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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA SOCIAL MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL Validação da Escala de Avaliação da Percepção Visual (EAPV) com idosos Hermesson Daniel Medeiros da Silva João Pessoa, Fevereiro de 2014

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARABA

    CENTRO DE CINCIAS HUMANAS E LETRAS

    DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM PSICOLOGIA SOCIAL

    MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL

    Validao da Escala de Avaliao da Percepo Visual (EAPV) com

    idosos

    Hermesson Daniel Medeiros da Silva

    Joo Pessoa,

    Fevereiro de 2014

  • Hermesson Daniel Medeiros da Silva

    Validao da Escala de Avaliao da Percepo Visual (EAPV) com

    idosos

    Dissertao apresentada ao Programa de

    Ps-Graduao em Psicologia Social da

    Universidade Federal da Paraba, nvel

    Mestrado, sob a orientao do Prof. Dr.

    Natanael Antonio dos Santos, como

    requisito para obteno do ttulo de Mestre

    em Psicologia Social.

    Joo Pessoa,

    Fevereiro de 2014

  • S586v Silva, Hermesson Daniel Medeiros da. Validao da Escala de Avaliao da Percepo Visual

    (EAPV) com idosos / Hermesson Daniel Medeiros da Silva.-- Joo Pessoa, 2014.

    122f. : il. Orientador: Natanael Antonio dos Santos Dissertao (Mestrado) - UFPB/CCHL 1. Psicologia social. 2. Percepo visual - idoso - avaliao.

    3. Envelhecimento cognitivo. TRI-Teoria de Resposta ao Item. UFPB/BC CDU: 316.6(043)

  • Validao da Escala de Avaliao da Percepo Visual (EAPV) com

    idosos

    Hermesson Daniel Medeiros da Silva

    Assinaturas da banca examinadora atestando que a presente

    dissertao foi defendida e aprovada em 27 de fevereiro de 2014:

    __________________________________________________________

    Prof. Dr. Natanael Antonio do Santos

    (Orientador)

    __________________________________________________________

    Prof. Dr. Bernardino Fernndez Calvo

    (Membro Interno)

    __________________________________________________________

    Prof. Dr Maria do Carmo Eullio

    (Membro Externo)

  • No espere por uma crise para descobrir o que importante em sua vida

    (Plato)

  • Dedico este trabalho minha

    esposa, Anna Luzia, por me apoiar

    de maneira incondicional nesse meu

    percurso acadmico. A meu av

    (Belarmino in memorian) pelo seu

    desejo em me ver formado, que no

    imaginava que chegaria to longe, e

    a minha av (Mariana in

    memorian), que recentemente

    terminou sua jornada na terra, por

    todo o amor, carinho, dedicao e

    por ter se apresentado para mim,

    como estmulo no estudo do

    envelhecimento.

  • Agradecimentos

    Ao contrrio de muitos, considero os agradecimentos uma das partes mais

    importantes do texto, na medida em que no se faz pesquisa sozinho. Diversas so as

    pessoas s quais, hoje, sou grato. Agradeo primeiramente, minha amada esposa, por

    todo seu incentivo, apoio, dedicao e investimento. Por acreditar que eu era capaz,

    confiar no meu trabalho, ter me ajudado durante todo esse percurso, ter sido

    companheira e compreensiva diante de minhas ausncias e posicionamentos nessa reta

    final da dissertao. Sem ela, no sei como teria concludo.

    Aos meus pais, Daniel e Guilhermina, por todo amor, carinho e apoio que recebi

    ao longo da minha vida, pelos seus ensinamentos, preocupao e pelo investimento em

    minha formao.

    minha querida irm, Jessica, pelas vezes que, sem medir esforos, ajudou-me.

    Ao meu orientador, Prof. Dr. Natanael Antonio dos Santos, por ter me dado a

    oportunidade de realizar o mestrado, pelo acolhimento ao grupo e pelo incentivo

    cientfico.

    Ao Prof. Dr. Bernardino Fernndez Calvo, pela confiana, ateno, compreenso

    e pacincia, por acreditar no meu trabalho, pela sua incomensurvel disponibilidade em

    ajudar, por sua preocupao com minha pessoa e pela amizade construda.

    Profa. Dra. Maria do Carmo Eullio, por deixar as portas abertas do seu grupo

    de pesquisa, que, sem pestanejar, ajudou-me de maneira incontestvel. Pelo incentivo,

    preocupao, carinho e ajuda sem precedentes durante minha formao acadmica.

    Aos meus amigos Rmulo, Frankleudo e Thiago pelo incentivo,

    companheirismo em momentos difceis, disponibilidade em ajudar nas anlises

    estatsticas e por tornar meus dias mais divertidos.

  • Aos colegas do Laboratrio de Percepo, Neurocincias e Comportamento

    (LPNeC), pelo acolhimento.

    Aos amigos de laboratrio Maria, Joenilton e Everton, pela troca de experincia,

    ajuda na coleta de dados e por sempre estarem disponveis em me ajudar e compartilhar

    minhas preocupaes.

    s coordenadoras dos Centros de Convivncia, Gilma e Onlia, e s

    coordenadoras dos programas destinados aos idosos da UEPB, Jozilma e Gorette, pela

    disponibilidade em ajudar e permitir a realizao da coleta.

    A todos os familiares e amigos que torceram por mim.

    A todos os idosos participantes da pesquisa.

    Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior CAPES

    pelo auxlio financeiro.

  • Sumrio

    ndice de figuras ......................................................................................................................... viii

    ndice de tabelas ........................................................................................................................... ix

    Lista de siglas e abreviaturas ......................................................................................................... x

    Resumo ........................................................................................................................................ xii

    Abstract ...................................................................................................................................... xiii

    Introduo ................................................................................................................................... 14

    PARTE I MARCO TERICO ................................................................................................. 16

    1. Percepo ................................................................................................................................ 17

    1.1 Aspectos histricos do estudo da sensao e percepo ................................................... 17

    1.2 Percepo visual ................................................................................................................ 18

    1.3 Abordagens da percepo visual ....................................................................................... 20

    1.3.1 Abordagem neurofisiolgica da percepo visual ...................................................... 20

    1.3.1.1 Aspectos neuroanatmicos da percepo visual ................................................. 23

    1.3.2 Abordagem da Gestalt ................................................................................................ 25

    1.3.3 Habilidades perceptivas .............................................................................................. 28

    1.4 Avaliao da percepo visual .......................................................................................... 29

    1.4.1 Escalas e testes neuropsicolgicos de avaliao da percepo visual ........................ 29

    1.4.2 Desenvolvimento da Escala de Avaliao da Percepo Visual (EAPV) .................. 31

    2. Envelhecimento cognitivo ....................................................................................................... 33

    2.1 Reduo da velocidade de processamento ........................................................................ 36

    2.2 Declnio do funcionamento da memria de trabalho ........................................................ 37

    2.3 Declnio da funo inibitria ............................................................................................. 37

    2.4 Declnio das funes sensoriais ......................................................................................... 38

    2.5 Envelhecimento cognitivo e percepo visual .................................................................. 38

    PARTE II ESTUDO EMPRICO ............................................................................................. 41

    3. Objetivos ................................................................................................................................. 42

    3.1 Geral .................................................................................................................................. 42

  • 3.2 Especficos ........................................................................................................................ 42

    4. Mtodo .................................................................................................................................... 43

    4.1 Tipo de estudo ................................................................................................................... 43

    4.2. Amostra ............................................................................................................................ 43

    4.3 Instrumentos ...................................................................................................................... 45

    4.3.1 Funcionamento cognitivo ........................................................................................... 45

    4.3.2 Percepo visual ......................................................................................................... 46

    4.3.3 Estado afetivo ............................................................................................................. 47

    4.3.4 Funcionalidade ........................................................................................................... 47

    4.3.5 Sade .......................................................................................................................... 48

    4.5 Aspectos sociodemogrficos ......................................................................................... 48

    4.6 Procedimentos ............................................................................................................... 48

    4.7 Anlises estatsticas ........................................................................................................... 49

    4.8 Consideraes ticas ......................................................................................................... 53

    5. Resultados ............................................................................................................................... 55

    5.1 Anlise fatorial da EAPV .................................................................................................. 55

    5.2 Validade convergente e discriminante da EAPV .............................................................. 62

    5.3 Anlise dos parmetros dos itens da EAPV por meio da TRI ........................................... 64

    6. Discusso ................................................................................................................................. 68

    7. Consideraes finais ................................................................................................................ 74

    8. Referncias .............................................................................................................................. 76

    9. Apndices ................................................................................................................................ 90

    10. Anexos................................................................................................................................... 95

  • viii

    ndice de figuras

    Figura 1. A. O olho humano com imagem invertida projetada na retina. B. Camada da retina com clulas

    fotorreceptoras (cones e bastonetes), clulas bipolares, clulas ganglionares, clulas amcrimas

    e clulas horizontais. Retirado e adaptado de Lent (2010)...................................................... 21

    Figura 2. Vias de processamento visual: via dorsal e via ventral. Retirado e adaptado de Lent (2010)....... 24

    Figura 3. Experimento de Wertheimer de movimento ilusrio. Retirado e adaptado de Goldstein (2010)... 25

    Figura 4. Princpios da Gestalt. a) princpio da proximidade; b) princpio da similaridade; c) princpio da

    boa continuidade; e d) princpio da simetria. Retirado e adaptado de Gordon (2004).................. 27

    Figura 5. Exemplo de figura-fundo, vaso de Rubin. Retirado e adaptado de Gordo (2004).......................... 28

    Figura 6. Exemplo de Curva Caracterstica do Item (Pasquali & Primi, 2003)........................................... 51

    Figura 7. Exemplo dos parmetros de discriminao de dois itens (Pasquali & Primi, 2003)..................... 52

    Figura 8. Exemplo do parmetro de acertos ao acaso (adaptado de Pasquali & Primi, 2003)....................... 53

    Figura 9. Grfico dos valores prprios da EAPV..................................................................................... 56

    Figura 10. Curvas Caractersticas dos itens 2 e 9...................................................................................... 63

    Figura 11. Curva de informao da EAPV................................................................................................ 64

  • ix

    ndice de tabelas

    Tabela 1. Estatsticas descritivas dos aspectos sociodemogrficos, cognitivos, afetivos, funcionais

    e de sade........................................................................................................................... 44

    Tabela 2. Estrutura fatorial da EAPV................................................................................................ 57

    Tabela 3. Estrutura fatorial da EAPV com fixao do nmero de fatores......................................... 57

    Tabela 4. Valores empricos e aleatrios dos 8 fatores da EAPV.................................................... 58

    Tabela 5. Estrutura fatorial da EAPV a partir de matrizes de correlaes tetracricas.................... 59

    Tabela 6. Estrutura fatorial final da EAVP........................................................................................ 60

    Tabela 7. Correlaes de Spearman da EAPV com testes bateria perceptiva e cognitiva.............. 62

    Tabela 8. Estatsticas de ajustes aos modelos.................................................................................... 62

    Tabela 9. Parmetros de dificuldade dos itens................................................................................... 63

    Tabela 10. ndice de ajuste dos itens ao modelo.................................................................................. 65

  • x

    Lista de siglas e abreviaturas

    AFE Anlise Fatorial Exploratria

    AFC Anlise Fatorial Confirmatria

    AIC Critrio de Informao de Akaike

    AGFI Adjusted Goodness of Fit Index

    BIC Critrio de Informao Bayesiano

    CCI Curva Caracterstica do Item

    CCS Centro de Cincias da Sade

    CEP Comit de tica em Pesquisa

    CIRS Escala de Avaliao de Doenas Cumulativas

    DRS Escala de Avaliao de Demncia

    DRS_A Escala de Avaliao de Demncia (Sub-escala Ateno)

    DRS_I/P Escala de Avaliao de Demncia (Sub-escala Iniciativa e Perseverao)

    DRS_Const Escala de Avaliao de Demncia (Sub-escala Construo)

    DRS_Conc Escala de Avaliao de Demncia (Sub-escala Conceituao)

    DRS_M Escala de Avaliao de Demncia (Sub-escala Memria)

    DTVP Developmental Test of Visual Perception

    EAPV Escala de Avaliao da Percepo Visual

    EDG Escala de Depresso Geritrica

    FI Funo de Informao

    GFI Goodness of Fit Index

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    KMO Kaiser-Meyer-Olkin

    MEEM Mini Exame do Estado Mental

    NGL Ncleo Geniculado Lateral

    PAF Principal Axis Factoring

  • xi

    PET Tomografia por Emisso de Psitrons

    PNAD Pesquisa Nacional por Amostra e Domiclio

    QAFP Questionrio de Atividades Funcionais de Pfeiffer

    RMSR Root Mean Square of Residuals

    SPSS Statistical Package for the Social Sciences

    TCT Teoria Clssica dos Testes

    TCVB Teste de Discriminao Visual de Benton

    TFCR Teste da Figura Complexa de Rey

    TFSP Teste de Figuras Sobrepostas de Poppelreuter

    TFV Teste de Fluncia Verbal

    TRI Teoria de Resposta ao Item

    UAMA Universidade Aberta Maturidade

    UBSF Unidade Bsica de Sade da Famlia

    UEPB Universidade Estadual da Paraba

    VOSP Visual Object Space Perception

  • xii

    Resumo

    O objetivo do presente estudo foi verificar evidncias de validade da Escala de

    Avaliao da Percepo Visual (EAPV) com idosos. Para isso, contou-se com a

    colaborao de 104 pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, de ambos os sexos,

    selecionadas de forma no-aleatria e residentes nos municpios de Joo Pessoa e

    Campina Grande PB. Alm da EAPV, na coleta de dados foram aplicados os

    seguintes instrumentos: Mini-Exame do Estado Mental (MEEM), Escala de Avaliao

    de Demncia (DRS), Teste de Fluncia Verbal (TVB), Teste de Figura Complexa de

    Rey (TFCR), Teste de Discriminao Visual de Benton (TDVB), Teste de Figuras

    Sobrepostas de Poppelreuter (TFSP), Escala de Depresso Geritrica (EDG-15),

    Questionrio de Atividades Funcionais de Pfeffer (QAFP), Escala de Avaliao de

    Doenas Cumulativas (CIRS) e um Questionrio sociodemogrfico. Os idosos foram

    entrevistados em Centros de Convivncia, Unidades Bsicas de Sade da Famlia

    UBSF e em trs programas da Universidade Estadual da Paraba (UEPB), destinados

    para o idoso: Universidade Aberta no Tempo Livre, Viva a Velhice com Plenitude e

    Universidade Aberta Maturidade (UAMA). Foram realizadas anlises descritivas,

    Anlise Fatorial Exploratria, anlise paralela, clculo da consistncia interna,

    verificao de validade convergente e discriminante e estimao dos parmetros dos

    itens utilizando a Teoria de Resposta ao Item (TRI). Utilizou-se, nas anlises, os

    softwares SPSS, verso 18.0, FACTOR verso 9.20 e a linguagem R, verso 2.15.1. A

    partir das anlises fatoriais, verificou-se uma estrutura unifatorial da EAPV composta

    por 13 itens que avaliam os aspectos da figura-fundo (2 e 18), visuocontruo (4, 8, 12,

    16 e 20) e discriminao visual (9, 11, 14, 15, 17, e 18). Foi possvel atestar a validade

    convergente e discriminante da EAPV a partir das correlaes significativas com os

    testes que avaliam a percepo visual e ausncia de correlao com os que mensuram

    construtos distintos. Quanto as anlise via TRI verificou-se que o melhor ajuste dos

    dados foi ao modelo 1 parmetro de Rach. Estimou-se o parmetro de dificuldade dos

    itens dos quais apresentaram uma variao de -2,81 a 0,93 (M = -0,67; DP = 1,20). Foi

    observado que a EAPV oferece mais informao para os indivduos com percepo

    visual mediana. De modo geral, os resultados indicam que a EAPV configurou-se como

    uma medida vlida para avaliar a percepo visual em idosos.

    Palavras-chave: percepo visual, idoso, envelhecimento, envelhecimento cognitivo,

    validade, TRI.

  • xiii

    Abstract

    The aim of this study was to investigate evidence of validity of the Scale for

    Assessment of Visual Perception (AEFI) with elderly people. He was assisted with the

    collaboration of 104 people aged over 60 years, of both sexes, selected non-random way

    and residents in Joo Pessoa and Campina Grande - PB. Besides the AEFI in data

    collection, the following instruments were applied: Mini-Mental State Examination

    (MMSE), Dementia Rating Scale (DRS), Verbal Fluency Test (TVB), the Rey Complex

    Figure Test (TFCR), the Benton Visual Discrimination Test (TDVB) in Figures Test

    superimposed Poppelreuter (TFSP), Geriatric Depression Scale (GDS-15), Functional

    Activities Questionnaire Pfeffer (QAFP), Rating Scale cumulative Illness (CIRS), and a

    sociodemographic questionnaire. The elderly were interviewed in Centers, Basic Health

    Units Family - UBSF and three programs from the State University of Paraba (UEPB)

    intended for the elderly: Open University in Leisure, Live Aging with Fullness and

    Open University to Maturity (UAMA). Descriptive analyzes, exploratory factor

    analysis, parallel analysis, calculation of internal consistency check convergent and

    discriminant validity and estimation of the parameters of the items using the Item

    Response Theory (IRT) were performed. Was used in the analyzes SPSS software,

    version 18.0, 9:20 FACTOR version and language R, version 2.15.1. From the factor

    analysis, there was an AEFI the factor structure composed of 13 items that assess

    aspects of figure-ground (2:18), visuocontruo (4, 8, 12, 16 and 20) and visual

    discrimination (9, 11, 14, 15, 17, and 18). It was possible to certify the convergent and

    discriminant validity of AEFI from significant correlations with tests that assess visual

    perception and lack of correlation with those that measure distinct constructs. As the

    route TRI analysis it was found that the best fit of the data to the model was 1 Rach

    parameter. We estimated the parameter of difficulty of the items of which varied

    between -2.81 to 0.93 (M = -0.67, SD = 1.20). It was observed that AEFV provides

    more information for individuals with visual perception median. Overall, the results

    indicate that the AEFI was configured as a valid measure for assessing visual perception

    in the elderly.

    Keywords: visual perception, elderly, aging, cognitive aging, validity, TRI.

  • 14

    Introduo

    O processamento visual caracteriza-se como o sistema sensorial mais importante

    para o homem (Schiffman, 2005). De acordo com Gazzaniga, Ivry e Mangnun (2006),

    as informaes visuais dominam as percepes do ser humano. Os autores acrescentam

    que a viso teve uma importncia evolutiva na histria da humanidade, ao possibilitar a

    percepo de informaes distantes. Para Schiffman (2005), a relevncia do sistema

    visual pode ser constatada pelo fato de metade do crtex cerebral ser destinado ao

    processamento das informaes visuais.

    O fenmeno do envelhecimento acompanhado do declnio de diversas funes

    cognitivas (Salthouse, 2010). De acordo com Foutaine (2010), existem alteraes

    perceptivas observadas nos idosos. O autor resume inmeros estudos que apontam que

    as principais mudanas da percepo visual esto relacionadas: ao aumento com a idade

    dos limiares absolutos e diferenciais; ao aumento da sensibilidade de ofuscao;

    dificuldade de discriminao de certas cores; e reduo da acuidade visual.

    possvel encontrar na literatura inmeras medidas utilizadas na avaliao da

    percepo visual. Entretanto, boa parte dos testes e escalas aplicadas apresenta estudos

    de validao apenas com crianas. Desse modo, a finalidade desse estudo foi verificar

    evidncias de validade da Escala de Avaliao da Percepo Visual (EAPV) em uma

    amostra de idosos saudveis. A presente dissertao composta por duas partes

    subdivididas em 10 captulos. A Parte I Marco Terico constitui-se de dois captulos

    que possuem carter introdutrio. O Captulo 1 aborda as principais idias sobre a

    percepo, com enfoque na percepo visual. O Captulo 2 apresenta os aspectos gerais

    do envelhecimento cognitivo e estudos que relacionam o envelhecimento com a

    percepo visual. A parte II Estudo Emprico formada por oito captulos. No

    Captulo 3 so apresentados os objetivos do estudo. O captulo 4 descreve o mtodo da

  • 15

    pesquisa. Os Captulos 5 e 6 tratam do relato e discusso dos principais resultados

    encontrados. O Captulo 7 aborda as consideraes finais do estudo. No Captulo 8

    esto disponibilizadas as referncias utilizadas. Os Captulos 9 e 10 apresentam

    respectivamente os apndices e anexos.

  • 16

    PARTE I MARCO TERICO

  • 17

    1. Percepo

    1.1 Aspectos histricos do estudo da sensao e percepo

    Durante a antiga civilizao grega j existia uma preocupao sobre como o ser

    humano adquire o conhecimento proveniente do meio externo. Naquela poca, a

    experincia era concebida como a principal maneira de obteno do conhecimento,

    sendo Aristteles (384-322 a.C.) o responsvel por introduzir a classificao bsica dos

    cinco sentidos: viso, audio, olfato, paladar e tato (Schiffman, 2005).

    Os questionamentos sobre a aquisio de conhecimento pelo homem

    direcionaram o foco, durante os sculos XVII e XVIII, para a escola filosfica

    empirista, que compreendia a mente humana como uma tbula rasa. Os seus principais

    representantes Thomas Hobbes (1588-1679), John Locke (1632-1704) e George

    Berkeley (1685-1753) defendiam que todo o conhecimento derivado das experincias

    dos sentidos (Schultz & Schultz, 2009). De acordo com os empiristas, as sensaes so

    as principais fontes de informao do meio externo (Schiffman, 2005).

    Em meados do sculo XIX, a emancipao das cincias sociais em relao

    filosofia foi substancialmente influenciada pelos pressupostos epistemolgicos

    provenientes do pensamento positivista (lvaro & Garrido, 2006). O progresso

    observado nas cincias naturais contribuiu no fortalecimento da ideia de que para o

    desenvolvimento do conhecimento social era necessria a adoo dos mesmos

    princpios metodolgicos utilizados pelos cientistas naturais. No que diz respeito

    Psicologia, houve influncia principalmente da Fisiologia e Psicofsica (lvaro &

    Garrido, 2006).

  • 18

    Diversos foram os pensadores que contriburam para a consolidao da

    Psicologia no ambiente acadmico. De acordo com lvaro e Garrido (2006), Johann

    Friedrich Herbart (1776-1841) foi um dos primeiros a propor a psicologia como cincia,

    ao relacionar os contedos mentais com frmulas e expresses matemticas. Segundo

    Schiffman (2005), outros pesquisadores como Ernst Weber (1834-1846) e Gustav

    Fechner (1850-1860) deixaram contribuies relevantes. O primeiro realizou

    experimentos somatossensoriais e introduziu a ideia da diferena mnima detectvel

    entre estmulos diferentes. J Fechner (1850-1860), que considerado o pai da

    psicofsica, foi o responsvel pelos mtodos usualmente empregados na determinao

    do limiar absoluto (Schiffman, 2005).

    Embora os legados de Weber e Fechner tenham sido importantes para a

    consolidao da Psicologia, foi no ano de 1879, em Leipzig na Alemanha, com a

    fundao do primeiro laboratrio de Psicologia Experimental por Wilhelm Wundt

    (1832-1920), que, definitivamente, a mesma se institui como cincia (Schultz &

    Schultz, 2009). Alm de fundar o laboratrio, Wundt foi responsvel por criar a

    primeira revista de Psicologia Experimental de sua poca e por desenvolver

    experimentos envolvendo a sensao, percepo, ateno e tempo de reao (Schultz &

    Schultz, 2009).

    1.2 Percepo visual

    A maneira pela qual o ser humano se relaciona com o mundo a sua volta passa

    por dois processos psicolgicos bsicos: a sensao e a percepo. Ambos so

    considerados unificveis e inseparveis, embora apresentem definies distintas

    (Schiffman, 2005). A sensao consiste no processo de transformao de certos

  • 19

    aspectos da energia fsica e qumica existentes no ambiente em impulsos nervosos

    capazes de ser entendidos pelos neurnios (Lent, 2010). A percepo diz respeito ao

    processo psicolgico bsico capaz de atribuir significado a estmulos sensoriais, a partir

    de experincias passadas (Kandel, Schwartz, Jessel, Siegelbaum & Hudspeth, 2013).

    Segundo Gazzaniga, Ivry e Mangun (2006), o processo perceptivo est relacionado

    aquisio, interpretao, seleo e organizao de informaes adquiridas pelos

    sentidos.

    A percepo pode ser classificada em funo do sistema sensorial envolvido no

    processo de captao do estmulo ambiental (Hockenbury & Hockenbury, 2002). Dessa

    forma, pode-se considerar a existncia de uma percepo visual, uma auditiva, uma

    olfativa, uma gustativa e uma ttil. Entretanto, os processos perceptivos visuais

    apresentam um nmero maior de estudos. Talvez isso se deva, em parte, por dois

    motivos: primeiro que diante dos demais sistemas sensoriais, o processamento visual o

    que melhor se compreende em funo da acessibilidade anatomia e s estruturas

    envolvidas na viso. Segundo, devido importncia adaptativa que a viso adquiriu

    durante a evoluo do ser humano, de tal forma que o sistema sensorial que mobiliza

    cerca de 50% do crtex cerebral para seu processamento (Schiffman, 2005).

    Destarte, compreende-se a percepo visual como o resultado final de um

    procedimento complexo, que envolve mais do que a transformao de estmulos fsicos

    em impulsos nervosos que so transmitidos para regies especficas do crebro. Trata-se

    de um processo no qual h atribuio de sentidos e significados aos inputs sensoriais

    que chegam ao crtex cerebral (Gazzaniga, et al., 2006). Dessa maneira, faz-se

    necessrio discorrer sobre as perspectivas tericas que lidam com o processamento

    perceptual.

  • 20

    1.3 Abordagens da percepo visual

    Antes de adentrar nas principais correntes tericas da percepo visual,

    importante destacar as duas formas bsicas de processamento perceptual: bottom-up e

    top-down. O processo bottom-up (de baixo para cima) ou data-driven processing

    (processamento dirigidos por dados) prope uma anlise que parte das caractersticas

    bsicas de um estmulo em direo a constituio de nveis mais elevados (Hockenbury

    & Hockenbury, 2002). Ou seja, consiste em um processamento que vai das partes para o

    todo. A forma de processamento top-down (de cima para baixo) ou concepually driven

    processing (processamento dirigido por conceituao) envolve o conhecimento, as

    experincias e as expectativas na construo da percepo. Com outras palavras,

    envolve a interpretao do todo em detrimento das partes (Schiffman, 2005).

    1.3.1 Abordagem neurofisiolgica da percepo visual

    A perspectiva terica neurofisiolgica compreende a percepo como um

    processo que envolve as vias neurais e fisiolgicas dos sistemas sensoriais (Schiffman,

    2005). Prope que os mecanismos neurais embasam todo e qualquer comportamento

    humano. O crebro o principal responsvel pelo processamento da informao visual.

    Entretanto, existem diversos fenmenos que antecedem a chegada da informao no

    crtex cerebral. Inicialmente, importante considerar que o estmulo fsico responsvel

    por excitar as clulas sensrias do sistema visual a luz. A luz consiste em um tipo de

    energia eletromagntica que se propaga na natureza em forma de onda (Schiffman,

    2005).

  • 21

    Na percepo visual, a luz que refletida nos objetos; ao penetrar no olho

    humano, passa pelo cristalino, e projeta a imagem de maneira invertida na retina (Figura

    1). A retina composta por milhes de clulas fotorreceptoras que transforma a luz em

    sinais eltricos por meio de um processo denominado de transduo (Goldestein, 2010;

    Kandel et al., 2013).

    Existem dois tipos de clulas fotorreceptoras na retina: os bastonetes e os cones,

    assim denominados devido s suas formas (Figura 1). Os bastonetes esto localizados

    essencialmente na regio perifrica da retina. Eles so sensveis a baixos nveis de

    luminosidade e consequentemente responsveis pela viso noturna. Por outro lado, os

    bastonetes no apresentam sensibilidade para a viso de cores. Acredita-se que existem

    em torno de 120 a 130 milhes de bastonetes na retina (Gazzaniga et al., 2006;

    Goldestein, 2010).

    Figura 1. A. O olho humano com imagem invertida projetada na retina. B. Camada da retina

    com clulas fotorreceptoras (cones e bastonetes), clulas bipolares, clulas ganglionares,

    clulas amcrimas e clulas horizontais. Retirado e adaptado de Lent (2010).

  • 22

    Em contrapartida, os cones esto concentrados principalmente na regio da

    fvea na retina. So responsveis pela viso diurna, viso de cores e viso de detalhes,

    assim como so ativos em alta luminosidade e apresentam boa resoluo espacial

    (Gazzaniga et. al., 2006). Alm das clulas fotorreceptoras, existem outros quatro tipos

    de neurnios na retina: clulas bipolares, clulas ganglionares, clulas amcrimas e

    clulas horizontais (Lent, 2010).

    De forma resumida, as clulas fotorreceptoras realizam diversos tipos de

    conexes neurais na retina, sobretudo com as clulas bipolares, que, por sua vez, ligam-

    se s clulas ganglionares. Os axnios das clulas ganglionares formam o nervo ptico,

    que se origina na regio posterior do olho, sendo responsvel por levar informaes

    visuais ao crtex cerebral (Schiffman, 2005).

    Antes de chegar ao sistema nervoso central, o nervo ptico converge para o

    quiasma ptico, onde h um cruzamento em forma de X das fibras nervosas. no

    quiasma ptico que uma parte do campo visual de cada olho se projeta no seu lado

    oposto do lobo occipital. Por exemplo, metade das informaes do olho direito

    representada no lado esquerdo do crtex visual. Por outro lado, pequena parte das

    informaes segue para o colculo superior (regio responsvel pela coordenao dos

    movimentos oculares e localizao espacial), e a maioria dos axnios, aps cruzar o

    quiasma ptico, realiza sinapse com as clulas do Ncleo Geniculado Lateral (NGL),

    localizado no tlamo (Gazzaniga et. al., 2006).

    O NGL consiste em um importante centro de regulao e organizao de

    informaes recebidas das diversas estruturas do sistema visual (Schiffman, 2005). Ao

    sair do NGL, os estmulos sensoriais partem para serem interpretados no crtex visual

    (Gazzaniga et. al., 2006).

  • 23

    1.3.1.1 Aspectos neuroanatmicos da percepo visual

    O crtex visual composto por um agrupamento de diferentes reas funcionais,

    cada uma responsvel por processar um aspecto distinto do sistema visual. A regio que

    recebe a maior gama de informaes do NGL a rea visual primria ou V1, tambm

    conhecida como crtex estriado e rea 17 de Brodmann (Schiffman, 2005). Ao seu

    redor, esto situadas as demais reas da funo visual, que so conhecidas como crtex

    extra-estriado, crtex associativo ou rea 18 de Brodmann. Assim como V1, tambm

    so nomeadas de acordo com sua localizao relativa ao crtex visual primrio, como

    V2, V3, V4 e V5 (rea mdio-temporal MT). A rea V1 capaz de interpretar apenas

    as caractersticas elementares dos estmulos com bordas e orientaes. As reas V2 e V3

    so responsveis por processar estmulos visuais relacionados forma e orientao. A

    rea V4 analisa as informaes sobre cores e a rea V5 especializada no

    processamento de estmulos de movimento (Kandel et al., 2013; Lent, 2010).

    No obstante, existem, ainda, duas importantes vias envolvidas no

    processamento visual. A primeira, denominada de via ventral, occipitotemporal ou via

    o qu, responsvel pelo reconhecimento de objetos. A segunda, conhecida como via

    dorsal, occipitoparietal ou via onde, fundamental para a percepo espacial (Figura

    2). Mishkin, Ungerleider e Macko (1983), em estudos com macacos, identificaram vias

    independentes, porm paralelas, responsveis pela discriminao e localizao dos

    objetos.

  • 24

    Nesse sentido, os estudos de Haxby et al. (1991), utilizando a tcnica de

    Tomografia por Emisso de Psitrons (PET) em humanos, apresentam importantes

    contribuies. Tais pesquisadores propuseram a 11 indivduos a realizao de duas

    tarefas. Na primeira, o participante era solicitado a discriminar faces. J na segunda, o

    indivduo tinha que indicar qual dos estmulos que lhes eram apresentados encontrava-

    se na mesma localizao de um estmulo padro. Haxby et al. (1991) observaram

    ativao da regio occipitotemporal e occipitoparietal, durante a tarefa de discriminao

    e de localizao, respectivamente.

    A descoberta de diversas regies corticais responsveis pelo sistema visual

    proporcionou o surgimento de modelos a respeito da maneira como as informaes so

    processadas. O primeiro deles, denominado de processamento hierrquico, pressupe

    que as informaes so analisadas de maneira que as mais simples antecedem as mais

    complexas. O segundo, conhecido como processamento paralelo, postula que os

    aspectos das informaes visuais (ex.: cor, forma, movimento) so processados

    simultaneamente em regies especficas do crtex visual (Lent, 2010).

    Figura 2. Vias de processamento visual: via dorsal e via ventral.

    Retirado e adaptado de Lent (2010).

  • 25

    1.3.2 Abordagem da Gestalt

    A Psicologia da Gestalt surgiu no incio do sculo XX, na Alemanha, em

    oposio teoria estruturalista, que defendia uma viso atomista da percepo

    (Schiffman, 2005). O fundador do estruturalismo, Titchener (1867-1927) compreendia a

    percepo como o somatrio de sensaes bsicas e que a Psicologia deveria estudar os

    fenmenos mais elementares da experincia consciente (Schultz & Schultz, 2009).

    De acordo com Gordon (2004), a Psicologia da Gestalt teve incio durante o

    vero de 1910, quando em uma viagem Max Wertheimer observou o padro de

    funcionamento de um estroboscpio de brinquedo. Wertheimer identificou que

    alternncias rpidas de dois estmulos luminosos diferentes so vistos em movimento.

    Tal fenmeno foi denominado de movimento ilusrio, movimento aparente ou

    fenmeno phi (ver Figura 3). Evidentemente, a percepo de movimento oferecida pela

    alternncia sequencial dos estmulos no poderia ser explicada pelos pressupostos do

    estruturalismo (lvaro & Garrido, 2006). Diante disso, Wertheimer continuou

    estudando o fenmeno phi na Universidade de Frankfurt e, juntamente com os

    psiclogos Wolfgang Khler e Kurt Koffka, desenvolveu a teoria da Gestalt (Gordon,

    2004).

    Figura 3. Experimento de Wertheimer de movimento ilusrio. Retirado e

    adaptado de Goldstein (2010).

  • 26

    A Gestalt considera que a percepo muito mais do que os dados fsicos

    bsicos fornecidos pelos nossos sentidos. Para os gestaltistas, os estmulos so

    percebidos de maneira holstica e no de forma fragmentada. Os tericos da Gestalt

    estavam preocupados em encontrar regras especficas capazes de explicar como as

    partes se organizavam para formar o todo. Dessa forma, postularam diversos princpios

    que norteiam a percepo, sobretudo acerca de como ocorre o agrupamento dos

    elementos visuais de maneira a se organizar em padres, configuraes e formas

    (Hockenbury & Hockenbury, 2002).

    Os psiclogos da Gestalt introduziram um princpio geral denominado de lei da

    pregnncia, que rege todos os demais pressupostos da teoria (Gordon, 2004). A lei da

    pregnncia, tambm conhecida como lei da boa forma ou lei da simplicidade diz

    respeito tendncia do ser humano perceber as coisas da maneira mais simples possvel

    (Goldstein, 2010).

    Houve diversos princpios de agrupamento (Figura 4) formulados pelos

    Gestaltistas, dentre os quais destacam-se (Gordon, 2004): 1) Proximidade: trata-se da

    capacidade perceptiva de agrupar os elementos que encontram-se mais prximos entre

    si; 2) Similaridade: consiste no agrupamento perceptivo em funo da semelhana dos

    elementos; 3) Boa continuidade: destaca a tendncia de perceber como grupos os

    elementos que seguem em uma mesma direo; e 4) Simetria: enfatiza a preferncia por

    agrupar formas simtricas em detrimento das assimtricas.

  • 27

    A abordagem da Gestalt procurou compreender, tambm, o fenmeno de figura-

    fundo (Figura 5). Os gestaltistas defendiam que para perceber o mundo no qual os

    objetos e as superfcies encontram-se fisicamente separados era essencial que alguns

    elementos de uma cena se destacassem em relao aos demais (Gordon, 2006). A

    relao figura-fundo trata-se da capacidade do indivduo perceber como figura a parte

    que se apresenta como mais distinta e nitidamente definida, e como fundo aquilo que

    no to distinto (Schiffman, 2005).

    Figura 4. Princpios da Gestalt. a) princpio da proximidade; b) princpio da

    similaridade; c) princpio da boa continuidade; e d) princpio da simetria. Retirado

    e adaptado de Gordon (2004).

  • 28

    Nessa perspectiva, Goldstein (2010) apresenta as principais propriedades da

    relao figura-fundo: 1) a figura possui a qualidade de ser mais memorvel do que o

    fundo; 2) a figura, quando comparada com o observador, parece estar mais prxima do

    que o fundo; 3) o fundo apresenta a caracterstica de ser visto como um elemento de

    forma indefinida que comporta por trs da figura; e 4) a figura possui a capacidade de

    delimitar, por meio do contorno, sua forma, ou seja, o que se trata de figura e o que se

    trata de fundo.

    1.3.3 Habilidades perceptivas

    A percepo visual pode ser compreendida por um conjunto de aspectos ou

    habilidades complexas. Nessa perspectiva, Frostig, Lefever e Whittlesy (1964)

    elaboraram o Developmental Test of Visual Perception (DTVP) para crianas com

    dificuldade de aprendizagem. Os autores propuseram a existncia de cinco habilidades

    Figura 5. Exemplo de figura-fundo, vaso de

    Rubin. Retirado e adaptado de Gordon (2004).

  • 29

    perceptivas: coordenao visuo-motora, figura-fundo, constncia da forma, posio no

    espao e relaes espaciais.

    Por outro lado, Clutten (2009), em estudo sobre o desenvolvimento de uma

    bateria para a avaliao da percepo visual em alunos do ensino bsico, realiza uma

    minuciosa descrio dos diversos aspectos da percepo visual, dos quais se destacam:

    1) Discriminao visual: capacidade de diferenciar objetos; 2) Constncia da forma:

    habilidade de reconhecer uma forma, independente do tamanho, cor ou posio; 3)

    Posio no espao: trata-se da identificao de figuras, formas ou objetos invertidos ou

    em diferentes rotaes; 4) Relaes espaciais: diz respeito ao reconhecimento de objetos

    em determinada posio ou orientao no espao; e 5) Figura-fundo: capacidade de

    discernir um objeto ou uma forma do seu fundo.

    Existem maneiras distintas de avaliar a percepo visual, dentre as quais

    encontram-se as escalas e os testes neuropsicolgicos, que podem auxiliar numa

    avaliao de forma adequada e eficaz. A seguir, so descritas algumas das medidas

    utilizadas na avaliao da percepo visual.

    1.4 Avaliao da percepo visual

    1.4.1 Escalas e testes neuropsicolgicos de avaliao da percepo visual

    Para a avaliao da percepo visual, pode-se contar com inmeros

    instrumentos: aqueles que avaliam apenas um componente especfico da percepo

    visual; aqueles que avaliam diversos aspectos perceptivos; e as baterias

    neuropsicolgicas que avaliam vrias habilidades perceptuais.

  • 30

    Dentre os que avaliam apenas um aspecto da percepo visual, encontram-se,

    sobretudo, os seguintes testes neuropsicolgicos:

    Teste da Figura Complexa de Rey (Oliveira & Rigoni, 2010), Teste do

    Desenho do Relgio e Teste Gestltico Visuomotor de Bender (Bender,

    2003): todos avaliam a habilidade de visuoconstruo (Strauss, Sherman

    & Spreen, 2006);

    Teste de Organizao Visual de Hooper (1958): avalia o aspecto visuo-

    espacial (Strauss et al., 2006);

    Julgamento de Orientao de Linhas (Benton, Varney & Hamsher,

    1978): possui o objetivo de mensurar a orientao e a percepo espacial

    (Strauss et al., 2006);

    Teste de Discriminao Visual de Benton (Benton, Hamsher, Varney &

    Spreen, 1983): avalia a habilidade de discriminao visual;

    Teste de Figuras Sobrepostas de Poppelreuter (Sells & Laner, 2011) e

    Teste de Percepo Visual Figura Fundo (Petersen, Goar & Deusen,

    1985): objetivam mensurar o aspecto figura-fundo da percepo visual;

    Por outro lado, existem os instrumentos que mensuram vrios aspectos da

    percepo visual. O Developmental Test of Visual Perception (DTVP), elaborado por

    Frostig e colaboradores (Maslow, Frostig, Lefever & Whittlesey, 1964) com a

    finalidade de avaliar a percepo visual de crianas com dificuldade de aprendizagem,

    composto por cinco subtestes, cada um responsvel por avaliar um aspecto especfico da

    percepo visual: coordenao visuomotora, figura-fundo, constncia da forma, posio

    no espao e relaes espaciais.

    H tambm as baterias neuropsicolgicas que avaliam mais de um aspecto da

    percepo visual. A Visual Object Space Perception (VOSP) foi desenvolvida por

  • 31

    Warrington e James (1991) com a finalidade de verificar as funes visuoespaciais.

    Dessa forma, o instrumento composto por oito categorias das quais quatro avaliam a

    percepo de objeto e quatro, a percepo de espao (Strauss et al., 2006).

    Nessa perspectiva, diversos pesquisadores (Femina, Senese, Grossi & Venuti,

    2009; Grossi et al., 2002; Nichelli & Magherini, 2005; Trojano et al., 2004) esto

    realizando a avaliao da percepo visual a partir da construo de baterias

    neuropsicolgicas, pois consiste em uma avaliao que contempla vrios aspectos da

    percepo visual, sendo, consequentemente, mais ampla.

    Apesar de existirem diversos instrumentos que avaliam algumas dimenses da

    percepo visual, observa-se que a maioria foi desenvolvida e aplicada com crianas

    (Andrade et al., 2012). Dessa forma, entende-se a necessidade de validar escalas que

    avaliem a percepo visual em amostras diferentes, sobretudo em idosos, que

    apresentam declnio cognitivo durante o processo de envelhecimento.

    1.4.2 Desenvolvimento da Escala de Avaliao da Percepo Visual (EAPV)

    Foi desenvolvida a partir do Programa de Treinamento da Percepo Visual

    (PTVP), realizado com crianas portuguesas que apresentavam dificuldades de

    aprendizagem (Dias & Chaves, 2000). Os autores criaram um instrumento composto por

    64 itens subdivididos em oito categorias da percepo visual: coordenao culo

    manual, cpia, relaes espaciais, posio no espao, figura-fundo, velocidade visual

    motora, lacunas visuais e constncia da forma.

    Para a construo e validao da EAPV, Andrade et al. (2012) realizou dois

    estudos. O primeiro, que foi a construo da escala, teve como referncia uma amostra

    no-probabilstica composta por 295 acompanhantes de usurios do servio de sade,

  • 32

    com idade entre 35 e 65 anos (M = 46,21; DP = 3,40). Os pesquisadores realizaram

    anlise fatorial e utilizaram-se do critrio de Kaiser para selecionar os itens. A partir

    disso, propuseram uma escala constituda por 20 itens que avaliam quatro dimenses da

    percepo visual: constncia da forma, figura-fundo, posio no espao e relaes

    espaciais. Foram realizadas, tambm, anlise de juzes e anlise semntica.

    Em um segundo estudo, foram realizadas anlises das propriedades

    psicomtricas da EAPV. Os pesquisadores utilizaram uma amostra de 183 indivduos

    dos sexos masculino e feminino com faixa etria de 35 a 65 anos (M = 47,98; DP =

    7,47). Realizaram anlise fatorial, utilizando o mtodo PAF (Principal Axis Factoring)

    com rotao oblqua para extrao e rotao dos fatores. Foram encontrados ndices

    satisfatrios de fatoriabilidade (Kaiser-Meyer-Olkin KMO = 0,89 e Teste de

    Esfericidade de Bartlett =5195,50; p

  • 33

    2. Envelhecimento cognitivo

    O envelhecimento est comumente relacionado a dficits e perdas ao nvel

    funcional, cognitivo e comportamental (Neri, 2006). Por outro lado, Salthouse (2010)

    pontua que existem registros histricos de interpretaes negativas e positivas do

    envelhecimento cognitivo. Segundo o autor, Plato (360 a.C.), por exemplo, acreditava

    que o envelhecimento proporcionava uma reduo na capacidade de aprendizagem do

    homem. J para Solon (600 a.C.), o envelhecimento sempre era capaz de ofertar o

    aprendizado de coisas novas. Desde antigamente, possvel observar as divergncias

    de opinies acerca do envelhecimento cognitivo (Salthouse, 2010).

    Segundo Neri (2006), h um consenso entre os pesquisadores de que o

    envelhecimento proporciona um declnio normal da cognio, a partir da meia-idade,

    porm sendo mais comum aps os 70 anos. A autora referencia estudos dos quais

    apontam as funes cognitivas como algo fundamental para a qualidade de vida na

    velhice e longevidade. Por outro lado, o comprometimento cognitivo frequentemente

    est associado a desconforto pessoal, perda de autonomia e aumento dos custos sociais

    (Neri, 2006).

    Existem diferentes formas de avaliar a capacidade cognitiva. Salthouse (2010)

    enumera cinco perspectivas distintas utilizadas na investigao do envelhecimento

    cognitivo: psicomtrica, cognitiva experimental, neuropsicolgica, neurocincia

    cognitiva e epidemiolgica.

    A abordagem psicomtrica trabalha com testes padronizados com a finalidade de

    verificar as diferenas entre os indivduos. Caracteriza-se, sobretudo, pela utilizao de

    grandes amostras com aplicao de vrios testes cognitivos. Preocupa-se

    fundamentalmente com as inter-relaes das variveis estudadas. A perspectiva

  • 34

    cognitiva experimental est interessada na compreenso de processos tericos

    especficos. Desenvolvem estudos com amostras relativamente pequenas, que,

    comumente, so formadas por dois grupos: um de jovens, como por exemplo:

    estudantes universitrios, e outro de idosos. Utilizam de vrias condies ou verses

    diferentes da mesma tarefa, de maneira que permite inferir relaes de causa e efeito.

    Na perspectiva neuropsicolgica, os testes ou tarefas tm o objetivo de avaliar o

    funcionamento de regies cerebrais especficas. Tal perspectiva desenvolve

    frequentemente pesquisas com indivduos que apresentam leses cerebrais. A

    abordagem da neurocincia cognitiva contempla tanto os aspectos da perspectiva

    cognitiva experimental como da neuropsicolgica. Entretanto, distingue-se das demais

    pela utilizao de medidas de ativao cerebral enquanto os participantes realizam os

    testes ou tarefas. Por fim, a perspectiva epidemiolgica comumente est preocupada em

    realizar uma avaliao cognitiva breve de um grande nmero de indivduos. Assim, se

    detm mais aos aspectos gerais do funcionamento cognitivo (Salthouse, 2010).

    Conforme destaca Salthouse (2010), o estudo do envelhecimento cognitivo

    proporcionou duas intrigantes questes para os pesquisadores. A primeira trata-se dos

    padres de relacionamento distintos entre as variveis cognitivas e o aumento da idade.

    Ou seja, durante o envelhecimento cognitivo h habilidades que se deterioram enquanto

    outras permanecem estveis. Nesse sentido, Park e Minear (2004) realizaram uma

    pesquisa com 345 adultos de 20 a 95 anos e constataram um declnio contnuo em

    funo da idade da velocidade de processamento, memria de trabalho e memria de

    longo prazo visoespacial e verbal. Por outro lado, observaram que a capacidade verbal

    permanceu estvel com o aumento da idade.

    A segunda questo, diz respeito grande variabilidade do desempenho cognitivo

    entre as pessoas independentemente da idade. Isso quer dizer que apenas uma pequena

  • 35

    proporo das diferenas cognitivas existentes entre os indivduos est associada ao

    aumento da idade (Salthouse, 2010).

    A constatao dos pesquisadores de que as diversas funes cognitivas

    apresentavam padres diferentes de declnio em funo da idade, possibilitou a

    distino de dois tipos de capacidade cognitiva. A primeira referente habilidade de

    gerar, manipular e transformar informaes, e a segunda relacionada ao acmulo de

    conhecimento a partir de experincias (Salthouse, 2010). Nessa perspectiva, Cattell

    (1943) prope dois tipos de capacidades cognitivas denominadas de fluidas e

    cristalizadas.

    A habilidade fluida foi assim denominada por ter a caracterstica de fluir, de

    circular por entre vrias capacidades intelectuais (Cattell, 1943). Trata-se dos aspectos

    fisiolgicos e que por isso est mais susceptvel ao declnio com o aumento da idade.

    Envolve as capacidades primrias como raciocnio, memria e velocidade perceptual

    (Neri, 2006). Para Fontaine (2010), as aptides que melhor representam a habilidade

    fluida so a complementao, o raciocnio indutivo, a flexibilidade figural e a

    integrao. De acordo com Parente e Wagner (2006), a capacidade fluida trata dos

    processos que precisam ser elaborados a partir de diferentes situaes e que necessitam

    de elaborao de estratgias adaptativas. Isso explica, por exemplo, a dificuldade dos

    idosos de desenvolver novas habilidades.

    A habilidade cristalizada se refere ao produto estvel derivado da relao entre a

    capacidade fluida e o meio ambiente (Salthouse, 2010). Dessa forma, a capacidade

    cristalizada depende, fundamentalmente, das influncias culturais e no diminui com a

    idade (Neri, 2006). Fontaine (2010) aponta que as habilidades cristalizadas esto

    relacionadas com a dimenso do saber e da experincia, do julgamento, da compreenso

    das relaes sociais e das convenes. Trata-se dos processos dependentes de

  • 36

    aprendizados que podem ser utilizados em qualquer situao. Como exemplo, pode-se

    citar os processos que dependem do conhecimento semntico aprendidos na infncia

    (Parente & Wagner, 2006).

    De acordo com Nunes (2009), h quatro modelos explicativos para as diferenas

    de processamento cognitivo relacionadas idade: reduo da velocidade de

    processamento, declnio do funcionamento da memria de trabalho, declnio na funo

    inibitria e declnio das funes sensoriais.

    2.1 Reduo da velocidade de processamento

    A teoria da velocidade de processamento prope que com o envelhecimento h

    uma reduo na velocidade de execuo de operaes cognitivas. Essa ideia foi

    proposta por Salthouse (1996) e embasada em vrias evidncias. Uma delas foi a de

    que, a partir das pesquisas sobre o envelhecimento cognitivo desenvolvidas com tarefas

    de lpis e papel, houve diferenas nas respostas em funo da idade. Para Salthouse

    (1996), o desempenho na maioria das tarefas cognitivas dependia da rapidez perceptual

    dos participantes.

    Diante disso, os dficits cognitivos estariam relacionados lentido no

    processamento a partir de dois mecanismos denominados de tempo limitado e

    simultaneidade. No tempo limitado, existe uma restrio para a execuo de operaes

    posteriores devido ao grande tempo perdido com operaes iniciais. O mecanismo da

    simultaneidade trata da possibilidade das informaes iniciais serem perdidas com o

    trmino do processamento final (Salthouse, 1996).

  • 37

    2.2 Declnio do funcionamento da memria de trabalho

    O sistema de memria de trabalho pode ser concebido como a capacidade de

    armazenamento, manuteno e manipulao das informaes, no qual seu xito est

    associado quantidade de recursos disponveis (Baddeley, Anderson, & Eysenck,

    2011). A memria de trabalho assume um importante papel no funcionamento cognitivo

    do idoso. Nunes (2009) afirma que existem diferenas do efeito da idade no declnio da

    memria de trabalho. As tarefas que implicam armazenamento e manuteno das

    informaes encontram-se mais preservadas do que as tarefas relacionadas

    manipulao e ao processamento das informaes. Nessa perspectiva, Dobbs e Rule

    (1989) realizaram uma pesquisa com indivduos com idade entre 30 e 99 anos,

    utilizando as tarefas do digit span direto e digit span inverso. Os autores constataram

    redues nos desempenhos significativas entre os idosos.

    2.3 Declnio da funo inibitria

    A perspectiva da funo inibitria pressupe que com o aumento da idade, os

    indivduos tendem a apresentar maiores dificuldades em focalizar informaes

    importantes e inibir as irrelevantes (Zacks & Hasher, 1997). Assim, de acordo com a

    teoria inibitria, o controle de informaes desnecessrias para a memria de trabalho

    diminui com a idade resultando em problemas nas operaes cognitivas (Dixon,

    Bckman, & Nilsson 2004). De acordo com Nunes (2009), possvel interpretar que o

    declnio observado na memria de trabalho no est associado capacidade da memria

    de trabalho propriamente dita, mas na reduo do funcionamento inibitrio.

  • 38

    2.4 Declnio das funes sensoriais

    Diz respeito explicao do envelhecimento cognitivo a partir do declnio das

    funes sensoriais com o aumento da idade. Lindenberger e Baltes (1994) apresentam

    dados relevantes para a compreenso da relao existente entre idade e funcionamento

    sensorial. Os autores realizaram medidas de acuidade (visual e auditiva) e de

    inteligncia em uma amostra estratificada de idosos na cidade de Berlin. Constataram

    que as funes sensoriais foram capazes de explicar 93,1% da varincia relacionadas

    idade da medida de inteligncia.

    Por outro lado, o envelhecimento cognitivo tambm est associado a mudanas

    no sistema nervoso central. De acordo com Fontaine (2010), as principais alteraes

    com o avanar da idade so: reduo de peso e volume da massa enceflica, surgimento

    de placas senis, degenerescncia neurofibrilar, diminuio da neuroplasticidade,

    mortalidade neuronal e rarefao e enriquecimento dentrticos.

    As regies dos crtices cerebrais apresentam padres distintos de

    envelhecimento. H, por exemplo, uma maior vulnerabilidade com aumento da idade

    das regies associativas. Em contrapartida, os crtices sensoriais primrios (visual,

    motor e somatossenssorial) so menos vulnerveis ao processo do envelhecimento.

    (Rodrigue & Kennedy, 2011).

    2.5 Envelhecimento cognitivo e percepo visual

    O processo de envelhecimento pode ser acompanhado pelo declnio gradual de

    diversas funes cognitivas. Conforme Yassuda e Abreu (2006), as funes cognitivas

  • 39

    que apresentam declnio significativo em idosos saudveis so as de memria, ateno e

    as funes executivas.

    Alguns estudos tm sugerido relao entre o declnio da percepo visual com o

    envelhecimento humano (Costa et al., 2009; Santos, Oliveira, Nogueira, & Simas, 2006;

    Santos, Simas, & Nogueira, 2003; Santos, Oliveira, Nogueira, Cruz, & Simas, 2006).

    Faubert (2002) referencia pesquisas nas quais o aumento da idade est associado

    reduo da acuidade visual, diminuio da sensibilidade ao contraste, a perdas da

    sensibilidade dos cones para longos, mdios e principalmente curtos comprimentos de

    ondas, e reduo da sensibilidade ao movimento. Por outro lado, Levine et al. (2000)

    destacam diversos estudos em que o envelhecimento tambm est relacionado ao

    prejuzo de outros aspectos das funes visuais, tais como: ateno visual, funes

    visuoespaciais e codificao e reconhecimento de estmulos visuais.

    Entretanto, conforme apontam Costa et al. (2009) e Fauber (2002), as pesquisas

    desenvolvidas com a finalidade de encontrar alteraes entre a percepo visual e o

    envelhecimento tm apresentado resultados contraditrios, pois h caractersticas da

    percepo visual que so afetadas com envelhecimento, em detrimento de outras.

    Estudos tm relacionado as funes perceptivas visuais com sndromes

    demenciais (Binetti, et al., 1998; Hanish, 2008; Nguyen, Chubb & Huff, 2003;

    Schmidtke & Olbrich, 2007). De acordo com o DSM-IV, demncia consiste no

    comprometimento de vrias funes cognitivas, tais como: memria, afasia, apraxia,

    agnosia ou pertubao do funcionamento executivo. Existem diversos tipos de

    demncias, sendo a Doena de Alzheimer a mais comum (Herrera Jr., Caramelli,

    Silveira, & Nitrini, 2002; Lopes & Bottino, 2002). Segundo Machado, Ribeiro, Leal e

    Cotta (2007), a demncia considerada uma das mais importantes causas de

    morbimortalidade entre idosos e um dos problemas de sade mental que tem aumentado

  • 40

    em importncia e em estatsticas. De acordo com Cunha, Pinheiro, Scoralick e Silva

    (2006), juntamente com a depresso, os quadros de demncia so as enfermidades mais

    prevalentes em geriatria. Segundo Herrera Jr. et al. (2002), a demncia acomete cerca de

    5% dos idosos aos 65 anos e 40% daqueles que apresentam idade igual ou superior a 80

    anos.

    Nessa perspectiva, Quental, Brucki e Bueno (2009) afirmam que a habilidade

    visuoespacial consiste em uma das funes cognitivas que pode ser prejudicada na

    Doena de Alzheirmer. Observa-se dficits visuoespaciais em atividades que envolvem

    discriminao visual, anlise e julgamento espacial e organizao perceptiva (Quental,

    Brucki, & Bueno, 2009).

    Segundo Camargo, Gil e Moreno (2006), a percepo de profundidade, a

    adaptao da viso ao escuro e a distino de coisas a distncia comeam sofrer

    alteraes a partir dos 50 anos de idade. Dessa forma, o comprometimento das funes

    perceptivas e/ou visuoespaciais nos idosos interfere na realizao de diversas atividades

    dirias como, por exemplo, as que eles necessitam distinguir distncias, perceber a

    profundidade de degraus e falhas no calamento (Camargo, Gil, & Moreno, 2006).

    Assim, a partir da constatao do declnio perceptivo em funo do

    envelhecimento e da presena do comprometimento perceptual nos processos

    demenciais, entende-se a importncia de avaliar a percepo visual nos idosos.

    Entretanto, diante dos custos da avaliao, percebe-se a necessidade de estudar

    parmetros psicomtricos de escalas que avaliem aspectos da percepo visual, na

    medida em que consistem em alternativas mais rpidas e baratas.

  • 41

    PARTE II ESTUDO EMPRICO

  • 42

    3. Objetivos

    3.1 Geral

    Verificar evidncias de validade da Escala de Avaliao da Percepo Visual

    (EAPV) em idosos.

    3.2 Especficos

    Verificar a estrutura fatorial da EAPV;

    Verificar a validade convergente por meio de correlao entre a EAPV e os

    Teste da Figura Complexa de Rey (TFCR), Teste de Discriminao Visual de

    Benton (TDVB) e Teste de Figuras Sobrepostas de Poppelreuter (TFSP);

    Verificar a validade discriminante por meio de correlao entre a EAPV, o Teste

    de Fluncia Verbal (TFV) e a Escala de Depresso Geritrica (EDG);

    Avaliar a consistncia interna do instrumento atravs do Alpha de Cronbach;

    Estimar os parmetros dos itens via TRI;

  • 43

    4. Mtodo

    4.1 Tipo de estudo

    Trata-se de uma pesquisa do tipo transversal, de abordagem quantitativa e

    delineamento ex post facto.

    4.2. Amostra

    Os participantes deste estudo foram selecionados de maneira no-probabilstica

    nos municpios de Joo Pessoa e de Campina Grande PB. Os critrios de incluso

    utilizados foram: morar na comunidade, ter idade igual ou superior a 60 anos e no

    manifestar dficit cognitivo, evidenciado por exibir uma pontuao acima de 18 para os

    analfabetos e 24 para indivduos com instruo escolar, obtidas no Mini-Exame do

    Estado Mental MEEM (Loureno & Veras, 2006).

    Foram excludos aqueles participantes que apresentaram: a) acuidade visual

    prejudicada ou no-corrigida, verificada a partir da cartela de optotipos E de Raskin;

    b) sintomas depressivos com escores superior a 6 (seis) na Escala de Depresso

    Geritrica EDG (Paradela, Loureno & Veras, 2005); c) comprometimento funcional

    com pontuao superior a 3 (trs), evidenciado pelo Questionrio de Atividades

    Funcionais de Pfeffer QAFP (Pfeffer, Kurosaki, Harrah, Chance, & Filos, 1982); d)

    presena de graves dficits de audio ou de fala, que dificultem fortemente a

    comunicao; e e) presena de doenas endcrinas (Ex.: Diabetes Mellitus), doenas do

    sistema nervoso (Ex.: Doena de Parkinson, Doena de Alzheimer, Esclerose Mltipla),

    doenas cerebrovasculares (Ex.: Acidente Vascular Cerebral AVC) e transtornos

  • 44

    metais e comportamentais (Ex.: Esquizofrenia), verificados a partir da Escala de

    Avaliao de Doenas Cumulativas CIRS (Linn, Linn, & Gurel, 1968).

    Finalmente, foram selecionados 104 idosos, dos quais so apresentados na

    Tabela 1 as caractersticas sociodemogrficas, os dados cognitivos, afetivos, funcionais

    e de sade. Por meio dos instrumentos MEEM, EDG, QAFP e CIRS, foi possvel

    certificar que os participantes no apresentavam dficits cognitivos, transtornos

    depressivos, perdas funcionais e problemas de sade. Alm disso, por meio da Escala de

    Avaliao de Demncia (DRS), foi possvel observar que os idosos no demonstraram

    alterao na memria, ateno, funcionamento executivo e percepo.

    Tabela 1.

    Estatsticas descritivas dos aspectos sociodemogrficos, cognitivos, afetivos, funcionais

    e de sade

    Varivel M DP Mn Mx

    Feminino

    Sexo 77,9%

    Idade 71,47 6,20 61 86

    Anos de escolaridade 9,63 5 2 22

    MEEM 26,14 2,17 20 30

    DRS_A 34,73 1,72 26 37

    DRS_I/P 34,58 3,43 20 37

    DRS_Const 5,87 ,72 1 7

    DRS_Conc 30,22 4,68 6 39

    DRS_M 21,42 3,66 11 26

    DRS_Total 126,82 9,43 95 140

    TFCR 23,66 9,47 2 36

    TFSP 14,09 3,34 7 20

    TDVB 24,54 4,43 11 32

    TFV 16,13 3,76 9 26

    EDG 2,56 1,97 0 6

    QAFP ,14 ,51 0 2

    CIRS 1,67 ,76 0 3

    Nota. MEEM = Mini Exame do Estado Mental; DRS_A = Escala de Avaliao de

    Demncia (Sub-escala Ateno); DRS_I/P = Escala de Avaliao de Demncia (Sub-

    escala Iniciativa e Perseverao); DRS_Const = Escala de Avaliao de Demncia (Sub-

    escala Construo); DRS_Conc = Escala de Avaliao de Demncia (Sub-escala

    Conceituao); DRS_M = Escala de Avaliao de Demncia (Sub-escala Memria); DRS

    = Escala de Avaliao de Demncia (Total); TFCR = Teste da Figura Complexa de Rey;

    TFSP = Teste de Figuras Sobrepostas de Poppelreuter; TDVB = Teste de Discriminao

    Visual de Benton; TFV = Teste de Fluncia Verbal; EDG = Escala de Depresso

    Geritrica; QAFP = Questionrio de Atividades Funcionais; CIRS = Escala de Avaliao

    de Doenas Cumulativas.

  • 45

    4.3 Instrumentos

    O protocolo de coleta de dados foi composto por 9 instrumentos, alm da Escala

    de Avaliao da Percepo Visual (EAPV), divididos entre escalas e testes

    neuropsicolgicos que foram organizados de acordo com seus objetivos. Dessa forma, a

    bateria formada por instrumentos que avaliam: a) o funcionamento cognitivo; b) a

    percepo visual; c) o estado afetivo; d) a funcionalidade; e) a sade; e f) os aspectos

    sociodemogrficos.

    4.3.1 Funcionamento cognitivo

    Mini-Exame do Estado Mental (MEEM): consiste num questionrio de 30 itens,

    com pontuao variando de 0 a 30, que avalia sete categorias de funes cognitivas,

    assim distribudas: orientao temporal, orientao espacial, memria imediata, ateno

    e clculo, evocao atrasada de palavras, linguagem e praxia construtiva (Veridiana,

    2013).

    Escala de Avaliao de Demncia DRS (Mattis, 1988): adaptada e validada

    para o Brasil por Porto et al. (2003), a escala consiste em 36 atividades dividas em 5

    subescalas: Ateno, Iniciativa/Perseverao, Construo, Conceituao e Memria. A

    pontuao varia de 0 a 144 pontos, distribudos da seguinte forma nas subescalas:

    Ateno, 37 pontos; Iniciao/Perseverao, 37 pontos, Construo, 6; Conceituao,

    39 pontos e Memria 25 pontos.

    Teste de Fluncia Verbal (TFV): trata-se de uma tarefa para avaliar a memria

    semntica e as estratgias de busca relacionadas funo executiva. Ao participante

  • 46

    solicitado que recorde todos os animais ou bichos que conseguir em um tempo de 60

    segundos. A pontuao consiste no total de animais lembrados (Brucki et al., 1997).

    4.3.2 Percepo visual

    Escala de Avaliao da Percepo Visual (EAPV): composta por 20 itens que

    avaliam quatro dimenses da percepo visual: constncia da forma, figura-fundo,

    posio no espao e relaes espaciais e que apresentam como alternativas de respostas:

    correto (1), errado ou faltante (0).

    O Teste de Figura Complexa de Rey (TFCR): foi desenvolvido por Andr Rey,

    em 1942, com o objetivo de avaliar as habilidades de construo visuo-espacial e

    memria (Oliveira & Rigoni, 2010). O teste consiste em um carto com o desenho de

    uma figura geomtrica complexa do qual o sujeito solicitado a realizar uma cpia em

    uma folha em branco. Durante o processo, os participantes so instrudos a utilizar lpis

    de cores, que so trocados de acordo com o comando do examinador para que se

    obtenha uma sequncia das formas desenhadas (Oliveira & Rigoni, 2010). Aps 10

    minutos do trmino da cpia, o sujeito requisitado a reproduzir o desenho novamente

    sem a presena do carto estmulo.

    Teste de Discriminao Visual de Benton (TDVB): introduzido por Benton et al.

    (1983), o teste possui a finalidade de avaliar a percepo visual de formas. Trata-se na

    apresentao de 16 estmulos compostos por 3 figuras geomtricas distintas que esto

    organizadas em uma certa ordem, rotao e posio. O participante instrudo a

    identificar na folha de respostas, formada por 4 opes, o estmulo apresentado pelo

    examinador. Existe apenas uma reposta correta com as demais opes se diferenciando

    em pequenos detalhes. De acordo com Benton et al. (1983), deve-se atribuir 2 pontos

  • 47

    para cada resposta totalmente correta, 1 ponto para repostas que envolve erro das formas

    perifricas e 0 ponto para os erros de maior rotao, distoro ou no respondeu. Dessa

    forma, a pontuao total do instrumento apresenta uma variao de 0-32 pontos.

    Teste de Figuras Sobrepostas de Poppelreuter (TFSP): foi proposto inicialmente

    pelo Neuropsiquiatra alemo Walter Poppelreuter, que tinha interesse no estudo da

    negligncia visual (Sells & Laner, 2011). O teste caracteriza-se pela existncia de dois

    grupos de figuras sobrepostas em que o participante solicitado a identificar todos os

    objetos apresentados. O primeiro grupo de figuras composto por 5 itens sobrepostos e

    o segundo, por 15. A pontuao possui uma variao de 0-20, sendo um ponto atribudo

    a cada figura identificada corretamente.

    4.3.3 Estado afetivo

    Escala de Depresso Geritrica (EDG-15): em sua forma reduzida (Yesavage et

    al., 1983), composta por 15 itens, sob o formato de respostas sim e no, que

    investigam o humor e o sentimento do sujeito nas ltimas duas semanas. A pontuao

    total varia de 0 a 15 pontos e escore acima de 6 pontos sugere provvel depresso

    (Almeida & Almeida, 1999).

    4.3.4 Funcionalidade

    Questionrio de Atividades Funcionais de Pfeffer (QAFP): foi desenvolvido por

    Pfeffer et al. (1982) e adaptado para o Brasil por Sanchez, Correa e Loureno (2011). O

    instrumento possui a finalidade de avaliar as atividades instrumentais de vida diria.

    composto por 10 questes sob o formato de respostas que varia de 0 (desenvolve a

  • 48

    atividade normalmente) a 3 (no capaz). A pontuao varia de 0 a 30 e escores

    superiores a 3 sugerem comprometimento funcional.

    4.3.5 Sade

    Escala de Avaliao de Doenas Cumulativas (CIRS): tem como objetivo

    verificar o ndice de funes mdicas gerais em 14 subsistemas orgnicos: cardaco,

    respiratrio, hematolgico, gastrointestinal superior, gastrointestinal inferior,

    genitounirrio, heptico/pancretico, renal, musculoesqueltico, endcrino/metablico,

    neurolgico e psiquitrico. A pontuao varia de 0 (representa nenhum problema) a 4

    (representa disfuno orgnica terminal, necessitando de tratamento imediato) (Linn,

    Linn & Gurel 1968).

    4.5 Aspectos sociodemogrficos

    Questionrio sociodemogrfico: ser composto por 26 questes de respostas

    estruturadas relacionadas : idade, data de nascimento, gnero, raa, ocupao, trabalho,

    aposentadoria, penso, alfabetizao, escolaridade, nmero de filhos, arranjo de

    moradia, propriedade da residncia, chefia familiar, renda mensal individual e renda

    mensal familiar.

    4.6 Procedimentos

    A coleta de dados foi realizada em Centros de Convivncia, Unidades Bsicas de

    Sade da Famlia UBSF e em trs programas da Universidade Estadual da Paraba

  • 49

    (UEPB), destinados para o idoso: Universidade Aberta no Tempo Livre, Viva a Velhice

    com Plenitude e Universidade Aberta Maturidade UAMA. Para a realizao da

    pesquisa nas UBSF e nos Centros de Convivncia foram adquiridas autorizaes com as

    Secretarias Municipais de Sade. Quanto aos programas da UEPB, os consentimentos

    para a coleta foram solicitados com os devidos coordenadores. Aps as devidas

    permisses, foram realizadas visitas s instituies e, em um espao reservado, os

    idosos eram convidados a participar da pesquisa.

    4.7 Anlises estatsticas

    Os dados foram tabulados no SPSS (Statistical Package for the Social Sciences),

    verso 18.0 para Windows, para a realizao de anlises descritivas, Anlise Fatorial

    Exploratria, anlise paralela, clculo da consistncia interna e verificao de validade

    convergente e discriminante. Em seguida os dados foram exportados para o software

    Microsoft Excel, com a finalidade de executar Anlise Fatorial com matriz de

    correlaes tetracricas por meio do software FACTOR verso 9.20 (Lorenzo-Seva,

    Timmerman, & Kiers, 2011). Por fim, foram realizadas anlises orientadas pela Teoria

    de Resposta ao Item (TRI) com a utilizao da linguagem R, verso 2.15.1 (R Core

    Team, 2012) e do pacote ltm (Rizopoulos, 2006). Em um primeiro momento, averiguou-

    se a unidimensionalidade da escala (uns dos princpios fundamentais para anlise

    embasada na TRI) a partir das anlises fatoriais. Em seguida, procurou-se verificar os

    parmetros dos itens.

    A TRI surgiu durante a dcada de 1950, impulsionada pelas limitaes

    existentes na Teoria Clssica dos Testes (TCT). De acordo com Pasquali (1996), os

    principais problemas encontrados na TCT so: 1) a dependncia que os parmetros dos

  • 50

    itens apresentam em funo da amostra em que os mesmos foram estimados; 2) o fato

    do clculo do parmetro de discriminao (a) ser realizado tendo como referncia o

    escore total do teste; 3) a fidedignidade do teste frequentemente estimada a partir de

    formas paralelas do teste utilizado; e 4) considera a varincia dos erros de medida como

    sendo a mesma para todos os testandos.

    Diante de tais limitaes, modelos matemticos complexos foram elaborados

    para a estimao dos parmetros dos itens. A TRI tomou como referncia o conceito de

    trao latente, representado pela letra (Teta). Segundo Pasquali (1996), o trao latente

    apresenta diversas denominaes, das quais destacam-se: fenmenos psicolgicos,

    construto, habilidade, aptido, trao psquico, varivel hipottica. O principal objetivo

    da TRI consiste em fornecer modelos capazes de relacionar as variveis observveis

    (ex.: itens de um teste) com traos hipotticos no observveis () (Pasquali & Primi,

    2003). Assim, as repostas de um indivduo em um teste (variveis observveis) podem

    ser preditas pela magnitude do (variveis hipotticas). Com outras palavras, o trao

    latente a causa e o desempenho do indivduo o efeito (Pasquali, 2007).

    H duas suposies ou hipteses que norteiam a TRI: a unidimensionalidade e a

    independncia local. A primeira, parte do princpio de que existe um nico trao latente,

    ou pelo menos um que seja dominante, responsvel por um conjunto de varveis

    observadas. J a independncia local pressupe que as repostas dos sujeitos a quaisquer

    dos itens no dependem estatisticamente entre si. Ou seja, o desempenho do indivduo

    em um item independente de sua performance em outro item, sendo influenciado

    apenas pela magnitude de seu teta () (Pasquali & Primi, 2003; Pasquali, 2007;

    Andriola, 2009).

    Diversos tipos de modelos matemticos foram construdos com a inteno de

    expressar a relao do trao latente com as variveis observadas. Entretanto, existem 3

  • 51

    modelos predominantes que se diferenciam em funo dos nmeros de parmetros

    (dificuldade, discriminao e acerto ao acaso) utilizados para descrever o item

    (Andrade, Tavares & Valle, 2000).

    O primeiro modelo que foi idealizado por Rasch (1960), conhecido tambm

    como Modelo logstico de 1-parmetro, trabalha apenas com o ndice de dificuldade

    representado pela letra b. O parmetro apresenta a quantidade de teta () necessrio

    para que um indivduo tenha a probabilidade de 50% de responder corretamente um

    item (Pasquali, 2007; Andrade, Laros & Gouveia, 2010). O modelo produz uma curva

    denominada de Curva Caracterstica do Item (CCI), na qual encontra-se no eixo das

    ordenadas a probabilidade do indivduo acertar um item, e nas abscissas, a quantidade

    de teta necessrio (ver Figura 6).

    O segundo modelo denominado de Modelo logstico de 2-parmetros foi

    introduzido por Birnbaum (1968), que acrescentou ao modelo proposto por Rasch

    Figura 6. Exemplo de Curva Caracterstica do Item (Pasquali & Primi,

    2003).

  • 52

    (1968) a estimao da discriminao do item representado pela letra a. Como exposto

    na Figura 7, o parmetro pode ser visualizado pela inclinao da curva no ponto de

    inflexo no qual a probabilidade de acerto de 50% (Pasquali, 1996).

    O Modelo logstico de 3-parmetros foi desenvolvido por Lord (1980) e

    considerado o terceiro modelo mais utilizado na TRI. Parte do pressuposto de que as

    chances de acertar um item depende da sua dificuldade (parmetro b), de sua

    capacidade de discriminao (parmetro a) e da probabilidade de que o mesmo seja

    acertado ao acaso (parmetro c) (Andriola, 2009). Devido o acerto ao acaso, o item

    torna-se mais fcil. Por este motivo, estima-se um parmetro de dificuldade para que o

    indivduo tenha uma probabilidade de 60% de responder o item corretamente (Figura 3)

    (Pasquali, 2007).

    Figura 7. Exemplo dos parmetros de discriminao de dois itens (Pasquali

    & Primi, 2003).

  • 53

    A estimao do modelo da TRI possibilita tanto o clculo da CCI, como tambm

    da Funo de Informao (FI). A FI consiste na magnitude de informao psicomtrica

    de um item contida em um trao latente (Pasquali, 2007). Diante da FI, possvel

    construir um grfico denominado curva de informao para os itens individualmente ou

    para um teste como um todo. De acordo com Couto e Primi (2011), a FI uma

    importante ferramenta na anlise dos itens, na medida em que permite o conhecimento

    tanto da quantidade de informao que um item acumula em , como do valor de em

    que o item apresenta mais informao.

    4.8 Consideraes ticas

    O presente projeto foi submetido e aprovado pelo Comit de tica em Pesquisa

    CEP do Centro de Cincias da Sade (CCS/UFPB), sob o protocolo n 0141/13 (ver

    Figura 8. Exemplo do parmetro de acertos ao acaso (adaptado de

    Pasquali & Primi, 2003).

  • 54

    anexo A). Antes do incio da entrevista, os idosos foram esclarecidos acerca dos

    objetivos e justificativas da pesquisa, da sua participao voluntria e do sigilo e

    anonimato das informaes. Em seguida, como condio necessria para a participao

    do estudo, todos os idosos assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido

    (Apndice A), elaborado em duas vias, uma para o participante ou representante legal e

    outra para o pesquisador. Dessa forma, a investigao seguiu todas as diretrizes

    regulamentadoras da Resoluo n. 196, de 10 de outubro de 1996 do Conselho

    Nacional de Sade que asseguram os direitos e deveres relacionados a pesquisas

    envolvendo seres humanos (Brasil, 1996).

  • 55

    5. Resultados

    Os resultados esto organizados da seguinte maneira: inicialmente, esto

    apresentados os resultados relativos estrutura fatorial da EAPV, seguidos das

    evidncias de validade da escala. Posteriormente, esto dispostos os resultados

    referentes verificao dos parmetros dos itens da escala por meio da Teoria de

    Resposta ao Item (TRI).

    5.1 Anlise fatorial da EAPV

    Procedeu-se na anlise fatorial exploratria (AFE) da mesma forma como foi

    realizada por Andrade et al. (2012) na construo e validao da EAPV. Dessa forma,

    primeiramente foi verificada a fatoriabilidade da matriz de correlaes entre os itens do

    instrumento por meio do ndice Kaiser-Meyer-Olkin (KMO = 0,69) e do Teste de

    Esfericidade de Bartlett, 2 (190) = 390,828, p < 0,001, que atestaram a possibilidade

    de realizao da anlise fatorial. Em seguida, foi a realizada a extrao de fatores por

    meio do mtodo dos principais eixos fatoriais. O procedimento de rotao adotado foi o

    da oblqua (direct oblimin). Utilizou-se, como critrio para a seleo de fatores, valor

    prprio (eigevelues) igual ou superior a um (Critrio de Kaiser). A anlise sugere a

    presena de oito fatores que juntos explicam 68,14% da varincia. Os valores prprios

    encontrados foram: 3,94; 1,69; 1,42; 1,27; 1,18; 1,14; 1,11 e 1,06. Entretanto, a

    observao da distribuio grfica dos valores prprios (critrio de Cattell; Figura 9)

    aponta para a extrao de apenas um nico fator.

  • 56

    Por outro lado, a inspeo da estrutura fatorial (Tabela 2) aponta para a excluso

    dos itens 5, 6, 8, 9 e 14 por no carregarem em nenhum fator ou por terem cargas

    cruzadas. Alm disso, observa-se a existncia de fatores que sequer apresentaram o

    nmero mnimo de 3 itens (Hair, Black, Babin, Anderson, & Tatham, 2009).

    Figura 9. Grfico dos valores prprios da EAPV

  • 57

    Tabela 2.

    Estrutura fatorial da EAPV.

    Itens Fatores

    1 2 3 4 5 6 7 8

    16. Faa, em cada quadro, traos

    formando uma figura igual primeira 0,746

    17. Mostre qual destes animais

    corresponde quele indicado acima 0,615

    20. Junte os pontos para que fiquem

    igual ao primeiro desenho 0,552

    8. Una os pontos como demarcado no

    primeiro quadro 0,498 -0,361

    12. Ligue os pontos formando trs

    figuras iguais primeira 0,464

    19. Mostre qual a figura est na mesma

    posio dos retngulos esquerda 0,336

    10. Assinale, na figura, as ovelhas

    representadas em sobreposio 0,765

    7. Marque qual a figura est na mesma

    posio dos smbolos esquerda -0,599

    18. Indique, na figura, os postes

    representados em sobreposio -0,386

    14. Marque na figura as formas que

    voc v no retngulo de cima 0,329 0,352

    3. Aponte qual a seta est na mesma

    posio daquela situada no primeiro

    quadro

    0,791

    15. Indique quais os quadrados

    apresentam figuras na mesma posio 0,710

    4. Marque, nos retngulos com pontos,

    traos na mesma posio dos do

    retngulo inicial

    0,403

    13. Aponte quais as formas so iguais

    quela destacada acima 0,517

    5. Indique que figuras so iguais

    destacada

    2. Indique, na figura, que animais esto

    representados -0,437

    11. Assinale, em cada fileira, os

    desenhos que esto na mesma posio -0,385

    9. Marque as figuras que tm formato

    idntico 0,314 0,673

    1. Assinale as formas que tm o mesmo

    formato do retngulo acima 0,368

    6. Aponte, na figura, os chapus

    representados em sobreposio

    Eigenvalue 3,940 1,694 1,421 1,275 1,184 1,144 1,116 1,063

    % da Varincia Explicada 19,702 8,468 7,103 6,376 5,919 5,721 5,581 5,313

  • 58

    Em virtude da incongruncia dos resultados com os apresentados na construo

    e validao da EAPV por Andrade et al. (2012), decidiu-se por efetuar uma nova anlise

    fatorial fixando o nmero de fatores. Deste modo, foi fixado extrao de 4 fatores que

    juntos explicaram 41,64% da varincia, cujos resultados esto apresentados na Tabela 3

    a seguir.

    Tabela 3.

    Estrutura fatorial da EAPV com fixao do nmero de fatores.

    Itens Fator

    1 2 3 4

    16. Faa, em cada quadro, traos formando uma figura igual

    primeira

    0,755

    8. Una os pontos como demarcado no primeiro quadro 0,726 -,0397

    20. Junte os pontos para que fiquem iguais ao primeiro desenho 0,672

    12. Ligue os pontos formando trs figuras iguais primeira 0,580

    17. Mostre qual destes animais corresponde quele indicado acima 0,443

    14. Marque na figura as formas que voc v no retngulo de

    cima

    0,441 0,361

    19. Mostre qual a figura est na mesma posio dos retngulos

    esquerda

    0,418

    15. Indique quais os quadrados apresentam figuras na mesma

    posio

    0,405

    9. Marque as figuras que tm formato idntico 0,397

    11. Assinale, em cada fileira, os desenhos que esto na mesma

    posio

    0,393 ,0308

    3. Aponte qual a seta est na mesma posio daquela situada no

    primeiro quadro

    4. Marque, nos retngulos com pontos, traos na mesma posio

    dos do retngulo inicial

    6. Aponte, na figura, os chapus representados em sobreposio 0,392

    10. Assinale, na figura, as ovelhas representadas em

    sobreposio

    1. Assinale as formas que tm o mesmo formato do retngulo

    acima

    5. Indique que figuras so iguais destacada

    7. Marque qual a figura est na mesma posio dos smbolos

    esquerda

    -0,331 -0,383

    18. Indique, na figura, os postes representados em sobreposio -0,332

    2. Indique, na figura, que animais esto representados

    13. Aponte quais as formas so iguais quela destacada acima 0,329

    Eigenvalue 3,940 1,694 1,421 1,275

    % da Varincia Explicada 19,702 8,468 7,103 6,376

  • 59

    Observa-se que mesmo fixando o nmero de fatores, os itens no saturam da

    forma como observado por Andrade et al. (2012). Ademais, nessa segunda anlise

    fatorial houve uma configurao semelhante primeira, no tocante sugesto de

    excluso de itens por no carregarem em nenhum fator ou por terem cargas cruzadas

    (Hair et al., 2009), assim com