JUDEUS SEFARDITAS, Periodico PÚBLICO: May/12/2013

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  • 7/30/2019 JUDEUS SEFARDITAS, Periodico PBLICO: May/12/2013

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    6 | DESTAQUE | PBLICO, DOM 12 MAI 2013

    Eles no esqueceramPortugal, por justiaO norte-americano Yehonatan Elazar j decidiu que ir pedir a

    nacionalidade portuguesa. O brasileiro Luciano Lopes, tambm.Por uma questo de justia: descendem de judeus expulsosde Portugal no sculo XV. O Parlamento abriu-lhes a porta

    Tornar-se portugus vai passar aser tambm uma forma de re-parao da Histria. Uma his-tria de espoliao com maisde 500 anos, mas que LucianoMordekhai Lopes e Yehonatan

    lazar de Mota no esquecem, comoambm no esquecida por outrosue so, como eles, descendentes dos

    udeus expulsos de Portugal a partir

    o final do sculo XV.Em Abril, por iniciativa do PS e do

    DS, o Parlamento portugus apro-ou, por unanimidade, uma alteraoLei da Nacionalidade com vista a

    arantir que estes descendentes te-ham direito a tornar-se portugue-es sem necessitarem, para tal, deequisitos exigidos a outros candi-atos (obrigao de residncia noas h pelo menos seis anos e teremonhecimento suficiente da lnguaortuguesa). Tero, contudo, de fa-er prova da tradio de pertena ama comunidade sefardita de origemortuguesa, com base em requisitosbjectivos comprovados de ligao aortugal, designadamente apelidos,

    dioma familiar e descendncia.Entre os judeus existem duas gran-es comunidades que se distinguemela sua origem e ritos de cultos: osshkenazis, que tm razes na Europaentral; e os sefarditas, que descen-em dos judeus (espanhis e portu-ueses) que chegaram Pennsulabrica muito antes de existir Portugalque foram daqui expulsos a partiro final do sculo XV. Em Portugal, ardem de expulso foi dada em 1496or D. Manuel I: ou se convertiam aoristianismo ou tinham dez meses pa-a abandonar o pas.

    porto de abrigo em Portugal, masapenas por quatro anos, j que tam-bm eles se encontravam abrangi-dos pelo dito de D. Manuel I.

    Esther Mucznik, vice-presidente daComunidade Israelita de Lisboa, pre-v que no v ser tarefa fcil com-provar a descendncia sefardita por-tuguesa aps sculos de disperso e,muitas vezes, de mudana de nomedevido s converses foradas. MasLuciano Lopes e Yehonatan Elazarno tm dvidas quanto s suas ra-

    zes e confirmaram ao PBLICO que,na sequncia da alterao aprovadapelo Parlamento, iro requerer a na-cionalidade portuguesa.

    Por uma questo de justia,porque se trata simplesmente dedevolver algo que muitas pessoasperderam sem que essa fosse a sua

    vontade, explica por emailLucianoLopes, um rabi de 39 anos, nascidoem So Paulo, no Brasil, residente naFlorida, e que conheceu Portugal em

    jovem e voltou vrias vezes depois.Ele foi, alis, um dos pees de-

    terminantes para a mudana da lei.Durante 13 anos tentou em vo obterinformaes sobre a possibilidade deobter a nacionalidade junto de cn-

    sules portugueses em Vancver, Pa-ris, Telavive e So Paulo. Em 2010,depois de ter formado, com outrosdescendentes, uma comisso dejudeus sefarditas portugueses noestrangeiro, iniciou contactos comdeputados do CDS e do PS, levando-os a interessar-se pelo desejo que ex-pressaram o de recuperarem a na-cionalidade que fora retirada foraaos seus antepassados.

    Talvez o prximo lugar seja Por-tugal. Veremos, p! A frase escritaem portugus j uma ponte e com ela que Yehonatan Elazar termi-

    JUDEUS SEFARDITAS

    Clara Viana O que dizem os genes

    Fonte:American Journal of Human Genetics

    Genes de judeus sefarditas soos segundos mais comuns noshomens portugueses

    Homens do Norte de Portugal

    Homens do Sul de Portugal

    Genes magrebinos

    Genesmagrebinos

    Genessefarditas

    Genesibricos

    Genesibricos

    Genessefarditas

    64,723,6

    11,8

    47,636,3

    16,1

    %

    %

    Quantas pessoas foram afectadaspor este edital algo que no pos-svel saber, por no existirem dadosseguros sobre o nmero de judeusque ento viviam em Portugal, afir-mam ao PBLICO os historiadoresJos Tavim e Florbela Frade. Sabe-se, isso sim, que o seu nmero au-mentara substancialmente com achegada dos judeus expulsos de Es-panha em 1492 por ordem dos reiscatlicos e que encontraram um

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    PBLICO, DOM 12 MAI 2013 | DESTA

    PAULO PIMENTA

    Judiaria em

    Belmonte; direita,YehonatanElazar,saxofonista

    de jazz e rabi;ao lado, o rabiLuciano Lopes

    na a resposta em ingls que enviouao PBLICO via Facebook. Yehona-tan, 32 anos, saxofonista de jazz erabi, nasceu em Miami e descendedos judeus que viviam h sculos noespao que se tornou Portugal e da-queles que aqui chegaram expulsosde Espanha. o que conta a partirde Santo Domingo, na Repblica Do-minicana, onde dirige um centro deestudos religiosos (Beth Midrash).Seguimos o ritual judaico portu-gus, facto que nos orgulha, relata,acrescentando que muitos dos fiisdesejam agora obter a nacionalidadeespanhola ou portuguesa.

    Em Espanha, a possibilidade deconceder a nacionalidade a descen-dentes dos judeus expulsos foi apro-

    vada em 2006 desde que se compro-vem existir, em relao ao candidato,circunstncias excepcionais. Ospedidos so apreciados pelo Gover-no e, at 2012, foram aprovados 779,tendo sido considerado a seu favor ofacto de no terem perdido volunta-riamente a nacionalidade e de teremmantido a lngua e cultura espanho-la ao longo dos sculos.

    Sinais de pertenaNo caso dos descendentes dos ju-deus portugueses, Luciano Lopes,que tem com a mulher uma pequenaempresa do ramo alimentar, lem-

    bra, por exemplo, que uma das tra-dies que se mantm a do usode palavras ou frases em portugusnos servios religiosos na sinagoga,mesmo por quem no fale o idioma,e a preservao dos sobrenomes.

    Jos Tavim refere que foram os ju-deus em fuga de Portugal que estive-ram na origem, a partir do sculoXVII, das comunidades ditas portu-guesas de Amesterdo, Hamburgoe Londres e hispano-portuguesasde cidades do Sul da Frana comoSaint-Jean-de-Luz, Bayonne, Bor-dus, onde o portugus foi faladocomo em Portugal.

    significativo que estes judeus,quando se fixaram em Anturpia,

    Amesterdo, Hamburgo e Londres,tenham adoptado como designativopara a sua comunidade Nao Por-tuguesa e que existam comunidadeschamadas Portugal ou Portugali emMonastir [Tunsia] ou Salnica [Gr-cia], frisa Florbela Frade.

    Existiam ser o tempo verbal maisapropriado, j que os judeus deorigem portuguesa residentes emSalnica foram praticamente todosdizimados no Holocausto, apontaEsther Mucznik.

    Luciano Lopes conta que os se-farditas tinham muitas e diversifi-

    cadas ligaes familiares, que con-seguiram manter mesmo duranteo perodo da Inquisio, o que le-

    vou mais tarde a que muitos laostenham sido recuperados. Mas aSegunda Guerra Mundial veio prfim a esta realidade: Todas as co-munidades sefarditas da Europa fo-ram quase por completo destrudas.S em Amesterdo, mais de 80% da

    comunidade foi extinta.Fora de Israel, os principais locais

    de implantao dos judeus de origemportuguesa sero hoje o Brasil, Esta-dos Unidos e Carabas. Esther Mucz-nik acrescenta Marrocos e Tunsia aesta lista. Os antepassados de Lucia-no Lopes e Yehonatan Elazar come-aram por procurar refgio noutrospases europeus (Itlia e Holanda) es depois atravessaram o Atlntico.Rumo ao Brasil, no caso do primeiro,ou com destino a Curaau, ento nasAntilhas Holandesas.

    Foi este o percurso dos antepassa-dos do lado paterno de Yehonatan,que tinham como apelido De Mota:saram de Portugal com destino a

    Amesterdo no sculo XVII e parti-ram para as Carabas no sculo se-guinte. J do lado da me descendede uma famlia de judeus espanhis,os Cohen de Lara, que fugiu parao Porto aps a expulso de Espa-nha em 1492, seguindo depois paraAmesterdo e que no final do sculoXVII partiu para as Carabas (Jamai-ca e Curaau).

    Como testemunham os percursosdistintos destes dois lados da famliade Yehonatan, as principais ondasmigratrias de judeus espanhis eportugueses no foram coincidentes

    no tempo. Os primeiros tiveram defugir logo em 1492; os segundos, ape-sar de terem tido ordem de expul-so em 1496, s o comearam a fazermais expressivamente a partir da ins-taurao da Inquisio em Portugal,em 1536, refere Florbela Frade.

    D. Manuel I assinou o dito de ex-pulso dos judeus para obter o con-sentimento dos reis catlicos ao seu

    casamento com a herdeira de Espa-nha, mas como precisava de os man-ter no pas colocou toda uma sriede entraves sua sada, forando-os converso, sequestrando os seusfilhos e entregando-os a famlias cris-ts, explica aquela historiadora.

    Muitos destes judeus, que conti-nuaram a praticar a sua religio emsegredo, foram torturados e mortospela Inquisio. Na Torre do Tombo,em Lisboa, subsistem os processosinstaurados pelo Tribunal de SantoOfcio contra pelo menos dois dosmembros da famlia de origem deLuciano Lopes, os Bentalhado, que

    viviam no Norte do pas.

    Um gesto simblicoQuando soube da deciso do Parla-mento portugus, houve vrias per-guntas que assaltaram YehonatanElazar. Questes como esta: Porque que Portugal nos quer con-ceder a nacionalidade agora, cincosculos depois de nos ter confiscadoos nossos bens e de nos ter forado converso? Conta que a me, Mo-desta Lara, v este gesto como umpedido de desculpa pelo passado, oque a alegra, embora considere queos dirigentes portugueses actuais noso responsveis pelo mal feito aos

    seus antepassados. Sacrescenta, ela diz qr possvel abandonarEUA para comear agPortugal. Quanto a Yrequerer a nacionalidapor causa do significque tem para ele.

    um gesto simbnhecimento da injus

    contra os judeus de P1496 e 1821, data da equisio, diz Esther Ma deciso do Parlamra no se possa mudpode-se tentar constrhistria, acrescenta

    O que s poder ser tambm um maior conpassado. Pelo que os glao actual mostramportugueses que tm udo judeu, mas da sualonga em Portugal acasistir hoje muito poumateriais, constata Josque, para ele, no expo inusitado cultural (

    inexistncia de um Mem Lisboa, uma capitadas mais importantesjudaicas da Europa Oonde tantos partiramreinos e continentes

    Florbela Frade revepoca funcionava edos centros mais conpoesia e de cpia de mque hoje pouco ou nOs livros foram destrsobreviveram esto nem bibliotecas estranTiago Luz Pedro