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SOCIEDADE EDUCACIONAL DE SANTA CATARINA
INSTITUTO SUPERIOR TUPY
MESTRADO EM ENGENHARIA MECÂNICA
ANÁLISE DA USINAGEM DE ROSCAS POR
INTERPOLAÇÃO HELICOIDAL NO FERRO FUNDIDO
VERMICULAR
Rodrigo Avancini Bretas
Joinville
2009
SOCIEDADE EDUCACIONAL DE SANTA CATARINA
INSTITUTO SUPERIOR TUPY
MESTRADO EM ENGENHARIA MECÂNICA
ANÁLISE DA USINAGEM DE ROSCAS POR
INTERPOLAÇÃO HELICOIDAL NO FERRO FUNDIDO
VERMICULAR
Rodrigo Avancini Bretas
Joinville
2009
Dissertação apresentada ao Programa de Pós -
Graduação em Engenharia Mecânica do Instituto
Superior Tupy, como requisito para a obtenção do
título de Mestre em Engenharia Mecânica.
Orientador : Prof. Dr. Adilson José de Oliveira
ANÁLISE DA USINAGEM DE ROSCAS POR
INTERPOLAÇÃO HELICOIDAL NO FERRO FUNDIDO
VERMICULAR
Rodrigo Avancini Bretas
Banca examinadora constituída pelos Professores:
______________________________________________
Prof. Dr. Adilson José de Oliveira (Orientador)
Instituto Superior Tupy
_______________________________________________
Prof. Dr. Ulisses Borges Souto
Instituto Superior Tupy
________________________________________________
Prof. Dr. Aldo Braghini Júnior
Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR)
Dedicatória
Este trabalho é dedicado aos meus pais Antônio Carlos e Marlene pelo incentivo, apoio
e ensinamentos sobre a vida, e à minha esposa Sandra pela compreensão, paciência e amor
incondicional.
Agradecimentos
Ao professor, orientador e amigo Adilson José de Oliveira pelos ensinamentos,
fundamentação teórica e principalmente paciência.
Aos laboratoristas Leandro e Wagner pelo apoio em todos os momentos durante os
experimentos.
A professora Salete pelos ensinamentos durante o mestrado.
As empresas Schulz e WEG pelo incentivo durante o todo o curso e o desenvolvimento
desta pesquisa.
Aos amigos Fernando (ISCAR) e Aldo (OSG) pelas incansáveis conversas sobre este
trabalho.
A todos que direta ou indiretamente contribuíram para a conclusão deste trabalho.
Resumo
BRETAS, Rodrigo Avancini, Análise da usinagem de roscas por interpolação
helicoidal no ferro fundido vermicular, Joinville,: Sociedade Educacional de Santa Catarina,
Instituto Superior Tupy, 2009. 75 p. Dissertação (Mestrado)
O ferro fundido vermicular apresenta propriedades mecânicas próximas ao do ferro
fundido nodular, mas condutividade e expansão térmica similar ao do ferro fundido cinzento.
Em função destas propriedades, na indústria automotiva, o ferro fundido vermicular é
amplamente utilizado em blocos de motores, cabeçotes e coletores de exaustão. Contudo, o
ferro fundido vermicular demonstra uma maior dificuldade de usinagem quando comparado
ao cinzento, o que é agravado em operações de roscamento. Existem diferentes ferramentas
para usinagem de roscas, tais como machos rígidos, fresas de interpolação e pastilhas de
torneamento. Machos rígidos são as principais ferramentas utilizadas na indústria. Entretanto,
com a utilização destas ferramentas, a velocidade de corte é limitada pela necessidade de
sincronismo entre a rotação e a velocidade de avanço. Uma alternativa a utilização de machos
rígidos é o fresamento de roscas por interpolação helicoidal. Dois tipos de ferramentas com
insertos intercambiáveis de metal duro são alternativas: múltiplas arestas e de aresta única. O
objetivo desta pesquisa é determinar o desempenho de cada tipo de ferramenta na usinagem de
roscas no ferro fundido vermicular. Os resultados demonstram que maior vida é alcançada
com ferramentas de múltiplas arestas e que o lascamento é a principal avaria que determina o
fim de vida da ferramenta.
Palavras-chave: ferro fundido vermicular, roscamento, metal duro, vida de ferramenta,
desgaste.
Abstract
BRETAS, Rodrigo Avancini, Analysis of thread mill using helical interpolation in
compacted graphite iron, Joinville,: Society Education of Santa Catarina, Institute Superior
Tupy, 2009. 75 p. Dissertation (Masters)
The compacted graphite iron shows mechanical properties similar to ductile iron, but
thermal conductivity and expansion close to gray iron. Based on these properties, in the
automotive industry, the compacted graphite iron is used in cylinder block, cylinder head and
exhaust manifold. However, compacted graphite iron has lower machinability when compared
to gray iron, which is critical in threading operation. In machining of threads, there are
different tools to carry out the process like tap, thread mill and thread turning inserts. Tap is
the most widely used tools employed in industry. However, cutting speed using these tools is
limited by required synchronism between tool speed rotation and feed velocity. An alternative
to use tap tools is thread mill using helical interpolation. Two types of cemented carbide tools
with indexable inserts are options: with single cutting edge and with multiple cutting edges.
The objective of this work is to determinate the performance in terms of tool life, tool wear
and cutting force of each thread mill in the machining of compacted graphite iron. The results
demonstrated that the longer tool life was achieved using thread mill with multiple cutting
edges and the cutting edge chipping was the main tool failure mode in both tools.
Keywords: compacted graphite iron, threading, cemented carbide tool, tool life, tool
wear.
i
Sumário
1. Introdução ..................................................................................................................... 1
2. Revisão Bibliográfica .................................................................................................... 3
2.1. Ferro fundido vermicular (Compacted Graphite Iron) ........................................... 3
2.1.1. Microestrutura ................................................................................................. 4
2.1.2. Método de fabricação do CGI ......................................................................... 5
2.1.3. Influência da forma da grafita na usinagem .................................................... 7
2.1.4. Influência da matriz......................................................................................... 8
2.1.5. Efeito das inclusões na usinagem .................................................................... 9
2.2. Usinabilidade do ferro fundido vermicular .......................................................... 13
2.3. Roscas .................................................................................................................. 15
2.4. Processos de manufatura de roscas ...................................................................... 17
2.4.1. Processo de roscamento com macho de corte ............................................... 19
2.4.2. Processo de roscamento com fresa múltipla aresta ....................................... 23
2.4.3. Processo de roscamento com fresa único corte ............................................. 29
3. Procedimentos Experimentais ..................................................................................... 31
3.1 Introdução ......................................................................................................... 31
3.2 Máquina-ferramenta ......................................................................................... 31
3.3 Ferramentas, porta-ferramentas e mandril ........................................................ 32
3.4 Material usinado ............................................................................................... 34
3.5 Avaliação do processo ...................................................................................... 37
3.6 Ensaios de Força de usinagem .......................................................................... 39
3.7 Procedimentos experimentais ........................................................................... 40
ii
3.8 Planejamento experimental............................................................................... 41
4 Resultados e Discussões ........................................................................................... 43
4.1 Vida de ferramenta ........................................................................................... 43
4.2 Vida de ferramenta x Custo-benefício .............................................................. 47
4.3 Vantagens das ferramentas quando comparado aos machos rígidos ................ 48
4.4 Desgaste e avarias de ferramentas .................................................................... 49
4.5 Esforços de corte .............................................................................................. 57
5 Conclusões e sugestões para trabalhos futuros ......................................................... 69
6 Referências Bibliográficas ........................................................................................ 70
iii
Lista de Figuras
Figura 1 – Grafita lamelar, nodular e vermicular (adaptado de COLPAERT, 2008)________ 4
Figura 2 – Concentração de magnésio nos ferros fundidos. Transição abrupta entre o cinzento
e o vermicular (DAWSON, 1999) __________________________________________ 6
Figura 3 – (a) Propagação de trincas na grafita lamelar (ferro fundido cinzento), (b)
propagação de trincas na grafita compacta (ferro fundido vermicular) (GEORGIOU,
2002 apud ANDRADE, 2005) _____________________________________________ 7
Figura 4 – Influência da forma da grafita na vida da ferramenta no torneamento com PCBN
(vc = 800 m/min) (DAWSON et al. 2001) ____________________________________ 8
Figura 5 – Redução da vida de brocas HSS com o aumento da quantidade de Fe3C na fase de
perlita (MOCELLIN et al. 2004) ___________________________________________ 9
Figura 6 – (a) Presença de MnS2 como camada protetora da ferramenta na usinagem do ferro
fundido cinzento; (b) ausência de camada de MnS na usinagem do ferro fundido
vermicular (ABELE, SAHM e SCHULZ, 2002) ______________________________ 10
Figura 7 – Inclusões de carbonitreto de titânio (GEORGIOU, 2001) __________________ 11
Figura 8 – Vida da ferramenta em função do teor de titânio no CGI (DAWSON et al. 2001) 12
Figura 9– Comparação de vida da ferramenta de MD na usinagem de ferro fundido cinzento e
vermicular com o tempo de corte (BAGETTI, 2009) __________________________ 14
Figura 10- Comportamento do desgaste da ferramenta de metal duro no vermicular
(BAGETTI, 2009) _____________________________________________________ 14
Figura 11 - Resultados de testes de fresamento em CGI (com baixa e alta proporção de
perlita) e ferro fundido cinzento (Mocellin, 2002) _____________________________ 15
Figura 12– Perfil Básico de uma rosca (OBERG, 2002) ____________________________ 16
Figura 13 – Roscas laminada e usinada (adaptado de TITEX, 1999) __________________ 18
Figura 14 – Imagem de rosca laminada / rosca usinada (AGAPIOU, 1994) _____________ 18
Figura 15 – Principais processos de usinagem de roscas internas. (adaptado de FERRARESI,
1995) ________________________________________________________________ 19
iv
Figura 16 - Detalhamento do roscamento interno com macho de corte (MOTA, 2006) ____ 20
Figura 17 - Comportamento durante o ciclo de roscamento – movimentos de rotação e
translação (adaptado de AHN et al. 2003) ___________________________________ 20
Figura 18 – Efeito dos erros de sincronização na rosca M3 (adaptado de AHN et al. 2003)_ 21
Figura 19 – Saída de rosca interna (adaptado de ABNT NBR 5870, 1988)______________ 22
Figura 20 – Ferramentas de fresamento de roscas (adaptado de Araujo et al., 2004) ______ 23
Figura 21 - Fabricação de roscas através do processo de fresamento (adaptado de SMITH,
2008). _______________________________________________________________ 24
Figura 22 – Usinagem de rosca interna e externa com fresa por interpolação (SMITH, 2008)
____________________________________________________________________ 25
Figura 23 – Seqüência esquemática de usinagem com ferramenta para furar, chanfrar e roscar
(adaptado de GRZESIK, 2008) ___________________________________________ 26
Figura 24 - Seqüência esquemática de usinagem com ferramenta para furar, chanfrar e roscar
(adaptado de GRZESIK, 2008) ___________________________________________ 27
Figura 25 – Posicionamento da ferramenta de fresar roscas (SMITH, 2008) ____________ 28
Figura 26 – Ferramenta de aresta única (RICHTER, 2003) __________________________ 29
Figura 27 – Intersecção de roscas usinadas por ferramentas de aresta única (RICHTER, 2003)
____________________________________________________________________ 30
Figura 28 - Centro de usinagem vertical Feeler FV-600 ____________________________ 32
Figura 29 – Insertos e porta-ferramenta utilizados nos experimentos (adaptado de ISCAR,
2009) ________________________________________________________________ 33
Figura 30 – Montagem das ferramentas e porta-ferramenta no mandril ________________ 34
Figura 31 - Dimensionamento dos corpos-de-prova utilizados nos ensaios _____________ 35
Figura 32 – Microestrutura do ferro fundido vermicular ____________________________ 36
Figura 33 – Rosca cortada no centro para verificar interferência do calibrador __________ 38
Figura 34 – Montagem do sistema de aquisição dos esforços de corte _________________ 39
v
Figura 35 – Sistema de fixação de corpos-de-prova nos experimentos _________________ 40
Figura 36 - Vida útil em função do tipo da ferramenta e velocidade de corte ____________ 43
Figura 37- Diagrama de pareto de influência dos fatores na vida da ferramenta __________ 44
Figura 38– Presença de partículas duras na microestrutura do ferro fundido vermicular ___ 46
Figura 39 – Superfície de folga da ferramenta múltiplas arestas com vc = 85 m/min. ______ 50
Figura 40 - Superfície de folga da ferramenta múltiplas arestas com vc = 100 m/min. _____ 53
Figura 41 – Superfície de folga da ferramenta de aresta única com vc = 85 m/min. _______ 54
Figura 42 – Superfície de saída da ferramenta de aresta única com vc = 85 m/min. _______ 55
Figura 43 - Superfície de folga da ferramenta de aresta única com vc = 100 m/min. _______ 56
Figura 44 - Superfície de saída da ferramenta de aresta única com vc = 100 m/min. ______ 56
Figura 45 – Orientação das componentes de força em relação ao corpo-de-prova ________ 58
Figura 46 – Forças medidas para ferramenta de aresta única com vc = 85 m/min _________ 59
Figura 47 – Instantes da primeira volta da ferramenta de aresta única _________________ 60
Figura 48 – Componentes da força de usinagem com ferramenta de aresta única com vc = 85
m/min (Detalhe “A” da Figura 46) _________________________________________ 61
Figura 49 – Forças medidas para ferramenta de múltiplas arestas com vc = 85 m/min _____ 63
Figura 50 – Componentes da força de usinagem com ferramenta de múltipla aresta com vc =
85 m/min (Detalhe “A” da Figura 49) ______________________________________ 64
Figura 51 – Comparação entre ferramentas na componente z com vc = 85 m/min. ________ 65
Figura 52 – Comparação de forças de corte simulado e experimentado (adaptado de ARAUJO
et al., 2005). __________________________________________________________ 66
Figura 53 – Comparativo de forças de usinagem entre ferramentas e velocidade de corte __ 67
vi
Lista de Tabelas
Tabela 1 – Propriedades mecânicas dos ferros fundidos (SINTERCAST, 2001) ...................... 5
Tabela 2 - Composição química do material utilizado nos corpos-de-prova ........................... 37
Tabela 3 – Dimensões do calibrador e da rosca (M16 x 1,5 mm – classe 6H) ........................ 37
Tabela 4 - Variáveis utilizadas no planejamento experimental ................................................ 42
vii
Lista de Equações
Equação 1 - .....................................................................................................................67
1
1. Introdução
Uma grande parcela das falhas em componentes mecânicos pode ser atribuída à fadiga
do material, o que não é causada pela insuficiente resistência mecânica, mas sim pela
iniciação de trincas devido à falta de plasticidade, particularmente em elevadas temperaturas.
No ferro fundido cinzento, normalmente o alongamento é menor do que 1 %, o que em
algumas aplicações não é suficiente. A substituição do ferro fundido cinzento por um material
de maior resistência mecânica, ductilidade e tenacidade, como o ferro fundido nodular nem
sempre é possível em função da pior fundibilidade, menor condutividade térmica e maior
módulo de elasticidade. Na maioria dos casos, o ferro fundido vermicular pode preencher o
espaço entre estes dois materiais. As propriedades mecânicas do ferro fundido vermicular são
próximas às do ferro fundido nodular enquanto as propriedades físicas (alongamento,
condutividade térmica) e propriedades em elevadas temperaturas (fadiga térmica, choques
térmicos) são próximas às do ferro fundido cinzento (STEFANESCU, 1988).
Conforme Dawson et al. (2001), o ferro fundido vermicular demonstra um aumento de
75% na resistência à tração, 40% no módulo de elasticidade e aproximadamente o dobro da
fadiga térmica quando comparado com o ferro fundido cinzento e o alumínio. Estas são
características imprescindíveis para atender à concepção dos motores de combustão de alto
desempenho. Contudo, grandes dificuldades têm sido notadas durante a usinagem de
componentes em ferro fundido vermicular. Comparando com o ferro fundido cinzento,
estudos mostraram reduções de até 50% na vida de ferramentas além de elevada dispersão nos
resultados (MOCELLIN, 2002 e REITER et al. 2006).
Em blocos, cabeçotes de motores e demais componentes, as roscas são a solução de
fixação mais utilizada (OBERG, 2002). Dentre os processos de roscamento na indústria
automobilística, a usinagem com machos rígidos é um dos mais utilizados. De acordo com
Ahn et al. (2003) e Stephenson e Agapiou (1996), a deficiência na sincronização dos
movimentos entre ferramenta e peça, é uma das principais causas para as baixas velocidades
de corte no roscamento utilizando machos. Além disso, problemas como extração de cavacos,
alto custo do processo devido às ferramentas, fixações dedicadas e risco de perda da peça
fabricada devido à quebra da ferramenta geram um alto valor agregado ao processo
(BEZERRA, 2003).
Uma opção é a usinagem de roscas por interpolação helicoidal utilizando ferramentas de
fresamento. Grzesik (2008) afirma que esta é uma alternativa para o aumento da velocidade
2
de corte no processo. Avanços tecnológicos nesta área permitem a usinagem de roscas com
tolerâncias mais estreitas, além de redução do tempo de ciclo, a redução de tempos de
retrabalho e peças sucateadas devido à quebra de machos dentro da rosca.
O objetivo deste trabalho é determinar o desempenho de ferramentas de múltiplas
arestas e aresta única na usinagem de roscas em ferro fundido vermicular como alternativa ao
processo convencional de roscamento utilizando machos rígidos. Nos processos com machos
rígidos, a velocidade de corte e o avanço dependem do tamanho da rosca a ser usinada, e
principalmente do passo. Estas são algumas das dificuldades encontradas para incrementos
nestes parâmetros de corte. Entretanto, com o processo de usinagem de roscas por
interpolação helicoidal, os parâmetros descritos são independentes do tamanho da rosca e
passo a ser usinado, gerando maior flexibilidade no processo, principalmente durante a
usinagem de roscas em matérias com maiores dificuldades de usinagem.
Como objetivos específicos, tem-se:
- determinar a influência da velocidade de corte na vida da ferramenta;
- determinar a influência do tipo da ferramenta na quantidade de roscas usinadas;
- determinar o principal mecanismo de desgaste e/ou avaria predominante no processo;
- determinar o comportamento da força de usinagem para cada tipo de ferramenta.
3
2. Revisão Bibliográfica
A revisão bibliográfica tem o objetivo de abordar os pontos relevantes da usinagem do
ferro fundido vermicular, técnicas de usinagem de roscas com fresas interpoladoras (corte
interrompido) e machos rígidos (corte contínuo), dando suporte para o entendimento dos
fenômenos que serão discutidos nos tópicos posteriores.
2.1. Ferro fundido vermicular (Compacted Graphite Iron)
O ferro fundido é uma liga ternária de ferro, carbono e silício com teor de carbono
superior a 2%, podendo ser caracterizado na forma livre de grafita ou como carboneto de ferro
(Fe3C). Elementos como manganês, fósforo, cobre, níquel, molibdênio, cromo, entre outros,
podem ser acrescentados para mudar suas propriedades (CHIAVERINI, 1986).
O ferro fundido vermicular (CGI) possui módulo de elasticidade entre 35-40%,
resistência à tração de no mínimo 75% e resistência ao desgaste maior que o ferro fundido
cinzento (GUESSER; SCHROEDER; DAWSON, 2001). Com estas propriedades, o CGI é
utilizado na fabricação de moldes de lingotes, cabeçotes e blocos de motores de combustão,
coletores e discos de freio, entre outros componentes (STEFANESCU, 1988). Estas
características importantes do ferro fundido vermicular propiciaram a otimização dos
processos de fabricação de blocos e cabeçotes de motores, como por exemplo, a redução de
espessuras, redução de fraturas frágeis, maior resistência mecânica, menor profundidade das
roscas, entre outros.
Ao se comparar o CGI com ligas de alumínio, Guesser; Schroeder; Dawson (2001)
afirmam que o CGI possui o dobro da resistência mecânica e limite de fadiga mecânica três
vezes maior que o alumínio. Essas propriedades permitem consideráveis reduções de massa
atendendo às pressões necessárias para um bom desempenho de motores diesel com injeção
eletrônica.
No entanto, o CGI mostra desvantagens para os processos de fundição e usinagem. As
propriedades anteriormente descritas promovem aumentos consideráveis no desgaste da
ferramenta em operações de usinagem. Durante operações de fresamento, caracterizadas por
corte interrompido, a vida útil da ferramenta na usinagem do CGI é aproximadamente a
metade da vida da mesma ferramenta na usinagem do ferro fundido cinzento (DAWSON,
1999). Nos processos de fundição, a aplicação do ferro fundido vermicular para altos volumes
de produção em componentes complexos requer uma estreita especificação microestrutural,
restringindo a utilização de titânio devido às dificuldades promovidas na usinagem
4
(DAWSON e SCHROEDER, 2004). Como descrito anteriormente, as propriedades
mencionadas podem variar em função da microestrutura e a melhor compreensão destes
fenômenos poderá suportar a usinagem do ferro fundido vermicular.
2.1.1. Microestrutura
Um dos fatores mais importantes na caracterização entre as propriedades do ferro
fundido é a diferença na morfologia da grafita (WARRICK et al., 1999). Com o objetivo de
facilitar a visualização desta diferença, a Figura 1 mostra imagens utilizando técnicas de
reconstrução tridimensional da grafita com imagens obtidas através de Microscopia Eletrônica
de Varredura (MEV).
Figura 1 – Grafita lamelar, nodular e vermicular (adaptado de COLPAERT, 2008)
Conforme a Figura 1, no ferro fundido cinzento, a grafita está presente na forma
lamelar, distribuídas aleatoriamente. As lamelas de grafita funcionam como entalhes internos
e resultam em um material com praticamente nenhum alongamento e resistência à tração
muito baixa. No entanto, benefícios como excelente capacidade de amortecimento e boa
usinabilidade são notados. No ferro fundido nodular (ou dúctil), a grafita apresenta-se sob a
forma esférica ou conhecida como nódulos (WARRICK et al., 1999). Já no ferro fundido
5
vermicular, a grafita de forma alongada e extremidades arredondadas, o que segundo Colpaert
(2008) e Guesser; Duran; Krause (2004), inibe a iniciação e crescimento das trincas,
aumentando significativamente a resistência à tração, ductilidade, resistência mecânica e
rigidez do ferro fundido vermicular quando comparado ao ferro fundido cinzento. Contudo,
quando comparado ao ferro fundido nodular, o CGI ainda apresenta valores inferiores nas
mesmas propriedades.
A Tabela 1 compara as principais propriedades mecânicas dos ferros fundidos cinzento
vermicular e nodular.
Tabela 1 – Propriedades mecânicas dos ferros fundidos (SINTERCAST, 2001)
Nota-se que das propriedades mostradas na Tabela 1, apenas a condutividade térmica do
ferro fundido vermicular se aproxima dos níveis do ferro fundido cinzento. As demais
propriedades são próximas as do ferro fundido nodular. Conforme afirma Colpaert (2008),
isto promove na liga, ductilidade, resistência mecânica e resistência à tração para suportar o
regime de trabalho submetido.
A microestrutura do CGI, conforme Dawson e Schroeder (2004), pode ser especificada
com elevada variação nas propriedades. Na fabricação de cabeçotes e blocos de motores
normalmente utiliza-se matriz perlítica ou uma matriz intermediária ferrítica-perlítica, dentro
do intervalo de 60-80% de perlita com o objetivo de aumentar a rigidez dos blocos e
cabeçotes e conseqüentemente obter a redução de massa.
2.1.2. Método de fabricação do CGI
A fabricação do ferro fundido vermicular classifica-se como um processo intermediário
quando comparado aos processos de obtenção do ferro fundido cinzento e o nodular. Para sua
fabricação são utilizados basicamente dois métodos. O primeiro é caracterizado pela adição de
6
elementos nodularizantes como o magnésio na liga de ferro fundido, em concentrações entre
0,010% a 0,012%, que são insuficientes para formar ferro fundido nodular. O segundo método
utiliza elementos nodularizantes suficientes para formar ferro nodular e, ao mesmo tempo,
elementos anti-nodularizantes, como o titânio, respeitando a faixa entre 0,1 e 0,2%.
O primeiro método exige um rigoroso controle da solidificação da liga na qual o
magnésio é adicionado em uma quantidade insuficiente para formar a grafita nodular. Este
processo exige grande habilidade para medir o comportamento do metal líquido após a adição
do magnésio, com interferência no processo anterior ao vazamento. Como este método não
utiliza titânio, as dificuldades notadas durante a usinagem das peças são menores se
comparado ao segundo método, descrito a seguir (GUESSER; SCHROEDER; DAWSON,
2001).
No segundo método, o magnésio impede o crescimento da grafita lamelar e o titânio
suprime a formação de grafita nodular. Desvantagens resultantes da adição destes elementos
resultam na precipitação de carboneto de titânio e inclusões de carbonitretos extremamente
duros, o que dificulta a usinabilidade do material (GUESSER; SCHROEDER; DAWSON,
2001). Outro problema a ser considerado refere-se à estreita faixa de magnésio a ser
adicionado na liga com o objetivo de formar a grafita compacta. Embora a quantidade de
magnésio seja diferente para cada tipo de ferro fundido, conforme mostrado na Figura 2,
variações elevadas nos índices de oxigênio e ou enxofre consumirão o magnésio ativo.
Figura 2 – Concentração de magnésio nos ferros fundidos. Transição abrupta entre o
cinzento e o vermicular (DAWSON, 1999)
7
Além disso, outros fatores como a forma da grafita e da perlita interferem na
usinabilidade do CGI. A principal conseqüência é a redução de vida da ferramenta que está
associada a dois fatores básicos: aumento da resistência mecânica e ausência de sulfeto de
manganês em sua microestrutura, o qual atua como lubrificante sólido na usinagem.
2.1.3. Influência da forma da grafita na usinagem
Para os ferros fundidos, características como a forma da grafita, tamanho e quantidade,
normalmente são mais importantes para a usinagem do que a composição química. Enquanto
as grafitas lamelares, presentes no ferro fundido cinzento, promovem o início das fraturas e
sua propagação, tornando-o frágil, a morfologia da grafita no ferro fundido vermicular
impossibilita a clivagem e a propagação de trincas, contribuindo para alterações na forma de
ruptura dos cavacos (GUESSER; DURAN; KRAUSE, 2004).
No ferro fundido vermicular, a forma da grafita promove uma melhor integração com a
matriz metálica e dificulta a propagação de trincas. A Figura 3 mostra esta condição, na qual a
estrutura do vermicular não é propícia a propagação de trincas como no caso da estrutura do
ferro fundido cinzento. Isto promove uma mudança das características de frágil para dúctil
(GEORGIOU, 2002 apud ANDRADE, 2005).
Figura 3 – (a) Propagação de trincas na grafita lamelar (ferro fundido cinzento), (b)
propagação de trincas na grafita compacta (ferro fundido vermicular) (GEORGIOU,
2002 apud ANDRADE, 2005)
No processo de torneamento utilizando ferramentas com insertos de PCBN, Dawson et
al. (2001) mostram a redução de vida útil da ferramenta com o aumento da quantidade de
grafita vermicular. A Figura 4 mostra a influência da forma da grafita na vida das ferramentas
de corte, comparando grafita vermicular (CGI), lamelar (GG25) e nodular (85% GGG).
8
Figura 4 – Influência da forma da grafita na vida da ferramenta no torneamento com
PCBN (vc = 800 m/min) (DAWSON et al. 2001)
2.1.4. Influência da matriz
A quantidade de perlita na matriz do ferro fundido influencia diretamente a
usinabilidade do material. Dawson et al. (2001) estudaram os processos de corte contínuo
(torneamento) e corte interrompido (fresamento) com variações de 50 a 95% de perlita na
matriz do ferro fundido vermicular. Os resultados mostraram que a vida útil da ferramenta no
fresamento é maior com o aumento do conteúdo de perlita. Uma das hipóteses é baseada nos
elementos perlitizantes, os quais propiciam boa deformação, fácil clivagem e formação de
cavacos em cortes interrompidos. Contudo no torneamento, a vida útil da ferramenta foi
menor com o aumento do conteúdo de perlita, mostrando que elementos perlitizantes de alta
liga são muito duros e abrasivos para operações de corte contínuo, o que mudou as
propriedades do processo de usinagem.
Outro elemento importante trata-se da quantidade de cementita presente na perlita que
pode ser controlada pelo tempo de desmoldagem e de resfriamento do material. Mocellin
(2002) estudou a influencia das variações destes elementos na usinagem do ferro fundido
vermicular com ensaios de furação. Diferentes tempos de desmoldagem, de 20 a 120 minutos,
foram testados e determinou-se que para tempos de desmoldagem maiores, a usinabilidade do
ferro fundido vermicular era melhor do que para materiais com tempos de desmoldagem
menores. Isto ocorreu devido à formação de perlita com lamelas de Fe3C mais estreitas, isto é,
menor quantidade de cementita na perlita em tempos de desmoldagem maiores. A cementita
(ou Fe3C) é definida como um constituinte duro e de baixa usinabilidade. A Figura 5 relaciona
9
a variação do teor de cementita com a vida da ferramenta no processo de furação em ferro
fundido cinzento.
Figura 5 – Redução da vida de brocas HSS com o aumento da quantidade de Fe3C na
fase de perlita (MOCELLIN et al. 2004)
Conforme a Figura 5, nota-se que o teor da cementita na perlita tem grande influência
como mostrado anteriormente. A redução da vida de ferramenta nos ensaios realizados por
Mocellin et al. (2004) mostram que, além disso, a variação da velocidade de corte possui
pouca influência na vida da ferramenta.
2.1.5. Efeito das inclusões na usinagem
Dawson et al. (2001) identificaram como principais variáveis na usinabilidade do ferro
fundido vermicular as características morfológicas da grafita e os efeitos de elementos
químicos como Si, S, Ti, Cr na forma de inclusões. Alguns desses elementos são
imprescindíveis na produção do ferro fundido vermicular, conforme descrito a seguir.
2.1.5.1. Enxofre (S)
Conforme Abele, Sahm e Schulz (2002), a principal diferença entre o ferro fundido
vermicular e o cinzento, além da forma da grafita, está o teor de enxofre que fica entre 0,08 a
0,12% em massa no ferro fundido cinzento. Contudo, as partículas de grafita compacta
somente atingem estabilidade com teores de oxigênio e enxofre da ordem de 0,005 a 0,025%.
No ferro fundido cinzento, o enxofre reage com o manganês formando inclusões de sulfeto de
manganês (MnS), as quais, normalmente são inferiores a 10 µm. Estas inclusões são macias e
flexíveis, podendo lubrificar a aresta de corte da ferramenta através da formação de uma
10
camada protetora. A Figura 6(a) mostra a camada de MnS formada em um inserto de CBN
quando usinado o ferro fundido cinzento em operações de torneamento, enquanto a Figura
6(b) mostra a mesma ferramenta porém, na usinagem do ferro fundido vermicular.
Figura 6 – (a) Presença de MnS2 como camada protetora da ferramenta na usinagem do
ferro fundido cinzento; (b) ausência de camada de MnS na usinagem do ferro fundido
vermicular (ABELE, SAHM e SCHULZ, 2002)
No entanto, no ferro fundido vermicular a situação é diferente, pois além de possuir
apenas 10% do teor de enxofre do cinzento, o magnésio é utilizado na formação das grafitas
compactas, possuindo maior afinidade química com o enxofre (ABELE, SAHM e SCHULZ,
2002). Isto impossibilita a formação da camada protetora na superfície da ferramenta, o que
acelera o desgaste ou até mesmo a quebra da ferramenta de corte, como pode ser notado na
Figura 6(b). Com isto, mostra-se que a camada de MnS é um dos fatores responsáveis pela
diferença no desempenho das ferramentas de corte durante a usinagem dos materiais citados.
Mocellin et al. (2004) estudaram a influência do sulfeto de manganês na usinabilidade do
ferro fundido maleável em operações de corte contínuo e demonstrou-se que as forças de
corte diminuem em até 30% para velocidades de corte entre 140 e 250 m/min com o aumento
da percentagem de MnS.
2.1.5.2. Silício (Si)
Conforme Dawson et al. (2001), o silício é um elemento que auxilia na formação de
ferrita. Além disso, o silício pode facilitar a usinabilidade do material quando apresenta
concentração de até 3% na estrutura. Contudo, percentuais acima deste valor tendem a
endurecer a ferrita por solução sólida, o que provoca redução de vida útil das ferramentas. A
concentração de silício no CGI fica entre 2,0 a 2,4%. Durante o torneamento de barras de CGI
com teor de 3% de silício, Dawson et al. (2001) verificaram que a vida da ferramenta
mostrou-se maior quando comparada às vidas obtidas no torneamento de barras contendo 4%
de silício.
11
2.1.5.3. Titânio (Ti)
Como descrito anteriormente, um dos métodos de obtenção do ferro fundido vermicular
utiliza o titânio como elemento anti-nodularizante, o qual impede a formação da grafita
nodular. Neste processo, o teor de titânio presente varia entre 0,10 a 0,20%. Concentrações de
titânio em torno de 0,10% promovem reações com outros elementos como o carbono e o
nitrogênio do ferro líquido, podendo formar inclusões de carboneto e nitreto de titânio
(Dawson et al. 2001).
A Figura 7 mostra inclusões de carbonetos de titânio, os quais podem formar grandes
aglomerados de forma cúbica, aumentando significativamente a dificuldade de usinagem em
função do desgaste da ferramenta por abrasão (DAWSON e SCHROEDER, 2004).
Figura 7 – Inclusões de carbonitreto de titânio (GEORGIOU, 2001)
Conforme afirmam Dawson et al. (2001), cada adição de 0,10% de titânio promove a
formação de mais de 1000 inclusões de carbonetos e nitretos em uma área usinada de 1 mm2.
O efeito do titânio na usinabilidade foi estudado por Dawson et al. (2001) em ensaios de
torneamento no ferro fundido vermicular com velocidades de corte de 150 e 250 m/min.
Como os resultados de vida de ferramenta com o aumento da % de titânio são descritos na
Figura 8.
12
Figura 8 – Vida da ferramenta em função do teor de titânio no CGI (DAWSON et al.
2001)
Nota-se na Figura 8 que para ambas as velocidades de corte utilizadas na pesquisa,
percentuais de titânio acima de 0,05% fazem com que a vida útil da ferramenta utilizada
decresça de forma repentina.
Segundo Dawson et al. (2001), é comum encontrar inclusões não-metálicas em todos os
metais fundidos, podendo atingir tamanhos entre 0,1 a 10 µm, na forma de nitretos e ou
carbonetos de titânio. Quantidades de titânio como a citada podem ser toleradas em
componentes com poucas operações de usinagem, como é o caso de coletores de exaustão.
Todavia controles mais eficientes mostram melhores resultados onde há grande quantidade de
operações de usinagem, como é o caso de blocos de motores. Um melhor controle do nível de
titânio adicionado na matriz, neste caso, é de extrema importância para os processos de
usinagem destas entidades. Ainda assim, a presença destes carbonetos e nitretos de titânio
dificultam a usinagem do material. Uma análise da Figura 8 mostra que com o aumento na
porcentagem de Titânio de 0,1 a 0,2 %, percebe-se uma redução da vida da ferramenta em
mais de 50 %.
2.1.5.4. Cromo (Cr)
O elemento cromo (Cr) é adicionado no ferro fundido vermicular através de sucata de
aço ou como liga, para obtenção de maior resistência em altas temperaturas. O cromo possui
fácil segregação a formação de carbonetos, principalmente nas últimas regiões em
13
solidificação. Além disso, é um potente perlitizante, se comparado ao manganês, pois o
aumento do seu teor facilita a formação da perlita fina, a qual se mostra de difícil
usinabilidade. A redução de 0,18 para 0,10% do teor de cromo no ferro fundido vermicular
propicia aumento de aproximadamente 40% da vida da ferramenta (DAWSON et al. 2001).
2.2. Usinabilidade do ferro fundido vermicular
De acordo com Machado e Silva (2004) e Trent e Wright (2000), dentre os muitos
conceitos de usinabilidade, esta pode ser considerada como a maneira que o material se
comporta durante a usinagem. Portanto, a usinabilidade trata-se de uma grandeza que indica o
nível de dificuldade durante a usinagem de determinado material. Forças de usinagem, vida de
ferramenta, taxa de desgaste entre outras variáveis que podem ser consideradas como
usinabilidade.
Segundo Abele, Sahm e Schulz (2002), o CGI é 33% mais abrasivo e 15% mais adesivo
que o ferro fundido cinzento. Entretanto os resultados deste trabalho foram realizados
utilizando o ensaio pino sobre disco, e assim, sua correlação com a usinagem não é direta,
contudo é um indicador da maior dificuldade de usinagem do ferro fundido vermicular.
Dawson e Schroeder (2004) afirmam que com resistência à tração de 75% maior e rigidez de
aproximadamente 45% superior ao ferro fundido cinzento, torna-se evidente que o ferro
fundido vermicular é mais difícil para usinar.
Bagetti (2009) estudou o comportamento de ferramentas de metal duro e de cerâmica no
fresamento de ferro fundido cinzento e vermicular. A Figura 9 mostra os valores que
representam a média de duas repetições para cada material usinado. O critério de fim de vida
dos insertos utilizado foi VBMáx = 0,3 mm.
14
Figura 9– Comparação de vida da ferramenta de MD na usinagem de ferro fundido
cinzento e vermicular com o tempo de corte (BAGETTI, 2009)
Conforme descrito na Figura 9, durante a usinagem do ferro fundido vermicular, a vida
da ferramenta foi de 1,6 vezes menor que na usinagem do ferro fundido cinzento. Isto mostra
a menor usinabilidade do ferro fundido. Além disso, como pode ser verificado na Figura 10
nota-se grande dispersão entre os valores de vida de ferramenta obtidos nas repetições para o
ferro fundido vermicular. O corpo-de-prova 1 é representado pela curva (ensaio 1) e o corpo-
de-prova 2 pela curva (ensaio 2).
Figura 10- Comportamento do desgaste da ferramenta de metal duro no vermicular
(BAGETTI, 2009)
Conforme a Figura 10, os resultados de vida de ferramenta são de 43,2 min e 71 min,
para os ensaios 1 e 2, ou seja, uma diferença de 64%. Bagetti (2009) atribui esta diferença de
a presença de carbonetos de silício (SiC) proveniente da areia de fundição e outros carbonetos
e nitretos duros, como o de titânio presentes no corpo-de-prova.
Mocellin (2002) também estudou operações de fresamento em ferro fundido cinzento e
vermicular com baixa e alta proporção de perlita. Ferramentas de CBN, cerâmica e metal duro
15
apresentaram vida útil em torno de 50% menor que as ferramentas que usinaram o ferro
fundido cinzento.
Figura 11 - Resultados de testes de fresamento em CGI (com baixa e alta proporção de
perlita) e ferro fundido cinzento (Mocellin, 2002)
Conforme a Figura 11, notou-se que com o aumento na quantidade de perlita no ferro
fundido vermicular, os valores de vida da ferramenta também cresceram proporcionalmente.
2.3. Roscas
As roscas são superfícies compostas, gerada por um ou mais perfis e quando todos os
seus pontos descrevem hélices com passo constante ou variável (NBR 5876, 1988). Conforme
a ABNT CB 206 (1991), as roscas são classificadas como roscas para fixação e roscas para
transmissão de movimentos. Roscas de fixação têm o objetivo de prender dois ou mais
elementos entre si. Este grupo de roscas é utilizado, como por exemplo, em porcas, parafusos
e hastes roscadas. Do outro lado, as roscas de transmissão de movimentos são utilizadas com
o objetivo de transmitir potência e movimentos, transformando-os de giratórios para lineares.
Exemplos destas aplicações são, por exemplo, fusos de tornos, fusos de esferas, roscas sem
fim (STEMMER, 1995).
Existem diferentes tipos de perfis de dentes nas roscas, entre elas: métrica normal,
métrica cônica, whitworth, gás, trapezoidal, dente de serra, edson, etc. Entre as roscas mais
utilizadas em elementos de fixação, pode-se citar a rosca de secção triangular métrica (60º) ou
whitworth (55º) em função do maior atrito promovido no contato do conjunto (NIEMANN,
16
2002 e OBERG, 2002). Além dos diferentes tipos de perfis de dentes, as roscas em furos são
designadas como roscas internas, e quando são construídas em eixos, são descritas como
roscas externas. Outra variável na construção das roscas é o seu sentido. Dependendo da
aplicação, uma rosca poderá ter sentido direito ou esquerdo dos filetes. Em elementos de
fixação, geralmente utiliza-se roscas de sentido direito. Entretanto, as roscas de sentido
esquerdo são utilizadas em peças que giram, pois neste caso não há possibilidade de soltura
dos elementos de fixação (NBR 5876, 1988).
O objetivo deste item é discorrer sobre as características geométricas das roscas internas
triangulares métricas, utilizadas principalmente na indústria automobilística,e detalhar os
diferentes processos de manufatura destas roscas, que é o foco desta pesquisa.
A Figura 12 mostra as principais dimensões do perfil básico de uma rosca. Dentre elas,
destaca-se a altura da rosca (ha), altura da rosca básica (ht), o diâmetro maior da rosca (Dm), o
diâmetro menor da rosca (Du), o passo (P) e o diâmetro efetivo (Dp).
Figura 12– Perfil Básico de uma rosca (OBERG, 2002)
Caso estas dimensões encontrarem-se fora do especificado, o ajuste de fixação ou a
transmissão de movimentos entre rosca interna e externa estará comprometido (AGAPIOU,
1994). Além disso, as roscas ainda possuem um sistema de tolerâncias, baseado nos padrões
ISO. Com isto, são determinados os limites dimensionais e o ajuste requerido durante a
montagem das roscas de acordo com a aplicação (OBERG, 2002).
17
2.4. Processos de manufatura de roscas
A operação de roscamento é definida como o processo destinado á geração de filetes,
por meio da abertura de sulcos helicoidais de passo constante, em superfícies cilíndricas,
cônicas de revolução e ou prismáticas (FERRARESI, 1995).
As roscas podem ser fabricadas em uma grande variedade de processos, dentre eles,
usinagem, conformação, fundição e injeção. Segundo Stemmer (1995), os principais
processos de manufatura de roscas internas na indústria automobilística são: a usinagem e a
conformação. A escolha do melhor processo, conforme Stephenson e Agapiou (1996), está
diretamente relacionada com o grau de precisão dimensional especificado, tipo de material a
ser roscado, aplicação da rosca (fixação ou transmissão de movimentos), geometria da peça,
entre outros fatores. Além disso, dentre estes processos, uma série de alternativas possibilita a
manufatura das roscas:
• Torneamento e/ou fresamento com ferramenta simples ou múltipla;
• Usinagem com ferramentas rígidas (machos e/ou cossinetes);
• Usinagem com cabeçotes automáticos, pentes radiais, tangenciais ou circulares;
• Ferramentas laminadoras.
Nos processos de manufatura de roscas internas, segundo Stephenson e Agapiou (1996),
a fabricação pode ser realizada por diferentes ferramentas. Entretanto, todas as opções
necessitam de uma operação prévia de furação. A ferramenta pode cortar ou deformar
plasticamente o material do furo, formando os filetes da rosca. A alternativa de laminar a
rosca em furos é aplicada em materiais dúcteis, como aços de fácil usinagem, aços de baixa
liga, ligas de alumínio, etc. Para materiais frágeis, como é o caso do ferro fundido, a opção da
laminação não é aplicada e, nestes casos, utilizam-se as opções de usinagem com machos
rígidos, fresas ou pentes radiais. A Figura 13 mostra características geométricas das roscas
laminadas e roscas usinadas.
18
Figura 13 – Roscas laminada e usinada (adaptado de TITEX, 1999)
Conforme ilustrado na Figura 13, a principal diferença entre a rosca laminada e usinada
é a alta resistência mecânica nos filetes conformados pelo processo de laminação, o que é
mostrado na orientação das fibras do material. A não geração de cavacos e a alta durabilidade
da ferramenta também são vantagens do processo de laminação a serem consideradas.
Agapiou (1994) comparou os dois processos de fabricação em liga de alumínio, conforme
mostrado na Figura 14.
Figura 14 – Imagem de rosca laminada / rosca usinada (AGAPIOU, 1994)
Um dos problemas do processo de laminação refere-se ao controle do diâmetro do pré-
furo. Variações nesta dimensão poderão gerar a incorreta formação dos filetes, o que
comprometerá a resistência mecânica da rosca. Contudo, no processo de roscamento com
macho rígido, a situação não é diferente. Conforme Müller e Soto (1999), um controle não
efetivo no diâmetro do pré-furo pode além de acelerar desgaste da aresta de corte da
ferramenta, causar a quebra e a má formação dos filetes. Este fato promove roscas com
dimensões fora do especificado e, por conseqüência, o comprometimento da resistência
mecânica do conjunto de fixação.
A Figura 15 mostra os principais processos de usinagem de roscas.
19
Figura 15 – Principais processos de usinagem de roscas internas. (adaptado de
FERRARESI, 1995)
Quanto aos processos de fabricação de roscas internas por usinagem, Stephenson e
Agapiou (1996) e Koelsch (2002) afirmam que os processos mais conhecidos utilizam
ferramentas de aresta única de corte, múltipla aresta, fresas integrais e machos rígidos. Além
do material da peca, outros aspectos devem ser considerados, como por exemplo, a tolerância
dimensional da rosca, a geometria da peça e, principalmente, o diâmetro da rosca. Coelho et
al. (2006) afirmam que para diâmetros de roscas menores que 15 mm, o processo utilizando
machos de corte é amplamente utilizado. No entanto, Stephenson e Agapiou (1996)
descrevem que o roscamento com machos de corte é utilizado para diâmetros menores que 40
mm. Já a usinagem de roscas com fresas, ferramentas de aresta única ou múltipla aresta
através de processos de interpolação helicoidal são principalmente utilizados para grandes
bitolas de roscas, na sua maioria para diâmetros maiores que 30 mm.
2.4.1. Processo de roscamento com macho de corte
Conforme Koelsch (2002) e Müller e Soto (1999), o processo de roscamento utilizando
machos de corte é um dos mais utilizados para a fabricação de roscas internas na indústria. O
roscamento interno com machos de corte é classificado como um processo de corte contínuo,
e além disso, geralmente está entre as últimas operações do produto manufaturado, o que
resulta em uma operação no componente com alto valor agregado.
Bezerra (2003), Mota (2007) e Reis et al. (2005) afirmam que este é um processo de alto
grau de complexidade devido à necessidade de sincronismo entre os movimentos de rotação e
avanço na ferramenta. Os principais movimentos que definem o processo de roscamento com
machos são divididos em dois estágios distintos: o corte e o retorno. A Figura 16 representa os
movimentos de rotação e avanço com a utilização de um macho rígido.
20
Figura 16 - Detalhamento do roscamento interno com macho de corte (MOTA, 2006)
Giessler (1999) e Ahn et al. (2003) descrevem que a principal diferença entre o processo
de roscamento e os outros processos de usinagem relaciona-se com a rotação do macho que
depende da velocidade de corte utilizada e da velocidade de avanço que é fixado pelo passo
da rosca. Assim, estes movimentos devem ser sincronizados durante toda a operação (corte e
retorno).
Com o objetivo de ilustrar o ciclo de roscamento, a Figura 17 mostra o comportamento
da velocidade no processo durante os movimentos de rotação e de avanço.
Figura 17 - Comportamento durante o ciclo de roscamento – movimentos de rotação e
translação (adaptado de AHN et al. 2003)
Conforme mostrado na Figura 17, notam-se etapas distintas durante a usinagem de uma
rosca. Ahn et al. (2003) e Reis et al. (2005) dividem estas etapas em sete fases, sendo: (t1-t2)
21
aceleração, (t2-t3) velocidade constante, (t3-t4) desaceleração, (t4-t5) parada para retorno, (t5-
t6) aceleração durante o retorno, (t6-t7) velocidade constante, (t7-t8) desaceleração.
Um dos principais desafios ao aumento da velocidade de corte no processo de
fabricação de roscas com machos, segundo Giessler (1999), é a limitação no sincronismo
entre os movimentos de rotação e de avanço durante todas as etapas mostradas, o que poderá
danificar a entidade produzida e, em caso extremo, ocorrer a quebra do macho de corte.
Normalmente, em roscas não passantes e com pouco comprimento roscado (por exemplo,
uma vez o diâmetro) observa-se que a aceleração e desaceleração do fuso durante o momento
de início de corte e reversão da ferramenta fazem com que os instantes de velocidade de corte
constante sejam mínimos, o que sugere que a velocidade de corte programada não é atingida.
Ahn et al. (2003) estudaram o roscamento com altas velocidades utilizando machos M3
em liga Al 7075. As velocidades de corte aplicadas foram de 19, 75 e 94 m/min, e
conseqüentemente, a rotação do eixo árvore variou entre 2000, 8000 e 10000 rpm. A pesquisa
demonstra que quanto maior a velocidade de corte programada torna-se maiores os erros de
sincronização entre os movimentos de rotação e avanço, inclusive podendo levar a quebra da
ferramenta. A Figura 18 mostra a formação dos filetes das roscas com as diferentes
velocidades de corte utilizadas.
Figura 18 – Efeito dos erros de sincronização na rosca M3 (adaptado de AHN et al.
2003)
Nota-se que os erros de sincronização são proporcionais ao aumento da velocidade de
corte. Entretanto, há outros fatores a serem considerados, os quais promovem dificuldades
adicionais. Linss (2002) e Giessler (1999) afimam que o desalinhamento entre ferramenta e o
furo, além da escolha incorreta da ferramenta são fatores que dificultam a execução do
processo. Segundo Reiter et al. (2006), outra grande dificuldade está relacionada com roscas
22
em furos não passantes, nos quais dependendo da geometria da peça, a profundidade do furo
tende a ser a menor possível. A norma ABNT NRB 5870 (1988) padroniza a profundidade do
“bolsão” ou saída da rosca, distância entre a rosca e o comprimento final do furo, conforme
ilustrado na Figura 19.
Figura 19 – Saída de rosca interna (adaptado de ABNT NBR 5870, 1988)
A dimensão mostrada na Figura 19 como “L3” trata-se da soma entre a profundidade de
rosca útil, representada por “L1” e a saída da rosca (bolsão) representada por “L2” a qual é
tabelada. Para a saída da rosca, são observados três tipos de saída, sendo normal, curta e
longa. Por exemplo, para uma rosca M16 x 2 mm com profundidade L1 de 32 mm (duas
vezes o diâmetro), a saída L2 deverá ser de 9,3 mm para a condição normal e 14,8 mm para a
condição longa.
As principais pesquisas sobre o comportamento do processo de roscamento com machos
rígidos são em ferro fundido cinzento. Vale ressaltar que o referido material apresenta
maiores índices de usinabilidade quando comparado ao ferro fundido vermicular. Exemplos
podem ser citados como Bezerra (2003) que utilizou velocidades de corte de 30 e 60 m/min
em machos (M8 x 1,25 mm) de aço-rápido na usinagem de roscas passantes em ferro fundido
cinzento. A pesquisa mostrou que os fatores de maior influência na vida útil das ferramentas
foram a velocidade de corte e o tipo de revestimento das ferramentas.
Mota (2007) estudou a influência da velocidade de corte (10, 37,5 e 75 m/min) com
machos de aço rápido em ferro fundido cinzento. Os resultados demonstraram que a redução
23
de vida útil das ferramentas teve com principal causa o aumento da velocidade de corte no
processo de roscamento. Além disso, com o objetivo de alcançar a velocidade de corte
programada e minimizar as limitações de sincronismo, Mota (2007) sugere que seja previsto
um espaço necessário para aceleração da ferramenta antes de entrar no furo. Outra conclusão
importante é que para furos não passantes, e principalmente com comprimentos curtos, as
velocidades máximas de corte e de avanço não são atingidas.
2.4.2. Processo de roscamento com fresa múltipla aresta
Conforme exposto anteriormente, normalmente as roscas acima de 15 mm podem ser
fabricadas utilizando o processo de fresamento, através de ciclos de interpolação helicoidal.
Conforme Stephenson e Agapiou (1996), as roscas usinadas através deste processo poderão
ser fabricadas com ferramentas de aresta única, de múltipla aresta com único corte ou ainda
com múltipla aresta de vários cortes. A Figura 20 ilustra cada uma delas com o objetivo de
mostrar a forma das ferramentas.
Figura 20 – Ferramentas de fresamento de roscas (adaptado de Araujo et al., 2004)
Grzesik (2008) afirma que a fabricação de roscas por interpolação helicoidal utilizando
o processo de fresamento é uma alternativa para o aumento da velocidade de corte no
processo. Avanços tecnológicos nesta área permitem a usinagem de roscas com tolerâncias
mais estreitas. Algumas das vantagens deste método são a redução do tempo de ciclo, a
redução de retrabalho e peças sucateadas devido à quebra de machos dentro da rosca.
Com o objetivo de entender as etapas compreendidas no processo, a Figura 21
esquematiza os passos da usinagem de roscas com ferramenta de múltipla aresta.
24
Figura 21 - Fabricação de roscas através do processo de fresamento (adaptado de
SMITH, 2008).
Conforme mostrado na Figura 21, as etapas do processo de roscamento utilizando
ferramentas de múltipla aresta são:
(1) movimento da ferramenta da posição inicial para o centro do furo;
(2) introdução da ferramenta no furo e início da aproximação da ferramenta no diâmetro
final da rosca em 180º (interpolação helicoidal cônica);
(3) usinagem da rosca utilizando movimento circular da ferramenta sincronizado com
movimento axial (interpolação helicoidal cilíndrica);
(4) retorno da ferramenta ao centro do furo em 180º (interpolação helicoidal cônica);
(5) retorno axial da ferramenta para a posição inicial.
O processo de roscamento com fresas, conforme Stephenson e Agapiou (1996),
caracteriza-se por gerar cavacos de tamanho reduzido quando comparado com o processo de
roscamento utilizando machos de corte. Ainda, comparando com os processos de roscamento
com machos, outras diferenças podem ser notadas, como por exemplo, a redução de potência
consumida, flexibilidade de utilização da mesma ferramenta em roscas que tenham o mesmo
passo. Como pode ser visto na Figura 22, as fresas permitem com a mesma ferramenta usinar
roscas esquerdas e direitas e também internas e externas (SMITH, 2008).
25
Figura 22 – Usinagem de rosca interna e externa com fresa por interpolação (SMITH,
2008)
Segundo Smith (2008), a principal diferença entre os processos de roscamento
utilizando machos rígidos e o fresamento de roscas é que a velocidade de avanço por dente da
ferramenta não depende do passo da rosca. Como descrito anteriormente, esta é uma das
limitações dos processos de roscamento com machos.
Grzesik (2008) descreve desenvolvimentos em ferramentas combinadas para furar,
chanfrar e roscar. Estas ferramentas podem ser fabricadas em PCD, metal duro e outros
materiais. Elas são indicadas para a usinagem de aços, ferro fundido, aços endurecidos e ligas
como alumínio e cobre, além de magnésio e materiais compósitos. Também existem algumas
variações do conceito de ferramenta mostrado na Figura 21, entre elas a ferramenta mostrada
de forma esquemática na Figura 23.
26
Figura 23 – Seqüência esquemática de usinagem com ferramenta para furar, chanfrar e
roscar (adaptado de GRZESIK, 2008)
Conforme mostrado na Figura 23, as etapas do processo são:
(1) movimento da ferramenta da posição inicial para o centro da rosca a ser usinada;
(2) usinagem do chanfro por interpolação circular;
(3) usinagem do furo e rosca ao mesmo tempo por interpolação helicoidal cilíndrica;
(4) posicionamento no centro da rosca e retorno a superfície da peça;
(5) rebarbação do chanfro.
Stephenson e Agapiou (1996) e Grzesik (2008) estudaram ferramentas de furar e roscar
combinadas. O furo do processo demonstrado na Figura 23 é obtido juntamente com a rosca
através de interpolação helicoidal cilíndrica. A outra variação, conforme a Figura 24, é a
ferramenta que fura e chanfra como uma broca e escareador convencionais. Posteriormente a
ferramenta é deslocada no eixo radial e inicia-se a interpolação helicoidal cônica ou somente
entrada linear, seguido da interpolação helicoidal cilíndrica formando os filetes. Entretanto,
uma fresa de furar, chanfrar e roscar conseqüentemente é menos rígida do que uma fresa de
interpolar roscas comum devido à grande profundidade dos canais para extrair os cavacos. O
diâmetro da ferramenta em relação ao tamanho do furo torna-se crítico, especialmente para
furos de diâmetros pequenos e grandes comprimentos.
27
Figura 24 - Seqüência esquemática de usinagem com ferramenta para furar, chanfrar e
roscar (adaptado de GRZESIK, 2008)
A principal diferença dos processos anteriores mostrados nas Figura 21 e Figura 23
ocorre nos passos (1), (2) e (3). Diante destas vantagens, Smith (2008) também descreve
alguns desafios dos processos já mostrados. Como o fresamento de roscas trata-se de um
processo de usinagem pouco utilizado, se comparado com o roscamento com machos rígidos,
pontos importantes como a escolha da máquina, estratégia de programação, principalmente
para a entrada da ferramenta na peça e comprimento roscado devem ser analisados. O
posicionamento radial da ferramenta de fresar roscas, ou o início de corte da rosca, pode ser
feito através de três formas básicas dentro do furo. Algumas máquinas CNC possuem ciclos
específicos para esta operação, ao passo que, máquinas com comandos mais simples não
detém estes recursos, exigindo diferentes estratégias de programação. Com objetivo de
facilitar o entendimento, a Figura 25 mostra as três formas mais utilizadas de posicionamento
no furo.
28
Figura 25 – Posicionamento da ferramenta de fresar roscas (SMITH, 2008)
Conforme a Figura 25 (a), uma das formas de entrada da ferramenta dentro do furo da
peça é a entrada linear. Segundo Smith (2008), esta etapa do processo é caracterizada por
gerar grande ângulo de contato entre o material e o diâmetro periférico da ferramenta de corte,
promovendo uma situação indesejável de alto carregamento na ferramenta, o que dependendo
do material, pode gerar cavacos longos. Ainda, a entrada linear não é aconselhável para roscas
de precisão por deixar marcas no ponto de entrada da ferramenta.
A segunda estratégia é a entrada circular com 1/4 de círculo, conforme a Figura 25 (b).
Esta estratégia é normalmente utilizada para grandes diferenças entre o diâmetro do pré-furo e
o diâmetro da ferramenta utilizada. A vantagem deste sistema é a menor trajetória da
ferramenta, contudo o carregamento na ferramenta ainda é considerado relativamente alto.
A terceira opção é a entrada com semi-círculo, conforme demonstrado na Figura 25(c).
Neste caso, o carregamento na ferramenta é relativamente menor se comparado com as
estratégias anteriores devido ao pouco ângulo de contato da ferramenta durante a entrada.
Entretanto, para utilizar esta estratégia o comando CNC da máquina deverá dispor de funções
29
específicas. Das três opções comentadas, esta é a que possui maior tempo de ciclo,
proporcional ao percurso realizado pela ferramenta.
Grzesik (2008) ainda afirma que umas vantagens de utilizar ferramentas de fresar roscas
por interpolação é a qualidade dimensional das entidades, além de variações nos diâmetros
poderão ser controladas e corrigidas sem que haja a troca da ferramenta. Contudo, a principal
vantagem deste processo está na velocidade de corte e velocidade de avanço atingida. Este
processo não possui velocidade de avanço vinculado ao passo da rosca. Dependendo do
diâmetro da rosca, podem ser alcançadas velocidades de corte entre 100 a 400 m/min e
avanços entre 0,05 a 0,25 mm/aresta.
2.4.3. Processo de roscamento com fresa único corte
Apesar das ferramentas de aresta única de corte mostrarem um amplo campo de
aplicações, poucas pesquisas são encontradas na literatura. Utilizando o mesmo conceito de
programação das ferramentas de múltipla aresta, a principal diferença entre as duas
ferramentas está na quantidade de arestas de corte, conforme a Figura 26. Isto impacta
diretamente na sua aplicação, pois mesmo apresentado uma ou mais arestas de corte, este
conceito permite usinar roscas de diversos passos. Elevadas velocidades de corte e de avanço
também são diferenciais importantes destas ferramentas quando comparado aos machos
rígidos.
Figura 26 – Ferramenta de aresta única (RICHTER, 2003)
Richter (2003) afirma que este tipo de ferramenta caracteriza-se principalmente pela sua
precisão e flexibilidade, podendo usinar roscas menores que 6 mm e com diversos passos. Sua
utilização tem grande importância na fabricação de peças de pequeno porte, por diversas
vantagens, como por exemplo, a possibilidade de não utilizar fluido de corte durante a
usinagem. Esta característica tem grande importância na produção de roscas em ambientes
30
mais limpos. Roscas usinadas sem rebarbas e além disso, conforme mostrado na Figura 27,
possibilita a usinagem de roscas que possuem intersecção com outras roscas sem que hajam
dimensões ou acabamento comprometidos ou ainda quebra de ferramentas.
Figura 27 – Intersecção de roscas usinadas por ferramentas de aresta única (RICHTER,
2003)
Obviamente que o tempo necessário para usinar uma rosca com uma ferramenta de
aresta única é maior que o tempo levado para usinar a mesma rosca com uma ferramenta de
múltipla aresta.
Comparado com o processo de roscamento que utiliza machos rígidos, o processo de
usinagem de roscas por interpolação helicoidal mostra-se uma ótima alternativa, onde se
deseja reduzir a quantidade de ferramentas e/ou o tempo de trocas. Esta alternativa também é
adequada para a usinagem de roscas em materiais com maior dureza (por exemplo, aços
temperados), roscas com maior grau de precisão ou com maior necessidade de escoamento de
cavacos e ainda em condições desfavoráveis como na intersecção de duas roscas. Entretanto,
o aumento da velocidade de corte para esta operação a níveis superiores aos do processo
utilizando machos rígidos é a principal vantagem do processo de usinagem de roscas.
31
3. Procedimentos Experimentais
3.1 Introdução
O objetivo principal desta pesquisa é determinar o desempenho de ferramentas para
interpolar roscas durante o processo de roscamento interno no ferro fundido vermicular. A
principal vantagem com a utilização desta técnica é aumentar a velocidade de corte utilizada
no processo de roscamento quando comparada à usinagem com machos rígidos. Como
descrito na revisão bibliográfica, a sincronização da rotação da ferramenta com a velocidade
de avanço limita a máxima velocidade de corte. Além disso, no caso da utilização de
ferramentas de interpolar roscas não há necessidade de inverter o sentido da rotação do eixo-
árvore durante a usinagem.
Os ensaios vida de ferramenta foram realizados no Laboratório de Manufatura Flexível
(FMS) do Instituto Superior Tupy (IST/SOCIESC). Ensaios de força de usinagem e análises
de Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) foram realizados na Faculdade de Engenharia
Mecânica da UNICAMP.
Este capítulo descreve as condições nas quais os ensaios foram realizados, as
especificações de máquina-ferramenta, as ferramentas de usinagem e sistemas de fixação, o
material utilizado, o tipo de fluido de corte, análises do processo e como o planejamento
experimental foi desenvolvido.
3.2 Máquina-ferramenta
Para a realização dos ensaios de vida de ferramenta, utilizou-se um Centro de Usinagem
Vertical da marca Feller, modelo FV-600, mostrado na Figura 28. As principais
especificações da máquina são: curso de movimentação de 610, 450 e 505 mm (eixos X, Y e
Z, respectivamente); comando numérico Mitsubishi modelo Meldas 520 AM; eixo-árvore
com rotação máxima de 6000 rpm e potência máxima de 7,6 kW; interface do sistema de
fixação de ferramentas tipo mandril ISO-40 e velocidade de deslocamento rápido de 18m/min.
O fluido de corte utilizado nos ensaios foi uma emulsão de base mineral. O fabricante
do fluido é a empresa Blaser e a especificação é Blasocut 2000 universia-MD. A concentração
do fluido era de 8% e foi medida com refratômetro Atago modelo N-1E. A determinação da
vazão de fluido de corte no processo (17 l/min) se realizou com a utilização de um recipiente
de volume conhecido em conjunto com a cronometragem do tempo necessário para seu
preenchimento.
32
Figura 28 - Centro de usinagem vertical Feeler FV-600
3.3 Ferramentas, porta-ferramentas e mandril
Os ensaios de fresamento de roscas por interpolação foram realizados com ferramentas
e porta-ferramentas da empresa Iscar. Os conjuntos definiam dois tipos distintos de
ferramentas: aresta única e múltiplas arestas. Os insertos das ferramentas de aresta única
(código 11 IR A60) foram montados em um porta-ferramenta de código MTSR 0010 M11C.
Por outro lado, os insertos das ferramentas de múltiplas arestas (código MT 14I 1.5 ISO)
foram montados em um porta-ferramenta de código MTSR 0013 J14C. Ambos os insertos
eram de metal duro da classe K15 com cobertura de TiAlN. A Figura 29 ilustra a montagem
dos insertos nos respectivos porta-ferramenta.
33
Figura 29 – Insertos e porta-ferramenta utilizados nos experimentos (adaptado de
ISCAR, 2009)
Conforme o catálogo do fabricante, o inserto de aresta única permite a usinagem de
roscas com passo de 0,5 mm até 1,5 mm e diâmetro de 16 mm até 48 mm. O inserto de
múltiplas arestas também tem flexibilidade de usinar diferentes diâmetros, mas apenas
permite usinar roscas com passo de 1,5 mm (ISCAR, 2009).
Outro ponto importante a ressaltar é a utilização de metal duro como material do porta-
ferramenta. O metal duro tem módulo de elasticidade de aproximadamente 2,6 maior do que
os aços – 520 GPa para o metal duro e 200 GPa para o aço (BORDMAN, 1990;
SANTHANAM, TIERNEY e HUNT, 1990). Isto reduz a deflexão quando submetido a um
mesmo esforço mecânico, comparando-se aos aços, e aumenta a freqüência natural do corpo,
o que pode minimizar os riscos de usinar nos harmônicos da freqüência natural do sistema.
Os conjuntos (ferramenta e porta-ferramenta) foram montados em um mandril tipo BT
40 com o auxílio de pinça, conforme mostra a Figura 30. Nota-se que o balanço da ferramenta
34
foi de 60 mm e a distância da extremidade da ferramenta ao eixo-árvore foi de 140 mm, em
ambos os casos.
Figura 30 – Montagem das ferramentas e porta-ferramenta no mandril
3.4 Material usinado
Os corpos-de-prova foram placas fundidas de ferro fundido vermicular. A utilização
deste material deve-se à sua grande utilização na fabricação de cabeçotes e blocos de motores
de combustão interna. Estes referidos componentes possuem grande quantidade de roscas de
diferentes diâmetros. Além disso, em muitos casos, as roscas são usinadas em furos não-
passantes. Estas características dificultam o processo de roscamento com machos rígidos, pois
há necessidade de ferramentas específicas para cada tipo de rosca.
A Figura 31 demonstra as dimensões das placas utilizadas nos ensaios de vida de
ferramenta. A distância entre centros das roscas foi determinada conforme a metodologia de
ensaio de usinagem para operação de furação, baseado na NBR 10625 (1989). Apesar dos
ensaios serem de roscamento, o objetivo de utilizar a mesma distância entre centros de ensaios
de furação era evitar que a força de usinagem deformasse as paredes de pequenas espessuras.
35
Figura 31 - Dimensionamento dos corpos-de-prova utilizados nos ensaios
Foram usinadas roscas M16 com passo de 1,5 mm e de classe 6H - roscas de qualidade
de tolerância média conforme a NBR 965-1 (2004). Para iniciar o ensaio de roscamento, furos
de diâmetro 14,5 mm foram usinados nas placas. Em cada furo também era usinado um
chanfro de 1 x 45º, com o objetivo de eliminar rebarbas e, principalmente, reduzir a
possibilidade de quebra da ferramenta no momento da entrada. Outro ponto importante a ser
ressaltado é a profundidade da rosca. Essa dimensão, em roscas métricas, geralmente é 1,5 a 2
vezes o seu diâmetro nominal. Entretanto, com o objetivo de otimizar a utilização dos corpos-
de-prova, utilizou-se toda a espessura das placas (40 mm), de forma a usinar roscas passantes.
Assim, obteve-se um valor de comprimento 2,5 vezes o valor do diâmetro.
Análises de dureza, micrografia e composição química foram realizadas no material
usinado com o objetivo de conhecer as principais características. Estes ensaios foram
realizados no Laboratório de Materiais do Instituto Superior Tupy (IST/SOCIESC).
Os ensaios de dureza foram realizados com um durômetro Wolpert modelo BK3004.
Utilizou-se como identador uma esfera de 10 mm de diâmetro e carga de 3000 kgf. Definiu-se
uma malha retangular para avaliação da dureza nos corpos-de-prova. Esta malha era composta
por 3 colunas e 3 linhas. A distância entre linhas era de 75 mm e a distância entre colunas de
100 mm. A média da dureza foi de 198 HB e o desvio padrão de 2,8 HB.
Para realizar a análise de micrografia, retiraram-se amostras de diferentes corpos-de-
prova. As amostras foram atacadas com solução de Nital a 3% por 10 segundos. As imagens
36
foram realizadas com o auxílio de um Microscópio Óptico da marca Olympus (modelo
BX51), uma Câmera Digital Evolution (modelo LC Color) integrada com o software Image-
Pro Plus. A Figura 32 mostra a microestrutura do ferro fundido vermicular utilizado nos
ensaios. µ
Figura 32 – Microestrutura do ferro fundido vermicular
Conforme pode ser observado na Figura 32, o ferro fundido vermicular apresenta uma
matriz ferrítica-perlítica. Na Figura 32a é possível identificar regiões claras (ferrita) além de
dois tipos de grafita no material: a grafita nodular (esferoidal) e vermicular. Com o
crescimento da nodularidade, aumenta-se a resistência mecânica e rigidez, contudo,
promovem-se maiores dificuldades no processo de fundição e usinagem. O aumento da
nodularidade também reduz a condutividade térmica do material. Blocos de motores e
cabeçotes, em função dos severos carregamentos térmicos e mecânicos além de grande
remoção de material por usinagem, têm valores de nodularidade entre 0 e 20% (GUESSER;
SCHROEDER; DAWSON, 2001). Ainda na Figura 32a, identifica-se regiões de cementita
(Fe3C) formando faixas estreitas e compridas na microestrutura do material. A cementita é um
componente duro e promove dificuldades ao processo de usinagem. A Figura 32b é uma
imagem com maior ampliação da microestrutura do material. Nota-se nesta figura que uma
ampla região de matriz perlítica em conjunto com regiões de esteadita ternária (Fe3P e Fe3C).
O aumento da perlita na matriz do ferro fundido vermicular promove incremento nos valores
de máxima resistência à tração em detrimento do alongamento. A esteadita ternária pode
conter carbonetos duros, os quais promovem maiores dificuldades ao processo de usinagem.
De uma forma geral, o ferro fundido vermicular apresenta elevada heterogeneidade
37
microestrutural, o que torna a definição de materiais de ferramentas e dos parâmetros de
usinagem extremamente complicada.
Ensaios de composição química foram realizados com o auxílio de um Espectrômetro
de Emissão Óptica Spectrolab do fabricante Spectro. A Tabela 2 mostra os resultados de três
amostras de diferentes placas do material usinado.
Tabela 2 - Composição química do material utilizado nos corpos-de-prova
Amostra Elemento (% em massa)
Si Mn P Cr Ni Cu Ti Sn
1 2,43 0,281 0,019 0,034 0,013 0,87 0,016 0,035
2 2,43 0,312 0,033 0,037 0,018 0,84 0,019 0,042
3 2,37 0,287 0,026 0,035 0,015 0,83 0,017 0,036
Conforme Stefanescu (1988); Dawson et al. (2001) e Abele, Sahm e Schulz (2002) as
faixas típicas dos elementos utilizados são: Cu: 0,048%, Cr: 0,02-0,06%, Si: 2,0-2,4% e Ti:
0,010 – 0,020. Observa-se que o percentual de titânio apresenta-se próximo ao limite superior.
Como descrito anteriormente, a presença de elevados teores de titânio na composição do
material promove a formação de inclusões duras, tais como, carboneto de titânio (TiC) e
nitreto de titânio (TiN).
3.5 Avaliação do processo
Para a avaliação da geometria da rosca usinada, utilizou-se um calibrador “passa e não-
passa”. A especificação do calibrador era M16 x 1,5 mm da classe 6H. O calibrador foi
construído pela empresa Ferriplax. A Tabela 3 faz uma comparação das dimensões do
calibrador com as dimensões da rosca M16 x 1,5 mm - série fina - da classe 6H (limites
inferiores e superiores).
Tabela 3 – Dimensões do calibrador e da rosca (M16 x 1,5 mm – classe 6H)
Dimensões
Calibrador M16 x 1,5 mm (6H) Rosca M16 x 1,5 mm (6H)
NBR ISO 1502 (2004) NBR ISO 965-2 (2004)
“passa” “não-passa” Limite inferior Limite Superior
Diâm. primitivo 15,038 - 15,039 15,221 - 15223 15,026 15,216
38
É possível notar que o lado “passa” do calibrador prevê um folga de 0,012 mm se
comparado ao limite inferior da rosca. Contudo, o lado “ não-passa” do calibrador somente
detectará que a rosca está fora do especificado, quando esta for maior que 15,222 mm
(média), permitindo folga no conjunto.
Contudo, diversos pontos podem causar restrições a entrada do lado “passa” do
calibrador na rosca usinada. Para se definir a região que limitava a entrada do calibrador,
roscas que determinaram o final de vida da ferramenta foram cortadas das placas conforme
mostrado na Figura 33.
Figura 33 – Rosca cortada no centro para verificar interferência do calibrador
Estas regiões foram divididas na linha de centro da entidade de forma possibilitar a
visualização da região de interferência entre calibrador e peça. Utilizou-se uma tinta, a qual
era facilmente removida pelo calibrador, para ressaltar o local de interferência com a peça.
Esta análise promoveu uma melhor compreensão de como o desgaste ou avaria da ferramenta
restringia a entrada do lado “passa” do calibrador na rosca usinada no diâmetro primitivo.
Análises do tipo de desgaste e avarias foram realizadas após atingir o fim de vida das
ferramentas. Para este objetivo, utilizou-se um Microscópio Eletrônico de Varredura (MEV)
da marca Jeol, modelo JXA-840A, equipado com sistema EDS (Espectroscopia de Energia
Dispersiva) do Laboratório de Materiais da Faculdade de Engenharia Mecânica da Unicamp.
Este sistema possibilita uma avaliação mais detalhada da ferramenta, assim como, a
identificação da presença de determinados materiais em pontos específicos das ferramentas de
corte.
39
3.6 Ensaios de Força de usinagem
Ensaios de força de usinagem foram realizados para se determinar o comportamento dos
esforços de corte com a utilização de cada tipo de ferramenta. Estes ensaios foram realizados
no Laboratório de Usinagem dos Materiais da Faculdade de Engenharia Mecânica da
Unicamp. Utilizou-se um dinamômetro estacionário da marca Kistler, modelo 9257B,
acoplado a um condicionador de sinais da marca Kistler, modelo 5019. Este conjunto
proporciona a definição de três componentes ortogonais da força de usinagem. Um
osciloscópio digital Tektronix, modelo TDS2004B, auxiliou na definição do valor de saída e
no comportamento do sinal das três componentes antes da aquisição. Após esta fase, a
aquisição dos sinais das três componentes era realizada com uma placa de aquisição PCI-
6525E (A/D), montada em um computador, em conjunto com o programa LabView 8.5,
ambos da empresa National Instruments. Utilizou-se uma taxa de aquisição de 2 KHz e um
filtro (passa-baixo) de 1 KHz. A máquina-ferramenta utilizada foi o Centro de Usinagem
Vertical Mori Seiki modelo SV-40 e o fluido de corte foi o mesmo utilizado nos ensaio de
vida útil das ferramentas. A Figura 34 mostra a montagem do sistema de aquisição das
componentes ortogonais dos esforços de corte.
Figura 34 – Montagem do sistema de aquisição dos esforços de corte
Foram necessárias adaptações nas dimensões do corpo-de-prova para a apropriada
fixação no dinamômetro. A geometria do corpo-de-prova para análise dos esforços de corte
pode ser verificada no detalhe “A” da Figura 34. As dimensões foram de 130 x 40 x 35 mm.
Também, utilizou-se uma placa de segurança entre o corpo-de-prova e o dinamômetro. Os
componentes descritos foram fixados com parafusos.
40
3.7 Procedimentos experimentais
O experimento consistia na usinagem de diversas roscas passantes M16 x 1,5 mm com
profundidade de 40 mm nas placas de ferro fundido vermicular. Durante o experimento de
vida da ferramenta, a usinagem era interrompida sistematicamente a cada 10 roscas usinadas
para análise com calibrador de roscas “passa e não-passa”. Determinava-se como final do
experimento o momento em que não era possível que o lado “passa” do calibrador de roscas
entrasse na entidade usinada.
Com o objetivo de usinar roscas passantes, as placas foram apoiadas sobre calços
paralelos na mesa da máquina-ferramenta. Grampos de fixação foram utilizados para realizar
a fixação do conjunto. A Figura 35 mostra o sistema de fixação dos corpos-de-prova durante
os experimentos.
Figura 35 – Sistema de fixação de corpos-de-prova nos experimentos
Diferentemente do processo de roscamento com machos rígidos, a utilização de
ferramentas de interpolar roscas (com aresta única ou múltiplas arestas) permite a variação no
diâmetro primitivo da rosca. Esta variação é determinada em função do diâmetro da
interpolação helicoidal da ferramenta. Contudo, em função desta flexibilidade, torna-se
necessário um ajuste do diâmetro inicial para o processo. Neste trabalho, o ajuste do diâmetro
inicial da interpolação helicoidal aproximou-se do limite superior permitido. Deste modo,
incrementou-se o diâmetro da interpolação helicoidal, em 0,02 mm, até que permitisse o lado
41
“não-passa” do calibrador de roscas entrar na entidade usinada. A partir desta dimensão,
reduziu-se 0,02 mm na dimensão da interpolação helicoidal de modo não permitir o lado
“não-passa” do calibrador entrar na rosca. A concepção de usinar a rosca próxima à máxima
dimensão se deve em função do desgaste de flanco na ferramenta. No caso de roscas internas,
o aumento no valor do desgaste de flanco promove a redução do diâmetro primitivo da
entidade usinada.
A cinemática para usinagem das roscas era diferente para cada tipo de ferramenta
(aresta única e múltiplas arestas). No caso das ferramentas de aresta única, o posicionamento
inicial era feito a 1,5 mm acima da superfície da placa. A partir deste ponto, iniciava-se a
interpolação helicoidal cilíndrica até o final da rosca e, posteriormente, a ferramenta se
deslocava para o centro do furo de forma a possibilitar a saída sem contatos na superfície
usinada. Para a ferramenta de múltiplas arestas, o posicionamento inicial era feito no centro
do furo, mas com 11 mm abaixo da superfície da placa. A partir deste ponto, uma interpolação
helicoidal cônica era realizada, por uma volta, até se atingir o diâmetro da interpolação
helicoidal cilíndrica. Ao final da interpolação helicoidal cilíndrica, a qual determinava o final
da rosca, uma nova interpolação helicoidal cônica era realizada até o centro da entidade. O
objetivo desta nova interpolação helicoidal cônica era permitir a saída da ferramenta. Apesar
da complexidade do processo com a ferramenta de múltiplas arestas ao ser comparado com a
ferramenta de aresta única, o número de voltas necessárias para usinar o comprimento da
rosca é menor em função do número de arestas da ferramenta (Childs et al., 2000).
3.8 Planejamento experimental
Montgomery (2005) afirma que o planejamento fatorial é uma técnica eficiente para
experimentos que envolvam o efeito de duas ou mais variáveis. O tipo mais simples de
planejamento fatorial envolve duas variáveis em dois níveis. Além disso, cada experimento é
replicado algumas vezes. Este tipo de experimento é, principalmente, indicado para análises
exploratórias, nas quais se tem poucas informações da influência de cada variável e suas
interações. O planejamento experimental deste trabalho está baseado na consideração descrita,
pois há escassez de informações científicas sobre a usinagem de roscas por interpolação
helicoidal no ferro fundido vermicular.
Os experimentos foram realizados de forma aleatória e com três réplicas para cada
situação. O planejamento fatorial utilizado consistia em duas variáveis (fatores) em dois
níveis (22). A Tabela 4 mostra o arranjo experimental.
42
Tabela 4 - Variáveis utilizadas no planejamento experimental
Fatores Variável Nível
A Velocidade de corte 85 m/min
100 m/min
B Tipo da ferramenta aresta única
múltiplas arestas
Conforme pode ser verificado na Tabela 4, utilizou-se dois valores de velocidade de
corte e dois tipos de ferramentas para usinagem de roscas por interpolação. É oportuno
observar que os valores de velocidade de corte empregados nos experimentos são bem
superiores aos empregados no roscamento com machos rígidos. Outro ponto importante é que
a cinemática do processo é diferente para cada tipo de ferramenta. Esta alteração promove
diferentes tempos de usinagem para cada tipo de ferramenta.
Contudo, com ambas as ferramentas de usinagem, os demais parâmetros de usinagem
eram idênticos. O avanço por dente (fz) foi de 0,05 mm e a profundidade de usinagem (ap) de
0,75 mm.
43
4 Resultados e Discussões
Neste capítulo serão descritos os resultados dos ensaios de usinagem de roscas por
interpolação helicoidal. Com o objetivo de facilitar a compreensão, o capítulo será dividido
nos seguintes tópicos: vida de ferramenta, desgaste de ferramenta e esforços de usinagem.
4.1 Vida de ferramenta
A Figura 36 mostra os resultados de vida de ferramenta nos experimentos realizados. As
colunas representam as médias obtidas nas réplicas de cada condição de usinagem e as linhas
de dispersão representam o valor de mais ou menos 1 desvio padrão.
Figura 36 - Vida útil em função do tipo da ferramenta e velocidade de corte
É importante ressaltar que para a determinação da vida da ferramenta, o diâmetro da
interpolação helicoidal não foi alterado ao longo dos ensaios. Este recurso promove um
aumento no diâmetro primitivo da rosca e um possível incremento no número de roscas
usinadas. Na Figura 36 nota-se que as ferramentas de múltiplas arestas apresentaram vida
média superior às ferramentas de aresta única. Além disso, existe uma tendência de usinagem
de um número maior de roscas com 85 m/min do que com 100 m/min.
Estas percepções são confirmadas pela análise de variância. A Figura 37 mostra o
diagrama de pareto de influência dos fatores na vida da ferramenta.
44
Figura 37- Diagrama de pareto de influência dos fatores na vida da ferramenta
Conforme a Figura 37, o tipo de ferramenta tem uma influência significativa no
processo, com um intervalo de confiança de 99%. A velocidade de corte mostra apenas uma
influência significativa quando o intervalo de confiança é de 80%. Além disso, a análise de
variância mostra que não há interação significativa entre as variáveis de influência.
Ao se analisar os valores de velocidades de corte (85 e 100 m/min) utilizados no
processo de roscamento, nota-se uma significativa diferença para os valores verificados na
literatura. Araujo et al. (2004) estudou a usinagem de roscas M10 x 1,5 mm em alumínio da
série 6061 pelo processo interpolação helicoidal. As velocidades de corte utilizadas foram de
32 e 64 m/min. Mota (2006) estudou o processo de roscamento com machos rígidos (M6 x 1
mm) na usinagem do ferro fundido cinzento. A maior velocidade de corte utilizada nesta
pesquisa foi de 75 m/min. Bezerra (2003) também estudou o processo de roscamento com
machos rígidos (M8 x 1,5 mm) na usinagem do ferro fundido cinzento. As velocidades de
corte utilizadas na pesquisa de Bezerra (2003) foram de 30 e 60 m/min. Apesar de Mota
(2006) e Bezerra (2003) utilizarem ferramentas de aço-rápido, fator que limita a máxima
velocidade de corte, a manutenção desta velocidade ao longo de toda a usinagem torna-se
crítica no processo. Isto se deve a necessidade de alterar o sentido de rotação do eixo-árvore
durante a usinagem e a limitações do cabeçote reversor. Com o processo de usinagem de
roscas por interpolação helicoidal, estas limitações não existem. Araujo et al. (2004) também
utilizaram valores de velocidade de corte inferiores ao desta pesquisa, mesmo com a
usinagem de roscas por interpolação helicoidal. É importante ressaltar que os trabalhos
citados utilizaram materiais de menor dificuldade de usinagem do que o ferro fundido
vermicular. Esta comparação mostra o potencial da usinagem de roscas por interpolação
helicoidal, principalmente em função das velocidades de corte permitidas no processo.
45
As ferramentas com múltiplas arestas de corte permitiram a usinagem de um maior
número de roscas quando comparadas às ferramentas de aresta única, independentemente da
velocidade utilizada. Contudo, uma análise torna-se importante: o processo de formação dos
filetes. Com a utilização de ferramentas de aresta única, a mesma aresta de corte da
ferramenta é responsável pela formação de todos os filetes de rosca. Em outras palavras, ao
atingir um determinado valor de desgaste na aresta de corte ou ocorrer uma avaria na
ferramenta, daquele momento em diante, todos os filetes são automaticamente
comprometidos. Por outro lado, com a utilização de ferramentas de múltiplas arestas, somente
nas duas primeiras voltas de formação dos filetes, mais do que uma aresta usina
simultaneamente. Isto se deve ao posicionamento da ferramenta abaixo da superfície do furo
no início do processo. Como descrito no item 3.7, após a ferramenta ser posicionada abaixo
da superfície e no centro do furo, a primeira volta da ferramenta utiliza uma interpolação
helicoidal cônica para atingir o diâmetro externo da rosca. Na segunda volta da ferramenta,
todas as arestas da ferramenta usinam o material com uma interpolação helicoidal cilíndrica.
Entretanto, a partir da terceira volta, realizada com interpolação helicoidal cilíndrica, somente
a aresta da extremidade inferior da ferramenta é responsável pela formação dos filetes. As
demais arestas da ferramenta, apenas tocam a superfície usinada. Contudo, caso o desgaste da
aresta da extremidade inferior da ferramenta comprometa a geometria do filete ou, ainda,
ocorra uma avaria nesta aresta, a aresta seguinte torna-se responsável pela formação do filete.
Como será demonstrado no item “4.4 Desgaste e avarias de ferramentas”, este tipo de situação
ocorreu freqüentemente com as ferramentas de múltiplas arestas. Este fator foi determinante
para a superioridade do número de roscas usinadas por estas ferramentas.
A estratégia da entrada da ferramenta na peça é um ponto determinante para o
desempenho das ferramentas de múltiplas arestas. Smith (2008) descreve duas estratégias de
entrada: interpolação linear e interpolação helicoidal cônica. Segundo o autor, a estratégia de
interpolação linear é a mais rápida, contudo, promove um grande ângulo de contato entre
ferramenta e peça. Este ângulo de contato promove elevados carregamentos no corte, cavacos
mais longos e marcas na peça no local de entrada da ferramenta. Por outro lado, a estratégia
de interpolação helicoidal cônica é mais lenta e complexa do que a anterior, mas permite um
aumento gradual nos esforços de usinagem durante a entrada da ferramenta e homogeneidade
do tamanho dos cavacos.
Conforme demonstrado na Figura 32, o ferro fundido vermicular é caracterizado pela
heterogeneidade microestrutural (presença de diferentes constituintes e de diferentes durezas).
Este é um elemento dificultador na definição do material da ferramenta e parâmetros de
46
usinagem. Contudo outro fator dificulta ainda mais o processo de usinagem: a concentração
de carbonetos em determinadas regiões do corpo-de-prova. A Figura 38 mostra uma
micrografia de uma região com elevado número de carbonetos na microestrutura do material.
Figura 38– Presença de partículas duras na microestrutura do ferro fundido vermicular
A análise da microestrutura do material, conforme a Figura 38, mostra uma
concentração de carbonetos de TiC (carboneto de titânio) e/ou TiN (nitreto de titânio) na
matriz ferrítica-perlítica do ferro fundido vermicular. Além disso, em uma região de esteadita,
é possível notar a presença de carbonetos do tipo M3C. A concentração de carbonetos em
determinadas regiões do material usinado é um elemento crítico para a entrada com
interpolação linear em função de elevados carregamentos nas arestas de corte, principalmente,
pelo do choque com partículas extremamente duras. Deste modo, a estratégia de interpolação
helicoidal cônica para a usinagem do primeiro filete torna-se imprescindível para o
desempenho da ferramenta.
Esta também é a hipótese para explicar os valores de dispersão dos resultados de vida de
ferramenta. A presença de concentrações de carbonetos e nitretos de elevada dureza pode
promover avarias, ou seja, a destruição da aresta de corte de maneira repentina e inesperada.
Esta situação de impacto contra partículas duras no material da peça pode promover
lascamentos e, até mesmo, quebra da aresta de corte. Dawson e Schroeder (2004) afirmam
47
que a adição de 0,1 a 0,2% de titânio no ferro fundido vermicular, com o objetivo de evitar a
formação de grafitas lamelares, pode originar, por conseqüência, a formação de TiC e TiN. Os
autores também afirmam que a presença destas partículas duras promove dificuldades
adicionais ao processo de usinagem. Portanto, com a determinação do fim de vida das
ferramentas por avarias, o qual ocorre de forma repentina e inesperada, aumenta fortemente a
dispersão dos resultados.
4.2 Vida de ferramenta x Custo-benefício
Apesar do maior número de roscas usinadas pelas ferramentas de múltiplas arestas,
independentemente da velocidade de corte utilizada, ao se analisar o custo da aresta de corte
por número de roscas usinadas, a ferramenta de aresta única promove o menor custo unitário.
Isto deve-se principalmente a dois aspectos: número de arestas por inserto e custo do inserto.
No inserto de aresta única existem três arestas de corte, enquanto que, no inserto de múltiplas
arestas, existem apenas duas arestas, sendo uma por lado do inserto. Contudo, o fator
preponderante para o menor custo unitário por rosca usinada é o valor de cada inserto. O valor
de compra do inserto de múltiplas arestas é 2,3 vezes maior do que o do inserto de aresta
única. Ao se ponderar o custo da aresta de corte de cada ferramenta em relação ao número
médio de roscas usinadas, tem-se que a condição de usinagem de roscas com ferramenta de
aresta única e 85 m/min, o que promove o menor custo unitário. Adotando-se este valor como
referência, ao aumentar a velocidade de corte para 100 m/min, com mesmo tipo de
ferramenta, o custo unitário por rosca é 1,52 vezes maior. Com as ferramentas de múltiplas
arestas, os custos são de 2,08 e 2,26 vezes maior para as velocidades de corte de 85 e 100
m/min, respectivamente. Entretanto, esta análise considera apenas o custo da aresta de corte e
o número de roscas usinadas.
Para determinação do menor custo da operação, outros fatores devem ser analisados,
tais como: tempo de usinagem, o valor da hora-máquina e a variedade de roscas no processo.
Do ponto de vista de tempo de fabricação, a usinagem de roscas curtas promove uma grande
vantagem para as ferramentas de múltiplas arestas, pois um número reduzido de voltas com
interpolação helicoidal cilíndrica é necessário quando comparado às ferramentas de aresta
única. Porém, com o aumento da profundidade da rosca, esta diferença tende a ser reduzida.
Paralelamente a esta análise, máquinas-ferramenta com valores de hora-máquina elevados
promovem uma vantagem em custo para os menores tempos de usinagem, pois o menor custo
da ferramenta não justifica o custo do maior tempo de usinagem. Por último, o aumento da
variedade de roscas no processo, principalmente do valor de passo, promove uma vantagem
48
para utilização das ferramentas de aresta única. O motivo é que a ferramenta de múltiplas
arestas permite usinar apenas um valor de passo de rosca, enquanto, a ferramenta de aresta
única permite uma faixa de valores de passo. Deste modo, a usinagem de diferentes valores de
passo com as ferramentas de múltiplas arestas necessita de diferentes conjuntos na máquina-
ferramenta (insertos, porta-ferramenta e mandris) para a manufatura das peças. A análise da
viabilidade econômica destes aspectos depende de detalhes específicos do processo e produto
usinado e o principal objetivo desta análise qualitativa é mostrar pontos potenciais de cada
alternativa.
4.3 Vantagens das ferramentas quando comparado aos machos rígidos
As operações de roscamento são caracterizadas por componentes de alto valor agregado.
Estas operações freqüentemente estão entre as últimas etapas do processo produtivo, nos quais
o risco de quebra de uma ferramenta pode gerar a perda da peça (MÜLLER e SOTO, 1999).
Neste caso, as fresas de interpolação de roscas apresentam grande vantagem, pois caso ocorra
a quebra da ferramenta dentro da rosca, sua retirada é simples. Além disto, a rosca afetada
poderá ser repassada e concluída sem que suas dimensões finais sejam prejudicadas.
As ferramentas de interpolação de múltipla aresta e aresta única caracterizam-se pela
alta flexibilidade em usinar roscas, possibilitando a usinagem de diferentes materiais,
principalmente os endurecidos. Utilizando o recurso de interpolação helicoidal, diferentes
diâmetros de roscas, com qualquer grau de qualidade são fabricadas somente com a alteração
de parâmetros no programa CNC, desde que tenham o mesmo passo. Além disto, roscas
direitas e esquerdas, passantes e não-passantes, internas e externas, dependendo do
comprimento útil podem ser usinadas em uma única volta da ferramenta em torno do seu eixo.
Já as ferramentas de aresta única, possibilitam todas as vantagens acima, ainda com a
possibilidade de usinar roscas de diferentes passos (GRZESIK, 2008).
Ainda, a aplicação do processo de fresamento de roscas por interpolação helicoidal
apresenta grandes vantagens quando aplicado em peças de grande porte. Conforme Grzesik
(2008), com este processo é requerida baixa potência da máquina durante a usinagem de
roscas de grandes diâmetros e profundidades. Como conseqüência, a geração da força de
usinagem e cavacos menores durante a fabricação.
As ferramentas de aresta única e múltiplas arestas ainda mostram outra vantagem. Para
este processo, é dispensada a utilização do bolsão entre o fundo do furo e final da rosca. Para
os processos que utilizam machos de corte, este é de extrema importância, pois sua ausência e
49
ou menor dimensão pode causar a quebra do macho de corte. Entretanto, este é um fator
limitante em peças de pouca espessura, que a redução de peso é um dos principais objetivos.
4.4 Desgaste e avarias de ferramentas
O estudo dos fenômenos tribológicos nos processos de usinagem é imprescindível na
determinação do material da ferramenta de corte, das estratégias de usinagem e dos
parâmetros de usinagem. Melhorias como redução nos valores de rugosidade, incrementos na
vida útil da ferramenta e obtenção de estreitas tolerâncias dimensionais podem ser obtidas
com o conhecimento das interações entre superfícies com movimento relativo (TRENT e
WRIGHT, 2000). Com o objetivo de determinar os tipos de avarias e mecanismos de desgaste
nas ferramentas utilizadas, após atingir o critério de final de vida definido pelo calibrador
passa e não-passa, análises de Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) foram realizadas
nas arestas de corte das ferramentas. Para facilitar a compreensão, são mostradas somente as
imagens que melhor representam os fenômenos observados para cada ferramenta com cada
velocidade de corte utilizada.
A Figura 39 mostra a superfície de folga da ferramenta de múltiplas arestas utilizada
com velocidade de corte de 85 m/min.
50
Figura 39 – Superfície de folga da ferramenta múltiplas arestas com vc = 85 m/min.
Conforme pode ser observado na Figura 39, as imagens da superfície de folga
demonstram que as arestas de corte responsáveis pela usinagem da rosca apresentam
diferentes mecanismos de desgaste e ou avarias. Observa-se que no primeiro dente (à
esquerda na figura superior) há ocorrência de quebra na aresta de corte. Por outro lado, na
segunda aresta, verifica-se a presença de desgaste abrasivo. Com o objetivo de facilitar a
compreensão, ampliações das referidas regiões analisadas foram feitas nos detalhes “A” (1ª
aresta) e “B” (2ª aresta).
A avaria mostrada no detalhe “A” pode ter duas hipóteses principais para a explicação:
fadiga mecânica e choques com carbonetos ou nitretos presentes no material usinado. A
fadiga mecânica é característica de operações com corte interrompido. A cada rotação da
ferramenta há um carregamento mecânico entre o final de ciclo inativo (ferramenta sem
contato com a peça) e o início do ciclo ativo, gerando um carregamento compressivo.
Contudo, mesmo havendo tenacidade suficiente para absorver os choques e evitar a quebra
imediata, a ferramenta de corte estará sujeita a um carregamento repetitivo a cada rotação,
levando ao surgimento de trincas. As trincas de origem mecânica ocorrem paralelas à aresta
51
de corte, tanto na superfície de saída como na superfície de folga da ferramenta, resultando
em lascamentos, os quais podem definir o fim de vida da ferramenta (MACHADO e SILVA,
2004).
Por outro lado, choques da ferramenta com partículas (inclusões) de elevada dureza
presentes no material usinado podem ocasionar microlascamentos, ou até mesmo a quebra da
aresta de corte. Em materiais fundidos, partículas oriundas da areia do molde também têm
elevada dureza (STEPHENSON e AGAPIOU, 1996). A Figura 38, que caracteriza uma região
do material usinado, mostra uma concentração de carbonetos. O choque da aresta de corte
com regiões de concentração de carbonetos similar a apresentada na figura pode promover a
quebra da aresta de corte. De acordo com Trent e Wright (2000), o carboneto de titânio (TiC)
tem dureza de 3.200 HV em temperatura ambiente e o carboneto de tungstênio (WC)
principal constituinte do material da ferramenta – tem dureza de 2.100 HV. Esta comparação
de durezas entre carbonetos (presentes no material da peça e ferramenta) suporta a afirmação
de microlascamentos e de quebra na aresta de corte. Esta é a principal hipótese para a quebra
da aresta de corte mostrada na Figura 39.
Ainda, no detalhe “A” da Figura 39, com o auxílio de análises EDS na região de quebra,
observou-se a presença de tungstênio (W). Este material é principal constituinte do substrato
da ferramenta. Além disso, verifica-se também a presença de material da peça aderido à
região da quebra (Fe). Machado e Silva (2004) afirmam que a isenção de impurezas e óxidos
na superfície recém formada (lascada) quando submetida à elevadas temperaturas favorece
esta interação.
Abele; Sahm e Schulz (2002) compararam os desgastes e/ou avaria de ferramentas de
PCBN utilizadas em operações de torneamento e fresamento no ferro fundido cinzento e
vermicular. O fim de vida da ferramenta na usinagem do ferro fundido vermicular também é
determinado pelo lascamento e/ou a quebra da aresta de corte. Bagetti (2009) também
identificou lascamentos e quebras na aresta de corte ao usinar o ferro fundido vermicular
utilizando fresas com insertos de metal duro classe K15 e cerâmica classe K10. Segundo os
autores, este fenômeno é considerado comum durante a usinagem do ferro fundido
vermicular.
Já na segunda aresta de corte, detalhe “B” da Figura 39, a principal característica é o
desgaste abrasivo na superfície de folga. Esta afirmação está baseada na presença de sulcos
paralelos e alinhados com a direção da velocidade de corte na superfície de folga da
ferramenta. O desgaste abrasivo caracteriza-se pelo deslizamento de partículas de elevada
52
dureza contra a superfície da ferramenta. Estas partículas (inclusões) duras são principalmente
provenientes do material usinado (CHILDS et al., 2000). O contato destas partículas, em
elevada pressão e temperatura causadas pela usinagem, com a superfície de folga promove os
riscos abrasivos mostrados na Figura 39 detalhe “B”.
Uma explicação para as diferentes características de desgaste e avarias, apresentadas
nos detalhes “A” e “B” da Figura 39, é relacionada ao tempo de contato entre peça e
ferramenta. É importante ressaltar que cada rosca usinada tem de 27 filetes (40 mm de
espessura da placa). Como o posicionamento da extremidade da ferramenta é realizado abaixo
da superfície da placa, a primeira aresta é responsável pela formação de 19 filetes (o
posicionamento é realizado 11 mm abaixo da superfície). As demais arestas de corte são
responsáveis pela usinagem de apenas dois filetes da rosca. Ainda, na primeira volta, a
interpolação helicoidal é cônica, o que reduz o carregamento na entrada. Após estas duas
primeiras voltas, o contato destas arestas subseqüentes a primeira acontece somente em um
pequeno ângulo quando comparado com o contato da primeira aresta, pois o perfil da rosca já
está usinado. Nestes casos, a probabilidade de choque destas arestas de corte com partículas
duras é reduzida expressivamente quando comparada a primeira aresta de corte. Esta é a
explicação para a as diferentes características de desgaste e avarias entre a primeira e demais
arestas de corte nas ferramentas de múltiplas arestas.
Com o aumento da velocidade de corte de 85 m/min para 100 m/min não ocorreram
alterações significativas nos mecanismos de desgaste e avaria conforme pode ser visto na
Figura 40. Esta figura mostra a superfície de folga da primeira, segunda e terceira aresta de
corte da ferramenta de múltiplas arestas utilizada com velocidade de corte de 100 m/min.
53
Figura 40 - Superfície de folga da ferramenta múltiplas arestas com vc = 100 m/min.
As imagens da 1ª e 2ª aresta de corte caracterizam a quebra da ferramenta. Análises
EDS na região de avaria da primeira aresta de corte demonstram o substrato da ferramenta
exposto (presença de tungstênio). Contudo, o tamanho da avaria no primeiro dente é
expressivamente maior do que a ocorrida no segundo. Essas características apresentadas nas
primeira e segunda arestas suportam a explicação mencionada anteriormente que a severidade
do corte no primeiro dente é muito maior do que nos demais.
Para facilitar a visualização da 3ª aresta de corte, a região da aresta identificada pelo
detalhe “A” foi ampliada. Isto possibilita a observação do desgaste abrasivo na superfície de
folga da ferramenta, caracterizado pela presença de sulcos paralelos e alinhados com a direção
da velocidade de corte. Contudo, observa-se um microlascamento na superfície de folga da
ferramenta, o qual pode ser explicado por choques com partículas de elevada dureza, uma vez
que, com a primeira e a segunda arestas de corte quebradas, a terceira aresta passa a ter maior
carregamento neste momento.
Com a utilização de ferramentas de aresta única, a presença de avarias como as
mostradas nas ferramentas de múltiplas arestas impossibilitariam a passagem do calibrador
54
passa na entidade usinada. A Figura 41 mostra a superfície de folga da ferramenta de aresta
única com velocidade de corte de 85 m/min.
Figura 41 – Superfície de folga da ferramenta de aresta única com vc = 85 m/min.
A imagem da esquerda na Figura 41 mostra a presença de quebras na superfície de folga
da ferramenta. Análises EDS ajudam na caracterização destes microlascamentos: na região da
quebra identifica-se elevados teores de tungstênio (material do substrato), enquanto em uma
região mais afastada do microlascamento identifica-se elevados teores de titânio e alumínio
(material da cobertura da ferramenta). Com o objetivo de promover maiores informações da
avaria, uma região (detalhe “A”) foi ampliada na imagem do lado direito da Figura 41. Nesta
imagem ficam evidentes as fraturas na superfície de folga. Além disso, não há evidências de
trincas de origem térmica, as quais poderiam aparecer em função do corte interrompido e da
presença do fluido de corte no processo. Novamente, a explicação para estas avarias na aresta
de corte são os choques com partículas duras, tais como carbonetos e nitretos presentes no
material usinado.
Informações adicionais sobre a avaria ocorrida na aresta de corte podem ser
identificadas com imagens da superfície de saída da ferramenta. A Figura 42 mostra a
superfície de saída da ferramenta de aresta única utilizada com velocidade de corte de 85
m/min.
55
Figura 42 – Superfície de saída da ferramenta de aresta única com vc = 85 m/min.
A imagem da esquerda na Figura 42 mostra o perfil de um dente da ferramenta após
atingido o critério de fim de vida. Nota-se que as regiões do contorno do dente, próximas à
extremidade da aresta de corte, têm a ausência da cobertura. Esta região caracteriza-se pela
presença do material da peça. Uma análise EDS na extremidade da superfície de saída
identifica elevados teores de ferro. Esta identificação demonstra a adesão de material do
corpo-de-prova na ferramenta. Este fenômeno se deve a forte interação entre o material
usinado e o substrato da ferramenta, principalmente diante de elevadas temperaturas e
superfícies isentas de impurezas e óxidos na região recém formada pelo microlascamento
(MACHADO e SILVA, 2004).
Nota-se que no detalhe “A” da Figura 42 (ampliação da extremidade da aresta de corte)
os microlascamentos têm um aspecto de “escamas”. Uma explicação para esta característica é
a remoção de regiões em diferentes momentos durante o corte. Como a remoção de material
ocorre de forma mais acentuada próximo a extremidade da aresta, o ângulo de saída torna-se
mais negativo ao longo da usinagem. Ainda, esta análise da superfície de saída da ferramenta
promove mais subsídios para a determinação do final de vida da ferramenta. A avaria na
região da ferramenta responsável pela formação do perfil dos filetes altera o ângulo destes
filetes e reduz o diâmetro primitivo da rosca usinada. A progressão deste fenômeno dificulta a
passagem do lado “passa” do calibrador até o momento em que a peça tem suas dimensões
comprometidas.
O aumento da velocidade de corte com a utilização da ferramenta de aresta única
também não promoveu significativas diferenças no aspecto da aresta de corte no instante de
final da vida. A Figura 43 mostra a superfície de folga da ferramenta de aresta única com
velocidade de corte de 100 m/min.
56
Figura 43 - Superfície de folga da ferramenta de aresta única com vc = 100 m/min.
Os fenômenos ocorridos são os mesmos discutidos anteriormente para a ferramenta de
aresta única e com vc = 85 m/min. Contudo, os resultados de menor vida da ferramenta
possuem forte associação com a presença de partículas de carbonetos e nitretos de titânio e
M3C, juntamente com incrementos de velocidade de corte, acelerando o desgaste e avarias nas
ferramentas. Para a ferramenta de aresta única com velocidade de corte de 100 m/min,
conforme mostrado na Figura 44, os fenômenos ocorridos na mesma ferramenta com
velocidade de corte de 85 m/min podem ser reproduzidos.
Figura 44 - Superfície de saída da ferramenta de aresta única com vc = 100 m/min.
57
Em comparação com os trabalhos pesquisados, o principal mecanismo de desgaste
encontrado foi o abrasivo, além das quebras. Suporta-se a hipótese que os lascamentos e
quebras foram geradas por choques das arestas de corte da ferramenta com partículas de
carboneto e nitreto de titânio provenientes do processo de fundição do ferro fundido
vermicular. Nos trabalhos pesquisados, Bagetti (2009), que estudou corte intermitente em
ferro fundido vermicular, característico de operações de fresamento, verificou que o
mecanismo de desgaste predominante é o abrasivo, porém com lascamentos provenientes de
choques da ferramenta com partículas duras contidas no material usinado. Oliveira (2008) e
Mocellin (2002) também afirmam que a abrasão é o mecanismo de desgaste predominante.
Entretanto, o lascamento não é observado por se tratar de processos de furação, os quais são
caracterizados como corte contínuo.
4.5 Esforços de corte
Com o objetivo de facilitar o entendimento de operações de fresamento utilizando fresas
de topo, alguns trabalhos de modelamento de forças de usinagem têm sido desenvolvidos.
Entretanto, estes trabalhos não podem ser aplicados ao fresamento de roscas por interpolação
helicoidal, pois os modelos não representam suas principais características, que são o
sincronismo entre os movimentos de rotação e deslocamento da ferramenta (ARAUJO et al.,
2005).
O comportamento dos esforços de corte, principalmente na entrada da ferramenta,
possui características distintas para cada ferramenta utilizada nesta pesquisa. Com a utilização
da ferramenta de aresta única, os esforços de corte mostram um incremento gradual em suas
componentes na primeira volta até atingir a estabilização nas demais voltas. Por outro lado,
com a utilização da ferramenta de múltipla aresta, os esforços de corte tendem a um valor
máximo na primeira volta e, posteriormente, ocorre a redução do valor até um patamar
inferior durante a continuidade do corte. Os fatores que determinam este comportamento
serão descritos ao longo de cada análise deste item. Além disso, com o objetivo de facilitar a
compreensão dos fenômenos ocorridos durante a usinagem, a força de usinagem foi dividida
em três componentes ortogonais. Posteriormente, realizou-se a comparação da resultante
(força de usinagem) para cada condição utilizada.
A Figura 45 mostra a orientação dos eixos de cada componente em relação ao corpo-de-
prova.
58
Figura 45 – Orientação das componentes de força em relação ao corpo-de-prova
Para melhor compreensão da cinemática do processo de usinagem de roscas com
ferramenta de aresta única, dividiu-se o tempo de operação em quatro estágios. A primeira
etapa é o posicionamento da ferramenta no centro do furo a uma distância de dois filetes da
face do material. O segundo estágio se inicia com a interpolação helicoidal cilíndrica, ainda
com a ferramenta fora do furo. Neste caso, com furos passantes, esta etapa conclui o
roscamento completo do furo e a passagem da ferramenta da face inferior do corpo-de-prova.
A ferramenta é novamente posicionada no centro do furo no terceiro estágio, como
preparação para a saída e o quarto estágio é a conclusão do processo com a saída da
ferramenta do corpo-de-prova. Como pode ser observado na Figura 45, a componente “z”
corresponde ao eixo axial do furo. Por outro lado, as componentes “x” e “y” formam um
ângulo reto e correspondem aos eixos radiais do furo. A Figura 46 mostra a força em cada
componente descrita para a usinagem da rosca com ferramenta de aresta única.
59
Figura 46 – Forças medidas para ferramenta de aresta única com vc = 85 m/min
Observa-se na Figura 46 que as componentes “x” e “y” comportam-se de forma cíclica,
descrevendo aproximadamente uma senóide durante a usinagem. Os sinais estão dispostos
acima e abaixo da linha de referência “0” das componentes “x” e “y”, os quais demonstram os
movimentos de interpolação da ferramenta em relação aos furos. A componente “z”, também
mostra as forças nos dois sentidos do eixo caracterizadas principalmente por forças de
compressão e tração realizadas na superfície do corpo-de-prova e, por conseqüência, na face
do dinamômetro.
Diferentemente da usinagem com ferramenta de múltiplas arestas, o percurso da
ferramenta por interpolação helicoidal inicia-se antes que a aresta de corte toque no material
do corpo-de-prova. A ferramenta percorre, a cada volta da ferramenta, o passo da rosca (1,5
mm) na direção axial. Para facilitar a visualização do comportamento da ferramenta, a Figura
47 mostra em três passos a usinagem do primeiro filete de rosca ou entrada da rosca.
60
Figura 47 – Instantes da primeira volta da ferramenta de aresta única
Os instantes iniciais e finais mostrados no detalhe “A” da Figura 47 indicam os
engajamentos em que a ferramenta se posiciona em relação ao furo do corpo-de-prova durante
a usinagem do primeiro filete de rosca. Como a quantidade de material retirado aumenta de
forma gradativa, as forças nas três componentes também aumentam durante a entrada da
ferramenta. Este fato explica o crescimento das forças nas três componentes ortogonais
durante a entrada da ferramenta. Após usinagem do primeiro filete ou entrada da rosca, o
carregamento da ferramenta torna-se cíclico, mantendo uma intensidade de força em torno de
50N na componente “z” durante todo o comprimento roscado. Contudo, ao atingir o final do
comprimento roscado o inverso do fenômeno observado na entrada ocorrerá na saída da
ferramenta. Com a redução da quantidade de material a ser usinado, a intensidade das forças
reduzirão nas três componentes de forças.
A Figura 46 mostra um comportamento do sinal aparentemente contínuo, em função da
proximidade de pontos na figura. Entretanto, com o objetivo de facilitar o entendimento do
comportamento dos esforços de corte, o detalhe “A” da Figura 46 foi ampliado na Figura 48.
Após os picos de forças, observam-se linhas no eixo “x”, as quais representam o tempo em
que a ferramenta gira em vazio, não havendo contato com o material do furo. Durante o
intervalo de tempo do detalhe “A”, nota-se que a ferramenta toca o material do corpo de prova
seis vezes. Com a condição de vc = 85 m/min, a ferramenta tem 1689 rotações por minuto.
61
Isto está diretamente relacionado com o intervalo de cada passe da aresta de corte da
ferramenta no corpo de prova, que segundo a Figura 48 é de 35 ms e o tempo de contato
ferramenta/peça, ou seja, o tempo efetivo de corte por volta é de 12 ms para cada evento.
Figura 48 – Componentes da força de usinagem com ferramenta de aresta única com vc
= 85 m/min (Detalhe “A” da Figura 46)
Para se determinar a força de usinagem durante um momento da operação, traçou-se
uma linha passando pelas componentes “z”, “x” e “y”. Como referência, utilizou-se o ponto
de maior intensidade da componente “z”. Esta análise foi realizada em cada condição e os
resultados mostrados na Figura 53.
Com relação aos picos de forças mostrados em cada componente na Figura 48, é notável
a diferença entre seus valores máximos. Este fenômeno ocorre devido à microestrutura
62
presente nos ferros fundidos. Conforme Diniz; Marcondes; Coppini (2006), o ferro fundido é
um material frágil, caracterizado pela geração de cavacos na forma de pequenas partículas, os
quais são formados por fragmentos retirados da peça que está sendo usinada. Classificados
como cavacos de ruptura ou descontínuos, estes cavacos não são capazes de suportar grandes
deformações. A fragmentação dos cavacos é promovida pela propagação de trincas por toda a
extensão do plano de cisalhamento primário, o que promove variações na força de usinagem
durante a operação. É exatamente este o aspecto identificado na Figura 48. Além disso, a
heterogeneidade microestrutural e as inclusões de partículas extremamente duras (carbonetos
e nitretos de titânio) também contribuíram para o aumento da dispersão dos resultados.
Conforme Araujo et al. (2005), o processo de usinagem de roscas por interpolação
helicoidal utilizando ferramentas de múltiplas arestas pode ser dividido em cinco estágios.
Para melhor entender as figuras mostradas a seguir, é importante que se descreva novamente
as etapas do processo. O primeiro estágio refere-se ao posicionamento no centro do furo e
introdução da ferramenta no furo, deixando dois filetes acima da face do corpo-de-prova. O
segundo estágio inicia-se com a interpolação helicoidal cônica até o atingimento do diâmetro
final da rosca. Na terceira etapa, sem que haja interrupção, se inicia a interpolação helicoidal
cilíndrica usinando a rosca até o final do seu comprimento. O quarto estágio é caracterizado
por uma interpolação helicoidal cônica novamente, a qual tem a função de posicionar a
ferramenta no centro da rosca, preparando a mesma para a saída que é a quinta etapa, onde a
ferramenta é posicionada acima da face do corpo-de-prova.
A Figura 49 mostra as componentes “x”, “y” e “z”, assim como o comportamento do
processo durante a entrada da ferramenta no furo. A primeira volta da ferramenta é
representada pela “entrada da rosca” (interpolação helicoidal cônica) e demais voltas da
ferramenta (interpolação helicoidal cilíndrica).
63
Figura 49 – Forças medidas para ferramenta de múltiplas arestas com vc = 85 m/min
Conforme mostrado anteriormente, com a ferramenta inserida no furo, iniciava-se um
ciclo de interpolação helicoidal cônica conforme mostrado na Figura 49 identificado como “1
volta” onde nota-se o aumento dos esforços principalmente nos eixos “x” e “y”.
Posteriormente, sem que haja interrupção e com a ferramenta já posicionada no diâmetro
final, inicia-se a interpolação helicoidal cilíndrica, entre a “1 volta” e a “2 volta”. Neste
momento, o inserto utiliza todas as arestas de corte. Nota-se que este é um ponto crítico do
processo, conforme ilustrado na Figura 49, a “2 volta” devido a grande intensidade dos
esforços nas três componentes medidas. Entretanto, ao atingir o final desta etapa, inicia-se o
ciclo demonstrado como a “3 volta”, no qual as forças se mantém em um patamar reduzido
em relação ao anterior.
64
Para facilitar o entendimento dos fenômenos ocorridos durante a usinagem com
ferramenta de múltiplas arestas de corte com vc = 85 m/min, o detalhe “A” mostrado na
Figura 49 é ampliado na Figura 50.
Figura 50 – Componentes da força de usinagem com ferramenta de múltipla aresta com
vc = 85 m/min (Detalhe “A” da Figura 49)
A Figura 50 mostra que para as componentes “x” e “y” da ferramenta de múltiplas
arestas de corte apresenta comportamento similar a ferramenta de aresta única. Entretanto, a
componente “z” mostra um fenômeno diferente do observado na Figura 48. O fenômeno que
parece uma inversão de sentido, trata-se de diferentes momentos de contato entre a ferramenta
corta o material.
65
Com o objetivo de comparar o comportamento dos esforços na componente “z”, a
Figura 51 compara o sinal em cinco ciclos para as ferramentas de aresta única e múltipla
aresta durante a entrada da ferramenta e durante o regime de corte.
Figura 51 – Comparação entre ferramentas na componente z com vc = 85 m/min.
Conforme a Figura 51, nota-se que durante a entrada da ferramenta de aresta única a
intensidade na componente “z” é consideravelmente menor do que a ferramenta de múltipla
aresta. O principal motivo está associado ao maior contato observado na ferramenta de
múltipla aresta, ilustrado pelo contorno em vermelho na ilustração à direita. Além disto, é
possível observar que o sentido do sinal, para ambas as ferramentas, está na mesma direção.
66
Contudo, durante o processo em regime, nota-se uma significativa diferença no
comportamento do sinal na ferramenta de múltipla aresta. O tempo de contato entre
ferramenta e corpo-de-prova é idêntico para as duas ferramentas. Como a velocidade de corte
para ambas as ferramentas é a mesma, o tempo efetivo de contato é 12 ms. Nota-se que os
picos das componentes da força de usinagem na ferramenta de aresta única coincidem com os
pontos de inflexão do sinal da ferramenta de múltipla aresta. Uma explicação para este
fenômeno ocorrido nas ferramentas de múltipla aresta é o efeito do contato das arestas que
efetivamente não participam do corte. Após a primeira volta de interpolação helicoidal
cilíndrica, somente a primeira aresta realiza o corte, como demonstrado na Figura 51, existe
uma força comprimindo a ferramenta. Esta força promove que as arestas que não participam
do corte acentuem um contato mais expressivo na parte superior do perfil usinado. Este
contato por período muito curto inverte o sentido da componente “z”da força de usinagem até
que as arestas finalizem o engajamento com a peça.
Araujo et al. (2005) estudaram o comportamento dos sinais para o processo de
roscamento através de interpolação helicoidal cilíndrica. Apesar de não detalhar a entrada da
ferramenta no corpo-de-prova, o modelo matemático determinado se aproximou do sinal real
obtido. Para validar o modelo, foram usinadas roscas M10 x 1,5 em alumínio 6061 com
diferentes tipos de hélices de ferramentas. O sistema de aquisição utilizado foi similar ao
desta pesquisa e as forças de corte estão representadas na Figura 52.
Figura 52 – Comparação de forças de corte simulado e experimentado (adaptado de
ARAUJO et al., 2005).
Dois pontos chamam atenção nos resultados apresentados conforme a Figura 52. O
primeiro é a diferença nos valores de Fx e Fy, pois caso estejam no mesmo plano deveriam
promover valores similares. Os resultados apresentados por Araujo et al. (2005) divergem dos
encontrados nesta pesquisa. O segundo ponto refere-se a presença de hélice na ferramenta.
67
Esta modificação geométrica distribui os esforços de usinagem durante o período de corte
minimizando regiões com valores nulos de esforços. Como pode ser observado na Figura 50,
existem grandes períodos sem corte.
Como não houveram alterações significativas no comportamento dos esforços de
usinagem durante a variação de velocidade de corte (85 e 100 m/min), a Figura 53 mostra a
força de usinagem para cada ferramenta e velocidade de corte.
Figura 53 – Comparativo de forças de usinagem entre ferramentas e velocidade de corte
Conforme mostrado na Figura 53, a determinação da força de usinagem foi realizada
com base na média de cinco amostras das três componentes ortogonais (Fx, Fy, Fz). Os valores
utilizados nesta determinação foram obtidos durante os ensaios em um de pico na componente
“z” e baseado na Equação 1 (FEITOSA, 1983).
Equação 1
Na ferramenta de múltiplas arestas houve a necessidade de medir os sinais durante a
entrada da ferramenta devido ao alto carregamento observado durante os ensaios. As linhas
acima das barras mostram a dispersão dos valores medidos em mais ou menos 1 desvio
padrão.
222zyxu FFFF ++=
68
Nas ferramentas de aresta única não observam diferenças significativas na força de
usinagem com a alteração da velocidade de corte. Já na ferramenta de múltiplas arestas, outro
fato pode ser notado: uma diferença na força de usinagem entre a entrada da ferramenta e o
processo em regime, independentemente da velocidade de corte utilizada. Como mostrado
anteriormente na Figura 51, o engajamento na primeira volta se dá com inúmeras arestas,
enquanto os demais filetes que não foram usinados na primeira volta da interpolação, são
usinados com apenas uma única aresta (primeira aresta). Ainda há grande variação nas
componentes Fx e Fy de aproximadamente três vezes, contudo na componente Fz o valor é
praticamente o mesmo indiferente da condição de entrada ou regime da ferramenta.
69
5 Conclusões e sugestões para trabalhos futuros
Baseado nos resultados obtidos nos ensaios realizados durante os experimentos, análises
de desgaste e avarias das ferramentas utilizadas e ensaios de forças, a usinagem de roscas
internas pelo processo de interpolação helicoidal em ferro fundido vermicular possibilita as
seguintes conclusões:
a) a velocidade de corte tem influência significativa na vida da ferramenta,
independentemente do tipo de ferramenta utilizada;
b) o tipo da ferramenta tem influência significativa na quantidade de roscas usinadas;
c) a avaria por microlascamento e/ou lascamento é o principal fator que determina o
final de vida da ferramenta;
d) o comportamento da força de usinagem é distinto para cada tipo de ferramenta. Para
ferramenta de aresta única, a força é menor durante a entrada da ferramenta e se mantém em
um patamar mais elevado durante o processo em regime. Para ferramenta de múltipla aresta, a
força de usinagem apresenta um elevado valor durante a entrada da ferramenta (uma volta) e
se mantém em níveis muito menores durante o processo em regime.
Como sugestões para trabalhos futuros, apresenta-se os seguintes itens:
- testar ferramenta com múltipla aresta no mesmo nível conforme mostrado na Figura
26 (esquerda)
- a usinagem de roscas em aços de elevada dureza torna-se inexeqüível utilizando o
processo de roscamento com machos de corte. Uma alternativa é testar ferramentas de usinar
roscas com interpolação helicoidal em aços temperados e revenidos (elevada dureza) de modo
a viabilizar a usinagem
- testar conceito de ferramenta em materiais que apresentam tendência a formação de
aresta postiça de corte em machos rígidos, como o alumínio, com o objetivo de melhorar a
qualidade superficial da rosca usinada
- utilizar recurso de compensação no diâmetro interpolado para maximizar a quantidade
de roscas usinadas.
70
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