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Monografia em Métodos e Técnicas de Pesquisa, sob orientação do Prof. Luis Mauro Sá Martino, 2007.Este estudo traça um paralelo entre a violência e o grotesco contido nos meios de comunicação ao modo como reagem às cenas de violência os espectadores do filme Pulp Fiction, de Quentin Tarantino. Em uma época onde a violência é incorporada a vida cotidiana muitas produções audiovisuais que abordam este tema são produzidas e parece que cada vez mais nos chocamos menos. Em Pulp Fiction, assistimos a cenas de extrema violência interpretadas como acontecimentos banais da vida do submundo, sem que isso desperte repulsa em relação ao filme nem raiva dos personagens. Muito pelo contrário, nos sentimos maravilhados com os acontecimentos, curiosos para saber os desfechos e acabamos torcendo por quem menos merece.
Citation preview
FACULDADE CÁSPER LÍBERO
PROJETO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA
A VIOLÊNCIA COTIDIANA DE PULP FICTION
O GROTESCO DA TELEVISÃO E O PÂNICO NA INFORMAÇÃO
AUTOR
RAFAEL POTENZA FERNANDES
ORIENTADOR
LUIS MAURO SÁ MARTINO
TURMA
2º RTV-C
MATÉRIA
MÉTODOS E TÉCNICAS DE PESQUISA
SÃO PAULO, NOVEMBRO DE 2007
2
A VIOLÊNCIA COTIDIANA DE PULP FICTION
O GROTESCO DA TELEVISÃO E O PÂNICO NA INFORMAÇÃO
3
AGRADECIMENTOS
No começo da realização desta pesquisa — proposta da matéria de Métodos e
Técnicas de Pesquisas, ministrada pelo professor Luís Mauro Sá Martino — senti não querer
isso pra mim. Não havia me familiarizado à escrita acadêmica e tão pouco teria assunto para
um estudo aprofundado como os que vemos por ai. Pós-graduação, defesa de tese e mestrado;
tudo isso eu imaginava bem longe dos meus objetivos pessoais.
Conforme foi desenrolando-se o processo de pesquisa, de leitura e escrita deste texto,
senti que minha primeira impressão era erronia. De todo o tempo desprendido a este estudo, o
ganho de conhecimento e experiência foi maravilhoso e inimaginável. Encontrei na pesquisa
acadêmica um meio de trilhar uma busca intelectual pelo que quero para o resto de minha
vida: cinema, literatura e psicologia.
Meu objetivo para a vida continua sendo a produção de projetos audiovisuais, mas
farei toda a pesquisa e busca de conhecimento teórico através de pesquisas acadêmicas e,
diferentemente do imaginado no primeiro contato, consigo desenvolver perguntas que dariam
pesquisas acadêmicas extensas, estas que já tento, de maneira ou outra, analisar e buscar um
encadeamento lógico para um estudo aprofundado.
Agradeço primeiramente ao professor Luis Mauro, por mostrar o caminho desta
descoberta e incentivar a produção deste estudo; à Taís Tanira Rodrigues, pelo auxílio na
revisão do texto, troca de conhecimento, seja em conversas ou literaturas e pelas dicas de
escritas e linguagem empregada, que irei levar para o resto da vida; á todos os entrevistados
que responderam aos questionários; à meus pais pelo apoio e pela compreensão à minha falta
nos almoços de família; e, em especial, à minha namorada Maíra Innocencio, que além do
incentivo e ânimo nas horas em que pensei não dar em nada esta pesquisa, sempre acreditou
nas indagações motivadoras deste e na sua realização, chegando a apostar comigo, ainda na
época em que eu afirmava não gostar de pesquisa acadêmica, que após esta realizada, eu ainda
iria fazer outras mais. Pois ela estava certa e agradeço, a ela e todos já citados do fundo do
coração.
4
RESUMO
Este estudo traça um paralelo entre a violência e o grotesco contido nos meios de
comunicação ao modo como reagem às cenas de violência os espectadores do filme Pulp
Fiction, de Quentin Tarantino. Em uma época onde a violência é incorporada a vida cotidiana
muitas produções audiovisuais que abordam este tema são produzidas e parece que cada vez
mais nos chocamos menos. Em Pulp Fiction, assistimos a cenas de extrema violência
interpretadas como acontecimentos banais da vida do submundo, sem que isso desperte
repulsa em relação ao filme nem raiva dos personagens. Muito pelo contrário, nos sentimos
maravilhados com os acontecimentos, curiosos para saber os desfechos e acabamos torcendo
por quem menos merece.
Palavras-chave: Pulp Fiction; Quentin Tarantino; análise de recepção.
5
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ......................................................................................................................................................5
POR QUE NÃO NOS ASSUSTAMOS COM CERTAS CENAS DE VIOLÊNCIA? ........................................ 12
A BELEZA DO GROTESCO.................................................................................................................. 13
O PÂNICO QUE NOS CERCA ............................................................................................................... 14
O FILME REFLETE A VIDA DA SOCIEDADE EM QUE VIVEMOS?......................................................... 17
A VIOLÊNCIA TORNA-SE FASCINANTE E NÃO REPULSIVA AO ESPECTADOR? .............................. 20
O HUMOR .......................................................................................................................................... 20
NÃO-LINEARIDADE ........................................................................................................................... 22
TRILHA SONORA ............................................................................................................................... 23
COMPARAÇÃO ENTRE 8MM E PULP FICTION.................................................................................... 24
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................................................. 27
REFERENCIAL TEÓRICO............................................................................................................................... 29
6
INTRODUÇÃO
O grandalhão pega a sua 45 automática e os Babacas abrem
espaço para ele. Marsellus começa a andar na direção de
Butch. Butch vê a figura decidida ziguezagueando em sua
direção. (...)
Marsellus levanta sua arma e atira, mas ele está tão
machucado, tremelicante e tonto que seu braço está
descontrolado. Ele atinge os quadris da mulher com cara de
maluca. Ela cai no chão, gritando.
Cara de maluca — Ai Meu Deus, fui baleada!
Quentin Tarantino e Roger Avary, in Pulp Fiction 1
Ao avaliar este trecho do roteiro, que descreve o desfecho do encontro entre Butch
(Bruce Willis) e Marsellus Wallace no filme Pulp Fiction2, notamos imediatamente como
Quentin Tarantino, diretor e roteirista do filme lida com a violência. Sua postura é de total
despreocupação e deboche, tratando como se fosse algo normal uma saraivada de tiros em
plena luz do dia, culminando na morte de inocentes.
Mas será que somente Tarantino interpreta a cena assim? Será que o público que
prestigiou o filme — um grande sucesso de bilheteria nos Estados Unidos e em outros países
— também achou a cena normal quando a viu no cinema?
Pulp Fiction é um filme de 1994, o segundo do diretor e conta com um elenco forte:
Samuel L. Jackson, Uma Thurman, Bruce Willis e, marcando seu retorno às telas, John
Travolta. O roteiro traz três histórias que são contadas fora da ordem cronológicas e que se
interligam em certo ponto da trama. A primeira história mostra o acerto de contas que Vincent
Vega (John Travolta) e Jules (Samuel L. Jackson) executam a mando do seu chefe, o mafioso
Marsellus Wallace (Ving Rhames). Na segunda história, Vincent tem que levar Mia Wallace
(Uma Thurman), mulher de Marsellus, para se divertir enquanto ele viaja. A trajetória de
Butch (Bruce Willis) — um boxeador pago por Marsellus para perder a luta que, além de não
cumprir o acordo, mata seu oponente no ringue, tendo que fugir do mafioso — é contada na
terceira parte do filme.
1 Trecho de roteiro do filme Pulp Fiction, pág. 113, traduzido in O espaço da violência no filme Pulp Fiction, de Quentin Tarantino monografia de Alessandra Perrechil, pág. 19. 2 No Brasil, o filme recebeu o título de Pulp Fiction – Tempos de violência.
7
O filme recebeu indicação ao Oscar® nas categorias de Melhor Ator (John Travolta),
Melhor Ator Coadjuvante (Samuel L. Jackson), Melhor Atriz Coadjuvante (Uma Thurman),
Melhor Roteiro Original, Melhor Diretor, Melhor Edição e Melhor Filme, dos quais só
ganhou o de Melhor Roteiro Original. Foi produzido com US$ 8 milhões e arrecadou
aproximadamente US$ 104 milhões nas bilheterias, sendo assistido por duzentas milhões de
pessoas. Instantaneamente tornou-se filme obrigatório para qualquer um que admire a sétima
arte, ainda mais sabendo que o diretor tornou-se uma enciclopédia cinematográfica após
trabalhar como atendente em locadoras de vídeo.
Em contrapartida, o filme foi duramente criticado pelos mais conservadores em razão
de seu conteúdo violento e a estas críticas apenas são somadas às de outros trabalhos de
Tarantino, como Kill Bill Volume 1 e 2 e Cães de Aluguel. Muitas críticas surgiram após
declarações de Tarantino aconselhando seus filmes para todas as faixas etárias, mesmo tendo
consciência do alto teor de violência presente em sua obra.
Em entrevista ao canal KRON Channel 4 de São Francisco, na época do lançamento de
Kill Bill Volume 1, a entrevistadora Jan Wahl discutiu umas das afirmações de Tarantino,
onde ele teria dito que Kill Bill era um filme que todas as crianças deviam ver. Tarantino
confirmou sua declaração e a reforçou, dizendo que seu filme era feito para crianças, por ser
engraçado. A entrevista então rumou para uma discussão se era ou não certo crianças verem
um filme tão violento quanto Kill Bill. Tarantino defendeu-se dizendo que ele, quando
criança, assistia à filmes violentos e sabia distingüi-los da realidade, e que faz filmes violentos
por que isso é “legal”, portanto, pais legais deveriam levar seus filhos para ver seus filmes.
Sou feliz. Mas quer saber se existe raiva dentro de mim?
Provavelmente, sim. Deve estar dentro de mim. Como e por
que, não sei responder. E não quero saber, pois não é do
meu feitio ser psicanalítico. Cresci vendo filmes de terror, de
kung fu, filmes de Clint Eastwood e Charles Bronson. Passei
a respirar as imagens desse mundo. É bobagem dizer que
crianças que vêem filmes violentos se tornam violentas.
Tarantino in Revista Época3
Na entrevista concedida a Revista Época, foi questionado sobre o que essas crianças
que vêem filmes violentos se tornam. A resposta de Tarantino foi curta. “Elas se tornam
cineastas violentos.”4
3 Entrevista a revista Época, pág. 2, perto do lançamento de Kill Bill, em resposta a questão se ele, Tarantino, era violento. 4 Tarantino in Revista Época, pág. 2.
8
O papel da violência nas obras de Tarantino é de elemento motivador, como comprova
Alessandra Perrechil em sua monografia. Ela defende que a violência é tão presente na obra,
que passa a ser personagem e que todo o desenvolvimento da história depende dos desfechos
dos atos de violência protagonizado pelos outros personagens.
O fluxo de narrativa é construído em cima da violência.
Todos os personagens estão ligados direta ou indiretamente
a ela, sob diversas formas. (...) ela não está inserida no
contexto do filme, mas é seu elemento principal — quase
uma personagem. A própria ligação das figuras dramáticas,
no filme, é através de cenas agressivas.
Alessandra Perrechil 5
Concordo com as ponderações de Alessandra e creio que o este texto vem para somar-
se ao dela. O estudo aqui apresentado não analisa como a violência se porta no filme e sim
como as pessoas se portam ao verem a violência presente nele.
Como espectador, me espantei ao me pegar-me rindo da cena descrita no começo
desta monografia. Após perceber minha reação, questionei o porquê do meu riso. A cena
retratava uma violência sem limite, o absurdo de um tiro que atinge uma mulher inocente, que
só estava ajudando alguém que tinha batido o carro e nada tinha a ver com o desentendimento
dos protagonistas do filme. Porque eu ria da morte da mulher inocente?
A resposta encontrei vendo o noticiário alguns dias depois. Era noticiado mais um
relatório dos crimes e mortes ocorridos naquele dia. Todos eles eram parecidos com a cena do
filme. Mortes estúpidas. Mortes estas que eram somadas a mais alguns números em uma
estatística trágica da violência urbana no Brasil e no mundo. E após o mortal relatório,
passavam mais duas notícias com teor mais ameno e um sorridente “boa noite” dos âncoras do
telejornal.
Relacionei então a cena de Pulp Fiction com o noticiário que tinha acabado de ver e
com todos os outros noticiários que já vi desde minha infância e percebi o fator que se repetia
nos dois objetos que analisava: a violência cotidiana.
Este estudo relaciona a recepção que o público tem das cenas de violência de Pulp
Fiction com a violência presente nos telejornais levantando a hipótese de que as cenas de
violência do filme não chocam tanto o espectador devido ao contato diário com a violência
presente nos noticiários.
5 Alessandra Perrechil in O espaço da violência no filme Pulp Fiction, de Quentin Tarantino, pág. 17.
9
Pulp Fiction é inteiramente violento, mas apenas o trecho — em que a cena originária
das indagações motivadoras desta pesquisa está presente — foi avaliado, promovendo uma
análise mais profunda e completa da recepção, montagem e interpretação desta violência.
A seqüência tem duração de dezoito minutos e faz parte da terceira parte do filme. É o
acerto de contas entre Marsellus Wallace e Butch. Recomendo que o filme seja assistido antes
da leitura da descrição da seqüência visando sempre uma melhor compreensão6.
Marsellus atravessa a rua quando avista Butch dentro de um carro, aguardando o sinal
abrir. Butch, quando o vê, avança com o carro sobre ele, atropelando-o, e em seguida é
arremessado contra um muro, após bater em um carro que passava no cruzamento.
Na seqüência, enquanto ambos tentam se recuperar do acidente, auxiliados por
transeuntes que presenciaram a cena, Marsellus saca seu revólver e, cambaleante avança até
Butch, visando acertá-lo. Seu tiro acerta uma das moças que presta socorro à Butch, e este
foge trôpego, dando início a uma perseguição a pé que termina em uma loja de penhores.
Dentro da loja, eles se agridem mas são nocauteados pelo vendedor, que os amarra num
quarto no fundo da loja enquanto aguarda seu comparsa, Zed, para iniciar a tortura, contando
com o auxílio de Gismo7. Butch consegue fugir enquanto os torturadores se ocupavam de
Marsellus, mas quando está prestes a deixar a loja, Butch percebe que deve tentar livrar
Marsellus — o homem do qual vinha fugindo — das mãos dos torturadores. Procurando na
loja uma arma que pudesse usar, encontra, após muitas opções, uma espada Hanzo8. Ele a
pega e volta para matar os dois torturadores. Quando entra no quarto, percebe que Marsellus
está sofrendo abuso sexual, Butch fere gravemente o primeiro torturador e, ameaçando com a
espada o segundo, dá tempo para que Marsellus se recupere. Com uma arma calibre 12
Marsellus atinge a região pélvica do torturador que estava sob controle de Butch.
Butch então pergunta como ficaria a situação deles, afinal, quando entraram na loja,
estavam quase se matando em função de um acordo de cavalheiros que havia sido rompido
por Butch. Marsellus determina que o desentendimento seja esquecido, mas Butch é obrigado
a deixar a cidade imediatamente e nunca comentar sobre o ocorrido naquele quarto.
Para a sustentação deste trabalho foi necessária uma bibliografia pautada na análise
cinematográfica, uma segundo voltada à discussão da violência presente nos tempos atuais e
6 Devo alertar que a redundância do texto de descrição da seqüência analisada deve-se ao respeito às convenções de roteiros. Usa-se um aparato verbal para descrever uma imagem, uma cena ou uma seqüência, necessitando do maior número de detalhes possíveis. 7 Um homem que dorme numa espécie de jaula, no porão da loja de penhores. Uma figura vestida, dos pés a cabeça, com roupas de couro, do estilo masoquista, com zíper na boca. 8 Espada japonesa muito referenciada nos filmes posteriores de Tarantino, Kill Bill volume I e II.
10
como ela configura a sociedade ao seu gosto e, a terceira voltada à interação do espectador
com os meios de comunicação.
Foram considerados dois livros-base para esta pesquisa e um terceiro que interliga os
dois conceitos — da linguagem do grotesco e do estado de pânico. O primeiro é O Império do
Grotesco, de Muniz Sodré9 e Rachel Paiva10, onde abordam a estética do grotesco, presente
em Pulp Fiction no submundo dos personagens que usam drogas, sofrem agressões, matam e
morrem. A narrativa torna-se descontraída pelo cômico, usando o espanto e a curiosidade em
assistir, por exemplo, ao desfecho de uma adicta de cocaína que por engano “cheira” heroína,
fazendo o espectador ficar atento e preso ao filme, envolvendo-se com as situações e com os
personagens da trama. O desenrolar da situação citada é tragicômico e aí está o grotesco, em
seu estado puro, nesta obra de Tarantino.
O segundo livro base para este trabalho é Mídia e Pânico: Saturação da informação,
violência e crise cultural na mídia, de Malena Segura Contrera — um estudo que traça um
paralelo entre o fácil acesso à informação e à violência exacerbada que inunda os meios de
comunicação com o Deus grego Pan, Deus este que deu origem a palavra pânico — no qual a
autora afirma que o pânico, adjetivo de ordem psicológica, é encontrado em todos os
receptores da informação sem limites da era atual.
Além de confirmar que a violência na mídia, em especial nos noticiários, é exagerada
e que isto faz com que o público acabe se acostumando a ela — ficando em um estado
permanente de pânico ou de pânico enrustido — ainda joga uma segunda luz sobre a
interpretação da violência em Pulp Fiction: que a violência contida nele nos choca sim, mas
como estamos em contato com a violência diariamente, ficamos chocados diariamente, sendo
então este choque recorrente na nossa existência. Como se o pânico, a violência e este choque
a que a autora se refere fossem sentimentos habituais da sociedade contemporânea.
Com relação à análise fílmica, Jacques Aumont, em A estética do filme, abre
horizontes para a interpretação da estrutura cinematográfica que Tarantino traz em Pulp
Fiction. Observa-se então que a linha entre o que é considerado verossímil e inverossímil no
filme é bem tênue, com desfechos pouco previsíveis e situações não muito convencionais,
mesmo assim, a obra não deixa de tratar da realidade dos anos 90.
9 Professor titular da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ECO/UFRJ). 10 Professor da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ECO/UFRJ).
11
Constata-se que como o grotesco é ampliado pela montagem cinematográfica a
recepção pelo público torna-se mais sutil e aceitável por ser costumeira no cotidiano desta
audiência.
Toda a seqüência analisada será decupada a partir deste conceito de realidade e
verossimilhança descrito na obra de Jacques Aumont e na análise da montagem das cenas de
Pulp Fiction feitas no estudo de Alessandra Perrechil.
Os artigos Ciberespaço e violência simbólica, de Paulo Quadros e Estética da
Violência, por Maria Luiza Belloni, ambos da revista Comunicação & Educação servem para
entender como a violência na sociedade influencia a percepção das pessoas, confirmando a
hipótese inicial de que, graças ao fácil acesso a informação que a era globalizada, tecnológica
e virtual proporciona, certos fatos, como a violência, acabam sendo banalizados e tidos como
corriqueiros. As pessoas deixam de ficar horrorizadas com acontecimentos grotescos e
violentos, passando a interpretá-los como acontecimentos freqüentes e quase naturais.
Para a análise foram aplicados dois questionários para 10 pessoas com acesso
ilimitado a cultura e a meios de comunicação, e posterior confrontos dos resultados com a
bibliografia citada. O primeiro questionário traça um perfil pessoal enquanto consumidores
dos meios de comunicação. O segundo indaga sobre a reação do espectador ao filme e, em
especial, à seqüência objeto deste estudo, relacionando-a com o modo como têm contato com
a mídia em geral.
Além disso, foi analisada a construção da seqüência de Pulp Fiction em comparação
com uma seqüência do filme 8mm, de Andrew Kevin Walker11, com o intuito de mostrar
como a violência de Pulp Fiction foi toda tratada para ser recebida como algo comum do dia-
a-dia, sendo por vezes, estilizada de maneira que o espectador se sentisse maravilhado e
positivamente surpreso com o que vê.
11 Mesmo roteirista de Seven, Sete Crimes Capitais, de 1995.
12
POR QUE NÃO NOS ASSUSTAMOS COM CERTAS CENAS DE VIOLÊNCIA?
A hipótese base deste trabalho é que não nos impressionamos com a maioria das cenas
de violência do filme Pulp Fiction porque o tipo de violência retratada está presente na vida
cotidiana, nos noticiários televisivos, impressos e virtuais.
Sem dúvida, o século XX inovou surpreendentemente na
questão de acessibilidade à informação. O acesso tem-se
tornado o grande investimento dos mercados especializados
em nichos tecnológicos. Assim, facilidade e rapidez a um
volume vertiginoso de informações é a grande meta da
sociedade dita globalizada (...)
Paulo da Silva Quadros12
Presente em quase todas as manchetes de jornal e chamadas de telejornais, a violência
é recorrente na mídia e, com o aumento vertiginoso na quantidade de meios para ter acesso a
informação, a violência é difundida para todos e sem nenhum tipo de restrição.
No espaço cibernético, a violência simbólica amplia-se para
níveis assustadores. Uma vez que não se pode controlar o
conteúdo veiculado, as crianças que têm acesso facilitado a
este meio, podem ser colocadas em contato com vários
graus de perversidade: drogas por computador, manuais
para construção de bombas (...).
Paulo da Silva Quadros13
A pessoas em contato com a violência desde pequeno, acostuma-se a ela e crê normais
suas implicações — sendo, inclusive, mais apto a praticá-la sem nenhum pudor ou senso.
Sim, pois é um tema decorrente de toda a sociedade
mundial, ou pelo menos, parte dela. E programas
sensacionalistas se alimentam disso para ganhar a
audiência de pessoas sedentas por tragédias e situações
humanas extremas.
Marina, 20 anos14
12 In Ciberespaço e violência simbólica, pág. 54. 13 In Ciberespaço e violência simbólica, pág. 56. 14 Em resposta a pergunta Você acha que a violência nos noticiários, em especial na televisão, tem um motivo para estar tanto em evidência? do questionário de análise de perfil.
13
Os dois artigos então fundamentam a idéia de que a banalização da violência pelos
meios de comunicação e o fácil acesso à informação fazem com que a sociedade receba com
mais naturalidade e passividade o grotesco da obra tarantiniana.
A beleza do grotesco
O grotesco como forma estética de linguagem foi estudado no livro O império do
grotesco de Muniz Sodré e Raquel Paiva. Chamado pelos italianos de disgusto, o grotesco é,
por definição dos próprios autores, “(...) uma combinação insólita e exasperada de elementos
heterogêneos, com referência freqüente a deslocamentos escandalosos de sentido, situações
absurdas, animalidade, partes baixas do corpo, fezes e dejetos”.
Com a estética do grotesco presente na televisão — em programas como o já extinto
Programa do Ratinho e o norte-americano Jackass — e nas artes, — em movimentos como o
Surrealismo — passou a ser largamente empregada no cinema, com filmes onde o enredo
gira em torno de situações caricatas, como, por exemplo, nos filmes do Charles Chaplin, e até
com personagens e dilemas bizarros, caso do filme Sujos, Feios e Malvados de Ettore Scola e
a maioria dos filmes do Fellini.
O grotesco seria tudo aquilo que vemos com asco, coisas extravagantes ou burlescas
que na verdade não gostaríamos de ver. Seria, mas o que ocorre é exatamente o contrário. A
televisão descobriu esta fórmula partindo da curiosidade do ser humano pelo que é diferente,
inusitado e escandaloso, devido ao seu teor de humor, surpresa e pioneirismo.
Nietzsche afirma em A Vontade de Potência que “A
preferência pelos acontecimentos terríveis é um sintoma de
força (da alma)”.
Sodré e Paiva15
No livro, os autores chegam a analisar a construção do Programa do Ratinho a fim de
elucidar a construção do grotesco nele, e como o programa necessita desta estética para atrair
o público. Um exemplo de fácil compreensão do que é o grotesco e de como ganhou força na
televisão hoje em dia é o caso do programa norte-americano Jackass, sucesso no mundo todo.
Jackass é estrelado por jovens que fazem tudo que é considerado nojento e de tremendo mal
gosto até o limite máximo que eles conseguem agüentar. De modo cômico e curioso — tanto
para os que fazem o programa, como para os que assistem — trabalham com o inusitado e o
grotesco. Em um de seus episódios, tatuaram em um dos integrantes do programa um smile16
15 In O Império do Grotesco, pág. 09. 16 Carinha amarela e redonda, com uma expressão de felicidade.
14
durante uma corrida de jipe. Claro que o resultado da arte não foi satisfatório, mas como isso
nunca havia sido feito, a curiosidade acabou tornando o estapafúrdio em pioneiro.O sucesso
do programa vem da curiosidade dos telespectadores sobre o inusitado que os aguarda em
situações totalmente diferentes e inimagináveis.
O primeiro a teorizar o grotesco foi Victor Hugo no prefácio de sua obra Cromwel17l.
Sodré e Paiva descrevem o texto de Hugo como agressivo, mostrando um tom de manifesto
nas suas afirmações. Eles esclarecem que Hugo acaba rompendo com o bom gosto da tradição
clássica exatamente por defender o grotesco como o estilo pelo qual todos se sentem atraídos
a ver. Hugo afirma que o grotesco está presente em tudo que apresenta valor simbólico feito
pelo homem.
“O grotesco simplesmente “é”, (...) ora conceito, ora
imagem.”
Sodré e Paiva18
O grotesco então não é exatamente o mesmo que feio, o grotesco é sim uma
manifestação fantasiosa que pode fugir à realidade convencional ou acentuar uma situação
real humana que já é degradante.
O pânico que nos cerca
Nos jornais, na televisão, no cinema, em todas as
instâncias, a violência está tão presente nas situações
comunicativas da mídia contemporânea que se apresenta
como uma obsessão temática. E é aqui que nos parece que
resida a insuficiência da maioria das abordagens
contemporâneas que refletem a relação entre violência e
mídia: tratar a violência como se ela estivesse presente na
mídia apenas sob a forma de tema, de assunto, como se
fosse apenas mais uma pauta.
Malena Segura Contrera19
Este trecho do livro de Malena exalta como a violência está presente a todo momento
na mídia, somando-se às idéias já citadas dos artigos de Paulo Quadros e Maria Luiza Belloni.
A questão que seu estudo lança ao problema da superexposição à violência é que
graças a isso, a pessoa exposta à violência diariamente — seja em jornais impressos,
noticiários televisivos, músicas ou filmes — começa a crer que a violência pura e 17 HUGO, Victor. Cromwell, 1827. 18 Como os autores descrevem o grotesco na concepção hugoliana in O Império do Grotesco, pág 44. 19 In Mídia e Pânico: Saturação da informação, violência e crise cultural na mídia, pág. 89.
15
simplesmente faz parte da sociedade e nada pode e deve ser feito contra isso, ou seja, deixa de
gerar espanto em quem a recebe.
Acho que é um ciclo que alimenta tudo. A realidade do
mundo atual é esta: muito terrorismo, homicídios, suicídios,
latrocínios, abandono, fome, aids e cataclismos; e o público
consome tudo isso, elevando o Ibope.
Taís, 42 anos20
A autora do livro cita trechos de R. Girard21 para explicar um ponto que achou
interessante na análise da violência: ela é bem aceita na televisão por que é parte integrante do
ser humano.
Dentre todas as reflexões significativas que vimos a respeito
da violência, chamou-nos especialmente a atenção as
reflexões de R. Girard sobre esse tema, já que ele afirma
estar esse fenômeno presente na base mesma de toda
cultura humana. Fenômeno que, aliás, ele relaciona
diretamente ao sagrado, considerando essa dupla como
traço intrínseco ao ser humano: “ a violência e o sagrado
são inseparáveis” (Girard, 1998:32); “É a violência que
constitui o verdadeiro coração e a alma secreta do sagrado”
(Girard, 1998:46)
Malena Segura Contrera22
(...) particularmente vejo que a violência é da natureza
humana. Nossa evolução está intimamente ligada a
capacidade de controlarmos nossas ações, principalmente as
violentas. No passado podemos verificar que muito do que
hoje consideramos atos violentos, crimes, violações e etc, na
época eram normais [grifo meu], logo não eram noticiadas
(negro escravo morto pelo seu dono: “normal”; negro escravo
fugitivo: ”notícia”).
Júlio, 39 anos23
O espectador de Pulp Fiction não fica chocado, primeiro, porque a violência foi
tratada para parecer cotidiana, como nos noticiário; segundo, porque os desfechos da história
trilham por caminhos comuns à existência do ser humano, utilizando o acaso e o grotesco; e
20 Em resposta a questão Você acha que a violência nos noticiários, em especial na televisão, tem um motivo para estar tanto em evidência? do questionário de análise de perfil. 21 Antropólogo famoso por suas teses sobre as relações entre o sagrado e a violência. 22 Idem nota 16. 23 Em resposta a pergunta Você acha que a violência nos noticiários, em especial na televisão, tem um motivo para estar tanto em evidência? do questionário de análise de perfil.
16
terceiro, porque a construção das cenas priorizam situações cômicas e surpreendentes,
estilizando a violência, despertando assim a curiosidade e o interesse do espectador.
17
O FILME REFLETE A VIDA DA SOCIEDADE EM QUE VIVEMOS?
Que tipo de conteúdo este filme tem?24
Violência banalizada, ou seja, o nosso cotidiano.
Gabriel, 14 anos.
O que achou da cena em que Butch e Marsellus se
encontram?25
Das cenas violentas do filme, essa é a que mais me parece
com a violência com a qual estamos acostumados no nosso
dia-a-dia. Quando Marsellus tenta dar um tiro no Butch, mas
acaba acertando a mulher que estava ajudando ele e ela, no
chão, fica dando gritos de dor, acho que foi a cena mais
próxima da violência do dia-a-dia que o filme teve.
André Gil, 19 anos.
Como André Gil aponta, a cena objeto deste estudo é uma das que traz um teor de
violência mais próxima da considerada violência cotidiana.
Dos pesquisados, todos disseram se informar pela internet e sete assinalaram a
televisão como outro meio de informação. Na questão Você acha que a violência nos
noticiários, em especial na televisão, tem um motivo para estar tanto em evidência? algumas
respostas afirmaram que a televisão mostra a violência por que esta dá audiência.
Os meios de comunicação valorizam estas questões na
busca de metas no Ibope.
Taís, 42 anos26
Malena Contrera confirma a citação da pesquisada Taís em seu livro.
Quando questionamos sobre a questão de predileção
temática da mídia pela violência, os profissionais de mídia
normalmente respondem com o velho clichê de que é disso
que o espectador gosta, de que é o que dá audiência e faz a
coisa toda continuar. E apressam-se a apresentar os
resultados de pesquisas que mostram os altos índices de
audiência de programas com um grau elevado de violência,
24 Questão do questionário de análise de recepção do filme. 25 Idem nota 19. 26 Idem nota 16.
18
procurando legitimar quantitativamente o que na realidade é
um problema qualitativo.
Malena Contrera27
Afirmando ser a violência o principal alicerce da mídia para atrair o público e dizendo
ser a violência em Pulp Fiction cotidiana, os entrevistados mostram que esta obra de
Tarantino é vista de maneira mais leve e atraente pelo fato deles assistirem ao noticiário.
(...) mostra a violência latente de uma sociedade pós-
moderna.
Edison, 47 anos28
Mas, em alguns pontos da seqüência objeto três dos entrevistados fizeram indagações
com relação à parte em que Marsellus está atravessando a rua com o que parece ser um lanche
e vê Butch parado no sinal.
O que me chamou atenção foi o fato de uma pessoa que
aparentemente é o “chefão” (Marsellus) estar andando
sozinho, sem comparsas e proteção.
Fernando, 45 anos
Marsellus jamais estaria no meio da rua com um café, ou sei
lá o que era aquilo.
Joana, 45 anos
Eles questionam como pode o chefão fazer o papel de subordinado. Esta é na verdade
uma manifestação do grotesco. “O grotesco funciona por catástrofe”29, esta citação de
destaque no livro de Sodré explica como a estética se consolida por meio de fenômenos
caóticos e quebra abrupta de um padrão aceitável pela sociedade. O padrão seria o capanga
buscar o café, mas na cena, quem busca é o chefão, que ainda por cima estava sozinho,
contrariando totalmente qualquer convenção para filmes policiais e de ação e estereótipos
para este tipo de personagem.
Com o grotesco beirando ao acaso, vamos analisar a cena na qual Marsellus encontra
Butch na rua. Butch estava voltando de seu apartamento e, enquanto aguardava o sinal ficar
verde para avançar, vê o seu maior desafeto, Marsellus, o chefe da gangue com quem tinha
acordado perder a luta.
Justamente o chefe da gangue tinha saído para comprar lanche. Foi o acaso, e não o
desentendimento dos dois que ocasionou o desfecho da cena.
27 In Mídia e Pânico: Saturação da informação, violência e crise cultural na mídia, pág. 98. 28 Em resposta a questão O que você achou do filme? no questionário de análise de recepção do filme. 29 In O Império do Grotesco, pág 23.
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Repara-se que a sua violência (do filme Pulp Fiction) pode-se
mostrar muitas vezes casual, gratuita e sádica (...) Assim, o
destino de seus personagens não é determinado apenas
pelas necessidades lógicas de uma ação, mas também por
algum tipo de acaso.
Alessandra Perrechil30
A cena prossegue, Marsellus é atropelado e transeuntes cuidam dele, que fica caído na
rua. Ele então se levanta e puxa o revólver, tentando atirar em Butch, que estava com o carro
batido do outro lado da rua. A perseguição se inicia e culmina nos dois entrando em uma loja
de penhores. Lá dentro, o dono da loja golpeia os dois, amarra-os e revela-se um pervertido
sexual que atua em parceria com um policial igualmente sádico. Com tantos lugares, Butch e
Marsellus foram entrar justamente na loja de dois pervertidos. O acaso da cena vai se
tornando cômico, pois o espectador não crê ser verdade que o azar dos dois protagonistas seja
tamanho.
O que pauta a cena é o acaso, prova máxima disso é a cena em que Zed, o policial
torturador escolhe quem será torturado primeiro. Ele usa a velha brincadeira do “Une-dune-
te” que consiste em apontar com o dedo alternadamente todas as opções no ritmo da música
infantil até ficar com a opção que o dedo apontar ao fim da canção.
A seqüência é extremamente violenta, com troca de tiros, abuso sexual e torturas mas
tudo é norteado pelo sentido do acaso, desde o encontro deles na rua até os desfechos das
ações. O que guia as nossas vidas é o acaso, mesmo que este seja chamado por alguns de
destino ou predestinação divina.
30 In O espaço da violência no filme Pulp Fiction, de Quentin Tarantino, pág. 20.
20
A VIOLÊNCIA TORNA-SE FASCINANTE E NÃO REPULSIVA AO ESPECTADOR?
Dentre os cineastas que desenvolveram a estética da
violência, Quentin Tarantino se destaca por tratar o tema de
maneira diferente. Sua violência é intercalada com um tom
de humor sarcástico e um ambiente aparentemente cotidiano
(...)
Alessandra Perrechil31
Segundo relato oral de Taís, dado em conversa informal após a entrega dos
questionários preenchidos, esta confessou que, antes de rever Pulp Fiction para responder as
perguntas, só se lembrava das cenas em que havia diálogos e da dança protagonizada entre
Mia Wallace e Vincent Veja. Veja que mesmo o filme girando em torno da violência, as cenas
do filme que ficaram na memória de Taís como referência foram justamente as de maior estilo
e menor conteúdo violento.
Uma parcela dos pesquisados respondeu na questão Quais os tipos de notícias que
você mais vê nos meios que você consulta?32 ser a violência manchete comum em todos os
meios consultados. Em seqüência a esta questão temos As notícias que você mais vê são as
que mais te interessam? E por quê?33, na qual as respostas apontam para a seleção das
informações que mais lhe atraem, ou seja, selecionam o que gostam de ver na mídia por que
não querem ver o que passa: violência. A contradição fica por conta da questão Você gosta
deste tipo de filme?34 em que a grande maioria diz que sim, gosta, mesmo tendo respondido
que o filme possui conteúdo violento na questão Que tipo de conteúdo este filme tem?35.
Com esta análise questiono por que, mesmo dizendo não gostar do tema violência,
Pulp Fiction agrada a quem assiste.
O HUMOR
O humor está muito presente no filme mesmo com a violência em tempo integral da
película. Os momentos que dão o tom cômico recorrem a piadas de humor negro, situações
inusitadas ou diálogos que parecem banais, descontraindo o clima do filme.
31 In O espaço da violência no filme Pulp Fiction, de Quentin Tarantino, pág. 17. 32 Presente no questionário de análise de perfil de recepção do filme. 33 Idem nota 28. 34 Presente no questionário de análise de recepção do filme. 35 Idem nota 30.
21
Como primeiro exemplo temos a parte em que a mulher que ajudava Butch leva um
tiro no quadril. De tão inesperado e rápido que isso acontece, o choque provoca uma reação
de riso em quem assiste.
(...) eles se entreolham e Wallace atira. Nesse momento
ocorre algo inesperado. Ele acerta o tiro em uma mulher que
estava do lado de Butch, ajudando o mesmo a se levantar.
De tão inusitada a situação, ela acaba sendo cômica e ao
mesmo tempo violenta.
Alessandra Perrechil36
Na seqüência objeto, os momentos de humor são: o encontro de Butch e Marsellus; o
nocaute dentro da loja de penhores; a escolha de quem seria torturado primeiro; a interação de
Gismo com Butch; os gritos dos torturadores dentro da sala; a procura de Butch por uma
arma; e o diálogo final entre Butch e Marsellus.
Do encontro entre Butch e Marsellus, as próprias circunstâncias, que já foram
levantas, tornam o fato deveras inusitado e, por conseqüência, surpreendente e cômico. O
acaso presente na hora em que, de tantas as lojas que eles poderiam entrar, escolhem justo a
de penhores dos torturadores, somente reforça a presença do inusitado. A escolha de quem
seria torturado, feita por Zed usando o sistema de escolha aleatória, confirma o acaso além de
ser engraçada por mostrar sua total despreocupação com as conseqüências que seus atos
poderiam causar.
Gismo é um personagem da história que tem uma breve aparição no filme. Vestido
todo em roupas de couro, deduzimos que este deva ser uma espécie de objeto sexual para os
torturadores e ficamos, em primeiro momento, horrorizados com tamanha perversidade
humana, mas logo perdemos este sentimento, pois ele protagoniza uma cena de humor
quando, após ser incumbido por um dos torturadores a tomar conta de Butch para que estes se
ocupem de Marsellus, o amarra na parede e sai de cena. Gismo começa a rir de Butch — um
riso com tom bestial, pois está abafado pela máscara que cobre sua boca — mas Butch
consegue se desamarrar e nesta hora, Gismo arregala os olhos e tenta avisar — sem êxito, pois
estava amarrado e impossibilitado de falar — seus “comparsas” que o prisioneiro tinha se
soltado. Gismo foi designado a vigiar um prisioneiro, mas este também é um prisioneiro.
Quando nos damos conta disso, o humor começa a aparecer e o riso é provocado quando
Butch lhe desfere um soco no rosto.
36 In O espaço da violência no filme Pulp Fiction, de Quentin Tarantino, pág. 18.
22
Saindo da loja, Butch sente-se obrigado a tentar ajudar Marsellus. Busca algo que
possa usar de arma nas prateleiras do balcão, encontra primeiramente um martelo, depois um
taco de beisebol. Desiste do taco em troca de uma serra-elétrica e por fim pega uma espada
Hanzo37. A trilha sonora e os gritos de “felicidade” dos torturadores dão à ação de Butch um
tom mais descontraído, contrariando os fins que sua busca tem: achar uma arma letal o
suficiente para matar com eficácia os dois torturadores.
No diálogo final entre Butch e Marsellus, ficamos sabendo quais serão os meios cruéis
utilizados por Marsellus para vingar sua “honra perdida” e isto não surpreende e sim
corresponde e satisfaz a nossa mente, por que ao término da cena, sentimos que uma medida
deve ser tomada e a vingança que Marsellus decreta nos agrada — desde seu ato de atirar em
Zed sem matá-lo até suas promessas de torturá-lo.
(...) e a parte em que Marsellus atira no dito cujo do policial
sem deixar ele morrer e promete trazer dois caras para
aplicar tortura medieval nele. É justiça com as próprias mãos.
Joana38, 45 anos.
NÃO-LINEARIDADE
Grande parte dos entrevistados atribui o grande trunfo do filme à sua falta de
linearidade.
(...) pela forma que foi desenvolvido, mesclando momentos
presente e passado, prendendo minha atenção. (...) sem
lógica normal, ou seja, você fica esperando e buscando
entender o enredo do início ao fim.
Fernando, 45 anos
Eu achei que o grande barato do filme foi o ir e vir da história
(...)
Joana, 45 anos
Acho genial, histórias que não parecem ter nada a ver, mas
que se entrelaçam como você nem imagina.
Maíra, 20 anos
37 Espada japonesa muito citada em Kill Bill volume I e II. 38 Em resposta a questão Qual o grande trunfo do filme? do questionário de recepção do filme.
23
Seu jogo de ir e vir fazem uma confusão na cabeça de quem assiste ao filme fazendo
com que este fique mais interessado em qual será os desfechos da história do que em seu
conteúdo altamente violento.
Ao trazer a história em um formato não-linear, Tarantino assina seu estilo no filme,
remetendo-o as histórias de detetive que eram denominadas Pulp Fictions, como mostra o
cartão no começo do filme.
“PULP (pulp) n. 1. A soft, moist, shapeless mass or matter.
2. A magazine or book containing luridsubject matter and
being characteristically printed on rough,unfinished paper.”
Tarantino in letreiro no começo de Pulp Fiction
Roberto Tietzman em seu artigo Pulp Fiction e a não-linearidade narrativa confirma o
estilismo de Tarantino em sua escolha pela não linearidade.
(...) acompanhamos as peripécias de Vincent e Jules sempre
pelo olhar de Tarantino, como se estivéssemos lendo um
jornal por sobre os ombros de alguém e não pudéssemos
escolher quais matérias ou anúncios ler.
O formato da história tira partido da relação entre filme e
espectador do cinema também. Tarantino sabia que teria o
espectador fechado em uma sala por duas horas e meia a
seu dispor. Podendo, portanto, sofisticar-se nos entrecortes
entre as tramas que compõem Pulp Fiction.
Tietzman39
TRILHA SONORA
Presença importante no filme, sua trilha sonora é composta por músicas alegres e
dançantes. Com grande influência na cultura pop dos anos 70 e 80, Pulp Fiction foi indicado
ao Oscar® de melhor trilha sonora no ano que concorreu na acadêmia.
As músicas que compõem sua trilha, em sua grande maioria são participantes da
trama, geralmente vindo de um som ligado pelo personagem da cena ou do ambiente onde a
ação se desenvolve.
Tarantino usa a trilha sonora para amenizar as cenas, dando ou o tom cômico ou
despretensioso aos atos que se desenrolam, como, por exemplo, na cena em que Butch busca
uma arma para matar os torturadores.
39 In Pulp Fiction e a não-linearidade narrativa, pág. 128.
24
COMPARAÇÃO ENTRE 8MM E PULP FICTION
Nesta parte do capítulo vamos comparar a seqüência objeto deste estudo com uma das
cenas finais do filme 8mm. Recomendo que antes de ler está parte da monografia, o filme
8mm, de Andrew Kevin Walker, seja visto.
8mm conta a história de um detetive (Nicolas Cage) contratado por uma recém viúva
de um magnata para descobrir se uma moça que a velha senhora viu num dos vídeos
pornográficos que encontrou no cofre do marido após sua morte, está viva, pois no vídeo, a
garota após ter a relação sexual foi brutalmente assassinada frente as câmeras. Nicolas Cage
se infiltra no mundo da pornografia para descobrir quem poderia produzir tal vídeo e qual a
origem da garota. Descobrindo que a garota foi realmente morta na filmagem e qual a
produtora do vídeo, se passar por um rico disposto a pagar a produção de um vídeo igual ao
que a velha senhora lhe mostrou, conseguindo um encontro com os “cineastas”. Esta
seqüência do encontro será usada na comparação com a seqüência de Pulp Fiction. Nela,
Nicolas Cage está no galpão com os “vilões” da história e estes ameaças sua morte. Há cenas
de agressão e o desfecho resulta na morte dos que ameaçavam a vida de Cage, com este
fugindo.
O filme 8mm foi escolhido em função de apresentar um alto nível de violência e pela
reação que me causou quando o assisti pela primeira vez — levava-me a freqüentes choques
devido as cenas. A seqüência escolhida para a comparação traz uma série de ligações com a
cena objeto deste trabalho — a presença dos inimigos, das torturas, de um ambiente propício
para ações ilegais (galpão e porão), de um personagem em roupas sado-masoquistas e de
personagens com quase as mesmas funções em ambas as cenas — e diferenças drásticas na
fotografia, trilha sonora, diálogos e motivações.
Começando pelas diferenças, a motivação da história é completamente diferente nas
duas seqüências. Enquanto em Pulp Fiction o encontro dos dois é por acaso, quase sem
querer, em 8mm o encontro de Cage com os antagonistas da história é todo premeditado, tanto
por Cage como por seus inimigos.
A fotografia de toda a seqüência em 8mm é escura, mesmo a ação acontecendo durante
o dia. Por se passar dentro de um galpão escuro, com paredes cor vermelho-vinho bem
escuras seu tom no vídeo é soturno e avermelhado. O figurino também é todo monocromático.
Esse é o ponto de maior divergência visual com a seqüência de Pulp Fiction, no qual a ação
acontece durante um dia ensolarado priorizando ambientes aberto, e mesmo quando esta
ocorre no porão da loja de penhores, que se assemelha ao galpão de 8mm, seu tom no vídeo é
amarelo, e não vermelho escuro. A duração neste ambiente também é diferente. Em 8mm, os
25
personagens passam quase a seqüência toda dentro do galpão e apenas parte dela fora, o
inverso do ocorrido em Pulp Fiction.
A trilha sonora em Pulp Fiction é usada para dar o tom de estilismo e humor na
seqüência, enquanto em 8mm a trilha dá o tom de suspense e emoção, atordoando o
espectador, pois toca em background sem parar. Não há também, em momento algum da
seqüência de 8mm nenhum tom cômico, este amplamente usado em Pulp Fiction.
Os diálogos em 8mm são esclarecedores enquanto em Pulp Fiction são apenas
rotineiros. No primeiro, há o que explicar, por isso os diálogos existem para esclarecer, já que
a seqüência é o desfecho de uma grande história contada desde o começo do filme. Em Pulp
Fiction os diálogos não falam nada revelador por que as ações acontecem por causa da
oportunidade, do acaso. Ninguém tramou para que Butch e Marsellus fossem a loja para
serem torturados, eles simplesmente entraram nela e seu dono resolveu que seria legal se
divertir com eles.
Das ações, há uma diferença em como recebemos os estímulos. Como há a presença
do mesmo número de personagens em ambas as cenas e estes representam os mesmo papéis
— o vilão que comanda, o ajudante do vilão, o herói um e o “herói” dois, a vítima inocente e
o símbolo da submissão e perversão — podemos analisar como cada um representou seu
papel e como interagimos com eles.
A presença da vítima inocente, em Pulp Fiction é caracterizada pelos transeuntes, em
especial a mulher que leva o tiro. Essa mulher quando é alvejada não gera muito choque por
que, mesmo não esperando este acontecimento, não foi dado pelo diretor grande ênfase em
sua participação na trama, enquanto em 8mm, o inocente é o amigo de Cage, usado para fazer
chantagem a este. Por este personagem já ter sido introduzido no filme anteriormente objeto
usado na chantagem, sua interação com o espectador é bem maior. Quando ele morre —
mesmo Cage tendo atendido todas as exigências do bandido — o susto é grande por que,
mesmo esperando que isso fosse acontecer, o espectador torce para que não ocorra. O diretor
também dá um enfoque grande à sua morte, mostrando o corte em sua garganta e seu corpo
caindo em direção a câmera.
Os dois vilões são iguais nos dois filmes — há o que comanda e o submisso. No fim
da seqüência de 8mm, um morre e o outro (somente morto mais a frente na trama) tenta
capturar Cage que conseguiu fugir. Igual ao que acontece em Pulp Fiction, um dos bandidos
fica vivo para mais tarde morrer.
Cage e o mordomo da viúva são no começo do filme aliados. Na seqüência que
analiso, o mordomo revela ser um dos vilões. Quando os membros da produtora do vídeo
26
descobrem que o mordomo os tinha ludibriado em um episódio a parte deste pedaço da trama,
acaba se tornando também inimigo dos inimigos. Inimigo de meu inimigo, é meu amigo, já diz
o dito popular. Essa configuração retoma a de Pulp Fiction no qual Marsellus e Butch fazem
um pacto — então são amigos — depois Butch quebra o acordo — tornam-se inimigos —
quando se encontram na rua, querem se matar mas, na hora que são presos por maníacos, um
acaba ajudando o outro — confirmando o dito popular citado.
A presença do personagem em roupas sado-masoquistas em Pulp Fiction, o Gismo,
não tem significação nenhuma, apenas ocorre para dar um ar mais inusitado a cena, enquanto
em 8mm, o mesmo personagem em roupas de sado-masoquista — chamado Machine — tem
um papel de verdade no filme, sendo um dos capangas, mesmo não falando muito na
seqüência analisada. Com o uso de Gismo sem significar nada, Tarantino mostra o inusitado e
traz a tona um tom cômico, enquanto em 8mm Machine é personagem, existe por que tem a
função de ser um vilão e o espectador sabe o que esperar dele por que já o viu na trama.
27
CONSIDERAÇÕES FINAIS
(...) uma das interpretações para a violência no filme de
Tarantino é a crítica brutal através de ironias e humor negro,
mostrando a violência como um fator cotidiano e habitual
para os personagens.
Alessandra Perrechil40
Da citação acima, vale ressaltar ela ser apenas uma das interpretações para a violência
na obra de Tarantino. Creio que em momento algum Tarantino tenha feito este filme com o
intuito de fazer uma crítica ao mundo violento em que vivemos.
Ele incita a violência, ao invés de alertar que ela existe e que
causa muitos problemas.
Bruna41, 20 anos.
Tarantino realmente acha a violência fascinante e crê ser este o jeito de extravasar a
raiva de uma vida cotidiana estressante. Quando o espectador está no cinema, entra na
chamada situação cinema42, onde deixa o papel que interpreta na sociedade do lado de fora e
entra em um mundo novo, onde não há regras e não há punição para ele que só assiste, sem se
mostrar, sem participar, sem cometer. O voyeurismo e a raiva são extravasados nos filmes de
Tarantino.
O desejo de ir ao cinema pressupõe, portanto, não apenas
uma disponibilidade pura e simples para se deixar
sugestionar pela impressão de realidade, mas uma forma de
se relacionar com essa realidade alucinatória, forma essa
que poderíamos definir ao mesmo tempo como voyeurista e
narcisista, porque nela o sujeito “espia” a intimidade do outro
pelo viés da tela, enquanto o seu corpo inerte se projeta
imaginariamente na intriga e passa a vivenciar o filme como
se fosse o seu sujeito.
Arlindo Machado43
Na pesquisa, quando perguntei Qual o grande trunfo do filme? E porque? recebi de
resposta exatamente a confirmação da situação cinema que o espectador alcança.
40 In O espaço da violência no filme Pulp Fiction, de Quentin Tarantino, pág. 20. 41 Em resposta a questão Qual o grande problema do filme? E porque? do questionário de análise de recepção do filme. 42 Denominação dada por Hugo Mauerhofer in A psicologia da experiência cinematográfica, 1983, pág. 373. 43 In Pré-cinemas & pós cinemas, pág. 47.
28
Extravasar um sentimento — a violência — contido numa
realidade extremamente competitiva.
Edison, 47 anos
Pulp Fiction não trás nenhuma crítica à violência do mundo, diferente de 8mm, que
acusa um sistema voraz de perversão sexual do submundo do crime — que movimenta
milhões pelo mundo e que causa a morte e humilhação de diversas pessoas — mas mesmo
desvendando este lado do submundo, ao vermos o noticiário, nos deparamos com inúmeros
casos de crimes brutais, que não tem mais ou menos importância que o submundo
pornográfico e que são transmitidos e interpretados pela sociedade como se fossem fatos
cotidianos.
Mesmo sem ter uma crítica brutal à nossa sociedade, se pararmos para pensar na
violência contida em Pulp Fiction e como reagimos como se esta fosse rotineira apenas por
que a vemos diariamente nos noticiários, chegamos a considerar que não nos acostumamos à
violência, mas estamos em permanente estado de medo dela. Assistimos ao filme e cremos ser
tudo aquilo fantasia, vemos o noticiário e achamos que bala perdida só existe nas favelas do
Rio de Janeiro. Nosso medo é que situações como a dos filmes e dos noticiários aconteçam
com nós, por isso fatos como o ocorrido no dia 07 de fevereiro de 2007, no Rio de Janeiro, no
qual uma criança de seis anos foi arrastada até a morte por inúmeros bairros ao ficar presa
pelo cinto de segurança do lado de fora do carro que fora roubado pelos assaltantes para fugir
da polícia, sensibiliza a população e a deixa chocada com a violência.
Essa notícia mexeu com as pessoas exatamente por parecer ter sido tirada diretamente
de um filme. Parece que a sensibilização se deu até por pensarem que toda a barbárie de um
filme como Jogos Mortais ou do horripilante Grindhouse pudesse aparecer de maneira mais
abrupta na sociedade a qual pertencemos, deixando a sala de cinema e realmente mexendo
com nossos parentes, conturbando nossa vida e assustando nosso existir. Se não fosse esse
medo da vida imitar a arte, a morte desse menino só viraria mais uma estatística. Se ele
morresse por reagir a um assalto ele seria só mais um número na conta de mortos devido a
violência cotidiana.
O medo não nós deixar ver nem reagir a real violência do mundo. Nós nos bastamos
com a violência dos filmes e das notícias por que elas não nós atingem fisicamente.
Estilizamos a violência para não hostilizarmos a nós mesmos.
29
REFERENCIAL TEÓRICO
BIBLIOGRAFIA
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ARAUJO, Inácio. Cinema: o mundo em movimento, São Paulo, Scipione, 1995
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BERNADET, Jean-Claude. O que é cinema, São Paulo, Brasiliense, 1983.
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MACHADO, Arlindo. Pré-cinemas & pós-cinemas. São Paulo, 1997.
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QUADROS, Paulo da Silva. Ciberespaço e violência simbólica. Comunicação &
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RIVOIRO, Luiz. As 30 melhores entrevistas de Playboy: Agosto 1975 — Agosto 2005
(Entrevista com Quentin Tarantino), São Paulo, Abril, 2005. Pág. 137 à 142
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2002.
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1999.
SITEGRAFIA
http://revistaepoca.globo.com/Epoca/0,6993,EPT604725-1661,00.html
30
http://www.eco.ufrj.br/semiosfera/anteriores/especial2003/conteudo_ibentes.htm
http://br.youtube.com/watch?v=kkSpz9SEIZc