43
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” UM NOVO OLHAR SOBRE OS TRANSTORNOS MENTAIS Por: MARILENE DE JESUS MATOS DE SÁ ORIENTADORA: PROFª MARIA POPPE RIO DE JANEIRO 2010

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

UM NOVO OLHAR SOBRE OS TRANSTORNOS MENTAIS

Por: MARILENE DE JESUS MATOS DE SÁ

ORIENTADORA:

PROFª MARIA POPPE

RIO DE JANEIRO

2010

Page 2: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

2

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

UM NOVO OLHAR SOBRE OS TRANSTORNOS MENTAIS

MARILENE DE JESUS MATOS DE SÁ

Apresentação de monografia ao Instituto A Vez do Mestre- Universidade Candido Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de Especialista em Terapia de Família.

Por: Marilene de Jesus Matos de Sá

Rio de Janeiro

2010

Page 3: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

3

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus pela vida e inteligência concedidos para a realização de meus sonhos.

A Marisa amiga de todas as horas, obrigado pela compreensão de sempre.

Ao Luiz Alexandre pelo incentivo na fase inicial desta nova jornada.

A minha família pelo apoio e preces de força.

Ao amigo querido Artênio psicopedagogo, pelas trocas de experiência e links que muito me ajudaram para a construção da minha vida acadêmica.

A todos que junto ao meu coração direta ou indiretamente me encorajaram para que concluísse essa nota etapa.

Page 4: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

4

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a todas as famílias que tem no seu núcleo familiar um portador de transtorno mental.

Page 5: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

5

METODOLOGIA

Para elaboração de estudo e resposta ao problema proposto foram utilizadas pesquisas bibliográficas, consultas a internet, artigos de caráter científico, além da consulta a profissionais possuidores de conhecimentos e experiência nesta área de estudo, como o psiquiatra Paulo Velasco citado na bibliografia.

Este estudo foi produzido por meio de consulta em livros de autores já experientes no trabalho com famílias que possuem doentes com transtornos mentais, foco deste estudo como Lou Olivier (2008), Jonas Melman (2006) e Paulo Velasco (2009).

Page 6: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

6

RESUMO

Esse estudo tem como objetivo mostrar recursos tanto para a cura

quanto para a profilaxia para se evitar qualquer doença dos transtornos

mentais e como o terapeuta familiar pode atuar no apoio à família dos

portadores de transtornos mentais, e provocar uma reflexão da importância dos

vínculos familiares para facilitar o processo de recuperação dos pacientes que

acreditando, cria motivação interna para sua auto-recuperação. Os temas

estabelecem como a família pode orientar e apoiar os doentes com transtornos

mentais que apesar dos medicamentos existe outros fatores que são

solucionados pela psicoterapia. Sob a luz do referencial teórico optei por

autores como Velasco, Melman, Olivier, Foucault e outros e aprofundei os

conhecimentos do histórico da loucura, sua relação com a religião e a

medicina. Em seguida foi abordado algumas síndromes psiquiátricas, suas

características,e os recursos para a cura.Sabemos que a reforma psiquiátrica

muito colaborou para a saúde mental e novos serviços com um novo modelo

de tratamento é criado, novos conceitos vinculados à prática psiquiátrica são

estabelecidos.Mencionei a participação da família no enfrentamento com a

doença mental e como agente de saúde mental.O desafio da família é

promover o bem estar dos portadores de transtornos mentais .

Page 7: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

7

SUMÁRIO

Capítulo I A história da loucura..........................................................11

1.1 A louca x mal................................................................................12

1.2 A loucura e a religião....................................................................14

1.3 A medicina e a loucura.................................................................15

Capítulo II As Síndromes psiquiátricas...............................................18

2.1 Definindo o que é Síndrome.........................................................19

2.2 Conhecendo algumas síndromes psiquiátricas............................20

2.3 Os recursos para profilaxia e a cura dos transtornos mentais.... 24

Capítulo III A reforma psiquiátrica.......................................................28

3.1 A Reforma psiquiátrica no Brasil...................................................30

3.2 O Hospital Nise da Silveira............................................................32

Capitulo IV Família e doença mental...................................................36

4.1 Quando a família adoece...............................................................37

4.2 A família como agente de saúde mental........................................38

Conclusão............................................................................................42

Bibliografia...........................................................................................43

Page 8: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

8

INTRODUÇÃO

Ao analisar a escolha do tema, foi observado o medo que as pessoas

tem de se aproximar de quem sofre de transtornos mentais e em outros casos

o medo de enlouquecer.

Isso porque existe uma preocupação de como o “louco” é tratado e o

preconceito e a rejeição por eles sofridos, num ambiente que mais parece de

prisão.

Os manicômios hoje vem passando por transformações importantes,

fazem acolhimento dos pacientes psiquiátricos.

Acolher , receber,agasalhar, amparar já nos define o dicionário, acolhimento é

a maneira de lidar com a diferença e entende-la sem medo, é olhar o sujeito

que vivencia a loucura como uma pessoa e não um conjunto de sintomas, ou

uma doença.

Quando uma pessoa enlouquece, ela não deixa de ser quem era, ao

longo de nossas vidas não deixamos de ser nós mesmos, apesar de algumas

transformações que sofrermos, a loucura é uma desses momentos.

A loucura não afeta só ao sujeito, ela atinge diretamente toda a sua família.

Cada membro da família compõe a rede familiar e quando um destes se

desequilibra, o grupo se desestabiliza profundamente, provocando uma série

de sentimentos, entre eles a rejeição e a ameaça.

Conviver com o louco é muito difícil, quase insuportável para a maioria

das famílias. A família sofre, por isso, ela também é convidada a se integrar

neste processo, tratar o sujeito e a família.

Esta monografia tem como objetivo mostrar recursos para a cura quanto

para a profilaxia para se evitar qualquer doença dos transtornos mentais.

Conhecer alguns transtornos, suas queixas, métodos e tratamentos.

Os pontos relevantes da pesquisa são: porque com o desenvolvimento

e avanço científico e tecnológico ainda assim se alastram os transtornos

mentais.

Page 9: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

9

Investigar como se alastram a doença, a forma de se precaver e até mesmo

curar os sintomas que afligem a população.

Levando me consideração que os transtornos mentais de somatização

atingem o indivíduo desde a primeira infância até a terceira idade, os

transtornos mentais são considerados como obstáculos para a realidade

psicológica da humanidade.

Esses transtornos mentais vem assustando tanto governos, quanto os

responsáveis pela saúde mental, que estudam a viabilização de recursos ,

formas de tratamentos diferenciados, que possam atender o indivíduo na sua

comunidade, sem a quebra do vínculo familiar.

Desse modo espera-se encontrar meios eficazes para a recuperação

dos pacientes, que acreditando criam motivação interna para sua

autorrecuperação. É importante estar preparado para procurar os recursos

certos no momento apropriado, para que assim consiga diminuir a dor e o

sofrimento dos pacientes com transtornos mentais.

Motivada por essas reflexões estará sendo desenvolvida esta pesquisa

que terá como título: Um novo olhar sobre os transtornos mentais.

Pretende-se aprofundar a discussão de que apesar do tratamento com

medicamento atuar satisfatóriamente auxiliando o equilíbrio dos

neurotransmissores existem outros fatores que são solucionados pela

psicoterapia. Em muitos casos, os portadores da doença mental procura auxílio

em terapias alternativas, como apoio emocional.

Apresente pesquisa emprega dados bibliográficos com base histórica.

Destacam-se autores como: Paulo Miguel Velasco,Jonas Melman,Lou

Olivier,Paula Boechat, Michel Foucault. Esses autores tratam da compreensão

na recuperação dos pacientes com transtornos mentais e no olhar para a

família que também sofre e é convidada a se integrar nesse processo.

A monografia será dividida nos seguintes capítulos:

No primeiro capitulo será abordado a história da loucura,através dos

relatos de Michel Foucault,o contexto da luta interna entre o bem e o mal,a

religião como cenário sobre o fenômeno da loucura e a medicina como ramo da

ciência que trata da doença mental.

Page 10: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

10

No segundo capítulo a definição de algumas síndromes psiquiátricas e

os recursos para a profilaxia e a cura dos transtornos mentais.

No terceiro capítulo a reforma psiquiátrica e a reforma psiquiátrica no

Brasil. Conhecendo o hospital Nise da Silveira.

No quarto capítulo a família e a doença mental.quando a família adoece

e a família como agente de saúde mental.

Page 11: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

11

CAPÍTULO I

A HISTÓRIA DA LOUCURA

A saúde mental no Brasil foi durante muito tempo associada ao hospital

psiquiátrico tradicional, que funcionava com base no modelo asilar. Hospício,

asilo e manicômio são sinônimos para esse modelo antigo que por muito tempo

esteve presente no discurso popular como uma representação tradicional do

lugar da loucura.

Ao final da Idade Média por volta do século XV, o problema da lepra

desaparece e, com isso um vazio aparece no espaço do confinamento, assim

aquele vazio deixado pelos leprosos foi ocupado pelos internos.

Aparece Michel Foucault fazendo uma analise sobre a loucura no livro A

história da loucura.

Foucault(2002) aponta que por volta do século XVIII, o louco passou a

ser excluído e confinado, ocupando lugares que antes eram destinados aos

leprosos, ao mesmo tempo em que o tema da loucura ganhava maior

visibilidade cultural. Não havia nesse momento uma definição precisa do que

seria a loucura e ela ainda não estava associada a uma disfunção médica. A

loucura, na Idade Clássica, se constituiria como uma oposição à razão, isto é,

uma desrazão. Foucault faz deste modo referência a Descartes, pontuando que

em um momento da história houve um gesto, uma conjuração, que separou a

loucura da razão. Foucault aponta que, naquela época, o ato de designar

alguém como louco, e assim conseqüentemente determinar a sua internação,

não dependia de uma ciência médica, mas sim de uma percepção do indivíduo

como ser social.

A reorganização das instituições de exclusão sofreu influência de fatores

políticos, econômicos e sociais, e não de uma necessidade médica, porém

essa reorganização possibilitou a criação de um espaço para a entrada da

medicina.

Page 12: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

12

Foucault usa o termo “Grande Enclausuramento’ ao se referir à fase do

surgimento dos hospitais gerais, que representa um dos marcos na separação

entre loucura e razão, tendo como base a ética moral. A reclusão que em um

primeiro momento era destinada aos pobres, doentes sem famílias e

criminosos, passa a restringir-se principalmente aos loucos e aos criminosos.

Foucault aponta que:” a percepção que o homem ocidental tem de seu tempo e

de seu espaço deixa aparecer uma estrutura de recusa, a partir da qual se

denuncia uma fala como não sendo linguagem, um gesto como não sendo

obra, uma figura como não tendo direito a um lugar na história”.

E esta percepção autoriza o recolhimento e a exclusão. Outro marco na

separação entre loucura e razão foi o simbólico desacorrentar dos loucos, em

Bicêtre, por Pinel, que ficou associado ao nascimento da psiquiatria. O modelo

criado pela medicina psiquiátrica para tratar e recuperar os doentes mentais

assume na sociedade, desde a sua constituição, um lugar de exclusão.

È destacado também a importância do papel do asilo e das ciências

médicas no desenvolvimento das estruturas de internamento e dominação,

enfatizando o papel de controle social exercido por este saber médico ao

determinar o que é e o que não é doença, e a maneira de tratá-la.

1.1 Loucura x mal

Dentro do tema da loucura algumas articulações foram feitas, como

loucura e religiosidade na Idade Média. A associação ou identificação da

loucura ligada à possessão diabólica. A alma humana medieval é a luta interna

entre as forças do bem e do mal. A loucura representaria o predomínio do mal:

A irrupção e a aparição tumultuosa dos espíritos malvados são acompanhadas

de batidas, estrépitos e gritos... Logo a alma é tomada por temores e

perturbações, a mente é tumultuada, abatida, sente ódio por quem conduz vida

ascética,sente desconforto, tristeza, saudade dos familiares e medo da morte.

Depois surge o desejo de coisas perversas, o enfraquecimento da virtude, a

instabilidade do comportamento (Arthanasil apud Pesssotti, 1994 pag.86)

Page 13: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

13

Nesse contexto entende-se que se a pessoa está louca, está possuída

pelo demônio, portanto a loucura é como a invasão do homem pelo diabo, e

quem enlouquece é um pecador. Algumas doenças como a histeria, a

depressão, a epilepsia são indicadas como possessão demoníaca. Assim para

o diagnóstico e tratamento dos loucos passa a ocupar a mão dos teólogos e

exorcistas que são especializados em demoniologia. A eles sé dada a

autoridade para definir diagnósticos e terapêuticos aplicáveis a ilimitados

distúrbios orgânicos e mentais, entendidos como mera evidência de possessão

demoníaca. ”.Os demônios são capazes de causar impressões nas faculdades

internas transpondo as imagens retidas nas faculdades correspondentes a um

ou mais sentidos”(Malleus apud Pessotti, 1994,pag.102).

Essa imaginação do demônio vem da Idade Média até os dias atuais na cultura

ocidental cristã onde se associam a loucura a possessão demoníaca e

encaminham seu tratamento a instituições religiosas.

Nos séculos XVI e XVII antes da era científica, um movimento passa a

será dotado a loucura, que é o isolamento. A loucura sai do campo do sagrado

e passa a ser entendida como associada ao cenário moral da miséria e

marginalidade.

Segundo Foucault:

A loucura só terá hospitalidade doravante entre os

muros do hospital, ao lado de todos os pobres. É lá que a

encontraremos ainda no final do século XVII. Com

respeito a ela nasceu uma nova sensibilidade: não mais

religiosa, porém moral. A hospitalidade que o acolhe se

tornará, num novo equívoco, a medida de saneamento

que o põe fora do caminho. De fato, ele continua a vagar,

porém não mais no caminho de uma estranha

peregrinação: ele perturba a ordem do espaço social.

Despojada dos direitos da miséria e de sua glória, a

loucura, com a pobreza e a ociosidade, doravante surge,

de modo seco, na dialética imanente dos estados.

(Foucault, 2002, pag.203)

Page 14: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

14

Foucault (2002) destaca a loucura sendo um assunto de polícia que

atuam sobre ela medidas de repressão e controle. No inicio das crises o

internamento era adequado, e fora desses períodos ele adquire outro sentido,

que é o da repressão.O louco era tido como um desviante moral e é isolado,

internado, e nesse recolhimento passa a servir a sociedade como mão de obra

barata.

Todo aquele que provocava situações de agitação e revoltas sociais eram

considerados loucos e eram trancados em manicômios. As casas de internação

serviam como depósito social de várias classes sociais, e o diagnóstico da

loucura acobertava essa exclusão.

Ainda hoje a loucura carrega essa associação cultural que se existe um

distúrbio moral, o sujeito necessita de internamento, e isso trouxe muitas

complicações na relação do louco e sua família.

Na modernidade a loucura está sendo dominada pelo pensamento científico e

se torna objeto da ciência médica.

1.2 A loucura e a religião

Cada vez mais pessoas se deparando com seus problemas e

sofrimentos buscam apoio para suas curas na religião.

Muitos pacientes com transtornos mentais juntamente com a sua família

percorrem essa trajetória, diante do sofrimento causado pela doença e buscam

alternativas para o alívio e a possível cura.

A presença da religião na vida do paciente com transtornos mentais tem

sido observada por muitos pesquisadores. Assim tanto é o caso em estudos

com contornos mais qualitativos e etnográficos, como com os mais bem

quantitativos e epidemiológicos. Isso também é constatável tanto para os

transtornos mentais mais leves, como ansiedade e depressão, como para os

graves, como as psicoses. A busca por algum alívio do sofrimento , por alguma

significação ao desespero que se instaura na vida de quem adoece, parece ser

algo marcadamente recorrente na experiência, sobretudo para as classes

populares.

Page 15: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

15

Cabe salientar que a temática de práticas religiosas é pouco discutida na

academia, razão pela qual não encontramos publicações com referencias, mas

existem alguns grupos na Unicamp estudando a relação saúde e religião.

Esses trabalhos discutem a trajetória terapêutica e a busca da população por

esses espaços na tentativa de aliviar os seus males e sofrimentos, com

resultados positivos na saúde. Este movimento sempre existiu, mas de um

tempo para cá se intensificou.

1.3 A Medicina e a loucura

A Medicina conceitua a loucura como o avesso do normal e do saudável

e assim como anormalidade e doença.

No campo médico ela é uma patologia, uma doença marcada por

sintomas, que necessita, portanto, de tratamento para alcançar a cura. A noção

de cura é um tanto complexa no contexto psiquiátrico, pois ainda no século

XVII, quando a medicina se estruturava como ciência, os sintomas da loucura

eram violentos, e assim seu tratamento era violento com ações agressivas para

combatê-lo.

Foucault define o perfil das decisões médicas com uma frase” existe na

convulsão uma violência que só pode ser combatida através da violência”.

(Foucault, 2002,pag305)

Eram usados por isso, para o tratamento da loucura substâncias com

odores fortes, óleos, sais, terra, sangue, caldo de víboras, musgo, carvão em

brasa e tantos outros elementos desagradáveis.

Foucault tinha uma explicação para isso, dizia que os remédios por

terem odores fortes e desagradáveis faziam uma acentuada e súbita impressão

nos nervos que eram sensíveis do nariz e com isso não apenas excitam os

diversos órgãos com os quais esses nervos têm alguma simpatia para entrar

em ação, como também contribuiriam para diminuir ou destruir a sensação

desagradável experimentada pelo corpo que teria ocasionado os espasmos.

Page 16: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

16

Foucault buscando dar sentido as práticas terapêuticas voltadas para a

cura da loucura, faz uma análise das idéias a ela associada para as quais tais

práticas seriam voltadas.

Seria assim essa análise:

a) A Consolidação, a loucura era entendida como fraqueza, uma falta de

resistência os loucos são espíritos submetidos a movimentos irregulares, a

espasmos, convulsões e as fibras de seus nervos são móveis demais e

irritáveis. Por isso os métodos de cura devem ser de vigor, relacionado a uma

imagem de vivacidade e robustez. E os odores fétidos, sabores ácidos e o ferro

fariam os espíritos readquirirem seu peso certo, consolidando-os

b) A purificação, a impureza também está relacionada à loucura, e o sangue é o

foco, e o louco tem o sangue sobrecarregado, grosso e precisa ser purificado.

E o tratamento indicado é a transfusão de sangue e uma abertura de pequenas

pústulas na cabeça para a saída das impurezas, queimaduras e cauterização

em todo corpo, sangrias, purgações, banhos e duchas.

c) A imersão ai existe elementos da purificação. A água e a sua limpidez são

indicadas para banhos longos de imersão, assim como duchas, banhos frios e

banhos de surpresa.

d) A regulação do movimento a loucura era associada pelo desvio do movimento,

sua aceleração do pensamento e o corpo ou pela estagnação dos nervos e

afixação das idéias. Assim o tratamento eram as caminhadas, viagens a fim de

restaurar o equilíbrio saudável dos movimentos internos e externos.

Esses métodos de tratamento ao longo dos séculos foi sendo

sofisticados, menos violentos e o uso das intervenções químicas foram

substituindo as ações mais violentas.

Chegamos a era do fim do sofrimento físico dos pacientes com

transtornos mentais e foi um médico de nome Philippe Pinel o pioneiro no

questionamento do uso dos métodos radicais que tanto sofrimento causou aos

doentes mentais, nas câmaras de tortura, preocupou-se em incluir no

tratamento terapias com o paciente, programas de atividades dirigidas, e

principalmente que o pessoal que trabalhasse com o doente mental recebesse

Page 17: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

17

treinamento adequado e que a administração das instituições fosse

competente.

Page 18: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

18

CAPÍTULO II

AS SÍNDROMES PSIQUIÁTRICAS

Neste capítulo iniciaremos situando o campo de estudo da

psicopatologia para podermos compreender a área da saúde mental e o

conjunto das doenças , suas características, alterações que afetam todo o

sujeito e o em torno de seu sofrimento.

Segundo Campbell(apudDalgalarrondo(2000,pag.88) define a psicopatologia

como o conjunto de conhecimentos referentes ao adoecimento mental do ser

humano.

Pesquisas realizadas em todo o mundo constatam que os transtornos

mentais tornam-se uma realidade comum a todos os povos e precisa de um

reconhecimento pela sociedade em geral e pelos profissionais que atuam na

saúde mental como os psicólogos, psicanalistas, médicos e outros.

Segundo Velasco a década de 90 foi proclamada a década do cérebro. A

neurociência vem desenvolvendo muitos estudos sobre o cérebro e a mente

humana, nas áreas da neurologia, psiquiatria, psicologia e psicanálise, essa

busca sobre o cérebro e a mente humana, procura mostrar como funciona, o

que ocorre quando está danificado, como reage quando é bombardeado por

sentimentos recalcados no desenvolvimento primário do sujeito, e assim

alterando todo o funcionamento químico do organismo e promovendo vários

distúrbios.( Velasco, 2009pag.15)

Esta pesquisa tem a necessidade de abordar os transtornos mentais que

afetam a população comprometendo sua capacidade de trabalho e sua auto

estima.

E hoje encontramos de variadas maneira a preocupação com o tema

até nas letras das músicas, o alerta para nossa reflexão. Orlando Moraes

canta “De onde vim.

No final da estrada

E você não sabe o que é

Se é fim ou é chegada

Page 19: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

19

Na vida, no tempo

Na luz da escuridão

No mundo, no sonho

Na brasa, no carvão

O horizonte esconde

A ciência do onde.

2.1 Definindo o que é Síndrome

Para nosso melhor entendimento vamos definir o que é síndrome e

destacar algumas delas com seus sintomas para assim compreendermos o que

o doente com transtornos mentais vivencia.

Síndrome é um conjunto bem determinado de sintomas que não

caracterizam necessariamente apenas uma afecção patológica ou uma

moléstia, mas podem traduzir uma certa modalidade patogênica. O conceito de

síndrome distingui-se da idéia de doença por não implicar numa unidade

etiológica ou patológica. Uma mesma síndrome pode ser produzida por

diferentes doenças.

As síndromes designam-se ora pelos fenômenos fisiopatológicos que os

caracterizam-se, ora pelo órgão ou estrutura cujas alterações determinam o

fenômeno mórbido, ou ainda pelo nome do autor, que os descrevem.

www.psiqueweb.med.br.acessado 20/01/2010

As síndromes são organizadas em categorias e identificas em sistemas

de classificação. Os mais importantes até o momento são o DSM IV(

documento de classificação das doenças mentais da Associação Americana de

Psiquiatria) e o CID 10( Classificação dos Transtornos Mentais da Organização

Mundial de Saúde).

Para o nosso estudo vamos conhecer algumas síndromes para nossa

compreensão.

Page 20: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

20

2.2 Conhecendo algumas Síndromes Psiquiátricas

Síndromes Depressivas

Considerada a primeira causa de incapacidade entre todos os problemas

de saúde. Sua característica principal é o humor triste.

Seus sintomas afetivos são:

• Tristeza, melancolia

• Choro fácil ou freqüente

• Apatia

• Sentimento de falta de sentimento

• Tédio

• Aumento da irritabilidade

• Angustia e ansiedade

• Desespero

• Desesperança

Alterações da esfera instintiva e neurovegetativa

• Fadiga, cansaço fácil e constante

• Desânimo, diminuição da vontade

• Insônia ou hipersonia

• Perda ou aumento do apetite

• Diminuição do desejo sexual

• Incapacidade de sentir prazer em varias esferas da vida(anedonia)

Alterações ideativas

• Ideação negativa,pessimismo em relação a tudo

• Idéias de arrependimento e culpa

• Ruminações com mágoas antigas

• Idéias de morte, desejo de desaparecer

Page 21: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

21

• Ideação, planos ou atos suicidas

Alterações cognitivas

• Déficit de atenção e concentração

• Dificuldade de tomar decisões

Alterações da autovaloração

• Sentimento de baixa auto-estima

• Sentimento de incapacidade

• Sentimento de vergonha e autodepreciação

Síndromes Maníacas

São opostas aos transtornos depressivos, tem como característica a

alegria patológica ou euforia.

Alguns sintomas:

• Aumento da auto estima

• Sentimento de expansão e engrandencimento do eu

• Insônia

• Produção verbal rápida, fluente e persistente

• Atenção diminuída

• Agitação psicomotora

• Irritabilidade

• Arrogância

• Desinibição sexual e social

• Compulsão para compras

• Desejo de poder

Em alguns casos existe a possibilidade de episódios depressivos

intercalados com fases de normalidade e fases maníacas, e são chamados de

transtornos bipolares.

Page 22: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

22

Síndromes Neuróticas

Síndromes fóbicas: caracterizam-se por medos intensos e irracionais,por

situações,objetos e animais que não oferecem ao sujeito perigo real e

proporcional à intensidade de tal medo.

Síndromes Obssessivas Compulsivas:tem como característica idéias,

fantasias e imagens obssessivas e também por atos, rituais ou

comportamentos compulsivos. Elas podem se dividir em dois subtipos : a)

aquelas nas quais predominam as idéias obssessivas b) aquelas que

predominam os atos e comportamentos compulsivos. No entanto as vezes se

apresentam de formas mistas.

As síndromes obssessivas: tem por características idéias, pensamentos,

fantasias, imagens persistentes que surgem na consciência e são vivenciadas

com angústia.Quem sofre dessa síndrome reconhece seu caráter irracional e

absurdo e tenta as vezes neutralizá-los com outros pensamentos, atos ou

rituais específicos.

As síndromes compulsivas: se caracterizam pela repetição de

comportamentos e rituais, assim como repetir palavras mentalmente.

Síndromes hipocondríacas:a predominância são os temores e

preocupações intensas com a idéia de ter uma doença grave.Essa

preocupação surge em geral a partir de sensações corporais ou sinais físicos

insignificantes.

Síndromes Psicóticas

Tem como características os sintomas de alucinação e delírios,

pensamento desorganizado e comportamento bizarro(fala e risos imotivados).

Alucinação é a vivência de percepção de um objeto, sem que este objeto

esteja presente, sem o estímulo sensorial respectivo, sem a presença do objeto

real.

Alguns tipos de alucinações freqüentes: auditivas, visuais, táteis,

olfativas e gustativas.

Page 23: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

23

Delírios são juízos patologicamente falseados. Geralmente o delírio é

uma convicção de um só homem. Ao delirar o indivíduo desgarra-se de sua

trama social.

Além da alucinação e do delírio, os sintomas paranóides são mias

comuns, como idéias delirantes e alucinações auditivas de conteúdo

persecutório.A psicose é a perda de contato com a realidade e a esquizofrenia

é uma delas e tem como sintomas de primeira ordem:

• A percepção delirante

• Alucinações auditivas que se caracterizam com as vozes

• Eco do pensamento o paciente escuta seus pensamentos ao pensá-los

• O paciente sente que seus pensamentos são ouvidos ou percebidos pelos

outros, no momento em que pensa

• Pensa que seu pensamento foi roubado

• O paciente sente que uma força ou ser age sobre seu corpo, sobre seus

órgãos, emitindo raios que influenciam na suas forças corporais.

Todos esses sintomas indicam uma profunda alteração da relação eu -

mundo e isso influenciam numa perda marcante da dimensão da intimidade.

A esquizofrenia tem ainda outros sintomas como: distanciamento afetivo,

retração social, diminuição da fluência verbal,diminuição da vontade, auto-

negligência, alucinações, idéias delirantes, comportamentos bizarros,agitação

psicomotora,produção nova da lingüística.

Destacamos quatro tipos de esquizofrenia a paranóide, a catatônica,

hebefrênica e a simples.

A paranóide se caracteriza pro alucinações e idéias delirantes de

conteúdo persecutório.

A catatônica é marcada pelo negativismo e impulsividade, além de

aletrações motoras.

A hebefrênica tem como característica o pensamento desorganizado, um

comportamento bizarro e afeto pueril.

A simples faltam alguns sintomas característicos, existe um

empobrecimento psíquico e comportamental com auto-negligencia e

distanciamento afetivo e social.

Page 24: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

24

A doutora Nise da Silveira discorda dela abordagem, ela destaca que o

paciente esquizofrênico tem uma intensa afetividade.

2.3 Os Recursos para a Cura dos Transtornos Mentais.

As Doenças Mentais têm cura ou só podemos falar em controle?

As Doenças Mentais têm cura tanto quanto as doenças da cardiologia,

da endocrinologia, da reumatologia, da neurologia e assim por diante. A

medicina tem como primeira obrigação definir se a pessoa que a procura É ou

ESTÁ doente. Se estiver doente, a possibilidade de cura definitiva é

enormemente maior do que nos casos da pessoa ser doente. Citamos outras

especialidades médicas para que se comparem os problemas da psiquiatria

com, por exemplo, a hipertensão arterial; quando, exatamente, podemos falar

em cura da hipertensão arterial? Quando, exatamente, podemos falar em cura

da diabetes?... Do reumatismo? ... Da asma? ..., podemos ver que a medicina

esta cheia de situações onde, felizmente, podemos controlar a pessoa

portadora de alguma doença para que viva o mais próximo possível do normal.

Em outros casos podemos falar em cura, como por exemplo, na pneumonia (e

outras infecções), na cólica de rins, na diarréia... etc. São situações onde a

pessoa ESTÁ doente. Doenças Mentais mais atreladas à maneira da pessoa

ser, mais inerentes à sua personalidade, pode ser muito bem controlado pela

psiquiatria, enquanto as situações reativas, onde a pessoa apresenta uma

alteração repentina em seu psiquismo, podemos falar mais facilmente em cura

definitiva.

Nos últimos anos, foram registrados progressos significativos na

compreensão e na atenção aos problemas de saúde mental, aumentando o

Page 25: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

25

conhecimento cientifico das causas das doenças mentais e os tratamentos

disponíveis para a maioria destas doenças.

As reformas da assistência em saúde mental, em varias partes do

mundo, demonstram que redes de atenção em saúde mental de base

comunitária representam uma abordagem eficaz para o tratamento q que há

menos necessidade dos hospitais psiquiátricos tradicionais.

As portas do século XXI, ainda é imenso o preconceito em relação a

“doenças mentais”. Antigamente, esse preconceito estava associado à falta de

conhecimento sobre os distúrbios que afetam a mente.

Na Europa, durante a Inquisição, muitos doentes mentais foram

acusados de bruxaria, de estarem “possuídos pelo demônio” e foram

queimados na fogueira nas praças públicas. Até 1801, quando o medico

francês Henri Pinel libertou os loucos estes ficavam acorrentados em prisões

ou porões de castelos, como se fossem criminosos perigosos e só a partir de

Pinel, a loucura passou a ser considerada uma doença, mas mesmo assim,

durante todo século XIX e na primeira metade do século XX os recursos que se

dispunham para cuidar dos problemas mentais eram poucos e ineficazes e o

tratamento continuava sendo inadequado, internando – se os pacientes em

manicômios (hospital para loucos) e asilos, onde permaneciam por longos

períodos ou mesmo até o fim da vida.

Utilizava-se nessa época, métodos cruentos e arriscados, como algumas

cirurgias altamente incapacitantes (lobotomias) e também diversos tipos de

choques (insulínico, cardiazol, malárico, térmico, e posteriormente o choque

elétrico). Como em outras ocasiões na medicina, esses choques foram

descobertos por acaso. O choque térmico, por exemplo, passou a ser utilizado

após a observação de doentes mentais que apresentaram um comportamento

mais calmo depois que a carruagem que os transporta caiu num rio gelado.

Apesar de todo processo conseguido em muitos outros aspectos de

saúde, a saúde mental ainda não recebe a atenção e os recursos que merecia.

Por isso, a Organização Mundial de Saúde (O.M.S) declarou que a partir do dia

07 de abril de 2001, o Dia Mundial de Saúde Mental, com o sentido de

sensibilizar o público em geral e provocar uma mudança positiva na posição

Page 26: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

26

pública acerca da doença mental. A idéia é despertar a atenção para a questão

da saúde mental e para a melhoria dos cuidados de saúde mental.

Hoje em dia, com o progresso da medicina, especialmente no ramo da

Psiquiatria após a “Revolução Bioquímica” da década de 50 e a “Revolução

Cientifica” da década de 80 e a” Década do Cérebro” dos anos 90, cada vez

mais o Transtorno Mental vem se inserindo no contexto dos problemas de

Saúde Pública. Agora eles podem ser adequadamente identificados e

diagnosticados, e mais importantes ainda, já se conta com recursos

terapêuticos específicos que possibilitam o tratamento ambulatorial, evitando-

se assim as internações desnecessárias que muitas vezes tornavam-se

hiatrogênica por asilarem o portador de transtorno mental.

Cuidar sim, discriminar não.

Cada ser humano nasce e se desenvolve de maneira única. Nenhuma

pessoa é igual à outra, reconhecer isso é fundamental para compreender e

respeitar os diferentes.

Direitos de cidadão

É preciso que as pessoas com transtornos mentais sejam reconhecidos

como seres integrais, dignos, com direito a liberdade, a integridade física e

moral, a reabilitação para o trabalho e a qualidade de vida. Para alcançar esses

objetivos, devemos trabalhar em conjunto e diminuir o preconceito por parte

dos profissionais de saúde, das famílias e das comunidades. A final, aceitar e

tratar com respeito e afeto o portador de transtorno mental é o melhor caminho

para sua reabilitação e para o fortalecimento de sua cidadania.

Portanto, para alcançar esses objetivos devemos trabalhar em conjunto

para diminuir o preconceito. Afinal, aceitar e tratar com respeito e afeto a

pessoa com transtorno mental é o melhor caminho para a sua reabilitação e

para o fortalecimento da sua cidadania.

A reforma psiquiátrica tem como principio básico o respeito aos direitos

das pessoas com transtornos mentais, buscando sua reintegração na vida

familiar e comunitária. Enfim, seu bem estar e sua felicidade.

Com a reforma psiquiátrica podemos repensar a relação do sujeito e sua

família, porque existe a proposta de uma relação saudável e humana.

Page 27: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

27

A família de pessoas que apresentam transtornos mentais necessitam

de ajuda para o enfrentamento dos problemas e seus conflitos diários.

Atualmente observamos que o atendimento ao doente mental tem tido

inovações e propostas de intervenções também para seus familiares, isso gera

possibilidades na qualidade do tratamento como um todo.

O convívio com a família dos doentes mentais é enriquecedora e

fundamental para o tratamento, pois essa relação paciente/família tem várias

possibilidades de aprendizado mútuo.

Page 28: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

28

CAPÍTULO III

A REFORMA PSIQUIÁTRICA

Nosso objetivo com este capítulo é verificar a nova proposta, um

questionamento e elaboração de propostas de transformação do modelo

clássico e de um novo paradigma para a psiquiatria.

A reforma psiquiátrica tem como proposta a transformação do modelo

assistencial em saúde mental e de construção de um novo estatuto social para

o louco para que ele seja um cidadão como qualquer um outro.

Ela deseja continuar o tratamento clínico dos pacientes com transtornos

mentais, porém eliminar o internamento, pois isso o exclui da sociedade.

A reforma psiquiátrica defende a criação de redes de serviços de

atenção psicossocial, e de base comunitária, para que o paciente seja um

cidadão capaz de ser produtivo e de ser respeitado.

Alguns movimentos da reforma, para mudanças ao paciente psiquiátrico.

Comunidade Terapêutica

A comunidade terapêutica tem como característica o processo de

reforma institucionais que predominam ao hospital psiquiátrico e marcadas pela

adoção de medidas administrativas democrática, participativas e coletivas, e

tem como objetivo a transformação da dinâmica institucional asilar.

Segundo Amarante(1995,pag.28), o período pós guerra torna-se cenário

para o projeto de reforma psiquiátrica contemporânea, atualizando críticas e

reformas da instituição asilar.

As estratégias da comunidade terapêutica são o envolvimento dos

pacientes em atividades produtivas e socializantes no hospital e uma interação

entre pacientes, familiares e funcionários do hospital.

O foco da comunidade terapêutica é o hospital e o trabalho em grupo.

Psicoterapia Institucional

É da terapia dedicada à cura da doença mental para que o paciente

possa ser devolvido a sociedade. A psicoterapia institucional tem como

Page 29: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

29

característica trazer a reflexão de que as instituições são doentias e que

precisam se tratar.

Para Vertzman (apud Amarante, 1995) a psicoterapia institucional deve

trabalhar o meio, o ambiente, afim de que o mesmo permita revelar, para

melhor tratar, o processo psicótico no que este tem de patogênico, especifico,

metabolizando o que existe de patoplástico, entendido aqui mais precisamente

como as aparências mórbidas resultantes das inter-relações entre a pessoa e o

meio.

Psiquiatria de Setor

Tem como idéia principal levar à psiquiatria a população, evitando o

isolamento do doente, o paciente deverá ser tratado dentro do seu meio social

e a sua passagem pelo hospital deverá ser de uma etapa transitória ao

tratamento, esvaziando assim os hospitais.

Psiquiatria Preventiva

A psiquiatria preventiva tem como estratégia intervir nas causas ou no

surgimento das doenças mentais, é a promoção da saúde.

Assim a psiquiatria preventiva determina que as intervenções precoces

evitem o surgimento e/ou desenvolvimento de doenças e que seu tratamento

deve ter inicio no meio social, evitando que se produzam condutas patológicas.

Antipsiquiatria

A loucura na perspectiva da antipsiquiatria é produto social resultante

das tensões e contradições culturais, e, portanto, não deve ser transformada

em uma doença de origem biológica.

A loucura, portanto é uma experiência positiva de libertação, é uma

reação ao desequilíbrio familiar, e por isso não configura um estado patológico,

nem, muito menos, o louco um objeto passível de tratamento.

Page 30: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

30

3.1 A Reforma Psiquiátrica no Brasil

O Brasil também participou dos movimentos da reforma psiquiátrica e

teve com o deputado Paulo Delgado em 2001 a Lei Federal 10.216 que

redirecionou a assistência em saúde mental, que privilegiou o oferecimento de

tratamento em serviços de base comunitária, e dispõe sobre proteção e os

direitos das pessoas com transtornos mentais.

Ate a metade do século XIX, no Brasil, não havia um estabelecimento

especial para acolher os chamados “alienados mentais”. Os primeiros protestos

da comunidade médica contra a situação dos loucos surgem na década de 30.

No Rio de Janeiro, os alienados até então eram encarcerados na Santa Casa

de Misericórdia sem receber qualquer tipo de tratamento especial.

No momento em que estão sendo criadas as primeiras faculdades de

medicina do país (no Rio e na Bahia), a Câmara Municipal do Rio de Janeiro,

promulga a legislação sanitária municipal. Neste período a classe médica

começa a se reorganizar e a consolidar sua influência sobre a sociedade.

O primeiro hospício do país, o Hospício Pedro II, foi criado em 1841,

sendo inaugurado somente 11 anos depois, em 1852,e após a proclamação da

republica ele passou a ser denominado Hospício Nacional de Alienados O

nome da instituição marcava a ascensão do novo imperador ao trono. No

Brasil, assim como na Europa, o hospício surgiu antes da criação da

psiquiatria. A psiquiatria enquanto especialidade só vem a se estabelecer no

país em 1881, a partir de uma reforma no ensino médico. O asilo no Brasil,

desde o momento de sua criação, foi alvo de inúmeras criticas por parte da

classe médica. Excluídos da sua direção, que estava nas mãos da Igreja e do

Estado, a classe médica acusava a instituição de não ter um projeto

assistencial especifico, e reivindicava um reconhecimento legal da pratica

médica, que legitimassem a sua intervenção no campo da doença mental e da

assistência psiquiátrica. Com a Proclamação da Republica, a psiquiatria busca

modernizar-se, e expandir a sua atuação para além dos muros do hospício, no

espaço social: “no espaço onde vivem as pessoas, onde se estruturam as

doenças mentais” (Amarante, 1992 p.76). A história da psiquiatria brasileira é

Page 31: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

31

então, baseada no processo de asilamento. Desde o inicio, a resposta social

dada à loucura, pela psiquiatria, foi à internação. O movimento da reforma

psiquiátrica surge com a proposta de tentar construir uma nova resposta social

para a loucura.

O processo mais recente de reforma psiquiátrica no país surge no

contexto de redemocratização dos anos 70 e 80, sob o pano de fundo do

projeto de Reforma Sanitária, da redemocratização das intuições e de inúmeros

movimentos sociais.

Num primeiro momento, o foco de atenção dos atores da reforma está

direcionado para o hospital psiquiátrico, buscando a humanização desses

serviços. São discutidas questões relacionadas à forma de atendimento.

Cogita-se a construção de outras opções de atendimento, diferentes do padrão

manicomial, neste contexto se inserem o desenvolvimento de uma grande rede

ambulatorial em saúde mental. Entretanto essas estruturas ainda estão

referenciadas ao hospital.

Num segundo momento, final da década de 80, inicia-se uma proposta

que aponta a necessidade de uma mudança estrutural no modelo assistencial.

É neste período que ocorre o II Congresso Nacional de Trabalhadores em

Saúde Mental, em 1987, onde é reforçada a importância de levar essa

discussão para a sociedade. O lema “Por uma sociedade sem manicômios”

aponta a necessidade da construção de uma rede de serviços substitutivos ao

modelo tradicional, e também neste momento é colocado para sociedade o

desafio de viver uma estrutura manicomial.

A partir de 1990, com a implantação do Sistema único de Saúde (SUS),

a reestruturação psiquiátrica passou a fazer parte da política oficial de governo.

Normas objetivas foram criadas para a avaliação e fiscalização dos serviços de

internação psiquiátrica e novos serviços foram sendo criados, segundo

recomendações da OMS, para substituir gradualmente o modelo clássico de

hospital psiquiátrico.

Esses novos serviços de assistência, de características diversas, tiveram

um grande incentivo por parte do Ministério da Saúde, dentre eles destacam-se

os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), os Núcleos de Atenção

Page 32: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

32

Psicossocial (NAPS), os Hospitais-Dia, os Centros de Convivência, as

Cooperativas, os Lares Abrigados, dentre outros.

Os CAPS, que surgiram de uma experiência em São Paulo, geralmente

são estruturas de atendimento que priorizam a reabilitação psicossocial,

funcionando em regime parcial ou integral, de segunda a sexta-feira. Os NAPS

são estruturas regionalizadas que funcionam 24 horas por dia e respondem a

uma demanda em saúde mental, em uma determinada região. Ambos serviços

citados são baseados num modelo de atenção diária, desvinculado do hospital.

Os Hospitais-Dia também possuem características de um serviço de atenção

diária, entretanto funcionam dentro de uma unidade hospitalar. Os Centro de

Convivência não possuem a assistência como característica principal, eles se

constituem como espaços de trocas, de produção, ou como o próprio nome já

diz, de convivência, muitas vezes associados a arte, criação e expressão. As

Cooperativas são espaços cujo objetivo e propiciar a inserção social, facilitar o

processo de emancipação e autonomia dos sujeitos e tornar possível o

enfrentamento com necessidades reais de trabalhos. Os Lares-Abrigados se

constituem como uma alternativa de moradia e cuidado aqueles que não têm a

possibilidade de se manterem junto à família ou sozinhos, neste grupo estão

incluídos aqueles sujeitos que passaram por um longo processo de

institucionalização.

3.2 O Hospital Nise da Silveira

Iniciaremos este item com uma frase de Nise da Silveira extraída do

Museu do Inconsciente do Hospital Psiquiátrico antigo Pedro II e hoje

conhecido como Nise da Silveira, pois a partir da experiência do ateliê na

seção de terapêutica ocupacional muitos benefícios foram trazidos aos

pacientes com transtornos mentais.

“ A meta de todo tratamento psiquiátrico não pode

mais continuar sendo a recuperação de sintomas, porém,

a recuperação do indivíduo para a comunidade. Por isso

Page 33: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

33

dar forma à situação psíquica sob o impacto de emoções,

pintar sonhos e fantasias, será medida preventiva

indicada contra recaídas na condição psicótica”. (Nise da

Silveira visita feita ao Museu do Inconsciente, março de

2009.)

Conhecendo um pouco da história da grande guerreira que adorava

poesias e vivia a poesia do cotidiano de paixão pelo trabalho, de amor pelos

animais, crianças, natureza e principalmente de amor pelos deserdados da

sociedade, os doentes mentais.

Nise da Silveira nasceu em 1906, em Maceió. Foi à única mulher, entre

os 156 alunos da Faculdade de Medicina da Bahia, que se graduou em 1926.

Em 1927 seu pai morreu, a mãe mudou-se para a casa do pai, e Nise, decidida

como sempre, pegou um navio para o Rio de Janeiro. Começou sua carreira

em psiquiatria no hospital que na época era popularmente chamado de

hospício da Praia Vermelha (hoje Hospital Pinel), em 1933.

Morava num quarto do hospital,uma enfermeira, ao fazer a limpeza do

quarto, achou livros socialistas na sua estante, e durante o Levante Comunista

de 1935, em plena ditadura Vargas, denunciou-a. Embora fosse apenas

simpatizante do comunismo, e não soubesse nada sobre a organização do

movimento liderado por Prestes, Nise foi presa, ficou na Casa de Detenção

durante um ano e quatro meses. Lá conheceu Olga Benário, Graciliano Ramos

e outros participantes do movimento comunista, que se tornaram amigos seus.

Diz ter tirado grandes lições deste período. Só conseguiu voltar ao cargo de

psiquiatra, em 1944, no Centro Psiquiátrico Pedro II, no Engenho de Dentro.

Foi lá que, por recusar-se a usar os métodos usuais da psiquiatria clássica,

como eletro choques, choque de insulina e utilização indiscriminada de

medicação (que deixava, e deixa até hoje os pacientes num estado terrível de

torpor - a chamada impregnação), foi deslocado para um setor considerado

“pouco nobre” do Centro Psiquiátrico, o lugar onde não havia médicos e que

era cuidado por serventes, a Terapêutica Ocupacional, que de terapêutica não

tinha nada, os pacientes faziam apenas serviços de limpeza, uma boa

economia para o hospital.

Page 34: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

34

Nesse lugar “abandonado” pela direção do hospital, Nise começou sua

grande revolução. Em 1946 fundou a Seção de Terapêutica Ocupacional e

Reabilitação (STOR). A partir de muito estudo, e principalmente a partir de sua

veia rebelde e criativa, Nise inovou e criou um espaço em que os internos eram

recebidos num ambiente de acolhimento e respeito. Abriu ateliês para vários

tipos de atividades (encadernação, musica, pintura, modelagem, teatro, etc.) e

orientou os monitores que acompanhariam os pacientes no sentido de terem

uma atitude de não interferência na sua produção. Procurava apontar para a

importância do contato afetivo para que aquelas pessoas, que passavam pelo

grande sofrimento do rompimento com a realidade, do mergulho, sem proteção,

nos abismos do inconsciente, pudessem tentar o caminho de volta para a

superfície, para a possibilidade de recuperar a autonomia perdida. Além da dor

provocada pela doença mental, os pacientes sofriam com a discriminação no

meio social e no próprio hospital. Um dos pintores do ateliê, que ainda

conseguia expressar-se verbalmente, falava do sentimento de ser “etiquetado”,

e que por ser “etiquetado como esquisito, uma coisa assim“ nunca mais

conseguiria sair dali.

O Museu continua existindo, graças à garra de Nise e dos que a auxiliam

e dão continuidade ao trabalho, a Sociedade dos Amigos do Museu do

Inconsciente (criada para isto), e a fama internacional conseguida pela

divulgação das pesquisas lá realizadas e das obras que impressionam críticos

de arte, artistas e pesquisadores do Brasil e do exterior. Por diversas vezes

esteve a ponto de extinguir-se, em função da incompreensão de alguns

psiquiatras que ocupavam postos de poder no Centro Psiquiátrico, por falta de

verbas, por falta de incentivo por parte dos órgãos públicos por ele

responsável. Ainda bem que alguns apaixonados pelo museu e o que ele

representa, heroicamente continuam lutando para que ele não morra.

Nise era já profunda conhecedora de Freud, mais viu principalmente na

psicologia de Carl Gustav Jung uma fonte preciosa de conhecimento, que

poderia ajudar na busca do sentido das vivencias dos pacientes,

dramaticamente representadas por seu trabalho plástico. Freud já tinha

esboçado a idéia de um inconsciente herdado, mas foi Jung que mergulhou na

Page 35: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

35

pesquisa do que ele chamou de Inconsciente Coletivo, que ultrapassa as

fronteiras do Inconsciente Pessoal. Este último refere-se as percepções que

não alcançaram a consciência, a potencialidades ainda não vividas, a aspectos

da personalidade não aceitos pela consciência e, principalmente, aos

complexos núcleos afetivamente carregados, vinculados a experiência

pessoais conflitivas. Jung, a partir do mergulho no seu próprio mundo interno e

do acompanhamento de pacientes psicóticos e não psicóticos percebeu a

existência de camadas mais profundas no inconsciente, em que processos

comuns a toda a humanidade estariam presentes. Deu a estas camadas o

nome de inconsciente coletivo e de arquétipos a seus elementos estruturais.

Os arquétipos seriam tendências herdadas para formar imagens semelhantes,

que apontam para uma mesma forma, ou para um mesmo tema básico. O

arquétipo só pode ser conhecido indiretamente, através das imagens

arquetípicas e possui forte carga energética. Jung estudou intensamente os

vários tipos de representações de arquétipos nas religiões, nos mitos, nos

contos de fada, nos escritos e desenhos alquímicos, nas artes enfim, em

diversas manifestações da cultura coletiva.

Page 36: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

36

Capítulo IV

FAMÍLIA E DOENÇA MENTAL

Neste capítulo será apresentado um estudo para reflexão acerca de

como atuar na família que tem em seu padrão de relacionamento um portador

de transtorno mental. Esses familiares necessitam de auxílio para lidar com

essa complexidade de problemas e conflitos.

Atualmente no Brasil tem se ampliado em propostas de intervenções

familiares e essa ajuda vem gerando varias possibilidades na qualidade do

tratamento dos doentes com transtornos mentais.

A partir dessas possibilidades trabalhar com a família juntamente com o

doente mental é uma experiência positiva na relação e no aprendizado mútuo,

para que seja resgatada a coragem de reconstruir suas vidas de uma forma

mais feliz.

Segundo Melman, (2006, pag.20) “o poder grupal tem a função de

proteger seus integrantes das forças ameaçadoras”.

Melman se refere que essa força ameaçadora é a enfermidade e isso gera

muita tensão, pois existe um sentimento de impotência, porque nos casos

graves das doenças os freqüentes insucessos nos tratamentos produzem muita

frustração e desespero e assim um isolamento do convívio social.

Isso acontece porque na nossa sociedade não estamos preparados para o

desafio que é o de cuidar de pessoas que adoecem mentalmente, pois

sabemos também que existe o preconceito e a exclusão. E a família adoece

junto, a doença atinge a todos alterando o ritmo do cotidiano, as relações

desses membros, e isso um maior número de atritos.

Imaginamos a dificuldade dessas famílias para o enfrentamento da doença,

umas buscam a solução nos manicômios, outros se dedicam a apoiar o doente

rejeitando a internação, por isso entendemos a necessidade do apoio e

orientação por profissionais especializados para essas famílias.

Page 37: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

37

” a família deve preparar-se para entrar em processo de

análise, pois, certamente, o paciente não será somente o

espelho que reflete o desequilíbrio, o mais sensível que

assume estar precisando de ajuda, mas toda a estrutura

familiar deverá ser analisada, revista e curada”. (Olivier

2008,pag.19)

4.1 Quando a família adoece

Será abordada a relação da doença mental e as questões da relação

entre a família e as pessoas acometidas de adoecimento psíquico. Para a

sociedade já é um desafio lidar com a loucura, imaginem para a família, pois o

doente mental desperta vários sentimentos conturbados em seus parentes.

Podemos perceber que a identificação do transtorno mental ocorre

geralmente através da família ou grupos próximos do portador desse sintoma,

(como por exemplo: da religião, escola, amigos) pela observação de ruptura

com o comportamento convencional do indivíduo.

O transtorno mental tende a sobrecarregar a família emocionalmente,

pois o convívio com uma pessoa que não se considera enfermo costuma gerar

tensões. Quando se esgotam os argumentos para convencer o portador de

transtorno mental de sua realidade e necessidade de tratamento, muitas vezes

a família tem de recorrer a persuasão e às vezes repressivo para ser ouvida.

É óbvio que essas estratégias geram um sentimento de culpa e atitudes

de super proteção para o doente. Cria-se então um sentimento de tensão na

família que partilha para os mesmos códigos culturais da sociedade, tem uma

atitude reativa e segregadora em relação ao portador de transtorno mental.A

família tem sentimentos de proteção e rejeição, isso constitui angústia.A família

tem uma sobrecarga emocional e temporal, pois lhe é exigido muita dedicação,

vigilância nas crises, socorro e cuidados.A família fica angustiada, estressada

Page 38: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

38

com sentimento de culpa, impotência, pois não compreendem como lidar com o

doente com transtorno mental na sua vida diária.

Quando acontecem as crises os doentes são levados para os serviços

tradicionais que são estruturados para o internamento e os medicamentos. A

família, no entanto é como uma unidade separada do doente e por isso é

excluída da intervenção terapêutica. Com isso, perdas significativas são cons

tatadas, os doentes tem rupturas do convívio familiar e a família perde pro não

saber utilizar a conduta adequada com o doente. Essas perdas acarretam um

afastamento desses integrantes do grupo familiar e tornam-se estranhos um ao

outro.

Atualmente novos serviços, centros de atenção psicossocial procuram

resgatar os pacientes com transtornos mentais, buscam construir novas formas

de relação entre a sociedade e a loucura. Visam incluir a família executando

trabalho educativo de esclarecimento, de capacitação, dividindo com ela os

cuidados para que o portador de transtorno menta passe o dia todo bem.

Assim com essa abordagem de serviço, a família compreende melhor a

natureza do transtorno e aprende a lidar com sua sintomatologia.

4.2 A Família como agente de saúde mental

A família é de suma importância para o tratamento do doente mental, o

acolhimento, o vínculo de confiança, incentivo para que entre em contato com

atividades como pintura é fundamental para o controle emocional do paciente,

evitando assim as crises.

A família quando procura auxílio para o tratamento da doença mental,

está na verdade em busca da saúde mental, pois nesta hora devem ser

orientados, pois trazem muitas dúvidas e questionamentos sobre a doença e o

tratamento.

Segundo Coll(2004,pag.101) as famílias atingem quatro fases quando

constatam um transtorno mental em um dos seus membros.

Page 39: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

39

• Fase de choque, cria-se um bloqueio, um atordoamento geral que inclusive

pode impedir a compreensão das mensagens que estão sendo recebidas.

• Negação, depois da profunda perturbação e desorientação inicial, a primeira

reação dos familiares é esquecer ou ignorar o problema, resistem, questionam

o diagnóstico dos profissionais. Esse comportamento prejudica, pois impede de

tomar as medidas necessárias para o tratamento.

• Fase de reação, depois do choque da negação , surgem sentimentos e

emoções para que possam se adaptar a nova situação, são necessários

expressa-los para atingir fases construtivas

A irritação, a raiva e agressão, manifestam-se como estados de ânimo difusos,

ou voltando-se contra os que orientaram sobre a doença mental, os médicos,

outros familiares ou até mesmo o portador da doença mental.

O sentimento de culpa que traduz uma profunda frustação, no caso dos

pais, buscam possíveis causas na gravidez, nos cuidados físicos e até mesmo

em sua educação.

A tristeza é um luto da dor, sentido de perda do familiar saudável.

A partir ,desses sentimentos vem a fase de adaptação e de orientação,

depois da calma emocional avançam para a realidade e a prática, na maneira

de ajudar o membro adoecido da família.

A família necessita passar por essa fases para que possam

compreender a situação de seu familiar adoecido e assim ajudá-lo em sua

melhora.

A família é parceira indispensável no uso adequado do medicamento por

parte dos pacientes, além de se responsabilizar pela relação deste com seus

demais vínculos terapêuticos, garantindo sua presença em psicoterapias

individuais, hospitais dias, oficinas terapêuticas entre outras. Existem em

alguns desses espaços de tratamento lugares de participação dos próprios

familiares. Esta participação é um sinal de afeto para o paciente, e ativa suas

forças curativas.

Citaremos o E.A.T( Espaço Aberto ao Tempo)no hospital psiquiátrico

Pedro II, hoje conhecido como Nise da Silveira, que tem esse atendimento ao

portador da doença mental e a seus familiares. Existem oficinas terapêuticas

Page 40: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

40

de pintura, bijouteria, artesanato em papel, caixas de madeiras para ocupação

diária dos pacientes e são realizadas reuniões também com a família.

” existe um grande número de evidências que demonstram

a eficácia das intervenções familiares em promover a

melhora do quadro clínico, diminuir ou atenuar recaídas e

diminuir o número de internações psiquiátricas nos

pacientes com transtorno mental severo”. Melman (2006,

pag.110)

O envolvimento da família é hoje reconhecido como um recurso

terapêutico a ser mobilizado na qualidade da saúde mental. As intervenções

familiares tenta explorar mais intensamente os limites e as possibilidades dos

participantes,uma valorização dos familiares como possíveis agentes de ações

e estratégias complexas,para tanto foi necessário encontrar mecanismos que

ativassem o potencial familiar, dando a eles expressão e legitimidade.

A presença de familiares no espaço terapêutico intensificam em trocas

enriquecendo a qualidade da convivência. Nos últimos anos aumentou o

interesse por parte dos profissionais de saúde mental em prover aos familiares

de pacientes com transtornos mentais com informações sobre os tratamentos

em saúde mental e sobre como lidar com os pacientes em casa.

Os familiares com muita freqüência, solicitam informações e opiniões

sobre as mais diferentes questões do campo da saúde mental. Participam de

cursos, palestras, oficinas para que ampliem a compreensão do problema.

Sabemos que não existe uma fórmula pronta e ideal, nem o melhor modelo

para resolver esses problemas, cada pessoa constrói seus modelos provisórios

e úteis para enfrentar as suas questões e durante esse percurso modificar seu

olhar e suas atitudes para as várias possibilidades que serão apresentadas.

“ a experiência do grupo familiar, assim como de

muitos outros trabalhos nesse campo, aponta para a

possibilidade de deixar a família escapar do olhar

familiocêntrico, deslocando a instituição familiar do lugar

central que ocupa em nossa cultura. É necessário

problematizar a noção da família como a grande

Page 41: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

41

mediadora universal do desenvolvimento humano.”

Melman(2006, pag.142)

Nessa perspectiva se propõe a uma valorização da alteridade, condição

fundamental para os processos de diferenciação e singularização do sujeito,

apoiando-se num olhar que pudesse acolher as incertezas e a desordem como

partes integrantes no tratamento.

Page 42: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

42

CONCLUSÃO

Analisamos ao longo deste trabalho a loucura, sua perspectiva histórica

e sua evolução ao longo do tempo.

Aprendemos um pouco sobre o sofrimento dos pacientes com

transtornos mentais e descrevemos algumas síndromes, suas características,

afim de que possamos lidar com alguém acometido de uma dessas patologias.

Analisamos a evolução da reforma psiquiátrica e pudemos perceber

nesse contexto que os familiares são fundamentais no processo de promoção

da saúde mental. A família é parceira indispensável no uso adequado de

medicamento por parte dos pacientes, além de se responsabilizar pela relação

destes com seus demais vínculos terapêuticos , garantindo sua presença nas

consultas, terapias e oficinas terapêuticas. Em alguns desses espaços de

tratamento podem ser encontrados lugares de participação dos próprios

familiares, pois a promoção da saúde mental deve alcançar os familiares dos

portadores de transtornos mentais.

Se somos capazes de compreender que a família de um paciente

também é uma família doente, devemos assumir nossa responsabilidade em

promover seu bem estar junto ao de seu familiar.

Concluímos então a importância do convívio dos familiares de pessoas

com transtornos mentais para que juntamente com os profissionais de saúde

mental possam lidar com a complexidade de seus problemas e conflitos, e

assim descobrir horizontes de possibilidades para o tratamento.

Page 43: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A … · 2 universidade candido mendes instituto a vez do mestre pÓs-graduaÇÃo “lato sensu” um novo olhar sobre os transtornos mentais

43

BIBLIOGRAFIA

AMARANTE, Paulo. Loucos pela vida-a trajetória da reforma psiquiátrica no

Brasil. Rio de Janeiro: SDE/ENSP,1995.

COLL, Cezar. Desenvolvimento psicológico e educação.Volume 3. Transtorno

de Desenvolvimento e necessidades educativas especiais. Porto Alegre: Art

Med, 2004.

DALGALARROND, Paulo. Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos

Mentais. Porto Alegre: Editora Artes Médicas,2000.

FOUCAULT ,Michel. História da Loucura. São Paulo: Editora Perspectiva,2002.

MELMAN, Jonas. Família e Doença Mental. São Paulo:Editora Ensaios

Transversais,2006.

OLIVIER, Lou. Distúrbios Familiares. Rio de Janeiro: Editora WAK,2008.

PESSOTI, Isaias. A Loucura e as épocas. Rio de Janeiro: Editora 34,1994.

VELASCO, Paulo Miguel. Depressão e Transtornos Mentais. Rio de Janeiro:

Editora WAK,2009.

WWW.psiqueweb.med.br. Psique web,1-6p., acessado em 20/01/2010.