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Círculo do Graal http://poemavida.blogspot.com/ Página 1 Poema Vivo Poesia De Eliane Lima

Poema vivo

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Poesia De Eliane Lima http://poemavida.blogspot.com/ Página 1 Círculo do Graal Poema vivo http://poemavida.blogspot.com/ Página 2 Círculo do Graal Prefácio Eliane F. C. Lima Círculo do Graal XV – Encontro XVII – O Eterno retorno III – Improváveis ecos urbanos XI – Macia seda XIX – Velha História XVIII – Cartão Postal VIII – Mágica estrada IX – Totalidade II – Obra-prima XIII – Cor, cordis XII – Enlace VII – Retrato IV – Afinal Círculo do Graal I – Intrigas Epílogo Prefácio

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Poema Vivo

Poesia

De

Eliane Lima

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Poema vivo

Poesia

De

Eliane Lima

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Prefácio

Minha vida sempre foi dedicada à literatura. Sou professora e ministrei minhas aulas até

me aposentar. Mas continuo dando aulas, nessa área, a cada conversa. Mania da

profissão. Sou doutora em Literatura Brasileira pela UFRJ e faço pesquisas no

NIELM/UFRJ, ainda na linha de pesquisa a que me dediquei e que pretendo privilegiar

em meu blogue: autoria de mulher. É urgente modificar o cânone, feito por e para

homens. Mas a literatura não foi escolha, foi destino. Desde cedo comecei a fazer poesia

e ficção. Como se vê, viver a literatura é para mim o mesmo que viver. O desejo de ter a

literatura em vida é mais do que um título de um de meus blogues. É uma confissão.

Também sou mãe do Gabriel amado, minha obra poética mais perfeita, morando na

Alemanha, tão longe no espaço, aninhadinho em meu coração. Sou carioca, meados do

século XX, desse Rio de Janeiro adorado por seus filhos e que devolve a emoção,

sempre, em beleza.

Eliane F. C. Lima

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Índice

Prefácio

I – Intrigas

II – Obra-prima

III – Improváveis ecos urbanos

IV – Afinal

V – O Haiti dentro de mim

VI – O Vento e o Tempo

VII – Retrato

VIII – Mágica estrada

IX – Totalidade

X – Das especificidades do amor

XI – Macia seda

XII – Enlace

XIII – Cor, cordis

XIV – O Absoluto

XV – Encontro

XVI – Vagante

XVII – O Eterno retorno

XVIII – Cartão Postal

XIX – Velha História

XX – Amor

Epílogo

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I – Intrigas

Mangueiras. Comadres:

boatos secretos,

suas folhas pontudas,

murmurinhas ao vento.

Sussurram de mim

suas vozes de chuva?

Disfarces, olhares oblíquos,

malícias, maldades?

As mangueiras, comadas,

seu verde, verdugo,

vergasta a verdade:

um grande segredo

rumoram ao vento.

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II – Obra-prima

No quadro de minha janela,

a natureza pintora:

o verde de uma mangueira,

vermelhos de suas frutas,

recortes de azul do céu,

jogados atrás de tudo.

Não é natureza morta:

um vento, de improviso,

desorganiza o conjunto,

aviva as folhas paradas,

ameaça as maduras,

torna mais cara a pintura.

Um pássaro pequenino,

amarelo dentro do ninho:

pingo de tinta borrado.

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III – Improváveis ecos urbanos

A paz é um latido ao longe:

traz recordações de não sei quê,

de não sei onde,

mas inunda a alma de saudade

do que fica no passado.

A paz é uma chuvinha elegante,

pouca, levemente fria,

que vem quando se precisa

que se vai na hora certa.

A paz é um dia de sol fraco

e uma brisa intermitente,

que refresca,

mas não dá arrepio.

A paz é um silêncio bom,

longe um som de carros pressentido,

numa estrada indefinida,

que não se vê,

que não chega aqui.

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IV – Afinal

O meu dragão, onde está?

Procuro pelas esquinas.

Onde foi que se perdeu?

Tem as garras afiadas,

a bocarra imunda e quente,

seus olhos verdes vidrados,

o ódio acaba na cauda.

Tudo junto, onde irá?

Apuro ouvidos e olhos,

apuro, fino, meu faro,

a minha pele esfriada,

procurando labaredas.

Aguardo seus urros loucos,

incêndios e destroçar.

Belo corpo, meio cobra,

asas negadas de anjos,

se pode, vai para o céu,

se não, rasteja no chão.

Sabe de si, sabe tudo,

esse meu dragão querido.

Hei de achá-lo, de surpresa,

hei de dar-me, sua presa.

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V – O Haiti dentro de mim

Tive um sonho mau:

de destroços, de choro, de fome.

Eram pés deambulantes,

bocas rotas,

olhos em busca de vida.

O mundo era ali, tragado, –

resto de mundo – e ruínas.

O caos. Aí, a vida errante,

erra, vagarosamente,

com pernas bambas,

passos inseguros.

A vida buscando

sob minhas lajes,

no meio do pó desabado,

por entre vigas caídas,

um restinho de humano.

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VI – O Vento e o Tempo

Diz Cecília que o vento,

o vento empurra o tempo,

mexe as folhas, leva areia,

revolve a alma e a vontade.

Cecília diz que o tempo,

o tempo empurra a vida,

corta a sorte, faz ferida,

apaga a felicidade.

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VII – Retrato

Era a vida,

seu movimento:

a juventude, o sonho, a festa.

Caleidoscopio colorido,

tudo mudança.

E veio a foto,

caras muitas, sorrisos sentados,

braços e ombros, entrelaços,

alegria presa do papel.

A vida, fugaz, foi.

Velhice,

mortos quatro,

um olha a foto:

de quem são os sorrisos,

de quem a juventude,

onde a festa,

que é do sonho?

A alegria, fugaz, fugiu.

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VIII – Mágica estrada

Nasci e a vida já indo:

um roteiro pela frente,

enorme estrada de luz.

Hoje, as luzes se apagando,

aperto os olhos e ando,

agora, já devagar.

E percebo, inutilmente,

que o caminho é só voltar.

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IX – Totalidade

Se me defino, eu me reduzo.

Aparo arestas, corto esquinas

e me arredondo.

Se me arredondo, eu me reduzo,

se é o círculo a perfeição.

Se sou perfeita, eu me reduzo,

tinha de um lado, tinha de outro,

o mau e o bom.

Se sou bondade, eu me reduzo.

Sou céu, sou chão,

ave altaneira, reptil cobra.

Se sou só cobra, eu me reduzo,

quero rastejo e quero voo.

Ser cobra e ave e peixe e lua,

se fico opaca e se eu luzo,

se sou a falta e sou a sobra,

faço o meu mundo para meu uso.

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X – Das especificidades do amor

Amor morto não deixa marca.

Não há memória

no amor morto.

Não é aborto,

fuga de porto,

desfecho torto.

Amor morto,

ninguém se lembra,

jamais se viu.

Amor morto nunca existiu.

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XI - Macia seda

(Homenagem ao engenho musical de Michel F.M.)

Um anjo canta,

som masculino,

seu doce mantra.

Ainda menino,

claves de sol,

semicolcheias,

são suas teias.

Com passo leve

– a vida é breve –,

não toca harpa,

não toca sino,

só seu destino.

Dedilha cordas,

retira a farpa

que fere o ouvido

de nossa vida.

De tão menino,

de tão canoro,

me afaga o ombro,

me embala o sono,

divina lida.

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XII – Enlace

Asas abertas, plana alto o anjo,

Busca, agudos olhos, o seu deus.

Luz solitária, vento amigo e brando,

sobre as nuvens – pássaro sem os seus?

Enormes asas, boi, montanha, lago,

pequena sombra erra pelo chão.

Achará, hoje, um dia, assim voando,

a quem procura, um rumo torto e vago?

Asas intensas, agora, entre as estrelas,

até a lua, baixa à rua, à várzea nua,

perscruta, atento, a cada vão desvão,

se vê imagens, voa, ali, ao vê-las.

Abertas asas, fugiu ao paraíso?

Não estava lá aquilo a que buscava?

Um par sem mancha, aberto, voa alto,

a face calma, mesmo sem sorriso.

E, finalmente, asas em sobressalto,

uma pessoa, abaixo, segue dura.

Desfeito todo em ternura e gratidão,

enxerga nela o criador a criatura.

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XIII – Cor, cordis

Não guarde o coração na gaveta para deixar que ele bata mais tarde, quando você não

tiver mais nada de importante para fazer;

não guarde o coração no bolso e o deixe esquecido lá, para só encontrá-lo, surpresa,

quando vestir aquela velha calça incômoda;

não esqueça o coração em cima do armário que você só alcança, quando pega a pesada e

insuportável escada de armar;

não perca o coração no meio dos livros que você deixou para ler não sei quando;

nenhum esforço vale o descompassado e sudorífero bater do coração vexado,

surpreendido, flagrado, tartamudo, boquiaberto, trêmulo de amor.

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XIV – O Absoluto

O silêncio de olhar,

o silêncio de ouvir.

O lento movimento,

de mansinho,

um vento sorrateiro,

leve brisa,

instaurada a paz de ninho.

A calma absoluta,

a luz pouca,

olhar sem sentir medo,

sem a roupa,

que cobre o corpo,

a alma:

a armadura.

Abrir – silêncio! – a estrutura

e espionar o fora,

mansamente.

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XV – Encontro

Miro a mulher parada,

ela virada pra fora.

Será que vê a paisagem?

Esgazear de olhos negros,

ares de enxergar o nada.

O que será que espia,

fita, investiga, espreita?

Parece esperar alguém...

um eu que de fora vem?

Encostada na esquadria,

a porta, de par em par,

seu corpo é como miragem.

As mãos, vaguidão em cada;

os pés, um já vai voar;

o rosto voltado, embora

pareça ao errante afeita.

Com que será que ela sonha:

futuro, mar, querubim?

Por ordem de deuses gregos?

Será por pura peçonha?

Ela olha para mim.

Fascinada, olho a mulher:

está nela a minha face.

E, sem qualquer mais disfarce,

é a mim que ela quer.

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XVI – Vagante

Tenho uma alma penada,

que mora dentro de mim.

Anda arrastando correntes,

caminha por quartos ermos,

enormes salas vazias,

lençóis brancos sobre móveis,

escadas em caracol,

levando a lugar nenhum.

De lá se desce voando,

levitando feito espuma.

No sótão há coisas velhas,

porão?, só há coisas mortas,

ratos e teias de aranhas,

que velam pelo silêncio,

se escondem,

se há gemido:

o desespero da alma,

fechando e abrindo portas.

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XVII – O Eterno retorno

Voltar sempre mulher,

se são dadas outras vidas.

Impossível diferente,

reconstruindo o mundo,

evitando o despedaço,

segurando sempre os cacos,

o mundo sempre explodido.

Voltar, eterna mulher,

apagando o velho mundo,

desenhando outros contornos,

outros modos, outros estares,

viver ser só fraternar.

Mulher, ser sempre mulher,

querer somente o ficar,

querer somente o querer,

cobiçar somente a vida,

juntar e unir os pedaços,

fazer do pó o inteiro.

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XVIII – Cartão Postal

Olho aquele Pão-de-açúcar,

morro, pedra e enfado,

de bondinhos e turistas,

barcos, banhistas aos pés.

Às vezes, no meio de [nuvens,

esconde o rosto, cansado,

esquecer tanta euforia.

Saudade de tempo passado,

índios, nudez e silêncio,

trilhas de pés descalços,

rostos quietos na mata,

banhos em rios sem sal.

Olho o morro:

seu corpo finge o azul,

esconde seu verde mato,

esconder-se-ia todo,

não fosse assim gigante,

não fosse assim parado,

navio fixo no mar,

âncoras pra sempre fundas.

Fugindo na água à fora,

longe de grandes navios,

perder-se-ia nas brumas,

terras ainda não vistas,

praias jamais nadadas,

ninguém pra ver ou falar.

Mas está tão encalhado,

eternamente calado,

seu pranto salga o mar.

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XIX – Velha história

Havia orgulho em mim.

De mim.

Hoje sou só uma lembrança do passado.

Como as velhas avós.

Entrei para o álbum de fotografias,

daqueles que partiram

e não são lembrados,

nem com saudade.

São caras estranhas.

Os antigos, guardiães das memórias,

contam histórias sobre eles.

A que os novos não prestam atenção.

Embora ainda caminhe por aqui,

e viva por aqui,

meu rosto, já esfumaçando,

amarelece entre os defuntos retratos.

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XX – Amor

Narcisa se debruça sobre o lago,

espelho verde, vítreo e cristalino.

Tudo é paz, e no silêncio de abandono,

umas folhas soltas, rumo vago,

umas sombras frias e sem tino,

por cima, uma flor boia sem dono.

Sorridente, ela já precisa

recolher negros cabelos com as mãos.

Mas surgem logo, de ouro, outros cabelos,

outros olhos como os seus tão sãos.

Se tão surpresa, vê, então, Narcisa,

louras madeixas que ela também quer,

dois rostos vivos n’água transparente,

aberto outro sorriso de mulher,

incontrolável, se apaixona de repente.

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Epílogo

A minha Pátria é a língua portuguesa!

Fernando Pessoa

E é nesta língua que tantos e bons escritores, romancistas, poetas, contadores de

histórias enriquecem as páginas do livro que é a Literatura!

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