8
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA TEORIA TRADICIONAL X TEORIA CRÍTICA BASES EPISTEMOLÓGICAS Aluno: André Gomes do Nascimento Naveca (20870126) Professor: Theo Fellows

Beckett e a Arte Como Verdade

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Se

Citation preview

UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONASINSTITUTO DE CINCIAS HUMANAS E LETRAS DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA

TEORIA TRADICIONAL X TEORIA CRTICABASES EPISTEMOLGICAS

Aluno: Andr Gomes do Nascimento Naveca (20870126)Professor: Theo Fellows

MANAUS2015UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONASINSTITUTO DE CINCIAS HUMANAS E LETRAS DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA

Beckett e a arte como manifestao de verdade

MANAUS2015

Beckett era bacharel em ingls e italiano alm de fazer uma dissertao de mestrado sobre Descartes. No fosse apenas isso mas seus inmeros textos com referncias a filosofia autorizaram o trabalho de inverter a mirada de anlise a que problema filosfico ou filsofo Beckett se refere para inserir inserir sua obra no rol de criaes artsticas que eram produzidas no sculo XX (assim como sries mais interessante uma primeira aproximao do Ulisses de James Joyce que primeiro contextualizasse as tentativas de compreender os objetivos e sua obra do que partir para analisar sua interminvel inventividade verbal e sua enorme gama de referncias) e entender a que tipo de questes o homem retratado por Beckett em suas obras anseia responder. quase senso comum inserir Beckett nos grandes renovadores artsticos que criaram novas tendncias na arte, ele a maneira de Proust e Joyce so lembrados como renovadores lingusticos no romance e no teatro, ao ponto de que em 1969 quando Beckett ganhou o prmio Nobel de literatura o The New York Times a poca comentar que Beckett ter ganhado esse prmio foi ter reconhecido s tendncias literrias modernas e "eleva-las" ao sufrgio de popularidade que esse prmio, trazendo assim Joyce a baila no por ele ter sido patro de Beckett quando este foi secretrio ou por Beckett ter sido tradutor de Joyce, mas por ambos ressaltaram, cada qual a seu modo, o absurdo, que deveria ser imputado no a suas obras mas ao absurdo da condio humana. Ou por ambos terem sido irlandeses. E mudar aquela parte, ao contrrio de uma histria inverdica muito persistente, no se tornou seu secretrio.

Tomando como exemplo Esperando Godot pode-se dizer que a trama toda consiste em esperar. Esperar o qu? Eis outro problema. Quando Esperando Godot foi apresentada, quatro anos depois de sua estreia em Paris (1953), aos internos da priso de San Quentin em San Francisco, os presos acharam que a pea havia sido feita para eles. De todo modo eles souberam melhor do que ningum interpretar a pea que tanto intrigava os teatros da Europa! H inmeras interpretaes para o que seria Godot. Becket quando perguntado sobre o que ele queria dizer respondeu simplesmente, "se eu soubesse teria dito na pea". Os internos do presdio acreditavam que Godot queria dizer l fora. Vises macro de crticos especializados tentaram estabelecer a partir de suas peas e textos em prosa credos estticos substanciais que servissem de ponto de partida para compreender a obra de Beckett. Mas elas no funcionam como ponto de chegada pois a cada obra h uma contrao na expressividade at desembocar em o inominvel onde s resta uma voz, num abandono total dos padres do teatro. Alm de elas destoarem artisticamente no modo de expressar o que seria o modus operandi becketiano, o dilogo com as referncias filosficas toma outra figura nos textos discursivos de Beckett sobre escritores, ali recuperado o dilogo com a esttica. O crtico de teatro Nvel Denis citou as palavras de Beckett no jornal New York Review,

De Beckett no ensaio sobre o Finnegan's Wake de Joyce, Despertar de Finnegan, ele se refere ao gesto que precede a palavra: "Ele no escreve sobre alguma coisa, ele escreve sobre a prpria coisa... Aqui a forma o contedo, o contedo a forma". Thomas Mann no Doutorado Fausto, tambm lidou com os limites da arte em seu tempo, ali ele conta a histria de um compositor que, percebendo que toda a cultura humana se degenera num clich, tentava sozinho dar um salto para uma nova viso que novamente tornaria a arte possvel. Esse relato dos fracassos acontecidos s torna mais patente a busca dos artistas da poca de um paradigma artstico que no se impe apenas a criao genuna com base em certos padres estticos, mas a prpria busca de padres to pungente que os melhores artistas souberam subverter critrio tradicionais do que seja um romance ou teatro, como Beckett para expressar esses anseios. Mas essa viso de Beckett no ponto pacfico entre os crticos, Beckett considerado um grandes prosador, alm disso a presena viva dos personagens no teatro parece dar mais consistncia ao texto em prosa que necessita apenas da imaginao. Crtica tpica de um crtico de "teatro". Beckett o porta-voz de uma experincia de mundo que no encontrava mais sentido uno ou termo de comparao no apenas nos paradigmas da arte mas tambm em outras formas de expresso humana, na cincia, na filosofia, na poltica desembocando na maneira mais palpvel de certa crise da razo com as duas grandes guerras (a primeira chamada de a guerra de todas as guerras que trouxe tantas atrocidades como o uso de gs nos campos de batalha acabou por no seguir seu vaticnio de paz pois houve a segunda grande guerra com campos de concentrao e bombas atmica). Na filosofia de Hegel pode ser encontrada um ponto de apoio importante para se compreender a emergncia de obras artsticas como a de Beckett na modernidade. Para Kant a razo a forma efetiva de conhecimento do mundo e nos idealistas alemes, como Hegel tambm, a razo havia separado a coisa em si das impresses, esto havia se refugiado em mero princpio subjetivo sem poder na estrutura objetiva da realidade. E na arte que ele passa a considerar na sua filosofia da histria do Absoluto e suas diversas manifestaes a compreenso epistemolgica do homem da coisa em si. Hegel diagnstica que h uma contnua desmaterializao, num primeiro momento da histria do Absoluto h uma relao equilibrada entre o contedo de verdade e a forma da arte nos gregos, o Athens Museum que Hegel viu surgir na Alemanha foi sintomtico de que a sada das arte do cotidiano (onde ela era inserida com os aedos e trgicos,no mundo grego, para um tpos especfico) de que no havia mais um critrio de beleza, harmonia que expressasse o realismo sem apelar a razo. Numa etapa intermediria da histria do esprito a arte tem seus contedos de verdade menos expresso por sua forma do que por uma verdade que e religiosa e por isso religiosa. Dessa maneira identificando em anlises estticas de obras de arte no tempo a maneira como elas expressavam contedos de verdade restringindo-se ao tempo e mostrando como a anlise e interpretao histrica servem para ver o caminho do esprito, Hegel pretende demonstrar como a arte pode ser posta se lado como esclarecimento do real, neste momento de efetivao do esprito. S que talvez no sculo XX a arte e artistas como Duchamp e Beckett venham desmascarar a pretenso da razo como nica via ao absoluto, alm de que depois de Freud mostrar que o universo dito racional e discursivo pode ter origem em outra coisa e Marx mostrar a influncia do carter material e ideologico nas construes metafsicas, que a arte pode expressar contedos de verdade que a racionalidade no tem acesso. Porm Hegel conseguiu demonstrar o carter de perda do veculo sensvel nessa tarefa da arte. As aporias secas e mostrando o excesso de racionalismo burocrtico de Kafka, o mictrio de Duchamp, a fonte que no jorra sentido mas repele filosofias, o dia hipertextualizado de Joyce, as odisseias dentro da Odisseia do cotidiano comum e livre de signos que norteiam o existir desembocam em formas artisticas como a de Beckett que conseguem exprimir os ideiais abalados da filosofia e tornar evidente a roupa nova do imperador. No a toa que apesar do choque das peas de Beckett muitos conseguem se enxergar em obras literrias modernas, no h mais o background de Paideia que havia para um grego compreendes a Antgona. Entender a emergncias de obras como a de Samuel propiciam novas formas de enxergar uma verdade que no depende apenas dos sentidos de uma forma despida de contedo, mas compreender minimamente que contedos dialogam com as obras de Beckett, no numa compreenso limitada como a do crtico literrio que v a obra teatral apenas como a expresso da confuso metafsica, existencial que i seja em uma forma mais comportada, como se a confuso de teses levasse a um ceticismo infantil, mas o contnuo conhecimento da tradio que Beckett dialoga pode levar a compreender o status da ter contempornea com a Verdade e de que maneira a literatura lidou com expressar contedo que pareciam ser melhor levado a cabo pela filosofia. Nas palavras de Becket no ensaio sobre o Finnegan's Wake de Joyce, Despertar de Finnegan, ele se refere ao gesto que precede a palavra: "Ele no escreve sobre alguma coisa, ele escreve sobre a prpria coisa... Aqui a forma o contedo, o contedo a forma". Thomas Mann no Doutorado Fausto, tambm lidou com os limites da arte em seu tempo, ali ele conta a histria de um compositor que, percebendo que toda a cultura humana se degenera num clich, tentava sozinho dar um salto para uma nova viso que novamente tornaria a arte possvel. Esse relato dos fracassos acontecidos s torna mais patente a busca dos artistas da poca de um paradigma artstico que no se impe apenas a criao genuna com base em certos padres estticos, mas a prpria busca de padres to pungente que os melhores artistas souberam subverter critrio tradicionais do que seja um romance ou teatro, como Beckett para expressar esses anseios. Num ensaio de Beckett a um sonho ele diz que ser artista fracassar ao se referir as pinturas de Vam Velde, pois ele diz que ele havia se tornado pintor abstrato porque a pintura figurativa era impossvel: no existia mais realidade a representar. A arte tradicional se reduzira a uma sequncia de tentativas teimosas e fteis de ajustar-se a uma realidade que h muito j tinha desaparecido, "numa espcie de tropismo na direo de uma luz, a respeito de cuja natureza as opinies continuam discordantes, e com uma espcie de terror pitagrico, como se a irracionalidade de pi fosse uma ofensa divindade, para nem falar de sua criatura", para Beckett Vam Velde teve sucesso ao desistir desse automatismo e submeter-se a incoercivel ausncia de relao. Mas Beckett no era pintor e por isso no podia se render a "experincia" da pura abstrao pois a literatura est ligada a experincia concreta, assim ele subverte formas literrias canonicas nas tentativas de encontras uma forma que, mais do que acomodasse a baguna, fosse capaz de tornar patente pela fora das metforas e situaes o que era a experincia do absurdo, e ele estava muito ciente do impasse ao dizer numa entrevista de 1956 que estava tendo dificuldades de passar a algo que fosse mais do que uma repetio daquilo que sua obra anterior at o Inominvel havia explorado. Assim, pelas suas palavras a Tom Driver se deduz que ele tentou de maneira positiva explorar a ambientao do homem no absurdo ao dizer que " a nica chance de renovao abrir os olhos e ver a baguna. Enquanto que um dos membros da academia sueca disse que a obra de Beckett um Miserere no domnio do aniquilamento e vm anunciar a libertao aos oprimidos, Lukcs tinha uma atitude negativa pois o considerava antes como um diagnosticador do mundo capitalista que no via resistncia possvel no homem. Porm no existe apenas o homem marxista, se todos os romacistas e artistas fossem vistos apenas da tica de proporem sadas positivas para o mundo de que maneira haveria espao para romacistas como Kafka, ostracizado por Brecht e defendido por Adorno? Ou a piada de que Sartre certa vez condenou romancistas da frica colonial por estarem escrevendo romances em vez de lutarem contra o colonialismo e recebeu de pronto a resposta de que eles leriam o qu? Sartre?

Da sua pea mais famosa, Godot, pode-se fazer algumas perguntas, como se ele tivesse dito quem era Godot, se Godot viesse e se preenchesse de sentido, quais seriam as consequncias? Ela seria uma pea comum, com cunho religioso, metafsico, poltico, mas com a substncia do vazio o potencial esttico da pea multiplicado, o nico ponto pacfico da pea o fato de que eles esto a esperar Godot. Beckett estabelece uma relao de simetria entre os atributos e os modos da substncia vazio ao nomear o personagem intelectual de Estragon, que significa senhor do mundo, remetendo a Aufklarung e Estragon, apelido francs para a erva Estrago, ambos tm caractersticas simtricas como o primeiro padecer de bafo feido e ter dificuldades com o chapu, enquanto o segundo sofre de chul e tm dificuldades com os sapatos. Ironicamente, Estragon deseja mais os apetites do corpo ao demonstrar preferencia por se enforcar e conseguir uma ereo, enquando Estrago o mais curioso intelectualmente dos dois. Outro sintoma que Beckett no deixa patente na sua obra elementos unvocos na apreciao o fato de no deixar limitado a significao apenas socioeconmica da relao entre Pozzo e Lucky.

BIBLIOGRAFIA

BECKETT, Samuel. Esperando Godot. Traduo Fabio de Souza Andrade. Editora Cosac Naify. So Paulo: 2005.WEBB, Eugene. As peas de Samuel Beckett. Traduo Pedro Sette Cmara. Editora: realizaes So Paulo: 2012.BECKETT, Samuel. Companhia. Traduo: Elsa Martins. Editora Francisco Alves.So Paulo: 1982.