de vivências fundamentais para o seu desenvolvimento.
Essa constatação levou-as a perceber a necessidade de investimentos em formação
continuada que envolvam as temáticas educação inclusiva e educação infantil, num
trabalho coletivo e colaborativo com toda a comunidade escolar.
Lima e Dorziat (2013) ressaltam que oferecer um ensino de qualidade a todos os
educandos, incluindo aqueles que têm alguma deficiência ou alguma dificuldade que
48
possa afetar sua aprendizagem, não é uma tarefa fácil para um sistema que se coloca
como inclusivo. No entanto, é preciso que a escola reorganize sua estrutura, seu
funcionamento, sua metodologia, seus recursos pedagógicos e, principalmente, que
se conscientize da premência desses ajustes e garanta que seus profissionais estejam
abertos para essa nova realidade.
As autoras frisam a necessidade de superação dessa abordagem, presente nas
escolas de caráter generalista de desenvolvimento, que relaciona a aprendizagem
com pressupostos da “normalidade”. Assim, podemos observar que, por falta de
conhecimento e informação, muitos docentes, apesar de não se colocarem contra a
inclusão, acabam excluindo os alunos por não saberem como trabalhar com eles.
Ao almejarmos avançar no conhecimento acerca da inclusão dos alunos PAEE em
Cachoeiro de Itapemirim, corroboramos o pensamento evidenciado nesta pesquisa de
que a formação contínua deve servir como mecanismo de superação dos modelos de
exclusão, de incapacidade, mostrando os vários possíveis existentes através de
estratégias de participação mediada.
Mesmo não tratando de uma pesquisa que investiga o processo formativo, Lima e
Dorziat (2013), ao apontarem os resultados de seu estudo, reforçam nosso
pensamento sobre a importância da formação contínua no processo de inclusão
escolar e nossas indagações sobre como os diferentes municípios têm caminhado e
avançado nessa questão.
Outro estudo com o qual estabelecemos um diálogo nesta revisão foi elaborado por
Gonçalves (2008) em sua tese de doutorado. Abordando a temática da formação
continuada sob a perspectiva das políticas públicas, a autora investiga a
implementação da inclusão escolar em um município do Espírito Santo, no que tange
às políticas públicas, à formação continuada e às práticas educativas e organizativas
da escola. Para tanto, o estudo envolveu os profissionais da escola, familiares e
técnicos da Secretaria de Educação.
Sobre as práticas de formação desenvolvidas, a autora ressalta que esse processo
vem sendo atravessado e produzido por políticas capitalistas, diante das quais o
docente, cada dia mais, tem perdido o sentido de seu trabalho. Dessa forma, o que
vemos são propostas de políticas de formação pensadas de cima para baixo por
49
pessoas que não as vivenciam, ou seja, os responsáveis pelos processos de
formação, na maioria das vezes, não participam deles, e as escolas juntamente com
seus profissionais precisam moldar-se a esses padrões externos.
Sobre essas políticas, Ferreira (2006, p. 65) ressalta:
[...] além de estarem sendo formuladas numa realidade econômica e social cuja tendência é fortemente excludente, também caíram num contexto escolar que historicamente tem suas práticas educacionais orientadas por processos seletivos e que assumem a homogeneidade como princípio organizativo. Daí se originam inúmeras barreiras que dificultam a implementação das propostas de inclusão escolar.
Ainda com base em Ferreira, destacamos que, como consequência dessas políticas
capitalistas, pensadas de cima para baixo, é possível afirmar que “[...] é grande a
possibilidade, hoje, de um aluno com deficiência ter acesso à escola, lá permanecer,
mas, na sala de aula, ficar excluído dos processos de ensino-aprendizagem”
(FERREIRA, 2006,