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ANÁLISE DA ALTERAÇÃO DA COBERTURA VEGETAL NATURAL EM UMA BACIA HIDROGRÁFICA CONSIDERANDO A EVOLUÇÃO DOS INSTRUMENTOS LEGAIS: ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE E RESERVA LEGAL Luiz Henrique Pereira Universidade Estadual Paulista– CEAPLA/IGCE/UNESP [email protected] Graziela Thaís Meneghetti Universidade Estadual Paulista– IGCE/UNESP [email protected] Camila Barbosa Universidade Estadual Paulista–IGCE/UNESP [email protected] Sergio dos Anjos Ferreira Pinto Universidade Estadual Paulista– CEAPLA/IGCE/UNESP [email protected] Resumo As sucessivas alterações no Código Florestal desde sua promulgação em1965 apontam a tentativa de adaptação aos novos ideais socioeconômicos e preocupações com o ambiente físico. No entanto, ainda é discutível se os atuais resultados advindos dessas renovações são satisfatórios em termos de qualidade ambiental. Questiona-se assim o quão distante está o ideal previsto em lei e a atual realidade ambiental. Desta forma, o presente trabalho tem por objetivo analisar como os avanços da Legislação Ambiental Brasileira, caracterizados pelos instrumentos legais de Área de Preservação Permanente (APP) e Reserva Legal (RL), têm influenciado a alteração da vegetação natural da bacia hidrográfica do rio do Corumbataí-SP ao longo dos últimos 45 anos, além de avaliar a discrepância entre o cenário previsto pela legislação referente à RL e APP de cursos d`água e o cenário efetivamente encontrado para a área em estudo no ano de 2008. Para tanto, utilizou-se técnicas de Sensoriamento Remoto e Geoprocessamento a fim de caracterizar e avaliar, em termos de cobertura vegetal e uso da terra, os cenários de 1962, 1972, 1988, 2001 e 2008, os quais coincidem com a promulgação do Código Florestal em 1965 e suas posteriores alterações. Os resultados obtidos demonstraram que a expansão agrícola entre 1962 e 2001 promoveu a redução da cobertura da vegetação natural de 31 para 15%, restringindo-a a pequenos fragmentos isolados. Observou-se que as limitações e exigências impostas pelas leis ambientais a partir da década de 80, relacionadas à RL e APPs possibilitou um pequeno incremento em termos de área de ocorrência da cobertura de vegetação natural para o cenário de 2008, passando para 18% da área total da bacia. No entanto, comparando a paisagem prevista pela lei com o cenário atual, a vegetação natural deveria representar 20% do total da área da bacia. Palavras chaves: fragmentação da vegetação natural, legislação ambiental, sensoriamento remoto. Abstract. The present work intends to analyze how the laws instruments have influenced the alteration of the natural vegetation of the Corumbataí’s river basin, considering the sceneries of 1962, 1972, 1988, 2001 and 2008; and to evaluate the discrepancy between the scenery foreseen by the RL and rivers courses APP laws with the effective scenery found in 2008 by using Remote Sensing and GIS. For the characterization of the types of vegetation covering, aerial pictures were used in the scale of 1:25000, making possible the confection of thematic maps. For measure and analysis of the occupied areas for the thematic classes, SIG SPRING was used. The obtained results demonstrated that the agricultural expansion in the studied area has promoted the reduction of the natural vegetation covering resulting in isolated fragments. This fact reflects the decrease of the natural biodiversity stock, besides intensifying

ANÁLISE DA ALTERAÇÃO DA COBERTURA VEGETAL NATURAL …€¦ · anÁlise da alteraÇÃo da cobertura vegetal natural em uma bacia hidrogrÁfica considerando a evoluÇÃo dos instrumentos

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ANÁLISE DA ALTERAÇÃO DA COBERTURA VEGETAL NATURAL EM UMA BACIA HIDROGRÁFICA CONSIDERANDO A EVOLUÇÃO DOS INSTRUMENTOS LEGAIS:

ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE E RESERVA LEGAL

Luiz Henrique Pereira Universidade Estadual Paulista– CEAPLA/IGCE/UNESP

[email protected]

Graziela Thaís Meneghetti Universidade Estadual Paulista– IGCE/UNESP

[email protected]

Camila Barbosa Universidade Estadual Paulista–IGCE/UNESP

[email protected]

Sergio dos Anjos Ferreira Pinto Universidade Estadual Paulista– CEAPLA/IGCE/UNESP

[email protected]

Resumo As sucessivas alterações no Código Florestal desde sua promulgação em1965 apontam a tentativa de adaptação aos novos ideais socioeconômicos e preocupações com o ambiente físico. No entanto, ainda é discutível se os atuais resultados advindos dessas renovações são satisfatórios em termos de qualidade ambiental. Questiona-se assim o quão distante está o ideal previsto em lei e a atual realidade ambiental. Desta forma, o presente trabalho tem por objetivo analisar como os avanços da Legislação Ambiental Brasileira, caracterizados pelos instrumentos legais de Área de Preservação Permanente (APP) e Reserva Legal (RL), têm influenciado a alteração da vegetação natural da bacia hidrográfica do rio do Corumbataí-SP ao longo dos últimos 45 anos, além de avaliar a discrepância entre o cenário previsto pela legislação referente à RL e APP de cursos d`água e o cenário efetivamente encontrado para a área em estudo no ano de 2008. Para tanto, utilizou-se técnicas de Sensoriamento Remoto e Geoprocessamento a fim de caracterizar e avaliar, em termos de cobertura vegetal e uso da terra, os cenários de 1962, 1972, 1988, 2001 e 2008, os quais coincidem com a promulgação do Código Florestal em 1965 e suas posteriores alterações. Os resultados obtidos demonstraram que a expansão agrícola entre 1962 e 2001 promoveu a redução da cobertura da vegetação natural de 31 para 15%, restringindo-a a pequenos fragmentos isolados. Observou-se que as limitações e exigências impostas pelas leis ambientais a partir da década de 80, relacionadas à RL e APPs possibilitou um pequeno incremento em termos de área de ocorrência da cobertura de vegetação natural para o cenário de 2008, passando para 18% da área total da bacia. No entanto, comparando a paisagem prevista pela lei com o cenário atual, a vegetação natural deveria representar 20% do total da área da bacia. Palavras chaves: fragmentação da vegetação natural, legislação ambiental, sensoriamento remoto. Abstract. The present work intends to analyze how the laws instruments have influenced the alteration of the natural vegetation of the Corumbataí’s river basin, considering the sceneries of 1962, 1972, 1988, 2001 and 2008; and to evaluate the discrepancy between the scenery foreseen by the RL and rivers courses APP laws with the effective scenery found in 2008 by using Remote Sensing and GIS. For the characterization of the types of vegetation covering, aerial pictures were used in the scale of 1:25000, making possible the confection of thematic maps. For measure and analysis of the occupied areas for the thematic classes, SIG SPRING was used. The obtained results demonstrated that the agricultural expansion in the studied area has promoted the reduction of the natural vegetation covering resulting in isolated fragments. This fact reflects the decrease of the natural biodiversity stock, besides intensifying

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the erosion processes of the soils. For the year of 1962, it was observed that the areas of natural vegetation in the basin represented a small portion, characterized by 31%. The following decades, 1972 and 1988, had values decreased, passing respectively to 25 and 20%. The pressure imposed by the environmental laws starting from the 80’s decade, allied to RL and APPs, allowed the scenery of 2001 and 2008 to present a small increment, in area, in the occurrence of the natural vegetation covering, constituting 15% and 18%, respectively, of the total of the basin. Comparing the scenery foreseen by the law with the actual found, the natural vegetation was supposed to represent 20% of the basin, and the effective scenery represents only 18%, demonstrating that the law has not been entirely respected and that there is a percentage of the natural vegetation to be implemented in the near future. Key-words: fragmentation of natural vegetation, environmental laws, remote sensing.

1. Introdução

Os crescentes problemas ecológicos foram responsáveis pelo importante campo de atuação de

governos e conselhos nos últimos anos implicando na criação e aplicação de leis e órgãos para a

proteção ambiental. A preocupação com o meio-ambiente ganhou importância internacional a partir da

década de 1950 e se fundamentou posteriormente em 1972 com a Conferência de Estocolmo. Essa

conferência foi responsável pela elaboração da Declaração sobre o Ambiente Humano e pretendia

orientar os governos na realização da preservação do meio ambiente com o estabelecimento do Plano

de Ação Mundial.

No Brasil desde 1965, com a promulgação do Código Florestal (Lei 4.771) a legislação ambiental

brasileira tem dado grandes avanços no intuito de garantir que a exploração dos recursos naturais, se

dê de forma sustentável, servindo, inclusive como referência para outros países. Dois instrumentos que

desempenham papel fundamental para que a exploração econômica agrícola não aconteça em

detrimento da degradação da vegetação natural, são as Áreas de Preservação Permanente – APP e a

Reserva Legal - RL.

De acordo com a atual redação do Código Florestal em seu artigo 2º as APPs são as florestas e

demais formas de vegetação natural situadas ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu

nível mais alto em faixa marginal; ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água; no topo de

morros, montes, montanhas e serras; nas encostas ou partes destas com alta declividade; nas restingas,

nas bordas dos tabuleiros ou chapadas e em altitudes superiores a 1.800 metros, qualquer que seja a

vegetação. E de acordo com o artigo 16 da mesma lei a RL é o percentual da propriedade rural que não

é susceptível de supressão a fim de conservar as florestas e demais formas de vegetação nativa.

Silva et al (2004) ressaltando a importância da preservação da vegetação natural afirma que, sob

condições naturais as copas das árvores, a vegetação de sub bosque e, principalmente, a serapilheira

de uma floresta fazem o papel de amortecedores da energia cinética contida na gota da chuva,

impedindo o contato direto entre a gota da água e as partículas do solo e evitando o primeiro passo do

processo erosivo, que é a erosão por salpicamento.

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Medinilha (1999) aponta como principais funções da vegetação ciliar: a redução das perdas do

solo provenientes de processos erosivos e de solapamento das margens dos rios; ampliação dos

refúgios e fontes de alimentação para as faunas silvestre e aquática; garantia da perenidade das fontes e

nascentes; protege os cursos d’água do transporte de defensivos, corretivos e fertilizantes; melhora a

qualidade e a quantidade de água para consumo humano e agrícola; promove o repovoamento

faunístico das matas artificiais e dos cursos d’água.

Portanto as APPs e as RLs são instrumentos de grande relevância para a preservação da vegetação

natural e conseqüentemente do solo, água e fauna.

Sendo assim, o presente trabalho tem por objetivos analisar como tais instrumentos, desde sua

criação com Código Florestal em 1965, têm influenciado a alteração de vegetação natural presente na

bacia do Corumbataí (SP) para os cenários de 1962, 1972, 1988, 2001 e 2008, além de avaliar a

discrepância entre o cenário previsto pela legislação referente à RL e APP de cursos d`água e o

cenário efetivamente encontrado em 2008 por meio das técnicas de Sensoriamento Remoto e

Geoprocessamento.

A bacia hidrográfica do rio Corumbataí pertence à bacia do rio Piracicaba (SP) e esta localizada

entre os paralelos de 22º 05’ e 22º 30’S e os meridianos 47o 30’ e 47º 50’W. Situada na porção centro-

leste do território paulista, compreende uma área aproximada de 1.710 km², abrangendo os municípios

de Corumbataí, Rio Claro, Santa Gertrudes, Ipeúna e parte dos municípios de Analândia (ao norte),

Itirapina (à Oeste), Charqueada e Piracicaba (ao Sul).

2. Metodologia:

Os produtos de Sensoriamento Remoto utilizados para a aquisição das informações sobre a

cobertura vegetal natural da bacia correspondem às fotografias aéreas dos aerolevantamentos de 1962,

1972 (escala aproximada de 1:25000); 1988 (1:40.000). Para o ano de 2008 foram utilizadas imagens

do satélite CBERS-2b (orbitas 155/156). Já para o cenário de 2001, foi utilizado o mapa de uso da terra

e cobertura vegetal elaborado por Valenti (2001), que obteve o mapa a partir de imagens dos Satélites

SPOT e LANDSAT-5.

A caracterização fitofisionômica dos alvos de interesse foi realizada a partir da analise do

comportamento espectral e dos elementos de fotointerpretação (tonalidade, forma, padrões texturais e

arranjos), como indicados em Miller e Miler (1961) e Ricci e Petri (1965).

Para o cenário de 1962, 72 e 88 a interpretação da classe temática baseou-se no reconhecimento

convencional de fotointerpretação, conforme método utilizado por Chiarini & Donzeli (1973),

contudo, realizados em meio digital pelo SIG SPRING.

Para o ano de 2008, o mapa foi obtido através da interpretação das imagens multiespectrais do

sistema CBERS-2B, processadas em meio digital, no qual incluiu as etapas de segmentação,

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classificação supervisionada e edição dos polígonos, com posterior confrontação entre o mapa

elaborado e informações obtidas com GPS em campo.

Foi implementado um banco de dados georreferenciado e gerados mapas temáticos conforme os

cenários selecionados, possibilitando o dimensionamento e análise das áreas ocupadas pela classe

temática.

A partir do mapa hidrográfico da bacia foi gerado um buffer no software ArcGis conforme as

exigências do atual Código Florestal para APPs de cursos d’água, mediante o qual foi possível calcular

a área que obrigatoriamente deveria ser preservada. Para calcular a área que deveria ser ocupada por

vegetação natural como RL, subtraiu-se o valor das áreas urbanas do total da bacia, e a partir deste

calculou-se o equivalente a 20%, que representa o percentual previsto pela lei.

Considerou-se para a referida análise como vegetação natural: matas de encosta, capoeiras, matas

ciliares, florestas naturais, vegetação de várzea e vegetações típicas do bioma cerrado (cerrado, campo

cerrado e cerradão) que são as vegetações com ocorrência significativa na bacia do rio Corumbataí.

3. Análise dos Resultados e discussão

De maneira a priorizar a análise das modificações ocorridas na vegetação natural da bacia do rio

Corumbataí, foi gerado um conjunto de mapas temáticos, conforme apresentado na Figura 1, por meio

dos quais foi possível avaliar as características da vegetação natural na área de estudo em cada cenário.

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Figura 1: Evolução das áreas ocupadas por vegetação natural na bacia hidrográfica do rio Corumbataí

–SP: 1962, 72, 88, 2001 e 2008.

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Considerando a área da bacia do Corumbataí ocupada por vegetação natural no decorrer dos

últimos 46 anos obteve-se os seguintes dados:

Tabela 1: Área de ocorrência da vegetação natural ao longo dos anos estudados

Cenários e áreas de ocorrência das classes temáticas

1962 1972 1988 2001 2008

ha % ha % ha % ha % ha %

52590,71 31 43777,67 25 34498,31 20 26100,6 15 30715,77 18

Constatou-se que durante os últimos 46 anos a bacia do rio Corumbataí (SP) apresentou um

decréscimo nas áreas de vegetação natural passando de 31% do total da área da bacia em 1962 para

18% em 2008. Segundo o estudo realizado por Pereira e Pinto (2007), tal fato relaciona-se ao avanço

das fronteiras agrícolas, condicionado principalmente pelas atividades realizadas em grandes

propriedades, nas quais predominam o cultivo de cana-de-açúcar e extensas áreas destinadas à

pastagem, que se expandiram em detrimento da cobertura vegetal natural.

O período analisado coincide com a promulgação do Código Florestal e inúmeras alterações foram

introduzidas no decorrer destes 46 anos. A Figura 2 demonstra o comportamento da vegetação natural

da bacia nos cenários analisados pontuando os principais documentos legais que consolidaram os

instrumentos legais: APP e RL.

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O período em análise é marcado pela ampliação das metragens das APPs e obrigatoriedade da RL

porém contraditoriamente houve uma redução do percentual da vegetação natural. Tal fato comprova

ineficiência destes instrumentos legais na preservação e conservação dos recursos naturais neste

período.

Somente a partir de 2001 houve um acréscimo da cobertura vegetal natural, fato que relaciona-se

ao acirramento da fiscalização e à avanços na legislação ambiental, visto que a MP2.166-6 de 2001

modifica o Código Florestal estendendo a RL, que até o momento era válida apenas para áreas com

vegetações específicas de grande interesse ecológico, para todas as regiões do pais, incluindo a região

sudeste na qual se encontra a bacia em estudo.

A Lei de Política agrícola (Lei 8171/1991) também representa grande contribuição neste sentido

isentando do Imposto Territorial Rural as APPs e as RLs, estimulando a efetivação destes instrumentos

e estabelecendo prazo mínimo para que a reserva legal seja recomposta. De acordo com tal lei, a partir

de 1992, a cada ano pelo menos um trinta avos da área total para complementar a RL deve ser

recomposta.

A análise da cobertura natural para os referidos cenários permitiu constatar que em 1962,

conforme mapa (a), as áreas ocupadas por vegetação natural representada sobretudo pela vegetação

ciliar, apresentava características de grandes manchas que acompanhavam pequenos trechos ao longo

dos cursos fluviais. Esta forma já no ano de 1972, conforme mapa (b), foi radicalmente modificada,

restringindo-se à pequenas manchas estreitas e alongadas. Tal fato é mais um indicativo de que a

legislação ambiental referente à APP não contribuiu para a preservação da vegetação natural existente

no período, podendo pelo contrario ter estimulado a devastação de grandes áreas paralelas a faixa

mínima de preservação estipulada pela lei. No ano de 1988, conforme mapa (c), a vegetação apresenta

configuração linear ao longo dos rios, muito parecida com as do ano de 1972.

Já no ano de 2001 a vegetação natural apresenta novamente características de grandes manchas

que se intensificam no ano de 2008 indicando que o período foi de grande relevância para a

recuperação da vegetação natural, especialmente através da RL.

Desta forma pode-se constatar que as modificações do Código Florestal e a criação da Lei de

Política Agrícola - Lei 8171 de 1991 têm contribuído para a recente preservação e recuperação da

vegetação na bacia.

No entanto o atual cenário ainda não condiz com as exigências legais. De acordo com a atual

redação do Código Florestal a APP prevista para a Bacia do Corumbataí ocuparia uma área de 13.146

ha o que representaria aproximadamente 8% do seu total, e a área de RL ocuparia uma área de 32.851

ha totalizando 20% do total da área rural da bacia. Desta forma o percentual de 18% encontrado para o

ano de 2008 demonstra que a legislação ainda não foi totalmente respeitada na bacia existindo ainda

um grande percentual de vegetação natural a ser implementado nos próximos anos. Dois fatos indicam

a perspectiva de melhoria deste quadro, primeiramente o prazo para recuperação da RL que ainda

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encontra-se em curso, pois de acordo com a Lei 8171/ 1991 somente no ano de 2022 seria exigida a

total recuperação desta, e o segundo fato se deve a constatação de que as APPs encontradas em 2008,

conforme indicada no mapa da figura 1, não estão totalmente preservadas.

4. Considerações Finais:

Pôde-se constatar que a bacia hidrográfica do rio Corumbataí-SP apresentou, na analise dos

últimos 46 anos, forte alteração na sua configuração da cobertura vegetal natural. Estas alterações

foram impostas pelas atividades agropecuárias, sendo estas o principal vetor das transformações de

maior amplitude que ocorreram na área da bacia, ocasionando a redução de suas áreas naturais,

inclusive importantes áreas de cerrado.

Tais constatações permitem-nos concluir que embora a legislação ambiental de proteção das APPs

e RL tenham se desenvolvido neste mesmo período sua efetiva contribuição para a recuperação da

vegetação natural na bacia do Corumbataí se expresse somente nos últimos sete anos.

Há fortes indícios de uma melhoria deste cenário e espera-se que em 2022, a vegetação natural

ocupe cerca de 28% da bacia, porém para tanto faz-se necessário efetiva fiscalização, além de

incentivos e assessoria ao proprietário rural neste processo.

Sabe-se que um dos grandes empecilhos da aplicabilidade da legislação ambiental são os altos

custos da fiscalização e neste sentido a difusão das técnicas e do conhecimento de Sensoriamento

Remoto e Geoprocessamento se apresentam como ferramenta com grande perspectiva de contribuição,

como buscou-se demonstrar aqui.

5. Referências Bibliográficas:

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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4771.htm> acesso em 15 de outubro de 2008.

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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MP/2166-67.htm> acesso em 15 de outubro de 2008.

BRASIL,LEI Nº 8171, DE 17 DE JANEIRO DE 1991 – Lei de política agrícola. Ministério da

Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Disponível em:

http://extranet.agricultura.gov.br/sislegisconsulta/consultarLegislacao.do?operacao=visualizar&id=199

> acesso em 15 de outubro de 2008.

CHIARINI, J.V & DONZELI, P.L. Levantamento por fotointerpretação da capacidade de uso das

terras do estado de São Paulo. Campinas, Instituto Agronômico (Bol. 3), 1973.

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MEDINILHA, A. A Degradação da Mata Ciliar e os Impactos nos Recursos Hídricos

Desencadeados Pela Expansão Urbana de Rio Claro/SP no Entorno do Rio Corumbataí. São

Carlos, USP, 1999.

MILLER V.C and MILLER, K., Photogeology, McGraw-Hill, New York,1961.

PEREIRA, L. H.; PINTO, S.A.F., Utilização de imagens aerofotográficas no mapeamento

multitemporal do uso da terra e cobertura vegetal na bacia do rio Corumbataí – SP, com o suporte de

sistemas de informações geográficas, In Anais do XIII Simpósio Brasileira de Sensoriamento

Remoto. Florianópolis – SC, Brasil, pp 1321-1328, 2007.

RICCI, M.; PETRI, S. Princípios de aerofotogrametria e interpretação geológica. São Paulo:

Nacional, 1965. 226p.

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Hidrográficas..São Carlos: Rima, 2004.

VALENTE, Roberta O. A. Análise da estrutura da paisagem na bacia do Rio Corumbataí – SP.

Piracicaba: USP, 2001. Dissertação de Mestrado. Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz.