Pirandello_Seis personagens

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    AS PERSONAGENSDA COMEDIA POR FAZER

    OPALA MAEAENTEADAo FILHOORAPAZINHO. . ,A MENINA(estas duas ultimas personagens nao falam)MADAMA PACE (depois, evocada)

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    OS ATORES DA COMPANHIA

    o DIRETOR-ENSAIADORAPRIMEIRA ATRIZo PRIMEIRO ATORA SEGUNDAATRIZAINGENUAo GALAOUTROS ATORES E ATRIZESo ASSISTENTEo CONTRA-REGRAMAQUINIST A ..

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    ilI",.,',

    _ , : ' , 1 : .

    "'i::\ I" "'I" o publico, ao entrar, encontrarii o pano',!;' ; '; levantado: e 0'palco sem bastidores nem

    ",I cendrio, tal qual e durante 0 dia, quase es-, ," ,',.' curo e vazio, para dar, desde 0comeco, aimpressiio de' urn espetdculo niio prepa-rado. ''';,''''''Duas escadinhas, uma a direita e outraa esquerda, poem 0palco em comunicaciiocom a sala.No palco, a caixa doponto, colocada aolado da abertura. Do outro lado, na partebaixa, uma mesinha e uma poltrona, decostas para a plateia, na qual se sentardo Diretor da companhia .. \ ' , ,,',','" Outras duas .mesinhas, uma poucomaior do que 'a outra, com' cadeiras emvolta, postas na baixa, prontas para serem'" uttlizadas-no ensaio, quando necessdrias.Outras cadeiras espalhadas a direita e d es-

    1 , '

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    Ir!II,fI'

    ,,', tura. Apanha alguns sarrafos, num cantodo fundo, levando-os para a baixa e pon-do-se a prega-los, ajoelhado no chao. Aobarulho das marteladas, entra, apressado,pela porta dos camarins, 0 Assistente dedireciio.

    o ASSISTENTEEh, voce ai, que esta fazendo? ...oMAQUINISTA.Marteiando. '

    i

    ! o ASSISTENTEA esta hora? {Olha 0 relogio) J a sao dez e meia. Daquia pouco'chega 0 Diretor para 0 ensaio.

    . . I, ,.. I", \ ~

    oMAQUINIST A ".Mas eu tambem preciso de tempo para trabaihar.". ' 'I,.

    0' ASSISTENTEVoce vai ter, mas nao agora.oMAQUINIST A \,

    Quando"! ... " ,o ASSISTENTE

    Quando njio for mais hora de ensaio. Vamos, vamos, ieveembora tudo isso, e deixe-me arrumar a cena para 0 se-gundo ato de'A Cada Qual Seu Papel.

    (0 Maquinista, indignado, resmun-gando, pega os sarrafos e vai em bora. En-tretanto, comecam a entrar os Atores da

    iIIIII"

    " 350I ;

    1I1,

    companhia, homens e mulheres, pela portado palco; primeiro um, depois outro, maisdois, juntos, como quiserem; nove ou dez,quantos se supoe serem necessdrios para 0ensaio da comedia. Entram, cumprimentamo Assistente e uns ..aos outros, dan-do-se bons-dias. Alguns iriio para os ca-marins, outros, entre os quais 0 Ponto, quetem 0 texto enrolado debaixo do braco.fi-cam no palco, a espera do Diretor, paracomecar 0 ensaio, sentados em grupos oude pe, conversando .entre si c Urn acendeum cigarro, outro se lamenta por causa dopape/que the foi distribuido, um terceiroI e para os colegas, em voz alta, noticiasde urn jornalzinho teatral. Sera' conve-niente que. tanto as Atrizes como os Ato-res, estejam vestidos com roupas claras ealegres, e que esta prime ira cena improvi-sada tenha, na. sua, naturalidade, .'muitavida e movimento. Num dado instante, umdos Atores senta-se ao piano e toea um tre-

    : cho da danca; os Atores e Atrizes maisjo-vens comecam a dancar.)

    ,"III: II I_

    iIt

    o ASSISTENTE (batendo palmas para chama-los a or-dem)Vamos, vamos, parem com isso. 0 Diretor vern at! '(0 piano e a danca param repentina-

    mente. Os atoresjicam a olhar para a pla-teia, por cuja porta entra 0Diretor que, dechapeu coco na cabeca, bengala debaixo

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    ,:~' do, braco e um' charutiio na boca, desce" pelo corredor entre as poltronas, cumpri-'. mentado pelos Atores, sobe ao palco poruma.das escadinhas. 0Secretdrio entrega-lhe a correspondencia: alguns jornais, umtexto enfaixado.)

    ODIRETQRCartas? ..

    0. SECR'ETARIQ, Nenhuma. Toda a correspondencia esta ai.0. DIREIQR (entregando-lhe 0 texto enfaixado). Ponha-o no-meu camarim. (Olhando em volta e dirigin-, do-se ~ao: Assistente) Oh !Nao se ve nada. Por favor,mande.acender urn pouco de luz.

    "'/.' .": ',,' I': ;.,'; ..I":'1 0. ASSISTENTE ""Pois nao, (Saipara dar a ordem.),

    II I1

    I

    ., " " , (Pouco depois 0palco se iluminara, em, ' ," " , todo 0 lado dire ito, onde estiio os Atores,

    com uma viva luz, branca. Entretanto, 0Ponto entrou na sua abertura, acendeu a

    '" \' ,,::,.1,\1',: lampadazinha e abriu 0 texto diante de si.)0. DIRETQR (batendo palmas)

    Vamos, vamos; comecemos. (Ao Assistente) Falta al-,guem?' ... ''',' '",

    0. ASSISTENTE ".< , Falta a Primeira Atriz.352

    1 1

    I 'if1j.I'1 1~

    '\i'.~i ! I II

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    i. '."':'QDIRETQRComo sernpre] (Olha 0 rej6gi~~rJa est amos atrasadosdez rninutos l Faca 0 favor, de po-la. na tabela, assimaprendera a ser pontual nos ensaios, .", .,;, "I ,.,

    /(Mal acaba de' falar, e, da porta dofundo da plateia, sf!' ouve a voz da Pri-meira Atriz.)

    A PRIMEIRA ATRIZNao, nao, por favor! Estou aqui, estou aqui! (Vem todavestida com um chapeldo petulante na cabeca e um ciio-zinho no braco. Desce correndo pelo corredor e so beapressadissima por uma das escadinhas.)

    QDIRETQRA senhora jurou fazer-rne esperar sempre !... : I" '" i'

    A PRIMEIRA ATRIZDesculpe-rne, procurei tanto urn autom6vel para chegara tempo! Mas vejo que ainda njio comecararn, e eu naoentro logo em cena. (Depois, chamando 0Assistente pelonome, entrega-lhe 0 ciiozinho.) Por favor, feche-o no meucamarim. . ,

    0. DIRETQR (resmungando)Ainda por cima 0 caozinho !Como se f6ssem~s poucos,os quadnipedes, aqui. (Bate de novo as miios e dirige-seao Ponto.) Vamos, vamos, 0 segundo' ato de A CadaQual 0 Seu Pape/. (Sentando-se na poltrona) Atencao,senhores. Quem esta em cena? ..

    t I; ';,.~\',, ~'"(Os Atores e. Atrizes saem da baixa do

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    palco e vao sentar-se a um lado, exceto ostres que iniciam 0 ensaio e a Prime iraAtriz, 'a qual, sem prestar atenciio a per-guntado Diretor, foi sentar-se diante deuma das mesinhas.)

    o DIRETOR (a himeiraAtrtz)A senhora entao esta em cena?

    A PRIMEIRA ATRIZEu? Nao, senhor.

    ODIRETOR (aborrecido)Entao saia dai, pelo amor de Deus! '

    _ I(A Primeira A triz levanta-se e vai sen tarjunto aos outros Atores que ja se afasta-ram.)

    i/ '11o DIRETOR (ao Ponto).Cornece, cornece. "I

    " ,, ' .

    o PONTO (Lendo 0 [extol"Em cas a de Leone Gala. Vrna estranha sala de jantare de estudo." I, ' "," "', ". ,',I ," , I,

    ( ~ 1

    ~ , " ,1o Diretor (ao Assistente).Porernos 0 gabinete verrnelho,

    . :. ,\'o ASSISTENTE (anotando numa folha de papel)'0 verrnelho.Perfeitamente.: ""

    354"

    I,~l

    I~ , ~ " IJ ' o PONTO (continuando a ler):

    "Mesa posta e escrivaninha com livros e papeis, Estantesde livros e cristaleira com ricos objetos de mesa. Portaao fundo abrindo para 0 quarto de .dorrnir de Leone.Porta lateral, it esquerda, pela qual se vai a cozinha. En-trada it direita."o DIRETOR (levantando-se e indicando)Bern! Prestern atencao: h r e a entrada, aqui, a cozinha.

    (Indo ao Ator que forti 0 papel de Socrates) 0 senhorentrara e saira por esta porta. (Ao Assistente) Ponha, aofundo, urna porta de urn so batente e pendure as cortinas.(Senta.)o ASSISTENTE (anotando) ,

    Perfeitarnente.

    o PONTO"Ceria prirneira. Leone' Gala,' Guido Venanzi, Filipe,charnado Socrates." (Ao Diretor) Devo ler tambem a ru-brica? . . . " ,i J 'I'

    ODIRETOR' "Claro! Claro! Ja the disse rnais de cern vezes !

    OPONTO '"Ao levantar 0 pano, Leone Gala, com gorro de cozi-nheiro e avental, bate, com urna colher de pau, urn ovo,nurna tigela. Filipe bate outro, tambem com vestido decozinheiro. Guido Verianzi escuta, sentado." , ,

    I I'

    o PRIMEIRO ATOR (ao Diretor)Com licenca: tenho.rnesrno de, por

    nheiro na cabeca? . .. I,' " 'urn gorro de' COZl-

    " '

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    o DIRETOR (chocado com apergunta) ..:; Parece-me que sim! Esta escrito ali! (Indica 0 texto.)

    o PRIMEIRO ATORDesculpe, mas e ridicule ! ...

    'I'I

    o DIRETOR (saltando.furioso)"Ridiculo !Ridiculo !"E que quer 0 senhor que eu faca,se nao nos vern mais, da Franca, uma boa comedia ese estamos reduzidos a pa r em cena pecas de Pirandello,que so os "iniciados'l.entendem, feitas, de proposito, detal modo que nao satisfazem nem aos atores nem aoscriticos nem ao publico? .. (Os Atores riem. Entiio 0Diretor, levantando-se, vem para junto do Primeiro Atore grita.) 0 gorro de cozinheiro, sim, senhor! Ebata' osovos! E pensa que, batendo avos, nao tern nada que fa-zer? Pois sim, va esperando. Tern que representar a casca. dos ovos que bate! (Os .Atores torn am a.r ir e comecama fazer comentdrios entre si, ironicamente.) Silencio ! Eprestem atencao quando explico! (Voltando-se, de novo,para 0Primeiro Ator) Sim, senhor, a casca; OU, em ou-tras palavras: a forma vazia da razao, sem 0 recheiodoinstinto, que e cego. 0 senhor e a razao e sua mulher,o instinto, num jogo de papeis preestabelecido, no qualo senhor, que representa 0 seu papel, e , voluntariamente,o fantoche de si mesmo, Compreendeu? ..:,

    ., \ ;1";" ', .' .: \ . \ \' . /.

    l,

    o DIRETOR (voltando para 0seu lugar)Nem eu tampouco! Vamos adiante, que no fim tudo dara \ i

    356 \ ~

    ~

    certo! (Conjidencial) Nao se esqueca de ficar sempre de. tres quartos, porque, se alern .do dialogo ja ser confuso,o senhor.nao se fizer ouvir pelo publico, entao ira tudo.por agua abaixo! (Batendo de novo as miios) Atencao !. ,Atencao l Recomecemos !..... 1'o PONTO

    Com licenca, senhor Diretor, permite que me cubra coma caixa? Ha umventinho por aqui! ..ODIRETOR, Pois nao ! Ponha a caixa, ponha! . I

    "

    ,i,):'\ ~,(Entretanto; 0 Porteiro do teatro entrou

    na sala com o' bone agaloado na cabecae atravessou 0 corredor, entre as poltronas,aproximando-se. do palco, para anunciar. ao Diretor- 'a chegada das Seis Persona-gens, que.vtendo entrado tambem na sa-.la, seguindo 0 Porteiro a certa distiincia,

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    caras para as Personagens, mtiscaras feitasexpressamente de material que niio amo-leca com 0 suor e que sejam leves, paraniio incomodar os atores que as usarem.Devem ser fabricadas e cortadas de modoa deixar livres os olhos, 0 nariz :e a boca.Desta maneira, interpretar-se-ti tambem 0sentido profundo da peca. As Personagensniio deveriio aparecer como "fantasmas",porem como "realidades criadas", constru-roes imuttiveis da fantasia e, por conse-guinte, mais rea is e consistentes do que avoluvel naturalidade dos Atores. As mas-caras ajudariio a dar a impressiio de rostosconstruidos artisticamente e cada qual fi-xado imutavelmente na expressiio do pro-prio sentimento fundamental, que e , parao.Pai.:o remorsot.para a Enteada, a vin-ganca; para o . Filho, 0 desdem; para aMiie, a dor, com 'tagrimas fixas, de cera,na lividez das olheiras e ao longo da face,I ' . conforme se veem, nas igrejas, em imagens

    . esculpidas e pintadas da Mater Dolorosa.1E os vestudrios devem ser tambem de teci-c;dos e feitlos especiais, sem extravagiincia,, com pregas rigidas e volume quase esta-tudrio, de modo que niio deem a ideia deterem 'sido feitos com fazendas que se po-dem comprar em qualquer loja da cidade,nem cortados e cosidos por uma costureiraqualquer. '. \

    - v . .. ..

    'II

    ,0 Pai andard pelos 50 anos; entradas

    I" ~ I

    fundas, mas niio calvo, cabelo ruivo, bigo-dinho espesso, quase encaracolado ao re-dor da boca ainda fresca, frequentementeaberta num sorriso incerto e viio. Pdlido,principalmente, na jronte ampla; olhosazuis, ovais, lucidissimos e argutos. Vestecalca clara e paleto escuro. Ora sera meli-fluo, ora sera dspero e duro. II

    A Miie parece apavorada e esmagadapor urn peso intolertivel de vergonha e avil-tamento. Velada por espesso crepe deviuva, esta humildemente vestida dlh'c/groe, quando' levantar 0' veu, , mostrard 'urn'rosto'niio dolente, mas como se fosse decera; sempre de olhos baixos. "\ ,"

    I.

    " II. ',\.A Enteada, de 18 anos, e petulante,quase impudente. Belfssima, veste-se tam-bern de Iuto, ~as 'com elegiincia vistosa.Mostra desprezo pelo ar.iimido, oflito eenleado do irmiiozinho, 0 Rapazinho es-qudlido, de 14 anos, vestido tam bern de ne-gro, e uma ternura vivaz pela irmiizinha,a Men ina, de 4 anos, vestida de branco,com uma faixa de seda negra na cintura.o Filho, de 22 anos, alto, quase inteiri-

    cado num contido desprezo pelo Pai enuma carrancuda indiferenca pela Miie,veste umsobretudo leve, violeta; e urnlongo cachecol verde em lorna do pescoco.

    t359

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    o PORTEIRO (com 0bone na mao), Com licenca, senhor .Diretor ...

    ; f: ,I I:.

    :\\:; , ',',o DIRETOR (abrupto, de maus modos)Que e ainda? > , ,o PORTEIRO (timido) "Estao aqui umas pessoas,perguntando pelo senhor.

    ,I~

    (0 Diretor e os atores voltam-se surpre-, , 'sos~ a olhar para a sala.)

    , ,. I. ',. ' , o'pIRJ:np,R (rurio,so outra vez) "" " 'Mas estou ensaiando. E, voce bem sabe que, quando en-

    "saio- nao de~~entrarjninguern. (Olhando para 0fundo,da piateia) Q,~~~~ao os senhores? Que desejam? ..., " " " , . , . .... ~ ,o PAl (adiantando-se a~e uT1}adas escadinhas, seguido pe-,'~"''''''""'los-outros})-_. ";,,.';~'.-"",::-\. I"Estamos aqui a'procura de urn autor.r r, ....< , l\) ,~;~:~il.! ;,~" '..- : ,j\.: . , . ~o DIRETOR' (entre espantado e irritado)

    De 'urn 'autor? Que autor? " ,,,' ""j.'. \, '.',' ~"I ~t",_" , 'k";" '.~ ~ .,\ t"~ ': .1,,:, II

    1\

    o 'PAil!'! ',/,',(, ",,', ','; r.: " ,',' ,, Qualquerum,' senh~r.! '""" .'~,-, .lV ;. I

    ODIRETOR1Mas aqui nao ha nenhum autor. Nao estamos ensaiando, nenhuma pe~a nova. .. ," , "k

    I" _ ' 1 ' , .,t~ 1 . _ " ,) , , ' ' . ~ : \ " , : . " , . ; ) . : ' ~ ~,1 ., '\ 'v... "l'A ENTEADA (com alegre vivacidade, subindo de corrida

    ',;, , I"~ I'"~ a escadinha) < " : ,' '' ;,360

    I~

    Tanto melhor !Tanto rnelhor, entad. meu senhor. Podere-mos ser nos a sua nova peca l ".'; " ,IUM ATOR (entre os comentdrios rdpidos e as risadas dosoutros) ,Oh ! Escutem, escutem !,

    OPAl (subindo ao palco, em seguida a Enteada)Sim. ! ' mas se nao ha nenhum autor ... (Ao Diretor)Salvo se 0 senhor quiser ser .. .

    (A Mae, com a Meninapela mao,' eoRapazinho subiriio os primeiros' degrausda escadinha ef icariio ali.' a espera. 0 Fi-lho permanecera embaixo, mal-humo-rado.r >: ,', !

    ODIRETOR . .. ,' ( " . \ . ,' . ~, ' . " ',.Os senhores querem fazer gra9a?>~'. II ",!, ,I.1 OPAl

    Nao, em absoluto! Que esta dizendo, senhor? Ao contra-rio, trazerno-lhes um drama doloroso, ,, ' .r ' i'

    I,AENTEADAE poderemos fazer a sua fortuna!

    ODI.RETOR, ,I I ,1 I

    I IFacam-me 0 favor, de ir ernbora I.Nao temos tempo aperder com loucos. ,I," ,,) ,!, I,~ ,'1)! I" ...~ .,. . , (I " 'OPAl (of endido, mas melifluo)

    Oh, senhor, sabe muito bem que a vida e cheia de infini-361

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    o DIRETOR (espantofingido e lrdnicol - , , l .. , ')E 0 senhor, COrn essasoutras pessoas em volta,nasceupersonagem? . . . '

    OPAlExatamente. E vivos, como nos ve,

    'to,Di;etor e os Atoresaesaiom a ~ir,como 'se t~atasse de uma brincadetra.),

    _ t , ' . 1 " ' .".:i,'; "o pAr(~agoad~)J,, i,J, ' ,,Desagrada-rne que riam dessa maneira, porque tr~zemosem nos, repitovum drama doIoroso, 0que e facil perce-ber; pelo 'aspecto' desta s e n h o r a velada de negro. (Assimfalando, estende a miio para ajudar a Miie a subir os tdti-mos degraus da escadinha e, continuando 'a 's~iu~'a-l~pela miio, a conduz; ' c o m ' c e r i a solenidade tTllgica!p~rao outro lado do palco, que se ilumina, repentinamente,c om=uma luz fanuist ica. A Menina e 0 Rapazinh(/~~!.

    ~r r~t,?~" _~, "_",.. '"'. ': "". f,, :. "' " ); '.guem I f . Mae; depols, val 0 Filho, que s e mantem apar-tado, a d 'fundo; depoisa Enieada, 'quefica tambem afas-" " t a d a 'dos"outros;' apoiada'ndboca decerui" Os 'Atores,';'aprinc@i(f'estupi!jatos, depois~dm(rcdos daquela evolu-u'9iio,";ompeni'em 'aplausos.como se lhes'estivessem ofere-c e ndo u rn e s pe td c ulo .)o DIRETOR (primeiro pasmo, 'depois indignado) " I 1

    Acabemos com isto! Facam silencio !(Volta-se para asJ Personagens.) E os senhores retirem-se l Saiam daqui!(Ao Assistente) Por Deus, faca-os sair !... Ii' : '.

    . . : " "i ' j " : . li........: I;'.'~j:~'r H~' i iU, ..' do ASSISTENTE (avancando e.depois parando, como.que1(, ", i",:: I ."" ,', retido por.estranho desiinimo) :.,\ .;", ,Saiam!

    364

    :,\

    I'

    o PRIMEIRO ATOR IINao e dire ito estar assim, a fazer troca !..."

    OPAl (resoluto, avancando) , , ' , '. " \ . { ) ' 1 " " 1 . - I , " ,Fico maraviIhado da incredulidade dos seriho'res ! j Naoestao habituados, porventura, a v~r 'p~iar~m v i v o s ; : !~quiem cima, uma diante das outras, as personagens que. [0-,r~~ ~ri~d~s por"um autor? I~aIye~p.,?rqu~. Il~o ~aali :(i~~dica a catxa do ponto) um texto que noscoritenha? ...

    . . 'rA.' 1'~j : t ." I JA ENTEADA (indo ao Diretor, sorridente e jirovocarlle) . II I. ~;.... '\ " t.l'Creia, senhor, que somas, verdadeirarnente, seis persona-

    gens interessantissimas! Se bem que.desperdicadas !...., , I ~ J,' ~_ ,~ ! ' 1

    II'))

    ..' '. . . .OPAl (cfastando-se)'Sim, desperdicadas, isso ,mesmo!. (Ao. Diretor, subita-.mente), No sentidode que 0 autor que" nos c~io~~i~~snao quis, depois, ou njio pode, materialrnente, m~t~r~nosno mundo da arte. E foi um verdadeiro crime senhor ,porque quem tem a sorte de nascer personagern viva.

    , pode rir. ate da morte. Nao morre mais !Morrera 0 ho-mem, 0 escritor, instrumento da criacao; a criatll~anaomorre jamais! E, para viver eternamente, nem mesmoprecisa possuir dotes extraordinarios ou reaIizar prodi-gios. Quem era Sancho Panca? Quem era Dom Abbon-dio? E, no entanto,yivem na eternidade, porque, germesvivos" tiveram a felicidade de encontrar a matriz fecunda,

    365: I

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    eternidade !ODIRETOR

    Tudo isso esta muitissimo bern. Mas que querem os se-nhores aqui?

    OPAlQueremos viver, senhor!o DIRETOR (ironico)! }l,ortoda a eternidade?O'PAI"'"'Nao,' senhor, ao menos, por urn mornento, nossenhores.

    " , " ,. '0 ' '

    UMATOR, Oh;'veja;n so:'. :' vejam so!

    t 1:.\ '. , I,' '" ~i" ,,' I , . " " .A PRIMEiRAATRIZ ' ' "

    Querem viver em nos! 'o GALA (indicando a Enteada), Quanto amim, terei muito prazer, se me couber aqueJa"ali!> .1:" .!!:'

    Vejam, vejarn: a peca esta por fazer; (ao Dire/or) mas,se 0 senhor quiser e seus atores tarnbem, podemos arran-:ja-Ia agora mesmo, entre nos.o DIRETOR (aborrecido) ,I ",

    Mas 0 que e que quer arranjar? Aqui nao se fazem dessesarranjos! Aqui se representam dramas e comedias.

    366

    y";:

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    OPAl 'nPois entao !Foi justamente por isso que viemos procu-ra-Io. .i'

    , I")

    ODIRETORE ondeesta 0 texto? ..

    'i1"" OPAl "

    Esta em nos, senhor. (as Atores riem.) 0 drama esta emnos; somos nos! E e grande a nossa impaciencia, 0 nossodesejo de representa-lo, impelidos que somos pela paixaoque ferve dentro de nos e naono~ datregua l ...

    A ENTEApA (escarnecendo, com graca perfida, de afe-taaa impudencia) " ' '.' , ": " . -,A minha paixao, se 0 sennor soubess~! :: . 'A'~inh~pai-xao , .. por ele!. .. (Indicando 0 Pai, quase 0 abraca,mas desata, depois, num riso estridente.) , ,'I ',' "

    , ,. " ",!, '.' ',Ij, '. ,\, ' '.! I:' ,I" "" ';'.1OPAl (num repente de raiva) ..

    Fique em seu lugar, por enquanto! E peco-Ihe que nao. . ,na asslm ....AENTEADA

    Nao? Entao, com licenca: se bern que orfii, apenas hadois meses, vejam, senhores, como.canto e como danco !

    (Trauteia com malicia 0 Prends Gardea Tchou-Tchin-Tchou, de Dave Stamper,It, reduzido afoxtrote ou a one-step lento porFrancis Salabert; -acompanhando; a pri-meira estrofe com passo de danca: ,.,1;' .

    , I

    367Ii

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    I:1'II'I!

    Les chinois sont un peuple malin,De Shangai a Pekin, 'i , 'l i s ont mis des ecriteaux partout:Prenez garde a Tchou-Tchin-Tchou !

    ; ,;Os Atores, principalmente osjovens, en-quanto ela canta e danca, como atrafdospor uma estranha fascinaciio, movem-seem,_,direriio a ela. Levantando de leve asmdos, c o ; n o para agarrd-la. El~' se es-'/luil!f!; e , qzjflndo os Atores rompem em" . /1 ,,', .. "_. _ ' 1 - . 'y"apla'!_s,os,jk,a, durante p reP,Tf!_ensii,!o in-retor, abstrata e longinqua.) - -

    ~, ... \ I ~OS\ATORES E As ATRIZES (rind(/~ aplaudindo):Muito bern! Bravos lEsplendido ! . ., itt . It i~().,l( .'-. J ~.,,' )1 .. ,'. i',{ t , r .... : i

    O'O'iRETo'R(irado) ',\ "\1,,1"',\,,:\ ' '-)'Silencio !Pensam;}p~~ 7 aci~o; 'q~'eestao -num 'cafe-con-certo?' .. (Trazendo 0 Pai um pouco a parte, com certaconstemaciio.) Diga-me uma coisa: ela e doida?', '. ' 0 ' " '1 " ,

    . . q i .: , ., ;: : q i f ~ . . '"OPAl

    N~ 'D"d ' .,.,, ao. 01 a 0 que. Pior ....~' ENTEADA'(indo, subitamente, ao Diretor)':PiaT.I, 'Pior l: Oh,' 1~, '1ft! Muito' pior! Escute, por favor!Faca-nos representar ja esse drama e vera que, num certo

    ')~'momento,' quando Deus' .tirar este amorzinho aqui. ..," (Toma pela miio a Menina, que estd junto a Mae, e a, "leva aoDiretor.l.vi: como elinda? (Levanta-a nos braces.. e a beijaJQueridinha! queridinha! (Poe-na de novo nochiio e-acrescenta 'quase sem querer, comovida) Pois

    368

    I,bern: quando Deus tirar, de repente, este amorzinhoaquela'pobre mae, e este imbecilzinho aqui (traz para aJrente 0 Rapazinho, puxando-o, de mau modo, pelamango) fizer a maior das tolices, digna do cretino queele e (repele-o, com um empurriio, P'f!a a Mae), entaovera que eu levanto voo l Sim,' senhor! levanto 0voo ! . .. 0 voo !E nao vejo a hora disso, acredite, naovejo a bora! Porque, depois do' que aconteceu, de muitointimoventre mim e e1e (mostra oPai com um horrivel

    " esgar), n~o posso mais me ver no meio desta gente, assis-tindo ao tormento daque1a\'mae',p~r causa daquele su-jeito ali (indica 0 Filho), veja-o, veja-o, indiferente, gla-cial, pois e 0 filho legitimo, ele! Cheio de desprezo p o imim, por aque1e (indica 0Rapazinho) e por esta criaturi-nha, que somos bastardos - compreendeu? - bastar-dos. (Aproxima-se da Mae e abraca-a.) E a estapobremae, que e a mae com urn de todos nos,' ele nao a querreconhecer como sua mae tambem, e a considera, de altoa baixo, como mae somente de nos tres - os bastardos- viI! que ele e! (Dizisso 'tudo: rapidamente, com e x -trema excitaciio, e, ao chegar ao "vii", depois de aumen-, tar, a ,VOZ," em \'"bastardos ': ,pronuncia-o r surdamente,quase cusp indo.) ", ' , ",

    ,;") :,.)'. ," , );,,!_( 'IA MAE (com infinita angUstia, a d Diretor) 'i "", _

    Senhor, em nome destas duas criaturinhas, sup Iico-lhe ... (Sente-se desfalecer e vacila.) Oh, meu;Deus! i"

    Jr" '_.', '. 1 , ' , J r . . : :'i '_ },,; ( It /:o PAl (acudi~do parasuste-la, com quase tod~s osAtores,

    aturdidos e consternados)Pel a Virgem Santissima, uma cadeira, uma cadeira'paraesta pobre viiiva ! \' , , ", ' , i ',::

    36 9

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    OS ATORES (acudindo). Mas entao e verdade? Esta desmaiando mesmo?o DIRETOR ' ... ~' . ; . , , : . 1 .

    Uma cadeira aqui, depressa !

    . l I.

    . (Um dos Atores traz uma cadeira. Osoutros agrupam-se em roda, solicitos. AMae, sentada, procura impedir que 0 Pailevant~ 0 'viz/que the esconde 0 rosto.)

    ~', . '. , j.. . ,, , ., t 1 I

    "'f' '.' ,.' ,OPAl.,, ' ll:; \ 1 _. Veja-a, senhor, veja-a . ...1, ,I " ~, I '

    A MAE.,Nao, por favor, nao.faca isso. "O,PAI, ..,'" ,. '". : :,1 ': ... ' "i ....Deixe que a vejam! (Levanta-lhe 0 veu.) " . '"'I I

    ,t < '"

    MAE'(levanta~se" cobrindo 0 rosto com as miios, desespe-radamente) ,.Oh, senhor, suplico-Ihe 'que irnpeca este homem de reali-, zar 0 seu proposito.que, p~ra mim, ehorrivel! , i., ', .' '

    t , ,' , . ; J'i.;,",~~..'.'~~",,},:' t , " , ,o DIRETOR (surpreso, aturdido)Mas nao sei mais onde estarnos, nem de que se trata ...,_(A~ ?ai)~st.ll se~h~rae sUlllespo~a?" . ".i 1OPAl (rdpido) :1 : ' _ '.' '." : ' .1;

    Sim senhor, e minha mulher.''"370

    J '1I,. ,~I I

    '. ,.: I,\ , :

    ODIRETORE como e, entao, que ela eviuva, se 0 senhor estavivo? i , '

    (Os Atores desafogam todos 0 seu es-panto numafragorosa risada.)

    OPAl (magoado, com dspero ressentimento)Nao riam! Nao riam assim, pelo amor de Deus L Estee, precisamente, 0 seu drama, senhores. Ela teve outrohomem; outro homem que deveria estar aqui !

    A MAE (num grito)Nao! Nao!

    A ENTEADA,' I iEle teve a sorte de morrer hit dois meses. la Ihe faleinisso. E, como pode ver, ainda estamos de Iuto.

    371

    1 11 OPAl". ., . . ....Mas, se nao esta aqui, n~o.e" contudo, porque estejamorto. Nao esta aqui porque _ olhe para ela, senhor,por favor, e cornpreendera logo. ,0 seu drama nao podeconsistir no amor de dois hornens, pelos quais era inca-paz de sentir coisa alguma '_ a nao se~, talvez, urnpouco de gratidao (niio pOT mim, pelo outro), Nao e mu-Iher: e mae. E 0 seu drama (intenso, senhor, muito in-ten so) consiste, de fato, inteiramente, nestes quatro fi-Ihos, dos dais homens que ela teve. ;, \

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    A MAE, Eu? Que eu tive? Tern coragem de dizer que fui eu queos tive, como se Fosse por mim, por minha propria von-tade? Foi ele, scnhor! Foi ele que me deu 0outro, aforca ! Obrigou-rne, sim, obrigou-rne a ir embora, como outro!

    A ENTEADA (com impeto, indignada)Nao everdade !, , . , " . " . J ,: . < :

    A, MAE (admirada)Como nao e verdade? '"

    A El\fTEADANao e verdade! Nao e verdade! ... " '

    A MAE. r ' ... ~ . ,,' I I~ " ( ....Que pode saber voce?" - r . . ; ' , : ! . , ." .

    I i'"

    AENTEADAr : - rao e verdade !(Ao Diretor) Nao acredite nela. Sabe por'que dizisso?: Pot causa daquele ali; (Indica 0' Filho.) Por-'{ " ", ,. I . . ... que vive mortificada, consumida pelo desprezo dele, e

    ,1 querdar-lhe 'a 'entender que, se 0 abandonou quando ti-'. nha'"dois'; anos,' foiporque ele (indica 0 Pai) a obrigouJ'j'l'aisso.( . ,f.r: I, .'I!-:: .... , ,. :':, ,;,';' 'i'. ~) " l , , , . t " , .

    , z " , ~. . j I "i : i,lA ,MAE (comforca) :; .,'; ).(, . j '

    Obrigou-me, sim, obrigou-me ~Chamo Deus em testemu-372

    , I',' : :' . I

    1 I

    L., "

    , j; " , . , . ,

    "

    nho! (Ao Diretor) Pergunte a ele- (indica 0 Pai) se njioe verdade! Obrigue-o a dizer! Ela (indica a Enteada) njiopode saber nada !

    A ENTEADASei que, enquanto esteve com meu pai, a senhora sempreviveu em paz e contente. Negue-o, se e capaz.

    A MAE,Nao nego, nao , , ,

    II

    A ENTEADA ..,,, ,\'" ," ,Foi sempre cheio de amor, para a senhora, e de,cuidados.(AoRapazinho, raivosamente) Nao e verdade'lDiga .. .Por que nao fala, idiota?

    A MAE ,:., UDeixe esse pobre rnenino quieto! Por que quer fazer-rne,passar,por ingrata, rninhafilha? Longe de mim ofenderseu pai, naoofaria, demodo algum. Apenas, respondia ele (indica 0 Pai) que njio foi por culpa minha, nempor meu gosto, que abandonei asua' casa e 0meu filho.

    . , ~OPAlE verdade, senhor: fui eu !(Pausa.)o PRlMElRO ATOR(aos colegas): ," Vejam so que espetaculo l. , -t: ~, :

    .r. -: (, >.!.,t >,'\ {i

    373I

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    i : / 1 "" ,I ': iI! 1I

    I'i/1"I -'1 '' , , '

    A PRIMEIRA A TRIZ,E sao eles que 0 dao a nos!

    o GALAAo menos, por uma vez, , ,

    o DIRETOR (que comeca a interessar-se vivamente)Vamos ouvir! Vamos ouvir ! (E, assim dizendo, desce aplateia por urna das escadinhas efica em pe, diante dopalco, pa~a ter, como espectador. a impressiio da cena.)

    o FILHO (sem sair de seu lugar, baixo,frio, ironico),Sim, fiquern ouvindo e VaGver, agora mesmo, que rasgos'de' filosofia] ' Vai 'falar-lhes ' 0 Dernonlo da .Experien-. ,cia ... , ': '

    OPAl;'VOCe'ie, urn cinico imbecil, e ja Ihe disse isto rnaisde,'cern vezes'I {AoDirelor, queja estd naplateia) Escarnece'de rnimvsenhor, por causa dessa frase que encontrei para" ,qesculpar-me. "

    " ; ,; .'

    o FILHO (com desprezo)Frases. . . '\OPAl

    Frases! Frases! Como se nao fosse 0 consolo de todos,diante de urn fa to que nao se explica, diante de urn mal

    374

    . ~,

    que nos consorne, achar uma palavra que nao diz n~daenos aquieta! '

    A ENTEADAMesmo 0 rem orso, e principalmente ele , ; ,

    OPAl , , " .o remorse? Nao e verdade; nao 0 aquietei e~ rrum ape-nascompalavras. " , ":;"

    t :1A ENTEADA , "',, "" " . ': 1~,Tambern com urn poucode dinheiro - SIm, sim ~ com, . di 'h . " C as cern liras que ia ofere-urn pouco de fn ~Iro. om , 'cer-me em p~gamep~o, senhores. .. " I " "

    . t '.

    (Movimento de horror dos Atores.) "',o FILHO (com desprezo, a irmii)

    Como isso evil!

    .,AENTEADA ., Vii? Estavam la, num envelope azul-claro, sobre a mesi-

    nha de mogno, na saleta dos fundos da loja de MadamaPace. Sabe, senhor, uma daquelas madamas que, com 0pretexto de venderem Robes et Manteaux, nos atr~~maos seus ateliers a nos, mocas pobres, de boa faI;t1I!la.o FILHO".E comprou, para si, 0 direito de tiranizar-nos a todos,

    com aquelas cern liras que ele i~ paga~ e que, por ~o,rte, b nao teve depois motive de pagar ....veJa em -, , ,375

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    A ENTEADA ","Eh! Mas estivemos, mesmo, por urn triz - fique sa-bendo! (Desata a rir.)

    A MAE (insurgindo-se)Que vergonha, minha filha ! Que vergonha ! ...

    A ENTEADA (num rompante)Vergonha? E a minha vinganca ! Estou vibrando, se-nhor, ~n.siosa ~or viver aquela cena! A saleta ... aqui,o armano envidracado dos mantas; ali 0 sofa-cama, 0esp:lho grande, de moldura dourada, 0 biombo, e, dianteda janela, a tal mesinha de mogno e 0 envelope azul-claro, com 'as cern lints. Estou vendo-o l Poderia apa-, nha-lo !Mas os senhores teriam de virar 0 rosto: estou9 uase nua.! Nao coro mais, porque, agora, quem corae ele. (Indica 0PaL) Mas asseguro-lhes que estava muitopalido, palidissimo;: naquele mornento ! (Ao Diretor)Pode crer-rne, senhor!

    il I'I'tI, I

    I', '

    ODIRETORNao cornpreendo mais coisissima nenhuma'!

    OPAlPudera l:Assaltado desse modo!' Imponha urn pouco deordem, senhor, e deixe-rne falar! Nao de ouvidos as ig-nominias que, a meu respeito e com tanta ferocidade, elapretende faze-to acreditar, 'sem as devidas explicacoes !I" ,,1

    AENTEADAAqui nao se inventam historias !Aqui nao se inventamhistorias !

    OPAlMas nao estou inventando nada. Quero explicar-lhe ...

    376!....... _

    "I.}:,"

    :rJ, ,. . ,),

    ,',1'I, , A ENTEADA'Pois sim ! A seu modo!

    , r ' (0 Diretor, neste. momento, sobe aopalco para impor ordem.)

    II, I OPAlMas, se todo 0 mal esta nisto! ... Nas palavras. Todos

    trazemos dentro de nos urn mundo de coisas: cada qualtern 0 seu mundo de coisas! E como podernos entender-nos, senhor, se, nas palavras que digo, ponho 0 sentidoe 0 valor das coisas como sao dentro de mlin, ' enquantoquem as ouve Ihes da, inevitavelmente, 0 sentido e 0 va-lor que elas tern para ele, no mundo que traz consigo?Pensamos entender-nos . .. e jamais nos entendemos !Veja: a minha cornpaixao, toda a minha cornpaixjio 'poresta criatura (indica a Mae), ela a considerou a mais fe-roz das crueldades ! : ..

    ~ I

    " " ~ t, .~ " . 'AMAE,'"

    Mas se voce me expulsou !, 'OPAl

    Ve? Esta ouvindo? Diz que a expulsei. Achaque a expul-sei! l:,

    A MAEVoce sabe falar: eu nao sei ... Mas, acredite, senhor,que, depois de se ter casado comigo. . . quem sabe porque! ... - (eu era uma pobre mulher, humilde ... )

    OPAl ~ ), -" ", '/Justamente por isso ! Casei-rne pela sua humildadc, 0 que

    37 7

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    eu amava em voce, julgando ... (Interrompe-se diantedas nezacses dela. Abre os bracos, desesperado pela im-possibilidade de fazer-se compreender. Dirtgindo-se ao, Diretor) Esta. vendo? Diz que nao !E espantosa, senhor- acredite -; e espantosa a sua surdez (bate na testa),a sua surdez mental! Coracao tern, para os filhos! Massurd a, surda de cerebro, surda, senhor, ate ao desespero!

    I i 'I,'I,I IIAENTEADA'E , mas pergunte-Ihe agora que sorte nos trouxe a sua in-teligencia !...

    I,'

    " I i ' r \OPAlS~ ':los fosse dado prever todo 0 m~Ique pode nascerdo bern que pensamos fazer !...I, I, ... I ., I ..

    II,j

    ", I,I/': ) 1i :

    (Nesta altura, a Prime ira A triz, aborre-cida por ver 0 Primeiro Ator namorar aEnteada, vem ao Diretor epergunta) ;

    A PRIMEIRA ATRIZ" Com licenca, senhor Diretor: 0 ensaio vai continuar?i ~ , J . . . . C , . . ' r . ' , 'ODIRETORVai, sim, vai. Mas agora deixe-rne ouvir.

    OGALA IE urn caso tao novo !, 'IIr AINGENUAInteressantissimo!

    378

    ", .~

    'II

    A PRIMEIRA A TRIZ (dando uma olhadela ao PrimeiroA tor)

    Para quem se interessa por ele ...

    {1,~'.

    o DIRETOR (ao Pai)Mas e preciso que 0 senhor se explique claramente! (Sen-ta-se.)

    OPAlPois nao !Veja, senhor: eu tinha urn subalterno, meu se-cretario, urn pobre hornetn, devotadissimo,que and ava,em tudo e por tudo, de acordo com ela (indica a Mae),sem sombra de mal - note bern! - urn homem born, 'humilde e tao incapaz quanto ela - ja njio digo de fazer,mas de pensar no mal! ... , ' , ,I

    AENTEADAE, em vista disso, ele 0pensou, por eles-t:0fez!, . ,

    1 ;. I - .) r

    ~ .' I, \.' , I:~~ '/"OPAlNao e verdade! Pensei fazer 0 bern deles e tambern 0meu, confesso!' Meusenhor, tinha chegado ao ponte ',emque niio podia dizer uma palavra a urn ou a outro,' semque imediatamente trocassem urn olhar de compreensao,sem que ela procurasse logo os olhos do outro para aeon-selhar-se, para saber, como devia interpretar aquela mi-nha palavra, para nao irritar-rne. Bastava is so -"0 se-.nhor bern 'pode 'compreender - para manter-me numa,raiva continua, 'nurn estado de exasperacao intolera-

    .1 vel !.";." ; , 'I . , ~ODIRETOR "

    Uma pergunta: por. que nao mandava embora 0 seu se-cretario? I; , n,379

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    , : f l"OPAl < , ' " , \ . : , , " " ' \ :,;'. ',1 " ~,

    Foi 0 que fiz. Mandei-o embora. Mas vi entao esta pobremulher andar pela casa como perdida, como urn animalsem dono que a gente recolhe por pena.I

    ;'i,',"

    AMAE""Pudera!

    OPAl (volta-se para ela, como que para antecipar-se-Ihe.';,,'r ,", rdpido) '~ .< ,"".

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    . Mas 0 que fiz, foi por bem. .. e mais por ela que pormim, juro! (Cruza os braces no peito. Depois, voltan-do-se imediatamente para a Miie) Perdi voce de vista,diga, perdi voce de vista, ate que ele a levou embora,de um dia para outro, sem eu saber, para outra cidade,totalmente impressionado por aquele meu interesse puro- pode crer, senhor -, absolutamente puro, sem qual-quer segunda intencao, por minima que fosse. Interes-sei-me, com uma ternura inacreditavel, pela nova familiaque crescia, E' disso ela tambem e testemunha. (Indica

    r / (. ; ~ '" ,a Enteada.) .... "\'.' ,!, ',I~\.'.'.~ .AENTEADA

    E como! Pequenina, pequenina, sabe? - com as tranci-nhas pelos ombros e as ca1cinhas mais eompridas do quea saia - pequenina, assim - lernbro-rne de ve-lo diantedo portao da escola, na hora da saida. (Intencional) Vi-nha v~~~~ecresce~ .. :'. ,"

    OPAlIsso e perfido !E infame !,

    i" AENTEADANao l Por que?

    ",OPAl.' , . , , .lnfame! Infame !(De repente, exaltado, em lorn de expli-cacdo, ao Diretor) A minha easa, senhor, depois que elase foi (indica a Miie), pareceu-me, de repente, vazia. Erao meu pesadelo, mas enchia-rne a casa! Sozinho, pareciauma mosca sem cabeca, andando pelos quartos. Aqueleali (indica 0 Filho) criado fora, recem-chegado a easa;

    .. njio me parecia meu filho. Faltando a mae, cresceu por

    tI ~'.'

    l(J

    111\"

    'I

    SI, a parte, sem nenhuma relacao afetiva ou intelectualcomigo. E entao - parecera estranho, senhor, mas e ver-dade - a principio senti curiosidade, e depois, poueoa pouco, senti atracao pela nova familia dela, forrnadapor obra minha, e esse sentimento cornecou a encher 0vacuo. que senti a ao redor de mim. Tinha necessidad,e,sim, necessidade de sabe-la em .paz, toda entregue asmais simples tarefas da vida, feliz, porque alheia e dis-tante dos complicados tormentos do meu espirito. E,para ter uma prova disso, ia ver aquela menina, a saidada escola!. . . .

    AENTEADAPois sim que era por isso! Seguia-me, na rua; sorria paramim e, quando chegava a casa, dava-rne adeusinho, coma mao - assim !Eu 0 olhava espantada, 'desconfiada ...Nao sabia quem ~fli\::,,. S,~,mt~ia ma~.ae e e!a deve,tercompreendido logo que era ele, (A Mae moye a cabeca,assentindo.) Nao me deixou if it escola, durante uns dias,Quando voltei la, tornei a ve-lo, it saida - engracado !- com um errtbrulho ' grande, na mao. Aproximou-se,fez-me festas e tirou do embrulho urn chapelao lindo, depalhada Italia, com uma guirlandazinha de rosas demaio, pequeninas. Era para mim ! .

    ODIRETORMas tudo isso e narrativa, rneus senhores !o FILHO (com desprezo)Claro que e! Literatura! Literatura!

    OPAlQualliteratura, qual nada 1Isso e vida, senhores, paixao !

    383

    ,

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    OPIRETOR, Sera. Mas irrepresentavel !

    OPAlDe acordo, porque todos esses sao fatos anteriores. Eunao digo que se represente isso. Como ve (indica a En-teada), ela nao e mais aquela garotinha, com as tranci-nhas ('elo ombro .. '. .

    AENTEADA... e as calcinhas abaixo da saia !

    OPAI'f, (E agora que 0 drama comeca !Complexo. .. novo ...',1- ,,\.: ',:

    A 'ENTEADA'(sombria, aliiv~~adiantando-se)'\ - - " ~"~ " " J . .., Assirn'que meu pai inorreu,' .. .' , ",

    "f' t.. .): 1, ,: \ , , ') , ; '.~ i I ".,[:,,"

    I :' I ' "i

    ,. :I,,~1 : . ,O. PAl(rap'idp, para niio lhe,dar tempo defalar)"', .. " a .miseria, senhor l VoItam para ca, sem eu saber.,'(Portolice dela. (Indica a Miie.) Mal sabe escrever, maspodia+mandar a'filha ou aquele rapaz escrever-rne di-., ,\ , .zendo que estavam passando necessidades!

    A MAEDiga-me, senhor, se eu podia adivinhar nele todos essessentimentos.

    'IOPAl

    Esse foi justamente 0seu erro: niio ter nunca adivinhado, nenhum dos meus sentimentos ! '

    384

    'I'"

    , '

    " ,

    , ., Iit 1 A MAE

    Depoisde tantos anos de afastamento e depois de tudoo que aconteceu ... " ; .'~

    OPAl ,I,Que culpa tenho eu se aquele homern levouvoces emboraassim, sern mais nem menos? (Ao Diretor) Foi como Ihedigorde urn dia para outro, porque tinha encontrado naosei que emprego, fora daqui. Nao me foipossivel seguir-lhes 0 rastro e entao, e logico, fui-me desinteressando,Durante tantos anos! 0 drama estoura,' senhor,' impre-. . . , . Ivisto e violento, com a volta deIes, quando eu, levado- aide mim! - pela miseria d a minha" carneaindaviva. .. Ah! rniseria, ~erdadeira rniseria 'para urn ho-mem solitario que niio tenha querido liga~oe~ aviltantes;niio tao velho ainda que possa passar sem mulher, e naomais tao jovem que Ihe seja possfvel, facilmentee semenvergonhar-se, andar it procura delas! Miseria? :_:::_ue, " , " . , r , ' , . , . , ~ . digo! horror, horror; porque muIher alguma pode marsdar-lhe amor. - E, quando seccmpreende isto, se'deve-ria' desistir ;' de vez . ' ... Qual.".. Senhor, cada qual' se"veste com a suadignidade' por fora, diante'dos outros;mas dentro de si saIJe multo bern tudo de' inconfessavelque se passa no seu Intimo. Cedemos, cedemos it tenta-c;:ao,para reerguer-nos logo depois .:.:: .: .Deus sabe como!, - com grande pressa de recornpcr, inteira'e solida, coI?oqu em" poe uma pedra sobre u r n tumuto, a nossa digni-dade; 'que' esconde e sepulta aosnossos proprios oIhos'todo sinale ate mesmo a lembranca da vergonha! E as-sim com todos! o que falta e'apen'as a coragem de dizercertas coisas !

    AENTEADAPorque a de faze-las depois, todos a tern!

    '""

    385

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    " " 1, IOPAl , i ,

    Todos! Mas, escondido! E por isso e preciso maior cora- " 1; "gem para dize-las !Porque basta que urn as diga e - :;~',pronto! - grudam-lhe 0 rotulo de cinico, No entanto, ,', ~nao e verdade, senhor: e como todos os outros; melhor ' I Italvez, melhor, porque nao tern medo de, descobrir, com ,'"a luz da .inteligencia, 0,rubor da vergonha la no fundo ,da bestialidade humana que fecha sempre os olhos para " , jnao ve-lo, E a mulher ~ sim -, a mulher, em verdade,como e?" Olha-nos, provocadora, convidativa... E ,,~,quando 'a agarramos, mal a apertamos contra nos, fecha L , I'logo os oihos. Eo 'sinal da sua submissao. 0 sinal comque diz ao homem: "Fica cego; eli estou cega !"

    "AENTEADA'E quando n~o os fecha mais'IQuando nao sente mais I"

    , ~ nece,~,sida?e de eS,co~~~r de si . propria,fechando os ' , I , i.olhos, 0 rubor da sua vergonha e, em vez disso, ve, com tolhosag6riiaddose im'passiveisl 0 rubor do homem que, \', ~"m~sr;.o sem lunor,'ficou c~go?' Ah ! que, asco entao, que';" ~nojofidl:~:}ofi'd,as,es~~scomplicacoes intelectuais, de ~oda '{,essa 1 oso ra que descobre a besta e depois quer salva-la, Iidesculpa~la,:< . " Nao, posse ouvi-lo, senhor (Porque,

    I" '. ""_." '\. I, . ' .,, quando se econstrangido a "simplificar" a vida -,',as-I sim, be'~ti~lnie,n~e, pondo fora 0 estorvovhumano" detoda e qualquer' aspira9aocasta,' d~'todo e qualquer senti-I , r , , ' , ' \ I I,. - IJmento pur?, idealismo, deveres, 0 pudor, a vergonha ;-nada ha que provoque rnais desprezo e nausea do quecertosrernorsos: lagrirnas d~ crocodilo! ' ,

    _, '." "'... . I

    ,I :

    ODIRETORVamos aos fatos, meus senhores, vamos aos fatos! Issosao discussoes.' -i : " ii, C :

    'I "\ ' , t "86

    '(

    OPAl'Exatamente! Mas urn fato e como 'urn saco: vazio, naofica de pe, Para que fique de pe, e preciso por-lhe dentroa raziio e 0 senti men to que odeterrninaram. Eu nao po-dia saber que, morto aquele homem, e ,com eles de voltapara ca, na miseria, para atender ao sustento dos filhosela (indica a Mae) costurasse para fora e fosse justamentetrabalhar para aquela ... aquela Madama Pace!

    A ENTEADAModista fina, se os senhores querem saber. Serve, emaparencia, as melhores senhoras, mas tern tudo dispostopara que estas melhores senhoras depois a sirvarn, porsua vez, a ela . . . sem prejuizo das outras assim assim!

    A MAEAcredite, senhor, garanto-Ihe que nao me passoupela ca-,beca, nem de leve, a suspeita de que aquela megera medava trabalho porque estava de olho na rninha filha ...

    AENTEADAPobre mamae l Sabe 0 que aqueJa Madama Pace faziaassim que eu the entregava 0 trabalho de minha mae?Mandava-rne tomar nota dos vestidos que the dera paracoser e que nao estavam bern feitos, e descontava nopreco combinado... E assim, 0 senhor compreende,quem pagava era eu, enquanto esta pobrezinha pensavasacrificar-se por mim e por aqueles dois, costurando,mesmo durante a noite, a roupa de Madama Pace. ' '

    387

    , ,

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    (Gestos e exclamaciies de desprezo dosA/ores.),

    o DIRETOR' (subitamente, a Enteada)E la, urn dia, encontrou-se ...

    A ENTEADA (indicando 0Pai)... com ele, sim senhor, com ele, velho cIiente! Veraque cena para representar ! Esplendida l

    - I , . " " )OPAl'I

    '" IC o m a chegada imprevista dela, da mae ..."\ ,!: .,.. ". ", ' , .. ,''- " :'/ ;,:. '1);) f "i .

    i i'II iiI l i l,III

    : 1 ''i:1 '"

    A ENTEADA (rdpida, perfidamente)... quase a tempo!

    I,'OPAl (gritando) ',:, ";, , " "

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    AENTEADA"De nos, gente vulgar! - De qualidade, ele !Mas 0se-nhor pode ver que,todas as vezes em que ponho os olhosnele para transpassa-lo com 0 meu desprezo, outras tan- ,tas ele baixa os seus - porque sabe 0mal que me fez !'i,'o FILHO (olhando-a a custo)Eu? ....AENTEADA

    Voce, Voce! A voce devo 0 rendez-vous, meu caro avoce! (Gesto de horror dos Atores.} Impediu ou' niio,Icom a sua atitude, ja niio digo a intimidade da casa, masaquela caridade que consiste em por os hospedes a seu

    , gosto.rsern constrangimento? Fomos os intrusos que vie-.ram invadir 0 reino da sua "legitimidade"! Senhor, gos-taria de faze-lo assistir a certas cenazinhas a sos entre

    .!mim eele !.Diz :que tenho tiranizado a todos .. '.' Mas,I osenhor estavendo?Foijustamente por essa atitude sua, que me utiIizei daquilo.que ele chama de ','vii": a razao"que me permitiu entrar na sua casa com minha mae _, que e tam b e r n ma~ dele --:-como patroa!o FILHO {adiantando-se lentamente) ITodos tern born jogo, senhor. Vma partida facil: todoscontra mim. Imagine, porern, urn filho que estatranqiiila-mente em casa e ve chegar, urn bela dia, cheia de petulan-cia, assim, "de olhos no alto", uma jovem que the per-.gunta pelo pai, ao qual tern que dizer ndo sei 0 que fDepois a ve voltar, sempre com 0 mesmo ar, acompatnhada daquela pequenina ali e, por fim, tratar 0 pai

    Iquem sabe por que motivo - de um modo muito ambi-guo e "desembaraeadn", pedindo dinheiro, num tom que

    ,390

    .. '~

    'I faz supor que ele lhe. deve e que tem de da-lo, porquee sua obrigacao da-le ... ' .., \ ~

    OPAl.. e e , de fato, obrigacao minha: e para sua mae!OFILHOQue sei eu, de tudo isso? Quando a vi, senhor? Quando

    ouvi falar nela? Vejo-a vir, urn dia, em sua companhia(indica a Enteada), com aquele Rapazinho e aquela Me-nina. Dizem-me"Sabe?'E tambem sua mae". Consigoperceber pelos modos dela(indica a Enteada), 0 motivopelo qual, assim, sem maisnem: menos, de urn diaparaoutro, entraram pela cas a adentro. Senhor, 0que eu expe-rimento, 0 que eu sinto, nao posso e nao quero dizer!Poderia no maximo confia-lo, na mais absoluta reserva,mas na~ quero faz~-Io ~nem a mim mesmo, Como ve,pois, isso nao pode dar, motivo a nenhuma acao, de mi-nha parte. Creia, senhor, acredite que sou uma persona-gem njio "realizada", dramaticamente, e que estou mal,muitissimo mal, na companhia deles! Deixem-mequieto ! \ J,'o PAl I:

    Mas. . . nao pode ser! Se - justamente porque voce eassim ...

    o FILHO (comviolenta exasperaciio). . . e sabe voce como sou eu? Quando se importou co-migo? ..

    OPAlConcordo! Concordo! E esta nao e tam bern uma situ a -

    391

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    ' : ' 1 . ~ao? Esse seu isolamepto, tao cruel para mim, para suamae, que, de volta para casa, 0 ve quase pela primeiravez, ja grande, e nao 0 conhece, mas sabe que e seu fi-lho ... (Indicando a Miie ao Diretor) Esta vendo? ..choral 'I'"

    A ENTEADA (com raiva, batendo 0pe)Como uma cretina ! . .. , I '~. " l.'.1,

    OPAl (rtipido, indicando-a tam hem aoDiretor) :\,',,E ela nao pode suportar isso, e claro! ... (Volta, a refe-

    " rir-se ao F}lho;)'Quer que 0deixem de lado, diz que naoentra nisso e, no entanto, quase que e ele 0eixo da acao,)Veja aquele rapazinho que esta sempre junto da mae, as-sustado, humilhado.;. Eassim por. causa dele! Talveza situacjio mais penosa seja a sua: sente-se como se fosse

    " urn estranho, mais do que qualquer outro, e vive, coitadi-'nho, nurna: angustiosa :mortifica~ao, .por ter, sido ' aco-',' lhido, emcasa, assim,por compaixao ... (Confidencial.),i Parece-se;' em tudo, com 0: pai! Humilde, njio fala ...".i t " : :") :,J" , (I:~i'~'L ';:,o DIRE TOR ' , C ' i : " " JEh, mas, para falar a verdade, isso nao me agrada muito !o senhor nao imagina as cornplicacoes que causam ~scriancas em cena. . . " , ; \.

    OPAl ;" \Oh, mas este acaba logo com a complicacao; pode ficar.

    ", tranqiiilo. E aquela menina tam bern, que e, alem do mais,a primeira air embora. . . ;',o DIRETOR \ ,,' "6timo! Garanto-Ihe que -tudo isto me interessa. .. me

    392 \

    \

    interessa, mesmo, muito. Percebo, vejo que e assunto deque se pode tirar umbelo drama.

    A ENTEADA (tenta introrrreter-se) ,Com uma personagem como eu .!.~u!,

    OPAl (afastando-a, cheio de ansied~de pela decisiio do Di-retor)Cale a boca!

    o DIRETOR (continuando, sem fazer caso da interrup-c i io )

    Novo, sim ...OPAlOh! Novissirno, senhor !

    ODIRETORMas e preciso ter, de fato, coragem para vir po-lo dian~~de mim, desse modo ... , '

    OPAlo senhor compreende.: nascidos, como fomos, para acena. "

    ODIRETORSao amadores? !"

    OPAlNao! Digo: nascidos para a cena ... porque. . . ',;

    ODIRETOROra, deixe-se disso! 0 senhor ja deve ter represen-tado !. ..

    393

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    OPAl "I". ," :~ : " " . ' "

    Nao, senhor: somente 0que cada qual representa, no pa-pel que escolheu ou que os outros Ihe de ram na vida.E depois, em mim, e a propria paixdo '_ vejai:;: que,apenas se exalta, torna-se sernpre,' por si mesrna, urnpoueo teatral _ eomo em todos ...

    1"1'

    ODIRETOREsta bern, esta bern. Mas, meu caro senhor, eompr~en-dera que, sem 0 autor. .. _ Eu poderia apresenta-Io a' alguem , '. . ',; ,j:,:'. i I

    OPAlNao, nao, escute: seja 0 senhor!

    ODIRETOR,Eu? Mas que esta dizendo? ..

    )~ r~ ~:. r ~. : ; :) ' ;h,,~,",j,1 Sim, 0senhor, 0senhor! Po~ que nao?

    ODIRETORPorquenunca fui autor, ora essa ! '

    o PAl " : 1 . 1 , . " , , 1 ' , ,E nao 0poderia ser agora! ... Nao e preciso'n~da! ljatantos que 0 sao! E 0 seu trabalho seria ainda mais facil,porque estamos todos aqui, vivos, diante do sen~~~~., \o DIRETOR" ", , , "(\",' ,r' ' \o :A~ niio basta! ...~.:"; '\' Como njio basta? Vendo-nos viver 0 noss~' drama .. . \94

    II i

    I i; t

    ODIRETORSim, mas e preeiso, de qualquer modo, alguem que 0 es-ereva! ...

    "iI'

    OPAlNjio - que 0 transcreva, quando muito, tendo-o assim,diante de si, em acao, cena por cena. Bastara combinar,primeiro, apenas urn roteiro, e ensaiar ! I I II

    IIo DIRETOR (subindo, tentado, para 0palco)

    Hummm! 0 senhor quase, quase, me esta tentando ...Assim, por brincadeira .. , poderiamos, mesmo, experi-mentar.

    OPAlSim, sim, meu senhor! Vera que eenas surgirao l Possoindica-las ja, se quiser !

    ODIRETOREsta me tentando .. , esta me tentando. .. Vamos ~erurn poueo 0 que e que d,a ... Venha cornigo ao meuca-marim. (Dirigindo-se aos Atores.)'Yoces estao livres, porurn momento, mas nao se afastem muito. Dentro de urnquarto de hora, vinte minutos, estejam de novo aqui. (AoPai) Vejamos, vamos experimentar, Talvez eonsigamostirar disso qualquer eoisa de extraordinario .. :

    OPAlSem diivida! Sera melhor faze-los vir tambem, nao acha?(Indica as outras Personagens.)

    ODIRETORSim, sim, venham, venham. (Encaminha-se para sair,

    395

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    mas volta-se e dirige-se aos Atores.) Sejam pontuais,'.hein? Naoesquecam. Daqui a. umquarto de hora. (0Diretor sai e as Seis Personagens atravessam a cena esaem. Os a/ores, pasmados, ficam a olhar-se entre si.)o PRIMEIRO ATOR. Mas esta falando serio? ... Que quer fazer? ...

    : '\ ,1 1 1,

    OGALAIsso e doidice, e da boa! ' ..1 ;. \:

    o TERCEIRO ATORQuer fazer-nos improvisar urn drama, assim, do peparaa mao? .

    o G A L A ~ ' '!', .,1.: .. .,Nem mais, nem menos! Como' os at ores da CornmediadelI'Arte.

    l,- ,. .:' J , r ", r ". .:: ~ I ".-, ..I,',;~A PRIMEIRAfTRIZ " , . ., ., C< ''.' 'Ah l ,~e ele pensa que vouprestar-me a sernelhante pata-,,!,coact'a;"J;:~",o!' .... '.' : ; j : , . : : ~ ,~.." (: ':,.... ~(f ..'t, .I :AINGENUA ,.1 " ,... ,,'E q u e ~ a O contecornigo, tampouco.' .." ,.,. . " ,.UM QUARTO ATOR i/,.Ij

    Gostaria de saber quem siio-aquefes la, (Aludindo as Per-isonagens.) I .' \ o TERCEIRO ATOR. ',! Quem quer voce, que sejam? Doidos ou trapaceirosI

    "1 ' :1 ,, " I I

    OGALAE ele se presta a escutar 0 que dizem? ...

    A INGENUAA vaidade ! A vaidade de figurar como autor!

    o PRIMEIRO ATORContado, ninguern acredita! Se 0 teatro, meus amigos,vai reduzir-se a isso !. ..

    UM QUINTO ATORA mim, me diverte!

    o TERCEIRO ATOREh !... Afinal de contas, vejamos 0 que sai dai ...

    (E. conversando assim entre si, os A/o-res sairdo de cena: parte, pela portinha, aofundo; parte, entrando em seus camarins.opano continua levan/ado.A representacdo fica interrompida porvinte minutos, mais ou menos.)

    I ',I ,, ,1 'IJI 39 7,

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    I ' A campainha do teatro avisard que 0 es-petticulo vai recome~ar. ' " ,Dos camarins, da porta e, tambem-da

    sala voltariio para 0palco os Atores, 0As-sistente; 0 Maquinista, 0 Ponto" 0 Contra-regra e, simultaneamente, do seu camarim,o Diretor com as Seis Personagens . " "

    Apagadas as luzes da sala, 0 palco seiluminard com a mesma luz do ato ante-rior.

    o DIRETORVamos, vamos! Estamos todos aqui? Atencao, atencao !Vamos comecar ! ~ Maquinista ! 'oMAQUINIST A

    Pronto!o DIRETORMonte depress a 0 cenario da saleta. Bastam dois lateraise urn fundo com a porta. Mas depressa, por favor! .\ l

    (0 Maquinista, rdpido, vai cumprir a or-dem e, enquanto 0 Diretor combina a re-

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    ~ ~!/' , 1 ' ) II '/,i i l i l l

    i j l l l , i , l" / i ' l ll i l ' I ,1 , 1 1 1 1 1" 1 1 1 ' , 1 :, " 1 1I ' : ,; , , 1 11 / ' : :I,.j.i" '

    I ! ' I I , I"',I ' " , !/ 1 1 ' , / ;i f l ' ,

    ' l i , : 1 1 1' I I ' :'I '~ , Il fi 'i II, II I ! i :I II ,I I Ii III 'I II'I'I,I 'i:I' ,1 '1'I 'i ':i l , ;I I I !liil1 1 , 1'II 'j1 1 /

    presentaciio iminente com 0 Assistente, 0Contra-regra, 0 Ponto e os Atores, dispo_rdo aquele simulacro de cena que 0 Dire-tor determinou: dois laterais e um lundocom a porta de listras cor-de-rosa e ouro.)

    o DIRETOR (ao Contra-regra)Veja se hit urn diva na contra-regra.

    o CONTRA-REGRA, Tern, sirn senhor, aquele verde.

    A ENTK4'DA ,~'Nao, nao.Que 0 que! Verde nada! Era amarelo, de pelu-cia, com flores e muito grande. Comodissimo !;1 'j ,;t\', . ~..', ~:. " '. ) 'Iu'~\~ \,",o CONTRA-REGRA .,: "" Ah! Assim nao tern. ' , 1., ,ODIRETOR

    Mas njio importa. Ponha esse mesmo que esta ai,A ENTEADA,;

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    o DlRETOR (aoPonto)Voce, enquanto isso, pode ir para 0 seu lugar. Olhe, estee 0 roteiro das cenas, ato por ato. (Entrega-lhe algumasfolhas de pape!.) Mas agora e preciso que faca umaproeza. J.,

    o PONTOQual? Estenografar? ' _ ' \t .,',! I

    ; } f lo DIRETOR (com alegresurpresa)Oh, esplendido !Voce sabe estenografia?

    . ,'"I :',OPONTO "

    Talvez nao saiba apontar, mas estenografar ... (Dirigin-do-se a um dos Ajudantes de contra-regra) Va ao'rneucamarim e traga-me papel muito, muito ... todoo papelque encontrar,

    (0 Ajudante satra correndo .e 'voltardpouco depois, com um bom maco de fo-, lhas depapel que entregard aoPontoJ,q ,~I",,';L,\j'o DIRETOR (continuando, ao Ponto) ,

    Siga as cenas, a medida que forem sendorepresentadas,e procure esc rever as falas, ao menos as mais importan-tes. (Depois, dirigindo-se aos Atores) Voces saiam dar,por favor: Olhem, vao para aquele lado e prestem bern

    .vatencdo, (Indicard a sua esquerda.) Fiquem bern atentos!",',';',. ,.. \ ! .. -.IA PRIMEIRA ATRIZ

    .i.Mas; com licenca, nos; .'.o DIRETOR (antecipa-se):

    Nao terao que improvisar, pode ficar tranquila !402

    o PRlMElRO ATORE que temos que fazer?

    q !o DlRETOR .Nada! Fiquem ouvindo e vendo, por enquanto. Depots,cada qual tera 0 seu papel escrito. Agora vamos fazerassim, de qualquer jeito, urn ensaio. (Indicando as Perso-nagens) Eles e que 0 farjio, ' , ,o PAl (como caido das nuvens, em meio a confusiio do

    palco) , , , ' ' .?N6s? Urn ensaio? D~sculpe, mas ,0 que quer dizer .o DIRETOR "'! , 'I, ' '; ,Urn ensaio ... urn ensaio 'para eles: (Aponta as Atores.)OPAlMas, se nos somos as personagens ..

    ODIRETORSim, esta certo, "as personagens". Mas, aqui, meu carosenhor, quem representa nao sao as personagens. Que~representa aqui sao os atores. As personagens fica~ ali,no texto (indica a caixa do Ponto). .. quando ha urn

    " 1,,',1,' "

    texto!OPAl

    Precisamente! J a que nao ha e coube aos senhores asorte de te-Ias aqui;. vivas, diante de si, as persona-gens ...

    ODIRETOROra essa! E queriam fazer tudo sozinhos? Representar,apresentar-se diante do publico? . . . ',," '

    403

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    OPAlIsso mesmo ! Assim, como somos.

    ODIRETORAh! Garanto-lhes que d~riam urn belissimo ~ ; ~ ~ ~ ~ ~ ~ U l oo PRIMEIRO ATOR

    Enos entao, que 6 que ficamos fazendo aqui? . .. " " " 0 . : ,"1ODIRETOR

    Decerto njio pensam que sabem representar, nao 61 Fa-riarn rir rnuito ... (Os Atores, defato riem.) Ve? Estaorindo ! (Lembra.) A proposito, e preciso distribuir os pa-peis, (A SegundaAtriz) A senhora sera a Mae~' (Ao pai)Temos que procurar-Ihe urn nome." " ) ",": .t::

    OPAl'Amalia, senhor.

    ,\ .~ '.o DIRETOR .0 , f ':.j:: ," Mas' esse e 0 nome da sua esposa. Nao querernos cha-ma-la pelo seu nome verdadeiro. . .T,',.OPAl i : , ' " ,1 (

    E por que nao, desculpe, se e assim que se chama? Emtodo 0' caso, se deve ser a senhora ... (Indicard, comleve aceno de mao, a SegundaAtriz.) Eu vejo esta (indi-carda Mae) como Amalia. Mas 0 senhor far a como en-tender. (Cada vez maisperturbado.) Nao sei mais 0quedizer-Ihe. " Comeco ja a ouvir como se fossem falsas,com outro som, as minhas proprias palavras ...

    . \ 'I ,I,; ,~

    o DIRETOR 'I,!',Oh, mas njio se preocupe, nao se preocupe ipor. causa

    404

    disto. Nos trataremos de encontrar 0 tom justo. E, noque se refere ao nome, se 0 senhor quer "Amalia", seraAmalia, ou acharemos outro. Por enquanto, chamaremosas personagens assim. (Ao Gala) Voce, 0 Filho; (d Pri-meiraAtriz) a senhora, e claro.ia Enteada.

    AENTEADA (divertida)o que? Como? Eu, aquela ali? (Ri.)o DIRETOR (irritado)Que 6 que achou nisso para rir?

    " ": ", " 1(

    ' ..

    APRIMEIRA ATRIZ (indignada)Ninguem ousou, jamais, rir de mim ! Exijo que me respei;tern, senao vou embora ! ' "

    ,. ",1 ',,!.\, ,j ,

    AENTEADAos, nao !Descuipe, n~o ~stoujri~do da se~h'ora: I,l '.1 '\\,\ . /"1 ,:~ .'::~~Jf:o DIRETOR (d Enteada).", "" .'Devia sentir-se rnuito honrada em ser representada por

    A PRIMElRA ATRIZ (cortando,com desdem.)...... "aqueia ali". ,I, ) ".

    AENTEADANao me referi a senhora, acredite! Dizia por mim mesma,que niio me vejo, em absoiuto, nasenhcraci: e isso. Naosei ... nao .. ': nao se parece em nada comigo. ' : I

    OPAlSim, e isso: veja, senhor. A nossa expressao . ..

    405

    ,i I'llII

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    ODIRETOR'-: .. '. mas que expressao e essa! Pensam -que a terri em, 'voces mesmos, a expressao? Qual nada!

    , /'OPAlComo? Nao temos a nossa expressao? ... 1'" 'I

    o DIRETOR "" " ",\1 " !Qual, nada! Aqui ela se torna materia a qual dao ~~rp~e aspecto, voz e gesto, as atores que, nao 0 esqueca, 'ternsabido dar expressao a materia bern mais alta. A de vo-ces e tao pequena que, caso se mantenha em cena, ~';ne-rita - pode crer! - cabers inteiramente aos me~s~to-res.

    OPAl , 'c , ' '" ,I , " ' , :11"Nao me atrevo a contradize-lo. Creia, porem," q~e'(6 'urnsofrimento horrivel para nos que somos assim como nosve, com este corpo, com este aspecto. . . " I, I ,:: ,"/ .: "! .. L ! " I, t ii , " d < : )

    o DIRETOR (cortando impaciente), ''','' ,. IIsso se arranja com a caracterizacgo, da-se urn jeiio~com

    .',a rriaquilagem, meu car6"senhor, no que se refereao 'as-pecto! .. ,," ~: .:", I

    OPAl ", \, , '~ ~ :: , 'i., ,. /\ ,_ jSim, mas a voz, 0gesto ...

    ,,'j'f'!' ",f",\ODIRETOR,,,,, I ,,,1:,, I ' - v ' \Oh I"em copclusao; aqui 0 senhor, tal como e,~aopodeser! Aqui esta 0ator queo representa, e basta I . " Ii'

    OPAl ) , ,I, ,I' " t', Compreendi, senhor. E agora come co talvez a perceber406

    tambern por que 0 nosso autor, que nos viu vivos, assim,nao quis depois compor-nos para ,a cella., Njio desejo, demodo algum, ofender os seus atores, Deus me livre! Maspenso que, ver-me agora representando. " niio sei porquem ...

    o PRIMEIRO ATOR ( levantando-se com altivez e indo-Ihe ao encontro, seguido pelas ale-gres Atrizes jovens, que riem)

    Por mirn, se nao Ihe desagrada!OPAl (humilde e melifluo) , '

    Ficaria muito honrado, senhor. (Inclina-se.) Mas veja:parece-rne que, por mais que se esforce, com toda at s~aboa vontade e sua arte, em acolher-me em si . .. (Hesita,confuso.)

    o PRIMEIR6'ATOR "Acabe, acabe.(Riso das Atrizes.)

    OPAlEh! Quero dizer ... a representacao que fara, mesmopondo em pratica todos os recursos de caracterizacaopara ficar. parecido comigo ... acho que, com essa al-tura ... (todos os Atores riem) dificilmente podera serurna representacao de mim, como realmente sou. Sera,antes - pondo de parte 0 aspecto - sera, mais exata-mente, como Ihe parece que sou, como 0 senhor me sente- se e que me sente -, ,e nao como eu me sinto, dentrode mim. E acho que isto deve ser Ievado em conta porquem for chamado a julgar-nos.

    II :407

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    , , .o.DIRETOR'.'bJa esta pensando ria opiriiao dacritica? E eu,' que ainda'1; estava a escutar !Deixe que a criticadigs o que quise-,E trataremos nos de por a peca em' pe, se 0 conseguir_mos! (Afastando-se e olhando em redor) Vamos, Vamos!Ja est a pronta a cena? (Aos Atores e as Personagens)

    . 'Afastem-se, . afastern-se ! Deixem-me ver. (Desce dopalco.) Nao percamos mais tempo! (A Enteada) Achaque a cena esta bern assim? ...

    1, 1" I , ' , AENTEADA I.'i" I,Eh !." Para falar a verdade, eu aqui nao me 'encontro.

    ',/ , \ " i," ,~~i d o , ; .O'DIRETOR ,

    " , ',' : ' \ > ,' .' ''',' " "E voltamos a 'mesma tecla! Nao vai pretender que"se lheconstrua aqui, tal qual era, aquela mesma saletrqu~ asenhora conhece, no fundo da loja da Madama P~ce. (ApPai) 0 senhor disse-rne que era iima saleta' fJ~fada de, ,It)' .... , .pa~el floreado, njio foi? . . ""\'''~'

    "I,'I,

    OPAlSirn, senhor. Branca.

    , ",I,., 'i

    1\",,1 ,1~ II, I.,:').('~io DIRETOR. 'IUn!.,;,Nao e branca.ji listrada, mas pouco irnporta, Quanto aosmoveis, acho 'que' estamos mais ou. menos arranjados.Aquela mesinha, tragarn-na urn pouco mais: para ca, a[rente., .'; , . ' 1 / I : , ,' . /,~i t~I;

    I/ I.'~ i' 'I:,,'"

    , .~. (Os Ajudantes da contra-regra' 'execu-. tam aordem.) \:',.~~,.:',:l '

    "t o -' ,."/:,_ ' .1

    408

    o DIRETOR (ao Contra-regra)Enquanto isso, providencie urn envelope, se possivel. azul-claro, e entregue-o ao senhor. (Indica 0Pai.)o CONTRA-REGRA

    De carta?o DIRETOR E 0PAlDe carta, sim, de carta.o CONTRA-REGRAAgora mesmo. (Sai.)

    ODIRETOR .. ', , "Vamos, varnos l A primeira cena e da Enteada. (A Pri-meira Atriz adianta-se.) Nao, njio, a senhora espera. Re-feria-me a Enteada. (Indica a Enteada.) A senhora fiquevendo ...

    A ENTEADA (acrescentando, rdpida). ,... como eu a VIVO.t, .!

    A PRIMEIRA ATRIZ (Ressentida.) "Eu tambem saberei vive-la, njio tenho diivida, assim quea cornecar !o DIRETOR (com as mdos na cabeca)Meus senhores, vamos parar com esse falat6rio. Apri-meira cena, entao, e da Enteada com Madama Pace. Oh !(Fica confuso, olhando em redor e tornando a subiraopalco.) E essa Madama Pace? '.

    I

    1 1409

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    OPAlNao esta conosco, senhor.o DIRETOR

    E como vamos fazer? f , , 'OPAlMas esta viva - viva, ela tam bern !

    ODIRETORSim! Mas onde?

    OPAlDeixe-rne dizer-lhe. (Voltando-se pa;a as Atriz;s/S~ assenhoras quisessem fazer-rne a fineza de dar-me, por urninstante, os seus chapeus , . . ' ,,' ' '~ . .'. ~ ,;!. ,). '. ., ' ,: !' \,1r:,:;, ....

    _AS ATRIZES' (um pouco perplexes, u r n pouco rindo e m):t,,", I'-""f!~ ,;. '/ corD) . \1> . '; l . .: , :.':. 1 . o f ~ "Os chapeus? Que esta dizendo? .. , - Para que: '.. ,-Ora, vejam so! , , ,

    :', ~/ODIRETOR "Que quer fazer com os chapeus das senhoras? : ' : ' . J

    (as Atores riem.)~ j I >

    OPAl : " ,11' "

    ,'"Oh, nada demais! Pendura-los, por urn momento, nessescabides. E alguma, se for tao gentil, que tire tambern 0manto. .,

    IJiI iOS ATORES (rindo) ,o manto tambern? ',\ '..' ,I., I410

    E depois?Deve ser doido ! . . '.

    ALGUMAS ATRIZES (idem)Mas, para que?So 0manto? ..

    OPAlPara pendura-los, urn momentinho. _. Facam-rne essefavor, querem? ..

    "\

    AS A TRIZES (tirando os chapeus '~' e algumas tambem, os mantas ----:continuam a rir, indo pendu-rti-los eele'ta nos cabides)E por que nao? ' , ;cs esta l

    Mas vejam que e mesmo engracado !,Devemos po-les em exposicao'[..

    OPAlIsso! Minha senhora - exatamente isso: assim; em ex-posicao l,

    ODIRETORMas para fazero que com eles, pode-se saber? ...

    OPAlPo is njio, senhor. Talvez, preparando-lhe melhor a cena,atraida pelos proprios objetos de seu cornercio, quemsabe se nao surgira entre nos. . . (Convidando a olharempara a porta, ao fundo do palco.) Vejam! Vejam! ...

    (A porta ao fundo do paleose abre epor ela avanra, poueos tiassos, Madama411

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    Pace, megera obesa, com uma pomposaperuca de la cor de cenoura e uma rosaj1amejante ao lado, Ii espanhola. ~ofj.,,!p~n-tada, vestida com elegiincia ridicula e vul-gar, de berrante seda vermelha, traz, n~1rradas miios , um leque de plumas e, na outra,levantada, seguro entre os dais dedos, 0ci-

    'I ~ .,"garro aceso. Os Atores e 0Diretor, mala veem, fogem do palco em tropel, Isol-lando gritos de espanto, e precipitam-sepela escadinha abaixo, com 0 intuif~, 1 e , ~ ~ -capar pelo 'corredor. A Enteada,: entre-tantoicorre ao encontro de Madama Pace,humilde; como se estivesse dian te de sua

    r. 1 q IJ .patroa.) ;;;';(,A ENTEADA (correndo),,Aqui esta ela! Aqui esta ela!

    OPAl (radiante)I . q ;:).E ela l E,U[lao dizia? Caesta ela. . ",,'/o DIRETOR (dominando 0primeiro susto, indignado) J (1

    Mas que truques sao estes? ,',".,I~I

    O~PRIMEIRO ATOR (quase ao mesmo tempo)Mas onde estamos, afinal de contas?

    II'

    I"~

    o GALA (idem)De onde saiu aquela ali". " '/ I .\ "

    A INGENUA (idem) ,Elesa tinham dereserva!

    A PRIMEIRAATRIZ(idem)Mas isto e urn jogo de magica !

    412

    OPAl (dominando osprotestos)Com licenca !Por que querem estragar, em nome de umaverdade vulgar, de fato, este prodigio de uma realidadeque nasce, evocada, atraida, formada pela propria cenae que tern mais direito de viver aqui do que as senhores,porque e muito mais verdadeira que os senhores? Queatriz, entre as presentes, fara Madama Pace? Pois bern:Madama Pace e aquela! Concordarao comigo em quea atriz que a representar sera menos verdadeira do queaquela - que e ela em pessoa lOlhem: minha filha areconheceu e foi logo para junto dela. Fiquem vendo acena.

    ODIRETORE entao?

    (Resitantes, 0Diretor"e os Aiores torna-riio a subir ao palco .. , , '. " !Mas; durante 0 protesto dos A/ores e

    a resposta do Pai, a cena entre a Enteadae Madama Pace ja terti comecado em, ~~zbaixa, pianissimo, em suma, naturalmente,como nab seha' possivel que acontecessenUn1palco. De modo que, quando a s .4to-res,' clzamados I i ' atenciio pelo Pai, se vol-tam para olhar, veem Madama Pace queja terd posto uma "das miios sob a queixoda Enteada para fazii-la levan tar a cabeca,'.e percebem que ela estd falando de ma-neira absolutamente ininteligfvel. Ficampor um momento atentos. Depois, logoapos, desiludidos.)

    413

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    o PRIMEIRO ATOR~Mas que estao dizendo?

    , ' ,', ,'I,

    '., '

    A PRIMEIRA ATRIZ, ,Assim, njio se ouve nada.o GALA

    Mais alto! Maisalto !.: "iA ENTEADA (deixando Madama Pace, que sorri com um

    sorriso impagdvel, e vindo em direciio aogrupo dos Atores) , 'I"Mais alto", pois sim! Alto 0 que? Nao sao, em abso-luto, coisas que se possam dizer alto! Pude eu dize-las. ',', " \ ., ,alto para a vergonha dele (indica o Pai), que e a minha

    I vergonha! Mas, para Madama Pace, e outra coisa, se-, nhores: e a cadeia ! , ' ,',.. d : 'I ,,' t, _ . " , "

    ODIRE~ ()R '; ,,',~ '~ ',;: ,~ ,,,,,',,: , . .. ~ 'Ora essa! Ahl E assim? Mas aqui e preciso que se facam

    , ouvir, 'minha cara. senhora! Nem nos' que estamos no. . ,, .. ,"\" "\palco ouvimos! Imaginem quando estiver 0 publico no, teatro.!Epreciso fazer' a ' cena, E, alem do mais, bern quepodern falar altoentre si.porque nos nao estaremos aqui,como agora; a ' ~uv'ir.Finjam que estao a sos, num

    , quarto, na 'sal~t~, dos' fundos da loja, onde ninguem as".' : 'ouve.

    (A Ente~d~ graciosamente, sorrindo commalicia, faz 'varias vezes 0 gesto de niiocom 0 dedo.)

    ODIRETORPor que nao?

    IiI 414i- c.1

    A ENTEADA (em voz baixa, misteriosa)Ha alguem que nos ouve, senhor, se ela (indica MadamaPace) faIar alto!

    t:o DIRETOR (constemadissimo}Vai aparecer ainda mais alguem? ...

    \',

    (Os Atores estiio para iniciar nova fugado palco.) .OPAl

    Nao, nao, senhor. Refere-se ~ mini'. Devo estar a espera,la arras daquela porta, e Madama Pace '0 sabe. Po'r isso,deem-me Iicenca. you, para ficar logo no meu lugar. (En-caminha-se para aporta.)

    o DIRETOR (fazendo-o parar) ,Nao, nao, espere. Aqui e preciso respeitar as exigenciasdo teatro ! Antes que 0senhor esteja pronto .. ,.

    A ENTEADA (cortando)Ah, sim, depressa, depressa! ... Estou morrendo, garan-to-the, de impaciencia de viver, de viver esta cena. Se elequiser aprontar-se agora mesmo, eu ja estou mais quepronta!I! o DlRETOR (gritando)Mas e preciso que se faca, antes, bern clara, a cena entrea senhora e aquela ali. (Indica Madama Pace.) Quer fa-zer 0 favor de compreender isso? . /"A ENTEADAOh, meu Deus, ela me disse 0 que 0 senhor jasabe: que,

    415

    ,1

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    c,, ' , 4~: 'I . I, '",. "

    , .mais ,u~a vez, 0 trabalho de mamae esta mal feit~; qUeo vestido esta estragado e que e necessario que eu tenhapaciencia, se quero que continue a ajudar-nos, na nos samiseria.

    MADAMA PACE (adiantando-se com ardegrandei~;or_tiincia)E esto, senor, porque yo no quero aprovechar-me ...aventajar-me ...

    oDIRETOR (quase aterrorizado)o que? Como? Flila assim? .. ,"".'. /.~ ', ~ .! '

    '; , ": (i'Odos os Atores desatam ari,. jrdgoro-samente.) , , ,.., '" " :{ !, , , . .A ENTEADA (rindo tambem) !.}~i!~' 0 '" , "" ,"' " Slm, ' senhor: Fala assirn, meio espanhol, meio em' nossalingua, de urn modo erigracadissirno ! ',' , it:

    1 '~1 : IMADAMAPACE -.""1." \-Ah! No me parece de boa educaci6n que se riamde mim,si yo me esfuerco de falar su idiorna, como podo, seiior!

    ,. I~I

    ODIRETOROh, nao !Muito ao contrario. Fale assirn, fale assim, mi-nha senhora. Efeito seguro! Nao se poderia acharnada, melhor para quebrar, com urn poueo de comicidade, acrueza da situacao, Fale,fale assim! Esta otimo !' '

    A ENTEADAOtimo l E como nao? Ouvir que nos fazem, em tal lin-guagem, certas propostas. .. efeito seguro, porque pa-

    416

    IIrece quase brincadeira, sennor 1Nao ha quem fique serio,ouvindo dizer que e urn "viejo senor" que quer "diver-tir-se urn poquito contigo" - nao e verdade, Ma-dama ...

    MADAMAPACEViejito, isso mismo! Viejito, linda! Mas mejor para ti,que si no te da gusto, te traz prudencia !

    A MAE (insurgindo-se, em meio ao espanto e a consterna-ciio de todos os Atores, que niio cuidavam nelae agora saltariio, ao seu grito, para, segurd-la,rindo, pois ela, nesse meio tempo, arraneou a pe-ruca de Madama Pace e jogou-a ao chao)

    Bruxa! Bruxa! Assassina lA minha filha! , " I "

    A ENTEADA (corte; seiura aUrie) ,Nao, nao, mamae, nao l Pelo amo r de Deus! ..", .

    OPAl (corre ao mesmo tempo), ,Fique quieta, fique quieta lSente-se !

    A MAEMas tirern-na, entao, da minha frente.

    A ENTEADA (ao Diretor, que tambem acorreu)Nao e possivel, nao e possivel que marnae 'esteja aqui!OPAl (tambem ao Diretor)

    Nao podem estar juntas! E por isso - ve 0 senhor-aquela ali, quando viemos, nao veio conosco h .Estandojuntas, forcosamente se antecipa tudo, compreende? ...

    417

    ' 1 ' 1

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    ODIRETOR, Nao importa! Nao importa. Por enquanto, e como urnprimeiro esboco. Tudo serve, para que eu colha, mesmo

    I.assim, confusamente, os varies elementos. (Voltando-separa a Mile e conduzindo-a de novo ao seu lugar, parafaze-fa sen tar ) Venha, venha, minha senhora, acalme-se,acalme-se, sente-se, por favor. ' .' t . \ '~ ; : : .

    .!

    (Entretanto a Enteada vai novamente aomeio da cena e volta-se para MadamaPace.) 1 ',~ [\ t i

    ';,''. . \t~.', .: I .' \ ~AENTEADA !" Entao, Madama.varrios cornecar? ...

    , \ ~, '.: ' \. ,'.1 L , ' . , 1 I , ' , "

    MADAMA PACE (of in did a) .;!:.:i'~Ah, no! Tantas gracias! Yo aqui no me fico ni mas urnmornentito, con tua madre p~e~ente.' .;.~'.~.';~.:

    AENTEADAOra, deixe-se disso! Faca entrar esse "viejo seii6t paraque se divierta comigo". (A todos, imperiosa)' Afinal, epreciso fazer esta cena! Vamos, adiante! (A MadamaPace) A senhora, va embora. :f:.~

    MADAMAPACEAh, me voi, me voi, me voi seguramente .. i ; (Sai furiosa,apanhando a peruca e olhando com arrogiincia os Ato-res, que aplaudem,fazendo troca.)

    , . \ t., ,: I,A ENTEADA (ao Pai) ,'" J', 0 senhor faca a sua entrada. Nao precisa dar, a volta.Venha cal Finja que ja entrou. Eu fico aqui.tdecabeca

    418

    baixa - modesta! Vamos! Fale alto! Diga-rne, com voznova, como quem vern de fora. - "Born dia, senhori-nha ... "

    o DIRETOR (que jd desceu do palco)Oh, mas vejam s6! Afinal, quem e que dirige: a se-nhora ou eu? (Ao Pai, que olha surpreso e perplexo)Pode sim. Va la no fundo, sem sair e volte.

    (0 Pai executa a indicaciio, quase ame-drontado. Palidissimo, mas ja penetradopela realidade da vida, corre, aproximan-do-se do fundo, como alheio ainda aodrama queestd prestesa desabar-lhe emcima. Os Atores ficam imediatamente., . atentos a cena que comeca.)

    o DIRETOR (baixo, apressado, ao Ponto na caixa)E voce, atencao ! Aten~ao agora, para escrever !ACENA

    '.,,','

    OPAl (adiantando-se outra vez)Born dia, senhorinha.

    A ENTEADA (de cabeca baixa, com repulsa contida)Bomdia.OPAl (olha-a um pouco por baixo do chapeu que quase

    lhe esconde 0 rosto, e, percebendo que ela e aindamuito jovem, exclama; quase para si, um poucocomsatisfacdo, umpouco tambem com temor dese comprometer numa aventura arriscada)

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    ;;:.,Oh; mas .... nao e a primeira vez que vern ca, nao e ver-,- !,', dade? .. :.. . - , " , I . \ . 'A ENTEADA (como antes)

    Nao, senhor..{, '.

    " 'I,r ,

    OPAl "'Ii .iVeio alguma outra vez? (E ja que a Enteadafaesinalque sim, com a cabeca.) Mais de uma? .. (Espera urnpouco pela resposta. Torna a olhti-Ia por baixo docha-peu, sorri e depois diz) Entao? Vamos! Nao deviamaisser assim. ':. Da licencade que the tire 0 chapeu? ...

    A ENTEADA (rapida, para evitti-lo, niio con tendo a aver-sao)" . :

    Nao, senhor! Eu mesma 0 tiro! (Tira 0 chapeu, apres-sada, tremula.) .

    '! ""1 ~I ',,,

    '1, (A Mae, assistindo a cena com o Filho eos dois men ores que sao mais seus 'e per-manecem sempre junto dela, no. 'ludooposto ao dos Atores, estt i como sobre es-pinhos e acompanha com expressiies vci-,rias de doride desdem, de dnsia, de 'horror,as palavras e as acoes do Pai e da Enteada.Ora esconde 0 rosto nas moos, ora deixa,.. , escapar alguns gemidos.) .-\\ ' : ;>.". I,

    :::, ' rJ"~': ', :~ " 'A MAE, ' .Oh,' meu Deus! Meus Deus!

    " '.\ ~, . ,.}}.OPAl (ao ouvir a exclamaciio, fica como petrificado, du-

    rante um longo momento; depoistorna oJ alar como tom de antes), " ',I

    420I .

    Agora, de-me. Eu 0 penduro.: (Tira-lhe das miios 0 cha-peu.) Numa linda, numa adoravel cabecinha como a sua,eu gostaria que estivesse urn chapeu mais digno dela.Quer ajudar-rne a escolher urn, depois, entre estes aqui,da Madama? ... Nao? ..

    ; .A INGENUA (interrompendo)Eh, devagar com isso !Esses chapeus sao nossos !

    o DIRETOR (rtipido, irritadissimo) ,Silencio, com todos os diabos! Nao se faca de engra-cada ! Esta e . a cena! (Voltando-se para a Enteada)Queira continuar, por favor!

    A ENTEADA (continuando)Nao, obrigada, senhor.

    OPAl '/,'Oh, nao me diga que nao !Vai dar-me 0 prazer de ace i-ta-Io, senao, ficarei sentido: .. ha uns bern bonitos, veja!E, depois, deixaremos Madama contente. Ela os poe aquide proposito, em exposicao. " '

    AENTEADANao, nao senhor, olhe: nao poderia usa-lo.

    OPALDiz isso por causa do que pensariam em sua casa, ven-do-a voltar com urn chapeu novo? Ora, sabe como sefaz? 0 que e que se diz em casa?

    A ENTEADA (impaciente, niio agiienta~do mais)Nao e por isso. Nao poderia usa-lo porque estou ... as-

    421

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    . sim, como 0senhor me-ve l Ja podia ter notado ! (Mostra.a vestido negro.) : :'; .OPAl'Ah, de luto! Desculpe-me! E verdade: percebo, agora.Peco-lhe perdao, Acredite que estou verdadeiramenteaborrecido. . 'I:

    A ENTEADA (fazendo-se ousada e esforcando-se por ven-eer0desdem e a nausea) .' .'Basta; basta, senhor! Cabe a mim agradecer-lhe,' e niio

    . 'ao senhor,: aborrecer-se ou afligir-se. Nao faca mais caso,do que the disse, por favor. Tambem por mim, com-preende? (Tenta sorrir e acrescenta) E preciso rnesmoque eu nao me lembre que estou vestida assim. " ., .....' .

    , . t , ' . 1 r . '~

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    der! (Batendo as miios) Vamos! Vamos! A entrada! ; ...(Desce do palco, para ter a impressiio da cena.)

    'i'

    (Abre-se a porta dofundo e vem dfrenteo Primeiro Ator,l com ar desenvolto,gaiato, dum velhote galante. A representa-ciio da cena executada pelos Atores pa-rece, desde as primeiras [alas, uma coisadiferente, mas sem ter 0 ar duma parodia:parecerd, melhor, "passada a limpo ': Na-turalmente, a Enteada e '0 Poi,' niio+po-dendo reconhecer-se naquela PrimeiraAtriz e naquele PrimeiroAtor, ouvindo-os

    .'dizer as suas proprias palavras, expressa-.riio de vtirios modos, ora com gestos; oracom sorrisos, ora 'com franco protesto; aimpressiio de surpresa, de espanto, de so-frimento, etc., que eleslhe dad, con.torme,

    " . , . . 1 .se vera a seguir. Ouvir-se-d da caixa, c1ara-mente, a voz do Ponto.) "'\" I"~

    o PRIMEIRO ATOR"Born dia, senhorinha , : : "o PAl (de repente, sem poder conter-se)Oh ~ , ". .' I. ,

    ,nao.. . . (Ent"m'~tes, a Enteada,ao v ~ > l ' ; jmeiro Ator entrar daquela maneira;J~~J' l~I\I ODIRETOR (furioso)Facam silencio I E a senhora, acabe com esse ,:riso de

    ,uma vez por todas !-Assim, nao e possivel continuar ..i::1 42 4

    A ENTEADA (vindo ao proscenio) "Oesculpe, senhor, mas e naturalissirno, A senhorinha (in-dica a Primeira Atriz) esta ali, quieta em seu lugar. Mas,se ela deve ser eu, posso garantir-lhe que, ao ouvir al-guern dizer-me "born dia", daquele modo e naquele tom.desataria a rir, exatamente assim, como eu 0 fiz !

    OPAl (adiantando-se tambem, um pouco)E isso mesmo .. . 0 ar, 0 tom ...ODIRETORMas que ar! Que tom! Fiquem' de parte agora e dei-

    xem-me ver 0 ensaio.o PRIMEIRO ATOR (vindo afrente) I' ,

    Se devo representar um velho, que vern a uma casa equi-voca ... . I,', '

    I.,ODIRETORPois e! Naofacr'a caso, por favor. Recornece, que vairnuitissimo bem! (A espera de que 0 Primeiro Ator reco-mece.) Entao . . . . '. ,I,. "o PRIMEIRO ATOR

    1 "Bom dia, senhorinha ... "A PRIMEIRA ATRIZ

    "Bom dia ... ". '.

    o PRIMEIRO ATOR (reJazendo 0 gesto do Pai, de o/harpor baixo do 'chapeu, .mas -expri-mindo depois, de modo muito dife-rente, primeiro, a satisfaciio e,a se-guir, 0 temor) ; "

    42 5

    II'I

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    "Oh! Mas ... nao e a primeira vez que, vern ca ... Qual, e a sua idade? .. ",., ' , i." .'

    OPAl (corrigindo, sem poder conter-se) .; ,Naor "qual e sua idade", nao; "nao e verdade?", "naoe verdade?". . . !:. "o DlRETOREle diz: "nao e verdade" - interrogacao, ,I ~ jo PRIMEIRO ATOR (indicando 0Ponto)

    Eu ouvi: "qual e sua idade".'"!l. i I

    ,.I. . .: i.

    ODIRETOR :! II :!',I,', ""Sim, esta bern !:~Nao e verdade" ou "qual e sua idade",no fi~, d.certo~'Coniinue,eontinue. - on.e, talvez urnpouco menos afetado ... Preste atencao: eu you faze-lopara que veja como e. " (Sobe ao palco de novo.e fazo papel desde a entrada.) "Born dia, senhorinha"." ~"-. I ,I" ,, ,:' .'1' :', ; ,: '," j ":: "". ,\

    ,,\1 ",'.' ',"~ ".,), A PRIMEIRA ATRIZ"Born dia".o DlRETOR . t ' .nU~ (

    "Oh! ... Mas ... " (Dirigindo-se ao Primeiro A tor, parafazer-lhe ver 0modo como deve olhar a Primeira Atriz,sob a chapeu.) Surpresa ... temor e satisfacao '," (De-pais continua, dirigindo-se a Primeira Atriz.) "Nao e a ~primeira 'vez .que vern ca, nao e verdade?" (Voltando-sede novo para 0 Primeiro Ator, com um olhar de inteli-genciaJ Esta clara a explicacao? ... ( . 4 Primeira Atriz)E a serihora, entao: "Nao senhor". (De novo ao PrimeiroAtor) Enfirn ... como dizer ... Souplesse!

    426

    (Desce do palco.)A PRIMEIRA A TRIZ

    "Nao, senhor ... "

    o PRIMEIRO ATOR . ,"Veio algurna outra vez? mais de,u rna? ... "

    ODIRETOR , 'tNao, nao, espere! Deixe primeiro que ela (indica a Pri-meira Atriz) faca sinal que sim. "Veio algurna outravez? ... " .,i , ,I

    . "](A Prime ira Atriz levanta um pou~o a ca-

    beca, entrecerrando penosamente os olhos,~' , ,~~como por aversiio, e, depois de ouvir urn"Baixe" do Diretor, deixa cair duasvezesa cabeca.)

    ,\ I

    A ENTEADA (sem poder conter-se)Santo Deus! (E leva rapidamente uma das miios a boca,para impedir a riso.)

    o DIRETOR (volta-se)o que e?A ENTEADA (rtipida)

    Nada, nada! " II I

    ! ' ,' II

    427'I

    o DlRETOR (ao Primeiro A tor)E sua vez, e sua vez, continue:

    n .[' " . . ' "II

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    "I'I ~Ii I". .,o PRIMEIRO ATORMais de urn a? Entao? Vamos! ... Niio devia mais sera~sim ... Oil licenca de que the tire 0 chapeu? ... , < 'i,

    (0 Primeiro Ator diz esta ultima falacom tal tom e acompanhada com tal gesto,'j' >'. Ique a ' Enteada, que ficara com a miio naboca, por mais que se e sfo rc e, n ii o .c o ns e-gue conter 0 riso, 0 qual lhe 'explode 'por

    ".\". ;,' '.i ~entre os dedos, irresistivel, estrepitoso.)A PRIMEIRA ATRIZ (indignada, voltando ao seu.lugar), Ah! Nao estou aqui para me fazer de palhaca para essa,mocinha ai !, '. ..~\'~'\,', .~,i~:;~.~'.:.l~!; 'l .' !T I, ~ , \' 1 , 1 . : 1 I : " . , ' , . 1'" ! )o'PRIM~IJ~'O'ATO~: '" " ,\.,' ,' .

    I \ ~"~1,1, ,~.: ~I):);" ..\~\.\ 'f I'j" ~J! '; " / r o ' I

    Nem eu tampouco ! Acabou-se!f ',', ' . . ~,,,,, ,:I\J.~I:'I: I',' , ~;, I' '.) "1,,' i t , , I I~ I'~, (,)'Ir i[IilIi,! :,I

    IIr:)!it

    o DIRETOR (ii Enteada, berrando)Pare corn.isso ! Pare com isso !

    A ENTEADA .., "Sim, senhor - perdoe-me, perdoe-me ... ,.)" ~(.:\,o DIRETOR . . , !('i/i.lT,A senhora e uma mal-educada. Isso e que a senhora e .

    "V

    Urna presuncosa ! . . . . ,""OPAl (intervindo)'''Sim, senhor, e verdade, e verdade. Mas desculpe-a' . ..

    I," :"

    o DIRETOR (sobe ao palco) .".Quequer que desculpe? E umaindecencia!. I ':1 ,. ,, ',11 "

    428

    I,OPAlTern razao, mas creia, acredite, faz urn efeito tao estra-nho ...

    o DlRETOREstranho? Estranho .. . 0que? Por que estranho? ...

    OPAlAdmiro, senhor, admiro os seus atores: 0 senhor, ali (in-dica 0 Primeiro A tor), a senhora (indica a PrimeiraAtriz), mas, certamente... que quer?.. nao saonos ... '1 'Io DlRETOR. rEh! Acredito! Como quer que sejam "voces", se sao os

    atores? . '. ', .'OPAl

    Exatarnente, os atores! E ambos interpretam bern os nos-sos papeis. Creia, porern, que a nos nos parece outracoisa, que quer ser a mesrna e, no entanto, nao e.o DIRETOR

    Como nao e? Que e, entao? ..OPAl

    I' 'I

    Urna coisa ... que se torne deles .... e nao e rnais nossa.o DIRETOR , , ~I. \Mas e claro !Tern que ser assirn! Ja Ihe disse isso!OPAlSim, compreendo, compreendo .. .

    429

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    ODIRETORE entiio, basta! (Aos Atores) Quer dizer que faremos osensaios depois, entre nos, como devem ser feitos. Paramim, foi sempre uma maldicao ensaiar diante dos auto-res. Jamais estao satisfeitos! (Ao Pai e a Enteada) Va-mos .. , Continuemos com voces... e vejamosse epossivel que a senhora njio ria mais. ; .

    AENTEADA 1.,',Ah, nao rirei mais, niio rirei mais. Agora vern 0melhorpara mim, pode ter certeza. ,.. '"

    ODIRETOREntao, quando a senhora diz: "Nao faca mais caso, porfavor, do que the disse ... Tambem por. mim., com-preende?", (aoPai) e preciso que 0 senhor. ataque logo:"Compreendo, ah ! compreendo ... " e que pergunte ime-diatamente.

    A ENTEADA (cortando) I..Como? Pergunte 0 que?

    . ! ' . : , ~} , .

    ODIRETORo motivo do seu luto !. , ; f . >

    A ENTEADA . , .Nao, senhor, nao pode ser. Escute: quando eu lhedisseque precisava nao me lembrar que estava vestidaassim,sabe 0 que ele me respondeu? "Ah, esta bern! Entao ra-mos tirar, vamos tirar depress a esse vestidinho 1 ': . ' . ' ' : . :

    , . 1, , r, ,.'.," :',

    ODIRETORLindo! Otimo !Diz isso para mandar 0 teatro todo pelosares?' . '.J .."I I~Ii 430

    A ENTEADAMas e a verdade !

    ODIRETORQue verdade, faca-me 0 favor! Aqui est amos no teatro!A verdade, ate certo ponto! ...

    A ENTEADAOesculpe; mas que quer 0 senhor fazer, entao?ODIRETOR

    Vai ver, vai ver ! Deixe por minha conta agora! ...AENTEADA. .Nao, senhor! Da mi~ha nausea, de todas as razoes, cada

    qual maiscruel e rnaisvil do que aoutra, e quefizeramde mim "esta" que sou, "assirn" como sou, quer 0 senhortirar uma chinfrinadazinha rom antico-sentimental, emque ele me pergunta o motive d~; meu luto, e eu the res-pondo, choramingando, que h a dois meses rnorreu 0 meupapaizinho? Nao, nao, meu caro senhor. E preciso queele me diga 0 que me disse: "Entao, vamos tirar, vamostirar depressa esse vestidinho !" E eu, com todo 0 meuluto no coracao, com 0meuluto de apenas dois meses,fui para le i - esta ~endo?' '-pa~a la , atras daquelebiombo e com estes dedos que me tremem de vergonha',' . -e de nojo, desabotoei 0corpete, 0vestido ...j ~ .: > - o DIRETOR (com asmiiosnos cabelos).Pelo amo r de Deus! Que esta dizendo? ...

    A ENTEADA (gritandofrenetica)A verdade, senhor, a verdade!

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  • 5/9/2018 Pirandello_Seis personagens

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    ODIRETORSim, nao nego, sera a verdade. . . e compreendo, Com-preendo todo 0 seu horror; mas, compreenda:tainbema senhora, que tudo isso njio e possivel, em "cena! .. '.

    " .,1,.

    A ENTEADA , .',1 i:"f 1\Nao e possivel? Entao, muito obrigada. Nao entro nissoODIRETOR

    Mas, nao ... veja ... ". I IAENTEADA

    Nao entro l Nao entro! 0 que e 'po~sivel em ce'~a:v~ce~dois juntos 0 combinaram la dentro. Obrigada! Com-preendo muito bern! Ele quer chegar logo arep~~senta-

    "C;ao(aceluiiando) dos seus tormehtos espirituais; mas eu, , quero representar 0 Trieudrama! 0meu! ,';il!1't,'jhi,' e '," "/ v', , t : . . . I ," ; '~;!,+ II t) !, "~~ ' "'~'I~.1'. ) .o DIRETOR (aborrecido, movendo-se com vivacidade) )

    Oh;'enfim,o seu! Nao e sornente o seu.Hesculpe !E him-'bern o dos' outros ! 0 dele (indica 0 Pai),'o da sua'rnae !

    > ", '. I 1\.", '. ., ." Nao e possivel queuma personagern venha, assim, derna-siado a frente, e se sobreponha a s dernais.Iinvadindo acena. Epreciso mante-las todas num quadro harmoniosoe represntar 6' 'qu~ e representavel ! Eti tam bern ' sei' quecada qual tern toda uma vida dentro de si, e ' que gostaria,de exterioriza-la. Mas 0dificil e exatamente isto? exterio-rizar s6 aquilo que enecessario em rela~ao ' a o s dernais;e, 'apenas com esse pouco,fazer compreender todaa ou-tra vida que perrnanece no intimo; sem vir a " i o n a lAh!Que comodo seria,' se' cada personagem pudesse, n'umbelo monologo, ou , " sem mais n