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3 rd Internacional Conference On Design History & Design Studies Istambul Julho 2002 P&D São Paulo 2004 ESTUDO DE EXERCÍCIO INTRODUTÓRIO AO DESIGN TENDO COMO BASE REFERÊNCIAS HISTÓRICAS Rafael Antonio Cunha Perrone Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Universidade Presbiteriana Mackenzie São Paulo, Brasil

rd3 Internacional Conference On Design History & Design ... · escrita de uma História do Design. Cadeira tradicional de uso de bar na Espanha ... disciplinas de design do objeto

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3rd Internacional Conference

On Design History & Design Studies

Istambul – Julho 2002

P&D São Paulo 2004

ESTUDO DE EXERCÍCIO INTRODUTÓRIO AO DESIGN TENDO COMO

BASE REFERÊNCIAS HISTÓRICAS

Rafael Antonio Cunha Perrone

Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo

Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Universidade Presbiteriana Mackenzie

São Paulo, Brasil

INTRODUÇÃO

Árvore

Vermelha

Mondrian

1908

Árvore

Cinza

Mondrian

1911

Este trabalho explora as possíveis relações entre design e história do

design, através do relato e discussão de uma experiência de ensino.

O aspecto central da proposta de ensino é o da utilização de uma

referência histórica como elemento dinamizador do conhecimento.

“Flowered

Apple Tree”

Mondrian

1912

“Blue, Gray and

Pink

Composition”

Mondrian

1912

Nessa proposta, a atividade de projeto é revisitada, para além de um ato de criação isolado, e o conhecimento histórico é compreendido como elemento dinamizador nas operações projetuais.

Embora, sem pretender ampliar essa experiência para todas atividades de ensino de projeto, esse trabalho procura colocar em relevo algumas possibilidades, no ensino, de cooperação ativa entre as atividades projetuais e a história do design.

Yves Saint

Laurent

1985

“Construction”

Cesar Domela

1929

O design como todos definem é uma atividade multidisciplinar. Esta

atividade, assim como a dos arquitetos, estrutura-se em conhecimentos

advindos das ciências exatas, das disciplinas tecnológicas e ambientais,

das ciências humanas e do domínio expressivo das linguagens,

característico das artes em geral. Ao definir a atividade projetual desse

modo, entendemos o processo de projeto como uma atividade criadora de

novos objetos por meio de uma síntese.

Eek em

Ruijgrok

1994

O designer terá de determinar as propriedades formais de cada um dos

produtos pela sua capacidade de abrigar as soluções para os diversos

requisitos estabelecidos.

Assim entre um problema de projeto e sua solução necessariamente se

deve passar pela solução parcial de cada sub-problema encontrado como

nos mostrou Munari (1982)

Requerimentos

de uso

Desenho

d’aprés

Munari

1981

Para a geração das determinantes formais o designer deve estar:

1) Habilitado a entender os problemas propostos;

2) Possuir um conhecimento teórico e um amplo vocabulário formal e

técnico sobre as soluções análogas já existentes;

3) Dominar um saber criativo para estabelecer a síntese entre novos

problemas e novas formas;

4) Conhecer os meios e métodos de representação capazes de criar

antecipadamente o objeto ou serviço a ser produzido.

‘Dakota”

armchair

P. Rizzatto

1995

Essas quatro condições foram significativas na constituição das disciplinas de projeto de arquitetura e do design modernos e contemporâneos. Elas revelam a superação das posições historicistas que vinculavam as atividades projetuais à continuidade no uso de modelos e vocábulos das linguagens tradicionais ou artesanais. Novos usos, novas técnicas, novos materiais, novas relações sociais tudo implicou em novas formas para os novos objetos ou ambientes. Assim, guiaram-se as posturas educacionais que emergiram do movimento moderno.

Cadeira Berlín

e

Mesa lateral

Rietveld

1923

A ilustração mostra como se realizava a análise de um armário de sala

demonstrando de modo inequívoco o procedimento racionalista que

fundamentou o processo de formação dos designers: a eliminação dos

elementos supérfluos (ornamentos a busca dos elementos e de

constituição mais simples).

Ilustração do

processo

antiornamento

Sistema de

mobiliário de

escritório

Florence Knoll

1950’s

A superação do método historicista não ocorreu somente por sua negação,

mas pelo próprio desenvolvimento de seu vocabulário: “o próprio costume de recorrer à História da Arte impede os arquitetos de enfrentar sem comprometimento os problemas de seu tempo, mas os obriga a ver que as formas da arquitetura passada são condicionadas ... ao período que nascem, convidando-os a refletir, do mesmo modo, sobre a necessidade de adequar as formas da arquitetura atual às exigências da vida de hoje” (Benévolo, 1972:200).

Escritório

Gropius

1923

As referências para o projeto foram sendo melhor compreendidas nas

últimas décadas a partir de uma revisão crítica das posturas racionalistas.

Novas perspectivas de ensino surgiram a medida que as formas propostas

pelo modernismo foram sendo consagradas ou criticadas e foi possível a

escrita de uma História do Design.

Cadeira

tradicional de

uso de bar na

Espanha

Cadeira

“Rothko Bar”

A. Liévore

1993-4

O estudo crítico do design revestiu-se de outra postura: “A História do

Design deve ter como prioridade não a transmissão de dogmas que

restrinjam a atuação do designer, mas a abertura de possibilidades que

ampliem seus horizontes, sugerindo, a partir da riqueza de exemplos do

passado, formas criativas e conscientes de se proceder no presente

(Denis:1999:15).

Le Corbusier

Sketch Book

As determinações formais portanto podem decorrer não apenas de um esforço racional e metodológico, mas de uma constante busca e interpretação de soluções de projetos historicamente verificados . Essa postura, embora negada, pode ser vista no período moderno durante toda a trajetória de Le Corbusier quando utiliza-se para novos projetos de seus desenhos baseados dos cadernos de viagens, ou em suas recomendações para o encontro das novas formas pela observação dos aviões, transatlânticos, automóveis (Le Corbusier: 1973).

Le

Corbusier

Capela

rural

1935

Caderno

de viajem

Le

Corbusier

Ronchamp

1951

No período pós-moderno, o arquiteto e designer Michael Graves aplica o mesmo método de utilização de desenhos de observação para referência de seus projetos. Afirma estar criando através desses fragmentos organizados, porque eles podem ser utilizados pelo potencial que armazenam: “Como um artefato físico colecionado ou admirado, como um modelo que contém uma importância simbólica, o esboço de referência é uma base metafórica que pode ser utilizada transformada ou combinada em um projeto posterior” (Graves: 1977:384).

Michael Graves:

Desenho

1978

Chaleira

1983

A busca consciente de referências afirma-se como parte do método no

projeto contemporâneo para a determinação formal de um problema de

projeto: “A atividade de criação exercida pelos arquitetos e designers não

parte de uma “tábula rasa” nem de consideração exclusiva de aspectos

estruturais e programáticos, e pode ser definida como uma atividade que

se baseia na interpretação e adaptação de precedentes” (Mahfuz:1995).

House III

P. Eisenman

1983

A House

J. Hejduk

1967

B House

J. Hejduk

DESIGN / REFERÊNCIA / EXERCÍCIO PROJETUAL

A busca de uma atividade projetual que introduzisse os primeiros

procedimentos metodológicos e que facilitasse o percurso para o aluno

“resolver” um projeto conduziu a um exercício simples de variáveis mais

ou menos delimitadas. O exercício projetual consiste em criar uma família

de móveis a partir da poltrona Red and Blue desenhada por Gerrit Rietveld

em 1917/18.

Schröder

House

G. Rietveld

1923

Cadeira

Red and Blue

G.t Rietveld

1917/18

As variáveis do problema são as dimensões, funções e tipologias dos

diversos móveis. As invariáveis são a técnica construtiva (madeira) e os

princípios de constituição formal (interpretação da sintaxe da poltrona).

Para a realização da atividade projetual foram estabelecidas as seguintes

etapas:

National

Library

Paris

D.Perraut

1989-92

Luminária,

1920

G. Rietveld

1ª ETAPA – PROPOSIÇÃO DO EXERCÍCIO

Nessa etapa é fornecida aos alunos uma prancha de desenhos contendo 3

vistas em escala 1:5 da poltrona Red and Blue.

São expostos os objetivos e as etapas do trabalho a serem realizadas.

A prática projetual será referenciada pelo uso de material iconográfico

relacionado ao período de formação do Grupo De Stijl e ao movimento neo-

plasticista.

3 vistas

escala 1:5

Cadeira

Red and

Blue

2ª ETAPA – REFERENCIAL HISTÓRICO

Nesta etapa são fornecidas informações históricas aos alunos sobre a

poltrona Red and Blue

As informações básicas são dirigidas aos alunos através de aulas

expositivas, com apoio em recursos visuais onde são analisadas as

características básicas do movimento.

Armário

G.Rietveld

1919

Análise

arquitetônica

Theo Van

Doesburg

1925

As relações propostas entre arte e arquitetura e sua importância para o

desenvolvimento do projeto moderno (obras de J.J. Pieter Oud, Mies Van

der Rohe, Mart Stam, Theo Van Doesburg) e alguns de seus elos no

período contemporâneo (obra de Peter Eisenman, John Hedjuk, Antonio

Citterio, Dominique Perrault).

Desenho,

Mies Van

der Rohe

1935

Protótipo

Red and

blue

G. Rietveld

1917/1918

Sua constituição e seus desdobramentos são analisados em outros

trabalhos de Rietveld como a gabinete do Dr Hartog (1920) e residência

Schoereder (1923). Aos alunos é fornecida uma bibliografia básica.

EscritórioDr.

Hartog’s

Rietveld

1920

Schoereder

residence

1923

3ª ETAPA – INTERPRETAÇÃO DO DESENHO /

CONSTRUÇÃO DO MODELO

As atividades de projeto desenvolvem-se a partir desses referenciais

históricos. O conhecimento, entretanto, é realizado por meio de

representações construções e projetos.

Os estudantes são divididos em grupos de 10 a 12 alunos e um modelo em

escala natural é apresentado à sala para os alunos terem contato.

City in

space

F. Kiesler

1925

A partir do desenho fornecido, cada grupo constrói um modelo da poltrona

na escala 1:5. O modelo em escala natural é utilizado pelos alunos para

análise de uso e sua relação com próprio corpo. O modelo 1:5 é construído

através de desenho fornecido, o processo de modelagem conduz ao

conhecimento constitutivo da poltrona: as barras, os planos, as conexões

e as dimensões.

FAU-USP

4ª ETAPA – DEFINIÇÃO DO TEMA /

ESTUDOS PRELIMINARES

A partir desses conhecimentos cada aluno define uma peça de mobiliário a

ser projetada. Inicia-se, para cada um, a fase do conhecimento de móveis

similares aquele que escolheu para projetar: sua tipologia, suas

dimensões, suas funções e alternativas.

Modelos

individuais

dos

estudantes

Nessa etapa cada aluno formula sua proposta de móvel preliminar,

realizando-a dentro dos princípios observados na poltrona referência.

Os alunos recebem informações sobre sintaxe visual e coerência formal

através de aula expositiva e bibliografia envolvendo os conceitos de

família de formas e sistema de produtos.

Estudantes

trabalhando

Modelos dos

estudantes

Modelos dos

estudantes

Modelos dos

estudantes

5ª ETAPA – ANÁLISE DO GRUPO / PROJETO FINAL

O grupo de alunos analisa cada um dos estudos individuais (desenhos e

modelos), discutindo e revendo o desenho de cada móvel, em função do

seu relacionamento com o sistema.

O exercício prossegue com o redesenho e a apresentação gráfica

individual do projeto do móvel de cada aluno através de vistas, cortes, uma

perspectiva axonométrica e um modelo final na escala 1:5.

Estudantes

estudam as

peças e o

conjunto

6ª ETAPA - AVALIAÇÃO

As equipes constroem ambientes com os móveis propostos para a avaliação. É

realizada a apresentação dos projetos e feitos debates com análises

comparativas.

O trabalho

dos

estudantes:

modelos das

famílias

ANÁLISE DOS RESULTADOS

Pode-se notar através da análise dos resultados obtidos algumas qualidades no processo de aprendizado dos alunos

. As limitações formais do procedimento ao mesmo tempo que limitam as possibilidades de criação introduzem um vocabulário e novos elementos que são significativos para a maioria dos estudantes

. A simplicidade da representação e modelagem da família permite o exercício sucessivo de alternativas projetuais, instigando aos alunos a aprenderem projetando.

. As relações entre projeto individual (móvel) e coletivo (sistema de

mobiliário) permitem auto-avaliações sobre a forma dos produtos

possibilitando aos alunos uma formação autocrítica.

. As operações de representação gráfica interligada a produção de

modelos são de tal modo integradas que permitem o aprendizado do

desenho técnico / projetivo dentro da atividade de design.

Sol Le Witt

Low Table

1980

Modelo

dos

estudantes

. O uso de elemento linguagem já bastante definida requer atenção dos

professores, que devem incentivar os alunos a buscar outras soluções de

modo que os projetos não se tornem repetitivos.

Sol Le Witt

“L” shapped

module piece

1966

Modelo

dos

estudantes

CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE O USO DE

REFERÊNCIAS HISTÓRICAS NO PROCESSO DE

PROJETO

O uso de referências históricas pode ter grande valor no ensino do design

e arquitetura. Esse valor deve ser relativizado tendo em vista que acreditar

que um trabalho profissional possa ser exclusivamente baseado em

precedentes é uma simplificação grosseira.

Para o bom aproveitamento do uso desses exercícios, dentro de

disciplinas de design do objeto e projeto de arquitetura eles devem

focalizar referências históricas com suas qualidades bem definidas.

Gumna

Museum

Arata

Isozaki

1976

Deve tornar-se evidente que um dos fundamentos do trabalho projetual é o

de reconhecer as fontes a as obras que indicaram soluções para

problemas similares.

A ampliação de métodos projetuais baseados em referências históricas

pode ter duas orientações

Thonet’s

cadeira

rocking

século XIX

Mies van der

Rohe’s

1930

Máquina a

vapor

século XIX

Olha-se o passado para fazer um futuro, olham-se os objetos como

criações humanas que por conterem germens de modificações de uma

época foram e serão indicativos de proposições futuras. Os objetos como

proposições, são vistos como princípios a serem utilizados na geração de

novas linguagens.

Theo

Vandersbourg

1923

Coleção

Citterio’s

1990

Espera-se das atitudes de utilização das referências históricas no processo

de projeto um elo entre os ofícios do designer e do historiador. A escrita

da História, como o projeto de um artefato devem alimentar uma versão,

uma interpretação. Os projetos e as versões históricas são escritos no

presente e devem estabelecer a construção do futuro.

Steinberg´s

Cartoon

Agradeço a colaboração dos estudantes

E. S. Lima, N. Xavier, R. Toshio, L. Domínguez, B. Polastri, A. Mussa, T.

Canhos, A. Cavagna, A. P. A. Gonçalves, T. P. Almeida, V. C. Rocha, L. Arruda,

A. Carolina, M. F. L. Ribeiro, R. Sandoli, R. Morolo, A. Hepmer, B. M. M.

Benvenda, D. Cossia, D. Oliva, F. Fusaro, G. Lima, G. O. F. Cursio, L. Santos, M

B. S. Barrios, M. F. Carrer, R. D. José, J. P. M. Osinshi, N.X. Carvalho