44
Revista Neurociências VOLUME 9 NÚMERO 1 2001 Universidade Federal de São Paulo Disciplina de Neurologia Escola Paulista de Medicina JUNTA EDITORIAL EDITOR-EXECUTIVO JOSÉ OSMAR CARDEAL EDITORES ASSOCIADOS ALBERTO ALAIN GABBAI ESPER ABRÃO CAVALHEIRO FERNANDO MENEZES BRAGA CONSELHO EDITORIAL ACARY DE SOUZA BULLE DE OLIVEIRA CARLOS JOSÉ REIS DE CAMPOS GILBERTO MASTROCOLA MANZANO HENRIQUE BALLALAI FERRAZ JOÃO ANTONIO MACIEL NÓBREGA JOÃO BAPTISTA DOS REIS FILHO LUIZ CELSO PEREIRA VILANOVA MARCIA MAIUMI FUKUJIMA PAULO HENRIQUE FERREIRA BERTOLUCCI SUZANA MARIA FLEURY MALHEIROS

Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

  • Upload
    others

  • View
    0

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

Revista

NeurociênciasVOLUME 9 NÚMERO 1 2001

Universidade Federal de São PauloDisciplina de Neurologia

Escola Paulista de Medicina

JUNTA EDITORIAL

EDITOR-EXECUTIVO

JOSÉ OSMAR CARDEAL

EDITORES ASSOCIADOS

ALBERTO ALAIN GABBAI

ESPER ABRÃO CAVALHEIRO

FERNANDO MENEZES BRAGA

CONSELHO EDITORIAL

ACARY DE SOUZA BULLE DE OLIVEIRA

CARLOS JOSÉ REIS DE CAMPOS

GILBERTO MASTROCOLA MANZANO

HENRIQUE BALLALAI FERRAZ

JOÃO ANTONIO MACIEL NÓBREGA

JOÃO BAPTISTA DOS REIS FILHO

LUIZ CELSO PEREIRA VILANOVA

MARCIA MAIUMI FUKUJIMA

PAULO HENRIQUE FERREIRA BERTOLUCCI

SUZANA MARIA FLEURY MALHEIROS

Page 2: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

2

Rev. Neurociências 9(1): 2, 2001

NORMASPARA PUBLICAÇÕES

A Revista Neurociências é voltada àNeurologia e às ciências afins. Publicaartigos de interesse científico e tecno-lógico, feitos por profissionais dessasáreas, resultantes de estudos clínicos oucom ênfase em temas de cunho prático.Os artigos devem ser inéditos e ficasubentendido que serão publicadosexclusivamente nesta revista, com o quese comprometem seus autores. A JuntaEditorial da revista reserva-se o direitode avaliar, aceitar ou recusar artigos.Quando aceitos, sugerir modificaçõespara aprimorar seu conteúdo, se neces-sário, aperfeiçoar a estrutura, a redação ea clareza do texto. São aceitos artigos emportuguês e inglês. Para publicação, seráobservada a ordem cronológica de acei-tação dos artigos. Provas tipográficasserão fornecidas em casos especiais.Poderão ser oferecidas separatas dosartigos, responsabilizando-se os autorespela despesa de sua tiragem. Os artigossão de responsabilidade de seus autores.Para avaliação, devem ser encaminhadosao Editor Executivo em disquete e pode-rão ser utilizados editores de texto “Word”para “Windows 95”, fonte Times New Ro-man, tamanho 12 e espaço duplo; alter-nativamente no formato “texto.txt”. De-verá também ser enviada uma cópia dotexto original conforme digitado. Adotaras recomendações abaixo.

Título: em português e em inglês,sintético e restrito ao conteúdo, mascontendo informação suficiente paracatalogação.

Autor(es): referir nome(es) e sobre-nome(s) do modo como preferir paraindexação, seu grau e posição. Referir ainstituição em que foi feita a pesquisaque deu origem ao artigo e referir o títulomaior de cada autor ou grupo de autores,

ex.: * Professor-adjunto, ** Pós-graduan-do, *** Residente. Identificar o endereçopara correspondência.

Resumo e Summary: devem permitiruma visão panorâmica do trabalho,contendo objetivos, métodos, resultadose conclusões. Nos artigos com casuística,não exceder 250 palavras. Nas comu-nicações breves ou relato de casos, nãoexceder 150 palavras.

Unitermos e keywords: referir após oResumo e o Summary, respectivamente.

Texto: apresentar a matéria do artigoseqüencialmente: introdução, material(casuística) e métodos, resultados,comentários (discussão e conclusões),referências bibliográficas, eventualmenteagradecimentos, suporte financeiro. Nãorepetir no texto dados que constem detabelas e ilustrações, bem como de suaslegendas. O texto deverá ser redigido emespaço duplo; a cada início de parágrafo,dar cinco espaços. Numerar as páginasno alto e à direita.

Tabelas: até cinco, apresentadas empáginas separadas. Não separar com linhashorizontais ou verticais os dados quecontêm. De cada uma, devem constar seunúmero de ordem, título e legenda.

Ilustrações: até duas figuras (gráficos oufotos), com tamanho não superior a 6 cm x9 cm cada uma. Gráficos devem serencaminhados, de preferência suas fotos.Fotos em preto e branco bem contrastadas;eventuais detalhes com setas, números ouletras. Identificar cada ilustração com seunúmero de ordem, nome do autor e doartigo, com etiqueta colada no verso e nelamarcada na parte superior. Não grampear,nem colar as ilustrações, embalar cada umaem separado. Encaminhar separadamenteas respectivas legendas. Ilustrações repro-

duzidas de textos já publicados devem seracompanhadas de autorização de re-produção, tanto do autor como da pu-blicadora. Ilustrações em cores podem serpublicadas; dado seu custo elevado, adespesa será de responsabilidade dosautores, assim como o custo por númerode tabelas e ilustrações acima dos men-cionados e desde que sua publicação sejaautorizada pela editora. As fotos não serãodevolvidas aos autores. Manter os ne-gativos destas.

Referências: até cerca de 30, restritas àbibliografia essencial ao conteúdo dotexto. Numerar consecutivamente asreferências na ordem de ocorrência notexto. O padrão de disposição das refe-rências segue as normas do IndexMedicus.

Artigos: Autor(es) – Título. Periódico,volume: página inicial – página final, ano.

Livros: Autor(es) ou editor(es), título,edição, se não for a primeira; se for ocaso, tradutor(es). Cidade, publicadora,ano, páginas inicial e final.

Capítulos de livros: Autor(es), título,demais dados sobre o livro como no itemanterior.

Resumos: Autor(es), título, publicadora,ano, páginas inicial e final e, entreparênteses, abstr.

Tese: Autor, título, cidade, ano, páginasinicial e final, nível (mestrado, doutoradoetc.), instituição.

Endereçar os trabalhos a:Prof. Dr. José Osmar CardealRua Borges Lagoa, 873 – cj. 11CEP 04038-031 – São Paulo, SPE-mail: [email protected]

Page 3: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

3

ÍNDICE

Rev. Neurociências 9(1): 3, 2001

EditorialArtigos

Espasmo Hemifacial ............................................................................................................................................... 5Vanderci BorgesHenrique Ballalai Ferraz

Cefaléia e Terapia de Reposição Hormonal ........................................................................................................... 9Carla SchultzeRenata Maria Lima de CarvalhoDeusvenir de Souza Carvalho

Intervenção Precoce na Criança com Baixa Visão ................................................................................................ 16Heloisa G. R. Gardon GagliardoMaria Inês R. S. Nobre

Metástases Cerebrais ........................................................................................................................................... 20Adrialdo José SantosClélia Maria Ribeiro FrancoLia Raquel Rodrigues BorgesSuzana Maria Fleury MalheirosAlberto Alain Gabbai

Neuroesquistossomose ........................................................................................................................................ 27Sandro Luiz de Andrade MatasRecomendações nos Casos de Aneurisma Cerebral Não Roto ....................................................................... 32Marcia Maiumi FukujimaAlberto Alain Gabbai

Relatos de casos

Neuro-Behçet: Relato de Dois Casos .................................................................................................................. 36Leopoldo Antônio PiresMarcelo Maroco CruzeiroMoisés Pereira PintoAndré Carvalho Felício

Acidente Vascular Cerebral Hemorrágico Secundário à Ruptura de Aneurisma Micóticoem Paciente com Endocardite Bacteriana por Estreptococo Gama-Hemolítico ................................................. 40

Gisele Sampaio SilvaRodrigo Meirelles MassaudPedro Araújo SampaioMarcelo OppermanAyrton Roberto MassaroHenrique Ballalai FerrazAlberto Alain Gabbai

...................................................................................................................................................................... 4

Page 4: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

4

Rev. Neurociências 9(1): 4, 2001

Mioclonias comprometendo a hemiface, no território do nervo facial – o espasmo hemifacial– são revistas em seus aspectos clínicos e terapêuticos no artigo “Espasmo Hemifacial”, dosautores Borges e Ferraz. Outro tema interessante é desenvolvido por Schultze et al., e tratada relação entre terapia de reposição hormonal e cefaléias.

Crianças com baixa visão necessitam de diagnóstico precoce e pronta intervenção paraproporcionar-lhes o melhor desenvolvimento possível, como pode ser notado em “IntervençãoPrecoce na Criança com Baixa Visão”, de Gagliardo e Nobre.

Freqüentemente nos deparamos com dificuldades sobre o diagnóstico e o tratamento dasmetástases cerebrais. Santos et al. nos fornecem valiosa contribuição para a solução dessasdúvidas no artigo “Metástases Cerebrais”. Outra dificuldade, particularmente sobre conduta,refere-se aos aneurismas cerebrais não rotos, abordados por Fukujima e Gabbai no tema“Recomendações nos Casos de Aneurisma Cerebral Não Roto”. Neuroesquistossomose e adoença de Behçet são outros temas revistos nesta ocasião.

O caso com correlação anatomoclínica deste fascículo trata de um aneurisma micóticopor estreptococo gama-hemolítico, que produziu acidente vascular cerebral hemorrágico.Nesse caso, a investigação sobre o sítio de entrada do germe verificou tratar-se, possivelmente,de um pólipo intestinal diagnosticado por colonoscopia.

José Osmar CardealEditor

EDITORIAL

Page 5: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

5

Rev. Neurociências 9(1): 5-8, 2001

Espasmo HemifacialVanderci Borges1

Henrique Ballalai Ferraz2

RESUMOO espasmo hemifacial é uma mioclonia segmentar da face, que acomete os músculos inervados pelo nervo facialipsilateral, de modo unilateral. Costuma ocorrer em adultos e é mais freqüente em mulheres. Pode estar associado auma compressão vascular do nervo facial em sua emergência, no tronco cerebral. O tratamento de primeira escolha faz-se com injeções de toxina botulínica A, com bons resultados.Unitermos: Espasmo hemifacial, compressão vascular, toxina botulínica.

Introdução

O espasmo hemifacial é uma mioclonia segmentarda face, que acomete os músculos inervados pelosétimo par craniano ipsilateral.

Antes do século XVIII, utilizava-se o termo tiquepara todos os movimentos anormais. Para dor,denominava-se tique doloroso.

Em 1988, Gowers (apud Ehni e Woltman1, 1945)fez a primeira descrição de espasmo hemifacial ediferenciou o tique do espasmo. Ele observou que oespasmo era usualmente clônico e que os músculosorbiculares dos olhos e também os estapédios eramos mais freqüentemente acometidos. É encontradosomente em adultos, sendo mais freqüente emmulheres, e apresenta causa orgânica.

O termo espasmo hemifacial foi escolhido por Ehnie Woltman1, em 1945. Esses autores fizeram a

1 Doutora em Neurologia. Médica do Setor de Distúrbios do Movimento da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.2 Doutor em Neurologia. Chefe do Setor de Distúrbios do Movimento da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.

ARTIGO

primeira grande revisão da literatura sobre o tema,avaliando 106 casos.

Manifestações clínicas

A média de idade varia de 45 a 53 anos1-3. Geral-mente se inicia nos músculos orbiculares dos olhos edepois se difunde àqueles da face e ao orbicular doslábios. Na maioria dos casos, é unilateral e as con-trações costumam ser síncronas, mas casos deacometimento bilateral ocasionalmente são encon-trados e com contrações assíncronas4. O espasmohemifacial é de ocorrência espontânea, mas pode serexacerbado ou desencadeado por contrações volun-tárias da face, estresse, fadiga e ansiedade1,5. Osmovimentos, em geral, persistem durante o sono.

Ainda podem ocorrer, associados ao espasmoclônico, espasmos tônicos prolongados ao se

Page 6: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

6

fecharem os olhos, estender a testa ou retrair o ânguloda boca. Com o decorrer do tempo, pode-se observarfraqueza facial5.

Outros nervos cranianos, como o acústico, podemtambém estar envolvidos. Nesses casos, são obser-vadas anormalidades no reflexo acústico do ouvidomédio6 e diminuição da acuidade auditiva do mesmolado do espasmo1.

A associação com neuralgia do trigêmeo podeocorrer, sendo denominada por Cushing de tiquedoloroso convulsivo.

A maior prevalência de hipertensão arterialassociada ao espasmo hemifacial tem sido descrita ediscute-se a hipótese de a hipertensão arterial ser umpossível fator de risco para o aparecimento doespasmo7.

Alguns casos familiares têm sido relatados, masesta não é a regra8-10.

Etiologia

O espasmo hemifacial idiopático é causado pelacompressão do nervo facial, por estruturas vascu-lares, e foi descrito pela primeira vez por Campbell eKeedy11.

Tumores cerebrais também podem estar as-sociados ao espasmo hemifacial, como epidermomas,meningiomas do ângulo ponto cerebelar12 e gliomaspontinos13. Uma causa rara é aneurisma no sistemavertebrobasilar14.

As artérias vertebrobasilares dolicoectásicaspodem ser encontradas, mas não é certo que estacondição seja suficiente para causar os espasmos15.

Raramente lesões nos ramos periféricos do sétimonervo costumam ser suficientes para provocarespasmos16, entretanto alguns casos são constatados17.

Tortuosidade vascular no ângulo ponto cerebelaripsilateral foi encontrada nos exames de neuroimagemdo estudo de Oliveira et al.7.

Especula-se que no espasmo hemifacial ocorrauma irritação no nervo facial por uma excitaçãoectópica e gera um potencial de ação local espon-tâneo, com transmissão “efáptica”, funcionandocomo se fosse uma falsa sinapse. A atividade ectópicapoderia ser desencadeada por irritação mecânica, poralterações na concentração regional de eletrólitos oupelo fluxo de corrente extracelular durante a passagemde impulsos nervosos nas fibras adjacentes18. Nosegmento em que há compressão, ocorreria umretardo na condução devido à desmielinização focalsegmentar19.

Estimulando-se os ramos zigomático e mandibulardo nervo facial, pode ser observada uma transmissão“efáptica”. Isso pode ser percebido devido à ocorrênciade uma resposta retardada nos orbiculares inferioresdos olhos e mentuais. Nesse mesmo sentido, pode serobservada a presença de resposta sincinética namusculatura mentual quando se pesquisa o reflexo dopiscamento. Nesse teste, estimula-se o ramo supra-orbital e registra-se a resposta ipsilateral no músculoorbicular dos olhos e na musculatura do mento. Após acirurgia de descompressão vascular no nervo, essasanormalidades eletrofisiológicas desaparecem20.

Outras evidências sugerem que o nervo facial éhiperexcitável. Por essa hipótese, somente a trans-missão “efáptica” e a excitação ectópica não seriamas únicas responsáveis. Foi encontrada uma hipera-tividade do primeiro componente do reflexo dopiscamento (R1), no lado afetado, que é de origempontina21,22. De acordo com essa hipótese, o espasmohemifacial é decorrente de uma descarga síncronado motoneurônio do núcleo do nervo facial. A lesãonervosa provoca perda de sinapses no soma da célulae nos dendritos e está associada a alterações daexcitabilidade do neurônio.

As duas teorias podem ser combinadas, sugerindoque uma lesão do nervo facial causaria excitaçãoectópica e transmissão “efáptica”, resultando ematividade nervosa ortodrômica e antidrômica, e quehaveria uma desaferenciação produzindo umareorganização da máquina neuronal dentro do nervofacial5.

Diagnóstico diferencial

O espasmo hemifacial deve ser diferenciado dealgumas entidades que causam movimentos involun-tários faciais.

Os espasmos pós-paralisia facial são contraçõesfixas dos músculos faciais, devido a uma inervaçãoaberrante do sétimo nervo após paralisia.

A miocimia facial caracteriza-se por movimentosondulantes dos músculos faciais.

A contratura facial, parética e espástica carac-teriza-se por paresia e contração contínua no ladoenvolvido, diferindo do espasmo hemifacial em queos músculos se relaxam entre as contrações, egeralmente está relacionada com doenças do troncocerebral.

O blefarospasmo é uma forma focal de distonia ecaracteriza-se por contrações mantidas dos músculosorbiculares dos olhos, bilateralmente, que melhoramdurante o sono.

Rev. Neurociências 9(1): 5-8, 2001

Espasmo Hemifacial

Page 7: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

7

Outra condição é a síndrome de Meige. Ela con-siste em uma associação de blefarospasmo com movi-mentos discinéticos da região inferior da face. Osmovimentos involuntários costumam ser assíncronosentre a porção superior e a inferior.

Os tiques também devem ser diferenciados dosespasmos. Os tiques diferem do espasmo hemifacialpor poder ser reproduzidos e suprimidos voluntaria-mente, também podendo manifestar-se nos músculosnão inervados pelo nervo facial.

A discinesia tardia ocorre após o uso de drogasque bloqueiam a transmissão dopaminérgica, e seusmovimentos podem ser coréicos e distônicos, ten-dendo a manifestar-se em ambos os lados da face,de modo assíncrono e irregular.

Tratamento

Os medicamentos utilizados, por via oral, para otratamento do espasmo hemifacial não têm mostradomuita eficácia. A carbamazepina foi utilizadainicialmente por Alexander e Moses23, em 46 paci-entes, e observou-se melhora dos sintomas em 35%deles. Com a utilização da gabapentina, pôde ser obtidauma resposta favorável em poucos casos24. Outrasmedicações, como o baclofeno e o clonazepam, nãomostraram benefício significativo.

Existem vários procedimentos cirúrgicos extra-cranianos, como injeções de álcool ou de cloreto deprocaína no nervo facial e rizotomias que resultamem benefícios transitórios1. Isso também se verificacom outros procedimentos, como a miotomia dosmúsculos orbiculares dos olhos, corrugadores,superciliares, próceros, que podem ter alguma eficáciano controle dos movimentos oculares, mas podemser seguidos de fraqueza muscular25.

As técnicas de anastomose do ramo distal do nervofacial, com a porção central do nervo acessórioespinhal, também têm mostrado pouco benefício1,25.

A cirurgia intracraniana tem sido utilizada há maisde 30 anos, pela descompressão microvascular donervo facial26-28, com melhora que variou de 81% a89% e recorrência de 6% a 10%27-29. As complica-ções mais freqüentes são disfunção permanente outemporária do nervo facial ou auditivo. Fraqueza facialé descrita em 3%30 e diminuição da audição variou de1% a 15%27-29.

A toxina botulínica é a primeira escolha para otratamento do espasmo hemifacial. A injeção da toxinaé realizada no tecido subcutâneo em 3 a 5 pontos aoredor da musculatura do orbicular dos olhos. Tambémsão injetados em 2 ou 3 pontos nos músculos orbi-

culares dos lábios e em 1 ponto no mento. A dosemédia utilizada varia de 30 a 35 UI do Botox® ou 100a 120 UI do Dysport®. Diversos estudos mostram quea melhora dos sintomas varia de 82% a 100%2,31-33. Osefeitos colaterais mais freqüentes são fraquezapalpebral, ptose e fraqueza da musculatura peribucal.Outros efeitos colaterais menos freqüentes sãolacrimejamento, secura ocular e diplopia.

O efeito benéfico dura cerca de 3 a 4 meses. Asinjeções repetidas são bem toleradas e não se observaperda do efeito durante anos de tratamento.

SUMMARY

Hemifacial spasmHemifacial spasm is a segmental myoclonus of

the face muscles innervated by the ipsilateral facialnerve. Women are more frequently affected. It isoften associated with vascular compression of thefacial nerve at its exit of brainsteim. Botulinumtoxin A is the treatment from choice with goodresults.

Keywords

Hemifacial spasm, vascular compression, botu-linum toxin.

Referências

1. Ehni G, Woltman HW. Hemifacial spasm: review of onehundred and six cases. Arch Neurol Psychiatry, 53:205-11, 1945.

2. Andrade LAF, Borges V, Ferraz HB, Azevedo-Silva SM.Experiência com aplicação de toxina botulínica A em115 pacientes. Arq Neuropsiquiatr, 55(3B):553-7, 1997.

3. Wang A, Jankovic J. Hemifacial spasm: clinical findingsand treatment. Muscle Nerve, 21:1740-7, 1998.

4. Tan EK, Jankovic J. Bilateral hemifacial spasm: a reportof five cases and a literature review. Mov Disord, 14:345-9, 1999.

5. Marsden CD. Peripheral movement disorders. In: MarsdenCD & Fahn S (eds.). Movement disorders 3. Butterworth-Heinemann Ltda., 1994, pp. 406-17.

6. Moller MB, Moller AR. Loss of auditory function inmicrovascular descompression for hemifacial spasm. JNeurosurg, 63:17-20, 1985.

7. Oliveira LD, Cardoso F, Vargas AP. Hemifacial spasmand arterial hypertension. Mov Disord, 14:832-5, 1999.

8. Carter JB, Patrinely JR, Jankovic J, McCrary III JA,Boniuk M. Familial hemifacial spasm. Arch Ophtalmol,108:249-50, 1990.

9. Coad JE, Wirtschafter JD, Haines SJ, Heros RC, PerroneT. Familial hemifacial spasm associated with arterialcompression of the facial nerve. J Neurosurg, 74:290-6,1991.

Rev. Neurociências 9(1): 5-8, 2001

Espasmo Hemifacial

Page 8: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

8

Rev. Neurociências 9(1): 5-8, 2001

10. Barbosa ER, Staut CC, Bacheschi LA, Bittar MS. Espasmohemifacial familiar: relato de 2 casos. Arq Neuropsiquiatr,56:111-5, 1998.

11. Campbell E, Keedy C. Hemifacial spasm: a note on theetiology in two cases. J Neurosurg, 4:342-7, 1947.

12. Auger RG, Piepgras DG. Hemifacial spasm associatedwith epidermoid tumors of the cerebellopontine angle.Neurology, 39:577-80, 1989.

13. Westra I, Drummond GT. Occult pontine glioma in apatient with hemifacial spasm. Can J Ophthalmol, 26:148-51, 1991.

14. Nagashima H, Orz Y, Okudera H, Kobayashi S, IchinoseY. Remission of hemifacial spasm after proximal occlusionof vertebrobasilar dissecting aneurysm with coils: casereport. J Clin Neurosci, 8:43-5, 2001.

15. Adler CA, Zimmerman RA, Savino PJ, Bernardi B, BosleyTM, Sergott RC. Hemifacial spasm: evaluation bymagnetic resonance imaging and magnetic resonancetomographic angiography. Ann Neurol, 32:502-6, 1992.

16. Martinelli P, Giuliani S, Ippoloti M. Hemifacial spasm duea peripheral injury of facial nerve: a nuclear syndrome?Mov Disord, 7:182-4, 1992.

17. Ruy H, Yamamoto S, Sugiyama K, Uemura K, MiyamotoT. Hemifacial spasm caused by vascular compressionof the distal portion of the facial nerve. Report of sevencases. J Neurosurg, 88:605-9, 1998.

18. Nielsen VK. Pathophysiology of hemifacial spasm: I.Ephatic transmission and ectopic excitation. Neurology,34:418-26, 1984a.

19. Nielsen VK. Pathophysiology of hemifacial spasm: II.Lateral spread of the supraorbital nerve reflex. Neurology,34:427-31, 1984b.

20. Nielsen VK, Jannetta PJ. Pathophysiology of hemifacialspasm: III. Effects of facial nerve decompression.Neurology, 34:891-7, 1984.

21. Eekhof JL, Aramideh M, Speelman JD, Devriese PP,Ongerboer De Visser BW. Blink reflexes and lateralspreading in patients with synkinesia after Bell´s palsyand in hemifacial spasm. Eur Neurol, 43:141-6, 2000.

22. Ishikawa M, Ohira T, Namiki J, Kobayashi M, Takase M,Kawase T, Toya S. Eletrophysiological investigation of

hemifacial spasm after microvascular decompression: Fwaves of the facial muscles, blink reflexes, and abnormalmuscle responses. J Neurosurg, 86:654-61, 1997.

23. Alexander GE, Moses H. Carbamazepine for hemifacialspasm. Neurology, 32:286-7, 1982.

24. Bandini F, Mazzella L. Gabapentin as treatment forhemifacial spasm. Eur Neurol, 42:49-51, 1999.

25. Wilkins RH. Hemifacial spasm: a review. Surg Neurol,36:251-77, 1991.

26. Kondo A. Follow-up results of microvascular decom-pression in trigeminal neuralgia and hemifacial spasm.Neurosurgery, 40:46-51, 1997.

27. Auger RG, Piepgras DG, Laws ER. Hemifacial spasm:results of microvascular decompression of the facialnerve in 54 patients. Mayo Clin Proc, 61:640-4, 1986.

28. McLauglin MR, Jennetta PJ, Clyde BL, Subach BR,Comey CH, Resnick DK. Microvascular decompressionof cranial nerves: lessons learned after 4.400 operations.J Neurosurg, 90:1-8, 1999.

29. Payner TD, Tew JM. Recurrence of hemifacial spasmafter microvascular decompression. Neurosurgery,38:686-90, 1996.

30. Lovely TJ, Getch CC, Jannetta PJ. Delayed facialweakness after microvascular decompression of cranialnerve VII. Surg Neurol, 50:449-52, 1998.

31. Geller BD, Hallett M, Ravits J. Botulinun toxin therapy inhemifacial spasm: clinical and electrophysiological studies.Muscle & Nerve, 12:716-22, 1989.

32. Jankovic J, Schwartz KS. Longitudinal experience withbotulinum toxin injections for treatment of blepharospasmand cervical dystonia. Neurology, 43:834-6, 1993.

33. Poungvarin N, Devahastin V, Viriyavejakul A. Treatmentof various movement disorders with botulinum A toxininjections: an experience of 900 patients. J Med AssocThai, 78:281-7, 1995.

Endereço para correspondência:Vanderci BorgesRua Baltazar da Veiga, 490CEP 04510-001 – São Paulo, SPE-mail: [email protected]

Espasmo Hemifacial

Page 9: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

9

ARTIGO

1 Médica Pós-graduanda do Departamento de Farmacologia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.2 Médica Residente da Disciplina de Neurologia do Departamento de Neurologia e Neurocirurgia da Escola Paulista de Medicina –

Unifesp.3 Professor-adjunto e Chefe do Setor de Investigação e Tratamento das Cefaléias da Disciplina de Neurologia, do Departamento de

Neurologia e Neurocirurgia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.

Cefaléia e Terapia de Reposição HormonalCarla Schultze1

Renata Maria Lima de Carvalho2

Deusvenir de Souza Carvalho3

RESUMONos países ocidentais, mais de 30% da população feminina está na pós-menopausa. Aproximadamente 30% dessasmulheres sofrem de sintomas clínicos típicos do climatério, tais como distúrbios vasomotores, associados com “ondas decalor”, sudorese noturna, insônia, alterações no humor, irritabilidade, tendência à depressão, necessitando de tratamentomédico. A terapia de reposição hormonal (TRH) abole sintomas específicos da menopausa em mais de 90% das pacientes.Sintomas inespecíficos, como cefaléias, respondem à TRH e ao tratamento com placebo igualmente bem. Neste trabalho,descreveremos tendências na prevalência de cefaléias em mulheres recebendo terapia de reposição hormonal (TRH), asrecomendações para prevenir ou melhorar os quadros de cefaléia e ainda os indícios de cefaléias como contra-indicações paraa TRH. A revisão bibliográfica dos últimos oito anos, sobre literatura científica pertinente, permitiu concluir que as cefaléiase enxaquecas são uma contra-indicação relativa ao uso de TRH; a via transdérmica parece ser mais aceita por pacientes quejá apresentavam crises de enxaqueca antes da terapia; não é fato comprovado que a TRH por si só cause enxaquecas; asenxaquecas não são constituídas de sintomas específicos da menopausa e podem estar relacionadas a várias outras causas;a relação risco/benefício favorece o uso de TRH.Unitermos: Cefaléia, enxaquecas, terapia de reposição hormonal.

Introdução

As informações dos trabalhos de Evans et al.1 ede Breckwoldt et al.2 permitem expor o que sesegue. A terapia de reposição hormonal (TRH) éfreqüentemente prescrita a mulheres em todo omundo, especialmente àquelas na pós-menopausa.Embora muitos benefícios bem estabelecidos sejamderivados dessa terapia, freqüentemente surgemvários problemas comuns e questões relacionadas aeste tratamento.

Por definição, menopausa significa o últimoperíodo menstrual, na vida de uma mulher, de-pendente da função ovariana. A vida útil dos ováriosé determinada por fatores genéticos e pelo númerode folículos primordiais. Durante a vida fetal, osovários contêm aproximadamente sete milhões de

folículos primordiais. Imediatamente antes do nasci-mento, esse número começa a declinar rapidamentee mesmo durante a infância, quando os ovários sãoendocrinologicamente não produtivos, a regressão dosfolículos continua. Defeitos no cromossomo X ousua ausência são associados a uma regressãoacelerada, resultando em menopausa prematura.Normalmente, a menopausa pode ser esperada porvolta dos 52 anos de idade. Devido à contínuaregressão, o ovário torna-se atrófico, sendo incapazde maturar folículos e, conseqüentemente, secretarestradiol. Apenas uma pequena quantidade deandrostenodiona é produzida e secretada pelas célulasintersticiais ovarianas. A androstenodiona pode seraromatizada na estrona, pelos tecidos periféricos, daqual somente uma pequena quantidade pode serposteriormente convertida a estradiol. Comparada à

Rev. Neurociências 9(1): 9-15, 2001

Page 10: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

10

fase pré-menopausa, a taxa de estradiol altera-se apósa menopausa em favor da estrona. A produçãodiminuída de estradiol e progesterona resulta emdesinibição das funções hipotalâmicas e pituitárias.O ovário atrófico é incapaz de suprimir a secreçãopituitária de hormônio folículo estimulante (FSH).Devido a este fato, a secreção de FSH após amenopausa é maior que a secreção de hormônioluteinizante (LH), resultando em concentraçõesperiféricas maiores de FSH. O estado de menopausapode ser definido como hipogonadismo hipergona-dotrópico, em virtude da falência ovariana primária.

Em aproximadamente 35% de todas as mulheres,os sintomas climatéricos da menopausa são ausentes;em outras 35%, os sintomas clínicos são reconhe-cidos, mas toleráveis. Nas trinta por cento restantes,os sintomas clínicos prejudicam o bem-estar,necessitando de tratamento médico; entretanto, orisco cardiovascular e o de osteoporose, devido àdeficiência estrogênica, devem ser considerados paratodas as mulheres. Alguns dos sintomas, como osvasomotores, podem persistir por mais de 5 anos em25% das mulheres climatéricas e durar o resto davida em uma pequena minoria.

Em mulheres na pós-menopausa, a terapia dereposição hormonal é recomendada para prevenção etratamento de osteoporose e para melhora da funçãocardiovascular, pela diminuição dos riscos de infartodo miocárdio. A terapia de reposição estrogênica podemelhorar a elasticidade dos tecidos vaginal, perineale periuretral, além da melhora dos sintomas de securavaginal e incontinência urinária. Essa terapia é usadatambém para aliviar os sintomas vasomotores e alte-rações de humor, associados à diminuição dos níveishormonais durante a menopausa.

A menos que o útero tenha sido removido cirur-gicamente, a TRH deve incluir um composto proges-togênico para evitar o desenvolvimento de hiperplasiaendometrial e o carcinoma endometrial. Entretanto,esses compostos progestogênicos não são recomen-dados para mulheres cujo útero tenha sido removido.

A TRH deve ser recomendada a mulheres na pós-menopausa, interessadas e com espontânea vontadeem recebê-la ou ainda em mulheres na pré-meno-pausa. A TRH deve ser instituída após uma completaanamnese médica, constituída de revisão do históricomédico, exame físico, incluindo exames das mamas,da pelve e de Papanicolaou, além de um mapeamentomamográfico (se não tiver sido realizado no anoanterior), para investigar algum carcinoma de mamaoculto. Os hábitos de vida da paciente, tais comotabagismo, ingestão de bebidas alcoólicas, regimes

alimentares, prática de exercícios, devem ser pes-quisados (dando atenção importante à ingestão decálcio). Análises laboratoriais, como testes de funçãohepática e níveis séricos de lipídios, podem serrealizadas. Os riscos potenciais, os benefícios, asalternativas e as escolhas de regimes de tratamentodevem ser discutidos com a paciente antes do inícioda terapia1.

Em geral, a TRH ideal é aquela cuja dosagemmínima de estrógeno efetivamente retarde a perdaóssea, diminua os fatores de riscos cardiovasculares,melhore os sintomas vasomotores e trate os sintomasda atrofia geniturinária. A dose ideal de progesteronaé aquela que proteje adequadamente o endométrio dahiperplasia e carcinomas, sem causar os efeitos nega-tivos dos progestogênios nos lipídios séricos. Osefeitos colaterais progestacionais, como depressão,ganho de peso e irritabilidade, são minimizados como tempo de uso.

As preparações de estrógeno e progesteronapodem ser administradas em vários regimes. Asformas mais comumente prescritas são “combinada-contínua” e “combinada-cíclica”. A primeira terapiatem duas vantagens distintas: maior aderência aotratamento (as pacientes acham mais fácil seguir oesquema de 2 pílulas/dia) e o potencial de escapes desangramento vaginal é menor com o passar do tempo.

As formas farmacêuticas existentes são pílulas deadministração por via oral (VO), emplastros deadministração transdérmica e cremes de aplicaçãovaginal. A administração transdérmica possui van-tagens em relação às outras duas vias: efeito mínimode primeira passagem pelo fígado; não há relato deefeitos adversos como tromboses; essa formamimetiza a função ovariana melhor do que a por VO;é mais bem tolerada em pacientes com náuseas oucefaléias ocasionais do tipo enxaqueca.

Endocrinologia do ciclo menstrual

O trabalho de Silberstein e Merriam3 mostra osaspectos neuroendocrinológicos do ciclo menstrual.A duração média do ciclo menstrual é de 28 dias,com uma variação de 25 a 32 dias. A maiorvariabilidade na duração do ciclo ocorre nos anosque seguem o início da menarca e aos que precedema menopausa. O funcionamento ovariano normalrequer a atividade coordenada de alguns órgãos ehormônios. Os hormônios sexuais são esteróidessintetizados em uma seqüência de etapas enzimáticasque fazem um rearranjo nos grupos laterais do núcleoesteróide. A progesterona é o precursor de ambos

Rev. Neurociências 9(1): 9-15, 2001

Cefaléia e Terapia de Reposição Hormonal

Page 11: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

11

hormônios sexuais masculinos (androgênio) efemininos (estrogênio). Como são compostosrelacionados, possuem alguma afinidade cruzada peloreceptor. A progesterona possui algumas propriedadesandrogênicas e alguns esteróides sintéticos e drogas,como a medroxiprogesterona e o danazol, possuematividade hormonal mista. As duas camadas celularesdo folículo ovariano dividem a responsabilidade pelaesteroidegênese. A camada externa – teca – respondeao hormônio luteinizante (LH) e realiza, a partir docolesterol, a síntese da progesterona e dos andro-gênios. A camada interna – granulosa – responde aohormônio folículo estimulante (FSH) e aromatiza osandrogênios a estrogênios. O ovário também produzas glicoproteínas, a inibina (produzida na granulosae células lúteas pelo estímulo do FSH, porém, emcontrapartida, sua ação é inibir seletivamente asecreção pituitária do FSH) e a ativina (que estimulaa liberação pituitária do FSH – ação oposta a inibina).No ciclo ocorrem, então, as oscilações hormonais,pico de LH, ovulação, etc. A cratera do folículoovulado e a granulosa remanescente organizam nocorpo lúteo, uma glândula evanescente que secretaprogesterona por cerca de 2 semanas e regride.

Ação da progesterona: no hipotálamo reduzprogressivamente a freqüência do pulso do fatorliberador de gonadotrofinas (GnRH), aumenta o “setpoint” de temperatura em meio grau Celcius e no úterocausa a secreção de muco pelo endométrio, proteínasespecíficas e substâncias vasoativas. A queda daprogesterona leva ao espasmo arterial e sangramento.As substâncias vasoativas incluem peptídeos eprostaglandinas.

Ação do estrogênio: agindo no hipotálamo,hipófise, glândulas mamárias, útero e vagina, afeta acontinência urinária, absorção de nutrientes emetabolismo geral, metabolismo mineral ósseo,pressão arterial e função cardiovascular, cognição ememória, organização e expressão dos ritmos diáriose progressão das doenças relacionadas com a idade.

Mecanismo de ação central do estrogênio:a) Ligação em receptores no cérebro responsável

pelo comportamento reprodutivo e liberação degonadotrofinas. Ativa receptores intracelulares de altaafinidade que são submetidos a um processo chamado“shuttling” nucleocitoplásmico, nos quais osreceptores saem do núcleo celular porém sãorapidamente puxados de volta em um processodependente de energia. O receptor de estrogênio (RE)quando ativado é um fator de transcrição. Na ausênciada ligação hormonal, o RE é um complexo oligo-mérico complexo contendo uma proteína “heats-

hock”, hsp 90. Após a ligação com o estrogênio, oRE faz difusão da hsp 90, dimeriza e liga-se com altaafinidade aos genes responsivos ao estrogênio. Istoresulta em transcrição por duas funções de ativaçãotranscricionais: TAF-1 e TAF-2. Eles também mo-dulam a expressão gênica e síntese de uma novaproteína no cérebro;

b) Ligação em membranas neuronais – os sistemasefetores que transduzem o sinal das interaçõesmembrana-esteróides incluem receptores deneurotransmissores, mecanismos de liberação e canaisiônicos. O estradiol possui rápidos efeitos nospotenciais de membranas dos neurônios pré-opticose septais, provavelmente através de sítios receptoresem membranas neuronais. O estradiol muda apermeabilidade para o potássio nos neurônios pós-sinápticos da amígdala medial. O estrogênio aumentao número de receptores de progesterona e musca-rínicos, modula receptores da serotonina, 5-HT1, 5-HT2 e beta adrenérgicos. O tratamento crônico comestrogênio diminui a sensibilidade do receptor 5-HT1na rafe pré-sinapticamente e melhora no hipocampopós-sinapticamente. Estas ações aumentam atransmissão serotoninérgica. A queda do estrogênioaumenta o número de receptores dopaminérgicos. Oestrogênio também afeta o sistema nervoso periférico(SNP), aumentando o local do campo receptivo dosmecanoreceptores trigeminais em ratos.

Mecanismo de ação central da progesterona:alguns metabólitos da progesterona e derivados sãoneuroesteróides que possuem potentes interaçõescom os receptores GABA. A progesterona estimula aliberação de dopamina do tecido estriado e de GnRHdo hipotálamo, modula os efeitos do estrogênio nosreceptores da serotonina, 5-HT1 e 5-HT2. Talvez atuenos receptores benzodiazepínicos (BZD). Muitosacreditam que os sintomas da síndrome de tensãopré-menstrual (TPM) estejam relacionados comalterações da progesterona na fase lútea tardia, porémmais provavelmente representam um distúrbioautonômico cíclico que é sinalizado pelo ciclo mens-trual, porém não pode dele ser dissociado. Alterna-tivamente, sintomas podem ser desencadeados peloseventos hormonais que ocorrem antes da fase lúteatardia, consistentes com relatos de supressão daovulação com análogos do GnRH que, geralmente,diminuem os sintomas da TPM.

O estrógeno e a progesterona possuem efeitos nosneurônios serotoninérgicos centrais e opióides, modu-lando ambos a atividade neuronal e a densidade dereceptores. O desencadeante primário da cefaléia as-sociado à menstruação parece ser a retirada do

Rev. Neurociências 9(1): 9-15, 2001

Cefaléia e Terapia de Reposição Hormonal

Page 12: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

12

estrogênio, mais que a manutenção de sustentadosníveis altos ou baixos. Contudo, alterações nos níveissustentados, como gravidez (aumento) e menopausa(diminuição), parecem afetar as cefaléias. Cefaléiasocorrendo com TPM parecem ser centralmentegeradas, envolvendo o ritmo que é parte essencial dosneurônios do sistema nervoso central (SNC), incluindotalvez sistemas serotoninérgicos moduladores da dor.

Evidências clínicas

A eficácia da TRH em vários sintomas da meno-pausa foi demonstrada em um estudo cruzado duplo-cego controlado por placebo. Os sintomas comoondas de calor, insônia, cefaléias e melancolia forampontuados e monitorizados. A partir desses dados,tornou-se evidente que os sintomas específicos demenopausa respondem bem à TRH. Os compostosestrogênicos são claramente mais eficazes que oplacebo; a melhora dos sintomas foi de 80% a 95%.Neste estudo, sintomas não-específicos, como cefa-léias, entretanto, responderam igualmente bem aoplacebo e à TRH2.

De acordo com uma revisão sobre a TRH e seuspossíveis efeitos colaterais e contra-indicações, reali-zada por Evans et al.1, concluiu-se que as cefaléiasdo tipo enxaqueca são uma contra-indicação relativaao uso de TRH (Quadro 1). Para pacientes em queos benefícios da TRH ultrapassam os riscos deexacerbação de enxaqueca, a TRH pode ser tentada.Normalmente, as pacientes toleram os emplastrostransdérmicos melhor que os medicamentos por VO,talvez porque produzam níveis séricos de estrógenomais constantes. Se novos episódios de cefaléias sedesenvolverem durante a TRH, outras possíveiscausas de cefaléia devem também ser consideradas.

Outro estudo, realizado na Grã-Bretanha porMoorhead et al.5, mostrou várias características de

mulheres recebendo TRH e de outras não recebendo,entre estas, efeitos colaterais relatados e contra-indicações. Os autores concluíram que o aumentonas cefaléias e enxaquecas foi associado ao uso deTRH.

Um estudo realizado na Itália6 procurou identificaras causas da má aderência ao tratamento da TRH.Foram avaliadas 200 mulheres na menopausa comútero intacto e observados os resultados da TRH após3, 6 e 12 meses de tratamento. As causas da inter-rupção do tratamento foram retenção de água e/ouaumento de peso (20%), mamas doloridas (12%),cefaléias (7%), sangramento vaginal (22%), medode câncer, etc. (54%).

Foi realizada uma consulta a três médicos gineco-logistas ingleses7 sobre suas condutas em relação auma paciente verídica, com o seguinte histórico:paciente com 48 anos de idade relatando ondas decalor e alterações de humor, histórico de asma para aqual utilizava beclometasona inalatória e salbutamol.Recebera TRH por 2 anos. Após um episódio deenxaqueca hemiplégica, seu médico a alertou paradescontinuar o uso da TRH. Suas ondas de calor nãoa deixavam dormir e a paciente estava desesperadapor ajuda. O que fariam os três médicos neste caso?

Dra. Jean Coope relatou o seguinte: outras pos-síveis causas de seus sintomas deveriam ser inves-tigadas, como ansiedade, trabalho em lugares quentes,uso de outros medicamentos etc. O status da meno-pausa e a densidade óssea atual deveriam ser ava-liados. Após a avaliação de todos esses fatores, amédica iria retomar a TRH a esta paciente, mantendouma supervisão por 3 meses, com medidas mensaisde peso e pressão arterial, e iria interromper o trata-mento novamente se a paciente tivesse outro ataquede enxaqueca.

Dra. Helen McEwan sugeriu o seguinte: voltar àTRH, porém pela via transdérmica, que evita a

Quadro 1 Usos não contraceptivos de estrógenos: contra-indicações absolutas e relativas (Greendale & Judd, 1993)4

Absolutas Relativas #Sangramento vaginal não diagnosticado EndometrioseSuspeita de câncer de mama Histórico de colelitíaseSuspeita de câncer endometrial Histórico de enxaquecasTrombose ativa venosa HipertrigliceridemiaHistórico de câncer de mama* Histórico de trombose relacionada à gravidezHistórico de câncer endometrial* Histórico de trombose relacionada ao uso de contraceptivos oraisMelanoma maligno* Doenças hepáticas* Freqüentemente sob debate. Algumas mulheres com essas condições, que desejam muito receber a terapia de reposição hormonal, estãosendo tratadas.# As pacientes devem ser especificamente orientadas sobre as conseqüências negativas da reposição estrogênica, em caso de algumacontra-indicação estar presente.

Rev. Neurociências 9(1): 9-15, 2001

Cefaléia e Terapia de Reposição Hormonal

Page 13: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

13

primeira passagem pelo fígado, ou uma preparaçãooral combinada, por um período experimental de 3meses. As cefaléias do tipo enxaqueca ocorrem maisparticularmente na fase progestacional. O uso deemplastros transdérmicos é mais eficaz em mulheresque tinham enxaquecas na fase pré-menopausa.Porém, se esta paciente tiver outra crise de enxa-queca, terá a desvantagem de ser mais demorada aretirada do estrógeno. Como essa paciente temhistórico de asma e usa corticosteróides, tem maiorrisco de osteoporose, portanto, deveria receber TRHa longo prazo. A relação risco-benefício neste casoparece favorecer o uso de TRH.

Por último, Dr. Tony Parsons relatou que iria enco-rajar a paciente a retomar a TRH, monitorizando-a deperto. Se ela apresentasse outra crise de enxaqueca, omédico iria consultar a opinião de um neurologista emvez de interromper de imediato a TRH. Desta vez, arecomendação seria dos emplastros transdérmicos, queminimizam as doses de progesterona e seus efeitoscolaterais, como enxaquecas.

Benefícios e riscos da TRH

Os dados de recente publicação8 permitiram fazeras considerações a seguir.

A privação do estradiol aumenta, na populaçãofeminina, a prevalência de osteoporose e de doençacardiovascular, particularmente a isquemia miocár-dica. A terapia só com estrogênio deve ser dada amulheres histerectomizadas.

O que está faltando deve ser reposto (?)Estrogênio: muitas mulheres sentem sintomas

desconfortáveis quando estes atingem valoresextremos durante a menstruação e o pico ovulatório,porém poucas se queixam quando os níveisplasmáticos permanecem na média dos níveis da fasefolicular (entre 60 a 150 pg/ml). Após a menopausa,os níveis permanecem consistentemente menores doque 40 pg/ml. Entretanto, é variável de acordo com aprodução em outros locais. A terapia com estradiolvisa a restaurar os níveis plasmáticos para mais de80 pg/ml.

Progesterona: os baixos valores plasmáticos dafase lútea precoce são suficientes para suprimir osreceptores de estradiol nas glândulas endometriais,bloquear a mitose e parar a proliferação endometrial,que é o objetivo da substituição hormonal pós-menopausa.

Benefícios:a) Melhoram os sintomas menopáusicos, como san-

gramento, mastodinia, instabilidade no humor e

leucorréia. Entretanto, vale ressaltar que essessintomas podem ser semelhantes aos pré-menstruais e ocorrer em muitas mulheres queusam estrogênio ou estrogênio-progestogênio.

b) Reduzem a perda óssea a curto prazo e risco defratura a longo prazo, são parcialmente relacio-nados com aumento na densidade óssea e maisdevidos à melhora na estrutura óssea. Reduzem orisco de fratura no quadril, coluna e punho em30% a 70% das usuárias habituais de altas doses.No passado, nunca usuárias tiveram similar baixorisco de fratura, mesmo 5 a 10 anos após ainterrupção da TRH.

c) Aumento no colesterol (HDL) e triglicerídios.Referem-se ao aumento de colesterol livre, fosfoli-pídios e triglicerídios dentro das partículas de HDL;a redução rápida na LDL, porém, com a taxa deapoproteína B para LDL aumentada, cria pequenase mais densas partículas, que teoricamente sãomais aterogênicas.

d) A tendência média nas usuárias de estrogêniosorais é para ativação da coagulação completa ouparcialmente contrabalanceada pela ativação dafibrinólise, com uma resultante variável de riscotrombótico aumentado. A administração não oralinduz a efeitos favoráveis nos fatores de coa-gulação, contudo a eficácia ótima no balançohemostásico é obtida apenas quando o estradiolatinge concentrações similares às da fase médiafolicular.

e) Espessamento da íntima-média da artéria – nãohá estudos válidos.

f) Restabelecem a resposta vasoativa à isquemia, aoesforço e ao frio. Parecem estar pelo menosparcialmente relacionados com a atividade doóxido nítrico (ON). Ambos, vasodilatação e níveisplasmáticos de ON, são correlacionados com osníveis circulantes de estrogênios. O acetato demedroxiprogesterona (MPA) e noretisterona(NTA) inibem os efeitos vasodilatadores dosestrogênios.

g) TRH pode retardar o início e diminuir o risco dedoença de Alzheimer e melhorar a cognição, porémeste efeito é controverso.

Riscos:a) Risco de câncer de endométrio aumenta 1,6 a 2

vezes em 25% das mulheres que usam menos de10 dias progestogênio.

b) Dados sugerem que mais de 10 dias por mês deprogesterona devem ser protetores do câncer demama em mulheres tratadas com estradiol, mas

Rev. Neurociências 9(1): 9-15, 2001

Cefaléia e Terapia de Reposição Hormonal

Page 14: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

14

isso não deve acontecer em mulheres tratadas comestrona. Não sabemos se o risco pode ser previstoe o tratamento individualizado, monitorizado deacordo com alterações na densidade mamária.Mulheres que possuem câncer de mama diag-nosticado, enquanto em TRH, tendem a ter melhorprognóstico, especialmente quando estão usandoestrogênios em oposição aos progestogênios. Estasobservações parecem sugerir algum grau deproteção e excluem um efeito estimulante danosoda progesterona em células malignas.

c) Riscos cardiovasculares não foram mais confir-mados e, mesmo assim, é difícil que a TRHcontinue sendo recomendada como tratamento deprimeira linha, uma vez que aumento do risco detrombose, trombo-embolismo pulmonar, episódiosisquêmicos transitórios e acidente vascular cere-bral foi observado em apenas um estudo.

Enxaqueca, menopausa e TRH

O trabalho de Silberstein e de Lignières9 enfocaas particularidades na enxaqueca.

A idade média da menopausa é de 51 a 52 anos,com variação de 40 a 60 anos. O tempo de menopausaocorre 2 anos antes nas mulheres tabagistas. Os níveisde estrogênios caem 6 a 12 meses antes damenopausa. A maior prevalência da enxaqueca é dos20 aos 40 anos. O estradiol está mais implicado nomecanismo da enxaqueca e a mulher portadora deenxaqueca com aura e fumante não deve usarcontraceptivo hormonal.

Moduladores do receptor de estrogênio seletivosão uma nova classe de drogas que diferem entre si edos estrogênios clássicos. O raloxifeno possui efeitosno osso e no metabolismo lipídico, semelhantes aoestrogênio, porém nenhum efeito na mama ou noútero. Está associado com trombose venosa. Otamoxifeno possui também esses efeitos no útero,porém não na mama. Em ensaios clínicos, não houveaumento do relato de enxaqueca ou cefaléia emmulheres recebendo raloxifeno comparado aodaquelas recebendo placebo ou TRH. De fato, aincidência de cefaléia foi estatisticamente menor emmulheres recebendo 60 mg de raloxifeno que placebo,devendo, portanto, ser a droga de escolha paramulheres que não podem tolerar estrogênio.

Apesar de a prevalência da enxaqueca diminuircom o avançar da idade, ela pode tanto regredir oupiorar na menopausa. Menopausa cirúrgica geral-mente resulta em uma piora na enxaqueca. Outrosestudos mostraram que histerectomia ou oofo-

rectomia não é um tratamento efetivo para enxaqueca,em qualquer idade. A TRH com estrogênio (eprogestogênio) pode exacerbar a enxaqueca, esozinho ou com testosterona pode aliviá-la. Isto foiconfirmado em um, mas não em outro estudo duplo-cego. O uso de drogas para o tratamento da enxa-queca por mulheres menopausadas, as quais nãonecessitam de reposição de estrogênio, deve ser guiadopelos seus status cardíaco e renal. Casos refratáriosdevem ser tratados com reposição hormonal.

O manuseio da cefaléia pode ser difícil em mu-lheres que requerem reposição hormonal para ossintomas de menopausa, mas que desenvolvemcefaléia como resultado da terapia. Algumas estratégiasempíricas podem ser utilizadas, como reduzir a dosedo estrogênio ou mudar o tipo de estrogênio, de umconjugado para estradiol puro para etinil-estradiol ouestrona pura, com isso, reduzindo significativamentea cefaléia. Mudança de administração, de interrompidapara contínua, pode ser muito efetiva se a cefaléiaestá associada com a queda do estrogênio. Técnicasdevem ser combinadas. Estrogênios parenterais, comou sem hormônios adjuntos, podem ser efetivos,como a adição de androgênios (testosterona). O selo(patch) cutâneo de estradiol determina uma taxafisiológica de estradiol. A estrona e uma concentraçãoadequada de estrogênio foram associadas a menoscefaléias como efeitos colaterais; contudo, isso nãofoi provado em um estudo controlado. O raloxifenopode também ser usado se uma mulher requer, masnão pode tolerar estrogênios não seletivos.

Conclusões

As cefaléias e enxaquecas são uma contra-indi-cação relativa ao uso de TRH.

A via transdérmica parece ser mais aceita porpacientes que já apresentavam crises de enxaquecasantes da terapia.

Não é fato comprovado que a TRH por si só causeenxaquecas.

As enxaquecas não constituem sintomas especí-ficos da menopausa e podem estar relacionadas avárias outras causas.

A relação risco-benefício favorece o uso de TRH.

SUMMARY

Headache and hormone replacement therapyIn occidental countries, more than 30% of the

female population are in the postmenopausal period.

Rev. Neurociências 9(1): 9-15, 2001

Cefaléia e Terapia de Reposição Hormonal

Page 15: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

15

Approximately 30% of these women suffer fromtypical clinical symptoms from the climacterium, suchas vasomotor symptoms, related to “hot flushes”,nocturnal sweating, restlessness, mood alteration,irritability and tendencies to depression, requiringmedical treatment. The hormone replacement therapy(HRT) abolishes specific symptoms from menopausein more than 90% of the patients. Unspecificsymptoms, such as headaches, answer to HRT as wellas to placebo. The goals from this work were: todescribe tendencies in prevalence of headaches inwomen receiving HRT; to describe recommendationsto prevent or improve the episodes of headaches andalso to describe indications of headaches being acontraindication to HRT. The method used for thiswork was the bibliographic review on scientificliterature related to the topic from the last eight years.As discussion, we concluded that headaches andmigraines are relative contraindications to HRT; thetransdermic pathway seems to be more acceptablefrom patients who have had migraine crises beforethe hormone therapy; it is not a proved fact that HRTfor itself causes migraines; migraines do not constitutespecific symptoms from menopause and can be relatedto many other causes; the relation risk/benefit supportsthe use of HRT.

Keywords

Headache, migraines, hormone replacement therapy.

Referências

1. Evans MP, Fleming KC, Evans JM. Hormone replacementtherapy: management of common problems. Mayo ClinProc, 70:800-5, 1995.

2. Breckwoldt M, Keck C, Karck U. Benefits and risks ofhormone replacement therapy (HRT). J Steroid BiochemMol Biol, 53:205-8, 1995.

3. Silberstein SD & Merriam GR. Physiology of the menstrualcycle. Cephalalgia, 20:148-54, 2000.

4. Greendale GA & Judd HL. The menopause: healthimplications and clinical management. J Am Geriatr Soc,41:426-36, 1993.

5. Moorhead T, Hannaford P, Warskyj M. Prevalence andcharacter ist ics associated with use of hormonereplacement therapy in Britain. Br J Obstet Gynaecol,104:290-7, 1997.

6. Porzio G, Patacchiola F, Toro G, Moscarini M. Terapiaormonale sostitutiva in menopausa: incremento dellacompliance. Minerva Ginecol, 49:515-9, 1997.

7. Coope J, McEwan H, Parsons T. A contraindication toHRT. The Practitioner, 237:93-8, 1993.

8. De Lignières B & MacGregor EA. Risks and benefits ofhormone replacement therapy. Cephalalgia, 20:164-9,2000.

9. Silberstein SD & De Lignières B. Migraine, menopauseand hormonal replacement therapy. Cephalalgia, 20:214-21, 2000.

Endereço para correspondência:Deusvenir de Souza CarvalhoDisciplina de NeurologiaRua Pedro de Toledo, 650Ed. Jairo Ramos – 2º andar, sala 48CEP 04039-002 – São Paulo, SPE-mail: [email protected]

Rev. Neurociências 9(1): 9-15, 2001

Cefaléia e Terapia de Reposição Hormonal

Page 16: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

16

ARTIGO

Rev. Neurociências 9(1): 16-19, 2001

1 Doutoranda em Ciências Médicas – Neurologia – FCM/Unicamp. Terapeuta Ocupacional no CEPRE–FCM–Unicamp.2 Doutoranda em Ciências Médicas – Oftalmologia – FCM/Unicamp. Terapeuta Ocupacional no CEPRE–FCM–Unicamp.

Intervenção Precoce na Criança com Baixa VisãoHeloisa G. R. Gardon Gagliardo1

Maria Inês R. S. Nobre2

RESUMOO presente trabalho discute o desenvolvimento da visão considerando os fatores ambientais e de maturação neurológica.Contempla as características do desenvolvimento de crianças com baixa visão e as diferentes áreas do desenvol-vimento que podem ser comprometidas pelas alterações visuais. Apresenta uma abordagem da atuação da terapiaocupacional em intervenção precoce, relacionando os pressupostos fundamentais para intervenção nessas crianças.Unitermos: Baixa visão, intervenção precoce, terapia ocupacional.

Introdução

A intervenção precoce relaciona-se de forma íntimacom a prevenção e a detecção precoces. ParaTemporini e Kara-José1, em se tratando de prevençãode problemas oftalmológicos, tão importante quantoprevenir o aparecimento de doenças, distúrbios ouagravos, é minimizar as suas conseqüências.

Considerando a importância que tem a visão parao desenvolvimento da criança, Botega & Gagliardo2

destacam que a intervenção precoce é um recursoprecioso para o desenvolvimento da criança com baixavisão.

No que se refere à importância da visão para odesenvolvimento humano, Sanchez3 refere que a visãorapidamente unifica as diferentes sensações e põe emrelação um sentido com o outro. A visão tem,portanto, como uma de suas principais caracte-rísticas, ajudar a integrar as diferentes modalidadessensoriais e auxiliar na compreensão das váriasinformações que recebemos dos sentidos.

Sabe-se que quando a deficiência visual é diagnos-ticada no primeiro ano de vida e a criança recebeestimulação prontamente, obtêm-se melhores reper-cussões na eficiência visual e, conseqüentemente, emtodos os aspectos do desenvolvimento.

Nesse sentido, Sonksen et al.4 enfatizam a impor-tância do diagnóstico precoce, pois os melhoresresultados são obtidos quando a intervenção ocorreno primeiro ano de vida. Do mesmo modo, Gagliardoe Gonçalves5 referem que o diagnóstico precoce dequalquer alteração no desenvolvimento da criançafavorece sua rápida habilitação, possibilitando ummelhor prognóstico.

Sendo a intervenção precoce conseqüência dodiagnóstico precoce, ela só ocorrerá se houver orien-tação da família e pronto encaminhamento da criançaa serviços de habilitação infantil. Ressalta-se, aqui, arelevância do papel dos profissionais da área médicaquanto ao diagnóstico precoce, à orientação da famí-lia, ao encaminhamento da criança para habilitação eao contínuo seguimento do caso.

A intervenção precoce é um processo que seestabelece com a parceria entre médicos, terapeutase a família. A relação de confiança estabelecida desdeos primeiros contatos firma a base para a habilitaçãoda criança.

Intervir precocemente requer profundo conhe-cimento sobre o processo de desenvolvimentohumano, mais especificamente sobre o processo dedesenvolvimento da criança e dos fatores que neleinterferem. Além disso, a habilitação de crianças

Page 17: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

17

deficientes visuais requer compreensão das limitaçõesvisuais e, sobretudo, das capacidades visuais dessascrianças e possibilidades de desenvolvimento daeficiência da visão.

Sendo a visão nosso sentido mais integrador, suaalteração pode afetar todos os aspectos de adaptaçãoda criança ao seu meio ambiente6. Assim, a terapiaocupacional, como uma ciência com bases na ética eno saber, busca a participação ativa da criança naconstrução de sua identidade. Por meio da análise eseleção de materiais e atividades, sua atuação emintervenção precoce em deficientes visuais utilizaestratégias que facilitem o aprendizado de habilidades,fortaleçam a eficiência das funções essenciais para aadaptação ao meio, promovam e mantenham ocrescimento, o desenvolvimento e a saúde.

Considerações sobre o desenvolvimento da visão

O desenvolvimento da visão, assim como odesenvolvimento de outras funções do organismo,é permeado por fatores de maturação neurológica ede aprendizagem. É determinado por fatoresgenéticos e influenciado por fatores ambientais7.Segundo Ciancia et al.8, ao nascimento, os olhosestão geneticamente determinados para a visãonormal, mas são necessárias experiências adequadase oportunas para que as possibilidades genéticaspossam se manifestar.

Inúmeras pesquisas, na década de 1960, abriramperspectivas para os estudos e determinação sobreos períodos críticos de maturação em diferentesregiões do sistema nervoso central. O desenvolvi-mento do sistema neurológico da visão foi, então,vastamente pesquisado.

Os estudos de Wiesel9 demonstraram que o pri-meiro ano de vida é crítico para o desenvolvimentodas funções visuais, e a privação de estímulos visuaisdurante esse período pode provocar danos funcionaisirreversíveis. Sabe-se, portanto, que há uma inter-relação entre maturação neurológica e experiênciasambientais, e uma favorece o desenvolvimento daoutra. Assim, Lipsitt10 refere que os estímulos visuaisrecebidos do ambiente provocam modificações namaturação neurológica da visão. Essas modificaçõespodem, por sua vez, alterar a habilidade do organismoem assimilar os estímulos que recebe do ambiente.Para Vilanova11, o processo de formação de sinapsese o de mielinização dependem de um componentebiológico e de estímulos externos.

Durante as primeiras semanas de vida pós-natal,a retina, as vias ópticas e o córtex visual desenvolvem

seus contatos celulares. À medida que chegam osestímulos visuais do ambiente, sinapses são realizadaspelas células neurais, favorecendo a função visual etornando-a permanente12,13. A partir do nascimento,a criança usa a sua visão para aprender sobre o mundoe profundas mudanças estruturais ocorrem no sistemaneurológico da visão, durante o primeiro ano de vida.Essas mudanças relacionam-se com o desenvol-vimento das funções visuais e sua eficiência. Con-tudo, ao final do primeiro ano de vida, muitas sinapsesforam eliminadas, sendo esse fato considerado umevento regressivo e altamente crítico para o desenvol-vimento da visão14. Portanto, a estimulação visual queo lactente recebe a partir do nascimento é de funda-mental importância para a formação de conexõesneurais responsáveis pela visão.

Apesar de o primeiro ano de vida ser consideradocrítico para o desenvolvimento da visão do bebê, elecontinuará desenvolvendo-a e aprimorando-a duranteos anos seguintes. As diferentes experiências senso-riomotoras que a criança vivencia contribuem de modoespontâneo para o desenvolvimento da visão. ConformeHyvärinen12, a visão é aprendida e melhora seu funcio-namento e eficiência com a utilização adequada.

Características do desenvolvimento da criançacom baixa visão

Durante o primeiro ano de vida, inúmeras serãoas transformações no desenvolvimento da criança, eem nenhum outro período da vida os saltos evolutivosocorrerão com tão notável velocidade15.

Considerando a importância dos primeiros anosde vida para o desenvolvimento da criança, a defi-ciência visual pode, na maioria dos casos, compro-meter em maior ou menor grau o desenvolvimentoneuromotor, o desenvolvimento das habilidades dasmãos, a cognição e a linguagem5,16,17.

O vínculo entre a mãe e a criança é um dos primei-ros aspectos que podem ser afetados, comprometendooutras áreas do desenvolvimento. Sabe-se que asrelações entre a mãe e a criança nos primeiros anos devida têm a ver com o futuro desenvolvimento da perso-nalidade de cada criança. Além disso, é a mãe que,com seu cuidado afetuoso no dia-a-dia, oferece àcriança as primeiras oportunidades de experimentar omundo que a rodeia. As sensações táteis do toquedurante o banho e a troca de roupas, durante aamamentação, a fala e as cantigas, o contato de olho eo olhar recíproco são trocas iniciais que despertam ointeresse da criança e a motivam para as interaçõescom pessoas e objetos do meio ambiente.

Rev. Neurociências 9(1): 16-19, 2001

Intervenção Precoce na Criança com Baixa Visão

Page 18: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

18

Contudo, o nascimento de uma criança deficientegera uma série de mudanças nas relações familiares,que podem influenciar diretamente a relação que amãe estabelece com seu filho. Os sentimentosgerados pelo nascimento de um filho, que não era oesperado, são profundos e variados, sendo maisfreqüentes a negação, a rejeição, a culpa e asuperproteção. Esses sentimentos podem, muitasvezes, fazer com que os pais demorem a procurarserviços de habilitação e, assim, deixem de receberas orientações e o apoio necessários. Muitos paispassam meses à procura de uma solução médicaimediata, indo de consultório a consultório, negando-se a entender que, em muitos casos, a intervençãoprecoce, al iada ao acompanhamento médicooftalmológico, pode ser o principal caminho parapromover o desenvolvimento da criança.

Durante esse período de busca da cura, que podenão existir, muitas crianças deixam de receber a esti-mulação necessária em momentos oportunos para odesenvolvimento da visão. Esse fato pode acarretaratrasos no desenvolvimento de outras funções, comoas motoras, cognitivas ou de linguagem, além decomprometer o desenvolvimento socioafetivo efavorecer o aparecimento de deficiências secun-dárias e comportamentos estereotipados. Essescomportamentos estereotipados ou maneirismos sãofreqüentemente observados em crianças comcegueira congênita. Porém, também são encontradosem crianças com baixa visão, principalmentenaquelas que recebem pouca estimulação ambientale, por este motivo, não utilizam seu corpo paraexplorar o ambiente nem suas mãos para manipularobjetos. Essas crianças, com pouca solicitaçãoambiental, podem desenvolver os comportamentosde auto-estimulação, caracterizados como movi-mentos sem função, como balanceios corporais,movimentos rítmicos com as mãos realizando toquesrepetitivos sobre o próprio corpo, superfícies ouobjetos, movimentos com a cabeça e fala fora deum contexto, entre outros.

Geralmente, a deficiência visual sem uma inter-venção oportuna pode causar um empobrecimentodas vivências pessoais, prejudicando as experiênciassensoriomotoras, a manipulação e a exploração dosobjetos, gerando atrasos na aquisição das habilidadesque são mediadas pela visão.

Objetivos

A intervenção precoce em crianças com visãosubnormal visa a criar condições de favorecimento para

o pleno desenvolvimento das potencialidades de cadacriança na faixa etária de 0 a 3 anos. Tem como princípiobásico a atuação nos períodos de sensibilidade críticapara o seu desenvolvimento neuropsicomotor. Visa aindaà criação de um ambiente rico em estímulos adequados,dando-lhe a oportunidade de desenvolver e integrar todasas áreas do desenvolvimento.

Intervenção

A intervenção precoce em crianças com baixa visãodestaca-se como sendo de importância fundamental,pois tem um caráter preventivo, ou seja, previne oaparecimento de deficiências secundárias. Na criançavidente, a visão é o agente desencadeador da moti-vação para a realização de movimentos e ações. Acriança com deficiência visual necessita de inter-venção para que sejam nela despertados o desejo, acuriosidade e a motivação para agir sobre o ambiente.Ela é importante ainda porque acontece no períodoem que ocorrem as maiores e mais significativasmudanças no desenvolvimento da criança, nosperíodos mais curtos de tempo. Criança e família têmvalor central na intervenção precoce.

A intervenção precoce inicia-se com a avaliaçãoda criança. Essa avaliação deve combinar a avaliaçãofuncional da visão e a avaliação do desenvolvimentoglobal da criança, utilizando procedimentos formaise a observação do comportamento. É um processodinâmico, realizado por equipe interdisciplinar, emsituações lúdicas e de acordo com o perfil do desen-volvimento da criança.

A programação da habilitação é individualizada,de acordo com o resultado da avaliação, consi-derando as áreas do desenvolvimento que se encon-tram alteradas e as potencialidades de cada criança.Utilizam-se estratégias criando condições para opleno desenvolvimento das capacidades da criança,prevenindo futuros déficits. Abrange todas as áreasdo desenvolvimento infantil.

Os recursos utilizados são praticamente infinitos,pois a criança está em constante transformação,modificando as suas necessidades. O principal recursoutilizado é a atividade do brincar, mas principalmenteo brincar participativo e prazeroso. Essa atividade éproposta de acordo com o perfil do desenvolvimentoda criança. Adaptações como contraste, textura,odores, sons são necessárias em alguns materiais. Oambiente também poderá sofrer modificações deacordo com a patologia, os sinais e os sintomas, comono caso de crianças com fotofobia, que necessitamde ambiente pouco iluminado para que possam ser

Rev. Neurociências 9(1): 16-19, 2001

Intervenção Precoce na Criança com Baixa Visão

Page 19: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

19

motivadas para o olhar. Em crianças com glaucoma,por exemplo, é preciso utilizar luz direta sobre omaterial a ser manipulado, ambiente pouco iluminadoe objetos com pouca reflexibilidade.

As orientações fornecidas às famílias baseiam-senas características e nas necessidades de cada criança.Orientações específicas estão sempre de acordo como contexto socioeconômico e cultural em que estáinserida a criança. As orientações fundamentam-se nodesenvolvimento neuropsicomotor normal da criança,permitindo que utilize funcionalmente a visão evivencie todas as etapas do desenvolvimento.

A intervenção precoce segue alguns princípios básicos:– Estimular a eficiência visual.– Favorecer o uso funcional da visão em todas

as situações do dia-a-dia, por menor que sejao resíduo visual.

– Favorecer o estabelecimento da relação mãe-criança.

– Proporcionar atividades funcionais queintegrem as sensações captadas pelos órgãosdos sentidos com as funções psicomotoras.

– Criar condições para a construção do universosensoriomotor.

Considerações finais

A intervenção precoce em crianças com visão sub-normal, visando ao desenvolvimento máximo da visão,requer longo tempo de seguimento, muita dedicação egrande colaboração entre pais e terapeutas. O primeiropasso é a formação do vínculo com a família, estabe-lecendo uma parceria, com um fim único – favorecer odesenvolvimento da criança e o uso funcional da visão.

SUMMARY

Early intervention in the child with low visionThe present work discusses the development of

vision considering the environmental and neurologicalmaturation factors. It contemplates the low visionchildren’s development characteristcs and the areasof the development that can be commited for visualalterations. It presents an approach of the occupa-tional therapy performance in early intervention,relating the fundamental presuppositions forintervention with those children.

Keywords

Low vision, early intervention, occupational therapy.

Referências

1. Temporini ER & Kara-José N. Níveis de prevenção deproblemas oftalmológicos: propostas de investigação.Arq Bras Oftal, 58:189-92, 1995.

2. Botega MBS & Gagliardo HGRG. Intervenção precocena deficiência visual: o que fazemos? Revi Soc BrasFonoaudiol, 2(Supl.1):46-50, 1998.

3. Sanchez PA. Deficiencias visuales y psicomotricidade:teoria y pratica. Organización Nacional de CiegosEspañoles, 1994, 255p.

4. Sonksen PM, Petrie A, Drew KJ. Promotion of visualdevelopment of severely visually impaired babies:evaluation of a developmentally based programe. DevMed Child Neurol, 33:320-35, 1991.

5. Gagl iardo HGRG & Gonçalves VMG. Propostametodológica para detecção de al terações nocomportamento visual de lactentes. Arq Bras Oftal, 63:59,2000.

6. Hyvärinen L. Considerations in evoluation and treatmentof the child with low vision. Americ J OccupationalTherapy, 59:891-7, 1995.

7. Brandão JS. Desenvolvimento psicomotor da mão. Riode Janeiro, Enelivros, 1984, 453p.

8. Ciancia AO, Fiondella AM, Penerini YP. La estimulacióntemprana en oftalmologia. Arq Bras Oftal, 49:147-9,1986.

9. Wiesel TN. The postnatal development of the visual cortexand the influence of environmemt. (Nobel Lecture). BiosciRep, 2:351-77, 1982.

10. Lipsitt LP. Learning in infancy: cognitive development inbabies. J Pediatr, 109: 172-82, 1986.

11. Vilanova LCP. Aspectos neurológicos do desenvolvimentodo comportamento da criança. Rev Neurociências,6:106-10, 1998.

12. Hyvärinen, L. La vision normal y anormal en los ninos.Madri, Organizacion Nacional de Ciegos Españoles,1988, 92p.

13. Alves MR & Kara-José N. O olho e a visão. Rio de Janeiro,Vozes, 1996, 151p.

14. Huttenlocher PR. Morphometric study of human cerebralcortex development. Neurophych, 28:517-27, 1990.

15. Diament AJ. Exame neurológico do lactente. In: DiamentAJ & Cypel S. Neurologia infantil. 3. ed., São Paulo,Atheneu, 1996, pp. 35-62.

16. Jan JE, Sikanda A, Groenveld M. Habilitation and rehabi-litation of visually impaired and blind children. Pediatrician,17:202-97, 1990.

17. Gonçalves VMG & Gagl iardo HGRG. Aspectosneurológicos do desenvolvimento do lactente combaixa visão. Temas sobre Desenvolvimento, 7:33-9,1998.

Endereço para correspondência:Heloisa G. R. Gardon GagliardoCentro de Estudos e Pesquisas em Reabilitação “Prof.Dr. Gabriel de O. S. Porto” – Faculdade de CiênciasMédicas da Universidade Estadual de CampinasAv. Adolfo Lutz, s/nCidade Universitária Zeferino VazCEP 13084-880 – Campinas, SP

Rev. Neurociências 9(1): 16-19, 2001

Intervenção Precoce na Criança com Baixa Visão

Page 20: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

20

ARTIGO

1 Pós-graduandos da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.2 Responsável pelo Setor de Neuro-oncologia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.3 Professor Titular e Chefe da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.

Metástases CerebraisAdrialdo José Santos1

Clélia Maria Ribeiro Franco1

Lia Raquel Rodrigues Borges1

Suzana Maria Fleury Malheiros2

Alberto Alain Gabbai3

RESUMOAs metástases cerebrais ocorrem comumente em pacientes com câncer. A freqüência dessa complicação está aumentandoem decorrência do tratamento mais agressivo do câncer, bem como do uso de métodos de neuroimagem que permitemum diagnóstico mais preciso. Com o melhor controle dos tumores primários, permitido pelos tratamentos atuais, aimportância do tratamento dessas metástases é óbvia. Os principais objetivos do tratamento são melhorar os déficitsneurológicos e aumentar a expectativa e a qualidade de vida. Os autores revisam as manifestações clínicas, o diagnósticoe as principais opções para o tratamento das metástases cerebrais.Unitermos: Metástases intracranianas, cirurgia, radioterapia, tratamento clínico.

Rev. Neurociências 9(1): 20-26, 2001

Introdução

O tempo e a qualidade de vida dos pacientes onco-lógicos têm aumentado sensivelmente com os trata-mentos atuais. Contudo, o aumento na sobrevida temalgumas conseqüências, como, por exemplo, o fatode as complicações metastáticas serem cada vez maisfreqüentes. Neste contexto, as metástases intracra-nianas ainda são consideradas a complicação neuro-lógica mais freqüente e temível, pois são respon-sáveis por sintomas incapacitantes ou por morteprecoce e, muitas vezes, implicam a desistência dotratamento sistêmico por alguns médicos. As metás-tases intracranianas ocorrem mais comumente nasfases avançadas do câncer, mas podem ser a primeiramanifestação de um tumor primário desconhecido1,2.Seu diagnóstico precoce é importante para promover

não apenas maior sobrevida, mas também paramelhorar a qualidade de vida dos pacientes.

Estima-se que cerca de 20% a 25% dos pacientescom câncer desenvolvam metástases cerebrais.Estudos baseados em necropsias estimam aocorrência das metástases intracranianas (MIC) ematé 25% dos pacientes que morreram de câncer1,3.As MIC podem localizar-se no parênquima (hemis-férios cerebrais, cerebelo, tronco encefálico) ou nasmeninges (dura-máter e leptomeninges). Nestarevisão, serão discutidas as metástases intraparenqui-matosas, que chamaremos de metástases cerebrais,por ser este o termo mais consagrado pelo uso. Asmetástases cerebrais representam 2/3 das MIC,podendo ser únicas ou múltiplas. Alguns tumores,como o melanoma, geralmente produzem metástasesmúltiplas, enquanto outros, como o carcinoma de

Page 21: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

21

mama, mais freqüentemente originam uma únicalesão. O termo metástase cerebral solitária implica aausência de qualquer outra lesão metastáticaconhecida, enquanto o termo metástase cerebralúnica indica que há uma única lesão cerebralindependentemente da existência de metástasessistêmicas4.

Os tumores primários que mais freqüentementeevoluem com metástases para o sistema nervosocentral (SNC) em adultos são o carcinoma bronco-gênico (principalmente o carcinoma de pequenascélulas e o adenocarcinoma), o câncer de mama, ocarcinoma renal, o melanoma e as neoplasias malignasdo trato gastrointestinal, embora até 10% dasmetástases cerebrais tenham origem primária desco-nhecida2,3. Outros tumores como o carcinoma depróstata, ovário, testículo e o linfoma de Hodgkinraramente apresentam metástases cerebrais3. Nospacientes com idade inferior a 21 anos, as metástasesoriginam-se principalmente dos sarcomas (sarcomaosteogênico, rabdomiossarcoma e sarcoma deEwing) e dos tumores de células germinativas1,3.

A maioria das metástases cerebrais ocorre pordisseminação hematogênica, principalmente pelacirculação arterial e, em alguns casos, pode ocorrerpelo sistema venoso por meio do plexo venosovertebral (plexo de Batson)1,5. A distribuição dasmetástases é aproximadamente proporcional ao fluxosangüíneo cerebral e isto é observado pelo predomíniodas lesões nos lobos frontal e parietal5. De modo geral,aproximadamente 80% das metástases cerebraislocalizam-se nos hemisférios cerebrais, 15% nocerebelo e 5% no tronco cerebral. A fossa posterioré acometida preferencialmente por lesões originadasdos tumores pélvicos1,5.

As metástases localizam-se preferencialmente naregião de transição córtico-subcortical, que é umainterface bem vascularizada, denominada “zona defronteira” (watershed) ou de circulação terminal. Istosugere que microêmbolos se estabeleçam noscapilares distais das artérias superficiais6.

Manifestações clínicas

Os tumores cerebrais metastáticos manifestam-se com os mesmos sinais clínicos dos tumores intra-cranianos primários, distinguindo-se destes por suaevolução mais rápida, geralmente subaguda, em diasou poucas semanas. Geralmente, essa evolução clínicamais rápida deve-se, entre outros fatores, ao intensoedema perilesional3. Os sintomas progressivos deaumento da pressão intracraniana (cefaléia, alteração

do nível de consciência), alterações de comporta-mento, sinais neurológicos focais e crises epilépticassão as manifestações clínicas habituais dos processosmetastáticos cerebrais. Cerca de 10% dos casos têmapresentação brusca, apoplética, secundária à hemor-ragia intratumoral, constituindo as chamadas “síndro-mes pseudovasculares”4. A hemorragia espontâneapode ocorrer em qualquer tipo de neoplasia metas-tática, sendo mais freqüente no melanoma, no carci-noma renal e no coriocarcinoma (os quais apresentaminvasão vascular)3. Uma complicação precoce dasmetástases cerebelares é a hidrocefalia obstrutiva que,se não tratada a tempo, é seguida de rápida dete-rioração clínica e óbito. Alterações comportamentaissão observadas em até 30% dos pacientes4.

Diagnóstico

A maioria das metástases cerebrais aparece comolesões arredondadas, com realce difuso ou anelar,tipicamente circundadas por intenso edema perile-sional, o qual não guarda proporção com o tamanhoda lesão. O efeito expansivo também é variável e,nos casos de apresentação aguda com hemorragiaintratumoral, esta pode dificultar o diagnóstico deneoplasia subjacente3. Os principais métodos deneuroimagem para o diagnóstico de metástasescerebrais são a tomografia computadorizada e aressonância magnética contrastadas. Têm sidodescritas variações de técnica, como, por exemplo,o uso de contraste em doses maiores do que ohabitual, bem como o aumento do intervalo de tempoentre a injeção do contraste e a aquisição da imagem,com o objetivo de aumentar a sensibilidade diagnósticadesses métodos. A ressonância magnética comgadolínio é considerada o método de escolha paraavaliação das lesões suspeitas, sendo especialmenteútil nos pacientes com imagem tomográfica duvidosaou em localização que não é bem visibilizada pelatomografia (por exemplo, fossa posterior)7,8. Alémdisso, a ressonância pode fornecer melhores infor-mações com relação à localização anatômica, àdiferenciação e ao número de lesões e também evitao risco de anafilaxia pelo contraste iodado. Entretanto,em algumas situações como nos casos de hemorragiaaguda ou envolvimento metastático da calota craniana,a tomografia computadorizada tem melhor reso-lução3,4,7,8.

Na maioria dos pacientes com história conhecidade câncer, a certeza de que uma lesão cerebral única,apresentando realce, corresponda a uma metástasegira em torno de 90%3. Contudo, há exceções e,portanto, uma lesão não deve ser classificada como

Rev. Neurociências 9(1): 20-26, 2001

Metástases Cerebrais

Page 22: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

22

metastática sem a definitiva comprovação histopato-lógica3,4. Também vale ressaltar que lesões denatureza diversa podem ter aspecto radiológicosugestivo de metástase. Como exemplos podem sercitados os processos inflamatórios e infecciosos(granulomas, abscessos), vasculares (hemorragiasem reabsorção, infartos) e neoplasias cerebraisprimárias, que podem ocorrer mesmo nos pacientescom câncer sistêmico conhecido3,4,8.

Por outro lado, pacientes sem diagnóstico préviode câncer podem apresentar sintomas neurológicose achados de neuroimagem sugestivos de metástases.Esses casos constituem um desafio para o diag-nóstico, devendo ser cuidadosamente abordados. Oexame clínico minucioso pode detectar tumoresprimários do reto, dos testículos, da próstata, damama, dos linfonodos e da pele (melanoma). Comomuitas das metástases cerebrais originam-se nopulmão e como também é freqüente o acometimentoconcomitante desse órgão na maioria das neoplasias,deve-se dar especial atenção ao tórax. Neste caso,recomenda-se a realização de radiografia de tórax ecitologia do escarro, estendendo-se a investigaçãocom tomografia, ressonância, broncospia com lavadoe biópsia nos casos suspeitos4. O mapeamento ósseotambém pode detectar lesões metastáticas, eventual-mente acessíveis para biópsia. A tomografia deabdome e pelve pode ser útil para o diagnóstico decarcinoma renal e de outras neoplasias abdominais.Exames relativamente simples, como a pesquisa desangue oculto nas fezes, podem fornecer informaçõesrelevantes e direcionar a investigação clínica.Marcadores bioquímicos, como CEA, alfa-feto-proteína e CA 125, podem ser úteis na pesquisa detumores embrionários. Nas mulheres, recomenda-seespecial atenção à possibilidade de carcinoma demama, indicando-se a realização de mamografia. Seapós extensa investigação não for encontrado o tumorprimário e se a lesão cerebral for acessível à cirurgia,indica-se a sua exérese para diagnóstico e eventualtratamento4. No caso de lesões múltiplas ou quandoa lesão única for de difícil acesso, a biópsia porestereotaxia pode ser mais adequada, embora existao risco de disseminação tumoral ao longo do trajetoda agulha utilizada nesse procedimento8,9.

Tratamento

A literatura disponível sobre a história natural dasmetástases cerebrais sugere uma sobrevida medianaem torno de 7 semanas, quando as lesões sintomáticasnão são tratadas4, com óbito geralmente decorrentede aumento da pressão intracraniana e conseqüente

herniação cerebral produzindo compressão do tronco,ou de intercorrências clínicas (distúrbios metabólicose infecciosos). Todas as evidências disponíveis, atéo momento, indicam que a sobrevida é maior e commelhor qualidade de vida se as metástases cerebraisforem tratadas3,4,8.

O tratamento das metástases cerebrais com-preende duas etapas fundamentais: o tratamentosintomático e o específico. O primeiro visa à estabi-lização do paciente crítico e inclui o controle dapressão intracraniana (com uso de corticosteróidese/ou de agentes hiperosmolares) e o tratamento deeventuais crises epilépticas, dos distúrbios metabólicoe infeccioso, bem como dos estados de hipercoa-gulabilidade que podem acompanhar alguns tipos decâncer1,3,10,11.

Com o paciente em situação estável, o tratamentoespecífico dependerá do número e da localização daslesões, do diagnóstico e do estadiamento do tumorprimário, bem como do comportamento biológico daneoplasia primária.

Tratamento sintomático

Os corticosteróides constituem o primeiro trata-mento para os pacientes com metástases cerebraisdesde 19604,8. A melhora clínica é usualmenteevidente dentro de 24 a 48 horas após o início dacorticoterapia e dá-se preferência ao uso da dexa-metasona na dose de 16 mg/dia, em doses fracio-nadas, ou mesmo doses maiores, quando não háresposta significativa em 48 horas. Embora se acrediteque essa melhora seja decorrente da redução do edemacerebral, o exato mecanismo de ação ainda édesconhecido. Tem sido sugerido que essa melhoraesteja relacionada com alterações no metabolismocelular8,12. O tratamento específico deve ser entãoinstituído, com redução progressiva do corticosteróideaté a mínima dose possível. Os efeitos colaterais douso de corticosteróides incluem o risco de desenvol-vimento ou agudização de úlceras pépticas, alteraçõesmetabólicas (por exemplo, hiperglicemia), miopatia,hipertensão arterial, síndrome de Cushing, distúrbiosdo sono, ganho ponderal, psicose, tremores, bemcomo infecções oportunistas. Também é conhecidaa potencial interação da dexametasona com afenitoína, recomendando-se a monitorização dosníveis séricos de fenitoína nos pacientes que estejamusando essa associação8.

Os pacientes com metástases cerebrais podemrequerer o uso de drogas antiepilépticas (DAE) paratratamento ou para profilaxia de crises epilépticas.

Rev. Neurociências 9(1): 20-26, 2001

Metástases Cerebrais

Page 23: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

23

Alguns autores sugerem que os pacientes commetástases de melanoma têm maior risco de crises,devendo receber DAE profilaticamente8. Entretanto,o uso dessas drogas nos pacientes que não apresen-taram crises ou que ainda não foram submetidos àcirurgia é muito controverso. Quando o uso é indicado,a fenitoína é a primeira droga de escolha devido à dispo-nibilidade de uso endovenoso e seu menor efeitosedativo. Contudo, há relatos de síndrome de Stevens-Johnson após a radioterapia, em pacientes que usavamfenitoína8,13. Já foi demonstrado in vitro que a fenitoínapode estimular a proliferação linfocitária e, por outrolado, a radioterapia pode diminuir a atividade doslinfócitos T supressores. Deste modo, esses doisfatores poderiam explicar o efeito sinérgico daradioterapia e da fenitoína, aumentando a incidênciada síndrome de Stevens-Johnson8.

Muitos pacientes com câncer apresentam distúr-bios de coagulação e a complicação mais freqüente éa tromboflebite, com ou sem embolia pulmonar10,tornando necessário, nestes casos, o tratamentoprofilático e, eventualmente, a anticoagulação. Valeressaltar que a incidência de hemorragia intratumoralnão é maior nos pacientes com tumores cerebraisprimários ou metastáticos em uso de anticoagulantesdo que naqueles que não os estejam usando10.

Tratamento específico

As opções de tratamento para os pacientes commetástases cerebrais incluem o uso de quimioterapia,radioterapia de encéfalo total ou localizada, cirurgiaconvencional e radiocirurgia. Para os pacientes commetástase cerebral única, a ressecção cirúrgicapermanece como importante opção terapêutica4,8. Asvantagens da cirurgia incluem a possibilidade deestabelecer ou confirmar o diagnóstico, melhorar osdéficits neurológicos e permitir o controle local dotumor4,8. Além disto, com os avanços cirúrgicosocorridos nos últimos anos, tem-se observadoconsiderável redução da morbidade. Exemplos destesavanços incluem o uso de métodos que permitemmelhor localização do tumor como ultrassonografia,tomografia de crânio e ressonância magnética intrao-peratórios e também a utilização de exames funcionaisque possibilitam a identificação de áreas eloqüentescomo o córtex motor primário, diminuindo assim asseqüelas neurológicas8. O tratamento clássico dametástase cerebral única consiste na ressecção cirúr-gica seguida de radioterapia, proporcionando umasobrevida mediana de 40 semanas, a qual é signifi-cativamente maior que as 15 semanas obtidas comradioterapia como tratamento único8,14,15. O aumento

Rev. Neurociências 9(1): 20-26, 2001

da sobrevida observado nos pacientes com metástaseúnica submetidos a tratamento cirúrgico tementusiasmado alguns neurocirurgiões a considerar apossibilidade de cirurgia nos pacientes com metástasesmúltiplas, o que é particularmente útil no caso delesões radiorresistentes como as do melanoma e doscarcinomas de cólon e rim4,8. De modo geral,preconiza-se a cirurgia para pacientes com até 3lesões4.

A radioterapia externa convencional é indicadaclassicamente para os pacientes com múltiplasmetástases ou com metástase única associada a doençasistêmica disseminada. O esquema padronizado pelamaioria dos serviços consiste em radiação externa demegavoltagem com dose total variando de 30 a 45 Gy.Têm sido descritas variações de dose e de fracio-namento, mas, excetuando-se os esquemas ultra-rápidos de altas doses, os quais são associados commaior morbidade e recidiva precoce, ainda não foramdemonstradas diferenças significativas nestesesquemas4,8,16. A sobrevida mediana proporcionada pelaradioterapia é de 3 a 6 meses e cerca de 10 a 15% dospacientes sobrevivem além do 1º ano4. Entretanto, valeressaltar que, como a maioria dos pacientes commetástases cerebrais morre em função da progressãosistêmica da doença, a sobrevida não deve ser o únicoparâmetro considerado para a avaliação da eficácia daradioterapia, devendo ser analisados outros fatores,como controle local da doença e tempo livre desintomas neurológicos4,8,16-18.

A radioterapia localizada com fonte externa(radiocirurgia extereotáxica ou gamma-knife) oucom uso de implantes (braquiterapia) consiste numaopção terapêutica que vem ganhando força nosúltimos anos4. Estas modalidades de radioterapiaobjetivam a utilização de uma dose focal de radiação,concentrando-a no alvo e diminuindo os efeitos nostecidos adjacentes. É uma opção para as lesõesinacessíveis cirurgicamente e as metástases são oalvo preferencial para esta modalidade de tratamentoporque têm formato aproximadamente esférico egeralmente não invadem os tecidos vizinhos. Aradiocirurgia é geralmente bem tolerada, emborasejam descritos efeitos colaterais como náuseas evômitos em pacientes com tumores na região do IVventrículo4,8. Ainda não há consenso sobre a eficáciada radiocirurgia em relação à cirurgia convencional,sendo recomendada para pacientes com lesões dedifícil acesso e de pequeno tamanho. Os critériosque indicam melhor prognóstico com a radiocirurgiasão a presença de lesão única, índice de Karnofskymaior que 70 e ausência de doença sistêmicadisseminada19,20-24.

Metástases Cerebrais

Page 24: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

24

A braquiterapia consiste no implante de fontes deradiação que podem ser de alta e baixa dosagem deIodo 125. Os de baixa dosagem são implantados sobcraniotomia enquanto os de alta são colocadostemporariamente por meio de extereotaxia8. Até omomento, a braquiterapia tem lugar limitado notratamento das metástases cerebrais, ficandoreservada para os pacientes que esgotaram outraspossibilidades terapêuticas8.

O comportamento biológico da neoplasia tambémdeve ser considerado, pois alguns tumores são maisradiossensíveis que outros, como descrito porCairncross et al.16. Segundo estes autores, as metás-tases cerebrais dos carcinomas de mama e pulmãoapresentam boas respostas clínica e tomográfica àradioterapia. Já os pacientes com metástases demelanoma, carcinoma renal e de cólon, emboratenham uma aparente melhora com a radioterapia ecom o uso de corticosteróides, geralmente não apre-sentam resposta tomográfica evidente. De modogeral, a radioterapia é paliativa em 66% a 75% doscasos e critérios tomográficos mostram melhora em50% a 60% dos pacientes. Os tumores de menortamanho respondem melhor e a presença de mais detrês lesões confere prognóstico mais reservado4.

Ainda há outras questões controversas comrelação à radioterapia, como uso de radiaçãoprofilática, reirradiação, uso de radioproterores e demedicações sinérgicas.

Em alguns serviços, utiliza-se a radioterapiacerebral profilática para os pacientes com diagnósticode carcinoma pulmonar de pequenas células, queainda não apresentaram metástases cerebrais,baseando-se no fato de que este tumor é radios-sensível. Recentemente foram revisados 11 estudosrealizados sobre essa questão e não foi demonstradoaumento da sobrevida, embora a maioria dos estudosdescreva menor taxa de ocorrência de metástases parao sistema nervoso central8.

Apesar de muito freqüentemente os pacientes nãosobreviverem tempo suficiente para a observação demanifestações clínicas tardias induzidas pela radio-terapia, há relatos de neurotoxicidade tardia nospacientes que alcançaram maior sobrevida. DeAngeliset al.25 relataram a ocorrência de complicações tardiasinduzidas pela radioterapia em pacientes que estavamaparentemente “curados” e que receberam doses deradioterapia variando entre 2.500 e 3.900 cGy. Entreas alterações descritas, há relatos de demênciaprogressiva, ataxia e incontinência urinária.

Na maioria dos serviços, associam a radioterapiaao uso de corticosteróides. Estes, além de influen-

ciarem na melhora clínica dos pacientes, tambémreduzem os efeitos colaterais da radioterapia, comonáuseas e cefaléia, melhorando, assim, a qualidadede vida dos pacientes8.

Classicamente, admite-se que uma das grandeslimitações da quimioterapia para o tratamento demetástases cerebrais é o fato de que as drogas comu-mente utilizadas não ultrapassariam a barreirahematoencefálica (BHE). Entretanto, há relatos dealterações na BHE nos tumores metastáticos e depenetração das drogas antineoplásicas nessaslesões26,27. Vários estudos prospectivos têm relatadoresultados favoráveis de quimioterapia como trata-mento primário para metástases cerebrais empacientes com carcinomas de mama, adenocarcinomae carcinoma pulmonar de pequenas células, neoplasiatrofoblástica gestacional e de tumores germi-nativos26,27. Contudo, esses resultados ainda nãoforam observados em estudos randomizados. Asevidências de potencial valor da quimioterapia incluema medida da concentração das drogas antineoplásicasnas metástases, mostrando que níveis citotóxicospodem ser alcançados26,27. Também vale ressaltar queas metástases comumente surgem em fases avançadasdo câncer, quando muitas vezes já há resistência aosantineoplásicos de primeira linha, de modo que aresposta esperada é sempre menor e, além disso,muitos tumores apresentam metástases para o sistemanervoso central, como o melanoma e o carcinomarenal, que são, geralmente, resistentes aos quimiote-rápicos de primeira linha27.

Retratamento

Nos pacientes com doença sistêmica controlada,a recorrência de metástases cerebrais previamentetratadas é relativamente comum8 e seu tratamento éespecialmente difícil. Todos os dados referentes aessa questão são baseados em estudos retros-pectivos. A reirradiação externa paliativa ofereceuma sobrevida de 2 a 4 meses e, quando possível, aradiocirurgia proporciona melhor controle local dadoença8. Em casos selecionados, uma nova cirurgiatambém pode ser útil28,29. A braquiterapia tambémpode ser uma opção, mas seu valor ainda não foiestabelecido8.

Cuidados terminais

A despeito de todos os avanços no tratamento dasmetástases cerebrais, o prognóstico desses pacientespermanece reservado, com sobrevida global em torno

Rev. Neurociências 9(1): 20-26, 2001

Metástases Cerebrais

Page 25: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

25

de 12 meses8. Com relação aos cuidados terminais,o tratamento sintomático é fundamental, dando-seimportância ao controle do edema cerebral e dascrises epilépticas. Muitos pacientes têm doençadisseminada sistemicamente e podem requereranalgesia para controle da dor, devendo-se ressaltarque os pacientes com metástases cerebrais sãogeralmente mais sensíveis aos opióides, podendoapresentar sonolência ou quadro confusional emdecorrência da analgesia8.

SUMMARY

Brain metastasesBrain metastases are common in cancer patients.

The frequency of this complication seems to be raisingas a result of more aggressive treatment of cancer aswell more accurate diagnosis by use of neuroimagingmethods. The clinical relevance of the treatmentbecomes evident with the development of effectivetherapeutic approaches to control the primary tumor.The main purpose of the treatment is to reverseneurological deficits and to increase survival, besidesimproving quality-of-life. The authors review theclinical manifestations, diagnosis and the maintreatment options for brain metastases.

Keywords

Intracerebral metastases, surgery, radiotherapy,clinical management.

Referências

1. Patchell AR. Metastatic brain tumors. In: Brain tumors inadults. Black PM, Wen PY (eds.). WB SaunndersCompany, Philadelphia, 1995, pp. 95-9.

2. Nguyen LN, Maor MH, Oswald MJ. Brain metastases asthe only manifestation of an undetecd primary tumor.Cancer, 83:2181-4, 1998.

3. Thapar K, Laws ER. Tumores Del Sistema NerviosoCentral. In: Oncologia Clínica. Murphy GP, Lawrence W(eds.). American Cancer Society, Washington, 1995, pp.424-62.

4. Posner JB. Intracranial metastases. In: Neurologiccomplications of cancer. Posner JB (ed.). FA DavisCompany, Philadelphia, 1995, pp. 77-110,.

5. Delattre JY, Krol G, Thaler HT, Posner JB. Distribuiton ofBrain Metastases. Arch Neurol, 45:741-4, 1988.

6. Hwang TL, Close TP, Grego JM, Brannon WL, GonzalesF. Predilection of brain metastases in gray and whitematter junction and vascular border zones. Cancer,77:1551-5, 1996.

7. Yokoi K, Kamya N, Matsuguma H, Machida S, Hirose T etal. Detection of brain metastasis in potentially operablenon-small cell lung cancer. A comparision of CT and MRI.Chest, 115:714-9, 1999.

Rev. Neurociências 9(1): 20-26, 2001

8. Davey P. Brain metastases. Curr Probl Cancer, 23:59-98, 1999.

9. Karlsson B, Ericson K, Kihlstrom L, Grane P. Tumorseeding following sterotactic biopsy of brain metastases.J Neurosurgery, 87:327-30, 1997.

10. Posner JB. Supportive care agents and their complica-tions. In: Neurologic complications of cancer. Posner JB(ed.). FA Davis Company, Philadelphia, 1995, pp. 59-74.

11. Cohen N, Strauss R, Lew R, Silver D, Recht L. Shouldprophylactic anticonvulsivants be administred to patientswith newly-diagnosed cerebral metastases? A retros-pective analyses. J Cli Oncol, 6:1621-4, 1988.

12. Chumas GH, Condon B, Oluoch-Olunya D, Griffths S,Hadley D et al. Early changes in peritumorous oedemaand contralateral white matter after dexamethasone: astudy using proton magnetic ressonance spectros-copy. J Neurol Neurosurg Psychiatry, 62:590-5, 1997.

13. Cockey GH, Amann ST, Reents SB, Lynch JW. Steevens-Johnsons syndrome resulting from whole – Brain radiationand phenytoin. Am J Clin Oncol, 19:32-4, 1996.

14. Patchel l RA, Tibbs PA, Walsh JW, Dempsey RJ,Maruyama Y et al. A randomized trial of surgery in thetreatment of single metastases to the brain. N Engl JMed, 322:494-500, 1990.

15. Vecht CJ, Haaxma - Reiche H, Noordijk EM, PadbergGW, Voormolen JHC et al. Treatment of single brainmetastasis: radiotherapy alone or combined withneurosurgery? Ann Neurol, 33:583-90, 1993.

16. Cairncross JG, Kim JH, Posner JB. Radiaton therapy forbrain metastases. Ann Neurol, 7:529-41, 1980.

17. DeAngelis LM, Mandell LR, Thaler HT, Kimmel DW,Galicich JH et al. The role of post-operative radiotherapyafter ressection of single brain metastases. Neuro-surgery, 24:798-805, 1989.

18. Sause WT, Crowley JJ, Morantz R, Rotmam M, MowryPA et al. Solitary brain metastases: results of an RTOG /SWOG protocol evaluation surgery + RT versus RT alone.Am J Clin Oncol, 13:427-32, 1990.

19. Laing RW, Warrington AP, Hines F, Graham JD, Brada M.Fractioned stereotactic external beam radiotherapy inthe management of brain metastases. Eur J Cancer,29:1387-91, 1993.

20. Lavine SD, Petrovich Z, Cohen - Gadol AA, Masri LS,Morton DL et al. Gamma knife radiosurgery for metastaticmelanoma: an analysis of survival, outcome andcomplications. Neurosurgery, 44:59-66, 1999.

21. Cho KH, Hall WA, Gerbi BJ, Higgins PD, Bohen M et al.Patient selection criteria for the treatment of brainmetastases with stereotactic radiosurgery. J Neurooncol,40:73-86, 1998.

22. Alexander III E, Moriarty TM, Davis RB, Wen PY, Fine HAet al. Stereotactic radiosurgery for the definit ive,noninvasive treatment of brain metastases. J Natl CancerInst, 87:34-40, 1995.

23. Bindal AK, Bindal RK, Hess KR, Shiv A, Hassenbush SJet al. Surgery versus radiosurgery in the treatment ofbrain metastasis. J Neurosurg, 84:748-54, 1996.

24. Sneed PK, Lamborn KR, Forstner JM, McDermont MW,Chang S et al. Radiosurgery for brain metastases: iswhole brain radiotherapy necessary? Int J RadiationOncology Biol Phys, 43:549-58, 1999.

25. DeAngelis LM, Delattre JY, Posner JB. Radiation–Induceddementia in patients cured of brain metastases. Neurology,39:789-96, 1989.

Metástases Cerebrais

Page 26: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

26

Rev. Neurociências 9(1): 20-26, 2001

26. Malacarne P, Santini A, Maestri A. Response of brainmetastases from lung cancer to systemic chemotherapywith carboplatin and etoposide. Oncology, 53:210-3,1996.

27. Siegers HP. Chemotherapy for brain metastases: recentdevelopments and clinical considerations. Cancer TreatVer, 17:63-76, 1990.

28. Arbit E, Wronski M, Burt M, Galicich JH. The treatment ofpatients with recurrent brain metastases. A retrospectiveanalyses of 109 patients with non-small cell lung cancer.Cancer, 76:765-73, 1995.

29. Sundaresan N, Sachden VP, DiGiacinto GV, HugghesJEO. Reoperation for brain metastases. J Clin Oncol,6:1625-9, 1988.

Endereço para correspondência:Adrialdo José SantosDisciplina de NeurologiaEscola Paulista de Medicina – UnifespRua Botucatu, 740CEP 04023-900 – São Paulo, SPE-mail: [email protected]

Metástases Cerebrais

Page 27: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

27

ARTIGO

1 Médico Doutor em Neurologia pela Escola Paulista de Medicina – Unifesp.

NeuroesquistossomoseSandro Luiz de Andrade Matas1

RESUMOA neuroesquistossomose é uma complicação ectópica da esquistossomose, sendo cada vez mais relatada na literaturamédica. Tal fato ocorre porque a incidência dessa complicação neurológica oscila entre 0,4% a 3% dos pacientes comesquistossomose e no Brasil há cerca de 16 milhões de esquistossomóticos. A forma de apresentação clínica daneuroesquistossomose mansônica varia com o estágio de evolução da esquistossomose. Na forma intestinal ehepatointestinal, o comprometimento raquimedular é mais freqüente. Já a neuroesquistossomose encefálica ocorremais freqüentemente nos pacientes com hipertensão portal e/ou pulmonar. O diagnóstico diferencial faz-seprincipalmente com as doenças inflamatórias e infecciosas crônicas do SNC, principalmente quando o quadro demielomeningorradiculite está presente: neurocisticercose raquimedular, paraparesia espástica tropical, meningiteeosinofílica etc. O exame de LCR apresenta como alteração aumento de células, em geral de 100 a 400 células por mm3,proteína discretamente aumentada, diferencial linfomonocitário predominante com presença de eosinófilos e reaçõesimunobiológicas positivas para Schistosoma mansoni. A eficácia do tratamento está diretamente relacionada aodiagnóstico precoce. Quanto mais cedo iniciar o tratamento específico, maior será a chance de recuperação. Estetratamento baseia-se na utilização de vermicida associado a corticoesteróides por um período de 7 a 15 dias.noentanto, não são possíveis. São sugeridos aprimoramentos metodológicos para estudos futuros sobre essa questão.Unitermos: Esquistossomose, Schistosoma mansoni, neuroesquistossomose.

Rev. Neurociências 9(1): 27-31, 2001

Introdução

Embora a esquistossomose não seja caracteris-ticamente uma parasitose intestinal, nem adquiridapela via gastrintestinal, pois é uma parasitose vascular,ela é estudada dentro do grupo das enteroparasitosespor causar importantes alterações vasculares nosistema porta do aparelho digestivo gastrointestinal1.O comprometimento neurológico do sistema nervosocentral (SNC) constitui afecção ectópica da doençasegundo definição proposta por Faust et al.2.

Existem três espécies principais que acometem oSNC do homem: Schistosoma japonicum, Schistosomahaematoium e Schistosoma mansoni. O acometimentodo SNC pode manifestar-se principalmente comoquadro encefálico, meníngeo, mielítico (cone eepicone medular na maioria das vezes), pseudotumoralgranulomatoso e mielomeningorradiculítico.

A espécie Schistosoma mansoni, a única presenteem nosso meio, foi provavelmente trazida da Áfricacom o tráfico negreiro. As áreas de maior endemi-cidade situam-se nos estados do nordeste e Minas

Gerais, existindo focos em quase todos os estadosdo Brasil, ocasionados pelo grande fluxo migratórioaqui existente3.

A via de infestação do homem faz-se pelapenetração das cercárias através da pele, quando oindivíduo toma contato com água infestada por estas.A cercária diferencia-se em esquistossômulo queganha a corrente sangüínea, desenvolvendo a formaadulta já no sistema porta-hepático, onde acasala e, apartir do 37o dia, começa a oviposição1.

O comprometimento do sistema nervoso está nadependência da presença dos ovos ou dos vermesadultos nos parênquimas cerebral, medular ou noespaço subaracnóideo. O comprometimento ence-fálico‚ mais raro na esquistossomose mansônica, émais freqüente na esquistossomose japônica. OSchistosoma mansoni alcança o cérebro quando háhipertensão portal, pois existe desvio do fluxo venosointra-abdominal para o sistema da cava superior. Nacirculação pulmonar, por shunts arteriovenosospulmonares, o Schistosoma mansoni alcança acirculação sistêmica sendo embolizado para diversos

Page 28: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

28

órgãos, entre eles o encéfalo4,5. Nestes casos, odiagnóstico faz-se tardiamente, não raro em achadosde autópsia, quando o paciente está em fase terminalda doença. O comprometimento intracranianotambém pode ser alcançado pela ampla comunicaçãodo sistema venoso intra-abdominal com o plexovenoso vertebral e subaracnóideo. Como é avalvular,o sangue abdominal pode alcançar os seios venososintracranianos. A favor dessa hipótese existemdescrições anatomopatológicas de ovos de Schisto-soma mansoni depositados em fileiras, em regiõespróximas a grandes seios venosos6,7.

O comprometimento mielomeningorradicular faz-se na fase intestinal e/ou hepatointestinal da doença,quando os ovos e/ou vermes adultos alcançam osplexos venosos vertebrais via plexo de Batson. Esseplexo foi estudado por Batson, em 1940, ao analisaras vias para as metástases do câncer de próstata.Batson observou que esse plexo é totalmentedesprovido de válvulas e comunica o sistema venosointra-abdominal com o vertebral. Assim, com oaumento da pressão venosa intra-abdominal, o sanguepode fluir livremente para o plexo venoso vertebral8.

Basicamente, a forma mielorradicular acomete oindivíduo jovem e produtivo. Nele, pela prensaabdominal, há um refluxo do sangue abdominal parao sistema venoso vertebral, carreando os ovos e/ouvermes para os vasos aí localizados. A partir disso,inicia-se o processo natural de exclusão dos ovospela formação de granuloma de corpo estranhoinduzido pelo próprio ovo. Assim, o ovo alcança oespaço subaracnóideo ou o parênquima medular. Noespaço subaracnóideo, começa um processoinflamatório do tipo imunoalérgico, com pleocitosepor células linfomonocitárias, presença variável deeosinófilos e aumento das proteínas do líquidocefalorraquidiano (LCR).

Quando há formação de granuloma, instala-se umquadro clínico sugestivo de bloqueio do espaçosubaracnóideo, parcial ou mesmo absoluto, origi-nando líquido de estase com grande teor protéico.Esta forma é a mais freqüente, pois recebediagnóstico inicial de processo expansivo intra-raquidiano; por este motivo, há exploração cirúrgicae o diagnóstico faz-se por exame anatomopatológicodo material extirpado6,9,10.

A evolução desfavorável para óbito geralmenteocorre por complicações de origem infecciosa. Nessescasos, observamos, à necropsia, o comprometimentotanto meníngeo quanto mielofunicular mais freqüentenas porções baixas da medula espinhal (cone, epiconee região toracolombar)4,11,12. O substrato anatomo-

patológico desse comprometimento fundamenta-sebasicamente no encontro de granulomas verdadeiros,tendo no centro restos de ovos do Schistosomamansoni em meninges e tecido parenquimatosocerebral e/ou medular. Algumas vezes, há umfenômeno vascular do tipo vasculite ao redor dosovos do Schistosoma mansoni sem processo granulo-matoso, geralmente acompanhado de amolecimentomedular resultante de infartos ocasionados pelavasculite.

O quadro clínico da neuroesquistossomose man-sônica está relacionado mais freqüentemente com ocomprometimento mielomeningorradicular em quepredominam as seguintes queixas13-15:

– Paraparesia, na maioria das vezes, de evoluçãoprogressiva e, às vezes, paraplegia.

– Paraparestesia e hipoestesia principalmente emregião selar (S1 a S5).

– Alterações esfincterianas vesical e retal, tantocom incontinência como retenções.

– Impotência sexual.Este quadro, por vezes, é precedido por forte dor

lombar baixa e relacionado a esforços físicosexecutados no dia anterior, tais como levantar peso,jogar bola, exercício abdominal, lavar roupa agachada,esforço evacuatório etc. Quase sempre há históriade infestação recente – contato com água contaminada(lagoas de coceira) entre 6 meses a 1 ano do inícioda doença neurológica.

O diagnóstico de mielomeningorradiculite esquis-tossomótica deve ser lembrado sempre que houver oquadro neurológico descrito acima e antecedente epi-demiológico para esquistossomose. O diagnóstico deesquistossomose clínica deve ser confirmado peloexame protoparasitológico, reações sorológicas16,17

e, quando necessário, biópsia de valva retal. Portanto,o diagnóstico de neuroesquistossomose é feito peloachado de esquistossomose e do distúrbio neuro-lógico mielomeningorradicular característico. Sendoassim, distúrbios neurológicos, focais e encefálicos,causados por esquistossomose, quase sempre nãosão diagnosticados antes de intervenção cirúrgica. Eessa intervenção só se realiza nos casos granulo-matosos em que o diagnóstico prévio é o de processoexpansivo tumoral intracraniano. Quando a neuro-esquistossomose encefálica assumir outras formasde manifestação, o diagnóstico só será realizado porestudo anatomopatológico na eventual evolução paraêxito letal do paciente.

As manifestações encefálicas são inespecíficase estão relacionadas às mesmas alterações pato-

Rev. Neurociências 9(1): 27-31, 2001

Neuroesquistossomose

Page 29: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

29

lógicas vistas nas porções raquimedulares. Opaciente pode apresentar, além da forma pseu-dotumoral granulomatosa, meningite linfomono-citária com presença ou não de eosinófilos, mani-festações vasculares isquêmicas ou hemorrágicasocasionadas por fenômeno vasculítico, encefaliteaguda e difusa etc.

No LCR, além das alterações imunoalérgicas,podemos realizar reações laboratoriais na tentativade diagnosticar a neuroesquistossomose13,18. Estesexames são ELISA, hemaglutinação indireta, reaçãode imunofluorescência indireta, reação periovularetc.13,19. Todas as reações descritas visam àidentificação de anticorpos anti-Schistosoma mansonino LCR. Portanto, devemos levar em consideraçãoque o conjunto das imunoglobulinas do LCR é oriundodo sangue. Testes muito sensíveis podem detectarfrações de imunoglobulinas que passaram pela barreirahematoencefálica, mas não foram de produçãointratecal. Atualmente, a reação que melhor satisfazo conceito de sensibilidade e especificidade paraneuroesquistossomose é a reação de imunofluores-cência indireta, utilizando-se como substrato anti-gênico corte parafinado de verme adulto de Schisto-soma mansoni, com conjugado fluoresceínico, o anti-IgM humano20. Ao pensar no diagnóstico de neuroes-quistossomose, não basta a coexistência de esquistos-somose associada a sinais e sintomas de comprome-timento neurológico, principalmente por tratar-se dedoença crônica que, em regiões endêmicas, afetagrande parte da população.

Em áreas onde é alta a prevalência da esquis-tossomose, é previsível a concomitância dessa para-sitose com outras doenças, incluindo as inflama-tórias e/ou infecciosas do SNC. Para exemplificaressa possibilidade, citamos o trabalho de AndradeFilho et al .21 que relata a alta prevalência daparaparesia espástica tropical entre mulheres daBahia, estado onde a esquistossomose é um graveproblema de saúde. Essa mielopatia causa alteraçõesno líquido cefalorraquidiano, assim como no exameneurológico, semelhantes à neuroesquistossomose.O agente etiológico é um retrovírus identificado pelasigla HTLV-I (Human T-Cell Lymphotrophic VirusType I) . Nesses casos, há aumento da per-meabilidade da barreira hematoencefálica, possi-bilitando a passagem de imunoglobulinas plasmáticasdo soro para o líquido cefalorraquidiano22,23. Por-tanto, essa passagem de anticorpos anti-Schistosomamansoni para o líquido cefalorraquidiano não indicacomprometimento do sistema nervoso pela esquis-tossomose, apesar de ser suficiente para poderpositivar algumas reações muito sensíveis. A

possibilidade da concomitância dessa doença comesquistossomose sistêmica dificulta o diagnósticodiferencial , exigindo uma reação al tamenteespecífica para o diagnóstico da neuroesquistos-somose.

Outra doença de alta prevalência no Brasil é acisticercose, sendo a neurocisticercose (NC) suacomplicação mais grave. Algumas vezes, o com-prometimento do sistema nervoso da NC é ra-quimedular24-27. Nesses casos, o diagnóstico dife-rencial torna-se muito difícil, pois pode haver reaçõescruzadas nos testes laboratoriais28,29.

Tratamento

O sucesso do tratamento depende de diagnósticoprecoce sobre o acometimento neurológico. Ao con-trário, quando o diagnóstico é tardio, podem ocorrerdanos irreversíveis no SNC13,14,30.

O praziquantel, na dosagem de 40 a 60 mg/kg emtomada única, associado com corticosteróides,proporciona melhora significativa, algumas vezes comrecuperação completa do dano neurológico.

O albendazol, um derivado do grupo dos benzi-midazólicos, é um anti-helmíntico de amplo espectrocom ação tríplice: vermicida, ovicida e larvicida. Temboa absorção por via intestinal, alcançando níveisplasmáticos em 3 a 4 horas da administração31. Atuainterferindo no nível molecular, alterando a cito-arquitetura por ligação aos microtúbulos (tubulin)intracelulares32. No entanto, sua utilização emesquistossomose permanece controversa na lite-ratura33-36. É um anti-helmíntico recente, com poucosefeitos colaterais. Como na neurocisticercose37, adose recomendada situa-se entre 10 e 15mg/kg,dividida em três tomadas e associada a corticos-teróides.

Prognóstico

A neuroesquistossomose é um problema desaúde pública. Basta lembrarmos que até recente-mente essa patologia era considerada rara. Porém,a freqüência do acometimento neurológico oscilaentre 0,3% e 4% dos portadores de esquistos-somose. No Brasil, existem cerca de 10% deindivíduos com esquistossomose (+/-17 milhões)3,logo há possibilidade de existir hoje algo em tornode 51.000 a 680.000 pessoas com neuroesquis-tossomose ou com grande potencial para ter talafecção neurológica.

Rev. Neurociências 9(1): 27-31, 2001

Neuroesquistossomose

Page 30: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

30

SUMMARY

NeuroschistosomiasisAlthough considered rare, there is progressive

increase of reports in medical literature of thiscomplication of the schistosomiasis. Such fact happensbecause the incidence of the neurological complicationoscillates among 0,4 to 3% of the patients withschistosomiasis, but there are about 16 million peopleonly in Brazil with this disaese, and over to 200 millionspeople in the word. The clinical form of presentationvaries with the apprenticeship of evolution of theschistosomiasis. The spinal cord disease is morefrequent in the intestinal form of schistosomiasis. Thebrain schistosomiasis already happens more frequentlyin the patients with portal hypertension. The differentialdiagnosis makes mainly when there are chronicinflammatory diseases of CNS, mainly when acutespinal cord complications picture is present: spinalneurocysticercosis, tropical spastic paraparesis (HTLVI infection), eosinophilic meningitis, and others. Theexam of CSF presents with increased cells, in generalof 100 to 400 cells/mm3; mild increased protein;lymphocytes and monocytes are predominant, but CSFeosinophilia is seldom seen; there are CSF positivereactions for Schistosoma mansoni. The effectivenessof the treatment is directly related to the precociousdiagnosis. Earlier the specific treatment, better will bethe recovery chance. This treatment bases on the useof associated drugs against Schistosoma mansoni withsteroids, for a variable period of 7 to 15 days.

Keywords

Schistosomiasis, Schistosoma mansoni, neuros-chistosomiasis.

Referências

1. Elliott DE. Schistosomiasis: pathophysiology, diagnosis,and treatment. Gastroenterology Clinics of NorthAmerica, 25:599-624, 1996.

2. Faust EC. An inquiry into ectopic lesions in schisto-somiasis. Ann Trop J Med Hyg, 8:175-99, 1948.

3. Santos AR. Esquistossomose. Fundação Nacional daSaúde – Gerência Técnica de Esquistossomose.Endereço na Internet (1998) – http://www.fns.gov.br/acoes/doencas/esquis/esquis.htm.

4. Scrimgeour EM & Gajdusek DC. Involvement of thecentral nervous system in Schistosoma mansoni andS.hematobium infection. A review. Brain, 108:1023-38,1985.

5. Pittella JEH. Neuroschistosomiasis. Brain Pathol, 7:649-62, 1997.

6. Greenfield JG & Pritchard EAB. Cerebral infection withSchistosoma japonicum. Brain, 60:361-72, 1937.

Rev. Neurociências 9(1): 27-31, 2001.

7. Perkins RF & Uihlen A. Cerebral schistosomiasis. J NervMent Dis, 107:207-19, 1948.

8. Batson OV. The function of the vertebral veins and theirrole in the spread of metastases. Ann Surg, 112:138-43,1940.

9. Couto D & COSTA N. – Esquistossomose da medula.Jornal Brasileiro de Neurologia 1 (2):189-377, 1949.

10. Rosembaum RM, Ishii N, Tanowitz H, Wittner M. Shistoso-miasis mansoni of spinal cord – Report of a case. TheAmericam Journal of Tropical Medicin and Hygiene,21:182-4, 1972.

11. Morais Junior LC, Maciel DRK, Tamburus WM, WanderleyCFO, Balalai H & Câmara ML. Granuloma esquistosso-mótico medular. Registro de um caso. Arq Neuropsiquiatr,42: 277-81, 1984.

12. Abath GM, Abath FGC & Silva RG. Esquistossomoseencefál ica associada a outras lesões ectópicas.Neurobiol Recife, 48:3-18, 1985.

13. Galvão ACR. Radiculomielopatias esquistossomóticas.– Arq Bras Neurocirurg 4:133-9, 1985.

14. Peregr ino JPA, Oliveira SP, Porto CA, Santos LA,Menezes EE, Silva AP, Brito AL, Pinheiro S & Dias AB.Meningomielorradiculite por Schistosoma mansoni –Protocolo de investigação e registro de 21 casos. Arq deNeuropsiquiatr, 46:49-60, 1988.

15. Peregrino JPA. Neuroesquistossomose: quando e comoinvestigar. In: Machado LR, Nóbrega JPS, LivramentoJA & Spina-França A. Neuroinfecção 94. São Paulo, 1994.Clínica Neurológica do Hospital das Clínicas da Faculdadede Medicina da Universidade de São Paulo, pp. 31-5.

16. Arambulo III PV, Walls KW, Bullock S. Serodiagnosis ofhuman cysticercosis by microplate enzyme-linked-immunospecific assay (ELISA). Acta Trop (Basel), 35:63-7, 1978.

17. Correa-Oliveira R, Dusse LMS, Viana IRC, Colley DG,Carvalho OS, Gazzinelli G. Human antibody responsesagainst schistosomal antigens. Am J Trop Med Hyg,38:348-55, 1988.

18. Livramento JA, Machado LR, Caetano da Silva L & Spina-França A. Síndrome do líquido cefalorraquiano naneuroesquistossomose. Arq Neuropsiquiatr, 43:372-7,1985.

19. Ferrari CAT, Moreira PRR, Oliveira RC, FerrariI MLA,Gazzinelli G, Cunha AS. The value of an enzyme-linkedimmunosorbent assay for the diagnosis ofschistosomiasis mansoni myeloradiculopathy. Trans RSoc Trop Med Hyg, 89:496-500, 1995.

20. Matas SLA. Reação de imunofluorescência indireta ereação imunoenzimática no diagnóstico da neuro-esquistossomose mansônica. São Paulo, 1998. [Tesede Doutorado. Universidade Federal de São Paulo –Escola Paulista de Medicina].

21. Andrade Filho AS, Dos Reis MG, Souza AL, Martins ER,Santos SRS, Ancilon M, Lima JMPF, Queiroz AC,Guimarães MGM, Moreno-Carvalho ao, Rêgo MF.Neuroesquistossomose mansônica: Aspectos clínicose terapêuticos. Arq Neuropsiquiatr, 54:232-7, 1996.

22. Reis JB, Bei A & Reis Filho JB. Líquido cefalorraquiano.São Paulo, Sanvier, 1980.

23. Fishman RA. Blood-brain barrier. In: Cerebrospinal Fluidin diseases of the nervous system. W.B. SaundersCompany-Harcourt Brace Jovanovich, Inc. 2. ed.Philadelphia – Pennsylvania, 1992, pp. 43-69.

Neuroesquistossomose

Page 31: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

31

Rev. Neurociências 9(1): 27-31, 2001

24. Canelas HM. Neurocisticercose: incidência, diagnósticoe formas clínicas. Arq Neuropsiaquiatria, 20:1-16, 1962.

25. Del Bruto OH & Sotelo J. Neurocysticercosis: an update.Rev Infect Dis, 10:1075-87, 1988.

26. Parker F, Hladky JP, Breton JO, Mignard C, Laporte JP,Bousquet C. Cysticercose racemeuse de la queue decheval et arachonoidie kystique. A propos de deux cas.Neurochirurgie, 34:280-5, 1988.

27. Colli BO, Assirati Junior JA, Machado HR, dos Santos F,Takayanagui OM. Cysticercosis of the central nervoussystem. II. Spinal cysticercosis. Arq Neuropsiquiatr,52:187-99, 1994.

28. Reis-Filho JB, Reis JB, Bei A. A reação de fixação decomplemento no diagnóstico da neurocisticercose.Neurobiologia, Recife, 48: 227-32, 1985.

29. Pammenter MD, Epstein SR, Rees RT. Cross reactionsin the immunodiagnosis of schistosomiasis andcyst icercosis by a cerebral f lu id enzime-l inkedimunosorbent assay. Trans R Soc Trop Med Hyg, 86:51-2, 1992.

30. Blanchard TT, Milne LM, Pollok R, Cook GC. Earlychemoterapy of imported neuroschistosomiasis. Lancet,341:959, 1993.

31. Bergold AM. Análise químico-farmacêutica do albendazol.Universidade de São Paulo. Faculdade de CiênciasFarmacêuticas. Tese de Doutorado, São Paulo, 1992 pp.220.

32. Solana HD, Teruel MT, Najiler, Lanusse CE, RodriguezJA. The anthelmintic albendazole affects in vitro thedinamics and the detyrosination-tyrosination cycle of ratbrain microtubules. Acta Physiol Pharmacol ther Latinoam,48:199-205, 1998.

33. Schmidt J. Effects of benzimidazole anthelmintics asmicrotubule-active drugs on the synthesis and transport

of superface glycoconjugates in Hyminolepis micros-toma, Echinostoma caproni and Schistosoma mansoni.Parasitol Res, 84:362-8, 1998.

34. Pancera CF, Alves AL, Paschoalotti MA, Chieffi PP. Effectof wide spectrum anti-helminthic drugs upon Schis-tosoma mansoni experimentally infected mice. Rev InstMed Trop São Paulo, 39:159-63, 1997.

35. Olds GR, King C, Hewlett J, Olveda RWUG, Ouma J,Peters P, Mcgarvey S, Odhiambo O, Koech D, Liu CY,Aligui G, Gachihi G, Kombe Y, Parraga I, Ramirez B,Whalen C, Horton RJ, Reeve P. Double-blind placebo-control led study of concurrent administrat ion ofalbendazole and praziquantel in schoolchildren withschistossomiasis and geohelminths. J Infect Dis,179:996-1003, 1999.

36. Miller JM, Boyd Ha, Ostrowski SR, Parise ME, GonzagaPS, Addiss DG, Wilson M, Nguyen-Dinh P, Wahlquist SP,Weld LH, Wainwright RB, Gushulak BD, Cetron MS.Malaria, intestinal parasites, and schistosomiasis amongBarawan Somali refugees resettling to the United States:a strategy reduce morbidity and decrease the risk ofimported infections. Am J Trop Med Hyg, 62:115-21, 2000.

37. Arruda WO & Menezes MS. Neurocisticercose: diag-nóstico e tratamento. Rev Bras Neurol, 32:15-20, 1996.

Endereço para correspondência:Disciplina de NeurologiaEscola Paulista de Medicina – UnifespRua Botucatu, 740CEP 04023-900 – São Paulo, SPE-mail: [email protected]

Neuroesquistossomose

Page 32: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

32

Recomendações nos Casos de Aneurisma Cerebral Não RotoMarcia Maiumi Fukujima1

Alberto Alain Gabbai2

RESUMOAneurismas intracranianos apresentam altas taxas de morbidade e mortalidade, especialmente quando rompem. Nãohá grandes estudos controlados que gerem evidências satisfatórias para padronizações de conduta. As recomendaçõessão baseadas em evidências de níveis IV e V. Fatores favoráveis à cirurgia são paciente jovem com longa expectativade vida, aneurisma roto prévio, história familiar de ruptura de aneurisma intracraniano, aneurismas grandes, aneurismassintomáticos, crescimento constatado do aneurisma e risco estabelecido baixo do tratamento. Fatores que favorecemo tratamento conservador são idade avançada, baixa expectativa de vida, comorbidades clínicas e aneurismasassintomáticos.Unitermos: Aneurismas intracranianos, tratamento.

ARTIGO

1 Neurologista do Setor de Doenças Neurovasculares da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.2 Professor Titular e Chefe da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.

Introdução

Hemorragia subaracnóidea (HSA) por ruptura deaneurisma intracraniano (AnIC) apresenta mortalidadede 45% em 30 dias, e metade dos sobreviventesmantém seqüelas neurológicas irreversíveis.

A história natural dos aneurismas intracranianosnão rotos (AnICNRs) e a resposta ao tratamentodependem de:a) fatores individuais, como hemorragia prévia, idade

do paciente e problemas clínicos preexistentes;b) características do AnIC, como tamanho, local-

ização e morfologia;c) fatores relacionados ao tratamento, como experi-

ência da equipe cirúrgica e estrutura hospitalar.Devido à grande variabilidade desses fatores, não

há ensaios clínicos prospectivos e randomizados paracomparação do tratamento cirúrgico versus o clínico.As melhores evidências nesse assunto provêm de

estudos não randomizados do tipo coorte ou relatosde séries sem controle1.

Diagnóstico

1) Tomografia computadorizada do crânio – asimagens tomográficas são obtidas usualmente comespessuras de 5 mm a 10 mm, não permitindo diag-nóstico de aneurismas pequenos, mesmo cominjeção de contraste endovenoso2-3.

2) Angiotomografia – consiste em imagens tomo-gráficas obtidas durante a fase arterial de opaci-ficação com contraste; pode demonstrar AnICde 2 mm a 3 mm, com sensibilidade de 77% a97% e especificidade de 87% a 100%. É útil noseguimento de pacientes com AnICNR emtratamento conservador, naqueles com AnICclipado parcialmente e naqueles submetidos atécnicas endovasculares. Este exame tem sido

Rev. Neurociências 9(1): 32-35, 2001

Page 33: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

33

usado como screening em populações de altorisco para AnIC2, 4, 5.

3) Angiorressonância magnética – possibilita recons-truir os vasos em projeções diversas, permitindovisibilização de ângulos não identificados naangiografia por cateterização arterial. Tem sensi-bilidade de 69% a 93% e é particularmente útilpara diagnóstico de AnIC de 3 mm a 5 mm, sendomenos útil para detectar alterações no tamanhodo AnIC ou como screening em pacientes comAnIC previamente tratado. Tem uso restrito empacientes com clipes6,7.

4) Angiografia cerebral por cateterização intra-arterial– continua sendo o padrão ouro para o diagnósticode AnIC. Os estudos transcateteres fornecem amaioria das informações sobre vasos perfurantespequenos e produzem imagens de resolução maiorque os demais métodos. Porém, é o método maisinvasivo, com risco de complicação relacionadoao procedimento em torno de 5%, com índice demorbidade neurológica total de 1% e morbidadeneurológica relacionada a déficits permanentes emtorno de 0,5%8,9.

Recomendações para screening de AnIC1

Até o momento, não há ensaio clínico controladoe randomizado com objetivo específico de avaliarcusto e benefício do screening para AnIC, o que geraevidência de nível C para recomendações (baseadoem níveis de evidência IV e V).

Não está indicado screening de AnIC na populaçãogeral.

Pacientes com fatores de risco ambientais, comotabagismo e etilismo, têm risco maior de HSA, masesta não está associada à freqüência maior de AnIC,e screening não se justifica nessa população.

Modelos teóricos sugerem que screening não éeficaz em populações com síndromes genéticas(doença renal policística autossômica dominante,síndrome de Ehlers-Danlos do tipo IV) ou nosfamiliares de primeiro grau de portadores de HSApor AnIC.

Essas sugestões requerem confirmação emestudos futuros.

Em populações com síndrome do AnIC familiar(dois ou mais parentes de até terceiro grau com AnICcomprovado radiologicamente), os programas derastreamento diagnóstico têm demonstrado altaincidência de AnIC. O custo e o benefício, porém,não foram avaliados em ensaios clínicos, mantendo

essa indicação controversa, devendo ser consideradacom base individual.

O índice anual de formação de novos AnIC empacientes tratados de HSA por AnIC tem sido descritocomo 1% a 2%, por isso a avaliação radiológicaposterior nesses casos deve ser considerada.

Tratamento10-13

Cirúrgico – é o tratamento clássico de AnIC pelaclipagem. A mortalidade varia de 0% a 7% e amorbidade, de 4% a 15%. Recorrência de AnICcompletamente clipado cirurgicamente ocorre em1,5% dos casos em 4,4 anos, e é maior naquelesincompletamente clipados.

Terapia endovascular – o único tratamentoendovascular aprovado pelo FDA (Food and DrugAdministration in United States of America) é aqueleque utiliza o sistema de embolização de coil destacávelde Guglielmi. Esse método associa-se à menor taxade complicações relacionadas ao procedimentocomparado ao tratamento cirúrgico, mas eficácia naprevenção de rupturas e crescimento do AnICNRainda não foram comprovados. Esse método vemsendo usado para casos de AnICNR, apesar de aindicação primária ser nos casos de pacientesportadores de AnIC, com alto risco cirúrgico, ou nosque recusaram tratamento cirúrgico.

Tratamento – recomendações1,8-15

O conhecimento atual suporta as seguintes reco-mendações (segundo o comitê de consensos – StrokeCouncil da American Heart Association):1) O tratamento de AnIC intracavernoso incidental

não está geralmente indicado. Para aneurismasintracavernosos grandes e sintomáticos, a decisãode tratamento deve basear-se individualmente naidade do paciente, na gravidade na progressão dossintomas e nas alternativas de tratamento. O riscomais alto de tratamento e a expectativa de vidamenor em indivíduos idosos devem ser consi-derados em todos os casos; os pacientes maisidosos beneficiam-se de observação do AnICNRassintomático.

2) Aneurisma intradural sintomático de qualquertamanho deve ser considerado para tratamento,com relativa urgência nos casos agudamentesintomáticos. AnICs grande ou gigante sinto-mático têm um risco cirúrgico maior e requeremanálise cuidadosa, individualmente, para cada

Rev. Neurociências 9(1): 32-35, 2001

Recomendações nos Casos de Aneurisma Cerebral Não Roto

Page 34: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

34

paciente, além do risco do AnIC, da cirurgia eda experiência do centro.

3) Coexistência ou AnIC residual de qualquertamanho em indivíduos com HSA decorrente deoutro AnIC tratado têm maior risco de hemorragiafutura do que AnIC de tamanho similar sem históriaprévia de HSA, o que deve ser considerado paradecisão terapêutica. AnICs localizados no ápiceda artéria basilar têm um risco relativo maior pararuptura. A decisão do tratamento deve considerara idade do paciente, a existência de condiçõesclínicas e neurológicas e o risco relativo do reparo.Se for optado pela observação clínica, reavaliaçãoperiódica com TC, RM ou angiografia seletiva deveser considerada para detectar alteração no tamanhodo AnIC, porém com atenção para os fatorestécnicos e de interpretação dos diferentesmétodos.

4) Considerando o relativo baixo risco de rupturade AnICs incidentais pequenos (< 10 mm), empacientes sem HSA prévia, o tratamento, em vezde observação clínica, não pode ser preconizadogeneralizadamente. Porém, consideração especialao tratamento deve ser feita para pacientes jovensdesse grupo. Da mesma forma, devem serconsiderados para tratamento aqueles AnICspequenos alcançando 10 mm de diâmetro, aquelescom formação sacular secundária ou outrapeculiaridade hemodinâmica, ou pacientes comhistória familiar positiva para HSA. Nos casoscuja opção conservadora foi observar, devem serfeitas reavaliações com imagens periodicamenteou se aparecerem sintomas específicos. Seaparecerem alterações na forma ou tamanho doAnIC, o tratamento deve ser cuidadosamenteconsiderado.

5) AnICs assintomáticos de 10 mm ou mais dediâmetro merecem forte consideração paratratamento, levando-se em conta a idade dopaciente, as condições clínicas ou neurológicaspreexistentes e o risco relativo do tratamento.Concluindo, o suporte na literatura é de evidência

de níveis IV e V, o que permite recomendações degrau C. Fatores favoráveis à cirurgia são pacientejovem com longa expectativa de vida, aneurisma rotoprévio, história familiar de ruptura de AnIC,aneurismas grandes, aneurismas sintomáticos,crescimento constatado do aneurisma e riscoestabelecido baixo do tratamento. Fatores quefavorecem o tratamento conservador são idadeavançada, baixa expectativa de vida, comorbidadesclínicas e aneurismas pequenos assintomáticos1.

SUMMARY

Management of unruptered intracranialaneurysm

Intracranial aneurysms have high mortality rates,especially when rupture. There is a lack of rando-mized and controled studies in this area. Therecommendations are based on level IV and Vevidence. Factors that favour surgery are youngpatient, long life expectancy, previous rupturedaneurysm, family history of aneurysm rupture, largeaneurysm, symptomatic ones, observed aneurysmgrowth, and low treatment risks. Factors thatfovour conservative management are old patient,decreased life expectancy, comorbid medical condi-tions, and asyntomptomatic small aneurysm.

Keywords

Intracranial aneurysm, treatment.

Referências

1. Bederson JB, Award A, Wiebers DO, Piepgras D, HaleyJr. EC, Brott T, Hademenos G, Chyatte D, RosenwasserR, Caroselli C. Recomendation for management of patienswith unruptered intracranial aneurysms. A statement forhealthcare professionals from the Stroke Council of theAmerican Heart Association. Circulation, 102:2300-8, 2000.

2. Hsiang JN, Liang EY, Lam JM et al. The role of computedtomographic angiography in the diagnosis of intracranialaneurysm and emergent aneurysm clipping. Neuro-surgery, 38:481-7, 1996.

3. Findlay JM. Current management of aneurysmal subara-chnoid hemorrhage: guidelines from the CanadianNeurosurgical Society. Can J Neurol Sci, 24:161-70, 1997.

4. Harbaugh RE, Schlusselberg DS, Jeffrey R et al. Three-dimensional computerized tomography in the diagnosis ofcerebrovascular disease. J Neurosurg, 75:408-14, 1992.

5. Tampieri D, Leblanc R, Oleszek J et al. Three-dimensionalcomputerized tomographic angiography of cerebralaneurysms. Neurosurgery, 36:749-54, 1995.

6. Korogi Y, Takahashi M, Mabuchi N et al. Intracranialaneurysms: diagnostic acuracy of MR angiography withevaluation of maximum intensity projection and sourceimages. Radiology, 199:199-207, 1996.

7. Maeder PP, Meuli RA, de Tribolet N. Three-dimensionalvolume rendering for magnetic resonance angiographyin the screening and preoperative workup of intracranialaneurysms. J Neurosurg, 85:1050-5, 1996.

8. Ronkainen A, Miettinen H, Karkola K et al. Risk ofharboring an unruptered intracranial aneurysm. Stroke,29:359-62, 1998.

9. Rinne JK, Hernesniemi JA. De novo aneurysms: specialmultiple intracranial aneurysms. Neurosurgery, 33:981-5, 1993.

10. ISUIA Investigators. Unriptered intracranial aneurysms:risks of rupture and risks of surgical intervention. N EnglMed J, 339:1725-33, 1998.

Rev. Neurociências 9(1): 32-35, 2001

Recomendações nos Casos de Aneurisma Cerebral Não Roto

Page 35: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

35

Rev. Neurociências 9(1): 32-35, 2001

11. Teunissen LL, Rinkel GJ, Algra A et al. Risk factors forsubarachnoid hemorrhage: a systematic review. Stroke,27:544-9, 1996.

12. Briltra EH, Rinkel GJ, van der Graaf Y et al. Treatment ofintracranial aneurysms by embolization with coils: asystematic review. Stroke, 30:470-6, 1999.

13. Raaymakers TW, Rinkel GJ, Linburg M et al. Mortalityand morbidity of surgery for unruptered intracranialaneurysm: a meta-analysis. Stroke, 29:1531-8, 1998.

14. Wirth FP, Laws ER Jr, Piepgras D et al. Surgical treatmentof incidental intracranial aneurysm. Neurosurgery,12:507-11, 1983.

15. Solomon RA, Fink ME, Pi le-Spellman J. Surgicalmanagement of unruptered intracranial aneurysm. JNeurosurg, 80:440-6, 1994.

16. Guglielmi G, Vinuela F, Sepekta I et al. Electrothrombosisof sacular aneurysms via endovascular approach, part

1: electrochemical basis, technique, and experimentalresults. J Neurosurg, 75:1-7, 1991.

17. Guglielmi G, Vinuela F, Dion J et al. Electrothrombosis ofsacular aneurysms via endovascular approach, part 2:preliminary clinical experience. J Neurosurg, 75:8-14, 1991.

18. Linskey ME, Sekhar LN, Hirsch WL et al. Aneurysms of theintracavernous carotid artery: natural history and indicationsfor treatment. Neurosurgery, 26:933-7, 1990.

Endereço para correspondência:Marcia Maiumi FukujimaRua Botucatu, 740CEP 04023-900 – São Paulo, SPE-mail: [email protected]

Recomendações nos Casos de Aneurisma Cerebral Não Roto

Page 36: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

36

RELATO DE CASO

Neuro-Behçet: Relato de Dois CasosLeopoldo Antônio Pires1

Marcelo Maroco Cruzeiro2

Moisés Pereira Pinto2

André Carvalho Felício3

RESUMOA doença de Behçet é uma doença sistêmica, sem marcador específico, cuja descrição clássica é de uma tríade clínicade úlceras genitais, aftas orais e lesão ocular (uveíte). O envolvimento do sistema nervoso (neuro-Behçet) é relatadoem 4% a 29% dos indivíduos acometidos pela doença. Relatamos dois casos de envolvimento do sistema nervoso, emum homem e em uma mulher. No primeiro, houve acometimento do terceiro nervo craniano à direita e comprometimentoneuropsicológico. O segundo caso caracterizou-se por cefaléia, baixa acuidade visual, astenia, eritema nodoso, trombosevenosa profunda e edema de papila.Unitermos: Doença de Behçet, neuro-Behçet, sistema nervoso.

1 Professor-adjunto do Serviço de Neurologia do HU/UFJF. Mestre em Medicina pela Escola Paulista de Medicina – Unifesp.2 Neurologista Voluntário do Serviço de Neurologia do HU/UFJF.3 Acadêmico Estagiário do Serviço de Neurologia do HU/UFJF.

Rev. Neurociências 9(1): 36-39, 2001

Introdução

A doença de Behçet é uma doença multissistêmicaque foi inicialmente identificada pelo dermatologistaturco Hulushi Behçet1,2,3. Classicamente é descrita atríade de lesões orais, úlceras genitais e uveíte,entretanto, pode afetar olhos, pele, mucosas,articulações, sistema vascular (principalmente veias),pulmões, trato gastrointestinal e sistema nervoso(SN)2,4-6. Os critérios diagnósticos dessa doença sãodescritos a seguir, segundo o “International StudyGroup of Behçet Disease” de 19907.

Critérios Diagnósticos para doença de Behçet –associação de pelo menos dois itens:1) Aftas orais recorrentes: no mínimo 3 vezes

em um ano.2) Úlceras genitais: lesão ativa ou escarificada.

3) Lesões cutâneas: eritema nodoso, foliculiteou ulcerações.

4) Comprometimento ocular: uveíte anterior ouposterior ou vasculite retiniana.

5) Teste de patergia positivo: hiper-reatividadecutânea ao estímulo puntiforme da pele(formação de pústula estéril, ou pápula, comhalo eritematoso em 24 a 48 horas, apóspicada com agulha estéril).A etiopatogenia é desconhecida, havendo hipóteses

de etiologia viral, mas parece que a reação antigênicacruzada é a melhor explicação2,6. Entretanto, háoposição a essa teoria devido à predominância emhomens, à ausência de antígeno específico e a umasuscetibilidade maior em certas populações2,3,6. Aassociação com HLA B51 é bem conhecida e esteestá particularmente vinculado à uveíte, embora em

Page 37: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

37

séries japonesas a prevalência de HLA B51 é somentede 57%4.

A alteração patológica central é constituída porum processo vasculítico, nem sempre demonstrávelno sistema nervoso central (SNC), no qualverificam-se meningoencefalite neutrofílica oulinfocítica crônica e múltiplos focos necróticos,principalmente em tronco encefálico e núcleos dabase6,8,9. As complicações vasculares podem ocorrerpor uma atividade pró-coagulante anormal, com umpapel primário ou secundário à ativação pela célulaendotelial4.

Pacientes e métodos

Os pacientes foram atendidos no Serviço deNeurologia do HU/UFJF, no período de 1998 a 1999,e avaliados conjuntamente pela Oftalmologia, Reuma-tologia e Dermatologia. O diagnóstico foi baseadonos critérios do “International Study Group for BehçetDisease” de 19907.

Primeiro paciente

RCS, 24 anos, sexo masculino, branco, solteiro,encaminhado ao Serviço de Neurologia do HU/UFJFem abril de 1998, com história de que há 15 diasapresentara quadro de ptose palpebral à esquerda,midríase e oftalmoparesia à esquerda. Foram relatadasúlceras orais e genitais de caráter recidivante.Recentemente, vinha apresentando alteraçõescognitivas com dificuldade na realização de algumasatividades habituais (tais como cuidados pessoais,jogo de cartas etc.), alteração de memória e distúrbiode comportamento, alternando períodos de apatia eagressividade.

Ao exame físico, observaram-se úlceras escrotaiscom fundo de aspecto esbranquiçado e bordaselevadas, além de paralisia de terceiro nervo cranianoà esquerda. Foi também observada paralisia facialperiférica à direita como seqüela de processo anteriorao quadro atual. Havia déficit cognitivo confirmadopelo miniexame do estado mental (23 – nível deescolaridade 6a série).

Os exames laboratoriais revelaram velocidade dehemossedimentação (VHS) elevada (90 mm naprimeira hora), hemograma, ionograma, VDRL e asprovas reumatológicas foram normais. A tomografiacomputadorizada e a ressonância magnética de crânioforam normais, o exame de liquor (LCR) por punçãosuboccipital revelou pleocitose linfocitária (40 céls.,96% linfomonócitos, 3% neutrófilos e 1% eosinófilos)e hiperproteinorraquia (70 mg%). A avaliação micro-

biológica do LCR foi negativa. O teste de patergia foipositivo. A biópsia da lesão genital foi sugestiva deBehçet (ulceração recoberta por crosta hemática epermeada por neutrófilos. Na derme, notou-se infil-trado inflamatório misto, denso, permeando paredesvasculares, observando-se neutrófilos ao redor decapilares e linfócitos ao redor de vasos de maiorcalibre – vasculite). Na avaliação oftalmológica, nãohavia sinais de uveíte. Acuidade visual 20/20 bila-teral. Na periferia da retina, havia pequenos pontoshipocorados e áreas hipotróficas, sugerindo seqüelade vasculite retiniana. Inicialmente, foi feita cortico-terapia e, atualmente, o uso de clorambucil 2 mg/dia.Paciente está em acompanhamento ambulatorial noserviço de neurologia do HU/UFJF, evoluindo semintercorrências.

Segundo paciente

TMAM, 47 anos, branca, casada, manicura, foiatendida no HU/UFJF com queixa de cefaléia há 4dias, hemicraniana à esquerda, pulsátil, de leveintensidade, mais acentuada em região temporal,associada à fotofobia e a náuseas, sem vômitos, comrelato de hiporexia, diminuição da acuidade visual,astenia e emagrecimento significativo. Nos últimosmeses, surgiram lesões eritematosas em face, que seacentuavam com exposição ao sol. Estava em uso deamitriptilina 25 mg/dia, complexo B e diclofenaco.História pregressa de cefaléia frontal bilateral desdea adolescência, dores articulares recorrentes comeritema e edema de punhos e cotovelos. Há 3 anosesteve internada por trombose venosa profunda emmembro inferior direito. Nessa ocasião, foram nega-tivos os testes sorológicos para doenças reumáticas.Há 4 meses, apresentara lesões nodulares e dolorosasem membros inferiores. A biópsia foi compatível comeritema nodoso. Os nódulos evoluíram para pequenasmáculas hipercrômicas.

Ao exame físico, observaram-se lesão ulceradade lábio inferior, máculas hipercrômicas em membrossuperiores, edema de membro inferior esquerdo,empastamento de panturrilha à esquerda e edema depapila bilateral, sem déficits focais ou outras alte-rações neurológicas. Foi internada em abril de 2000para tratamento de trombose venosa profunda.

Os exames laboratoriais revelaram anemia hipo-crômica microcítica e VHS de 120 mm na primeirahora. Anti-HIV, anticoagulante lúpico, fatorantinuclear, látex, waaler rose, Coobs direto e indiretoe anti-DNA nativo foram negativos. C3, C4, TSH eT4 livres normais. O teste de patergia foi negativo. Atomografia computadorizada de crânio foi normal.

Rev. Neurociências 9(1): 36-39, 2001

Neuro-Behçet: Relato de Dois Casos

Page 38: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

38

Avaliação oftalmológica: papiledema bilateral, papilitepor provável vasculite comprometendo o nervoóptico. Atualmente, está em uso de amitriptilina25 mg, varfarim 5 mg, prednisona 20 mg e cloram-bucil 2 mg, diariamente, e evoluindo sem novasintercorrências clínicas.

Discussão

Os dois casos aqui apresentados ilustram a diver-sidade de manifestações neurológicas da doença deBehçet, de acordo com a literatura. Sabe-se que oenvolvimento neurológico, nessa entidade, ocorre em4% a 29% dos pacientes3. O envolvimento ocularocorre em 50% dos casos, podendo haver amauroseem 20% dos pacientes acometidos6. As lesõesoculares são bilaterais, não-granulomatosas, recor-rentes e inflamatórias. Quando há comprometimentooftalmológico, o prognóstico é ruim se houver envol-vimento do segmento posterior ocular. Podem ocorrerperiflebite, processo vascular difuso, retinite e vitritequando o segmento posterior está envolvido4,9.

O padrão de envolvimento neurológico observadoem uma série de 200 pacientes relatados por Akman-Demir et al., em 199910, foi caracterizado peloacometimento parenquimatoso do SNC em 162 eenvolvimento secundário não-parenquimatoso doSNC em 38 pacientes. Basicamente, os achadosforam sinais piramidais, hemiparesia, mudança decomportamento e distúrbio esfincteriano naquelescom envolvimento parenquimatoso e trombose deseio dural, levando à hipertensão intracraniananaqueles com envolvimento não parenquimatoso. Em45% dos casos, houve evolução em surtos eremissões, 28% evoluíram de modo progressivoapós o primeiro ataque, 10% tiveram evolução prima-riamente progressiva e 21% tiveram envolvimentoneurológico assintomático. Há três formas deapresentação clínica da doença no SNC, segundoAl-Fahad e Al-Araji11: 1) forma parenquimatosa(síndrome do tronco encefálico, forma stroke like,psiquiátrica, mielopática e forma difusa); 2)hipertensão intracraniana com papiledema; 3)meningite símile. Na série de 50 casos de Kidd etal.9, além dessas manifestações, houve tambémcomprometimento de nervos cranianos (II, V, VII eVIII)4. O envolvimento neuropsicológico écaracterizado, principalmente, por prejuízo damemória e alterações da personalidade (apatia,desinibição). Outras alterações observadas são adificuldade para realizar tarefas ligadas ao lobofrontal, déficit de atenção e, mais raramente, ligadasa outras áreas da cognição5. Na série de 50 casos

publicados por Kidd et al.4, a meningoencefalite comenvolvimento do tronco encefálico foi a mani-festação neurológica mais freqüente (25 pacientes).Em geral, o declínio cognitivo manifesta-se antesde serem constatadas alterações nos exames deneuroimagem3,4,12. Em um dos nossos pacientes,ocorreu nítido comprometimento cognitivo.

Os exames complementares servem para afastaroutras causas reumatológicas, infecciosas, outraspatologias de envolvimento ocular e neurológico quepossam simular o quadro. Ressaltamos que não háum marcador sorológico para doença de Behçet e,por isso, é chamada de doença soro-negativa,podendo haver uma significativa elevação da VHS.

Quando presentes, as anormalidades do SNCencontradas na ressonância magnética apresentam-se como aumento do sinal em tronco encefálico,diencéfalo e hemisférios cerebrais em T22. Pode-severificar lesões na junção mesodiencefálica (46%),região pontobulbar (40%), região tálamo-hipotalâmica(23%) e, mais raramente, núcleos da base, telencéfalo,cerebelo e medula cervical, não havendo diferençano padrão das lesões nas fases aguda e crônica12.Em nossos casos, não houve evidência de lesão aosexames de neuroimagem. As alterações mais usual-mente encontradas no LCR são a pleocitose e oaumento de proteínas13, como ocorreu no nossoprimeiro caso.

O tratamento é feito, basicamente, com drogasimunossupressoras e corticosteróides. As drogas deprimeira linha são a azatioprina e a ciclosporina A14,havendo bons resultados com alfa-interferon15.Outras opções terapêuticas referem-se aos corticos-teróides, pelos seus efeitos supressivos, e aoclorambucil11. Deve-se ressaltar que a toxicidadeóssea e as infecções são complicações possíveis dotratamento com imunossupressores e que aquimioterapia prolongada pode levar à infertilidade1.Nossos pacientes foram tratados com corticoterapiae manutenção com clorambucil. Este foi utilizadopor Al-Fahad e Al-Araji11 para casos com compro-metimento parenquimatoso intenso e recorrente doSNC, os quais mantiveram todos os seus pacientescom o ácido acetil salicílico, na dose de 300 mg, noperíodo de remissão. Para alguns autores, aciclosporina tem melhor efeito quando há envolvi-mento ocular6,15. A talidomida tem sido usada nadose entre 100 mg e 300 mg, principalmente naforma mucocutânea14,15, entretanto seu uso érestrito pelos potenciais efeitos teratogênicos emmulheres na idade fértil, além de poder causar poli-neuropatia16.

Rev. Neurociências 9(1): 36-39, 2001

Neuro-Behçet: Relato de Dois Casos

Page 39: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

39

O prognóstico é ruim quando há envolvimentoparenquimatoso do SNC, aumento de proteína e/oude células no LCR, lesão do tronco cerebral e cursoprogressivo primário (envolvimento lento com piorados sinais e sintomas neurológicos em meses ou anos,sem ataques precedentes) ou secundário (envolvi-mento lento com piora dos sinais e sintomas neuroló-gicos, após, no mínimo, um ataque prévio ou pro-gressão step-wise se houver mais de um ataque) erecaída durante a redução do uso de drogas10. Temsido relatado efeito benéfico da colchicina na doençade Behçet, que seria útil no controle de eritema nodosoe no comprometimento articular de alguns pacientes17.

Conclusão

A doença de Behçet é uma doença reumatológicaque sempre deve ser lembrada e o seu diagnósticodeve ser feito o mais precocemente possível, possibi-litando, assim, melhor controle clínico e, conseqüen-temente, proporcionar qualidade de vida do pacientemais favorável. Ocorre predominantemente em homense o acometimento do SNC é variável. Sinais piramidaise distúrbios neuropsicológicos devem ser prontamenteidentificados. O seu tratamento é feito com drogasimunossupressoras ou com corticosteróides.

SUMMARY

Neuro-Behçet: two cases reportThe Behçet disease is multisystemic, there is not

specific laboratorial hallmark and the classicdescription is oral lesions, genital ulcerations anduveitis. The neurologic involvement oscillates among4 to 29% of compromised individuals. This report isabout two cases of neuro-Behçet. The first caseattacked is 24 year old man that presented withimpairment of third cranial nerve at right andimportant neuropsichologic envolviment. The secondcase is a 47 year old woman with caracterized byheadache, low acuity visual, malaise, nodouserythema, venous thrombosis and there waspseudoaedema of papila.

Keywords

Behçet disease, neuro-Behçet, nervous system.

Referências

1. O’Duffy JD. Behcet’s syndrome. N Engl J Med, 322:326-8, 1990.

2. Osborn AG. Acidentes vasculares. Diagnóstico neuror-radiológico, 11: 377-8, 1999. Traduzido por RaimundoRodrigues Santos. Revinter.

3. Sanvito WL. Síndromes neurológicas. São Paulo,Atheneu, 2. ed., 1997, pp. 48-50.

4. Kidd D, Steuer A, Denman AM, Rudge P. Neurologicalcomplications in Behçet’s syndrome. Brain, 122(Pt11):2183-94, 1999.

5. Oktem-Tanor O, Baykan-Kur t B, Gurvit IH, Akman-Demir G, Serdaroglu P. Neuropsychological follow-upof 12 patients with neuro-Behçet disease. J Neurol,46:113-9, 1999.

6. Ozyazgan Y, Yurdakul S, Yazici H, Tuzun B, Iscimen A,Tuzun Y, Aktunc T, Pazarli H, Hamuryudan V, MuftuogluA. Low dose cyclosporin A versus pulsed cyclophos-phamide in Behçet’s syndrome: a single masked trial. BrJ Ophthalmol, 76:241-3, 1992.

7. International Study Group for Behçet’s Syndrome. Criteriafor diagnosis of Behçet’s disease. Lancet, 335:1078-80,1990.

8. Calzada-Sierra DJ et al. Neurobehçet. Presentación detres casos. Rev Neurol, 28:1166-9, 1999.

9. Kanski JJ. Clinical ophtalmology. Uveitis (6): 3rd ed.

10. Akman-Demir G, Serdaroglu P, Tasci B. Clinical patternsof neurological involvement in Behçet ’s disease:evaluation of 200 patients. The Neuro-Behçet Study Group.Brain, 122(Pt 11):2171-82, 1999.

11. Al-Fahad SA, Al-Araji AH. Neuro-Behçet’s disease in Iraq:a study of 40 patients. J Neurol Sci, 170:105-11, 1999.

12. Koçer N, Islak C, Siva A, Saip S, Akman C, Kantarci O,Hamuryudan V. CNS involvement in neuro-Behçetsyndrome: an MR study. AJNR Am J Neuroradiol,20:1015-24, 1999.

13. Serdaroglu, P. Behçet’s disease and the nervous system.J Neurol, 245:197-205, 1998.

14. Yazici H, Pazarli H, Barnes CG, Tuzun Y, Ozyazgan Y,Silman A, Serdaroglu S, Oguz V, Yurdakul S, Lovatt GEet al. A controlled tr ial of azathioprine in Behçet’ssyndrome. N Engl J Med, 1; 322:281-5, 1990.

15. Yazici H, Yurdakul S, Hamuryudan V. Behçet’s syndrome.Curr Opin Rheumatol, 11:53-7, 1999.

16. Reis RG, Oliveira ASB. Drogas e sistema nervosoperiférico – I – Neuropatias tóxicas induzidas por drogas.Revista Neurociências, 7:108-14, 1999.

17. Aminoff MJ. Connective tissue diseases and the nervoussystem. Neurology and general medicine. ChurchillLinvinstone, 2ª ed., 23: 465-6, 1995.

Endereço para correspondência:Leopoldo Antônio PiresE-mail: [email protected]

Rev. Neurociências 9(1): 36-39, 2001

Neuro-Behçet: Relato de Dois Casos

Page 40: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

40

1 Médica Residente da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.2 Médico Residente da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.3 Médico Estagiário da Disciplina de Neurocirurgia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.4 Doutor em Neurologia da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.5 Doutor em Neurologia e Chefe do Setor de Distúrbios do Movimento da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.6 Professor Titular e Chefe da Disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina – Unifesp.

Acidente Vascular Cerebral Hemorrágico Secundário à Rupturade Aneurisma Micótico em Paciente com Endocardite Bacterianapor Estreptococo Gama-HemolíticoGisele Sampaio Silva1

Rodrigo Meirelles Massaud2

Pedro Araújo Sampaio2

Marcelo Opperman3

Ayrton Roberto Massaro4

Henrique Ballalai Ferraz5

Alberto Alain Gabbai6

RESUMOAneurismas micóticos intracranianos são complicações raras associadas à endocardite infecciosa. Relatamos o caso deuma paciente com endocardite bacteriana diagnosticada por ocasião da ruptura de um aneurisma micótico, levando àhemorragia intraparenquimatosa e subaracnóidea. Colonoscopia realizada para evidenciar local de entrada bacterianadetectou pólipo adenomatoso. A associação entre patologias colônicas e endocardite bacteriana por Streptococcusbovis é bem descrita na literatura. Discutiremos as opções terapêuticas em casos refratários à terapêutica antimicrobiana.Unitermos: Endocardite, aneurisma micótico, patologia colônica.

RELATO DE CASO

Introdução

A incidência de infecções metastáticas e eventosembólicos associados à endocardite infecciosa égeralmente considerada elevada. A maioria desseseventos, no entanto, não é diagnosticada porpermanecer assintomática1. Aneurismas micóticos deorigem cardioembólica foram mais comuns na erapré-antibiótica, sendo hoje considerados complicaçãopouco freqüente na prática clínica2. Os territóriosarteriais geralmente acometidos são os da aortaabdominal, artéria femoral, mesentérica superior,extremidades superiores e das ilíacas. A ocorrênciade aneurismas micóticos intracranianos em pacientescom endocardite infecciosa é rara3. Relataremos o

caso de uma paciente que teve endocardite bacterianadiagnosticada após hemorragia intraparenquimatosaassociada à ruptura de um aneurisma micótico.

Relato de caso

Paciente de 56 anos, do sexo feminino, casada,natural e procedente de São Paulo, foi admitida noserviço de emergência do Hospital São Paulo porcefaléia e dificuldade de comunicação iniciadas háduas horas. A família referia dois picos febris no diaanterior e sopro cardíaco diagnosticado há 20 anos.Ao exame físico, a paciente estava em regular estadogeral, hidratada, pálida, febril (38°C), normotensa (PAde 130 x 95 mmHg) e apresentava sopro sistólico em

Rev. Neurociências 9(1): 40-43, 2001

Page 41: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

41

foco mitral com irradiação para a axila. O exameneurológico revelou dificuldade em nomear objetos ecores, alexia sem agrafia, incapacidade de distinguirentre direita e esquerda, acalculia e hemianopsiatemporal direita. Exames laboratoriais mostraramanemia, leucocitose e aumento de velocidade dehemossedimentação (Hb = 9,8, Ht = 30%, leucograma= 15.400 leucócitos e VHS = 103). Tomografiacomputadorizada de crânio (TC) realizada três horasapós o início dos sintomas revelou lesão espontanea-mente hiperdensa em região parieto-occipitalesquerda, que não realçou após injeção de contrastee sangue nas cisternas da base (Figura 1). Hemo-culturas (feitas em duas amostras) colhidas no diada admissão hospitalar foram positivas paraestreptococo gama-hemolítico. Ecocardiogramatranstorácico mostrou espessamento do folhetoanterior da valva mitral e insuficiência mitralmoderada. Ecocardiograma transesofágico nãovisualizou vegetações valvares. Foi introduzidaantibioticoterapia com penicilina cristalina e genta-micina. Ressonância magnética de crânio revelouhemorragia parenquimatosa parieto-occipito-temporalesquerda com área de edema e efeito expansivocaracterizado pelo apagamento de sulcos e cisternas(Figura 2). Angiografia digital revelou presença deaneurismas micóticos das artérias angular esquerdae frontal interna posterior direita (ramo da artériacerebral anterior) (Figura 3). Colonoscopia detectou

Figura 1 Tomografia computadorizada de crânio mostrando lesãoespontaneamente hiperdensa em região parieto-occipital esquerda,sem realce significativo após injeção de contraste. Observa-setambém presença de sangue nas cisternas da base, sugerindoextensão do sangramento ao espaço subaracnóideo.

Figura 2 Ressonância nuclear magnética de crânio mostrandohemorragia parenquimatosa parieto-occipito-temporal esquer-da, com área de edema e efeito expansivo caracterizado peloapagamento de sulcos e cisternas. Observa-se, ainda, apa-gamento de sulcos corticais à esquerda com conteúdo sangüíneoem alguns sulcos corticais correspondendo à hemorragiasubaracnóidea.

Figura 3 Angiografia cerebral mostrando área hipovascular parietalesquerda, notando-se desvio dos ramos da artéria angular, superiore inferiormente, sugerindo hematoma intraparenquimatoso.Observa-se dilatação sacular localizada em ramo distal da artériaangular.

Rev. Neurociências 9(1): 40-43, 2001

Acidente Vascular Cerebral Hemorrágico Secundário à Ruptura de Aneurisma Micótico emPaciente com Endocardite Bacteriana por Estreptococo Gama-Hemolítico

Page 42: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

42

pólipo adenomatoso em cólon ascendente (realizadapara investigar local de entrada bacteriana). A pacientepermaneceu afebril após uma semana do início daantibioticoterapia, apresentando melhora do quadroneurológico. Nova angiografia realizada após seissemanas de tratamento revelou diminuição dotamanho do aneurisma fusiforme da artéria angularesquerda e nova lesão em artéria frontal internaposterior direita (Figura 4). Ecocardiogramatransesofágico, realizado após o término do trata-mento, mostrou presença de vegetação em resoluçãoem valva mitral. Hemoculturas (feitas em trêsamostras) foram negativas. A paciente será submetidaa procedimento cirúrgico valvar pela refratariedadeao tratamento antibioticoterápico.

espectro, sendo considerada rara na atualidade4. Aformação de tais aneurismas parece dever-se àembolização de debris infectados para a vasa-vasorum com conseqüente formação de abscessosintramurais e isquemia da parede arterial, levando àdegeneração de elementos musculares da artéria6.Em nosso caso, a paciente apresentou-se ao hospitalpor ruptura de um aneurisma micótico. A evoluçãoclínica de hemorragias intraparenquimatosas esubaracnóideas secundárias à ruptura de aneurismasinfecciosos costuma ser grave, com altos índicesde mortalidade7. Nossa paciente evoluiu de maneirafavorável, apresentando, na admissão, quadroclínico semelhante à síndrome de Gerstmann(dificuldade em diferenciar direita e esquerda, emnomear dígitos e em fazer cálculos) associada àalexia sem agrafia, permanecendo sem alteraçõesdo nível de consciência8. Aneurismas micóticos sãomais comuns em endocardites subagudas causadaspor bactérias menos virulentas, como os estrepto-cocos, conforme observamos em nosso caso3. Aassociação entre endocardite por Streptococcus bovise carcinoma de cólon é bem reconhecida, no entantoa presença de pólipos adenomatosos não é descritacomo fator de risco para o desenvolvimento deendocardite por tal bactéria9. O tratamento de taislesões é questão bastante controversa na literatura.A localização do aneurisma, o status cardíaco dopaciente e a resposta à antibioticoterapia são fatoresque devem ser considerados na decisãoterapêutica10. O tratamento cirúrgico é geralmentereservado para lesões que sangram, sendo aabordagem de lesões assintomáticas geralmentecontra-indicada3. A opção por manter acompa-nhamento radiológico, apesar das novas lesõesobservadas na angiografia, baseou-se no excelenteestado geral da paciente, podendo tais aneurismasserem considerados assintomáticos. A abordagemcirúrgica da lesão valvar é consenso na literaturaem casos considerados refratários a tratamentoantibiótico1.

A existência da associação entre endocardite porStreptococcus bovis, uma espécie gama-hemolítica,e patologias colônicas não malignas (pólipos) podeser questionada a partir da descrição desse caso,uma vez que tal associação é forte em se tratandode câncer de cólon. A terapêutica dos aneurismasmicóticos persiste como assunto controverso na lite-ratura, sendo este caso ilustrativo de que a condutadeve basear-se em um conjunto de fatores (locali-zação, sintomas e agente etiológico), devendosempre ser levada em consideração a evoluçãoclínica do paciente.

Figura 4 Angiografia cerebral mostrando duas pequenas dilataçõessaculares localizadas em ramos distais da artéria angular esquerda (adilatação mais proximal já era observada no exame anterior eapresenta redução do seu tamanho). Nota-se, também, outra dilataçãoem ramo parietal anterior da artéria cerebral média esquerda. Presençade pequena dilatação sacular, em ramo frontal interno posterior daartéria cerebral anterior direita, que apresentou aumento de suasdimensões quando comparada com a do exame anterior.

Discussão

As bactérias causadoras de endocardite infec-ciosa podem colonizar outras áreas do sistemavascular, levando à destruição da parede do vaso eà formação de pseudo-aneurismas4. O termoaneurisma micótico foi utilizado por Osler, em 1885,para denominar essa complicação e, embora não sejaapropriado, uma vez que não se trata de umaneurisma verdadeiro (não envolve todas as camadasda parede arterial), foi consagrado na literatura5. Aincidência de aneurismas micóticos secundários àendocardite bacteriana tem diminuído bastante apósa introdução de esquemas antibióticos de amplo

Rev. Neurociências 9(1): 40-43, 2001

Acidente Vascular Cerebral Hemorrágico Secundário à Ruptura de Aneurisma Micótico emPaciente com Endocardite Bacteriana por Estreptococo Gama-Hemolítico

Page 43: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

43

SUMMARY

Hemorragic cerebrovascular accident in apacient with bacterial endocarditis and mycoticaneurysms

Mycotic aneurysms are major life threateningcomplications of infective endocarditis. We present apatient with a bacterial intracranial aneurysmrefractory to antibiotics. The pathogenesis andtherapeutic options are discussed. The managementof cerebral mycotic aneurysms remains a controversalissue and factors as patient’s cardiac status, theaneurysm’s location and response to antibiotic therapymust be considered in the treatment of these lesions.

Keywords

Mycotic aneurysm, endocarditis, colonic disease.

Referências

1. Millaire A. Incidence and prognosis of embolic eventsand metastatic infections in infective endocarditis.European Heart Journal, 18:677-84,1997.

2. Mertens R. Aneurismas micóticos y embolías múltiplesen una paciente con endocarditis infecciosa. Rev MédChile, 125:696-700, 1997.

Rev. Neurociências 9(1): 40-43, 2001

3. Pruitt A. Neurologic complications of bacterial endo-carditis. Medicine, 57(4):329-43,1978.

4. Osler W. The goulstonian lectures on malignant endo-carditis. BMJ, 1:467-70,1985.

5. Jhirad R. Mycotic axillary artery aneurysm. Journal ofVascular Surgery, 28:708-9,1998.

6. Weinstein L. Life-threatening complications of infectiveendocarditis and their management. Arch Intern Med,146:953-7,1986.

7. Salgado A. Neurologic complications of endocarditis: a12-year experience. Neurology, 39:173-8,1989.

8. Caplan L. Cueing and memory dysfunction in alexiawithout agraphia. Brain, 97:251-62,1974.

9. Zarkin BA. The triad of Streptococcus bovis bacteremia,colonic pathology and liver disease. Ann Surgery, 211:786-91, 1990.

10. Fizzell T. Treatment of a bacterial intracranial aneurysmusing an endovascular approach. Neurosurgery, 32:852-4,1993.

Endereço para correspondência:Gisele Sampaio SilvaEscola Paulista de Medicina – UnifespDisciplina de NeurologiaRua Botucatu, 740, Vila ClementinoCEP 04023-900 – São Paulo, SPE-mail: [email protected]

Acidente Vascular Cerebral Hemorrágico Secundário à Ruptura de Aneurisma Micótico emPaciente com Endocardite Bacteriana por Estreptococo Gama-Hemolítico

Page 44: Revista Neurociênciascefaleias.com.br/wp-content/uploads/2009/09/espasmo-hemifacial.pdf · Resumo e Summary: devem permitir uma visão panorâmica do trabalho, contendo objetivos,

44

REVISTA NEUROCIÊNCIASDisciplina de Neurologia – Escola Paulista de Medicina

Universidade Federal de São Paulo

VOLUME 9 – NÚMERO 1 – ABRIL 2001

Produção Editorial:LEMOS EDITORIAL & GRÁFICOS LTDA.

Rua Rui Barbosa, 70 – Bela VistaCEP 01326-010 – São Paulo, SP

Telefax: (0xx11) 3371-1855E-mail: [email protected]

Diretor-presidente: Paulo LemosDiretor-superintendente: José Vicente De Angelo Vice-presidente de negócios: Idelcio D. Patricio

Gerente comercial: Jorge RangelRepresentante no Rio de Janeiro: Roberto Amoêdo – Tel.: (0xx21) 262-9817

Coordenação comercial: Edileuza Machado e Patricia MirraProdução editorial: Ligia Ricetto (coord.), Caline Devèze, Danielle Sales e Márcia M. da Mata

(ass. coord.), Flávio Santana (diagr.), Glair Picolo Coimbra e Patrizia Zagni (rev.),Produção gráfica: Altamir França

Periodicidade: QuadrimestralToda correspondência relacionada ao Editorial, bem como textos para publicação,

deve ser encaminhada aos cuidados do Conselho Editorial para:

REVISTA NEUROCIÊNCIAS

Disciplina de Neurologia – Escola Paulista de MedicinaUniversidade Federal de São Paulo

ISSN 0104-3579

Rua Botucatu, 740 – CEP 04023-900 – São Paulo, SPE-mail: [email protected]

Pede-se permutaOn prie l’echange

Exchange is requested

Rev. Neurociências 9(1): 44, 2001

EXPEDIENTE