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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEODINÂMICA EGEOFÍSICA
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
ORIENTAÇÃO DE FALHAS PRESENTES EM TESTEMUNHOS DE SONDAGENS DO CAMPO
DE XARÉU/BACIA DO CEARÁ.
CRISTINA APARECIDA DOMINGUETI
Orientador:Prof. Dr. Walter Eugênio de Medeiros
Co-orientadorProf. Dr. Emanuel Ferraz Jardim de Sá
Dissertação n0 31/PPGG.
Natal-RN, julho - 2002
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEODINÂMICA EGEOFÍSICA
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
ORIENTAÇÃO DE FALHAS PRESENTES EM TESTEMUNHOS DE SONDAGENS DO CAMPO DE
XARÉU/BACIA DO CEARÁ.
CRISTINA APARECIDA DOMINGUETI
Dissertação de Mestrado apresentada em
18 de julho de 2002, para obtenção do
título de Mestre em Geofísica pelo
Programa de Pós-Graduação em
Geodinâmica e Geofísica da UFRN.
Comissão examinadora:Prof. Dr. Walter Eugênio de Medeiros (Orientador)
Prof. Dr. Fernando César Alves da Silva Prof. Dr. Olivar Antonio Lima de Lima
Natal-RN, Julho - 2002
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN i
RESUMO
Um projeto de pesquisa está sendo desenvolvido pelo PPGG/UFRN e a
PETROBRÁS no Campo Petrolífero de Xaréu localizado na bacia do Ceará, Nordeste do
Brasil. O objetivo da pesquisa é a caracterização de um reservatório carbonático
fraturado, o Calcário Trairí, para a perfuração de um poço com duas “pernas” horizontais
levando em consideração o sistema natural de fraturas deste reservatório visando
aumentar a taxa de recuperação do óleo. A presente dissertação é parte desta pesquisa e
sua contribuição é estimar a orientação das falhas presentes em testemunhos de
sondagens não orientados, usando o método proposto por Hesthammer & Henden (2000).
Para orientar uma falha interceptando um estrato observado no testemunho, o
estrato deve ser previamente orientado. Como vínculo para orientar os estratos, utilizou-
se o mergulho regional das camadas, obtido em cada posição de poço a partir dos mapas
de contorno estrutural do Calcário Trairí. Devido ao fato do número de falhas presentes
nos testemunhos do Calcário Trairí ser pequeno, a analise estrutural foi realizada em
todos os testemunhos do Campo de Xaréu. Como hipótese geológica de trabalho,
admitiu-se que todas as falhas foram formadas como resultado da separação da América
do Sul e África, no contexto de formação de uma falha transcorrente dextral regional.
Nesse contexto, falhas secundarias são principalmente dos tipos “T” e “R” de acordo com
a classificação de Rieldel.
Foram analisados 263.5 m de testemunhos. Os mergulhos dos estratos variam de
0o a 8o, sendo que o valor mais freqüente é igual a 2o. Este resultado foi interpretado
como um indício de que a deformação no Campo de Xaréu foi principalmente de
natureza rúptil. As direções preferenciais de strike para as falhas analisadas são NW e
NE. Essas falhas possuem mergulho alto, em geral entre 70o e 90o. Sugere-se que as
pernas horizontais do poço sejam orientadas para NW e NE, de modo a aumentar a
probabilidade das pernas interceptarem o maior número possível de fraturas e falhas
abertas.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN ii
ABSTRACT
A research project is being developed by PPGG/UFRN and PETROBRAS in the
Xaréu Oil Field located in Ceará Basin, Northeastern Brazil. The objective of the
research is to characterize a fractured carbonate reservoir, the Trairi Limestone, in order
to drill a borehole with two horizontal “legs” taking advantage of the natural fracture
system to enhance the oil recovery. The present master thesis is part of this research and
its contribution is to estimate fault orientation from unoriented cores, using the method
proposed by Hesthammer & Henden (2000).
In order to orient a fault cutting a bed observed in the core, the bed should be
previously oriented. As additional constraint to orient the bed, we use regional bedding
orientation obtained from structure maps of Trairi Limestone. Because the number of
cores drilled from the Trairi Limestone was too small, we analyzed all cores from the
field. As geologic constraint, we admit that all faults were formed as result of the South
America and Africa separation, in the context of a regional dextral strike-slip fault
formation. In this context, secondary faults are manly “T” and “R” faults according
Riedel’s classification.
We analyzed 236.5 m of cores. The dip of bedding varies from 0o to 8o, being the
most frequent value equal to 2o. We interpret this result as evidence that the deformation
process was manly ruptil. 77 faults were identified in the cores. These faults strike manly
to NW and NE with dips, in general, inside the interval 700 - 900. We suggest that the
horizontal “legs” of the borehole should be oriented to NW and NE in order to improve
the probability of intercepting open fractures and faults.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN iii
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar quero agradecer a Deus pela meta alcançada. Pois nos
momentos de desespero, Ele me deu esperança. Nos momentos de tristeza, Ele me deu a
sabedoria de entender o porque de tal acontecimento. Nos diversos momentos da minha
caminhada, Ele me deu a Luz.
Agradeço com todo amor a minha família, pelo seu incentivo e compreensão.
Pelos choros nas horas de despedida, pelos telefonemas dizendo: “Quando você vem?;
Confiamos em você!; Não se preocupe, se não der certo você volta.; Cuidado! ...”. Pelo
amor e segurança que sempre me deram.
À Agência Nacional de Petróleo (ANP) e CAPES pelo apoio financeiro, através
da concessão de bolsas. Ao PPGG pelo apoio logístico.
Ao professor Walter Eugênio de Medeiros pela orientação desta dissertação, na
qual ele teve muita paciência e soube transmitir com clareza e objetividade suas idéias.
Ao seu bom humor e seus conselhos.
Ao professor Emanuel Jardim de Sá pela sua confiança em mim depositada. E
pelas contribuições valorosas dadas a esta dissertação e pelo apoio do “Projeto
Multilaterais”.
Aos profissionais da PETROBRÁS e do CENPES, ligados ao “Projeto
Multilaterais”. A Silvio José Moreira (PETROBRÁS) pela liberação dos dados presentes
nesta dissertação e pelo apoio logístico. Ao professor Virgínio Henrique Neumann
(UFPE) e Alex Francisco Antunes (PPGG/UFRN) pelas valiosas contribuições.
Aos amigos do PPGG/UFRN Carlos César, Moreira, Alex e Mario, pelas dúvidas
esclarecidas; “meus professores” nas horas vagas. Aos amigos de sala, Josibel, Luciano,
Carlos César, Jesimael, Marcelo (visitante da sala) e Pedro Xavier, pelo apoio,
cumplicidade, companheirismo e carinho. Pelas horas das piadas, das risadas e do
relaxamento. Aos amigos, alunos do PPGG, pelo incentivo, choro em conjunto e apoio.
Aos amigos, Leandro e André (Dani), pelos 18 meses de convivência, nos quais
aprendi e me diverti bastante. Ao amigo Marcos Paulo pelos momentos de reflexão e
pelos finais de semana na praia. À Márcia e Peres pelo apoio, carinho e apoio logístico
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN iv
(meu novo lar). À Fátima (Fatinha) pelos almoços de sábado e pelo carinho. Minha mãe
adotiva de Natal.
As amigas, Ludmila, Iriane, Patrícia, Virginia e Virginia Elisabeth, pela amizade,
apoio, incentivo e carinho, mesmo estando a mais ou menos 2000 km de distância.
Ao corpo docente do PPGG pelas aulas ministradas e pelo conhecimento
adquirido. A Nilda pela sua eficiência, simpatia e apoio. Pelos e-mails de incentivo.
Domingueti, C. A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN v
ÍNDICE
RESUMO............................................................................................................................. i
ABSTRACT......................................................................................................................... ii
AGRADECIMENTOS....................................................................................................... iii
ÍNDICE................................................................................................................................ v
1. INTRODUÇÃO............................................................................................................... 01
1.1 Apresentação................................................................................................................... 01
1.2 O “Projeto Multilaterais” e o Escopo desta Dissertação................................................. 01
1.3 A Bacia do Ceará............................................................................................................ 02
1.3.1 A Sub-Bacia de Mundaú........................................................................................ 04
1.3.2 A Formação Paracuru............................................................................................ 04
1.3.3 O Membro Trairí.................................................................................................... 04
1.4 O Campo Petrolífero de Xaréu....................................................................................... 05
1.5 Condicionamento Estrutural do Campo de Xaréu.......................................................... 07
1.6 O Poço Multilateral......................................................................................................... 08
2. DESCRIÇÃO DO MÉTODO UTILIZADO PARA ORIENTAÇÃO DAS FALHAS
PRESENTES EM TESTEMUNHOS NÃO ORIENTADOS......................................... 10
2.1 Introdução....................................................................................................................... 10
2.2 Orientação dos Estratos.................................................................................................. 10
2.3 Orientação das Falhas..................................................................................................... 13
Domingueti, C. A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN vi
3. ORIENTAÇÃO DAS FALHAS PRESENTES NOS TESTEMUNHOS NÃO
ORIENTADOS DO CAMPO DE XARÉU..................................................................... 18
3.1 Introdução....................................................................................................................... 18
3.2 Localização dos Poços e Testemunhos do Campo de Xaréu.......................................... 18
3.3 Procedimento Experimental para Medição dos Atributos Geométricos nos
Testemunhos......................................................................................................................... 20
3.4 Análise dos Dados dos Testemunhos do Campo de Xaréu............................................ 21
3.4.1 Dados de Dipmeter................................................................................................. 25
3.4.2 Mergulho Regional das Camadas............................................................................ 25
3.4.3 Resultados Obtidos para os estratos........................................................................ 28
3.4.4 Resultados Obtidos e Exercício Interpretativo para as Falhas................................ 30
4. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES..................................................................... 41
BIBLIOGRAFIA................................................................................................................ 43
ANEXO – ÂNGULOS MEDIDOS NOS TESTEMUNHOS........................................... 45
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 1
CAPÍTULO 1
INTRODUÇÃO
1.1 Apresentação
Os estudos aqui apresentados fazem parte do projeto “CARACTERIZAÇÃO
GEOMECÂNICA DE RESERVATÓRIOS HETEROGÊNEOS PARA AUMENTO DO
FATOR DE RECUPERAÇÃO ATRAVÉS DA PERFURAÇÃO DE POÇOS
MULTILATERAIS”, que está sendo desenvolvido no período de 2000 a 2002 por
pesquisadores e alunos do Programa de Pós-Graduação em Geodinâmica e Geofísica da
UFRN (PPGG/UFRN), em conjunto com pesquisadores da PETROBRAS (UN RN-CE e
CENPES). Um dos objetivos deste projeto, que passaremos a designar abreviadamente
por “Projeto Multilaterais”, é um melhor conhecimento dos aspectos litológicos e
tectônicos do Campo de Xaréu, mais precisamente do Calcário Trairí, visando fornecer
subsídios para a perfuração de um poço especial (multilateral) neste calcário, que venha a
aumentar o índice de recuperação de óleo do reservatório. O campo se localiza na Bacia
do Ceará/Sub-Bacia de Mundaú.
1.2 O “Projeto Multilaterais” e o Escopo desta Dissertação
A equipe do PPGG/UFRN está atuando principalmente na caracterização
estratigráfica, estrutural e petrofísica do Calcário Trairí. Nessa caracterização, a presença
de fraturas e falhas é um aspecto relevante porque elas podem servir de condutos e
espaços que armazenam e de onde pode ser drenado o petróleo. Deste modo, a
identificação da direção (ou direções) dominante(s) das falhas e fraturas é um fator
determinante no planejamento de um sistema complexo de poço, o chamado “poço
multilateral”, constituído por “pernas” horizontais. Como o reservatório alvo é
constituído por uma rocha carbonática, em que as falhas e fraturas são geralmente abertas
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 2
e com caráter não selante, o direcionamento das pernas do poço será feito de modo a
tentar interceptar, na perpendicular, o maior número possível de fraturas e falhas.
O reconhecimento da trama de fraturas e falhas em uma camada ou horizonte não
aflorante, como o Calcário Trairí, é um procedimento relativamente complexo. Para
tanto, a equipe do PPGG conta com vários pesquisadores que interagem entre si e com
profissionais da PETROBRAS para encontrar, de forma integrada, uma solução para a
questão. A contribuição desta dissertação para o “Projeto Multilaterais” é um estudo
quantitativo das falhas e fraturas presentes nos testemunhos do campo; em particular, a
implantação da metodologia de Hesthammer & Henden (2000) para orientação de falhas
presentes em testemunhos de sondagens coletados sem orientação (exceto identificação
de topo e base), como é o caso usual e, especificamente, dos testemunhos do Campo de
Xaréu. O exame dos testemunhos foi realizado em conjunto com o doutorando Alex
Francisco Antunes (PPGG/UFRN).
1.3 A Bacia do Ceará
A pequena contextualização que se segue sobre a Bacia do Ceará e o Campo de
Xaréu é baseada em Farias et al. (1998), Beltrami (1990), Beltrami et al. (1994) e Ribeiro
et al. (1990).
A Bacia do Ceará está localizada na plataforma continental da Margem
Equatorial Brasileira, entre os meridianos 380 e 420W. Limita-se a sudeste pelo Alto de
Fortaleza (com a Bacia Potiguar), a noroeste pelo Alto de Tutóia (com a Bacia de
Barreirinhas), a norte pela Falha Transformante do Ceará (que inclui a Cadeia de
Fernando de Noronha), e a sul com a área aflorante do embasamento cristalino. A Bacia
do Ceará possui uma área de aproximadamente 34.000 km2, com uma lâmina d’água de
até 200 metros, possuindo uma espessura máxima de sedimentos de cerca de 10.000
metros. Devido à presença de características tectônicas distintas e feições estruturais
proeminentes, a Bacia do Ceará foi subdividida por Beltrami (1990) em quatro sub-
bacias, assim designadas de oeste para leste (figura 1.1 a): Piauí-Camocim, Acaraú, Icaraí
e Mundaú. As Sub-Bacias de Icaraí e Acaraú têm como limite comum o prolongamento
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 3
norte do Lineamento de Sobral, estando esta última separada da Sub-Bacia de Piauí-
Camocim pelo Alto do Ceará.
Figura 1.1: Subdivisão da Bacia do Ceará de acordo com Beltrami (1990).
Segundo Beltrami (1990), a origem da Bacia do Ceará está relacionada à
separação dos continentes Africano e Sul-Americano e ela estaria enquadrada como uma
bacia continental do tipo rifte, em margem divergente. Sua evolução tectono-sedimentar
teve início provavelmente no Eo-Aptiano. O preenchimento sedimentar da Bacia do
Ceará compreende sedimentos cujas idades variam desde o Eo-Aptiano (Alagoas) até o
Quarternário. Mais recentemente, os trabalhos de Azevedo (1991) e Matos (2000) re-
interpretaram a evolução desta bacia no contexto transcorrente/transformante do
Atlântico Equatorial. Esses dois modelos geodinâmicos alternativos, o “Rifte Clássico” e
a Margem Transformante, acarretam implicações quanto à geometria e cinemática de
fraturamento desenvolvido na bacia.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 4
1.3.1 A Sub-Bacia de Mundaú
Três mega-seqüências sedimentares foram reconhecidas na Sub-Bacia de Mundaú:
rifte, transicional e deriva continental. Nestas três mega-seqüências, foram definidos
diferentes formações e membros. A Formação Mundaú representa a seqüência rifte, cujo
topo, ou seqüência transicional, corresponde à Formação Paracuru (Beltrami, 1990). O
Membro Trairí está contido na Formação Paracuru.
1.3.2 A Formação Paracuru
É constituída por três pacotes litológicos distintos, depositados durante a fase de
transição no final do Neo-Alagoas. Possui uma espessura máxima de aproximadamente
500 metros. Na base ocorrem arenitos deltáicos e folhelhos cinzentos intensamente
bioturbados, tanto por raízes como por animais. Nos arenitos deltáicos estão os principais
reservatórios produtores da Sub-Bacia de Mundaú, também designados como “Zona C”.
Na porção intermediária distingue-se o Calcário Trairí (Membro Trairí). A parte superior
é composta por um folhelho síltico cinzento, com raras interlaminações de calcilutito
creme e arenito fino (Beltrami et al, 1994).
1.3.3 O Membro Trairí
O Membro Trairí está localizado na porção mediana da Formação Paracuru,
tendo idade neoaptiana e espessura máxima de 100 metros. Desenvolveu-se em ambiente
restrito, em associação a blocos baixos de falhas, sendo ausente, por erosão ou por não
deposição, na maior parte da Sub-Bacia de Mundaú. Está bem desenvolvido apenas na
parte noroeste enquanto que, da parte central para sudeste, ocorre apenas em alguns
locais restritos aos baixos deposicionais (Beltrami, 1990). É constituído principalmente
de calcilutitos depositados em ambiente lacustre com sabkha marginal associada,
superpondo-se a folhelhos e lóbulos areníticos sublacustres. Ocorrem ainda acumulações
evaporíticas, que estão restritas ao depocentro da bacia (Farias et al, 1998).
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 5
O Membro Trairí constitui uma série argilo-carbonática onde as interlaminações
de folhelho permitem individualizar duas zonas, denominadas A1 e A2, que são
separadas por uma camada de folhelho com espessura de aproximadamente 10 metros. A
Zona A1, superior, é mais delgada que a Zona A2, inferior. O Calcário Trairí tem
propriedades físicas diferentes em relação às outras camadas, o que lhe confere uma
assinatura típica nos logs geofísicos. Como exemplo, ver a figura 1.2, onde se identificam
as Zonas A1 e A2 em dois diferentes poços.
A Zona A2 apresenta descontinuidades decorrentes de falhas e de variações
litológicas e diagenéticas (Ribeiro et al, 1990). Em geral, a Zona A2 possui maior
porosidade “vugular” e apresenta-se mais fraturada do que a Zona A1.
Trabalhos em andamento no contexto do “Projeto Multilaterais” demonstraram
que a Zona A2 é constituída por interlaminações de carbonatos, folhelhos e margas, e não
apenas por carbonatos (Antunes, A. F., com. verbal). Verificou-se também que ocorrem
muitas brechas carbonáticas.
1.4 O Campo Petrolífero de Xaréu
O Campo Petrolífero de Xaréu (figura 1.3) está localizado na Bacia do Ceará /
Sub-Bacia Mundaú, e foi descoberto em 1977. Ele está situado há cerca de 35 km mar
adentro na costa do Estado do Ceará, 95 km a NW de Fortaleza, com lâmina d’água entre
24 e 36 metros. Este campo abrange uma área de aproximadamente 10 km2, com 38
poços perfurados, dos quais 4 estão em produção no Calcário Trairí (Membro Trairí)
(Farias et al., 1998).
O índice de produtividade de óleo no Calcário Trairí é baixo, com fator de
recuperação em torno de 5%, bem abaixo da média na industria do petróleo que se situa
em torno de 15%. Isto faz com que este tipo de reservatório, tomado isoladamente, seja
considerado economicamente inviável; isto é, se a produtividade do Campo de Xaréu
dependesse exclusivamente do Calcário Trairí, o campo seria inviável economicamente.
O “Projeto Multilaterais” visa assim aumentar a taxa de recuperação do óleo armazenado
no Calcário Trairí.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 6
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 7
0 20 km
400 km 20’
20 m
39 00’040’ 20’ 625 km
9700 km
3 00’0
20’
40’
9575 km
MUNDAÚ
PARACURU
CAMPO DE XARÉU
FORTALEZA
CEARÁ
50 m200 m
1000 m
Figura 1.3: Localização do Campo de Xaréu na Bacia do Ceará.
1.5 Condicionamento Estrutural do Campo de Xaréu
No Campo de Xaréu está presente um sistema principal de falhas normais (figura
1.4), com direção noroeste-sudeste, que muda para leste-oeste ou mesmo para leste-
nordeste (Ribeiro et al, 1990). O mergulho dominante das falhas é para nordeste. Falhas
de segunda ordem, em geral com direções leste-oeste e norte-sul, se interligam com os
sistemas de falhas principais.
Figura 1.4: Mapa da base da Zona A2 com localização das falhas de grande escala e dos poços no Campo de
Xaréu (Fonte PETROBRAS). Por motivo de sigilo, as coordenadas foram retiradas e os nomes dos poços são
fictícios.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 8
Segundo Antunes (2002), as falhas principais apresentam mergulhos altos nos
níveis mais rasos do campo; porém, com o aumento da profundidade, ocorre uma
suavização nas inclinações destas falhas, que interligam com um deslocamento basal. Nas
camadas do teto, geralmente está impressa uma morfologia anticlinal roll-over, por
causa da geometria lístrica das falhas. A seção sísmica interpretada, reproduzida na figura
1.5, ilustra esse estilo estrutural. Note o roll-over imediatamente a nordeste da falha de
bordo, afetando a Formação Paracuru e o topo da Formação Mundaú. Essa dobra também
pode ser visualizada nos mapas de contorno estrutural do campo (figuras 1.4, 3.7 e 3.8).
Figura 1.5: Sessão sísmica (interpretada) de direção SW-NE do Campo de Xaréu. Pode-se observar que as
falhas possuem um padrão lístrico (Fonte e interpretação sísmica: Antunes, 2002). Por razões de sigilo, a
localização da seção não foi fornecida.
1.6 O Poço Multilateral
O poço multilateral é um tipo particular de poço direcional, constituído por pernas
laterais (figura 1.6); uma perna lateral é um trecho reto perfurado horizontalmente dentro
da formação produtora, de modo a aumentar a área de drenagem do reservatório e, como
conseqüência, ocasionar um aumento da produtividade e da recuperação final de
hidrocarbonetos. Para direcionar estas pernas, é preciso ter informações a respeito da
tectônica frágil do reservatório. A depender do tipo de litologia e do caráter selante ou
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 9
não selante das falhas, recomenda-se um tipo de relação espacial entre as direções das
pernas do poço e as direções dominantes das falhas e fraturas (Aguillera, 1980). Para o
caso de formações calcárias, onde as falhas e fraturas em geral funcionam como dutos
para a extração de óleo, é recomendável que as pernas interceptem o maior número
possível de fraturas e falhas. Na figura 1.6, é apresentado de forma esquemática, um poço
com duas pernas, estando a perna A numa situação favorável e a perna B numa situação
desfavorável. Esta figura ilustra a necessidade de orientar as falhas e fraturas presentes
nos testemunhos do Campo de Xaréu, no contexto da pesquisa em andamento.
A B
Figura 1.6: Desenho esquemático de um poço multilateral com duas pernas horizontais. A perna “A”
atravessa em alto ângulo um grande número de fraturas, numa situação em que pode aumentar a
produtividade, por exemplo, se as fraturas são abertas. Já a perna “B” se encontra sub paralela às fraturas,
possuindo uma orientação desfavorável.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 10
CAPÍTULO 2
DESCRIÇÃO DO MÉTODO UTILIZADO PARA ORIENTAÇÃO DAS FALHAS PRESENTES EM TESTEMUNHOS NÃO ORIENTADOS
2.1 Introdução
A análise estrutural em testemunhos de sondagem é uma ferramenta relativamente
recente. Na indústria do petróleo, a análise estrutural vem sendo utilizada em conjunto
com a análise de dados sísmicos, de dipmeter e de outros perfis geofísicos (a exemplo de
perfis de imagens), para obter informações sobre a orientação de falhas e fraturas em
escalas subsísmicas. No caso do Campo de Xaréu, mais precisamente no Calcário Trairí,
a informação sobre as direções das falhas e fraturas é importante para direcionar as
pernas do poço multilateral, para que estas interceptem o maior número possível de
descontinuidades.
Com o objetivo de orientar as falhas presentes em testemunhos não orientados do
Campo de Xaréu, esta dissertação detalha e emprega o método de Hesthammer &
Henden (2000). Neste método, são utilizadas relações geométricas entre as orientações
dos estratos, das falhas e da parede do poço. Estas relações fornecem famílias de soluções
para as possíveis orientações das falhas que, analisadas em conjunto com outras
informações geofísicas e geológicas, podem fornecer soluções únicas para a orientação
dessas estruturas.
Para orientar falhas presentes em testemunhos não orientados, é preciso que as
mesmas sejam observadas cortando um dado estrato, e que este último tenha sido
previamente orientado. A seguir apresentaremos a fundamentação teórica do método de
Hesthammer & Henden (2000) para orientação do estrato, bem como para orientação das
falhas.
2.2 Orientação dos Estratos
Considere um testemunho de forma cilíndrica, do qual são conhecidas apenas as
informações de “topo” (face mais próxima da “boca” do poço) e “base” (face mais
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 11
distante da “boca” do poço). Em geral, o eixo do testemunho não coincide com a direção
vertical da Terra, isto é, o posicionamento espacial do testemunho é arbitrário. Admita
que o testemunho sofreu um corte longitudinal, realizado de tal modo a apresentar, neste
corte, o maior ângulo de “mergulho” do estrato, conforme observado no testemunho
(ângulo 0 ). Exceto no caso do poço ser vertical, este “mergulho” não coincide com o
mergulho verdadeiro do estrato. 0 é também o ângulo entre os vetores unitários n e - B
(figura 2.1).
Figura 2.1: Diagrama esquemático mostrando as relações geométricas entre as orientações do estrato, dafalha e do eixo do poço. O Plano I representa um corte longitudinal realizado no testemunho de tal modo a apresentar, neste corte, o maior ângulo de “mergulho” do estrato, conforme observado no testemunho
(ângulo 0 ). O Plano II é um corte também longitudinal e que faz 90o com o Plano I. As definições das
grandezas mostradas na figura estão no corpo do texto.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 12
Os parâmetros azimute de mergulho ( n ) e mergulho verdadeiro ( n ), a serem
determinados e que definem o vetor n , associado à normal ao plano do estrato, definem
também a reta de maior declividade sobre o estrato. Por outro lado, B é o vetor, de
antemão conhecido, que define a orientação do eixo do poço. Por comodidade, os
parâmetros associados ao vetor B são azimute de caimento do eixo do poço ( B ) e
desvio do eixo em relação a direção vertical ( B ); observe que B é o complemento do
ângulo de caimento do poço.
Do plano I da figura 2.1 obtém-se a seguinte relação:
0cosBn . (2.1)
Pelo fato de que o ângulo 0 é comum à todas possíveis orientações do estrato, a equação
2.1 fornece um conjunto de soluções possíveis para o sentido e o mergulho verdadeiro do
estrato (Hesthammer & Henden, 2000). Em outras palavras, são descartados apenas os
valores de sentido e mergulho verdadeiro que são incompatíveis com a equação 2.1.
Usando coordenadas polares, a equação 2.1 pode ser expressa como:
0coscoscoscossensen),cos( BB nBnnBnBn (2.2)
em que n , n , B e B foram acima definidos. Utilizando um programa de computador
por nós desenvolvido, os valores de n e n são sistematicamente “varridos” em todos os
respectivos intervalos admissíveis, sendo armazenados apenas os pares de valores de n
e n que satisfazem à equação 2.2, dentro de um certo grau de confiança pré-
estabelecido. Um exemplo sintético de um conjunto de soluções está apresentado na
figura 2.2.
Para orientar um dado estrato, observada num testemunho, devemos confrontar o
conjunto de soluções possíveis para o sentido de mergulho e o mergulho verdadeiro, com
outros dados (que porventura estiverem) disponíveis, tais como dados de sísmica, dados
de dipmeter e dados de mapas de mergulho regional de topo e/ou base das camadas, de
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 13
modo a encontrar uma única solução para a orientação do estrato observado no
testemunho. Por exemplo, admita que, no caso sintético ilustrado na figura 2.2, o azimute
do estrato seja de 300 e que este estrato não esteja fortemente basculada. Nesta situação, o
mergulho verdadeiro do estrato é aproximadamente 50 (descartou-se a solução de
mergulho igual a 790).
Figura 2.2: Exemplo sintético de uma família de soluções para o sentido de mergulho e o mergulho verdadeiro do estrato. Neste caso, 0 = 47o 2o , tendo o poço azimute de 170o e inclinação em relação à vertical de 50o . Admita-se que é conhecida, a partir de dados sísmicos, o sentido de mergulho do estrato, por exemplo, igual a 30o Az. Deste modo, temos dois valores possíveis para o mergulho da camada: 5o e 79o. Na hipótese de que a região sofreu pouca deformação, pode-se descartar a possibilidade de mergulho igual a 79o,e a solução para o mergulho será 5o.
2.3 Orientação das Falhas
A figura 2.1 apresenta uma falha deslocando um estrato. O traço da falha no plano
I é definido pelo vetor 'D , que define a interseção do plano da falha com a seção do
testemunho (Plano I). Em geral, 'D não representa a reta de máxima declividade da falha.
A direção, desconhecida, da falha no espaço é definida pelo vetor unitário D , que é
perpendicular ao plano da falha. Os parâmetros que definem D são os ângulos D e D ,
respectivamente, mergulho e azimute de mergulho da falha. Em geral, D não está
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 14
contido em nenhum dos possíveis cortes longitudinais do testemunho. Todavia, os
parâmetros que definem D podem ser obtidos de medidas efetuadas sobre o plano I, já
definido, e sobre o plano II (figura 2.1). Este ultimo plano é também um corte
longitudinal no testemunho e que forma 900 com o plano I.
Vamos trabalhar primeiramente sobre o plano I. A relação espacial entre D , 'D ,
B e n (estes dois últimos vetores já definidos na seção anterior) é dada pela expressão:
nDBBDnDBnD' . (2.3)
Além disso,
cos'Dn , (2.4)
em que é o (menor) ângulo entre os vetores 'D e n . Como o sentido de 'D é
desconhecido, uma equação similar deverá ser escrita para 180o - (o ângulo
suplementar de ). Utilizando as equações 2.3 e 2.4, pode-se deduzir a expressão:
21
22 coscoscoscos2cos
coscoscoscos
nDnDBnBDBD
BDBnnD , (2.5)
em que nD é o ângulo entre os vetores unitários n e D , Bn é o ângulo entre os vetores
unitários B e , e n BD é o ângulo entre os vetores unitários B e D . De modo similar ao
utilizado na seção anterior, a equação 2.5 pode ser desenvolvida em coordenadas polares.
Usando a versão em coordenadas polares da equação 2.5, D e D (já definidos
como mergulho e azimute de mergulho da falha, respectivamente) podem ser
sistematicamente “varridos” nos seus respectivos intervalos fisicamente admissíveis, e os
pares de valores que satisfazem essa equação fornecem uma família de soluções
admissíveis (e associada ao ângulo ) para a direção da falha. Contudo, há ainda a fonte
de ambigüidade adicional, já referida: uma família de soluções deve ser também
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 15
construída para o ângulo suplementar de . Um exemplo sintético de um conjunto de
soluções para e seu suplemento está mostrado na figura 2.3.
Figura 2.3: Exemplo sintético de uma família de soluções obtida pela equação 2.5 em coordenadas polarespara o sentido de mergulho e o mergulho de uma falha. Neste caso, = 45o, n (mergulho verdadeiro do estrato) = 5o e n (sentido de mergulho do estrato) = 30o Az. Os parâmetros do estrato foram retirados dafigura 2.2. O poço tem azimute igual a 170o e inclinação em relação à vertical de 50o. A família de soluçõesinclui também 1800 - (o ângulo suplementar).
Vamos agora trabalhar sobre o plano II de modo a restringir ainda mais o conjunto
das soluções possíveis para a orientação da falha. No plano II é possível medir o
mergulho aparente da falha através do ângulo . Este ângulo e o ângulo (ver figura
2.1) satisfazem a relação:
tancos
tan, (2.6)
onde é o ângulo entre os vetores D e Bn . Estes dois últimos vetores ( D e Bn )
definem o plano III (figura 2.4) que, em geral, é de difícil acesso no testemunho.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 16
D
n x BTraço da falha
Plano III
Figura 2.4: Plano III composto pelos vetores D e Bn . D é o vetor normal ao plano da falha e Bn é o vetor normal ao plano I da figura 2.1. Em geral, o plano III não está acessível no testemunho. Neste plano, oângulo é amostrado.
Do plano III obtém-se a relação:
cosBn
DBn. (2.7)
Em combinação com a equação 2.6 e utilizando coordenadas polares, a equação
2.7 pode ser empregada para obter uma nova família de soluções, agora associadas ao
ângulo , para o sentido e o mergulho verdadeiro da falha (ângulos incógnitos D e
D ). Observe-se, contudo, que a equação 2.7 tem o mesmo tipo de ambigüidade referido
para a equação 2.5: uma família de soluções deve ser também construída para o ângulo
suplementar de . Um exemplo sintético de um conjunto de soluções para e seu
suplemento está mostrado na figura 2.5.
A interseção das duas famílias de soluções para a direção da falha, acima descritas
(uma associada ao ângulo , através da equação 2.5, e a outra associada ao ângulo ,
através da equação 2.7), fornece um conjunto discreto de soluções, em geral composto
por quatro pares de valores possíveis para o sentido e o mergulho da falha (figura 2.6).
Para selecionar uma solução única, é necessária alguma informação ou vinculo adicional.
Por exemplo, no caso de poços verticais, para eliminar os ângulos suplementares, basta
informar se a falha mergulha no mesmo sentido ou em um sentido oposto ao dos estratos
(Hesthammer & Henden, 2000).
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 17
No próximo capitulo, o método aqui descrito será aplicado às falhas presentes nos
testemunhos de sondagem do Campo de Xaréu.
Figura 2.5: Exemplo sintético de uma família de soluções obtida pela combinação das equações 2.6 e 2.7 em coordenadas polares para o sentido de mergulho e o mergulho verdadeiro de uma falha. Neste caso, = 47o e = 140o. Os parâmetros do estrato e do poço são os mesmos que foram usados na figura 2.4. A família de
soluções inclui também 180o - (o ângulo suplementar).
Figura 2.6: Exemplo sintético mostrando as interseções entre as duas famílias de soluções, dadas pelasequações 2.5 (em vermelho) e 2.6 em combinação com a 2.7 (em púrpura), para o sentido de mergulho e o mergulho verdadeiro da falha. As interseções são os valores matematicamente admissíveis para o sentido e mergulho da falha. Para escolher dentre estes valores uma solução única, é necessário informação geológicaou geofísica adicional.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 18
CAPITULO 3
ORIENTAÇÃO DAS FALHAS PRESENTES NOS
TESTEMUNHOS DO CAMPO DE XARÉU
3.1 Introdução
O método de método de Hesthammer & Henden (2000) será utilizado para
orientar populações de falhas amostradas em testemunhos de sondagem do Campo de
Xaréu. O horizonte de maior é interesse é o Calcário Trairí. Porém, devido à escassez de
testemunhos coletados nesse calcário, a análise da orientação foi estendida a todos os
testemunhos disponíveis do Campo de Xaréu, independentemente dos horizontes
amostrados.
Este capítulo está organizado da seguinte maneira: de início, apresentamos uma
descrição sucinta sobre a localização dos poços e dos testemunhos disponíveis. Em
seguida, descrevemos o procedimento experimental para medição, nos testemunhos, dos
parâmetros geométricos associados às orientações dos estratos e das falhas, com especial
ênfase na questão da identificação das rupturas de origem tectônica. Por último,
descrevemos a reorientação das estruturas presentes nos testemunhos, concluindo com
uma discussão desses resultados.
3.2 Localização dos Poços e Testemunhos do Campo de Xaréu
O Campo de Xaréu possui 38 poços e, dentre estes, apenas 7 foram
testemunhados (Farias et al, 1998). Todos os testemunhos têm diâmetro de 4 polegadas e
são não-orientados, isto é, a informação disponível resume-se ao topo e base de cada
testemunho (figura 3.1). Os poços que possuem testemunhos são verticais e se
encontram, na sua maioria, perto de grandes falhas (rever figura 1.4). Em 6 dos poços, os
testemunhos foram retirados da Zona A2 (Calcário Trairí) e em zonas adjacentes. A
tabela 3.1 (no final do capítulo) mostra a localização dos testemunhos.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 19
Figura 3.1: Exemplo de um testemunho, com indicação de base e topo, exibindo uma micro-falha normal na sua porção central.
Foram analisados 236,5 metros de testemunhos no Campo de Xaréu, sendo que,
destes testemunhos, 65 metros se encontram na Zona A2. Foram identificadas 77 falhas;
8 delas se localizam na Zona A2, a zona de maior interesse. Apesar de terem sido
encontradas poucas falhas na Zona A2, isto não quer dizer que esta zona não seja
fraturada, pois a probabilidade de um furo vertical detectar uma falha ou fratura não
horizontal, visível a olho nu, é, em geral, muito pequena. Por exemplo, de acordo com
Lorenz & Warpinski (1996), existe apenas 10% de chance de um testemunho com 4
polegadas, retirado de um poço vertical, amostrar um exemplar de fratura pertencente a
uma família de fraturas de alto ângulo regularmente espaçadas de 1,1 metro (figura 3.2).
Figura 3.2: Gráfico da probabilidade de intersecção de fraturas verticais por um poço vertical em função do espaçamento das fraturas para um testemunho com diâmetro de 4 polegadas (Lorenz & Warpinski, 1996).
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 20
3.3 Procedimento Experimental para Medição dos Atributos Geométricos nos
Testemunhos
Alguns critérios, a seguir descritos e discutidos, foram utilizados para identificar
as falhas naturais e medir os atributos geométricos dos estratos e das falhas, de modo a
garantir confiabilidade dos resultados. O critério principal para selecionar as falhas foi de
que estas deveriam estar truncando ou deslocando laminações (estratos), para que se
possa orientá-las em relação aos estratos (no caso de uma falha subparalela ao estrato, a
direção da falha é a mesma do estrato).
Uma das principais dificuldades encontradas foi o fato de que os testemunhos já se
encontravam cortados, não tendo sido o objetivo original deste corte o estudo da
orientação das estruturas. Deste modo, muitas vezes, o plano de corte não satisfaz
exatamente o requisito definido para o Plano I (rever figura 2.1), de que o corte
longitudinal do testemunho tenha sido realizado de tal modo a amostrar o maior ângulo
possível de mergulho do estrato, conforme observado no testemunho. De modo a ter um
controle desse desvio, o testemunho foi examinado de modo a avaliar qualitativamente se
o corte foi feito aproximadamente dentro das condições exigidas; foram utilizados no
estudo de orientação apenas os dados coletados em testemunhos em que se admitiu ter
sido dado um corte adequado.
Outra dificuldade foi identificar se as falhas eram de origem tectônica ou
“atectônica”. Nos testemunhos do Campo de Xaréu é comum a presença de estratos de
folhelhos que se mostraram facilmente desagregáveis. É possível que o alívio de pressão
que sofre o testemunho, após a sua retirada, contribua bastante nesse processo de
desagregação. Além disso, a perfuração também pode induzir fissuras. Para distinguir as
falhas “atectônicas” das falhas tectônicas, o principal procedimento utilizado foi verificar
se elas tinham algum tipo de preenchimento: todas as falhas que possuem algum tipo de
preenchimento foram admitidas como sendo tectônicas. Esse critério foi utilizado
principalmente nos casos em que as falhas não deslocavam os estratos.
Um critério adicional de consistência foi verificar se uma dada estrutura se
encontrava isolada ou fazendo parte de um “enxame” de estruturas. O número de rupturas
por unidade de comprimento, presentes nos testemunhos, foi utilizado como um critério
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 21
de localização de zonas de dano, seguindo a proposta de Hesthammer et al, 2000. A
figura 3.3 mostra os gráficos do número de rupturas por unidade de comprimento para
todos os setores testemunhados do Campo de Xaréu, indicando ainda a localização das
falhas. Admitindo-se a validade deste critério, a maioria das falhas analisadas no Campo
de Xaréu se localiza no interior de zonas de danos (figura 3.3) e seriam, portanto, de
origem tectônica.
Devemos chamar a atenção para o fato de que os testemunhos analisados do
Campo de Xaréu, em sua grande maioria, se encontram bastante deteriorados, pois eles
foram retirados há mais de 20 anos. Um exemplo de um testemunho deteriorado pelo
crescimento de cristais de sais é mostrado na figura 3.4.
Deve-se salientar também que a maioria das falhas analisadas, além de serem
obviamente pequenas, se localizam no meio dos testemunhos (figura 3.5). Devido a este
fato e ao estado de deterioração dos testemunhos, houve dificuldade de se obter o ângulo
(rever figura 2.1); a maioria dos testemunhos que receberam um corte adicional
vertical, para este estudo, se fragmentou.
A descrição sedimentológica dos testemunhos foi realizada pelo doutorando Alex
Francisco Antunes, aluno do PPGG/UFRN, sob a orientação do Prof. Dr. Virgínio
Henrique Neumann, pesquisador do DG/PPGEO/UFPE. A medição dos atributos
geométricos foi realizada pela autora deste trabalho, com o auxílio eventual do
doutorando Alex F. Antunes.
3.4 Análise dos Dados dos Testemunhos do Campo de Xaréu
O exame de identificação de falhas e fraturas foi realizado em todos os
testemunhos do Campo de Xaréu. O Anexo dessa dissertação apresenta todas as medidas
efetuadas para as falhas. Dos 7 poços testemunhados, não foi encontrada nenhuma falha
nos testemunhos do Poço CX-TT-01. Nos testemunhos do Poço CX-TT-07, identificou-
se apenas uma única falha, ocorrendo o mesmo com o Poço CX-TT-02. Em resumo,
apenas os testemunhos de quatro poços (CX-TT-03, CX-TT-04, CX-TT-05 e CX-TT-06)
(rever figura 1.4) apresentaram uma maior freqüência de falhas.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 22
Figura 3.3: Gráficos da profundidade versus o número de rupturas por metro para cada poço. A linha em vermelho apresenta o número de falhas por metro e a linha preta o número total de rupturas (fraturas e falhas) por metro. Os espaços em branco nos gráficos, por exemplo, no Poço CX-TT-04 entre 1584 a 1589, indicam que neste trecho não houve testemunhagem. Os testemunhos do Poço CX-TT-03 foram retirados logo abaixo da Zona A2. Os testemunhos dos poços CX-TT-02 e CX-TT-07 possuem somente uma falha.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 23
Figura 3.4: Foto de um testemunho deteriorado pelo crescimento de cristais de sais.
Figura 3.5: Foto de uma microfalha normal situada no meio de um testemunho.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 24
Os poços testemunhados do Campo de Xaréu são todos verticais. Desse modo, o
ângulo B (desvio da vertical do poço) (rever equação 2.2) é sempre igual a 00 e B
(azimute do eixo do poço) foi tomado arbitrariamente igual a 900. Assim, admitindo-se
que o corte do testemunho seja adequado, o mergulho do estrato medido no testemunho é
o mergulho verdadeiro do estrato, excetuando erros de medida. Por outro lado, a direção
ou sentido de mergulho do estrato constitui uma incógnita, já que o testemunho retirado
do poço foi rotacionado nessa operação e no manuseio posterior. A expressão gráfica
dessa incerteza no azimute do estrato é ilustrada na figura 3.6.
Figura 3.6: Conjunto de soluções para o sentido e o ângulo de mergulho do estrato do testemunho 04, caixa 04 e do Poço CX-TT-04.
Como já foi dito anteriormente, para obter uma solução única para o sentido e o
ângulo de mergulho do estrato, devemos confrontar o conjunto de soluções com algum
tipo de informação a respeito destas grandezas, para os estratos do Campo de Xaréu.
Infelizmente, em apenas um único poço estão disponíveis, simultaneamente, os dados de
dipmeter e uma seção testemunhada (tabela 3.1). Para vincular as demais soluções, os
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 25
principais dados utilizados foram os mapas estruturais de topo e base da Zona A2. A
seguir, detalhamos as informações utilizadas como vínculos.
3.4.1 Dados de Dipmeter
O dipmeter é uma ferramenta de micro-resistividade que faz três ou mais leituras,
em direções diferentes, da resistividade da formação. Deste modo, é possível obter a
informação de mergulho do estrato. O dipmeter foi muito utilizado na indústria do
petróleo para obter informações a respeito do mergulho dos estratos, especialmente antes
do advento das ferramentas de imagem. No Campo de Xaréu, somente o Poço CX-TT-03
apresenta testemunhagem e dados de dipmeter no mesmo intervalo. Os dados utilizados
do dipmeter estão apresentados na tabela 3.2.
3.4.2 Mergulho Regional das Camadas
Os mapas de contorno estrutural da base e topo da Zona A2 estão mostrados nas
figuras 3.7 e 3.8, respectivamente. Estes mapas foram obtidos da interpretação conjunta
de dados sísmicos e dados de poços do Campo de Xaréu (Fonte: PETROBRAS). Usando
os locais dos poços como referência, retiramos destes mapas estimativas para o mergulho
e azimute de mergulho da base e do topo da Zona A2. As estimativas “regionais” assim
obtidas estão mostradas na tabela 3.3. A utilização posterior destas estimativas é
fundamentada na hipótese de que as superfícies de topo e base da Zona A2 não são
superfícies erosionais de truncamento, ou, mais precisamente, a hipótese de que os
mergulhos dos estratos, nas proximidades da Zona A2, internamente ou externamente a
esta zona, são subparalelos ao mergulho da superfície limitante (topo ou base) mais
próxima.
Pelo fato de que o Poço CX-TT-05 se situa no ápice da estrutura de roll-over
(figura 3.7 e 3.8), não foi possível obter estimativas para o azimute de mergulho e
mergulho “regional” da camada. Por este motivo, na ausência de informações adicionais,
abdicamos de reorientar as estruturas medidas nos testemunhos desse poço.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 26
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 27
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 28
3.4.3 Resultados Obtidos para os Estratos
Um histograma com todos os mergulhos dos estratos medidos nos testemunhos
do Campo de Xaréu está mostrado na figura 3.9. Observe que o valor mais freqüente de
mergulho é igual a 20, e que 84% das estimativas se situam entre 00 e 80 (figura 3.9).
Interpretamos esse resultado como um indício de que a deformação neste campo é de
natureza principalmente rúptil e concentrada em grandes falhas, o que é consistente com
os dados de sísmica.
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 240
10
20
30
Núm
ero
deca
sos
Ângulo (grau)
Figura 3.9: Histograma de mergulho dos estratos. Foram realizadas 75 medidas de mergulho dos estratos, emtodos os testemunhos.
As figuras 3.10 a, b e c apresentam os valores medidos do ângulo de mergulho dos
estratos em função da profundidade, para os poços CX-TT-03, CX-TT-04 e CX-TT-06,
respectivamente. Em cada uma destas figuras está também apresentado o ângulo de
mergulho “regional”, obtido do mapa estrutural de topo ou base da zona A2, de modo que
é possível apreciar a variabilidade de mergulho “local” dos estratos em relação ao valor
de mergulho “regional”. Uma possível explicação para a maior ou menor variabilidade do
ângulo de mergulho “local” em relação ângulo de mergulho “regional” é o fato do
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 29
testemunho ter sido retirado de uma zona de danos. Uma outra explicação seria que os
testemunhos foram retirados de zonas onde ocorrem dobras sindeposicionais.
Consideramos esta ultima explicação menos plausível a julgar pela análise visual das
estruturas, que parecem ser principalmente de natureza rúptil.
a) Poço: CX-TT-03
1652,5 1653,0 1653,5 1654,0 1654,5 1655,0
0
3
6
9
12
15
18
21
24
27
30
Base da Zona A2
Ân
gulo
(gra
u)
Profundidade (m)
b) Poço: CX-TT-04
1660 1665 1670 1675 1680 1685 1690 1695 1700
0
3
6
9
12
15
18
21
24
27
30
Topo da Zona A2
Ân
gulo
(gr
au)
Profundidade (m)
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 30
c) Poço: CX-TT-06
1470 1480 1490 1500 1510 1520
0
3
6
9
12
15
18
21
24
27
30
Base da Zona A2Âng
ulo
(g
rau
)
Profundidade (m)
Figura 3.10: Mergulho dos estratos ( 0) versus a profundidade dos testemunhos das quais foram retirados os
dados. O traço horizontal representa o mergulho da base ou do topo da Zona A2; a) o Poço CX-TT-03 se
encontra próximo de uma falha de grande escala e seus testemunhos foram retirados abaixo da Zona A2; b) o
Poço CX-TT-04 se encontra afastado das grandes falhas; c) o Poço CX-TT-06 se encontra localizado entre
duas falhas de grande escala.
Para obter uma estimativa completa da orientação dos estratos, em cada poço,
adotou-se como sentido de mergulho o valor do azimute de mergulho “regional” do topo
ou base da Zona A2, no local do poço. Em síntese, em virtude da falta de informações
adicionais, a orientação final adotada para cada estrato falhado, identificada num
testemunho, é dada pelo sentido de mergulho “regional” e pelo ângulo de mergulho
“local”, medido no próprio testemunho, já que o poço é vertical.
3.4.4 Resultados Obtidos e Exercício Interpretativo para as Falhas
A título de exemplo, a figura 3.11 apresenta as estimativas do sentido e ângulo
de mergulho para a falha 1400 (figura 3.12), observada nos testemunhos do Poço CX-TT-
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 31
04. As quatro soluções matematicamente possíveis, encontradas no procedimento, foram
plotadas em um estereograma (figura 3.13). Analisando estas soluções, e o mapa de
contorno estrutural da Zona A2, pode-se verificar que todas as soluções são
geologicamente possíveis de ocorrer, associadas a diferentes modelos estruturais. Alguns
dos modelos associados às soluções estão representados na figura 3.14. Deve-se salientar
que a base destes modelos estruturais é a hipótese de que as todas as falhas,
independentemente da escala, resultaram de um mesmo padrão tensional. Esta hipótese
não pode ser admitida senão com reservas, porque Antunes (2002) descreveu a
ocorrência de pelo menos duas gerações de falhas com orientações cinemáticas distintas,
a partir dos marcadores associados (tipo de preenchimento e estrias).
De todo modo, seguimos nesta seção com um exercício de interpretação que tem
como base simplificadora a atribuição das falhas estudadas a uma única geração. Nesse
caso, elas são atribuídas ao evento principal de deformação, associados ao rifteamento e
geração dos continentes, o que ao menos confere maior respaldo às nossas conclusões.
Figura 3.11: Interseções dos conjuntos de soluções para a microfalha 1400 (Poço CX-TT-04). As interseçõesdos dois conjuntos de soluções fornecem quatro soluções matematicamente possíveis para o sentido e o ângulode mergulho da microfalha. Estas quatro soluções são: mergulho 68o/024o Az, mergulho 65o/148o Az,mergulho 65o/201o Az e mergulho 69o/330o Az.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 32
Figura 3.12: Foto da falha 1400 com os ângulos utilizados para calcular o conjunto de soluções para o seu sentido e o ângulo de mergulho.
Figura 3.13: Estereograma com as soluções matematicamente possíveis para o sentido e ângulo de mergulho da microfalha 1400 – Poço CX-TT-04. Na solução 01, o mergulho é 690/3300 Az; na solução 02, o mergulho é650/1480 Az; na solução 03, o mergulho é 680/0240 Az e, na solução 04 o mergulho é 650/2010 Az. Os pólos foram plotados no hemisfério inferior da esfera. Nos diagramas que se seguem serão apresentados apenas os pólos.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 33
Figura 3.14: Modelos estruturais associados às soluções 01, 02, 03 e 04 da figura anterior. a) Leque de falhasnormais (distensionais). Falhas secundárias sintéticas (S) à falha principal (P) - solução 01. b) As falhas secundárias são antitéticas (A), todas normais - solução 02. Para as soluções 03 e 04, as falhas secundárias seriam do tipo R ou T (falhas distensionais paralelas às fraturas T). c) Modelo de fraturas de segunda ordem numa falha transcorrente dextral com direção leste-oeste. d) Modelo de uma falha oblíqua normal com componente transcorrente dextral, com direção oeste-noroeste.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 34
A solução 01 indica que a falha analisada do testemunho poderia estar paralela à
falha de grande escala mais próxima do poço, com direção nordeste, sendo assim uma
falha sintética de pequena escala. A solução 02 seria uma falha antitética. As soluções 03
e 04 representam uma falha principal transcorrente dextral ou uma falha oblíqua normal-
transcorrente dextral, respectivamente. Nesse caso, a falha estudada poderia ser uma
fratura de segunda ordem, sendo T e R os tipos mais prováveis (classificação de Riedel).
De acordo com Jardim de Sá (2001) e Antunes (2002), o modelo cinemático mais
compatível para o Campo de Xaréu teria falhas normais com um componente de
transcorrência dextral, no contexto da Margem Equatorial Transformante (Matos, 2000).
Neste caso, os modelos (a) e (b), e especialmente (d) e (c), devem ser considerados como
pertinentes. Como exercício interpretativo, trabalharemos preferencialmente com as
soluções consideradas mais prováveis de ocorrer, que são as soluções do tipo T, R e FP
(Jardim de Sá, com. Verbal).
O tipo de análise acima descrito foi efetuado para todas as falhas observadas nos
testemunhos, considerando, tentativamente, que o modelo estrutural mais compatível é aquele
em que as falhas de segunda ordem estariam paralelas ou em baixo ângulo (R) com a falha
principal, ou alternativamente em posição diagonal (T no modelo (d) – figura 3.14). A falha
principal foi sempre considerada como sendo a falha mapeada pela sísmica mais próxima do
poço de onde foi retirado o testemunho. A tabela 3.4 apresenta todas as soluções
matematicamente possíveis encontradas para cada falha analisada do Campo de Xaréu. Os
resultados obtidos para cada poço seguem abaixo. Deve-se registrar que, pelo menos do
ponto de vista de direcionamento das pernas do poço, é relevante identificar apenas o
strike da falha.
A figura 3.15a apresenta todas as soluções matematicamente possíveis para o
mergulho e a direção de mergulho das falhas dos testemunhos do Poço CX-TT-04. As
soluções dos tipos FP, R e T delineadas por círculos, foram consideradas as mais
prováveis de ocorrer, de acordo com o modelo adotado (que foi o de preservar as
soluções do tipo FP, R e T associado com a falha de grande escala, mais próxima do
poço).
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 35
Todas as soluções matematicamente possíveis para o sentido e o ângulo de
mergulho das falhas presentes nos testemunhos do Poço CX-TT-03 são apresentadas na
figura 3.15b. Neste caso, não houve soluções compatíveis com as falhas de segunda
ordem do tipo FP, já que a direção da falha de grande porte mais próxima do poço é para
leste-nordeste (figura 3.7 ou 3.8). Uma explicação possível para a existência de falhas
secundárias mergulhando para nordeste ou sudoeste, seria a existência de uma
ramificação curva, não mapeada, à semelhança das falhas A e B ilustrada nas figuras 3.7
e 3.8.
Na figura 3.15c estão apresentadas todas as soluções matematicamente possíveis
para o mergulho e a direção de mergulho das falhas encontradas no Poço CX-TT-06. Um
fato importante neste poço é a presença de um grupo de soluções, bem consistente, de
direções de mergulho noroeste e sudeste, associado às falhas de maior porte encontradas
nos testemunhos. Este grupo de soluções está delimitado com círculos tracejados na
figura 3.15c. Além disso, existe um conjunto de falhas mergulhando sistematicamente
para nordeste e sudoeste. Os resultados obtidos para os testemunhos deste poço são, no
todo, compatíveis com o fato de que este poço se situa numa região bastante falhada do
campo, onde pode haver ramificações de strike noroeste.
Na figura 3.16 foram plotados todos os resultados encontrados e considerados os
mais prováveis para as falhas presentes nos testemunhos do Campo de Xaréu, dentro da
hipótese adotada. Observe que as direções de strike das falhas variam de noroeste a
nordeste. Sugerimos, com base nesses resultados, que as pernas do poço multilateral
sejam projetadas com direções nordeste e noroeste.
Os resultados aqui encontrados são compatíveis com o tipo de análise
apresentado por Hesthammer et al (2000), em particular no fato de que as microfalhas
estão associadas com zonas de danos de grandes falhas. Deve-se salientar que as grandes
falhas foram mapeadas com sísmica e é razoável que a variação, em direção, das
microfalhas seja bem maior do que aquelas das grandes falhas, conforme observado nos
mapas de contorno estrutural.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 37
a)
b)c)
Fig
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3.15
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Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 38
Figura 3.16: Estereograma com todas as soluções mais prováveis de ocorrer para as falhas analisadas nos testemunhos do Campo de Xaréu.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 41
CAPÍTULO 4
CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
Em relação às falhas analisadas, presentes nos testemunhos, deve-se salientar a
dificuldade encontrada de orientá-las por causa da escassez de dados, no Campo de
Xaréu, em comparação com outros campos de importância e tempo de explorações
semelhantes. Para ilustrar esta escassez, apresentamos abaixo uma tabela comparativa
sobre a distribuição de dados nos campos de Xaréu e de Gullfaks. Este último campo se
localiza no Mar do Norte e tem servido de área-teste para desenvolvimento de uma série
de estudos de natureza estrutural, utilizando dados geológicos e geofísicos (Hesthammer
& Henden, 2000).
Campo de Gullfaks Campo de Xaréu Área 55 km2 19 km2
Elementos para comparação Comprimentoamostrado
Proporçãocom a área
Comprimento amostrado
Proporçãocom a área
Testemunhos 6 km 109 m/km2 0,236 km 12 m/km2
Dipmeter 34 km 618 m/km2 2,864 km 150 m/km2
Tabela 3.5: Comparação de dados disponíveis nos Campos de Gullfaks e Xaréu.
Observe que a proporção testemunho/área no Campo de Gullfaks é quase 10
vezes maior que no Campo de Xaréu. Além disso, todos os trechos testemunhados do
Campo de Gullfaks estão também perfilados, com perfis sônicos e dipmeter, o que não
ocorre no Campo de Xaréu. Em particular, este último fato dificultou bastante a análise
de orientação das estruturas presentes nos testemunhos desse campo.
Contudo, ressaltamos que a metodologia utilizada é bem consistente e, mesmo
na ausência de muitos vínculos, resultados razoáveis foram encontrados. A maioria das
estratificações apresenta mergulho suave; 84% dos estratos apresentam mergulho entre 00
e 80, o que significa que as camadas não foram fortemente basculadas. Com isto, há uma
indicação de que a deformação ocorrida no Campo de Xaréu foi principalmente de
natureza rúptil e concentradas nas grandes falhas e zonas de danos a elas associadas.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 42
Em sua maioria, as falhas analisadas possuem mergulho forte; 62% das falhas
possuem mergulho entre 650 e 900. Admitindo a validade do modelo interpretativo
adotado, existem duas direções de strike preferenciais para as falhas, sudeste-noroeste e
nordeste-sudoeste. Estas direções de strike são consistentes com os resultados obtidos por
outras abordagens no “Projeto Multilaterais”.
A principal recomendação desta dissertação é de que as direções das pernas do
poço multilateral sejam noroeste-sudeste e sudoeste-nordeste, para que se possa
interceptar o maior número possível de rupturas. O poço multilateral deverá ser
construído em agosto/2002.
Outra recomendação é o uso da análise estrutural em testemunhos. Na maioria
das empresas de petróleo, somente são realizadas análises estratigráficas e petrofísicas
nos testemunhos. A análise estrutural é uma importante ferramenta adicional para se
obter informações sobre a estruturação do campo em escala subsísmica.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 43
BIBLIOGRAFIA
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Janeiro, Petrobrás/DEPRO. Relatório Interno.
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 45
ANEXO
ÂNGULOS MEDIDOS NOS TESTEMUNHOS
Para o estudo da orientação dos estratos, foram utilizadas todas as medidas do
ângulo 0. Por outro lado, para o estudo das falhas, foram utilizados somente os casos em
que foi possível de medir o ângulo (ver figura 2.1).
Código da
Falha
Poço 0 (grau) (grau) (grau) (grau)
0200 CX-TT-02 13 54 14 -
0400 CX-TT-03 5 21 106 -
0401 CX-TT-03 4 51 135 -
0402 CX-TT-03 7 12 95 175
0403 CX-TT-03 13 11 86 174
0404 CX-TT-03 9 9 87 173
0600 CX-TT-03 5 65 30 90
0601 CX-TT-03 7 56 42 90
0700 CX-TT-03 8 40 41 -
0701 CX-TT-03 8 3 85 -
0900 CX-TT-04 18 31 39 -
1100 CX-TT-04 2 46 133 -
1101 CX-TT-04 1 50 139 -
1102 CX-TT-04 2 26 119 -
1300 CX-TT-04 2 24 116 160
1301 CX-TT-04 2 16 76 165
1400 CX-TT-04 2 27 119 46
1600 CX-TT-04 2 35 58 -
1601 CX-TT-04 1 38 54 -
1700 CX-TT-04 3 12 81 -
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 46
1701 CX-TT-04 2 32 60 -
1800 CX-TT-04 4 35 49 -
1900 CX-TT-04 1 37 126 -
2100 CX-TT-04 4 39 47 -
2101 CX-TT-04 5 30 54 -
2200 CX-TT-04 2 30 122 -
2400 CX-TT-04 1 55 36 147
2500 CX-TT-04 3 61 24 -
2501 CX-TT-04 7 54 28 -
2502 CX-TT-04 7 55 26 -
2600 CX-TT-04 3 31 117 -
2700 CX-TT-04 3 47 140 -
2900 CX-TT-04 3 69 156 -
3100 CX-TT-04 1 50 38 109
3101 CX-TT-04 1 42 47 135
3102 CX-TT-04 2 42 54 155
3103 CX-TT-04 2 33 125 40
3104 CX-TT-04 1 41 130 41
3200 CX-TT-04 3 31 122 -
3201 CX-TT-04 3 20 106 -
3202 CX-TT-04 5 28 110 -
3300 CX-TT-04 1 74 17 -
3400 CX-TT-04 1 42 131 -
3800 CX-TT-05 3 49 35,5 75
3900 CX-TT-05 5 24 59 -
4300 CX-TT-05 1 4 91 179
4301 CX-TT-05 5 23 59 -
4302 CX-TT-05 2 39 49 -
4303 CX-TT-05 2 46 139 -
Domingueti, C.A. - Dissertação de Mestrado - PPGG/UFRN 47
4304 CX-TT-05 2 60 147 -
4305 CX-TT-05 0 47 42 -
4306 CX-TT-05 5 41 42 -
4307 CX-TT-05 6 53 29 -
4308 CX-TT-05 1 57 95 175
4400 CX-TT-05 3 28 68 -
4401 CX-TT-05 4 6 103 177
4402 CX-TT-05 4 15 81 -
4403 CX-TT-05 2 2 95 179
4404 CX-TT-05 3 34 61 -
4900 CX-TT-06 2 44 48 -
5900 CX-TT-06 4 52 140 80
6000 CX-TT-06 3 63 153 70
6300 CX-TT-06 19 2 108 135
6400 CX-TT-06 18 57 65 -
6500 CX-TT-06 12 25 80 170
6600 CX-TT-06 3 42 47 -
6700 CX-TT-06 18 45 25 -
6900 CX-TT-06 21 4 71 -
7000 CX-TT-06 3 43 135 -
7001 CX-TT-06 3 42 131 -
7200 CX-TT-06 4 4 91 179
7400 CX-TT-06 9 8 89 179
7401 CX-TT-06 2 24 66 -
7500 CX-TT-06 5 11 76 -
7501 CX-TT-06 6 27 113 -
7700 CX-TT-07 5 45 140 -