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7/25/2019 Is Bn 9788539301874 http://slidepdf.com/reader/full/is-bn-9788539301874 1/397 A figueira Sarita Leonel e Aloísio Costa Sampaio (Orgs.)

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    A figueira

    Sarita Leonel eAlosio Costa Sampaio (Orgs.)

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    A FIGUEIRA

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    FUNDAO EDITORA DA UNESP

    Presidente do Conselho Curador

    Herman Jacobus Cornelis Voorwald

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    Editores-Assistentes

    Anderson NobaraHenrique Zanardi

    Jorge Pereira Filho

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    2011 Editora UNESP

    Direitos de publicao reservados :

    Fundao Editora da UNESP (FEU)

    Praa da S, 108

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    CIP-BRASIL. CATALOGAO-NA-FONTESINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

    F485

    A figueira / Sarita Leonel e Alosio Costa Sampaio (Orgs.).So Paulo: Editora Unesp, 2011.

    Inclui bibliografia

    ISBN 978-85-393-0187-4 1. Figo Cultivo. I. Leonel, Sarita, 1965-. 2. Sampaio, AlosioCosta. I. Ttulo.

    11-7109 CDD: 634.37CDU: 634.37

    Este livro publicado pelo projeto Edio de Textos de Docentes e

    Ps-Graduados da UNESP Pr-Reitoria de Ps-Graduao

    da UNESP (PROPG) / Fundao Editora da UNESP (FEU)

    Editora afiliada:

    Asociacin de Editoriales Universitarias

    de Amrica Latina y el Caribe

    Associao Brasileira deEditoras Universitrias

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    SUMRIO

    1 Figo, histria e cultura 9

    Lin Chau Ming, Maria de Nazar ngelo Menezes,

    Gutemberg Armando Diniz Guerra

    2 Aspectos econmicos da produo e comercializaodo figo 57

    Aldir Carlos Silva, Marco Antonio da Silva Vasconcellos,

    Rubens Nei Brianon Busquet

    3 Aspectos botnicos e biologia reprodutiva da figueira 67

    Rafael Pio, Sarita Leonel, Edvan Alves Chagas

    4 Propagao da figueira 77

    Manoel Euzbio de Souza, Sarita Leonel

    5 Variedades de figueira 93

    Rafael Pio, Edvan Alves Chagas

    6 Exigncias climticas da figueira 111

    Adilson Pacheco de Souza, Andra Carvalho da Silva

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    7 Ecofisiologia da figueira 123

    Andra Carvalho da Silva, Sarita Leonel

    8 Manejo da poda da figueira 151

    Sarita Leonel, Alosio Costa Sampaio

    9 Planejamento e instalao do pomar 167

    Erval Rafael Damatto Junior

    10 Uso da irrigao suplementar em figueira 177Adilson Pacheco de Souza, Sarita Leonel

    11 Manejo nutricional da figueira 195

    Sarita Leonel, Rubem Marcos de Oliveira Brizola

    12 Adubao orgnica da figueira 221

    Sarita Leonel, Ronaldo Simes Grossi

    13 Manejo de culturas intercalares no pomar de figueira 237

    Jaime Duarte Filho, Sarita Leonel

    14 Utilizao de fitorreguladores na cultura da figueira 255

    Emerson Dias Gonalves, Joo Vieira Neto, Fabola Villa

    15 Doenas da figueira 267

    Emi Rainildes Lorenzetti

    16 Pragas de importncia econmica da figueira 279

    Thase Karla Ribeiro Dias, Everton Pires Soliman,

    Alosio Costa Sampaio

    17 Produo integrada de figo 305

    Jos Augusto Maiorano

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    1FIGO, HISTRIAECULTURA

    Lin Chau Ming

    Maria de Nazar ngelo Menezes

    Gutemberg Armando Diniz Guerra

    Introduo

    A histria do figo remonta poca, no se sabe exatamente

    quando, do incio da domesticao das plantas pelo homem. Comouma espcie encontrada na forma selvagem na natureza, ano apsano, sculo aps sculo, passados alguns milnios desde que oprimeiro ser humano a considerou apta para o consumo, foi sendomoldada para os mais requintados e exigentes gostos e manipuladapara produzir mais, ser maior/menor/diferente, mais colorida/doce/macia, nas mais diversas pores de nosso planeta, consti-

    tuindo-se em importante alimento.Essa histria pode ser escrita na forma de informaes cientficas

    observadas em pesquisas arqueolgicas (algumas paleoetnobotni-cas), tratados agronmicos/botnicos e escritos sobre a evoluo da

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    culinria e da alimentao humana e em pesquisas etnobotnicas.Pode ainda existir na forma de estrias contadas de gerao emgerao, muitas delas perpetuadas na forma de escritos, diversosdeles annimos, desde tempos imemoriais, e que at hoje so aindacontadas, cantadas e reinventadas. Algumas delas transformaram-seem lendas ou mitos, em contextos apropriados ao seu surgimento.Mesmo nesse tempo da informao digital, da facilidade decomunicao escrita e eletrnica, muitas dessas estrias ainda sotransmitidas oralmente, reconstituindo o tempo passado, reforandoos domnios culturais existentes das populaes humanas e maravi-lhando a imaginao de adultos e crianas.

    O figo nas escavaes arqueolgicas

    A Arqueologia uma cincia que permite descobrir e interpretaras atividades humanas de pocas passadas. Associar Arqueologia

    com Botnica, e mais do que isso, com Etnobotnica, contribuipara que se entenda quais e como as plantas foram consumidas edomesticadas pelo homem. Fatores culturais e ambientais interfe-rem na conservao de vestgios pr-histricos em vrias regies doglobo onde, supe-se, comeou a histria da relao do homen comas plantas cultivadas.

    Entre as pesquisas paleoetnobotnicas do Oriente Mdio e da

    Europa, h o trabalho de Jane M. Renfrew. Nesse trabalho, estudossobre o figo so apresentados indicando figos fossilizados em dep-sitos do Tercirio e Quaternrio na Frana e na Itlia. Esses figosfossilizados so menores e se parecem com os figos cultivados nosdias atuais (Renfrew, 1973).

    Raramente encontram-se figos em materiais paleoetnobotnicos,mas quando isso acontece, os materiais carbonizados esto bem con-

    servados, a exemplo dos encontrados em Jeric, da Era Neoltica, eem Gezer, na Palestina (Flandrin & Monatanari, 1998), indicandoserem de 5000 a.C. A morfologia do fruto/semente proporcionouesse fato.

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    Outras evidncias so os stios encontrados na Grcia e naMesopotmia, do final da Era Neoltica. Figos tambm foramencontrados em regies alpinas da Sua e no norte da Itlia, datadosda fase final da Idade do Bronze, indicando terem sido transportadospara aquelas regies, dadas as caractersticas climticas desfavorveisao seu desenvolvimento (Renfrew, 1973). Essas regies apresentamclima muito frio, nevado, imprprio ao crescimento do figo.

    Em outros locais neolticos foram encontradas sementes de figos,como em Tell Asward, na Sria (7800 a 6600 a.C.), e em Jeric (porvolta de 7000 a.C.), provavelmente de frutos selvagens coletadospor caadores-coletores da poca (Roberts, 2001). Jonathan Robertsressalta que as sementes fossilizadas foram encontradas em stios novale do Rio Jordo e em rea do Mar Morto com datao indicativade 3500 a.C., e que as caractersticas so de figos cultivados, con-forme evidncias encontradas em escritos sumrios em placas deargila que garantem que eles teriam sido cultivados na Mesopotmiamil anos mais tarde (ibidem).

    Ucko & Dimbleby tambm afirmam que sementes fossilizadasde figo podem ser detectadas em muitas amostras depois do pri-meiro assentamento em Jeric e que apenas uma vez foi encontradaa polpa do fruto, em virtude da fragilidade de seus tecidos (Ucko &Dimbleby, 1969).

    Figos tambm foram gravados no Egito por volta de 2750 a.C.,com representaes grficas de colheita datadas de 1900 a.C. Essas

    evidncias esto no tmulo de Knunhotep, em Beni Hasan (Berral,1966; Roberts, 2001; Edlin, 1969). H, inclusive, nessas evidncias,um interessante mural com o desenho da colheita de figo e presenade macacos nas rvores dessa fruta.

    Outra evidncia da presena do figo nos jardins egpcios a maquete encontrada no tmulo de Meketre, chanceler do reiMentuhotep II, datado de 2000 a.C. Tal maquete foi esculpida em

    madeira pintada de verde, mostrando um jardim com um criatriode peixes sombreado por figueiras (Hobhouse, 1993).

    Van Wyk escreve que o figo um dos mais antigos cultivos,de acordo com informaes arqueolgicas que indicam que ele

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    cultivado desde 4000 a.C. na Mesopotmia e no Egito Antigo (VanWyk, 2005).

    Presente em pomares e jardins, vasta a ilustrao sobre sua pre-sena como planta cultivada e de uso difundido na histria agrcolada humanidade, em particular no Egito (Wright, 1934; Hyams,1971; Cowell, 1978.). Importantes registros iconogrficos demons-tram a relevncia do cultivo de rvores frutferas na regio naquelapoca, quando a humanidade aprofundava seus conhecimentossistemticos do cultivo de espcies vegetais.

    No livro de Zohary & Hopf (2004) sobre domesticao de plantasdo Velho Mundo, os autores citam que o figo a terceira espciearbrea frutfera associada com o incio da horticultura na BaciaMediterrnea. Fazia parte dos elementos constituintes dos sistemasde produo alimentares das populaes do Mediterrneo, sendoconsumido no vero como fruta fresca e nas outras estaes comofigo seco, rico em acar.

    So vrios os autores que relatam evidncias arqueolgicas a

    partir de sementes fossilizadas encontradas em stios desde a fase ini-cial Neoltica no Oriente Mdio, em lugares como Netive Hagdud,Israel (entre 7900 a.C. e 7500 a.C.). Foram encontrados vestgios defigo na parte oeste do Mediterrneo, do perodo Mdio Neoltico;em Grotta dellUzzo, na Siclia; e, da Era do Bronze, em Vallegio,no norte da Itlia (ibidem).

    Na regio de Creta e Chipre, evidenciando as origens da agri-

    cultura na Era Acermica Neoltica, foram encontrados locais comvestgios da espcie (Colledge & Conolly, 2007). O mesmo ocorreuem stios arqueolgicos do Neoltico em reas no norte da Itlia(Rottoli & Pessina, 2007) e no oeste do Mediterrneo (Bux, 2007).

    De Candolle (1885) apresenta um fato curioso acerca da exis-tncia do figo em pocas antigas na Frana. Segundo ele, foramdescobertas, em escavaes em estratos quaternrios de turfas de

    Montpellier e Saporta, e ainda perto de Marselha e Paris, folhas emesmo frutos de figo selvagem em dentes de Elephas primigenius,um mamute, juntamente com folhas de outras plantas, entre as quaisalgumas no mais existem, e outras, como a Laurus canariensis, que

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    dados anteriores, como nesse exemplo citado. Essa situao no uma especificidade daquela poca, ainda sendo comum esse tipo dedificuldade em nossos dias.

    Em De Candolle (1885, p.294) encontra-se indicao de regiotendo como pressuposto que no final do sculo XIX as dificuldadesde se estabelecer os limites de supostas reas de ocorrncia eramgrandes:

    As figueiras crescem selvagens, ou quase selvagens, sobre uma

    vasta regio da qual a Sria quase o centro, quer dizer, do leste da

    Prsia, ou mesmo do Afeganisto, cruzando toda a regio mediterr-

    nea, to longe quanto as ilhas Canrias. Do norte at o sul esta zona

    varia em largura do paralelo 25 at o paralelo 40 ou 42, conforme as

    circunstncias locais. Como regra, o figo para, como a oliveira, nos

    ps do Cucaso e as montanhas da Europa que limitam a bacia do

    Mediterrneo, mas ele cresce quase selvagem na costa sudoeste da

    Frana, onde o inverno muito ameno. (traduo nossa)

    A dificuldade de se ter uma definio mais precisa do centro deorigem do figo, assim como de muitas das espcies vegetais culti-vadas, notada, uma vez que outros autores tambm fazem, porsegurana, delimitaes geogrficas muito amplas, como Vavilov(1951, p.34, traduo nossa), que, em seu clssico The Origin,Variation, Immunity and Breeding of Cultivated Plants, incluiu o figo

    no quarto centro de origem, o do Oriente Mdio, [...] incluindo ointerior da sia Menor, todo o Transcucaso, Ir e as terras altas doTurquemenisto, ou Harrison et al. (1969, p.94), na publicao daOxford University Press, que indicam ser

    [...] provavelmente nativa da sia Ocidental, tendo sido cultivada

    por seus frutos em tempos muito antigos e est espalhado em

    regies temperadas e subtropicais mais quentes. Muitas vezes autossemeada e naturalizada, mesmo to longe ao norte como as

    Ilhas Britnicas. (traduo nossa)

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    Harlan, famoso pesquisador de plantas cultivadas, em seu livroCrops & Man, incluiu o centro de origem do figo na sia Menor,ou Turquia-Ir-Iraque (Harlan,1992). Hancock, em seu livro PlantEvolution and the Origin of Crop Species, coloca seu centro de origemno Oriente Mdio (Hancock, 1992); Van Wyk o coloca como origi-nrio da regio Leste do Mediterrneo (Van Wyk, 2005) e Simpson& Ogorzaly (1995), apenas do Mediterrneo. Holden, Peacock &William (1993) repetem o expresso por Harlan.

    No trabalho enciclopdico de Hedrick (1972, p.268),Sturtevants Edible Plants of the World, o figo dito ser indgenana Sria, Prsia, sia Menor, Grcia e Norte da frica e tem sidocultivado nesses pases desde tempos imemoriais e mesmo todistante quanto o sul da Alemanha (traduo nossa), enquantoBianchini & Corbetta (1976, p.166), no livro The Complete Book ofFruits and Vegetables, informam que o figo encontrado em umavasta rea ininterrupta do Leste do Ir at as ilhas Canrias, atravsde pases mediterrneos. Acredita-se que tenha vindo da Sria

    (traduo nossa).Autores ligados rea de horticultura, mais recentemente, aca-

    bam por ter a mesma dificuldade em definir com exatido o centrode origem e acabam repetindo outros autores que j haviam se mani-festado quanto a essa questo. Julia Brittain, em seu livro publicadopela Editora Horticulture Books, Ohio, Estados Unidos, coloca oseguinte: o figo, Ficus carica denominado por causa desta antiga

    regio nas montanhas no extremo da parte sudoeste da sia Menor.Ela agora parte da Turquia, prxima s ilhas gregas de Rhodes eKos (Brittain, 2006, p.47, traduo nossa).

    Outros pesquisadores, como Hyams (1971, p.107), seguemDe Candolle em definir o habitat original do figo selvagem comoas partes mdias e sul da bacia mediterrnea, da Sria at as IlhasCanrias e indo em direo leste at Prsia ou Afeganisto (tra-

    duo nossa). Segundo o mesmo autor, o figo selvagem nativo daGrcia, porm os gregos no o domesticaram.

    Autores brasileiros tambm manifestaram suas opinies. Corra(1984), em sua memorvel obra-prima Dicionrio das plantas teis

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    do Brasil e das exticas cultivadas, faz uma aproximao geral,afirmando:

    Parece fora de dvida que esta espcie originria da Cria dos

    antigos, vasta regio da sia Menor situada entre o oceano e a Lcia,

    a Ldia e a Psdia, porm, para maior facilidade de compreenso, diz-

    -se simplesmente ser originria da bacia do Mediterrneo, de onde

    muito cedo foi levada para outros pases bem distantes, inclusive o

    arquiplago das Canrias, a introduzida pelos Brberes navegado-

    res, se porventura tambm no indgena dali.

    Observa-se ento nos trabalhos que algumas certezas geogrficascom delimitaes imprecisas, ou algumas delimitaes precisas comincertezas geogrficas, refletem as dificuldades de se recompor aconstruo da origem do figo.

    Uso do figo ao longo do tempo

    O figo tem sido usado tanto como alimento quanto como plantamedicinal desde os tempos antigos e essa evoluo pode ser vista nascaractersticas da planta evidenciadas pela Arqueologia, em citaeshistricas, como as bblicas, e no conhecimento popular.

    Conforme registros arqueolgicos, o figo uma planta que vem

    sendo consumida desde pocas muito antigas, o que confirmadopor provas de comensais desse fruto em tempos e regies distin-tas. Desenhos de figos datando de sculos antes de Cristo foramencontrados na Pirmide de Gis, no Egito. As plantas eram indu-bitavelmente conhecidas na Babilnia, sendo cultivadas nos famososJardins Suspensos do reinado de Nabucodonosor II (604 a.C. a 562a.C.). Os frutos eram comercializados pelos antigos comerciantes

    gregos e fencios, que podem ter sido os introdutores desse cultivona Itlia (Heinerman, 1988).

    O figo mencionado trs vezes na Odisseiade Homero, indi-cando ter Ulisses recebido vinte rvores de figo de seu pai, todas com

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    nomes distintos. Plnio, no primeiro sculo da Era Crist, listou 29variedades de figo, indicando os lugares onde eram encontradas, oque tambm foi referido por Cato, que acrescentou outras varieda-des quela lista (Condit, 1955).

    Aristteles, Teofrastus e Dioscrides falam dele como uma plantacultivada por um longo tempo e cujos frutos, especialmente quandosecos, eram altamente apreciados (Bianchini & Corbetta, 1975).

    Por volta de 1500 a.C., depois do estabelecimento do NovoReino no Egito, rvores nativas e flores foram intensamente plan-tadas, sendo acrescidas provavelmente pelas trazidas do Leste eSudoeste do Mediterrneo, incluindo-se entre elas o figo. Diversosbaixos-relevos e pinturas dessa poca encontradas nas pesquisasarqueolgicas mostram o figo cultivado nos jardins dos faras egp-cios (Richardson & Stubbs, 1978; Hobhouse, 1993).

    As evidncias apontam que provavelmente o uso principaldo figo nos perodos pr-histricos do homem tenha sido comoalimento. Os vestgios encontrados conservaram apenas caracters-

    ticas de que foram consumidos, mas podem ter sido utilizados comfinalidades medicinais, semelhana de outras partes de vegetaisou outros produtos.

    Entre as evidncias existe uma placa com escrita cuneiformedos sumrios que recomenda misturar tomilho seco e pulverizado,peras e figos com cerveja e leo, e usar a pasta como emplastro(Roberts, 2001).

    O uso medicinal do figo tambm citado na Bblia, conforme sepode atestar com o trecho seguinte: Isaas disse ento: Que tra-gam um cataplasma de figos para aplicar sobre a lcera, e Ezequiassarar (Isaas 38:21). Krymow (2002), em seu livro dedicado splantas medicinais da Sagrada Escritura, ressalta que em Reis II(20:7), a citao bblica contm o mesmo sentido daquele refletidono trecho anterior e tambm coincide com o uso feito pelos sumrios,

    conforme citado anteriormente.Figos eram usados na medicina do Egito desde tempos antigos,

    tanto internamente, como purgativo e para doenas estomacais,quanto externamente, para dores musculares e dores nas costas.

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    Os assrios usavam figos como emplastro, da mesma forma comoregistros encontrados na Bblia.

    Em seus trabalhos sobre a histria natural de Pompeia, Plnioe Dioscrides mostram muitos usos medicinais dessa planta(Jashemski, 1999). Eles fornecem uma vasta lista de curas realiza-das usando o ltex ou o fruto do figueira, preparado de diferentesmaneiras.

    Plnio recomendava o figo para remover excrescncias da pele,e Dioscrides e Celsus, como de uso laxativo. Este ltimo tambmrecomendava o figo cozido em gua para remover certos tipos deexcrescncias cutneas. Scribonius usava figos secos em decoctopara tratar abscessos da garganta (ibidem). Nessa mesma obra sobreas plantas medicinais usadas pela populao da extinta Pompeia,Soranus lista um supositrio feito de figos secos para ser usado comocontraceptivo.

    Na Antiguidade, gregos e romanos tinham conhecimento deplantas usadas tanto para o controle de natalidade quanto para o

    aborto e dominavam as diferenas entre seus usos. Segundo Soranus(1991, p.62), muito melhor no conceber do que destruir oembrio, em uma posio religiosa semelhante existente hoje. Asdefinies se distinguem: um contraceptivo difere de um aborto,pelo fato de o primeiro no deixar a concepo ocorrer, enquanto oltimo destri o que foi concebido. Deixe-nos, ento, chamar um deabortivoe o outro de contraceptivo.

    Essas referncias indicam a importncia do uso do figo na medi-cina e evocam a tradio religiosa da Igreja Catlica, que advogacontra as situaes contraceptivas e abortivas.

    O uso do figo na Europa entra na composio dos quatro fructospeitoraes; cozidos em leite so bons para gargarejos e combatem a dorde garganta, segundo apresentado em Chernoviz (1890, p.1175).

    Algumas plantas contm compostos que podem ser fotossens-

    veis, havendo evidncias de que o figo pode provocar fotodermatiteno homem (Lewis & Elvin-Lewis, 1977). Essa alergia pode sercausada por compostos fenlicos nitrogenados, acoplados com umanel aromtico tambm nitrogenado, este muitas vezes hidroxilado.

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    Segundo Wolf (2004, p.49), o figo usado na medicina popular,comendo-se os frutos secos para constipao e problemas digestivos,assim como para anemia. Assim diz a receita neste livro:

    Ferver cinco figos em gua quente, deixando-os nessa gua por

    trs dias; filtrando-se a mistura, obtm-se um xarope que efetivo

    em casos de m digesto e anemia, assim como para curar gripes e

    febres. A dosagem recomendada cinco colheres cheias por dia.

    (traduo nossa)

    O autor continua:

    [...] o lquido branco leitoso (ltex) que exsuda dos ramos da

    figueira quando so quebrados, efetivo no tratamento de con-

    tuses e feridas purulentas se aplicado diversas vezes. Cinco a dez

    gotas desse mesmo lquido podem ser misturadas em gua quente e

    aplicados em infeces dos olhos. (ibidem)

    A espcie ainda faz parte da composio de um laxante (xaropede figos) usual na Farmacopeia Britnica (Harrison; Masefield;Wallis, 1969).

    No Brasil so vrias as indicaes populares para o uso terapu-tico do figo, tais como peitoral, emoliente e laxativo. indicadotambm para combater tosses, bronquites e outras molstias do

    aparelho respiratrio (Cruz, 1985, p.353-4).Martius j havia citado a espcie em suas atividades medicinais

    em meados do sculo XIX, quando esteve no Brasil e conheceu asplantas medicinais utilizadas pelos moradores brasileiros, o queinclua espcies nativas e exticas (Martius, 1852). Nessa publicaosobre plantas medicinais, ele apresenta informaes sobre o uso dofigo, com o uso de fruto fresco ou seco, chamado por ele de Ficus

    passae, ou ainda na forma Caprificus.A referncia ao figo como alimento subjacente a todo esse tra-

    balho, destacando-se citaes sobre seu uso desde o Antigo Egito,atravessando praticamente toda a histria da civilizao humana,

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    usado seja como complemento aucarado de pes e bolos, seja comoalimento consumido fresco ou seco. Dele tambm se produzia vinhode alto teor alcolico (Flandrin & Montanari, 1998) e a quantidadede vezes em que citado tanto na literatura sagrada quanto na pro-fana d conta de sua importncia em praticamente todo o mundo.

    Pelo fato de ser facilmente conservado ps-colheita, na formade passa, desidratado, seco, pode ser difundido em praticamentetodos os continentes, sendo muito popular na Europa e sia desdetempos imemoriais.

    O figo torrado e modo substitui ou complementa o caf e,segundo Lewington (1990), o mais luxuriante de seus substitutos.Os cafs da ustria e Bavria so bem conhecidos por essa adio.

    Dos figos secos se obtm, por destilao, apreciada aguardente(Cruz, 1985). De suas folhas pode-se produzir licor, conformereceita disponvel em diversos websitese de fcil execuo (Licor,2009).1

    Variedades de figos pretos e roxos podem ser consumidas fres-

    cas, enquanto aqueles com epiderme verde so ricos em glucdeos egeralmente so consumidos secos.

    Figos fermentados produzem um vinho muito leve e o ltex queexsuda dos ramos usado para fazer uma goma de mascar alternativa(Viard, 1995).

    So muitas as histrias ligadas ao fabrico de derivados do figo edo sucesso pelo seu emprego adequado, como a da receita especial

    de doce de figo cristalizado que teria sido a razo de sustento de todauma famlia, em Guaratinguet, no estado de So Paulo, durantedcadas (Fontes, 2009). De fabricao artesanal e caseira, o sucessoda receita permitiu a produo em srie com a instalao de umafbrica para produo em escala ampliada.

    1 Ingredientes: folhas de figo, garrafa de pinga; 3 copos de acar. Modo defazer: Lave, enxugue e amasse as folhas de figo. Coloque-as em infuso com apinga, durante 4 dias. Faa uma calda grossa com o acar. Deixe esfriar e junte pinga coada, sem as folhas. Misture bem e guarde em garrafas por 10 dias,antes de servir (Licor, 2009).

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    Os significados das palavras mudam no tempo histrico, sociale cultural. Os nomes dados s coisas e aos vegetais, por exemplo,podem sofrer influncias dessas variantes. Se uma espcie origi-nria de uma determinada regio, seus moradores, os primeiros quea conheceram ou a usaram, podem dar um nome a ela, sob diversasjustificativas. Muitas espcies recebem ento os nomes dos locais.Quando uma espcie no originria dessa regio, tendo sido nelaintroduzida, seus moradores podem se referir a ela a partir do nomeconhecido na regio de origem ou na regio onde essa espcie erausada, ou ainda podem dar um nome diferente a ela, associado ouno ao nome j conhecido.

    No dicionrio Vocabulrio Portuguez e Latino, de RaphaelBluteau,o verbete figo apresenta as seguintes definies:

    1. fruto da figueira, do tamanho & quase da figura de uma pera

    mea; he molle, carnoso, succulento, viscoso, delicioso ao gosto &

    cheo de huns grasinhos chatos, & redondos, a que o vulgo chama

    Milharas.2. enfermidade nos cascos dos ps, ou mos do Cavallo. He huma

    carnosidade exterior nas ranilhas, & s vezes participa da palma.

    Chama lhe figo, porque o parece pela figura; tem sua raiz, & se se

    no tira bem, vem outra vez, como gavarro. (Bluteau, 1712, p.112)

    No Diccionario de Medicina Popular e das Sciencias Acessorias,

    de Chernoviz, publicado em 1890, em Paris,o mesmo verbete con-tm a definio botnica, alm de excrescncia syphilitica. Veja-seSyphilis (Chernoviz, 1890, p.1173).

    Mrio Souto Maior apresenta algumas outras definies para amesma palavra sob a tica popular de diversas regies brasileiras:1. lcera do nus ou de outro rgo pudendo; 2. Pederasta passivo;3. Oftalmias; 4. Fgado, na linguagem popular (16) (Souto Maior,

    1988, p.67).Ressalta-se que a sinonmia lxica da palavra com sentidos

    diferentes pode ter origem na similaridade morfolgica com outrosobjetos, dependendo do ponto de vista retratado na escrita e nas

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    narrativas, mesmo no sendo vegetais, e tambm como corruptelada palavra fgado.

    A histria oral geralmente responsvel pela continuidade dadivulgao e do uso do vocbulo, como o encontrado na troca dapalavra figo por fgado na verbalizao da estria do papa-figoem suas diversas verses.

    Pode ser encontrada nos escritos dos primeiros cronistas euro-peus que estiveram na Amrica do Sul e no Brasil a referncia auma fruta tambm chamada figo, porm tratava-se da banana ou dapacova. A associao pode ter sido feita pela semelhana da texturadas cascas: tem uma pele como de figo ou pelo tamanho [...]humas so pequenas como figos berjaotes (Gandavo, 1980, p.97).

    Quando de sua estada no Brasil, no final do sculo XVI, GabrielSoares de Sousa, que viveu no Nordeste brasileiro, tendo grandeexperincia para o relato da vida na nova terra, descreveu no captuloL Em que se declara a natureza das pacobas e bananas:Pacoba uma planta natural desta terra, a qual se d em uma rvore muito

    mole e fcil de cortar [...]; na ndia chamam a estas pacobeirasfigueiras e ao fruto, figos (Sousa, 1971, p.188). Em outro trechodo mesmo captulo, ao se referir banana, o autor escreveu: Asbananeiras tm rvores, folhas e criao como as pacobeiras, e noh nas rvores de umas s outras nenhuma diferena, as quais foramao Brasil de So Tom, aonde ao seu fruto chamam bananas e nandia chamam a estes figos de horta, as quais so mais curtas que as

    pacobas [...] (ibidem, p.189).Entre os historiadores que esclarecem sobre a impreciso desse

    fato encontra-se o padre Joo Daniel, que durante seu perodo naAmaznia brasileira, entre os anos de 1741 e 1757, relatou que[...] ao anans a pacova, a que a sia chamam de figo, porm notem nenhum parentesco com os verdadeiros figos (Daniel, 2004,p.459).

    Esse padre jesuta escreveu sua obra em crcere em Portugalquando esteve preso no perodo de 1757 a 1776, depois de deixar oForte de Almeida e parte na Torre de So Julio, vindo a falecer em19 de janeiro de 1776.

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    A obra de Joo Daniel importante para o entendimento dasatividades agrcolas, dos habitantes e de suas tecnologias e conhe-cimentos acerca da histria natural da Amaznia brasileira, aindadesconhecida na poca. Da a importncia de sua informao quedesenhava a Amaznia:

    [...] no falo agora das bananas, que, como j dissemos, na sia se

    chamam figos, mas falo nos prprios figos, que em todo o mundo

    so bem conhecidos e estimados, e na verdade so uma das mais

    deliciosas frutas que Deus criou para regalo dos homens; mas

    devem ser comidos quando j se lhe vai rasgando a camisa por

    velha, e quando j se inclinam para cair de maduros, porque quanto

    mais humildes, e mais rajetados, mais saborosos e sadios. (ibidem)

    A designao de figo provavelmente se aplicava a espcies cujosfrutos tivessem alguma similaridade com o fruto de Ficus carica.Ou seja, alm das j citadas por Gandavo e Sousa, no final do sculo

    XVI, poderia ser considerada sua textura interna (macia) e doura.Nos meados do sculo seguinte, na medida em que outras espciesdo Novo Mundo foram levadas Europa e descritas por botnicosda poca, algumas dessas semelhanas morfolgicas ainda eramutilizadas para se manter o nome para plantas diferentes. Exemplodisso visto no livro de John Gerard, Gerards Herbal: of theHistorie of Plants, publicado em 1633. Nesse livro, o captulo 133

    destinado Ficus carica(Da figueira), e o captulo seguinte, Dafigueira da ndia espinhosa, destina-se ao hoje conhecido figo-da--ndia (Opuntia ficus-indica). Observa-se claramente nessa obra queessas espcies recebem o designativo figo em razo da aparentesemelhana morfolgica entre seus frutos, apesar de pertencerem afamlias botnicas distintas. O adjetivo espinhosa est evidente-mente bem esclarecido no nome (Gerard, 1980).

    Seguindo o caminho sugerido pela histria do nome cientficoda cactcea, observa-se que ela foi designada Ficus indica porBauhin, anteriormente a Linneu, que a designou Cactus ficus--indica, em 1753, em Species Plantarum 1, incluindo ainda em sua

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    obra o binmio Cactus opuntiapara a espcie Ficus indicadesignadapor Bauhin.

    Essa obra ajuda a confirmar outra informao: a ndia do nomecientfico se refere s ndias Ocidentais, ou seja, regio do Caribe e daAmrica Central, onde os espanhis aportaram no final do sculo XVe encontraram essa espcie. Linneu (1774, p.23) tambm cita na obraseu habitat, Amrica, Peru e Virgnia, nunca na Espanha e Portugal,mostrando corretamente sua regio de origem e sua disperso poroutras regies do continente de origem e posteriormente Europa.

    Apenas em 1768 Miller, em sua obra The Gardeners Dictionary,8 edio, incluiu a espcie no novo gnero Opuntia (criado pelomesmo autor em 1754), passando a ser ento Opuntia ficus-indica(L.) Mill., com a manuteno do conhecido basnimo.

    O nome popular dessa espcie, em vrias partes do mundo,incluindo o Brasil, traduo literal de um dos nomes cientficospropostos em pocas anteriores. Ressalta-se que existe outra espcie,Opuntia ficus-barbarica (A. Berger), espcie coletada na regio de

    Cochabamba, Bolvia, e que est em perigo de extino (Trpicos,2009). Assim como outras Opuntia, os frutos so semelhantes, aju-dando a conservar o nome dado.

    A semelhana do fruto e, no caso, a existncia de espinhostambm ajudaram a designar outras figueiras, como a figueira-do--inferno (Datura stramonium L.), da famlia Solanaceae. Esse mesmonome popular aplicado a outra espcie,Jathopha curcas (L.), da

    famlia Euphorbiaceae(Penna, 1941), no por causa dos espinhos,no existentes nos frutos dessa espcie, mas provavelmente peloforte efeito diarreico de suas sementes.

    Ou seja, ao longo dos anos, e em diferentes circunstncias, foramadicionados novos ingredientes para o uso da mesma palavra para sereferir a plantas diferentes.

    O carter simblico tambm compe o panorama de significados

    dado a essa planta, podendo-se listar entre eles o de paz e abundn-cia, comum entre os hebreus, o de rvore do paraso, comum nomundo rabe, sabedoria e integridade, e rvore de Jpiter, entre osastrlogos (Lehner & Lehner, 2003; p.115).

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    O figo e as religies

    Ento os seus olhos abriram-se; e, vendo que

    estavam nus, tomaram folhas de figueira, liga-ram-nas e fizeram cinturas para si.

    (Gnesis, 3:7)

    Quando algum abre a Bbliapara iniciar seus estudos, verificaque a primeira planta citada em suas linhas o figo. Est em Gnesis(3:7) (Bblia Sagrada, 2004), quando Ado e Eva, aps desobede-

    cerem ordem do Senhor, provando do fruto proibido, costuramfolhas de figo para cobrir a nudez, que a partir daquele momento setornara evidente. Essa citao da figueira no Gnesis pode ter sidoum forte elemento de induo a que se representasse essa plantacom a carga mstica com que ela aparece nas sagradas escrituras dacultura judaico-crist, principalmente na Idade Mdia (Shibukawa,2009), mas tambm em diversas outras representaes de outras

    culturas, como a rabe.Na Bbliah ainda diversas outras passagens em que o figo ou a

    figueira so citados, no menos que 57 vezes, segundo Moldenke &Moldenke (1986). O Guia Ilustrado da National Geographic Societyorefere como a mais citada das plantas na Bblia(National GeographicSociety, 2008). So referncias rvore e ao fruto, s fases de seudesenvolvimento ou a produtos dele derivados. Diferentes verses

    bblicas mostram essas situaes. A palavra hebraica usada emDeuternimo (8:8) teenah, ou taynahou sukonou suke, que emgrego significa um lugar fortificado, localizado em Syracusa, naSiclia, assim chamado provavelmente por causa das figueiras quecresciam na regio e na prpria fortificao.

    Alm dessa referncia usada para a rvore da figueira, h outrasquatro palavras que aludem no rvore como tal, mas aos diferentes

    estgios de desenvolvimento e condies do fruto:

    1. teenim ou tanim(forma plural de teenah), usada em Jeremias(8:13), indicando o figo como fruta;

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    2. pagoupageha, usada em Cntico dos Cnticos (2:13), ofruto verde ou imaturo, que permanece na rvore durante oinverno;

    3. bikkurahou bikurah, usada em Osas (9:10), so os primeirosfrutos;

    4. debelahou dveletou dvelim, usada em Samuel I (25:18) e ReisII (20:7), um bolo de figo seco, ou seja, o principal produtoda rvore conservado para uso no inverno, geralmente men-cionado no Velho Testamento como um produto alimentarbsico.

    O nome rabe para o figo tin. encontrado ainda em Nmeros(13:23), que relata a explorao das terras de Cana por Moiss eas recomendaes deste para os que foram enviados para fazer aprimeira expedio. O seguinte trecho relata parte do retorno de talexpedio: Chegaram ao vale de Escol, onde cortaram um ramo devideira com um cacho de uvas, que dois homens levaram em uma

    vara; tomaram tambm consigo roms e figos.No retorno dos emissrios da Terra Prometida, narram a Moiss:

    verdadeiramente uma terra onde corre leite e mel, como se podever por esses frutos (Nmeros, 13:27).

    As citaes anteriores permitem a reflexo de que a terra era frtilna regio ou que a figueira se adaptava bem a terrenos arenosos,pedregosos e com nveis de fertilidade e umidade baixos, podendo

    mesmo ali produzir bons frutos.Jesus menciona a figueira mais de uma vez na Bblia, fazendo

    com que a planta seja frequente e essencial nas parbolas e perma-nente na memria daqueles que as ouviram. A parbola da figueiraque no produzia frutos tem um apelo especial para os cristos, poisse reporta a uma figueira plantada entre as uvas de um parreiralcujo proprietrio, a cada ano, a observava sem frutos, apesar dos

    tratos culturais apropriados para um bom crescimento. Como elacontinuava estril, aps trs anos ordenou a seu empregado que acortasse, porm este relutou em cortar a figueira, considerando oesforo dispendido, diz a parbola.

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    Marcos (11:12-13) escreveu em passagem do seu evangelhosobre a esterilidade de uma figueira. Jesus teria visto uma plantacom muitas folhas na primavera e se aproximou com a expectativade nela encontrar figos maduros, ficando desapontado quando issono aconteceu.

    Segundo King (1975), Jesus no d explicao sobre esse fato,sendo porm a interpretao favorita a de que a figueira permaneceuem p para a nao judia e a promessa de uma chance a mais pelodesejo divino e universal.

    Mateus (21:19-22) e Marcos (11:12-26) propem outra inter-pretao, em que o efeito da maldio lanada contra a figueira teriasido para demonstrar que o poder da f seria capaz de transformarem realidade os desejos de seus discpulos.

    A simbologia dessa passagem faz com que o figo, junto com avideira e a oliveira, tenha papel destacado em escritos religiosos, con-forme se pode ver na interpretao dos Deuteronmios (22: 9) pelopadre Igncio dos Escolpios (III Domingo, 2009), que reconhece

    no ser proibido pela lei o plantio dessas espcies em consrcio.Alm disso, o padre faz uma leitura de uma resposta poltica dadapor Jesus, naquele momento em que era pressionado para tomarposio contra os romanos. O apelo parbola da figueira estrilteria sido uma resposta em um contexto que provoca a reflexo dosjudeus sobre a relao entre o pecado e a punio divina, vindo ela defenmenos naturais ou de aes humanas. O fato que essas passa-

    gens da Bblia demonstram o quanto o cultivo da figueira, da oliveirae da vinha era consolidado em prticas culturais de domnio popular.

    A ltima citao do figo na Bblia no Apocalipse (6:13), em queas estrelas cadentes do cu so comparadas a uma figueira soltandoseus frutos verdes quando agitada por um vento poderoso (King,1975; p.9).

    O figo citado tambm noAlcoro, o livro sagrado dos muul-

    manos, em que h uma surainteira, chamada O figo (2009, p.1):

    Em nome de Alah, o misericordioso, o misericordiador:

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    Pelo figo e pela oliva, e pelo Monte Sinai, e por esta cidade

    segura, com efeito criamos o ser humano na mais bela forma, em

    seguida levamo-o ao mais baixo dos baixos degraus. Exceto os que

    creem e fazem as boas obras, eles tero prmio incessante. Ento, o

    que te leva depois disso a desmentir o dia do juzo? No Al o mais

    sbio dos juzes?

    importante ter em mente que a associao do figo com teste-munho e julgamento tema presente tambm na Bblia, como podeser verificado em outras passagens (Musselman, 2007).

    Podem-se encontrar outras apropriaes religiosas do figo, comoa do texto de Tauber (2009) sobre as sete espcies vegetais conside-radas pelos mestres cabalistas do judasmo (trigo, cevada, uva, figo,rom, azeitona e tmara), a cada uma das quais atribuda umacaracterstica. O figo serve de referncia para comparao entre asfruteiras e reconhecido como o fruto da rvore do conhecimento doBem e do Mal ou do Conhecimento, induzindo ao seu atributo de

    envolvimento, pelo fato de que Ado e Eva pretendiam tudo conhe-cer da divindade e se envolver com cada uma das criaes, mesmo asconsideradas fora de seu alcance.

    Na Mitologia Grega, a deusa da terra, Gaia, teria provocado umbroto na figueira para que este protegesse seu filho, o titan Sykeus,dos rancorosos raios de Jpiter, sendo por isso corrente a ideia de quea figueira est protegida contra esse fenmeno (Impelluso, 2004).

    conhecido o fato de nos terreiros de candombl a figueirabrava, conhecida como loco ou gameleira, ser considerada sagrada,como no Gantois e em muitas das outras casas de culto afro emSalvador, na Bahia, o que despertou polmica quando do processode abertura de avenidas para a modernizao da cidade, exigindoo abate de muitos de seus exemplares (Brito, 1980). No se trata,evidentemente, de Ficus carica, mas a figueira extremamente

    importante nesse caso religioso.A recorrncia ao carter mstico da figueira se encontra enraizada

    nas prticas culturais em quase todas as partes do mundo, sendoabundante o registro do apelo que lhe atribui poderes no mbito

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    religioso, seja como planta abenoada, representada positivamente,seja como planta maldita, representada por caractersticas negativas.De uma maneira ou de outra, incontestvel sua importncia comoplanta medicinal e alimentcia, no que concerne ao plano material,o que em muitos casos tambm se mistura ao mundo religioso etambm das lendas e mitos.

    A trajetria do figo nas amricas e no Brasil

    A rainha de Castela, Isabela, ao casar-se com Fernando, herdeirode Arago, acelerou, a partir de 1469, a expulso dos mouros, cul-minando em derrota proclamada em 1ode janeiro de 1492. Nessemesmo ano foi comemorada no apenas a descoberta do NovoMundo, mas tambm a expulso definitiva dos mouros da ltimafortificao em poder deles, Granada. Desde ento as terras daPennsula Ibrica passaram a ser governadas pelos cristo sobrevi-

    ventes da monarquia.A populao majoritariamente rural era pobre e sobrevivia

    cultivando variadas espcies vegetais. O figo predominava na partesul, pois a regio mediterrnea mais quente, e depois de Colombo,com a expanso territorial espanhola, a transferncia das principaisespcies cultivadas na Europa para as novas terras foi intensificada.

    O figo, por ser uma espcie apreciada e de fcil propagao, foi

    trazida para a Amrica logo nas primeiras expedies que se suce-deram ao descobrimento das terras americanas. As primeiras estacasde figueira alcanaram as ndias Ocidentais em 1520, e por volta dametade daquele sculo, variedades com polpas vermelhas e brancaseram cultivados com sucesso nas ilhas (Dunmire, 2004).

    O primeiro livro que versa sobre a histria natural do NovoMundo, de Fernndez de Oviedo, publicado em 1526, informa

    que na ilha de Hispaniola (atual Repblica Dominicana) haviamuitos figos durante todo o ano, muitas tamareiras e outras plantase rvores que foram levadas para l da Espanha (Oviedo, 1526,traduo nossa).

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    Muitas dessas frutas, de clima temperado, no se desenvolve-ram bem ou no frutificavam. No existe referncia figueira nessalista, indicando que ela se portava bem no novo continente (Dun-mire, 2004).

    Com o avano ao sul e ao oeste, alcanando o Mxico, as fron-teiras coloniais espanholas se expandiram em trs corredores, maso plantio de figo ficou limitado aos climas mais quentes, motivo dea planta no ter alcanado o norte e o El Paso no corredor central.

    Em 1570, os espanhis introduziram a cultura do figo na Flrida,e dois sculos mais tarde a fruta chega Califrnia (ibidem). Em1560, Cortez trouxe figueiras para o Mxico, e em 1669 so mencio-nados cultivos na Virgnia, observados por Wm. Bartram crescendofora das runas de Frederica, na Gergia, e na Ilha Pearl, perto deNova Orleans, nos idos de 1773 (Hedrick, 1972).

    No sculo XVIII os padres jesutas cultivaram as primeirasfigueiras nas misses religiosas de San Diego, originando o figo--misso-preto, uma importante variedade cultivada no estado da

    Califrnia, responsvel pela maior parte da produo americana(Heinerman, 1988). Porm a variedade mais familiar nos EstadosUnidos o black-mission, que disponibilizado fresco, seco ouenlatado. encontrada tambm a variedade brown-turkey, comu-mente consumida fresca, e a variedade conardia, direcionada paraa indstria de figos secos. A variedade kadota ofertada enlatada(Rogers & Powers-Rogers, 1988).

    Padre Garca de San Francisco, fundador da misso Guadalupe,foi um vido horticultor e durante sua gesto construiu um sistemade irrigao que alimentava os pomares dos diversos cultivos defrutas, entre as quais o do figo (Dunmire, 2004).

    No livro The Oxford Book of Food Plants, as variedades citadascomo entre as melhores dos Estados Unidos so brunswick, turquia--marrom, ischia-preto e ischia-branco (Harrison; Masefield; Wallis,

    1969). Essas mesmas variedades so referendadas por Viard (1995).Na Inglaterra os nomes das variedades mais importantes cultivadas

    no final do sculo XVIII tm alguns desses mesmos nomes: ischia--marron, gnova-preto, branco-pequeno, gnova-branco-grande,

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    ischia-preto, malta, npoles-marrom ou murrey, ischia-verde,brunswick e npoles-comprido-marrom (Bryant, 1873).

    Alguns aspectos interessantes dessas variedades so:

    - o ischia-marrom um figo muito grande, de forma globular,tem um olho grande e se insere prximo em curto pecolo. de cor castanho-marrom na parte externa, quase pr-pura, tem gros grandes, doce e de polpa muito saborosa.Amadurece no incio de agosto e pode estourar;

    - o gnova-preto um figo alongado, extremidade superiorobtusa e inflada, mas de pecolo muito delgado. de cor pr-pura escura por fora, coberta com um lils suave. O interior vermelho brilhante e a polpa tem um elevado sabor. Madurono incio de agosto;

    - o branco-pequeno um figo arredondado, com um pecolomuito curto e achatado na coroa. A casca fina e de cor ama-relo plido quando maduro. Branco por dentro e com a polpa

    muito doce. Maduro em agosto;- o gnova-branco-grande um figo arredondado, ligeira-

    mente alongado em direo ao pecolo. amarelado quandomaduro, mas avermelhado antes. Maduro em agosto;

    - o figo ischia-preto de tamanho mdio, um pouco curto eligeiramente achatado na coroa. Preto por fora e bem vermelhopor dentro. A polpa muito saborosa. Amadurece em agosto;

    - o malta um figo pequeno, marrom, bem achatado na coroae grandemente alongado em direo ao pecolo. amarron-zado tanto por fora quanto por dentro. A polpa ou carne suculenta e bem saborosa. Amadurece em agosto;

    - o npoles-marrom ou murrey um belo, redondo e grandefigo com uma cor marrom brilhante com pequenas marcasbrancas. O interior aproximadamente da mesma cor, os ps

    so grandes e a polpa, muito saborosa. Amadurece no fim deagosto;

    - o ischia-verde um figo oblongo, porm arredondado nacoroa. O exterior verde, mas quando completamente

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    maduro torna-se amarronzado. A polpa prpura e muitosaborosa. Amadurece no fim de agosto;

    - o brunswick um figo em forma de pera, grande, de cormarrom externamente e marrom mais claro por dentro. Apolpa rugosa e no muito saborosa. Amadurece no inciode setembro;

    - o npoles-comprido-marrom tem um longo pednculo e ofigo um pouco achatado na coroa. Quando maduro, suacasca de uma cor marrom escura, de sementes grandes,polpa tendendo para o vermelho e muito saborosa. Ficamaduro em setembro.

    Segundo a tradio inglesa, acredita-se que o figo tenha sidotrazido por um abade de Fcamp da Normandia francesa que trans-feriu-se para a Sompting Abbots, em Sussex, no Sul da Inglaterra.Outra verso que Thomas Beckett plantou um pomar com qui-nhentas figueiras no antigo Palcio dos Arcebispos de Canterbury,

    em West Tarring, perto de Worthing, tambm em Sussex, em 1145(Campbell-Culver, 2001). Na Inglaterra, essa regio era conhecidapor cultivar figueiras e at os dias atuais existem muitas rvorescrescendo em casas antigas e produzindo bem a cada ano.

    Segundo a mesma autora, a primeira referncia escrita sobre afigueira data de 1525, quando Reginald Pole, ltimo arcebispo deCanterbury, retornou de seus estudos na Itlia trazendo diversas

    rvores para plantar no Palcio Lambeth, em Londres. Elas aparen-temente eram do tipo white-marseilles e um exemplar cresceu at aaltura de aproximadamente 16 metros, sobrevivendo at ao rigorosoinverno de 1814 (ibidem).

    Encontram-se referncias na tradio que se assemelham ao ditoanterior, incluindo-se ainda como provvel responsvel pela chegadado figo na Inglaterra a esposa de Eduardo I (Roberts, 2001).

    Outra informao da trajetria da figueira a de 1648, quandoo dr. Pocock de Aleppo, vindo da Sria, trouxe uma figueira eplantou-a na igreja de Oxford. A planta teria sobrevivido at apro-ximadamente o ano de 1833, apesar de ter sido afetada severamente

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    no incndio de 1803. Segundo essa autora (Campbell-Culver, 2001),na Inglaterra a variedade mais conhecida kadota, nome dado emvirtude da sua semelhana com a forma de um especfico tipo devaso grego chamado de kados, enquanto nos Estados Unidos sooutras as variedades cultivadas, conforme Clevely (1988), tais comoturquia-marrom, celeste, kadota (ou dottato) e magnlia, todas cul-tivadas em diversas regies americanas.

    No geral, observa-se que diversas variedades europeias foramintroduzidas na Amrica a partir de seu descobrimento, e as prin-cipais, talvez as mais produtivas ou saborosas, tenham sido asresponsveis pelo material primrio para o desenvolvimento denovas variedades locais adaptadas s novas condies ambientais,levando em conta os novos paladares dos imigrantes e os dos habi-tantes nativos. Mistura de corpo e sangue junto com mistura degostos e sabores.

    No se tem referncias de figueiras to antigas no Brasil comoas anteriormente relatadas, cujas espcimes tm entre 185 anos e

    290 anos.Mas como o figo chegou ao Brasil? A partir de registros histricos

    possvel redesenhar seu percurso. O incio est posto na costa daatual Bahia:

    A armada de Pedro lvares Cabral em 1500 estava repleta de

    vveres e mesa de gulodices e mimos de boca, confeitos, fartis,

    mel, figos passados, alm de carne, porco, laco, arroz, po, vinho.(Cascudo, 2004, p.322)

    O historiador-folclorista Cmara Cascudo discute a dificuldadena poca em se organizar tais viagens transcontinentais, incluindoa durao da travessia, a inconstncia do vento, os navios superlo-tados, a deficincia na alimentao e a dependncia da simpatia do

    rei. A conservao dos alimentos embarcados era um dos quesitosprincipais para sua escolha.

    O figo, semelhana do fato de ter sido a primeira planta citadana Bblia(King, 1975; Baerg, 1989; Walker, 1957), foi a primeira

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    espcie vegetal (fruta) experimentada pelos indgenas brasileirosquando da chegada da expedio de Cabral na costa baiana. Algunsestudos, como o de Cmara Cascudo citado anteriormente, ajudama entender o ambiente no Brasil naquela poca.

    Alm disso, Fernando Denis relata as viagens portuguesas naAmrica do Sul e faz relato dos primeiros contatos da esquadra cabra-lina com os indgenas brasileiros. Escreve que dois indgenas foramconvidados a entrar na nau, e ante os olhares de membros do staffportugus, foram apresentados a alguns objetos trazidos da Europa:

    Offerecero-lhes po, peixe, doces, passas e figos, e elles mani-

    festaro muita repugnancia em provar destes alimentos, que apenas

    levro aos beios longe de si arremearo. (Denis, 1844, p.9)

    Verso semelhante relata Cmara Cascudo (2004, p.303): [...]na sexta-feira, 24 de abril de 1500: Deram-lhes ali de comer; poe peixe cozido, confeitos, fartis e figos passados. Primeiro ato de

    conquista. A posse pela gula.Mais tarde, mudas de figo foram sistematicamente trazidas,

    desde o sculo XVI, de Portugal para a nova colnia. O professorPiraj da Silva informa que este passa por ser o primeiro fruto cul-tivado que os homens comeram (ibidem, p.637). Pode-se entendernessa frase o sentido da palavra homens como tripulantes dasembarcaes portuguesas (por no haver outros suprimentos frutais

    nas embarcaes, alm de passas) ou mesmo os indgenas da novaterra (pois lhes foi oferecida, a ttulo de frutas, apenas essamorcea).

    No final do sculo XVI, Gabriel Soares de Souza (1971, p.166)descreve muitas das plantas trazidas de Portugal e cultivadas noBrasil. Em seu pormenorizado relato sobre a vida cotidiana noNordeste brasileiro, escreve:

    As figueiras se do de maneira que no primeiro ano que as plan-

    tam vm como novidade e, da em diante, do figos em todo o ano,

    s quais nunca cai folha; e as que do logo novidade e figo em todo

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    o ano so figueiras pretas, que do mui grandes e saborosos figos

    prtos e as rvores no so muito grandes, nem duram muito tempo,

    porque como so de cinco, seis anos, logo se enchem de carrapatos

    que as comem, e lhes fazem cair as flhas e ensoar o fruto, os quais

    figos prtos no criam bicho como os de Portugal. Tambm h

    outras figueiras pretas que do figos bberas mui saborosos, as quais

    so maiores rvores e duram perfeitas mais anos que as outras, mas

    no do a novidade to depressa como ela.

    Pero de Magalhes Gandavo, na mesma poca, diz em seu relato

    sobre as frutas trazidas para a Terra de Santa Cruz que Algumasdeste Reino se do tambm nestas partes, convem a saber, muitosmeles, pepinos, roms e figos de muitas castas, muitas parreiras quedo uvas duas, tres vezes no anno (Gandavo, 1980, p.51). Indicano apenas o representante das morceas como tambm outras esp-cies que vieram ao Brasil poca do incio da colonizao.

    Essas novas aquisies frutais moldaram o gosto e o paladar

    dos que para c vieram ou dos que j estavam por estas paragens,entrando em sua lista de preferncias.

    Em seu livro publicado em 1941, Meira Penna afirmava que naEuropa havia muitas variedades de figo, distinguindo-se, dentreelas, o figo roxo, o figo branco, o figo rajado e o figo grande.

    Segundo Corra (1984), as variedades introduzidas e cultivadasno Brasil de que temos notcia so as seguintes: albicone, algarve,

    gelfiore, brillasotto, brogiotto (branco e roxo), catalo, colo-de--dama (Collo di Signora, dos italianos, lamentavelmente deturpadopelos nossos jardineiros e horticultores para cuello-de-dama), corfu,dalmazia, kadota, madeleine, missin, napolitano, narras (figueirabranca de frutos brancos), negretto, ouro, portugal, troyano, vesvioe white-celeste.

    Cruz (1985, p.353) informa que em nosso pas, porm, se

    conhecem poucas variedades de figos, entre os quais se destacam odouradinho, o branco, o roxo, o roxo grande e o rajado.

    Em Valinhos, no interior de So Paulo, h mais de sessentaanos acontece o Festival do Figo-Roxo. Essa cidade considerada

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    importante centro produtor no estado, e o figo teria chegado ali em1901, pelo imigrante italiano Lino Busatto, considerado o inven-tor da variedade roxo-de-valinhos. Busatto veio da Itlia no finaldo sculo XIX e trabalhou em fazendas do interior de So Paulo,vindo a residir em Valinhos, onde j havia plantio de figo-branco(pingo-de-mel). Desejando saborear os figos diferentes de sua terranatal, solicitou o envio de mudas. Com a chegada destas, em 1901,e com a aprovao de seu sabor por moradores vizinhos, distribuiudiversas mudas das rvores novas que cultivava, iniciando-se assima expanso dessa variedade na regio (Pires, 1970).

    Em 1910, com a ampliao da rea cultivada e a distribuio paradiversos pontos do pas, Valinhos passou a ser considerada a Terrado Figo, graas iniciativa do sr. Busato. A tradicional festa do figodessa cidade iniciou-se em 1939, sem que o introdutor da varie-dade mais conhecida tivesse conhecimento, uma vez que j haviase mudado para outra cidade (Louveira, e posteriormente, Salto eJundia, onde veio a falecer em 1944).

    A festa comeou a ser promovida pelo mons. Bruno Nardini, apretexto de arrecadar fundos para a construo da nova matriz deSo Sebastio, quando se estabeleceu o evento que congrega chaca-reiros e a comunidade regional (Festa do Figo, 2009), mobilizandoem torno de 500 mil pessoas (60 Festa do Figo movimenta, 2009)no ms de janeiro de 2009.

    Em 1968, a prefeitura de Valinhos, em homenagem a Lino

    Busatto, designa com seu nome o trecho da rua que passa em frente antiga chcara onde havia plantado o primeiro p do figo roxo--de-valinhos. O vigor econmico do municpio est associado importncia dessa atividade, dando-se-lhe o epteto de Pomo daRiqueza (Pires, 1970).

    Outras cidades vm promovendo eventos tendo como temticaa valorizao do cultivo dessa planta, como se pode apreender do

    processo ocorrido em Caapava do Sul (RS), em que uma feira deexposio de figo e mel Expofigo @ Mel tenta se consolidar ressal-tando aspectos culturais que vo alm dos trabalhos agrcolas ligados produo do figo e do mel (Estado do Rio Grande do Sul, 2007).

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    Certamente existem outras festas relativas a essa fruta, par-ticularmente em regies onde seu cultivo mais promissor outradicional.

    O figo na literatura, nas artes e na estria oral

    O figo e sua rvore espcie cantada e contada em verso e prosah muito tempo, conforme se demonstrou no tpico sobre a figueiranas Sagradas Escrituras judaico-crists e muulmana. Consta comoreferncia mitolgica importante na representao da loba amamen-tando os fundadores de Roma, a rvore na sombra da qual os herisforam amamentados. Conta a lenda que depois de abandonados emuma cesta no Rio Tibre, foi embaixo de uma figueira que a cestateria aportado (Impelluso, 2004). Na literatura clssica, popular, nasestrias e narrativas orais, conforme se demonstra a seguir, o figo ea figueira so presena marcante.

    Don Quixote de la Mancha, considerado o primeiro romancemoderno, escrito por Miguel de Cervantes, traz uma lista de 102espcies, conforme levantamento feito por Pardo-de-Santayana(2006), demonstrando que essas citaes esto associadas aos usosfeitos pela populao no perodo em que a obra do escritor espanholse contextualiza. O figo uma dessas plantas, citado seu fruto sem-pre como referncia a algo sem valor.

    Em Manoel Thomas, no seu livro 10 da Insulana, o figo assimdescrito (Bluteau, 1712, p.112):

    Ir doura o figo sustentando

    Com mostras de pobreza no vestido

    Acar pelo olho distillando

    Com seu p de cajado retorcido,

    Suaves embaxadas ensinandoA Mercrio na planta offercido,

    Com q o Reyno das arvores despreza

    Porque mais a doura estima, & preza

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    Ainda de Portugal do sculo XVIII, os vrios adgios impemrespeito e talvez provocassem algum medo, alegria ou riso disfar-ado. O mesmo autor cita:

    Em tempos de Figos, no h amigos.

    No darei por isso um Figo podre.

    No busques o Figo na Ameixeira.

    O Figo cahido, para o Senhorio, & o que est quedo, para mim o quero.

    A branca com frio, no val hum Figo. (Bluteau, 1712, p.113)

    Alguns deles tambm so citados por Souto Maior (1988, p.67),que apresenta algumas variaes dos adgios anteriores e adicionaoutros provenientes de pesquisadores da cultura popular:

    No fiarei dele um figo podre.

    Enquanto h figos, h amigos.

    Mais vale um po duro que figo maduro.

    Uva, figo e melo sustento de nutrio.Uns comem figo, outros arrebentam a boca.

    Merece destaque o adgio que associa lxicos semelhantes e jcomentados referentes cura de doenas, talvez como adaptaoonomatopeica da teoria das assinaturas, mas certamente para favo-recer a memorizao da receita: Ch de folhas de figo para os males

    do fgado (ibidem).Trazido de Portugal, sem data precisa, dizia-se no campo: Figo

    cortado figo estragado. Segundo Cmara Cascudo (2004), opovo cisma em no cortar de faca certas frutas [...]. Evita-se a con-centrao do tanino, o gosto adstringente caracterstico?.

    O figo verde no to adstringente quanto outras frutas, mas,por precauo, por que no respeitar o dito popular?

    Mitos envolvendo rvores so comuns e a figueira aparece emvrias deles como amaldioada ou assombrada, tendo como expli-cao recorrente o fato de ter sido em uma planta dessa espcieque Judas teria se enforcado (Porteous, 2002). Os evangelhos

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    no do detalhes sobre o suicdio de Judas, mas se consolidou atradio de que teria sido em uma figueira que ele teria cometidoo tresloucado ato.

    A figueira foi amaldioada tambm pelo poeta portugusAntnio Nobre, (Silva, 2002, p.201), que retomou essa antigalenda sobre o suicdio que Judas supostamente suicidara em umafigueira nos arredores de Jerusalm: figos pretos, sois as lgrimasdaquele/que, em certo dia, se enforcou em uma figueira. Todos osque a amaldioaram viveram bem menos do que a rvore.

    Na Siclia, muitas supersties giram em torno dessa rvore,como a de considerar imprudente repousar sua sombra nas horasquentes do dia, pois em cada folha habitaria um demnio sangui-nrio. Uma das lendas alerta sobre o risco de se encontrar umamulher vestida como freira, com uma faca na mo, perguntando sea pessoa deseja peg-la pelo cabo ou pela lmina. Se a resposta forpela lmina, a pessoa morrer, se responder que ser pelo cabo, tersucesso em todas as tarefas assumidas.

    Na verdade, na Siclia as supersties sobre as rvores so muitase, particularmente na noite de So Joo, diz-se ser muito perigosodormir embaixo delas, sob o risco de sofrer assdio de demnios(ibidem).

    Existem citaes em que o figo associado com a sorte, como nocaso de textos gregos e rabes que revelam que pessoas que sonhamestar colhendo figos maduros seriam abastecidas com dinheiro

    (Simmons, 1998). Alm disso, segundo o mesmo autor, o formatoertico do fruto do figo levou a associaes na Grcia Antiga para ocampo da prosperidade e fertilidade, representaes comuns na festade Dionsio. Na Antiga Roma e em partes da ndia e do Qunia,o leite de figo fazia parte de cerimnias importantes, igualmenteassociadas aos aspectos erticos e reprodutivos.

    Talvez parte dessas associaes e usos tenha influenciado

    outros povos europeus e, trazida ao Brasil pelos missionriosno perodo colonial, ainda se faz presente nos dias atuais. JeanBaptiste Debret (1978, p.208) descreve algumas cenas religiosasda poca, em que mes penduram pequenos antebraos de punho

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    fechado e que tm em geral uma polegada de comprimento paraa proteo das crianas:

    Estes amuletos (feitos de raiz de arruda) tm o nome genrico

    de figas, porque a princpio esculpiam-se pequenas peras ou figos

    consagrados ao mesmo uso. A superstio recomenda que no

    momento de pendur-los no pescoo da criana se reze uma orao

    a So Joo, o qual indubitavelmente preservar o pequeno de todas

    as desgraas. (ibidem)

    No Brasil Colnia, alguns escritores produziram saborosos textossobre a fruta. Alguns exemplos podem ser vistos no livro de Cascudo(2008),Antologia da alimentao no Brasil:

    [...] o figo de cor roxa graciosos poucos se logram, salvo-se porfia

    se defendem de que com os biquinhos, os vo picando os leves

    passarinhos. (atribudo a Frei Manuel de Santa Maria de Itaparica,

    1704-1768)[...] as bananas famosas na doura, fruta que em cachos pende e

    cuida a gente

    Que fora o figo da cruel serpente. (atribudo a Frei Jos de Santa

    Rita Duro, 1720-1784, do livro sobre Frutos, caa e pesca do

    Brasil, de 1781, poema pico do descobrimento da Bahia)

    Aqui no faltam figos,

    e os solicitaram pssaros amigos,

    apetitosos de sua doce usura,

    porque cria apetites e doura;

    E quando acaso os matam

    porque os figos maltratam,

    parecem mariposas, que embebidasna chama alegre, vo perdendo as vidas.

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    Esse texto atribudo a Manuel Botelho de Oliveira (1636-1711),As frutas e legumes, produzido em Lisboa, em 1705, na forma demsica dividida em quatro coros de rimas portuguesas, castelhanas,italianas e latinas.

    Ainda no Brasil, e mais recentemente, o figo foi merecedor decitaes em textos literrios infantis, como em O Minotauro, deMonteiro Lobato (apud Camargos & Sacchetta, 2008, p.24), queescrevia: Jantar em casa de Pricles primou pela simplicidade ediscrio: Carneiro assado e timo! Merecedor at da aprovaode Tia Nastcia; po; peixe; queijos de vrios tipos; frutas secas efrescas, figos, uvas; mel; leite; timos vinhos [...].

    E ainda, em uma inimaginvel viagem no tempo e no espao, aturma do Stio do Pica Pau Amarelo levada para a Antiga Grcia, procura da cozinheira raptada, e l encontra-se com Scrates eHerdoto. Tia Nastcia, sbia nos dotes culinrios, encanta-se comum prato oferecido por uma senhora helnica de nome Aretusa,feito de leite e toucinho preparado em folhas de figo. Com que

    regalo devorei o pitu! Tive a sensao de ambrosia dos deuses. Quetempero, que arte no usou a velhinha para conseguir aquele prato!(ibidem), surpreendeu a cozinheira.

    Em seu livro Plantas medicinais, benzeduras e simpatias, ToAzevedo apresenta algumas crendices e adgios:

    figueira: planta sagrada, no local que tem p de figueira tudo corre bem.

    figo(s): comer significa satisfao; figos frescos prosperidade;secos sinal de decadncia financeira; doce de figo amizade sin-

    cera, auxlio de amigos. (Azevedo, 1984, p.35)

    Nem sempre o papel da figueira explicitado seno como meroelemento do enredo, como emA menina e a figueira,cabendo porma interpretao de sua importncia no devido contexto. Essa estria

    possui muitas variantes, como se depreende dos outros ttulos querecebe (A madrasta, Figo da figueira, Menina enterrada, Histriada figueira) e das diversas formas de contar, embora se mantenha oenredo principal (Neves, 2009; Histrias, 2009).

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    agricultor, invejoso, manda ao mesmo imperador uma cesta maiorainda, esperando retribuio semelhante, recebendo, no entanto, odesprezo do imperador.

    Na segunda estria, intitulada Os guardas do rei, um cego eum coxo so os protagonistas. O rei, constituindo-os guardas desuas figueiras, ficou sabendo que os melhores frutos tinham desa-parecido logo depois da primeira noite de viglia daqueles guardas.Interrogados, os dois inicialmente negam sua culpa alegando suasdeficincias fsicas, posteriormente confessando terem se associadopara colher indevidamente os figos. Ambos foram castigados.

    Entre as letras de msicas religiosas, a figueira tambm se fazpresente, evocando a parbola evanglica:

    Ainda que a figueira no floresa

    E os campos no produzam mantimentos

    No vem das mos dos homens

    Minha fora e proviso

    Deus a minha salvao Deus o meu alto refgio

    Ainda que as benos paream no chegar

    Deus fiel e sem demora vem

    A minha parte eu fao, eu no paro de adorar

    A ele minhas mos levantarei

    Mesmo se eu passar por um deserto

    Pelo vale ou seja onde forNada poder me abalar

    Pois quem me segura o senhor

    Deus determinou no corao

    Nos escolheu e nos chamou

    E se chamou... com sua uno... nos capacitou

    Deus nos escolheu

    Deus nos chamouDeus nos ungiu

    Nos capacitou (Deus, 2009, p.1)

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    O mito do papa-figo, em que pese o ttulo que remeteria fruta,nada, de fato, tem a ver com a planta da qual trata este artigo, apesardas mesmas grafia e fontica referentes ao fruto da figueira.

    A expresso papa-figo uma corruptela de papa-fgado e serefere a uma estria de fundo moralizante, de carter repressor(Queiroga, 2009), usualmente contada a meninos de mau compor-tamento para amedront-los e for-los obedincia aos adultos(Barros, 2009). O mito teria surgido da incompreenso de campone-ses aps uma epidemia da doena de Chagas, no Nordeste brasileiro,quando agentes de sade coletavam amostras do fgado de pessoasmortas com essa doena, em geral crianas (Papa-figo, 2009), paraverificao da causa mortis. O papa-figo representado por um

    negro velho, sujo, vestindo farrapos, com um saco. Pode ser plido,

    esqulido, com barba sempre por fazer. Atrai crianas para comer-

    -lhes o fgado, com momices ou mostrando-lhes brinquedos.

    Costuma ficar sada das escolas, jardins e parques. Conhecido em

    todo o Brasil. (Lenda o papa-figo, 2009, p.1)

    H ainda uma verso indicando ser o papa-figo uma pessoa rica,educada e respeitada, que foi vtima de uma terrvel maldio, no sesabe por parte de quem. Depois de se alimentar do fgado de algumacriana, compensa financeiramente a famlia enlutada ao efetuar oenterro da pequena criatura por ele sacrificada (ibidem).

    Ressalta-se nesse item que a expresso papa-figo pode tam-bm se referir ao nome de um pssaro europeu, conforme citadopor Cascudo (2002), por aquele consumir essa fruta com frequncia,aumentando ainda mais a quantidade de variaes nas estrias aserem contadas sobre o tema.

    Associada ao imaginrio infantil, a estria da moura encantadatambm tem o figo presente. Um homem encontra uma mulher com

    um cesto de figos cabea e pede um, que guarda para comer maistarde. Ao sentir fome e tirar o figo do bolso, este se transformara emuma moeda de ouro, percebendo o homem que a mulher encontradatratava-se de uma moura encantada (Era uma vez, 2009). Manuel e

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    2ASPECTOSECONMICOSDAPRODUOECOMERCIALIZAODOFIGO

    Aldir Carlos Silva

    Marco Antonio da Silva Vasconcellos

    Rubens Nei Brianon Busquet

    Introduo

    Nos ltimos 25 anos analisados pela Food and AgricultureOrganization (FAO), a maioria das fruteiras teve sua produo

    aumentada em todo o mundo, fazendo crescer, com isso, a reaplantada. Nesse perodo, um dos pontos importantes do sistemaprodutivo de frutas foi a capacidade de gerar produtos de qualidadee saudveis, conforme os requisitos de sustentabilidade ambiental,segurana alimentar e viabilidade econmica, mediante a utilizaode tecnologias no agressivas ao meio ambiente e sade humana(Toda Fruta, 2008). O mercado internacional, diante das novas

    tendncias do consumidor, requer alimentos seguros e livres dequalquer tipo de agravante sade humana, adotando programasespecficos que asseguram o controle e a rastreabilidade de toda acadeia produtiva de frutas frescas.

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    O figo est entre as vinte principais frutas exportadas pelo Brasile vem mantendo a 3 posio no ranking devolume comercializadoentre as frutas de clima temperado. Fica atrs apenas da ma, com153 mil toneladas, e da uva, com 28,8 mil toneladas, e atingiu opatamar de US$ 2,109 milhes em 2004 (IBGE, 2008).

    O Brasil o terceiro maior produtor mundial de frutas, evoluindosua participao no mercado externo nos ltimos anos. Diante dagrande mobilizao do mercado internacional visando maior segu-rana do alimento, principalmente o importado, o Brasil tem seesforado para se adequar s novas tendncias internacionais.

    O Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento (Mapa)criou o sistema de produo denominado Produo Integrada deFrutas (PIF), que tem o aval do Instituto Nacional de Metrologia,Normalizao e Qualidade Industrial (Inmetro), visando aumentar aqualidade das frutas brasileiras, com o objetivo de ampliar sua parti-cipao no mercado externo. Esse sistema possibilita o rastreamentoda produo, conferindo ao agricultor um selo de certificao, e ao

    exportador, a qualidade da fruta, reduzindo ao mximo o impactoambiental do sistema produtivo a partir do uso racional de produtosqumicos, reduzindo sua utilizao no processo produtivo. As dire-trizes do programa foram publicadas favorecendo catorze espciesde frutas: ma, manga, uva, mamo, melo, pssego, goiaba, caqui,ctricos, caju, coco, banana, maracuj efigo. Os produtores que oadotaram possuem o selo de certificao como garantia de qualidade

    e adequao aos padres estipulados, o que garante a entrada nomercado internacional sem que seja necessrio adotar programasinternacionais de certificao.

    A valorizao do produto por meio da adoo de certificados talvezseja uma soluo para um dos problemas que ocorrem normalmentedurante o perodo de pico das exportaes brasileiras, em que, paraatender demanda quantitativa, a qualidade do produto exportado

    diminui para aumentar a quantidade de produto enviado, o que, namaioria das vezes, prejudica os exportadores que mantm a qualidademesmo exportando menor quantidade. Dessa forma, a certificao vaipropiciar a manuteno da qualidade independentemente do perodo.

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    A FIGUEIRA 59

    Produo e mercado internacional

    O figo uma fruta produzida e consumida em todos os continen-tes e a produo mundial chega a mais de 1bilho de toneladas porano. O preo pago pelo quilo do fruto fresco tem sofrido aumentonos ltimos anos, fazendo crescer o volume de exportaes (Mapa,2008). A maior parte da produo mundial concentra-se na regioda Bacia Arbica do Mediterrneo, compreendida pelos seguintespases: Egito, Grcia, Ir, Marrocos, Turquia, Itlia e Espanha. ATurquia tem atualmente a maior produo de frutos. Outros pasesfora dessa regio tambm tm produo significativa de figo, comoEUA, China, Mxico, ndia e Brasil, que responde por 5% da pro-duo mundial (Mapa, 2008; Toda Fruta, 2008).

    Por se tratar de uma fruta climatrica, ou seja, que tem maturaoaps a colheita, o figo tem pouco tempo de prateleira, o que dificultaa atividade de exportao. Com isso, mesmo alguns pases tendograndes produes, estas se destinam principalmente ao mercado

    interno, ficando o Brasil (figo tipo comum: roxo-de-valinhos) e aTurquia (tipo polinizado: smirna) como importantes fornecedoresde figo ao mercado internacional.

    A produo do figo pode ser destinada tanto para a comercia-lizao in naturaquanto para a industrializao. Para a indstria,o fruto meio maduro destina-se produo do doce de figo, secoe caramelado, tipo rami; o figo inchado, ou de vez, pode ser usado

    para o preparo de compotas e figadas, enquanto os figos verdes soempregados para a produo de compotas e doces cristalizados.

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    Grfico 1 Principais pases produtores de Figo (Ficus carica) e sua repre-

    sentao no mercado mundial.

    Fonte: FAO (2004)

    O figo est entre as frutas frescas mais exportadas pelo Brasil

    (IBGE, 2008), e entre o perodo de 2000 e 2002, a quantidadeenviada a outros pases sofreu um decrscimo, mas a partir desseperodo, apresentou consecutivos aumentos a cada ano, ultrapas-sando, a partir de 2006, a quantia de 1 milho de quilos enviados.O valor pago por essa fruta tambm apresentou o mesmo compor-tamento, ultrapassando, a partir de 2005, a soma de US$ 2 milhes,e em 2007 ultrapassou a marca dos US$ 6 milhes em exportaes,

    representando esse valor um acrscimo mdio de 130% sobre osvalores pagos em anos anteriores. Dessa maneira, a exportao defigo passou a representar 1% do valor e 0,2 % da quantidade de frutasfrescas nacionais exportadas.

    A colheita do figo no Brasil concentra-se de novembro a maro,perodo de entressafra da produo da fruta fresca no HemisfrioNorte e nos pases do Mercosul. No mercado interno, por sua vez, os

    preos so menos atrativos, tornando a exportao uma opo vanta-josa. Para o mercado europeu, o maior volume deve ser exportado ato final de janeiro por causa da entrada do fruto originrio da Turquiaem fevereiro, com preos inferiores aos praticados pelos produtores

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    A FIGUEIRA 61

    brasileiros, por ter proximidade com o mercado consumidor (euro-peu) e tambm por apresentar maior tempo de prateleira. Os preosrecebido