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I I
Coordenadores: Antó '0 Barbosa e sabei Fernandes
Centro de Bioética
FACULDADE DE
MEDICINA LISBOA
l
Título
EntreclUzares Bioéticos
Coleção
Bioética
Publicação
Centro de Bioética
Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa
Coordenadores
António Barbosa e Isabel Femandes
Arranjo Gráfico
Vivelinda GuelTeiro
Impressão
Secção Editorial da Associação de Estudantes da FMUL
ISBN
978-972-9349-43-0
ISSN
2183-2609
Depósito legal
478160/20
Edição
Lisboa, 2020
Distribuição
Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa
©2020 Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa
Reservados todos os direitos
CENTRO DE BIOÉTICA
Direção
António Barbosa
Assessoria Técnica
Vive linda Guen'eiro
,
FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE LISBOA
Av. Professor Egas Moniz, 1649-028 Lisboa
Tel.: +35 1217985182, e-mail: [email protected]
íNDICE
AUTORES
INTRODUÇÃO
1. HOSPITALIDADE, BIOÉTICA E HUMANIDADES
António Barbosa
2. DO EU AO OUTRO: LITERATURA E ÉTICA
Isabel Fernandes
3. LlTERATURE, ILLNESS AND THE JOYS OF LlVING
Marijke Boucherie
,
4. LITERATURA E ÉTICA MÉDICA: ELEMENTOS PARA UMA EQUAÇÃO
Maria de Jesus Cabral
5. VIVER COM DEMÊNCIA: OS PONTOS DE VISTA DA PESSOA DOENTE, DA CUIDADORA E DO
PROFISSIONAL DE SAÚDE
Teresa Casal
6. PERCEPÇÃO, COGNiÇÃO E ÉTICA: RELAÇÕES E LIMITES
Alda Correia
7. NEUROCIÊNCIAS, NEUROÉTICA E INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
J. Alexandre Ribeiro
8. MANIPULAÇÃO DO GENOMA HUMANO: DESAFIOS ÉTICOS E SOCIAIS
Miguel Barbosa
9. DO (IT) YOURSELF: PRÁTICAS, DESAFIOS E ÉTICAS DO B/OHACK/NG
Francesca De Luca Maria Concetta Lo Bosco
10. MEDICINA E CIRURGIA ESTÉTICA 'ÉTNICA': QUESTÕES BIOPOLíTICAS E BIOÉTICAS DA
TRANSFORMAÇÃO 'RACIAL'
Chiara Pussetti
11. BIODIVERSIDADE, BIOTECNOLOGIA E SEGURANÇA ALIMENTAR: ASPETOS DE UMA RELAÇÃO
COMPLEXA
Jorge Marques da Silva
12. BIOÉTICA E PSICOLOGIA
Maria adilia Teixeira
António M. Duarte
13. "CRIME E CASTIGO": PREOCUPAÇÕES ÉTICAS NA POLíTICA COMUM DE PESCAS
Manuel Pacheco Coelho
IX
XIII
15
23
35
47
61
93
105
117
137
153
183
197
205
,
9. DO (Ir) YOURSELF: PRÁTICAS, DESAFIOS E ÉTICAS DO BIOHACKING
Francesca De Luca Maria Concetta Lo Bosco
INTRODUÇÃO
137
Com este artigo propomos reflectir acerca de um conjunto de práticas que visam ao aprimoramento humano, conhecidas com o nome de biohacking.
Sejam intervenções no corpo fora dos circuitos biomédicos, experiências de biologia sintética em laboratórios caseiros ou a integração da tecnologia digital na gestão do próprio metabolismo, estas formas tão diferentes de praticar o biohacking têm o objetivo comum de superar aqueles que são percebidos como limites da dimensão "bio" - material, celular, genética - da vida.
Embora considerado marginal na economia das biotecnologias do aprimoramento, este fenómeno representa hoje em dia uma tendência crescente na conjuntura entre cultura DIY (do-it-yourself, literalmente "faça você mesmo") e as novas formas de desenvolvimento científico e tecnológico, tendo vindo a criar uma comunidade crescente de biohackers, os quais partilham os conhecimentos on-line e se identificam com movimentos de open-access, ciborgue e transumanismo. Esta nossa primeira exploração procura olhar para as práticas que são definidas como biohacking a partir da partilha, na Internet, de informações, experiências e saberes assim como da divulgação de tutoriais e da venda de produtos no mercado informal das plataformas on-Une. Para realizar essa tarefa, iremos brevemente explorar o projecto de investigação dentro do qual a nossa pesquisa se coloca, explicar a nossa abordagem metodológica e por fim apresentar ao público português uma primeira análise dos discursos éticos, dos desafios e das contradições que acompanham estas práticas.
"ENHANCEMENT": A BUSCA DE EXCELÊNCIA NO PROJECTO EXCEL
A presente contribuição articula-se no âmbito do projecto de investigação "EX CE L - Em busca de excelência. Biotecnologias, enhancement e capital corpóreo em Portugal" em curso no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. O projeto EXCEL aborda as tecnologias de "enhancement"
138 ENTRECRUZARES BIOÉTICOS
como práticas de bio-investimento finalizadas à promoção da competitividade
pessoal, de acordo com uma lógica de excelência, interpretando as alterações
corporais e cognitivas como processos voluntários de auto-coIlsh'ução (Ong,
2006). Considerando em particular a área da Grande Lisboa, e com uma cons
tante atenção aos circuitos nacionais e transnacionais que afetam este contexto,
o projeto tenciona complementar os estudos estatísticos e as analises bioéticas
existentes sobre os riscos, os limites e as previsões futuras da manipulação
corporal (Bostrom e Sandberg, 2009; PickersgiIJ e Hogle, 2015) com dados
qualitativos e etnográficos, próprios da abordagem antropológica, para melhor
dar conta da complexidade destas práticas, que põem em relação subjetivida
de, alterações corpóreas e cidadania. A partir das análises económicas acerca
do aumento do consumo das biotecnologias cosméticas em Portugal durante
os anos da crise financeira (Furtado, 2013), este projeto visa analisar critica
mente as tecnologias de enhoncemenf no âmbito do seu contexto económico e
sócio-histórico de produção, assim COIllO relacionar as escolhas e as experiên
cias individuas de bio-investimento com a génese de novos mercados e circui
tos transnacionais de turismo médico cosmético no país.
A exploração das práticas de aprimoramento assim como das aspirações
subjacentes das pessoas serão lidas como processos de auto-construção de
acordo com as propostas teóricas de Aihwa Ong (2006), que nos convidam a
considerar como os sujeitos experimentam e incorporam como desejos e aspi
rações os novos valores e modelos resultantes de uma adequação do capitalis
mo global às realidades locais. Tendo em conta estas considerações iniciais, as
práticas de cura e de modificação ou alteração do corpo configuram-se, por
exemplo, como formas de auto-construção dei sl~ieito que assentam na dimen
são biológica com o objetivo de contribuir para a formação identitária do indi
víduo e implementar o seu sentido de afiliação e pertença social. A procura de
tecnologias que melhorem o aspecto físico (cuja finalidade se centra, por
exemplo, no combate aos sinais de envelhecimento ou na conformação a pa
drões vigentes de beleza, sexualidade ou raça) ou a pelformonce cognitiva (no
caso, por exemplo, dos produtos farmacêuticos que melhoram a memória e a
concentração no âmbito escolar, ou a resistência 110 trabalho) representa então
uma expressão da formação de novos sujeitos sociais, motivados pela busca da
excelência e que se definem de acordo com seus padrões ou expectativas.
J
91 DO (ir) YOURSELF: PRÁTICAS, DESAFIOS E ÉTICAS DO BIOHACKING 139
, APRIMORAR O SUJEITO: AS PRÁTICAS DE BIOHACKING E O DESAFIO À MEDICINA
A capacidade de transformar a biologia, ligada aos avanços tecnológicos desenvolvidos na engenharia genética, na farmacologia, na bioengenharia, na cibernética e na nanotecnologia, tem gerado uma ampla variedade de dispositivos e intervenções, geralmente definidas por "aprimoramento" (enhancement
technologies), capazes de manipular ou alterar os corpos e suas caraterísticas e
as funções humanas (cognitivas, reprodutivas etc.). Seguindo a proposta feita pelo psiquiatra Kramer (1995) de acordo com a qual se define "cosmético" o uso de psicofármacos fora do diagnóstico ou prescrição médica, as biotecnologias são chamadas de "cosméticas" quando visam melhorar as características humanas, incluindo a aparência fisica e o desempenho cognitivo, independentemente de um diagnóstico oficial de doença ou patologia. O consumo e o uso cosmético das biotecnologias de aprimoramento refere-se , portanto, a um conjunto diferente de intervenções entre as quais, por exemplo, a cirurgia plástica estética (Edmonds, 2010; Livingston, 2015), os tratamentos de despigmentação de pele (Pussetti, 2019), assim como de produtos como as "smart drugs" para o melhoramento da pe/jormance (Barbosa, 2014), as terapias hormonais (Edmond e Sanabria, 2014; Rodhen, 2017) e as intervenções de biohacking (Ikemoto 2017).
Estas últimas intervenções, que daqui por diante irão ser o objecto de aprofundamento do nosso artigo, referem-se a um conjunto diversificado de práticas e de conhecimentos onde se incluem o implante de ímanes na pele, o consumo de substâncias revigorantes ou a experiência "caseira" de biotecnologias para a edição genética. A nossa intenção é aprofundar a reflexão em tomo destas práticas e observar como elas se articulam no panorama mais amplo das modificações corpóreas e performativas ligadas ao consumo de biotecnologias de aprimoramento. De facto, as práticas definidas de biohacking representam um fenómeno específico dentro da economia do aprimoramento humano e a sua exploração do ponto de vista social e ético é ainda relativamente limitada, pois as pesquisas sobre o enhancement focaram-se principalmente sobre as práticas que têm usualmente lugar no mercado "regular" e sobre as tecnologias cujo aparecimento e consumo está regularizado pelos protocolos médicos e pela legislação vigente. Contudo, a "vida social" das biotecnologias (Latour e Woolgar, 1986), as suas (novas) possibilidades de uso, ultrapassa a sua "regularização" pelo sistema do mercado, criando novas dinâmicas e formas de
consumo fora dos padrões previstos, como é o caso, por exemplo, das técnicas
140 ENTRECRUZARES BIOÉTICOS
de branqueamento da pele com uso de cremes à base de mercúrio (Pussetti 2019), ou do consumo de substâncias psicoativas para fim de estimulação cognitiva (Barbosa, 2014). A peculiaridade da abordagem antropológica às biotecnologias reside na capacidade de poder observar e ilustrar estes lugares intersticiais onde as práticas de aprimoramento humano de facto acontecem.
O nosso interesse pelas práticas de biohacking baseia-se, a nível empírico, nas modalidades específicas da sua produção e do seu consumo, sendo que estas acontecem fora dos canais "mainstream" das biotecnologias de aprimoramento. Além disso, como já mencionado, o nosso foco será também a dimensão ideológica e ética dos discursos que são produzidos em tomo desta práticas e que podem ser reconduzidos, de forma variável, aos movimentos open-source, transhumanistas e cyborg, embora nem sempre de forma linear. O objetivo mais amplo será o de analisar como as práticas de biohacking impulsionam novos imaginários sobre o que um corpo é ou poderá ser, estimulando a pensar nossos possíveis futuros panoramas biotecnológicos.
METODOLOGIA: A INVESTIGAÇÃO ON-LlNE, CARACTERíSTICAS E PRESSUPOSTOS
De acordo com Boyd (2011) e Hine (2015), a emergência da Internet tem vindo a proporcionar uma nova gama de possibilidades de acesso a conteúdos e conhecimentos assim como novas oportunidades de comunicação e agência no contexto social mais amplo. Como resultado, as redes sociais e os grupos virtuais representam hoje em dia uma fonte de informação e um lugar de partilha para os utilizadores, reforçando o sentido de comunidade que é construído e alimentado por interesses e experiências comuns. Entre outros benefícios práticos, esses grupos assim como os fóruns de discussão on-line promovem a interação e a amizade, representando uma oportunidade para conhecer novas pessoas ou para manter e solidificar as conexões off-line já existentes (Ellison et aI. 2007).
No nosso caso específico, a maioria dos sujeitos que se dedicam às práticas de biohacking agem e interagem neste contexto no ambiente virtual, utilizando fóruns e blogues como espaços e ferramentas para divulgar informações, fazer perguntas e ajudar outras pessoas com seus conselhos. Alguns deles também usam o espaço virtual duma forma mais engajada, para ampliar a consciencialização pública sobre o "open access" e o uso democrático da tecnologia científica, bem como para ganhar visibilidade como hackers. Com o objetivo de
91 DO (IT) YOURSELF: PRÁTICAS, DESAFIOS E ÉTICAS DO BIOHACKING 141
, interagir e entrevistar várias pessoas praticantes de biohacking, assim como de
participar em encontros informais em espaços públicos ou privados, uma parte significativa do nosso trabalho de campo é dedicado, p0l1anto, ao estudo dos
grupos virtuais de hackers. Noutras palavras, o nosso know-how etnográfico
incorpora dados sociais mediados pela Internet, como sugerido por vários
antropólogos que investigaram comunidades on-line (Bowler Jr 2010). Tendo em conta estas características, elaboramos, portanto, uma específica "netno
grafia", ou seja uma "fonua especializada de etnografia" adaptada à Internet
(Kozinets 2010) e baseada numa metodologia de pesquisa que inclui métodos
de pesquisa on-line. Para podermos recolher e analisar as práticas, os discursos
e os desafios que os hackers colocam às instituições e às práticas biocientíficas, a nossa observação científica está focada primariamente nos espa
ços digitais (blogues, sites, fóruns, redes sociais, etc.), todavia a complementa
ridade entre os espaços ou domínios on-line e o.fJ-line das experiências implica
que a etnografia digital seja considerada como uma metodologia processual (Hine 2015), significando que não é um método ou técnica de pesquisa limita
da a regras rígidas, mas sim aberta a outras influências e disciplinas. Ao usar
as redes on-line e o.fJ-line, pretendemos obter uma compreensão maior das
práticas de biohacking das pessoas, suas reivindicações e experiências compartilhadas. Essa maneira interligada de conduzir o trabalho de campo dar-nos
á a oportunidade de conhecer uma variedade de pessoas diferentes (em termos
de idade, género, nacionalidade) e aprofundar a nossa compreensão das suas
vidas quotidianas e das suas perspectivas sobre o biohacking, esclarecendo
tópicos que de outra forma ficariam inexplorados. Por exemplo, o trabalho de campo on-line permitir-nos-á observar como um tópico específico - o uso dos
implantes magnéticos ou a troca de tutoriais - circula pela comunidade, às
vezes até revelando as suas ambiguidades e os pontos de fraqueza.
Ainda em andamento, a nossa exploração netnográfica assenta até agora
em dados parciais e não representativos no sentido sociológico. Os dados reco
lhidos on-line e reportados daqui por adiante refletem mais a realidade norte
americana, sendo que os grandes centros tecnológicos do East Coast estaduni
dense (em particular o Massachusetts Institute ofTechnology) e a Silicon Val
ley representam desde há duas décadas o berço do fenómeno do biohacking.
Nas redes virtuais onde se partilham técnicas e conhecimentos ligados ao
biohacking existem núcleos de biohackers portugueses, que porém até agora
não foram ainda entrevistados. Sendo um contexto não formalizado, os pró
prios sujeitos demonstram haver uma multiplicidade de formas em como o
142 ENTRECRUZARES BIOÉTICOS
biohacking é definido e praticado, ilustrando desta forma a amplitude do objecto de estudo nOlmalmente abrangido pelo termo biohacking assim como a fluidez da comunidade habitada por diferentes sujeitos.
DO HACKING AO BIO: CURTA GENEALOGIA DO BIOHACKING
Etimologicamente bio, termo de origem grega, exprime a noção de vida, enquanto hacking, em inglês, pode significar o acto de cortar algo grosseiramente, ou tomar uma coisa de uso comum. Como sugere o dicionário etimológico da língua inglesa, estes dois significados do verbo to hack sobrepuseram-se provavelmente a partir do final da década de 1970, quando o termo hacker começou a ser utilizado nos ambientes informáticos EUA para se referir aos programadores especializados que, dentro e fora da indústria computacional, se dedicavam à modificação, reconfiguração ou reprogramação dos sistemas informáticos em modalidades não previstas por seus criadores iniciais. Na sua obra seminal sobre a difusão das inovações tecnológicas, o sociólogo Everett Rogers (2003 [1962]) identificou uma veia "artística" na emergente subcultura hacker daqueles anos: esta manifestava-se justamente no uso dos computadores como meios para canalizar a criatividade. A emergência deste uso inovador das tecnologias informáticas contribuiu segundo o autor, para o processo de domesticação dos aparelhos informáticos - até ntão prerrogativa das grandes empresas - iniciado com a invenção do microproce sador em 1972 e com a consequente seguinte redução dos custos no mercado.
Num artigo do Washington Post de 1988 intitulado' Playing God in your basement", Michael Schrager (MIT) imaginava a possibilidade das biotecnologias virem a ter uma evolução semelhante à que tiveram a tecnologia informáticas da década anterior, e cunhou o termo bio-hacker para delinear o perfil do futuro "manipulator-amador" de materiais genéticos e de outros avanços científicos. Juntamente com outro ienti ta entrevi tados Schrager ob ervava como "a tecnologia da biotecnologia e está a tomar mais rápida mai fácil e mai barata". A indú tria das biotecnologias avançava a uma velocidade surpreendente; o acesso às técnicas era mais aberto (no artigo, por exemplo, sublinhava-se a venda difusa nos jornais de divulgação científica de kits comerciais de iniciação ao uso de biotecnologias) e apontava-se para a divulgação dos saberes científicos, em particular no campo da engenharia genética, que ocupavam os títulos dos maiores jornais internacionais. Aliás, a
91 DO (IT) YOURSELF: PRÁTICAS, DESA\IOS E ÉTICAS DO BIOHACKING 143
prática "caseira" da experiência científica, chamada de ciência popular e produzida fora das instituições e dos laboratórios não era uma novidade nos CÍrculos de investigação académica, nem nos tratados de história e filosofia da ciência. Como observa Conner (2005), a história da "cítizen science" (literalmente "ciência cidadã") remonta às origens da produção de conhecimento científico.
Numa época, como a dos anos oitenta do século passado, em que as biotecnologias se começavam a caracterizar pela facilidade de uso e pelos custos decrescentes (Roosth 2010), não era então invulgar vislumbrar uma iminente conjuntura entre o interesse público pelas inovações científicas e as "abordagens hacking" às tecnologias, caracterizadas pela criatividade, pela bricolagem e, em geral, pela adversidade às regulamentações institucionais. Todavia, vários autores sugerem que com o desenvolvimento da nova disciplina científica da Biologia Sintética (Keulartz e Belt, 2016; Delfanti, 2013; Roosth 2010) e a seguir com a tentativa do mapeamento preliminar do genoma humano (completado enfim pelo Human Genome Project), as práticas de biohacking, e concretamente a chamada DJY-bio (biologia do-it-yourselj) tiveram um grande impulso no panorama das experiências feitas com as biotecnologias fora dos laboratórios universitários. Esta coincidência cronológica e contextuai entre a
biologia sintética e o DIY -bio é sublinhada pela antropóloga Sophia Roosth (2010) que acompanhou como observadora participante (prática própria da metodologia de investigação antropológica) este processo de disseminação do biohacking a partir das inovações no campo da biologia sintética. A partir de 2003, a criação do concurso iGEM (International Genetically Engineered Machines) contribuiu fortemente para a criação de novas gerações de biohackers
(Kelty 2010), tendo começado por ser uma competição de projetos de estudantes do Massachusetts Institute of Technology para se tomar num concurso anual internacional de biologia sintética. Nestes concursos, equipas de estudantes universitários competem para produzir sistemas sintéticos que funcionam em células vivas, tendo contribuído também para a expansão do BioBricks, o "Registry of Standard Biological Parts" (uma lista de partes biológicas padronizadas) análogo aos registos de software de código aberto (Keulartz e Belt, 2016). Vários fundadores de numerosos grupos DIY-bio que emergiram depois de 2008 foram participantes de competições iGEM. Mas se, como observa Delfanti "a biologia de garagem" (garage biology) pode ser vista como um exemplo da direta transposição das práticas hacking e do acesso aberto no reino das células, genes, e laboratórios, um olhar mais atento aos vários
fenómenos contemporâneos chamados de biohacking dá uma ideia de como o
144 ENTRECRUZARES BIOÉTICOS
, termo é usado para entender práticas bastante diferentes, e que nem todas se
identificam no domínio da "biologia da garagem". Por este motivo, sobrevo
ando as controvérsias nominalistas, na próxima seção iremos identificar três
diferentes declinações de biohacking à volta das quais se movimentam várias
comunidades de praticantes-consumidores.
ASSUMINDO UMA PERSPECTIVA ÊMICA: BODY-HACKING, GRINDERS E DIY-BIO
Em geral, o biohacking pode ser pensado como um termo "guarda-chuva"
para definir diferentes práticas que têm em comum a característica de incorpo
rar a biologia na ideologia hacker; isto é, práticas que se apresentam como
inovadoras e desafiantes do statu quo da biologia: seja esta a (limitada) biolo
gia humana ou o sistema de controlo (limitante) das biotecnologias. Nesta
perspectiva, todas as práticas de biohacking reivindicam o direito individual de
manipulação de material biológico. Contudo, esta definição tenta resumir as
práticas de biohacking acabando por homogeneizar um fenómeno bastante
variado e heterogéneo (Ikemoto 2017). Como antropólogas, apontamos para a
importância de se referir a um padrão êmico de distinção dos vários "partici
pantes" do panorama biohack. Em outras palavras, observamos como alguns
biohackers - em particular os adeptos à DIY -bio, que se reconhecem como
iniciadores do fenómeno do biohacking - definem as diferenças entre as várias
modalidades de "hackerar" a biologia. Neste sentido, adotamos a distinção -
proposta pelo biohacker Gabriel Licina numa áudio-entrevista disponível 011-
fil1e - entre bodyhackers, gril1ders e biohackers.
BODYHACKERS
Os bodyhackers (que geralmente se auto-definem como biohackers) são
pessoas que procuram melhorar a perf01111atividade e aspecto do próprio corpo
com o uso de biotecnologias. Os discursos dos bodyhackers fundam-se na
ideia de acordo com a qual é possível manipular o corpo humano da mesma
forma em que os hackers manipulam os computadores, para que o "sistema"
se comporte de maneiras que não eram originalmente planejadas. Nesta pers
petiva, eles definem o corpo em termos de hardware e as funções cognitivas
em termos de software, atuando uma sobreposição da tenninologia computa-
91 DO (IT) YOURSELF: PRÁTICAS, DESAFIOS E ÉTICAS DO BIOHACKING 145
cional quer na interpretação da corporalidade quer na operacionalidade da sua manipulação.
Os lemas do bodyhacking - atualize, descompacte - são, por exemplo, emprestados da terminologia informática: "upgrade your body", "unpack biotechnology", "high-level performance". De facto, o contributo do movimento dos bodyhackers em comparação com a inovação alcançada pelas comunidades de biohackers é relativamente reduzido. Fazem parte da esfera do bodyha
cking práticas tão diferentes como as dietas cetogênicas; o uso de dispositivos digitais vestíveis (wearable technology) que desempenham funções como
monitorizar dados biológicos ou de saúde; a meditação, o relaxamento e o treinamento cognitivo; o consumo de nootrópicos; o uso de próteses assim designadas de "soft", como os dispositivos elétricos de mobilidade pessoal.
Os bodyhackers que têm mais visibilidade on-line são conhecidos como "gurus" de estilos de vida: muitas vezes empreendedores de tecnologias wea
rable e integradores alimentares e hormonais, o seus corpos - mostrados em vídeo-tutoriais e sítios web - são o principal elemento de marketing. O Dave Hasprey (Figura 1), por exemplo, é uma figura renomeada do panorama do empreendedorismo do bodyhacking, e o marketing dos seus produtos assenta na narrativa do seu próprio percurso de vida, apresentada em termos de mudanças alcançadas na procura do aprimoramento absoluto da sua biologia, como sejam a perda de peso, o controlo do sono e a descoberta de tecnologias para o aumento do seu quociente de inteligência. As técnicas de bodyhacking
do Dave Hasprey são a dieta cetogênica, o consumo regular de integradores e
de nootrópicos. Como outros bodyhackers, ele identifica os primeiros bioha
ckers na tradição dos culturistas (bodybuilders), por estes terem investido na transformação do próprio corpo e na sua performatividade para além do "humano". Neste sentido "humano" e "biologia" são termos que realçam as limitações do corpo e das capacidades tisicas e cognitivas da existência "normal": os bodyhackers visam a críação de subjetividades pós-humanas no que diz respeito à integração das tecnologias como formas de "upgrade" humano. Como refere um bodyhacker numa entrevista on-line, "os bodyhackers são pessoas que visam mudar a biologia com a qual nasceram".
146 ENTRECRUZARES BIOÉTlCOS / '
Figura 1 - Bodyhacker Dave Asprey monstra uma faixa para a estimulação eletrica do cerebro que visa melhorar a cognição. Foto de Jason Lelchuk https://www.pbs.org/newshour/science/biohacking-care
GRINDERS
Talvez os que mais têm despertado a atenção do público e dos media nas últimas décadas são os chamados grinders, que Licina define como "os entusiastas do hardware", e que se apresentam como a franja anti-establishmenf do movimento do biohacking. Ligados às cenas "biopunk" e cyborg (Patterson, 2010), os grinders aplicam a ética hacker para melhorar os seus próprios corpos com técnicas invasivas, como por exemplo os implantes de sensores magnéticos, de biochip e de LED no epiderme (Figura 2).
Figura 2 - Implantes do Northstar Version 1, dispositivo de silicone ativado magneticamente, equipado com LED. Foto de Grindhouse Wetware http://www.grindhousewetware.com
91 DO (Ir) YOURSELF: PRÁTICAS, DESAFIOS E ÉTICAS DO BIOHACKING 147
Alguns destes dispositivos permitem simplificar ações quotidianas como abrir, fechar, trancar e destrancar portas, ligar o cano ou usar o telemóvel.
Outros têm finalidades mais estéticas, como o NOlth Sense que emite vibra
ções no corpo quando este está alinhado em direção ao norte. Com o uso de
agulhas, bisturis e outras fenamentas cirúrgicas, os grinders reivindicam a
criação de uma "medicina pun/{' e nos fóruns on-fine partilham tutoriais tanto
para explicar a construção dos implantes e dinamizar mercados informais dos
novos dispositivos quanto para aconselhar técnicas cirúrgicas para otimizar a
introdução dos aparelhos no corpo, pattilhando as suas próprias experiências
acerca das reações adversas do mesmo corpo à estes dispositivos. É interessan
te ver como nos fóruns onde se partilham as técnicas de aplicação dos disposi
tivos hardware existem "regras" e "procedimentos standards" a seguir - como
a necessidade do uso de fármacos anestésicos na gestão da dor durante as ope
rações - que remetem para a profilaxia própria das práticas biomédicas, crian
do assim uma espécie de profilaxia informal nos moldes da cirurgia standard.
Os grinders então rompem com o sistema biomédico no sentido estético e
funcional da experimentação e manipulação do corpo através das biotecnolo
gias, mas reproduzem nos seus ambientes informais alguns padrões de "segu
rança" e higiene próprios da prática médico-cirúrgica, justificando essa neces
sidade como forma de cuidado para com a vida.
BIOHACKERS
Segundo Licina e segundo a maioria dos autores referenciados neste artigo,
os biohackers propriamente ditos são biólogos DIY, que experimentam em
laboratórios construídos em casa, na garagem, ou nos community labs (labora
tórios comunitários, ou populares), que são espaços para a utilização de tecno
logias de laboratório a baixo custo pensados para pellnitir a "democratização"
das técnicas e a disseminação do conhecimento de biologia sintética. Os
biohackers mais influentes no ambiente digital são pessoas que fizeram parte
do mundo académico, e que em geral estão já fora da academia. Entre os
biohackers mais discutidos, mencionamos o Gabriel Licina e o Josiah Zayner,
ambos investigadores em biologia. Os biohackers reivindicam a bricolagem
científica, a inovação e a ideia de sustentabilidade, esta última particularmente
defendida pelo Licina. Como aconteceu para os primeiros computadores, dis
positivos muito caros que aos poucos se tornaram desatualizados para as gran-
148 ENTRECRUZARES BIOÉTICOS
,
des empresas que os usavam, acabando nos mercados de segunda mão e incen
tivando a criatividade dos futuros hackers, assim, diz Licina, "hoje podemos comprar coisas (de laboratório) que os ricos já não necessitam no ebay". E continua "as coisas estão a melhorar para os biohackers porque as pessoas
continuam a deitar coisas fora, e pessoas como eu usam este lixo e fazem algo
com ele". O biohacking e o DIY estão, portanto, ligados à ideia de lixo - de
lixo tecnológico - que faz com que aparelhos hoje obsoletos para a indústria
farmacêutica e os grandes laboratórios universitários, entrem no mundo do mercado de segunda mão principalmente através da InterneI. Estes materiais,
juntamente com os conhecimentos adquiridos por alguns biohackers graças às
suas próprias experiências de investigação científica e à ética hacker do "open access" criam um cocktail que está na base do biohacking como movimento e
como ética (Figura 3).
FiguJ"a 3 - Um laboratório de DIY -bio. Foto de Bue https://www.flickr.com/photos/141682395@N07/25799280874
Mas o fenómeno do biohacking é realmente heterogéneo e não sem contro
vérsia interna. Um exemplo emblemático é o caso do Josiah Zayner, um biohacker e cientista conhecido sobretudo pela sua campanha de crowdfun
ding para fornecer kits CRISPR (do inglês Clustered Regularly Interspaced
Sh0l1 Palindromic Repeats) de engenharia genética para o público em geral, e
por ter usado o CRISPR por modificar seus próprios genes durante um evento
em live-streaming. A campanha de Zayner para a disponibilização dum kit CRISPR público coincidiu com uma sondagem à opinião pública acerca da
modificação genética. Numa entrevista recente Zayner defende o uso abel10 de
tecnologias de editing genético, menos regulamentado e baseado numa escolha
91 DO (IT) YOURSELF: PRÁTICAS, DESAFIOS E ÉTICAS DO BIOHACKING 149
, individual. Ele afinna que em nome da defesa da liberdade, da igualdade e dos
direitos, não há direito mais humano do que poder controlar os próprios genes.
O medo referido pela sociedade acerca do uso do kit é baseado, na sua opinião,
num mal-entendido sobre o potencial efetivo do dispositivo, mas também nas
reticência de alguns exponentes do mesmo movimento de biohacking. Zayner
tem criticado a comunidade de biohacking por ser exclusiva e hierárquica,
particulannente por reproduzir, no seu interno, o poder regulador das institui
ções no decidir o que é ou não "seguro" por ser divulgado no público. Como
ele mesmo declara em relação aos riscos e benefícios da distribuição (criticada
por muitos biohackers) dos kits de editing genético "se vamos fazer estas ex
periências, precisamos de avaliar duas coisas: quantas pessoas podem morrer
por testar seus próprios produtos ou disponibilizá-los antetempo, e quantas
pessoas têm distúrbios genéticos e estão apenas morrendo porque não o fa
zem?". Em referência à sua crítica elitista do biohacking, alguns cientistas fora
e dentro do movimento objetam que o biohacking é de facto inerentemente
exclusivo por depender da disponibilidade de tempo e de dinheiro dos seus
praticantes, e que o desvio radical, perseguido por alguns, das regras gerais de
segurança pode levar à regulamentações ainda mais rigorosas para todos no
imediato futuro.
CONCLUSÕES: DESAFIOS E ÉTICAS DO BIOHACKING
No já citado artigo do Washington Post assinado por Schrage em 1988, o
autor concluía imaginando possíveis imaginários futuros da efetiva difusão de
práticas de biohacking no mundo. O autor previu duas direções possíveis:
"proibir equipamentos biotecnológicos fora de laboratórios licenciados", op
ção que ele julgava utópica e até inútil, ou alcançar um nível de conscientiza
ção tal de "supor que qualquer pessoa suficientemente inteligente para ser um
biohacker seria inteligente o suficiente para ter um respeito pela vida". Na
nossa opinião, a sua análise do futuro das práticas de biohacking baseada na
ideia da responsabilização dos indivíduos, mesmo que perspicaz, não tomou
suficientemente em consideração a diversificação que essas práticas poderiam
vir a assumir em contextos diferentes, assim como as medidas tomadas ao
nível de regulamentação institucional e das recomendações éticas subjacentes.
Uma comparação entre as comunidades de biohackers nos dois lados do
Atlântico revela, por exemplo, visões e expectativas diferentes sobre o que
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representa a ética hacker no que diz respeito a manipulação da vida. Analisando as reuniões dos congressos anuais internacionais finalizados à fonTIulação de linhas comuns de ética a respeitar no biohacking, Keulartz e Belt (2016) observam como neste momento há uma tensão entre o modelo norteamericano
de DIY-bio, orientado para o empreendedorismo de mercado e para valorização pessoal, e o modelo europeu, mais focado nas reivindicações do open
access como forma de empoderamento social e ação comunitária. Neste contexto, as diferenças regionais têm um papel importante. Chama-se à atenção a necessidade de considerar os contextos e as especificidades locais nas análises
sobre o biohacking, para evitar o risco de considerá-lo um fenómeno puramen
te "ocidental" (Kera, 2012; 2014). Por outro lado, considerando as suas ambivalências económicas, epistemo
lógicas e éticas, se o DIY-Bio pode ser considerado como uma potencial alter
nativa ao sistema capitalista de produção e gestão das biotecnologias representa uma questão ainda aberta. As comunidades norte americanas de biohackers
e DIY -bio, que criticam os sistemas corporativos de regulamentação da produ
ção e do acesso às biotecnologias (Patterson, 2010), mostram ter relações ambíguas com o sistema capitalista que supostamente visam minar, parecendo de
facto perfeitamente compatíveis com o biocapitalismo emergente e com a
mercantilização contínua de todos os aspetos do biocapital (Ikemoto 2017). Apesar da ênfase na liberdade individual no contexto das atividades dc pesqui
sa e manipulação genéticas, assim como na criação de mercados alternativos
para a realização de laboratórios não profissionais, os "projetos de código
aberto não são necessariamente anticapitalistas, mas podem até ampliar o es
copo da exploração capitalista" (Keulartz e Belt 2016: 4). Por concluir, como observa Kelty (2010), a difusão crescente do biohacking e da DIY -Bio, junta
mente com os grupos de defesa do paciente e do movimento open access,
mudaram o significado da ideia fazer parte do público: "Estar em público já
não pode ser passivo ... mas agressivamente ativo e envolvido no conhecimento, no acesso e na experiência" (Kelty 2010, 8). Torna-se urgente, portanto,
uma reflexão ética aprofundada sobre o lema da participação pública na busca para a ciência aberta e livre, que revele criticamente qual público, em particu
lar, não está a ser tomado em consideração.
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