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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA OS CRIMES HEDIONDOS E A PROGRESSÃO DO REGIME Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí. ACADÊMICA: MARJORIE DE MEDEIROS São José (SC), outubro de 2004.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

OS CRIMES HEDIONDOS E A PROGRESSÃO DO REGIME

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí.

ACADÊMICA: MARJORIE DE MEDEIROS

São José (SC), outubro de 2004.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

OS CRIMES HEDIONDOS E A PROGRESSÃO DO REGIME

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob orientação do Prof. Mestre. Jádel da Silva Júnior. ACADÊMICA:MARJORIE DE MEDEIROS

São José (SC), outubro de 2004.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

OS CRIMES HEDIONDOS E A PROGRESSÃO DO REGIME

MARJORIE DE MEDEIROS

A presente monografia foi aprovada como requisito para a obtenção do grau de bacharel em Direito no curso de Direito na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI. São José,

Banca Examinadora:

_______________________________________________________ Prof. MSc. Jádel da Silva Júnior- Orientador

_______________________________________________________ Prof. «título, se houver» «Nome» - Membro

_______________________________________________________ Prof. «título, se houver» «Nome» - Membro

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“Sobre ele repousará o Espírito do Senhor, Espírito de

sabedoria e de entendimento, Espírito de prudência e de coragem, Espírito de ciência e de temor do Senhor.” (Lc, 2, 52)

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SUMÁRIO

RESUMO LISTA DE ABREVIATURAS INTRODUÇÃO ......................................................................................................................09

1 O SISTEMA DE PENAS NO DIREITO PENAL BRASILEIRO

1.1 O CONCEITO DE PENA...................................................................................................12

1.2 A FINALIDADE DA IMPOSIÇÃO DA PENA.................................................................13

1.3 AS ESPÉCIES DE PENAS PREVISTAS NO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO............16

1.3.1 Penas Privativas de Liberdade.........................................................................................16

1.3.2 Penas Restritivas de Direitos............................................................................................17

1.3.3 Penas Pecuniárias.............................................................................................................20

1.4 OS REGIMES DE CUMPRIMENTO DE PENAS............................................................20

1.4.1 O regime fechado.............................................................................................................21

1.4.2 O regime semi-aberto.......................................................................................................22

1.4.3 O regime aberto................................................................................................................22

1.5 O SISTEMA DE PROGRESSÃO DO REGIME DE PENAS...........................................23

1.5.1 Evolução do sistema progressista de penas......................................................................25

1.5.2 A finalidade da progressão do regime de penas...............................................................26

2 ASPECTOS DESTACADOS DA LEI DOS CRIMES HEDIONDOS

2.1 O CONCEITO DE CRIME HEDIONDO..........................................................................28

2.1.1 O Conceito semântico......................................................................................................29

2.2 O TRATAMENTO DISPENSADO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 COM

RELAÇÃO AOS CRIMES HEDIONDOS...............................................................................29

2.3 CIRCUNSTÂNCIAS QUE MOTIVARAM O LEGISLADOR A ELABORAR A LEI

DOS CRIMES

HEDIONDOS..................................................................................................31

2.3.1 Fatores mediatos determinantes da Lei 8.072/90.............................................................31

2.3.2 Fatores imediatos determinantes da Lei 8.072/90............................................................32

2.4 O ROL TAXATIVO DE CRIMES HEDIONDOS E OS A ELES EQUIPÁRADOS.......33

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2.5 A INSUSCETIBILIDADE DE ANISTIA, GRAÇA, INDULTO E LIBERDADE

PROVISÓRIA...........................................................................................................................34

2.5.1 A anistia...........................................................................................................................34

2.5.2 A graça………………………………………………………………………………….35

2.5.3 O indulto..........................................................................................................................36

2.5.4 A liberdade provisória…………………………………………………………………..37

2.6 A VEDAÇÃO EXPRESSA PELA LEI 8.072/90 À PROGRESSÃO DO REGIME DE

PENAS......................................................................................................................................37

2.7 BREVE COMPARATIVO AO TRATAMENTO DO REGIME DE PENA NA LEI DA

TORTURA (LEI nº 9.455/97)...................................................................................................38

3 A INCONSTITUCIONALIDADE DA VEDAÇÃO À PROGRESSÃO DO REGIME

DE PENAS NA LEI DOS CRIMES HEDIONDOS

3.1 A RELAÇÃO DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA

PENA E A LEI DOS CRIMES HEDIONDOS........................................................................40

3.2 O PARADOXO ENTRE A LEI DE EXECUÇÃO PENAL E A LEI DOS CRIMES

HEDIONDOS...........................................................................................................................42

3.3 A POSIÇÃO DE ALGUNS DOUTRINADORES CONTEMPORÂNEOS ACERCA DA

PROGRESSÃO DO REGIME DE PENAS NOS CRIMES HEDIONDOS............................43

3.4 PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS ACERCA DA PROGRESSIVIDADE DO

REGIME DE PENAS NOS CRIMES HEDIONDOS..............................................................46

CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................................49

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................................51

APÊNDICE...................................................................................................................................56

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RESUMO

A presente monografia trata, em sua primeira parte, do sistema de penas no Direito Penal

Brasileiro, o conceito, a finalidade, as espécies de penas e regimes e a evolução e finalidade do

sistema de progressão do regime de penas. Em seguida trata da Lei dos Crimes Hediondos e

alguns aspectos destacados desta como, por exemplo, os fatores que levaram a sua elaboração, o

tratamento dispensado pela Constituição Federal de 1988 com relação aos crimes hediondos, a

insuscetibilidade de anistia, graça, indulto e liberdade provisória a estes crimes rotulados de

hediondos e a previsão expressa da vedação à progressão do regime de penas. E, por fim, tem-se

como assunto principal a inconstitucionalidade da vedação à progressão do regime de pena nos

crimes hediondos, pois, esta vedação viola o princípio constitucional da individualização da pena

e, a opinião doutrinária e jurisprudencial sobre esta controvérsia. O objetivo da presente pesquisa

é verificar se a elaboração da lei sob comento alcançou ou não a meta para qual foi elaborada, ou

seja, a contenção da criminalidade no Brasil, os benefícios trazidos pela progressão do regime

como, por exemplo, a ressocialização do condenado.

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LISTA DE ABREVIATURAS

ART. Artigo

CP Código Penal

CPP Código de Processo Penal

CF Constituição da República Federativa do Brasil

Cf Conforme

DJU Diário da Justiça da União

DOU Diário Oficial da União

HC Habeas corpus

INC. Inciso

j. Julgado em

LCH Lei de crimes hediondos

LEP Lei de Execução Penal

PROF. Professor

RA Recurso de Agravo

Rel. Relator

REsp Recurso Especial

RHC Recurso em Habeas corpus

RT Revista dos Tribunais

STF Supremo Tribunal Federal

STJ Superior Tribunal de Justiça

TJSP Tribunal de Justiça de São Paulo

TJSC Tribunal de Justiça de Santa Catarina

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INTRODUÇÃO

A presente monografia tem por objeto a investigação acerca da inconstitucionalidade da

vedação à progressão do regime prisional nos crimes elencados pela Lei 8.072/90, a Lei dos

Crimes Hediondos.

Conforme exposto neste estudo acadêmico, o texto da Lei 8.072/90 recebe sérias críticas

de seguimentos da doutrina brasileira, especialmente sobre a sua desarmonia com preceitos

constitucionais, bem como por ser uma lei elaborada e aprovada de afogadilho, pelo impulso da

emoção e para tentar resolver fatos marcantes e de repercussão sensacionalista que precederam à

sua edição.

Entre os temas intrigantes que sugerem o debate doutrinário em torno da Lei 8.072/90,

destaca-se a imposição do cumprimento da pena em regime integralmente fechado, conforme

estabelece em seu artigo 2º, § 1º.

Esta pesquisa buscará demonstrar, portanto, que o art. 2º, § 1º da Lei dos Crimes

Hediondos, ao preconizar expressamente a proibição da progressão do regime prisional, provoca

a generalização da aplicação da pena a todos os condenados por crimes ditos hediondos, em

afronta ao princípio constitucional da individualização da pena, bem como altera toda a

sistemática de execução da pena, já que a progressão do regime é garantida no artigo 112 da Lei

de Execução Penal.

Por outro lado, não se deixará de colacionar os argumentos que ainda defendem a

constitucionalidade da vedação da progressão do regime prisional, sob o fundamento de que não

há ofensa ao princípio constitucional da individualização da pena, porque se houve a elaboração

de uma lei que elenca determinados delitos como sendo de periculosidade ímpar, devem os

condenados por estes crimes serem tratados de forma mais severa.

O interesse em desenvolver a pesquisa sobre o tema da progressão do regime nos crimes

hediondos surgiu da atualidade desta controvérsia e dos estudos encaminhados pela acadêmica

com a leitura da Parte Especial do Código Penal e dos dispositivos constitucionais correlatos,

além da análise do sistema prisional brasileiro.

O objetivo específico desta monografia é reunir subsídios teóricos suficientes para um

maior esclarecimento acerca dos problemas de ordem penal e social que surgem da imposição de

uma pena em um regime integralmente fechado e a dificuldade que gera ao Estado e ao apenado

em buscar a sua ressocialização, um dos objetivos da sanção penal.

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A importância social desta pesquisa é a de permitir a toda coletividade acadêmica um

conhecimento maior sobre o assunto, expondo os aspectos positivos e negativos de tal

controvérsia, para então, ao depois, proporcionar uma discussão mais aberta e clara que este

polêmico tema impõe.

Com relação à importância científica desta monografia, o assunto em questão

oportuniza a correlação de regras e princípios constitucionais e a análise da harmonia entre a Lei

8.072/90 e preceitos constitucionais, sobretudo aqueles atinentes às garantias individuais.

A técnica de pesquisa que serve de alicerce à metodologia do presente trabalho é a

indireta bibliográfica, que envolve principalmente a pesquisa de obras e opcionalmente sites da

internet. Utilizou-se como método investigatório para a elaboração da pesquisa o método

indutivo.

O objetivo deste trabalho é analisar as espécies de penas previstas no Código Penal

Brasileiro, a sua finalidade, verificar se a doutrina e a jurisprudência vêm admitindo a progressão

do regime prisional nos crimes elencados como hediondos, bem como identificar quais os crimes

que são considerados pela Lei 8.072/90 como hediondos, especificar as vantagens trazidas pela

progressão do regime e analisar o princípio constitucional da individualização da pena, além de

abordar a garantia à progressão do regime estabelecido pelo artigo 112 da Lei de Execução Penal.

Para tanto, esta monografia foi dividida em três capítulos.

O primeiro capítulo consiste em tratar do sistema de penas no Direito Penal Brasileiro,

iniciando-se com o conceito de pena, a sua finalidade, as espécies, os regimes de cumprimento de

penas. Fala-se também do sistema da progressão de regime prisional, sua evolução e da

finalidade ressocializadora deste.

No segundo capítulo falou-se dos aspectos destacados da Lei 8.072/90 (Lei de Crimes

Hediondos), o conceito de crime hediondo, o tratamento que a Constituição Federal de 1988

dispensou à Lei dos Crimes Hediondos, os fatores que levaram o legislador a elaborar a Lei

8.072/90, bem como o rol taxativo de crimes hediondos e os a eles equiparados. Comentou-se

brevemente também sobre os institutos do indulto, da graça e da anistia, sendo estes causas

extintivas de punibilidade, bem como da liberdade provisória. Ao final deste capítulo foi exposta

a previsão expressa da vedação da progressão de regime prisional aos crimes hediondos e fez-se

um breve comentário sobre a discussão da progressão de regime após a Lei de Tortura (Lei n.

9.455/97).

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O terceiro capítulo trata da inconstitucionalidade da vedação da progressão do regime

de penas na Lei dos Crimes Hediondos e a conseqüente violação ao princípio constitucional da

individualização da pena. Trata também do paradoxo que existe acerca da Lei de Execução Penal

e a Lei dos Crimes Hediondos, pois a primeira garante expressamente o instituto da progressão de

regime de pena e a segunda veda esta garantia. Por fim, tratou-se da opinião doutrinária e

jurisprudencial acerca da problemática da progressão de regime prisional nos crimes hediondos,

sendo que a doutrina majoritária defende a inconstitucionalidade da vedação à progressão do

regime de penas e a jurisprudência ainda sustenta, majoritariamente, a tese contrária, não

concedendo a progressão aos condenados por crimes hediondos.

E, por fim, nas referências bibliográficas constam as obras que serviram de aporte

teórico para este estudo.

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1 O SISTEMA DE PENAS NO DIREITO PENAL BRASILEIRO

1.1 O CONCEITO DE PENA

Pena é a sanção imposta pelo Estado, ao fim do devido processo legal, ao autor de uma

infração penal como uma retribuição ao seu ato ilícito, além de possuir caráter preventivo (JESUS,

1998, p. 517).

A pena constitui-se num recurso elementar do Estado para tornar possível a convivência

entre os homens (ORDEIG, 1981, apud BITENCOURT, 2003, p. 65).

Para Bittencourt (2003, p.65-66) “[...]a pena é concebida como um mal que deve ser

imposto ao autor de um delito para que expie sua culpa [...] uma grave e imprescindível

necessidade social”.

Conforme PUIG (1998, apud BITENCOURT, 2003, p. 66) “[...]a pena é um ‘mal’ que se

impõe por causa da prática de um delito: conceitualmente, a pena é um ‘castigo’”.

FERREIRA (1995, p.3) cuida da etimologia do termo pena:

[...] para uns, viria do latim poena, significando castigo, expiação, suplício, ou ainda do latim punere (por) e pondus (peso), no sentido de contrabalançar, pesar, em face do equilíbrio dos pratos que deve ter a balança da Justiça. Para outros, teria origem nas palavras gregas ponos, poiné, de penomai, significando trabalho, fadiga, sofrimento e eus, de expiar, fazer o bem, corrigir, ou no sânscrito (antiga língua clássica da Índia) punya, com a idéia de pureza, virtude. Há quem diga que derive da palavra ultio empregada na Lei das XII Tábuas para representar castigo como retribuição pelo mal praticado a quem desrespeitar o mando da norma.

Mirabete (2001, p. 246), valendo-se da lição de Cernicchiaro (1970, p. 161) defende que

a pena pode ser encarada sob três aspectos, quais sejam, “[...] substancialmente consiste na perda

ou privação de exercício do direito relativo a um objeto jurídico; formalmente está vinculada ao

princípio da reserva legal, e somente é aplicada pelo Poder Judiciário, respeitando o princípio do

contraditório; e teleologicamente mostra-se, concomitantemente, castigo e defesa social”.

Soler (1970, apud MIRABETE, 2001, p. 246) sustenta que a pena “[...] é uma sanção

aflitiva imposta pelo Estado, através da ação penal, ao autor de uma infração (penal), como

retribuição de seu ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico e cujo fim é evitar

novos delitos”.

Mirabete (2001, p. 246) disserta que a pena deve atender o princípio da legalidade, além

de reunir as características da personalidade, proporcionalidade e inderrogabilidade:

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[...]O princípio da legalidade consiste na existência prévia de lei para a imposição da pena (nulla poena sine lege), previsto no art. 1º do Código Penal. A característica da personalidade refere-se à impossibilidade de estender-se a terceiros a imposição da pena. [...] Deve haver, ainda, proporcionalidade entre o crime e a pena; cada crime deve ser reprimido com uma sanção proporcional ao mal por ele causado.[...]Por fim, a pena deve ser inderrogável; praticado o delito, a imposição deve ser certa e a pena cumprida.

Conforme Dotti (2002, p. 433), a pena criminal é “[...] a sanção imposta pelo Estado e

consistente na perda ou restrição de bens jurídicos do autor da infração, em retribuição à sua

conduta e para prevenir novos ilícitos”.

E, por fim, para Noronha (2003, p.225), a pena “[...]é retribuição, é privação de bens

jurídicos, imposta ao criminoso em face do ato praticado. É expiação”.

Portanto, sinteticamente, pode-se afirmar que a pena é uma sanção que o Estado impõe ao

condenado para privar-lhe de bens jurídicos, como forma de retribuição pelo mal que causou à

sociedade, além disso, a pena reveste-se, subsidiariamente, de caráter preventivo.

1.2 A FINALIDADE DA IMPOSIÇÃO DA PENA

Conforme Noronha (2003, p. 225), o conceito de pena não deve ser confundido com a

identificação de suas finalidades.

São três as teorias que tratam da finalidade da pena, a teoria relativa, que diz respeito à

prevenção geral e especial, a teoria absoluta, também chamada de retribucionista ou retributiva e a

teoria mista ou unificadora.

Preventivo no sentido de evitar a prática de novos delitos e retributivo porque é visto

como uma ameaça de um mal contra o autor que cometeu uma infração penal (JESUS, 1998, p.

517).

Estas duas primeiras finalidades da pena estão expressas no artigo 59, caput, do Código

Penal, que dispõe:

Art. 59, caput: O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime.

Sendo assim, pode-se dizer que a pena possui uma finalidade mista, pois além de

prevenir, também reprova crime.

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No tocante à prevenção, é geral e especial. Nesta primeira “[...]o fim intimidativo da pena

dirige-se a todos os destinatários da norma penal, visando a impedir que os membros da sociedade

pratiquem crimes” (JESUS, 1998, p. 517). Já na prevenção especial “[...]a pena visa o autor do

delito, retirando-o do meio social, impedindo-o de delinqüir e procurando corrigi-lo” (JESUS,

1998, p. 517).

Noronha (2003, p. 226) disserta tanto sobre a prevenção geral, quando diz que esta

“[...]dirige -se à sociedade, tem por escopo intimidar os propensos a delinqüir, os que tangenciam o

Código Penal, os destituídos de freios inibitórios seguros, advertindo-os de não transgredirem o

mínimo ético”, como também da prevenção especial, quando sustenta que “[...]o delito é resultado

de condições endógenas, próprias do criminoso, e exógenas, isto é, do meio circuncidante”, e ainda

complementa que “[...] a pena não deve ignorar, então, a influência daquelas, e justo é assinalar

que, neste terreno, se tem avançado bastante”.

De acordo com a teoria preventiva, a pena não visa retribuir o fato delitivo, mas sim,

prevenir a sua prática e, se o castigo ao autor do delito se impõe porque este delinqüiu, conforme

sustenta a teoria absoluta, na teoria relativa a pena se impõe para que o autor do delito não volte a

delinqüir (BITENCOURT, 2003, p.75).

O Estado tem como finalidade a consecução de um bem coletivo, este não pode ser

alcançado sem a preservação do direito dos elementos integrantes da sociedade, sendo assim,

quando encontram-se em jogo direitos relevantes e fundamentais para o indivíduo e para o Estado,

e quando as outras sanções são insuficientes e falhas, o Estado intervém com o jus puniendi , isto

é, a pena, sendo esta a sanção mais enérgica que existe, pois, poderá implicar até a supressão da

vida do delinqüente (NORONHA, 2003, p. 226).

Dotti (2002, p. 434) também escreve acerca da prevenção geral quando afirma que esta

“[...]caracteriza -se pelo efeito de intimidação que a ameaça de sua imposição ou a sua aplicação ou

execução concretas possam produzir no seio da comunidade”, como também da prevenção

especial, sendo que a mesma entende-se “[...]o objetivo de evitar que o sujeito cometa novas

infrações. Trata-se de proporcionar ao condenado, através de execução da pena, caminhos opostos

à reincidência”.

De acordo com esta concepção de que a prevenção geral é tratada como medicina da

alma, para Costa Júnior (1987, p. 241) o delinqüente “[...] como um ser espiritual, dotado de

consciência e liberdade ética, tem condições de melhorar e emendar-se”.

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Segundo a teoria retributiva da pena, é atribuída a ela, exclusivamente, a difícil

incumbência de realizar a Justiça, pois, a pena tem como fim fazer Justiça, nada mais, e a culpa do

autor deve ser compensada com a imposição de um mal, que é a pena (BITENCOURT, 2003, p.

68).

Noronha (2003, p. 226), contudo, sublinha que “[...] já não se admite exclusivamente a

sanção como retributiva – o mal da pena ao mal do crime – mas tem-se em vista a finalidade

utilitária, que é a reeducação do indivíduo e a sua recuperação”.

Sustenta Mirabete (2000, p. 22) que para as teorias absolutas (retribucionistas ou de

retribuição) “[...] o fim da pena é o castigo, ou seja, o pagamento pelo mal praticado. O castigo

compensa o mal e dá reparação à moral, sendo a pena imposta por uma exigência ética em que não

se vislumbra qualquer conotação ideológica”.

A idéia retributiva da pena fundamenta-se em bases psicológico-existenciais e, para Costa

Junior (1987, p. 240) “[...] já que as forças instintivas necessitam ser controladas, sempre que se

apresente uma ruptura do equilíbrio intra-psíquico, aplica-se a pena”.

Para Bettiol (2000, p. 634) pode-se dizer que a idéia de retribuição “[...] é própria de todo

tipo de civilização que não renegue os valores supremos e se ajuste às exigências espirituais da

natureza humana”.

Na sua essência, a pena nada mais é do que um mecanismo de defesa em face de um

conflito interior.

De acordo com a teoria absoluta, a pena tem uma finalidade de retribuição, visando à

restauração da ordem atingida e, para esta teoria, todos os demais efeitos da pena (intimidação,

correção, supressão do meio social) nada têm a ver com a sua natureza e a sua conseqüência é que,

somente dentro dos limites da justa retribuição é que se justifica a sanção penal (CARVALHO

NETO, 2003, p. 20).

Outra teoria acerca da finalidade da pena é a teoria mista ou unificadora que tenta agrupar

num conceito único os fins da pena, bem como recolher os aspectos mais destacados das teorias

absolutas e relativas.

Esta teoria unificadora parte da crítica às soluções monistas, ou seja, às teses sustentadas

pelas teorias absolutas ou relativas da pena, defendendo que “[...] essa unidimensionalidade, em

um ou outro sentido, mostra-se formalista e incapaz de abranger a complexidade dos fenômenos

sociais que interessam ao Direito Penal, com conseqüências graves para a segurança e os direitos

fundamentais do homem” (BITENCOURT, 2003, p. 82 -83).

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Este é um dos argumentos básicos que ressaltam a necessidade de se adotar uma teoria

que reúna a pluralidade funcional da mesma.

Esta teoria mista, adotada pelo sistema penal brasileiro, reúne como finalidades da pena a

retributiva, a preventiva e a ressocializadora. Ressocializadora, também chamada de medicinal,

conforme Callado de Oliveira (2003, p. 4) visa a recomposição da cidadania do apenado, de modo

a fazê-lo retornar ao convívio social com a compreensão de seu papel na sociedade.

1.3 AS ESPÉCIES DE PENAS PREVISTAS NO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO

As espécies de penas existentes em nosso ordenamento jurídico são três, e estão

dispostas no art. 32, caput, do Código Penal Brasileiro, in verbis:

Art. 32: As penas são: I – privativas de liberdade; II – restritivas de direitos; III – de multa.

Cabe falar sobre os aspectos gerais das três espécies de penas.

1.3.1 As penas privativas de liberdade

As penas privativas de liberdade estão divididas em reclusão e detenção e devem ser

cumpridas no regime fechado, semi-aberto e aberto e estão previstas no art. 33 e ss. do Código

Penal.

Dispõe o art. 33, caput, do Código Penal Brasileiro:

Art. 33: A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado.

Estabelece a Lei Penal que o regime inicial de execução da pena privativa de liberdade é

estabelecido na sentença de condenação, com observância do art. 33 e seus parágrafos do Código

Penal (MIRABETE, 2000, p. 296).

Com relação à natureza jurídica da pena privativa de liberdade, esta vem presente em

seu próprio nomen juris, ou seja, é aquela que retira do condenado de uma forma mais rígida, o

seu direito à liberdade. Para Noronha (2003, p. 234) “[...] é a que restringe, com maior ou menor

intensidade, a liberdade do condenado”.

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Caso condenado o agente, o juiz deverá atender a estes dispositivos do art. 33, caput, do

Código Penal, que dizem respeito à natureza e à quantidade da pena como também à reincidência.

A pena de reclusão diferencia-se da de detenção não só quanto à espécie de regime, mas

também com relação ao estabelecimento penal de execução, que será de segurança máxima,

média e mínima, à seqüência de execução no concurso material (art. 69, caput do CP), à

incapacidade para o exercício do pátrio poder (art. 92, inc. II do CP), à medida de segurança (art.

97, caput do CP), à fiança (art. 323, inc. I do CPP) e à prisão preventiva (art. 313, inc. I e II do

CPP).

1.3.2 Penas restritivas de direitos

O artigo 43 do Código Penal Brasileiro estabelece as espécies de penas restritivas de

direitos, in verbis:

Art. 43: As penas restritivas de direitos são: I – prestação pecuniária; II – perda de bens e valores; III – (vetado); IV – prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas; V – interdição temporária de direitos; VI – limitação de fim de semana.

De acordo com o artigo 44 e incisos do Código Penal, as penas restritivas de direitos

têm como características serem substitutivas, pois visam afastar as penas privativas de liberdade

de pequena duração, gozam de autonomia, pois têm características e forma de execução próprias.

Além disso, a pena substituída deve ser inferior a um ano ou resultante de crime culposo e, nos

crimes culposos, cuja pena privativa de liberdade seja igual ou superior a um ano. A substituição

pode ser feita por duas restritivas de direitos, se exeqüíveis simultaneamente, ou conjuntamente

com a de multa, também, exigem como condição objetiva que o réu não seja reincidente em

crime doloso e, para haver a substituição, também devem ser examinados os elementos subjetivos

juntamente com as condições objetivas anteriores.

A prestação pecuniária consiste no pagamento de dinheiro à vítima, a seus dependentes

ou a entidade pública ou privada com destinação social e de importância fixada pelo juiz da

condenação.

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No entanto, a finalidade desta sanção para Bitencourt (2003, p. 460), segundo a dicção

do texto legal, “[...] é reparar o dano causado pela infração penal”.

Por disposição expressa no Código Penal Brasileiro (art. 45, § 1º), não poderá ser

inferior a um salário mínimo nem superior a 360 vezes esse salário.

Nesse sentido, para Mirabete (2001, p. 269), de forma sumária, “[...] deve o juiz fixar o

quantum da reprimenda com base apenas nos dados disponíveis no processo”, uma vez que não

existe previsão legal específica de procedimento para se calcular o prejuízo que resultou da

prática daquele crime.

Dispõe ainda o § 2º do art. 45 do Código Penal que, se houver aceitação do beneficiário

a prestação pecuniária poderá constituir-se, por decisão judicial, em prestação de outra natureza,

como, por exemplo, o fornecimento de cestas básicas e é obrigatória a consulta ao beneficiário

pelo juiz da execução, para que se efetue a referida substituição.

A perda de bens e valores consiste, nos termos do art. 45, § 3º do Código Penal, no

confisco em favor do Fundo Penitenciário Nacional de quantia que pode atingir até o valor

referente ao prejuízo causado ou do provento obtido pelo agente ou por terceiro, em conseqüência

da prática do crime, prevalecendo aquele que for maior.

Escreve Mirabete (2001, p. 269) que a lei ressalva a “[...] destina ção diversa que lhe for

dada pela legislação especial, como por exemplo, os previstos no art. 41 da Lei nº 6.368/76 e no

art. 1º e seu parágrafo único da Lei nº 8.257/91”. E também é sublinhado que tais bens e valores

serão destinados, com preferência, ao lesado ou ao terceiro de boa-fé, conforme dispõe o art. 91,

inc. II do Código Penal Brasileiro ao tratar do confisco.

Para Bitencourt (2003, p. 462) a perda de bens e valores trata-se, na verdade, “[...] da

odiosa pena de confisco, que, de há muito, foi proscrita do Direito Penal moderno”.

No tocante a prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas esta consiste

na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado (art. 46, § 1º) e, compreende ela na prestação

social alternativa, admitida pela Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, inciso XLVI, alínea

“d”.

Conforme Jesus (1998, p. 529), as tarefas deverão ser atribuídas, nos termos do § 3º, do

artigo 46, do Código Penal, “[...] conforme as aptidões do condenado, devendo ser cumpridas

durante oito horas semanais, aos sábados, domingos e feriados ou em dias úteis, de modo a não

prejudicar a jornada normal de trabalho”.

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Com relação à interdição temporária de direitos, prescreve o artigo 47 do Código Penal

Brasileiro, in verbis :

Art. 47: As penas de interdição temporária de direitos são: I – proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo; II – proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público; III – suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo; IV – proibição de freqüentar determinados lugares.

Na lição de Bitencourt (2003, p. 475), das modalidades de penas alternativas “[...] essa

é, sem dúvida, a que maior causa impacto na população que recebe, com certo gosto, a

efetividade da Justiça Penal”.

Deve-se ressaltar que a proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública não

se confunde com a perda de função pública, cargo ou atividade, que constitui efeito específico da

condenação (art. 92, inc. I do Código Penal).

Da mesma forma, a suspensão de autorização ou habilitação para dirigir veículo não se

confunde com a inabilitação para dirigir veículo, este, efeito específico da condenação por delito

doloso (art. 92, inc. III do Código Penal).

No tocante à proibição de freqüentar determinados lugares, já inscrita no Código Penal

como uma das condições obrigatórias do sursis especial (art. 78, § 2º), sustenta Mirabete (2001,

p. 274) que a pena não poderá ser aplicada de forma genérica ou imprecisa e “[...] o juiz deverá

especificar expressamente na sentença quais os lugares que o sentenciado não pode freqüentar”.

E, por fim, sobre a limitação de fim de semana, segundo Mirabete (2001, p. 275),

consiste “[...] na obrigação de permanecer, aos sábados e domingos, por cinco horas diárias, em

casa de albergado ou outro estabelecimento adequado”, podendo ser ministrado aos condenados

durante essa permanência cursos e palestras, ou atribuídas a eles atividades educativas (art. 48,

parágrafo único do Código Penal).

Portanto, como se vê, a finalidade das penas restritivas de direitos é fracionar as penas

privativas de liberdade de curta duração e, para Bitencourt (2003, p. 466), “[...] a intenção de

evitar o afastamento do apenado de sua tarefa diária, de manter suas relações com sua família e

demais relações sociais, profissionais, etc”, e tem por objetivo, impedir o encarceramento com o

inevitável contágio do ambiente criminógeno que essa instituição total produz e todas as

conseqüências decorrentes disto.

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1.3.3 Penas pecuniárias

Dispõe o art. 49, caput, do Código Penal Brasileiro, in verbis:

Art. 49: A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa.

A pena de multa ou pecuniária é uma modalidade de pena patrimonial que, para

Noronha (2003, p. 236) consiste “[...] no pagamento por parte do sentenciado, a um fund o

penitenciário, de uma importância correspondente, no mínimo de dez e no máximo de trezentos e

sessenta dias-multa”, que é calculado de modo a corresponder a um trigésimo do salário vigente

na época da sentença.

A quantidade dos dias-multa não é cominada pela norma penal incriminadora, esta só

faz referência à multa. Nesse sentido, para Jesus (1998, p. 531), esta quantidade “[...] deverá ser

fixada pelo juiz”, conforme dispõe o artigo 49, § 1º do Código Penal:

Art 49, § 1º: O valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse salário.

A pena de multa originou-se do direito germânico e, segundo Mirabete (2001, p. 284) a

vantagem desta pena em relação à privativa de liberdade consiste em não levar o apenado “[...] à

prisão por prazo de curta duração, privando-o do convívio com a família e de suas ocupações”.

Neste mesmo viés, disserta Noronha (2003, p. 236) que, condenando o indivíduo a pena

diminuta, “[...] não há tempo de submete -lo à terapêutica penal e, ao revés, só se poderá piora-

lo”, pois sabe -se que é muito mais rápida a influência nociva que traz a pena privativa de

liberdade a este condenado.

1.4 OS REGIMES DE CUMPRIMENTO DE PENAS

São três os regimes de cumprimento de penas e estão dispostos no art. 33, § 1º, alíneas

“a”, “b” e “c”, in verbis:

Art. 33, § 1º: Considera-se: a)regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média; b)regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;

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c)regime aberto a execução da pena em casa do albergado ou estabelecimento adequado.

Vale ressaltar que o regime inicial de cumprimento de pena não depende

exclusivamente da quantidade de pena fixada, mas das circunstâncias judiciais da fixação da

pena-base, estas, previstas no artigo 59 do Código Penal.

Cabe comentar as regras de cada um destes regimes.

1.4.1 O regime fechado

Estabelece o art. 34 e seus parágrafos do Código Penal:

Art. 34: O condenado será submetido, no início do cumprimento da pena, a exame criminológico de classificação para individualização da execução. § 1º O condenado fica sujeito a trabalho no período diurno e a isolamento durante o repouso noturno. § 2º O trabalho será em comum dentro do estabelecimento, na conformidade das aptidões ou ocupações anteriores do condenado, desde que compatíveis com a execução da pena. § 3º O trabalho externo é admissível, no regime fechado, sem serviços ou obras públicas.

O exame criminológico é realizado pela Comissão Técnica de Classificação de cada

presídio, que observará a ética profissional, terá sempre presentes peças ou informações do

processo e poderá entrevistar pessoas, requisitar de repartições ou estabelecimentos privados

dados e informações a respeito do condenado e realizar outras diligências e exames necessários e,

somente será realizado após o trânsito em julgado da sentença condenatória, já que visa à

individualização para a execução da pena privativa de liberdade.

No regime fechado o condenado cumpre a pena em penitenciária e estará obrigado ao

trabalho em comum dentro do estabelecimento penitenciário, na conformidade de suas aptidões

ou ocupações anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena.

Quem cumpre pena em regime fechado não tem direito a freqüentar cursos, quer de

instrução, quer profissionalizantes e o trabalho externo só é possível em obras ou serviços

públicos, desde que o condenado tenha cumprido, ao menos, um sexto da pena.

Desde que haja fundamentação expressa na sentença, o condenado tenha péssimos

antecedentes, desvio de comportamento moral, alta periculosidade, insensibilidade e perversão e

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mesmo que este seja primário e condenado a pena inferior a quatro anos, deve ficar sujeito ao

regime fechado.

1.4.2 O regime semi-aberto

Prescreve o art. 35 e seus parágrafos do Código Penal:

Art. 35: Aplica-se a norma do art. 34 deste Código, caput, ao condenado que inicie o cumprimento da pena em regime semi-aberto. § 1º O condenado fica sujeito a trabalho em comum durante o período diurno, em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar. § 2º O trabalho externo é admissível, bem como a freqüência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior.

Aos condenados ao regime semi-aberto, também se aplica as regras do art. 34, caput, do

Código Penal, qual seja submete-los ao exame criminológico.

No regime semi-aberto não há previsão para o isolamento durante o repouso noturno e

neste regime o condenado terá o direito de freqüentar cursos de instrução de 2º grau ou superior,

bem como cursos profissionalizantes.

Neste regime é o trabalho externo é admissível, inclusive na iniciativa privada, ao

contrário do regime fechado e, este trabalho externo, para Cezar Bitencourt (2003, p. 424) “[...]

pode ser o penúltimo estágio de preparação para o retorno do apenado ao convívio social. O

próximo e derradeiro passo será o livramento condicional”.

O condenado também ficará sujeito ao trabalho em comum durante o dia, em colônia

agrícola, industrial ou estabelecimento similar.

1.4.3 O regime aberto

As regras do regime aberto estão dispostas no art. 36 e seus parágrafos do Código Penal,

in verbis:

Art. 36: O regime semi-aberto baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado. § 1º O condenado deverá, fora do estabelecimento e sem vigilância, trabalhar, freqüentar curso ou exercer outra atividade autorizada, permanecendo recolhido durante o repouso noturno e nos dias de folga.

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§ 2º O condenado será transferido do regime aberto, se praticar fato definido como crime doloso, se frustrar os fins da execução ou se, não pagar a multa cumulativamente aplicada.

O regime aberto baseia-se na autodisciplina e no senso de responsabilidade do

condenado e este só permanecerá recolhido (em casa do albergado ou em estabelecimento

adequado) durante o repouso noturno e nos dias de folga.

Para Cezar Bitencourt (2003, p. 424) o maior mérito do regime aberto “[...] é manter o

condenado em contato com a sua família e com a sociedade, permitindo que o mesmo leve uma

vida útil e prestante”.

O condenado também deverá trabalhar e freqüentar cursos ou exercer outra atividade

autorizada fora do estabelecimento e sem vigilância.

Se o condenado praticar fato definido como crime doloso deverá ser transferido do

regime aberto, bem como se frustrar os fins da execução ou se, podendo, não pagar a multa

cumulativamente aplicada.

1.5 O SISTEMA DE PROGRESSÃO DO REGIME DE PENAS

O Código Penal Brasileiro, seguindo a tradição brasileira e o próprio pensamento

punitivo emergente das idéias político-filosóficas e jurídicas que prevaleceram a partir do início

do século XIX, consagrou o sistema penitenciário progressivo tratado na Parte Geral do Código

Penal, em seu art. 33, § 2º:

Art. 33, § 2º: As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso [...].

A Reforma Penal adotou o sistema progressivo de cumprimento de pena que, para

Bitencourt (2003, p. 430) possibilita ao próprio condenado “[...] através de seu procedimento, da

sua conduta carcerária, direcionar o ritmo de cumprimento de sua sentença, com mais ou menos

rigor”, faculta ao condena do ir conquistando paulatinamente a sua liberdade, ainda durante o

cumprimento da pena, de tal maneira que a pena a ser cumprida não será sempre e

necessariamente a pena aplicada.

A partir do regime fechado, que é a fase mais severa do cumprimento da pena,

possibilita o Código Penal a conquista progressiva de parcelas da liberdade suprimida.

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A progressão do regime também está garantida na Lei de Execução Penal em seu artigo

112, dispõe a lei:

Art. 112: A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e seu mérito indicar progressão. Parágrafo único. A decisão será motivada e precedida de parecer da Comissão Técnica de Classificação e do exame criminológico, quando necessário.

Capez (2003, p. 92) conceitua a progressão de regime como a “[...] passagem do regime

mais rigoroso para outro mais brando de cumprimento da pena privativa de liberdade” .

O condenado que iniciar o cumprimento de sua pena em regime fechado poderá

progredir para alcançar os regimes semi-aberto e aberto e, em seguida, obter o livramento

condicional, até a liberdade completa. Tudo dependerá de seu bom desempenho prisional

(mérito), revelador de uma provável ou suposta recuperação moral do condenado. Conforme Leal

(2003, p. 204) é “[...] afastada a tese utilitarista da pena como instrumento de recuperação,

admite-se que o mérito resulta do simples fato de que, ao cumprir parte de sua pena, sem faltas ou

infrações disciplinares, o condenado resgata parcialmente o preço de seu crime e, com isso,

adquire o direito à progressão”.

Na progressão deve-se analisar tanto o mérito do condenado, sendo este um requisito

subjetivo, como também que o condenado tenha cumprido ao menos um sexto da pena no regime

anterior, este, requisito objetivo, sendo que este condenado não poderá progredir direto do regime

fechado para o aberto, deverá passar pelo regime semi-aberto primeiro.

Neste sentido, defende Mirabete (2002, p. 359) que a progressão deve ser efetuada por

etapas, já que “[...] nas penas de longa duração, a realidade ensina que se deve agir com

prudência para não permitir que o condenado salte do regime fechado para o aberto”, por essa

razão a lei vigente torna obrigatória a passagem pelo regime intermediário (semi-aberto).

Especificamente para o ingresso no regime aberto, além do cumprimento de um sexto da

pena e pelo mérito do condenado, escreve Bitencourt (2003, p. 431) que se deve analisar se o

condenado preenche os requisitos do art. 114 da Lei de Execução Penal, ou seja, “[...] se o

apenado está trabalhando ou se demonstra a possibilidade de vir a fazê-lo imediatamente e, se

apresenta, pelos seus antecedentes e pelo resultado dos exames a que se submeteu, fundados

indícios de que se ajustará com autodisciplina e senso de responsabilidade ao novo regime”.

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A progressão do regime de pena é um instituto garantido tanto por Lei Penal quanto por

Lei de Execução Penal, sendo assim deve ser respeitada e concedida pelos operadores do Direito

a todos os condenados.

1.5.1 A evolução do sistema progressista de penas

O sistema progressista de penas foi, como vários institutos penais, fruto de uma

evolução histórica, da busca por um sistema de execução adequado ao sistema penal que surgia e

que tinha como fundamento a punição constituída na privação da liberdade do indivíduo infrator.

Diante de todas as deficiências apresentadas pelos estabelecimentos penais e da

irracionalidade na forma de cumprimento das penas privativas de liberdade, procurou-se, a partir

do século XVIII, idealizar uma nova filosofia penal que propunha aos sistemas penitenciários

corresponderem à estas novas idéias.

A evolução foi a seguinte: do sistema Filadélfia, fundado no isolamento celular absoluto

do condenado, passou-se para o sistema Auburn, que preconizava o trabalho em comum em

absoluto silêncio e então, se chegou ao sistema progressivo.

Consoante Mirabete (2002, p. 358), consistia na execução da pena em quatro estágios

“[...] o primeiro de recolhimento celular absoluto, o segundo de isolamento noturno com trabalho

e estudo durante o dia, o terceiro de semiliberdade com trabalho fora da prisão e o quarto no

livramento condicional”, este sistema progressivo ainda hoje é ad otado em algumas legislações.

Bitencourt (1993, p. 84) explica a distinção entre estes sistemas progressivos em seus

diversos matizes, pois estes “[...] procuram corresponder ao inato desejo de liberdade dos

reclusos, estimulando-lhes a emulação que haverá de conduzi-los à liberdade. E exatamente aí

está a grande diferença com os sistemas pensilvânicos e auburniano que somente pretendiam

disciplinar o regime interior das prisões e a eventual correção dos reclusos no transcurso de

tempo prefixado a sentença” .

Questiona-se este sistema nos dias de hoje, porque não poderá haver um sistema, ou

seja, um método de tratamento único para todos os condenados, por cujas etapas devam passar

todos os presos. Conseqüentemente, de um sistema único, mesmo que tenha flexibilidade na sua

aplicação, está se passando para uma fase de pluralidade de sistemas, que são determinados pela

classificação científica dos condenados a serem distribuídos em pequenos estabelecimentos

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segundo sua natureza e que prevê, para cada um deles, um regime diverso. O que se procura é

eliminar o automatismo normativo na execução da pena privativa de liberdade, embora em todos

estes regimes se adotem elementos do sistema progressivo.

No Código Penal Brasileiro de 1940 adotou-se o sistema progressivo, prevendo-se um

período inicial de isolamento absoluto por um prazo que não seria superior a três meses na pena

de reclusão, seguido de trabalho em comum durante o dia e da possibilidade de transferência para

colônia penal ou estabelecimento similar e, afinal, o livramento condicional. Com a Lei n. 6.416,

de 24-5-77, o isolamento inicial na pena de reclusão passou a ser facultativo, introduzindo-se

também o sistema de execução em três regimes (fechado, semi-aberto e aberto) e a possibilidade

do início do cumprimento nos regimes menos severos conforme a quantidade da pena aplicada e

as condições de menor periculosidade do condenado.

Já a Lei n. 7.209, excluindo o período inicial de isolamento, manteve as três espécies de

regime e determinou que as penas devem ser executadas na forma progressiva, segundo o mérito

do condenado, sem eliminar, porém, a possibilidade de ser iniciado seu cumprimento nos regimes

menos severos. Assim, não se afastando inteiramente do sistema progressivo, concede a lei

vigente modificações que se adaptam às concepções modernas. Impõe a classificação dos

condenados, faz cumprir as penas privativas de liberdade em estabelecimentos penais

diversificados (penitenciária, colônia e casa do albergado), conforme o regime (fechado, semi-

aberto ou aberto), e tem em vista a progressão o mérito do condenado, ou seja, sua adaptação ao

regime, quer no início, quer no decorrer da execução.

1.5.2 A finalidade da progressão do regime de penas

Tendo em vista a finalidade da pena de reinserção ou integração social, o processo de

execução, baseado na progressão do regime da pena deve ser dinâmico e sujeito a mutações

estabelecidas pela resposta do condenado ao tratamento penitenciário.

Com Fillipo Grammatica, Adolfo Prins e Marc Ancel, toma vulto a Escola do

Neodefensismo Social ou a Nova Defesa Social, aonde se buscou instituir um movimento de

política criminal humanista, que se funda na idéia de que a sociedade apenas é defendida à

medida que se proporciona a adaptação do condenado ao meio social, esta é a chamada Teoria

Ressocializadora.

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A Teoria Ressocializadora além der ser a finalidade do sistema progressista do regime

de pena é também a finalidade da pena.

Algumas Constituições modernas atribuem à pena o fim de reeducação, ressocialização

ou reinserção social do condenado, como na Itália de 1947 (art. 27, segunda parte) e na Espanha

de 1978 (art. 25, nº 2) e para René Ariel Dotti (2002, p. 434) “[...] a esperança de que a pena

alcance o fim de recuperação social do infrator, além das exigências de reprovação e prevenção

do crime, é expressamente consignada no Código Penal Português de 1982”.

Escreve Mirabete (2002, p. 23) que a idéia de reeducação ou ressocialização “[...]

termina por sujeitar o condenado ao Estado por tempo indeterminado e, portanto, ao arbítrio,

motivo pelo qual os totalitarismos sempre optaram pela defesa social, e não pela retribuição”,

pois o Estado Democrático não pode impor ao condenado os valores predominantes na sociedade,

mas sim, apenas propô-los ao recluso e, este terá o direito de refuta-los, se entender o caso de não

conformar-se ou de recusar adaptar-se às regras fundamentais coletivas.

A afirmação de que é possível, mediante cárcere, castigar o delinqüente, neutralizando-o

por meio de um sistema de segurança e, ao mesmo tempo ressocializá-lo, já não se sustenta,

exigindo-se a escolha de novos caminhos para a execução de penas, principalmente no que

concerne às penas privativas de liberdade, devendo-se, então, aplicar o sistema progressista,

sendo este garantido pela Lei de Execução Penal.

Sendo assim, entende Mirabete (2002, p. 23) que “[...] a idéia central da ressocialização

há de unir-se, necessariamente, o postulado da progressiva humanização e liberação da execução

penitenciária”, de tal maneira que, ao serem assegurad as as medidas como permissões de saída,

como o trabalho externo e os regimes abertos, terem elas uma maior eficácia.

A tendência moderna é de que a execução da pena deve estar programada de molde a

corresponder à idéia de humanizar, além de punir.

Como visto, a finalidade do sistema progressista de pena tem como base a idéia de

reinserção social, tem o escopo de reeducar, ressocializar o condenado para que este retorne ao

convívio da sociedade de uma maneira mais digna e mais humana, tendo a sua recuperação uma

maior eficácia.

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2 ASPECTOS DESTACADOS DA LEI 8.072/90

A elaboração da Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos) trouxe certas peculiaridades e

controvérsias, como, por exemplo, a dificuldade de se chegar a um conceito de crime hediondo,

pois, o legislador brasileiro não adotou nenhum critério técnico-científico para definir os crimes

hediondos, além disso, previu a vedação a institutos e garantias reconhecidos pelo Direito Penal

Brasileiro.

2.1 O CONCEITO DE CRIME HEDIONDO

A Lei de Crimes Hediondos não criou novos tipos penais mas selecionou da legislação

penal já existente alguns tipos penais e os caracterizou com o adjetivo hediondez.

Trata-se de um critério puramente formal, que utilizou um procedimento de simples

colagem, “[...]no entanto, ess e critério meramente formal é inaceitável, porque parte de uma

premissa cientificamente falsa, ao presumir que as condutas assim rotuladas legalmente carregam

necessariamente em suas entranhas o caráter da hediondez indiscutível” (LEAL, 2003, p. 39).

Este critério adotado pela lei positiva de especificar certos crimes como hediondos “[...]é

conseqüência de pura e equivocada conveniência de política criminal praticada em certo

momento, como expressão categórica do poder discricionário estatal” (LEAL, 2003, p . 40).

Alberto Silva Franco (2000, p. 45) defende que o legislador ordinário não se preocupou

em traçar linhas mestras desta figura criminosa e sim “[...]optou pela pura e simples rotulação de

tipos preexistentes: o crime é hediondo porque faz parte do elenco enumerado na lei, e não

porque apresenta características próprias, devidamente explicitadas”.

Nota-se que a doutrina predominante sustenta que a caracterização destes crimes como

hediondos foi uma conveniência de política criminal, bem como uma rotulação de crimes

colhidos no Código Penal Brasileiro e na legislação penal extravagante e, por isso, não

apresentam características próprias.

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2.1.1 O conceito semântico

No sentido semântico, hediondo é aquele crime que causa repugnância, aversão, repudio

pela sociedade em geral e, por conseqüência, presume-se que o indivíduo que o pratica possui um

maior grau de periculosidade.

Para Acquaviva (2000, p. 429-430) o vocábulo hediondo “[...]deriva do latim hoedus,

bode, vale dizer, em sentido figurado, fétido, malcheiroso, [...]. Daí, o espanhol hedor, em

português, fedor”.

Conforme Leal (2003, p. 37) o termo hediondo representa “[...]um ato profundamente

repugnante, imundo, horrendo, sórdido, ou seja, um ato indiscutivelmente nojento, segundo os

padrões da moral vigente”.

A idéia que se extrai do conceito semântico de crime hediondo é de que existem certas

condutas que se revelam como a antítese extrema de certos padrões éticos de comportamento

societário e de que aqueles que os praticam, ou seja, os autores destes crimes, são portadores de

grande perversidade e periculosidade (LEAL, 2003, p. 37).

Para Antônio Lopes Monteiro (1992, p. 17) um crime seria hediondo “[...]toda vez que

uma conduta delituosa estivesse revestida de excepcional gravidade, seja na execução, quando o

agente revela total desprezo pela vítima, insensível ao sofrimento físico ou moral a que a

submete, seja quanto à natureza do bem jurídico ofendido”.

Pode-se dizer, portanto, que hediondo é aquele crime que causa uma intensa

repugnância, porque ofende de forma grave os valores morais de indiscutível legitimidade,

valores estes passíveis de manipulação pelos segmentos dominantes da sociedade.

2.2O TRATAMENTO DISPENSADO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 COM RELAÇÃO AOS CRIMES HEDIONDOS

O legislador constituinte de 1988 introduziu no artigo 5º da Constituição Federal o

inciso XLIII, que prescreve:

“[...] a lei considerará inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática de tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evita-los, se omitirem”.

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Portanto, o constituinte vedou a todos aqueles que praticarem os crimes previstos neste

dispositivo constitucional a garantia processual da fiança, da liberdade provisória, da graça e da

anistia.

A tortura, o terrorismo, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e os crimes

hediondos, de acordo com a aferição do legislador constituinte “[...] representavam les ões graves

a bens jurídicos de inquestionável dignidade penal e que estavam necessitados da tutela penal”

(FRANCO, 2000, p. 75).

A partir deste dispositivo constitucional criou-se duas categorias de crimes hediondos:

aqueles que a Constituição Federal considerou expressamente em seu texto, denominados crimes

hediondos constitucionais, e os que foram definidos pela lei ordinária, chamados de crimes

hediondos ordinários ou comuns.

Guardando a mesma simetria estabelecida no inc. XLIII do art. 5º, da Constituição

Federal, “[...]a Lei 8.072/90 estendeu às figuras típicas do terrorismo, da tortura e do tráfico

ilícito de entorpecentes e drogas afins, as restrições mencionadas na regra constitucional”

(FRANCO, 2000, p. 109).

O art. 5º, inc. XLIII, da Constituição Federal ainda prevê que, pelos delitos enunciados,

deverão responder os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.

Para Alberto Silva Franco (2000, p. 76), no que se refere aos mandantes e executores,

estes responderão pelo crime por subsumirem-se à conduta ativa do tipo penal descrito na norma.

Já com relação à conduta omissiva, consistente em deixar de fazer uma conduta que lhe era

possível e exigível, entretanto, ressalta o autor que nem sempre é deixando de se fazer algo que se

caracteriza uma ação criminosa. É necessário algo mais e, para Franco (2000, p. 77), esse poder

fazer algo que não foi feito para evitar a prática delituosa “[...] só terá interesse de conotação

penal, quando é também imposto, ao emitente, o dever fazer algo para obstar a concretização

delituosa”, pois a omissão só tem relevância penal, quando o emitente podia e devia agir para que

o resultado fosse evitado.

A Lei 8.072/90 surgiu para atender o dispositivo constitucional sob o foco e especificar

quais seriam os crimes hediondos e estes crimes não sofreram qualquer modificação na sua

estrutura típica, conservando os mesmos elementos normativos. A referida lei apenas majorou o

mínimo legal das penas cominadas a estes crimes e deu-lhes um tratamento punitivo mais grave.

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2.3 AS CIRCUNSTÂNCIAS QUE MOTIVARAM O LEGISLADOR A ELABORAR A LEI

DOS CRIMES HEDIONDOS

2.3.1 Fatores mediatos determinantes da Lei 8.072/90

Vários foram os fatores político-jurídicos que levaram à elaboração da Lei de Crimes

Hediondos, entre eles destacam-se os fatores denominados mediatos e imediatos.

Parlamentares que compunham a Assembléia Nacional Constituinte de 1988 defenderam

a idéia de inserir no texto da Carta Magna que estaria por vir um dispositivo que coibisse a ação

daqueles que viessem a cometer atos de tortura por motivos político-ideológicos, ou ainda, ações

armadas contra a ordem político-jurídica vigente (LEAL, 2003, p. 27).

A proposta fundamentava-se na justificativa de que era indispensável o Estado

Democrático de Direito utilizar-se de “[...]normas jurídico -constitucionais capazes de assegurar a

efetiva estabilidade política do processo de democratização da sociedade brasileira” (LEAL,

2003, p. 27).

A meta para justificar a implementação da lei era impedir que alguns eventuais

usurpadores do poder político fossem beneficiados com leis de anistia ou decretos de indulto de

legitimidade duvidosa e “[...]em conseqüência, escapar da justa e necessária punição por crimes

que venham a praticar mediante tortura física e psicológica, perseguições políticas e atentados

reiterados à ordem político jurídica democrática” (LEAL, 2003, p. 27).

Os constituintes mais conservadores defendiam a pena de morte para os crimes mais

graves, bem como uma resposta punitiva mais rigorosa para quem cometesse atos de terrorismo.

As últimas décadas do século passado foram marcadas pelo tráfico e pelo uso

completamente abusivo e indevido de entorpecentes. Isso levou a formação de uma consciência

mais severa e punitiva em relação aos responsáveis pelo tráfico ilícito de drogas.

Isso não repercutiu somente na classe política, mas na sociedade brasileira como um

todo, que se transformou em pressão junto ao poder político, que passou a “[...]exigir medidas

preventivas de maior eficácia” (LEAL, 2003, p. 28).

Mesmo com a Lei 5.276 de 1971, que durou apenas cinco anos e foi substituída pela Lei

6.368/76, que estabeleceu um procedimento mais severo para disciplinar a ação penal contra os

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acusados da prática de tais delitos, os crimes por eles tipificados não sofreram a redução

prometida e os níveis de criminalidade continuaram a crescer e alcançar índices cada vez mais

altos, fazendo a coletividade exigir e reivindicar punições mais severas e duras. Este quadro de

medidas punitivas foi percebido por Leal (2003, p. 28-29), destacando que “[...]o mecanismo

legal de controle social foi acionado outra vez em 1990, com a aprovação da Lei de Crimes

Hediondos, sem que o problema tenha recebido o tratamento sócio-político e jurídico correto e

eficaz”.

Entretanto, passados mais de dez anos da elaboração da Lei 8.072/90 o objetivo que

justificou a sua edição não alcançou o resultado pretendido, pois a criminalidade violenta cresce

de forma geométrica e de maneira cada vez mais assustadora.

2.3.2 Fatores imediatos determinantes da Lei n. 8.072/90

Um dos principais motivos da votação e aprovação da Lei 8.072/90 foi o

conservadorismo político da maioria do Congresso Nacional.

Isso representou um grande retrocesso em face de todo processo histórico de

humanização contínua do nosso Direito Penal que foi “[...] endurecendo desnecessariamente o

sistema punitivo vigente e contrariando princípios jurídico-penais indiscutíveis, como o da

individualização e o da progressão pelo mérito do condenado na execução da pena privativa de

liberdade” (LEAL, 2003, p. 32).

A intensa violência urbana e o sentimento de repugnância que amedrontavam a

população dos grandes centros urbanos brasileiros foram fatores que contribuíram, e muito, para

a aprovação da Lei dos Crimes Hediondos.

E, sem esta sinistra realidade humana e social das duas últimas décadas “[...]

dificilmente haveria vontade e condições político jurídicas para a aprovação deste discutível e

inoportuno diploma legal” (LEAL, 2003, p.33).

Sob esta ótica, Monteiro (2002, p.4) adverte sobre o momento de pânico que atingia

alguns setores da sociedade brasileira “[...]sobretudo por causa da onda de seqüestros no Rio de

Janeiro, culminando com o do empresário Roberto Medina ”.

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Amaral (1996, p. 1) argumenta que uma das razões que levaram o legislador pátrio a

elaborar a Lei dos Crimes Hediondos foi “[...]dar uma resposta jurídico -política à onda de

seqüestros promovidos por grupos armados e tendo preferencialmente como vítimas,

personalidades do mundo empresarial e sócio-econômico nacional”.

Os meios de comunicação social, divulgando fatos de forma emocional e

sensacionalista, “[...] contribuíram seguramente para a formação de uma opinião pública

favorável a uma solução radicalmente mais severa, tanto do ponto de vista jurídico penal quanto

meramente policial” (LEAL, 2003, p. 34).

Nesse contexto, Franciny Silva (2003, p. 44) escreveu que a Lei de Crimes Hediondos

“[...]é fruto da mídia manipulada politicamente e formadora de idéias”.

Sob o impacto dos grandes meios de comunicação, os crimes de extorsão mediante

seqüestro atuaram “[...] como um mecanismo de pressão ao qual o legislador não soube resistir”

(FRANCO, 1994, p. 43-44).

Monteiro (1992, p.17) lembra que o caso Medina “[...] foi a gota d’água para a edição da

lei”.

Deste cenário não discorda Reale Júnior (1992, p. 275), quando sublinha que “[...] a lei

de crimes hediondos, aprovada de afogadilho, foi uma resposta penal de ocasião, para dar

satisfação diante do seqüestro de Roberto Medina”.

Percebendo esta compulsão social, Barbosa (1992, p. 212) observou que o agravamento

dos crimes de extorsão mediante seqüestro e, principalmente, o seqüestro contra o festejado

empresário carioca “[...] aceleraram o processo legislativo de votação do projeto que culminou

com a aprovação da lei de crimes hediondos”.

Como se vê, esta seqüência de crimes violentos, selecionados pela imprensa brasileira,

sobretudo quanto a seqüestros que tomaram São Paulo de pânico, e principalmente o Rio de

Janeiro, bem como a sua manipulação político-ideológica, foram os motivos principais para

acelerar a edição da Lei dos Crimes Hediondos. Vê-se, portanto, que a criação da lei sob o foco

não se pautou por critérios científicos, jurídicos ou de política jurídica, mas para atender a uma

pretensão política-ideológica de ocasião.

2.4 O ROL TAXATIVO DE CRIMES HEDIONDOS E OS CRIMES A ELES EQUIPARADOS

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Pela Lei 8.072/90 foram relacionados como hediondos os crimes de homicídio,

latrocínio, extorsão mediante seqüestro e na sua forma qualificada, estupro simples e qualificado,

atentado violento ao pudor simples e qualificado, epidemia com resultado morte, falsificação,

corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais e

genocídio.

A Lei 8.930/94 foi o escopo para a inclusão do homicídio na sua forma simples

praticada por grupo de extermínio, e na sua forma qualificada em todas as circunstâncias.

Os crimes equiparados aos hediondos, também chamados de crimes hediondos

constitucionais, ressaltados também no mencionado dispositivo constitucional e na própria lei,

foram o crime de tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo.

Vale ressaltar que o crime de tortura está previsto na Lei 9.455/97 e o crime do tráfico

ilícito de entorpecentes e drogas afins na Lei 6.368/76.

2.5 A INSUSCETIBILIDADE DE ANISTIA, GRAÇA, INDULTO E LIBERDADE

PROVISÓRIA

O artigo 5º, inc. XLIII, da Constituição Federal prevê que os crimes hediondos são

insuscetíveis de liberdade provisória, graça e anistia, além de considerá-los inafiançáveis.

De acordo com o art. 107, II, do Código Penal Brasileiro, a anistia, a graça e o indulto

são causas de extinção de punibilidade. A liberdade provisória, por sua vez, é uma medida

processual, de natureza cautelar, em benefício da liberdade pessoal do réu ou do indiciado no

curso do procedimento penal e é regulada pelos artigos 310 e 321 e ss. do Código de Processo

Penal.

A Lei 8.072/90, em seu artigo 2º, incisos I e II, seguindo o comando constitucional,

previu para estes crimes, bem como aos crimes a eles equiparados (tortura, narcotráfico e

terrorismo), a insuscetibilidade de anistia, graça, indulto, fiança e liberdade provisória.

Passa-se a analisar objetivamente os aspectos gerais de cada um destes institutos.

2.5.1 A anistia

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A anistia é a primeira das causas de extinção de punibilidade dispostas na Lei dos

Crimes Hediondos e o seu escopo, como expõe Aurelino Leal (1925, p. 754) “[...] é o

esquecimento do fato ou dos fatos criminosos que o Poder Público teve dificuldade de punir ou

achou prudente não punir. Juridicamente os fatos deixam de existir”.

Jesus (1998, p. 683) conceitua anistia como sendo o “[...] esquecimento jurídico de uma

ou mais infrações penais”.

Em outras palavras, o Estado, atendendo a razões de natureza político-sociais, poderá

deixar de considerar como crime determinados fatos que eram praticados durante a vigência de

uma lei que incriminava estes mesmos fatos. Nesse sentido, para Tourinho Filho, a anistia

equivale “[...] à novatio legis”.

Bitencourt (2003, p. 706) conceitua anistia como “[.. .]o esquecimento jurídico do ilícito

e tem por objeto fatos (e não pessoas) definidos como crimes, de regra, políticos, militares ou

eleitorais, excluindo-se, normalmente, os crimes comuns”.

Jesus (1998, p. 684) disserta que a anistia “[...] tem o caráter de generalidade,

abrangendo fatos e não pessoas. Em face disso atinge uma generalidade de pessoas, salvo

exceções quanto a condições especiais exigidas pela lei, p. ex., quando exige a condição da

primariedade dos agentes”.

De acordo com o art. 48, inc. VIII, da Constituição Federal, a concessão da anistia é

atribuição do Congresso Nacional, sendo que o seu efeito é ex tunc. Portanto, compete

exclusivamente ao Poder Legislativo conceder anistia.

A anistia pode ser concedida antes ou depois da condenação e extingue todos os efeitos

penais, inclusive a reincidência, contudo, permanece a obrigação de indenizar (BITENCOURT,

2003, p. 706).

A anistia, quando condicionada, “[...] pode ser recusada por aquele que não concordar

em se submeter às restrições impostas pela lei que a concedeu” (MIRABETE, 1997, p. 381).

2.5.2 A graça

A graça ou indulto individual é uma forma de clemência soberana, tem por objeto crimes

comuns e aplica-se a um indivíduo determinado, previamente condenado por sentença transitada

em julgado (BITENCOURT, 2003, p. 706). É bem por isso que a graça, em seu sentido estrito, é

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uma espécie da “[...] indulgentia principis de ordem individual, pois só alcança determinada

pessoa” (NORONHA, 1985, p. 336).

Em regra, deve ser solicitada, conforme prevê o artigo 188 da Lei de Execuções Penais,

e necessita do parecer do Conselho Penitenciário. Esta solicitação pode partir do condenado, de

qualquer pessoa do povo, pelo próprio Conselho Penitenciário ou pelo Ministério Público.

A graça representa o jus gratiandi do Presidente da República e diferentemente da

anistia, pressupõe sentença condenatória com trânsito em julgado.

A competência para conceder a graça é do Presidente da República (art. 84, inc. XII, da

CF/88) e pode ser plena (quando extinguem totalmente a punibilidade) ou parcial (quando

concede diminuição da pena ou a sua comutação – substituição da pena por outra de menor

gravidade).

Extinta a punibilidade pela graça, salvo disposição em contrário, não se executa a

medida de segurança, como dispõe o artigo 96 do Código Penal.

2.5.3 O indulto

O indulto destina-se a um grupo indeterminado de condenados e é delimitado pela

natureza do crime e pela quantidade de pena aplicada, além de outros requisitos que o diploma

legal brasileiro poderá estabelecer (BITENCOURT, 2003, p. 706).

O primeiro critério para a concessão do indulto consiste em verificar o quantum da pena

aplicada ao beneficiário, embora “[...] se exijam certos requisitos subjetivos (primariedade etc.) e

objetivos (cumprimento de parte da pena, exclusão dos autores da prática de algumas espécies de

crimes etc.)” (MIRABETE, 1997, p. 382).

Como a graça, deve pressupor uma sentença condenatória com trânsito em julgado, pois,

“[...] se refere tão só a seu efeito executório -penal” (NORONHA, 1985, p. 337).

O indulto é coletivo, espontâneo e de atribuição privativa do Presidente da República, e

também necessita do parecer do Conselho Penitenciário, que poderá ser solicitado pelo próprio

condenado, por qualquer do povo, pelo Ministério Público ou pelo próprio Conselho

Penitenciário.

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2.5.4 A liberdade provisória

Para Marques (1998, p. 119) sob o nomen juris de liberdade provisória, disciplina o

Código de Processo Penal a “[...] medida de caráter cautelar em prol da liberdade pessoal do réu

ou do indiciado, no curso do procedimento. Essa medida é admitida para fazer cessar prisão ilegal

do acusado ou para impedir a detenção deste em casos em que o carcer ad custodiam é

permitido”.

A liberdade provisória, conforme Leal (2003, p. 193), é um instituto de natureza

processual e está relacionada com a sua contra face repressiva, qual seja a prisão provisória e suas

espécies (a prisão em flagrante, a prisão decorrente da sentença de pronúncia e a de sentença

condenatória irrecorrível).

A liberdade provisória é a situação substitutiva da prisão processual, é o contraposto da

prisão processual, ou seja, se de maneira antecedente há fundamento para a prisão provisória,

“[...]esta não se efetiva ou se relaxa se houver uma das situações de liberdade provisória”

(GRECO FILHO, 1995, p. 247).

Este instituto processual pode ser definido ainda como “[...] o estado de liberdade

individual, garantido por lei ao presumido autor de uma infração criminal (indiciado ou acusado),

para defender-se solto durante a ação penal a que deverá responder, mediante determinadas

restrições, ao seu jus libertatis” (LEAL, 2003, p. 193).

Diz-se provisória, a liberdade porque esta é “[...] revogável e se encontra sujeita a

condições resolutórias de natureza e caracteres vários e, enquanto não findar o processo, aquele

que estiver no gozo de liberdade provisória continua vinculado ao processo, cumprindo as

obrigações que lhe foram impostas, sob pena de revogação” (TOURINHO FILHO, 1994, p.448).

A liberdade provisória será então, uma liberdade condicionada ao interesse público de

que a marcha do processo criminal transcorra de forma regular (LEAL, 2003, p. 194).

Acrescenta-se ainda que a liberdade provisória poderá ser concedida com fiança (art.

321 do Código de Processo Penal) e sem fiança (art. 323 e 324 do Código de Processo Penal).

2.6 A VEDAÇÃO EXPRESSA PELA LEI 8.072/90 A PROGRESSÃO DO REGIME DE

PENAS

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Dispõe o art. 2º, caput, e § 1º, da Lei 8.072/90, in verbis:

Art. 2º. Os crimes hediondos, a prática de tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de: I – anistia, graça e indulto; II – fiança e liberdade provisória. § 1º - A pena por crime previsto neste artigo será cumprida integralmente em regime fechado.

O dispositivo sob comento veda a progressão de regime de penas aos crimes hediondos e

aos delitos a eles equiparados.

Nascimento (2003, p. 1), comentando o dispositivo, escreve que para o legislador

ordinário “[...] a pena para os crimes hediondos, que estão previstos no artigo 1º da Lei 8.072/90,

será cumprida integralmente em regime fechado”.

Sustenta Franciny Silva (2003, p. 55) que o presente dispositivo “[...] proíbe, veda, a

progressão de regime aos crimes hediondos e aos crimes a ele equiparados”.

No caso de condenação pela prática de crime hediondo, terrorismo e tráfico ilícito de

entorpecentes, Capez (2003, p. 92) grifa que a Lei 8.072/90, em seu art. 2º, § 1º, proibiu aos

crimes por ela tipificados a progressão de regime, determinando “[...] que o cumprimento da pena

se faça em regime integralmente fechado, vedando a passagem ao regime semi-aberto e ao

aberto”.

Sendo assim, o legislador de 1990 criou, com a Lei de Crimes Hediondos, uma nova

forma de execução de penas, pois, segundo estabelece em seu texto, o condenado cumprirá a sua

pena em regime único, o fechado, e somente quando findar o tempo da pena ou por ocasião de

liberdade condicional retornará ao convívio social.

2.7 BREVE COMPARATIVO AO TRATAMENTO DO REGIME DE PENA NA LEI DA

TORTURA (LEI nº 9.455/97)

O § 7º do art. 1º da Lei n. 9.455/97, a chamada Lei da Tortura, determina que o regime

prisional concernente à pena privativa de liberdade aplicada ao autor de qualquer uma das

condutas rotuladas no novo tipo penal deverá ser inicialmente fechado.

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Para Franco (2000, p. 182) a redação dada pelo legislador denuncia de forma indireta

“[...]seu objetivo de aplicar, na execução da pena referente à tortura, o regime progressivo, com

suas três etapas”.

Segundo este autor, é possível a progressão para o regime semi-aberto e depois para o

aberto, pois o que o dispositivo da lei sob comento exige é que o processo de execução da pena

seja apenas iniciado em regime fechado.

Leal (2003, p. 212) argumenta que não havendo proibição expressa em contrário, “[...]a

interpretação correta do dispositivo em tela permite concluir que a progressão de regime prisional

pode ser concedida ao condenado pelo crime de tortura”.

Por força deste novo comando normativo, alguns autores passaram a interpretar que este

dispositivo da Lei de Tortura deveria se estender à Lei dos Crimes Hediondos, sob o fundamento

de ser lei nova mais benéfica.

Mirabete (2000, p. 328) defende, porém, que em se tratando de regra especial para o

crime de tortura “[...]a possibilidade de progressão não se estende aos demais crimes hed iondos

ou equiparados, vigendo para estes ainda a regra do art. 2º, § 1º da Lei n. 8.072/90, que determina

para o agente o cumprimento integral da pena em regime fechado”.

Por sua vez, Lopes Monteiro (2002, p. 153-154) sustenta que a Lei de Tortura não

implica em revogação do §1º do art. 2º da LCH, “[...]em primeiro lugar porque a Lei de Tortura

não se refere de forma expressa à LCH. Em segundo lugar é ela uma lei específica para esse

crime e como tal não tem o condão de se aplicar a outros tipos penais, até porque estes são

regidos por uma lei também específica”.

Nota-se, entretanto, como antes dito, que a doutrina ainda é dividida com relação a

derrogação ou não do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 pelo § 7º do art. 1º da Lei 9.455/ 97 e o cerne

desta divergência encontra-se em se saber se as duas leis em comento tratam ou não da mesma

matéria, bem como se a lei posterior por ser mais benéfica, revoga a anterior.

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3 A INCONSTITUCIONALIDADE DA VEDAÇÃO À PROGRESSÃO DO REGIME DE PENAS NA LEI DOS CRIMES HEDIONDOS

3.1 A RELAÇÃO ENTRE O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA

PENA E A LEI DOS CRIMES HEDIONDOS

A garantia da individualização da pena está prevista na Constituição Federal de 1988,

em seu artigo 5º, inc. XLVI, que prescreve:

Art. 5º. [...] inc. XLVI: a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos.

A individualização da pena, portanto, foi incluída pelo legislador constituinte como uma

garantia constitucional do cidadão, revestindo-se, portanto, em um postulado básico de justiça.

Individualizar a pena significa adaptar a pena ao condenado, considerando as suas

características físicas, antropológicas, morais e psíquicas e também a natureza e as circunstâncias

do delito (FRANCINY SILVA, 2003, p. 53).

A individualização pode ser determinada no plano legislativo, sem descurar do comando

normativo constitucional, quando se estabelecem e disciplinam as sanções cabíveis nas várias

espécies delituosas.

Pode também ser dosada no plano judicial, conforme facultam os artigos 59 e 68 do

Código Penal, os quais tem o propósito de fixar a pena dentre os limites da cominação em

abstrato e personalizar a decisão judicial o mais possível, de modo que se aplique a pena mais

justa e adequada ao caso concreto.

E, por fim, pode ser disposta no plano executório (art. 33, § 2º do Código Penal c/c arts.

1º e 112 da Lei de Execução Penal), quando processada no período de cumprimento da pena,

abrangendo medidas judiciais e administrativas, ligadas ao regime penitenciário, à suspensão da

pena, ao livramento condicional e tendo como finalidade adaptar a pena à pessoa do condenado

para propiciar a este uma melhor reinserção na sociedade após ter ele cumprido o lapso temporal

cominado.

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Individualizar a pena na execução, portanto, consiste em dar a cada apenado as

oportunidades e os instrumentos necessários para lograr sua reinserção social. A individualização,

nesse passo, deve aflorar tanto técnica quanto cientificamente, nunca improvisada, iniciando-se

com a indispensável classificação dos condenados a fim de serem destinados aos programas de

execução mais adequados, conforme as condições de cada um.

Nesse contexto, sustenta Moysés Neto (2001, p. 6-7) que “[...]a individualização da

pena, com o benefício do regime prisional progressivo, insere-se no tronco comum do processo

individualizador que se inicia com a atuação do legislador, passa pela ação do juiz e se finda, ao

atingir o nível máximo de concreção, na execução penal”.

Desse modo, o condenado deve ser visto como cidadão, sujeito de direitos

constitucionalmente garantidos, que devem ser respeitados e garantidos pelo Poder Estatal

(FRANCINY SILVA, 2003, p. 54).

Neste mesmo viés, Franco (2000, p. 162-163) sublinha que o princípio constitucional da

individualização da pena “[...] garante a todo e qualquer cidadão, que é condenado num processo

crime, uma pena particularizada, pessoal e distinta, sendo assim, inextensível a outro cidadão

numa situação fática igual ou semelhante”.

E na medida em que o critério de individualização não pode ser restringido, uma vez que

é direito fundamental de todo condenado, é descabido ao legislador ordinário suprimir tal

preceito, fazendo, assim, uma exacerbação de seu poder, em afronta direta ao comando

constitucional vigente (MOYSÉS NETO, 2001, p. 7).

Entretanto, o texto da Lei 8.072/90 permite concluir que o legislador pátrio de 1990

ignorou o princípio da individualização da pena previsto nos artigos 59 e 68 do Código Penal e

consagrado no art. 5º, inc. XLVI, da Constituição Federal.

Nesse viés, Franco (1992, p. 52) é enfático em sustentar que o § 1º do art. 2º da Lei

8.072/90 fere o princípio constitucional contido no art. 5º, inc. XLVI, da Carta Magna, porque

suprimiu do julgador o seu poder dever de aderir às circunstâncias do crime, ao grau de

reprovabilidade da conduta e às características do agente infrator a pena adequada para a

repressão do crime, ou seja, em face da prática de um crime hediondo ou de um crime a ele

equiparado, o legislador ordinário generalizou a aplicação da pena, sobretudo o instituto do

regime de penas, a todos os autores e partícipes destes crimes, descurando-se das condições

pessoais do infrator e das circunstâncias que envolveram o evento criminoso.

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Em defesa ao princípio constitucional da individualização da pena, Mirabete (2000, p.

46) disserta que a execução penal não pode ser igual para todos os presos:

[...] justamente porque nem todos são iguais, mas sumamente diferentes, e de que tampouco a execução pode ser homogênea durante todo o período de seu cumprimento. Não há mais dúvida de que nem todo preso deve ser submetido ao mesmo programa de execução e de que, durante a fase executória da pena, se exige um ajustamento deste programa conforme a reação observada no condenado, podendo-se só assim falar em verdadeira individualização no momento executivo.

Portanto, quando a Constituição Federal estabelece que a “[...] lei regulará a

individualização da pena”, força é convir que a lei poderá dar parâmetros para a atuação judicial,

porém, não poderá, de modo algum, obstar que se realize a individualização punitiva (FRANCO,

2000, p. 163), sob pena de incorrer em grave violação às garantias individuais do cidadão, em

violação frontal ao preceito constitucional.

3.2 O PARADOXO ENTRE A LEI DE EXECUÇÃO PENAL E A LEI DOS CRIMES

HEDIONDOS

A Lei dos Crimes Hediondos quando vedou a progressão do regime de penas violou

também outro importante comando normativo de direito penal, qual seja, a Lei de Execução

Penal.

O art. 112, caput, da Lei de Execução Penal, prevê o sistema progressivo de execução de

pena:

Art. 112: A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e seu mérito indicar progressão. (grifei)

Neste sentido, sustenta Salgado (2000, p. 5) que a lei de crimes hediondos foi além “[...]

na contramão do processo evolutivo pelo qual vem passando a ciência penal moderna, a lei

entrou em rota de colisão com um dos mais importantes institutos penais, qual seja, o sistema de

progressão no cumprimento da sentença, estipulado dentro da Lei de Execuções Penais”.

Sobre o tema, argumenta Moysés Neto (2001, p. 4):

Agravar a execução é uma coisa; destituir o juiz do poder de particularizar o regime é outra. Se o legislador considerava branda demais a Lei n. 7.210/84, que estabelecesse novas regras para a individualização, não que as impedisse. Se queria dar tratamento

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rigoroso a essa “etiqueta” de delinqüentes, que o fizesse, mas usufruindo de seus meios, e não invadindo a competência do Judiciário.

O sistema penal no Brasil adota como fundamento o regime de progressão de pena,

baseado em algumas características que são apresentadas ao condenado durante o cumprimento

da sua pena, de tal modo a possibilitar-lhe a reinserção gradativa na sociedade. De acordo com o

comportamento do preso e da sua capacidade de recuperação, vai este adquirindo o direito a

passar de um regime mais rígido para um gradualmente mais suave, até alcançar o livramento

condicional.

Gustavo Vaz Salgado (2000, p.5) ainda afirma que:

[...] não se pode olvidar do caráter pedagógico e restabelecedor do regime progressivo. Se a pena privativa de liberdade, tão combatida atualmente pelo mundo jurídico, considerada modernamente um ‘mal necessário’, pode ainda ser encarada como tendo um objetivo ressocializador, certamente, a regra que determina o cumprimento integral da pena em regime fechado aniquila de vez esse caráter ressocializador da pena, nos remetendo a período histórico medieval, em que a ela era vista como mero castigo, simples retribuição.Garantir ao preso a possibilidade de ser reinserido no corpo social, adquirindo novos valores é um direito constitucionalmente garantido, senão explicitamente consignado no texto, abstraído do sistema de proteção individual que a Carta encerra. E isso só pode ser alcançado através da aplicação incondicional do regime progressivo da execução penal.

Conforme sustentado, é unânime que, com a edição da Lei 8.072/90, houve a violação

cabal da Lei de Execução Penal, na medida em que vedou o instituto da progressão do regime, já

que a lei de execução inseriu este instituto em seu texto normativo como garantia do reeducando.

3.3 A POSIÇÃO DE ALGUNS DOUTRINADORES CONTEMPORÂNEOS ACERCA DA PROGRESSÃO DO REGIME DE PENAS NOS CRIMES HEDIONDOS

A tese da inconstitucionalidade da vedação à progressão de regime aos crimes hediondos

é fortemente majoritária entre os autores brasileiros, muito embora alguns ainda resistam em

defender a corrente contrária.

Entre os autores que sustentam a constitucionalidade está Capez (2003, p. 93), não há

que se falar em ofensa ao princípio constitucional da individualização da pena (art. 5º, inc.

XLVI), “[...] uma vez que o próprio constituinte autorizou o legislador a conferir tratamento mais

severo aos crimes definidos como hediondos”.

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Defende também Bitencourt (2003, p. 432) que o Código Penal e a Lei de Execução

Penal, complementados pelas leis extravagantes “[...] individualizam a aplicação da pena e o seu

cumprimento. Esses dois diplomas regulamentam a individualização da pena cumprindo a função

delegada pela Constituição (art. 5º, XLVI)”.

Por isso é que Leal (1996, p. 113) defende a tese de que o legislador ordinário, ao

instituir a Lei 8.072/90 e dispor em seu § 1º do art. 2º a vedação à progressão do regime de pena,

ignorou o princípio da individualização da pena, inserido no artigo 59 do Código Penal e

consagrado no artigo 5º, inc. XLVI da Constituição Federal, “[...] segundo o qual cada condenado

receberá a reprimenda certa e determinada para prevenção e repressão do seu crime”.

Para Franco (2000, p. 164) excluir o sistema progressivo, também denominado sistema

de individualização científica, da fase de execução “[...]é impedir que se faça valer, nessa fase, o

princípio constitucional da individualização da pena”.

O direito que os condenados têm à progressão de regime prisional constitui a base do

sistema progressivo e para Leal (2003, p. 215) “[...]a proibição apriorística e absoluta de

concessão desse benefício contraria o princípio constitucional da individualização da pena,

consagrado no inc. XLVI, do art. 5º da CF”.

Este dispositivo da lei sob comento para Franco (2000, p. 199) constitui “[...]um pesado

gravame para o apenado que apresentar tal qualificação subjetiva já que, nessa hipótese, terá de

cumprir a pena privativa de liberdade num único regime penitenciário, ou seja, o regime

fechado”.

Sendo assim, o legislador ordinário ignorou que a execução de longas penas privativas

de liberdade num único regime representa um castigo insuportável ao preso, o desmotiva e lhe

tira qualquer esperança de retorno à sociedade (LEAL, 2003, p. 206).

Para Caetano da Silva (2001, p. 155) é de se concluir que o regime progressivo decorre

do preceito constitucional da individualização da pena, o que leva “[...]por conseqüência, à

inconstitucionalidade do art. 2º, § 1º da Lei 8.072/90, que veda a progressividade”.

Sobre a prejudicialidade do processo de ressocialização sustenta Franco (2000, p. 199)

que o dispositivo legal em exame “[...] além de representar um desestímulo ao processo

ressocializador do condenado, contribui também para diminuir a rotatividade dos presos

recolhidos nos equipamentos penitenciários que já se encontram, no presente momento, em fase

máxima de saturação”.

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Articula Monteiro (2002, p.150) que a exclusão dessa forma progressiva de execução da

pena nos crimes hediondos e equiparados “[...] é um grave castigo para os condenados por estes

crimes”.

Além disso, a formação de um grupo numeroso de condenados, que deverá ser mantido

nos presídios por largo espaço temporal, sem nenhuma esperança de obter a liberdade ou um

tratamento penitenciário mais benevolente, criará dificuldades crescentes ou mesmo condições

explosivas para as administrações prisionais, sendo assim:

A opção feita pelo legislador no sentido de agravar a execução da pena foi, no mínimo, desarrazoada, infeliz. Nada pior, num estabelecimento penitenciário, do que um condenado sem nenhuma perspectiva de ser libertado ou, ao menos, de receber regime penitenciário mais favorável, antes do término de uma pena privativa de liberdade de longa duração (FRANCO, 2000, p. 199).

A proibição do regime progressivo para os crimes hediondos, conforme Monteiro (1992,

p. 122) é “[...]um grave castigo para os condenados por estes crimes e foi uma obsessão no

projeto da lei”.

Já para Salgado (2000, p. 5) “[...] obrigar o preso a permanecer estacionado num mesmo

regime durante todo o cumprimento da pena é algo repugnante do ponto de vista social, eis que

lhe retira a possibilidade de recuperação dos valores perdidos por ocasião do cometimento do

delito”.

Pena longa e regime fechado são elementos contraditórios à idéia de reinserção social,

pois, segundo Bártoli (1992, p. 299), são medidas inúteis para a contenção da criminalidade,

limitando ao “[...] autor do crime uma vida futura em sociedade”. Em verdade, estes i nstrumentos

deixam de atender uma circunstância relevante para o apenado e o seu retorno à vida em

sociedade, qual seja, “[...] uma das condições para a preservação da identidade moral do

condenado, com positivas repercussões na disciplina carcerária, está na possibilidade de

vislumbrar a liberdade”.

Escreve Toledo (1992, p. 68) que a aprovação do dispositivo legal analisado foi fruto

“[...]da mais completa ignorância a respeito do sistema progressivo de execução da pena adotado

pela reforma penal brasileira de 1984”.

Leal (2003, p. 209) giza que não há dúvida quanto à inconveniência do dispositivo penal

em referência, pois, “[...]constitui ele um verdadeiro absurdo, pois representa a expressão de um

pensamento punitivo retrógrado, autoritário e desumano, que há muito já se deveria estar

completamente sepultado”.

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E, por fim, Leal (2003, p. 207) ainda sustenta que: “[...]esta clara contradição jurídica,

de graves e sérias conseqüências punitivas, precisa ser adequadamente superada pelos operadores

do Direito. Afinal, a justiça criminal não pode ser transformada num instrumento de simples

semeadura de castigos e medidas opressivas”.

Não há como se ter dúvidas quanto a inconveniência do dispositivo em exame, como

bem expõem os doutrinadores citados, pois, tanto representa um afronta a Constituição Federal na

medida em que o legislador infraconstitucional vai além dos limites estabelecidos pelo Poder

Constituinte, violando o princípio constitucional da individualização da pena, como também

constitui-se numa norma desumana e de extrema severidade quando impõe ao condenado por

crime hediondo a cumprir sua pena num único regime, prejudicando assim, o processo de

ressocialização deste apenado.

3.4 PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS ACERCA DA PROGRESSIVIDADE DO REGIME DE PENAS NOS CRIMES HEDIONDOS

Muito embora o seguimento majoritário da doutrina sustentar a tese da

inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, não é este o entendimento predominante

nos Tribunais.

Ao decidir o Recurso Ordinário de Habeas Corpus, relatado pelo Exmo. Ministro Félix

Fischer, o Superior Tribunal de Justiça negou a concessão da progressão do regime prisional ao

condenado pelo art. 12 da Lei 6.368/76, conforme se verifica da ementa do Acórdão:

EXECUÇÃO PENAL. RECURSO ORDINÁRIO DE HABEAS CORPUS. ART. 12 DA LEI 6.368/76. REGIME PRISIONAL. PROGRESSÃO. DESCABIMENTO. LEI 8.072/90. A pena de reclusão, em se tratando de crime previsto na Lei dos Crimes Hediondos, deve ser executada em regime integralmente fechado (art. 2º §1º, da Lei nº 8.072/90).Recurso desprovido.

O Superior Tribunal de Justiça, por sua 5ª Turma, ao julgar o Recurso Especial nº

286.786/SP, em que foi Relator o Ministro Jorge Scartezzini, em decisão publicada no DJU de

28/05/2001, em mais um precedente, reconheceu a constitucionalidade da vedação à progressão

do regime de pena ao condenado pelo tráfico ilícito de entorpecentes, sustentando a tese de que a

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Lei das Penas Alternativas (Lei nº 9.714/98) e a Lei da Tortura (Lei nº 9.455/97) não alcançaram

a Lei 8.072/90, cuja ementa transcreve-se:

PROCESSO PENAL - TRÁFICO DE ENTORPECENTES SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE PELA RESTRITIVA DE DIREITOS - PROGRESSÃO DE REGIME PRISIONAL – IMPOSSIBILIDADE. - As alterações introduzidas no Código Penal pela Lei das Penas Alternativas (Lei 9.714/98) não alcançam o crime de tráfico de entorpecentes (crime hediondo), cujo cumprimento da pena é em regime integralmente fechado. Impossibilitada, portanto, a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos. - Nos delitos previstos na Lei de Crimes Hediondos o regime de cumprimento de pena é o fechado, vedada a progressão. A Lei 9.455/97, refere-se, exclusivamente, à prática de tortura, não se estendendo aos demais delitos previstos na Lei 8.072/90. - Precedentes. - Recurso conhecido e provido para determinar que o cumprimento da pena seja em regime integralmente fechado.

Em novo precedente, o Superior Tribunal de Justiça, pela mesma 5ª Turma, ao julgar o

Recurso Especial nº 170.841/PR, em que foi Relator o Ministro José Arnaldo da Fonseca, decisão

publicada no DJU de 26/03/2001, não concedeu a progressão de regime prisional, cujos

fundamentos, inseridos na respectiva ementa, transcreve-se:

HABEAS CORPUS. PENAL. CONDENAÇÃO POR INFRAÇÃO AO ART 12 DA LEI 6368/76. PROGRESSÃO DE REGIME PRISIONAL E SUBSTlTUlÇÃO DE PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. ART 44 DO CP. LEI 9.714/98. CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO.IMPOSSIBILIDADE. A Terceira Seção desta Corte pacificou o entendimento de que "A Lei nº 9.455/97 refere-se exclusivamente aos crimes de tortura, sendo descabida a sua extensão aos demais delitos elencados na Lei nº 8.072/90, em relação aos quais mantém-se a vedação à progressão de regime”. (REsp 170.841 -PR, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 28.02.2000). À luz do princípio da especialidade (art. 12, CP), as alterações introduzidas no Código Penal pela "Lei das Penas Alternativas" (Lei 9.714/98) não alcançam o crime de tráfico de entorpecentes, e de resto todos os considerados hediondos, eis que a Lei 8.072/90 - de cunho especial - impõe expressamente o cumprimento da pena em regime integralmente fechado (§ 1º, do art. 2º, da Lei 8.072/90). Precedentes desta Corte e do STF. Ordem denegada.

Pelos crimes de homicídio qualificado e narcotráfico também não foi concedida a

progressão de regime prisional pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao julgar o Recurso

Especial nº 252.886/RS, em que foi Relator o Ministro Gilson Dipp, decisão publicada no DJU

em 21/08/2000:

"CRIMINAL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA. HOMICÍDIO QUALIFICADO, LESÕES CORPORAIS GRAVES E TRÁFICO DE ENTORPECENTES. EXISTÊNCIA DE CONDENAÇÃO POR CRIME ELEVADO À CATEGORIA DE HEDIONDO. REGIME INTEGRALMENTE FECHADO. LEI 8.072/90. VEDAÇÃO LEGAL À PROGRESSÃO. CONSTITUCIONALIDADE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

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1. As condenações por delitos elencados, equiparados ou elevados à categoria de hediondos pela Lei nº 8.072/90, devem ser cumpridas em regime integralmente fechado, vedada a progressão. Precedentes. II. Constitucionalidade do art. 2º, § 1º, da Lei dos Crimes Hediondos já afirmada pelo STF III. Recurso conhecido e provido para impor o regime prisional integralmente fechado. "

Porém, o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, já firmou o seguinte

precedente jurisprudencial, destoando, ao menos no início, da orientação dos Tribunais

superiores, quando reconheceu a inconstitucionalidade da vedação à progressão do regime de

penas, conforme se extrai do Recurso de Agravo em que foi relator o Desembargador Álvaro

Wandelli, em decisão publicada no D.J.S.C. nº 9.436, de 12.03.96, cuja ementa reproduz-se:

RECURSO DE AGRAVO - Narcotraficância - Crime hediondo - Possibilidade de progressão do regime fechado para o semi-aberto - Inconstitucionalidade do § 1º, do art. 2º, da Lei 8.072/90 frente ao princípio da individualidade de pena - Art. 5º, inc. XLVI, da Carta Magna - Recurso provido. “‘A constituição da República consagra o princípio da individualização da pena. Compreende três fases: cominação, aplicação e execução. Individualizar é ajustar a pena cominada, considerando os dados objetivos e subjetivos da infração penal, no momento da aplicação e da execução. Impossível, por isso, legislação ordinária impor (desconsiderando os dados objetivos e subjetivos) regime único e inflexível’ (STJ - RE 19.420-0 - Rel. Vicente Cernicchiaro - DJU, de 7.6.93, p. 11.276)”.

Como se vê, a jurisprudência ainda é dominante em fixar a tese da não concessão de

progressão de regime prisional para os crimes hediondos e equiparados, no entanto, como pode-

se constatar, já existem decisões favoráveis à inconstitucionalidade do §1º do art. 2º da Lei

8.072/90.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente pesquisa tratou de investigar um tema ainda controvertido relacionado com a

progressão do regime prisional, vedada nos crimes elencados pela Lei n. 8.072/90.

O artigo 2º, § 1º, da referida lei, estabelece a proibição à progressão do regime de penas,

dispondo que a pena privativa de liberdade cominada pelos crimes previstos nesta lei deverá ser

cumprida integralmente em regime fechado. Esta proibição é considerada pela doutrina

majoritária como inconstitucional por violar o princípio da individualização da pena, introduzido

na Constituição Federal como uma garantia individual inviolável, e por impor a todos os

condenados por crimes hediondos um único regime de pena, sem atentar sobre as condições

pessoais do apenado, as circunstâncias e conseqüências do crime tratado em concreto. Porém,

autores penalistas brasileiros divergem sobre este tema, bem como a própria jurisprudência

pátria.

Há seguimentos doutrinários clássicos que sustentam que os crimes rotulados de

hediondos pela Lei n. 8.072/90 devem ser tratados de forma diferenciada e, conseqüentemente, os

autores destes crimes devem receber uma segregação mais severa, como cumprir suas penas num

único regime, o fechado.

Como forma de desenvolver este estudo acadêmico, primeiramente abrangeu-se o

instituto jurídico da pena, seu conceito, as suas finalidades. Estas consistem em revestir-se de

caráter retributivo, no sentido do condenado reparar o mal que trouxe a sociedade; preventivo,

quando indiretamente inibe ao cometimento de crimes, e, finalmente, ressocializador ou

medicinal, na medida em que reintroduz o apenado ao meio social.

Depois, no segundo capítulo, após apresentar-se o conceito de crime hediondo,

procurou-se demonstrar o tratamento que a Constituição Federal de 1988 deu aos crimes

hediondos, prevendo dispositivos restritivos a algumas garantias individuais previstas em normas

de caráter geral, como é o caso da norma que dispõe sobre a insuscetibilidade do indulto, graça,

anistia e liberdade provisória, não só aos hediondos como também aos a ele equiparados.

Ainda neste capítulo, cuidou-se de revelar os fatores que originaram a edição da Lei dos

Crimes Hediondos e que buscaram justificar a severidade de tratamento a determinados crimes,

selecionados, sem rigor científico, pelo legislador ordinário.

Distinguiu-se, ainda, a forma pela qual a Lei 8.072/90 proibiu a progressão do regime

prisional, impondo um regime único de cumprimento de pena, o fechado, em sua integralidade,

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em colisão frontal à Lei de Execução Penal, que em seu artigo 112 garante a progressão de

regime prisional. Além disso, fundamentou-se que a própria Constituição Federal de 1988 não

concede, em seu texto, ao legislador ordinário, a vedação à progressão de regime prisional.

Buscou-se confrontar a Lei 8.072/90 com a Lei da Tortura (Lei n. 9455/97), a qual

prevê em seu artigo 1º, § 7º, o cumprimento da pena em regime inicialmente fechado. A partir

daí, então, houve outra divergência doutrinária quanto à revogação ou não do art. 2º, § 1º, da Lei

n. 8.072/90 por este dispositivo da Lei de Tortura. A questão estava em saber se este dispositivo

da Lei n. 9.455/97 se estenderia aos outros crimes hediondos, e não somente a prática de tortura.

Porém, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça orientam que este

dispositivo deve ser aplicado tão somente ao crime de tortura, não se estendendo ao outros crimes

hediondos, pois não se pode pretender neste caso, a revogação por via oblíqua, já que esta nova

lei (Lei n. 9.455/97) não é incompatível com a anterior, sendo a diferença apenas por questão de

política criminal.

Procurou-se, portanto, reunir argumentos adotados por seguimentos doutrinários e

jurisprudenciais a respeito da polêmica que envolve a vedação da progressão do regime de penas

pela Lei 8.072/90. Concluiu-se que esta proibição, além de não ter contribuído com a redução dos

crimes classificados como hediondos, fere frontalmente uma garantia individual preconizada pela

Constituição Federal, inserta no princípio da individualização da pena.

Esta pesquisa segue a corrente que defende a insustentabilidade da vedação à

progressão do regime de penas, sob o argumento de que o artigo 2º, § 1º, da Lei 8.072/90 atenta

contra uma das finalidades da pena, a ressocialização, já que marginaliza ainda mais o apenado,

inibindo e até mesmo impossibilitando a recuperação de sua cidadania, que é obrigação do

Estado. Além disso, qualquer restrição a uma garantia individual somente poderá ser prevista

pelo legislador ordinário quando for admitida expressamente pela Constituição Federal e sob

parâmetros por esta fixados, mas não é o que acontece com o dispositivo invocado da Lei dos

Crimes Hediondos, já que em nenhum momento houve pelo constituinte a previsão de restrição à

progressão do regime de penas aos crimes hediondos, mas tão somente a insuscetibilidade da

anista, graça, indulto e liberdade provisória.

Ademais, convém sublinhar que a pretensão desta pesquisa acadêmica foi o de

contribuir com o debate acerca deste tema, sem qualquer intenção de apresentar uma solução para

a questão proposta.

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APÊNDICE

LEI Nº 8.072, DE 25 DE JULHO DE 1990.

Dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte lei:

Art. 1o São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou tentados: (Redação dada pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994)

I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2o, I, II, III, IV e V); (Inciso incluído pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994)

II - latrocínio (art. 157, § 3o, in fine); (Inciso incluído pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994)

III - extorsão qualificada pela morte (art. 158, § 2o); (Inciso incluído pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994)

IV - extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada (art. 159, caput, e §§ lo, 2o e 3o); (Inciso incluído pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994)

V - estupro (art. 213 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único); (Inciso incluído pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994)

VI - atentado violento ao pudor (art. 214 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único); (Inciso incluído pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994)

VII - epidemia com resultado morte (art. 267, § 1o). (Inciso incluído pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994)

VII-A – (VETADO) (Inciso incluído pela Lei nº 9.695, de 20.8.1998)

VII-B - falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273, caput e § 1o, § 1o-A e § 1o-B, com a redação dada pela Lei no 9.677, de 2 de julho de 1998). (Inciso incluído pela Lei nº 9.695, de 20.8.1998)

Parágrafo único. Considera-se também hediondo o crime de genocídio previsto nos arts. 1o, 2o e 3o da Lei no 2.889, de 1o de outubro de 1956, tentado ou consumado. (Parágrafo incluído pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994)

Art. 2º Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de:

I - anistia, graça e indulto;

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II - fiança e liberdade provisória.

§ 1º A pena por crime previsto neste artigo será cumprida integralmente em regime fechado.

§ 2º Em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade.

§ 3º A prisão temporária, sobre a qual dispõe a Lei nº 7.960, de 21 de dezembro de 1989, nos crimes previstos neste artigo, terá o prazo de trinta dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade.

Art. 3º A União manterá estabelecimentos penais, de segurança máxima, destinados ao cumprimento de penas impostas a condenados de alta periculosidade, cuja permanência em presídios estaduais ponha em risco a ordem ou incolumidade pública.

Art. 4º (Vetado).

Art. 5º Ao art. 83 do Código Penal é acrescido o seguinte inciso:

"Art. 83. ..............................................................

........................................................................

V - cumprido mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza."

Art. 6º Os arts. 157, § 3º; 159, caput e seus §§ 1º, 2º e 3º; 213; 214; 223, caput e seu parágrafo único; 267, caput e 270; caput, todos do Código Penal, passam a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 157. .............................................................

§ 3º Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de cinco a quinze anos, além da multa; se resulta morte, a reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo da multa.

Art. 159. ...............................................................

Pena - reclusão, de oito a quinze anos.

§ 1º .................................................................

Pena - reclusão, de doze a vinte anos.

§ 2º .................................................................

Pena - reclusão, de dezesseis a vinte e quatro anos.

§ 3º .................................................................

Pena - reclusão, de vinte e quatro a trinta anos.

Art. 213. ...............................................................

Pena - reclusão, de seis a dez anos.

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Art. 214. ...............................................................

Pena - reclusão, de seis a dez anos.

........................................................................

Art. 223. ...............................................................

Pena - reclusão, de oito a doze anos.

Parágrafo único. ........................................................

Pena - reclusão, de doze a vinte e cinco anos.

Art. 267. ...............................................................

Pena - reclusão, de dez a quinze anos.

Art. 270. ...............................................................

Pena - reclusão, de dez a quinze anos.

......................................................................."

Art. 7º Ao art. 159 do Código Penal fica acrescido o seguinte parágrafo:

"Art. 159. ..............................................................

§ 4º Se o crime é cometido por quadrilha ou bando, o co-autor que denunciá-lo à autoridade, facilitando a libertação do seqüestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços."

Art. 8º Será de três a seis anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código Penal, quando se tratar de crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ou terrorismo.

Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços.

Art. 9º As penas fixadas no art. 6º para os crimes capitulados nos arts. 157, § 3º, 158, § 2º, 159, caput e seus §§ 1º, 2º e 3º, 213, caput e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único, 214 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único, todos do Código Penal, são acrescidas de metade, respeitado o limite superior de trinta anos de reclusão, estando a vítima em qualquer das hipóteses referidas no art. 224 também do Código Penal.

Art. 10. O art. 35 da Lei nº 6.368, de 21 de outubro de 1976, passa a vigorar acrescido de parágrafo único, com a seguinte redação:

"Art. 35. ................................................................

Parágrafo único. Os prazos procedimentais deste capítulo serão contados em dobro quando se tratar dos crimes previstos nos arts. 12, 13 e 14."

Art. 11. (Vetado).

Art. 12. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

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Art. 13. Revogam-se as disposições em contrário.

Brasília, 25 de julho de 1990; 169º da Independência e 102º da República.

FERNANDOCOLLOR Bernardo Cabral

Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 26.7.1990