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© Cambridge University Press, 1970 Traduzido do original em inglês Participation and Democratic Theory Revisão técnica: Anna Maria Quirino Preparação: Eliana Antoniolli Revisão: Ana Maria O. M. Barbosa Capa: Pinky Wainer Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Pateman, Carole Participação e teoria democrática/ Carole Pateman; tradução de Luiz Paulo Rouanet. — Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. Bibliografia. 1. Autogestão 2. Democracia 3. Participação I. Título. CDD-321.80 índice para catálogo sistemático: 1. Democracia: Ciência política 321.80 ÍNDICE I. Teorias recentes da democracia e o "mito clássico " 9 II. Rousseau, John Stuart Mill e G.D.H. Cole: uma teoria participativa da democracia 35 III. O sentido de eficácia política e a participação no local de trabalho 65 IV. "Participação" e "democracia" na indústria 93 V. Autogestão de trabalhadores na Iugoslávia 115 VI. Conclusões 137 Bibliografia 149 índice remissivo 157 Direitos adquiridos pela EDITORA PAZ E TERRA S.A. Rua do Triunfo, 177 01212 - São Paulo, SP Tel. (011) 223-6522 Rua São José, 90 -II 2 andar, cj. 1111 20010 - Rio de Janeiro, RJ Tel. (021) 221-4066 que se reserva a propriedade desta tradução. Conselho Editorial Antônio Cândido Fernando Gasparian Fernando Henrique Cardoso 1992 Impresso no Brasil / Printed in Brazil 92-0919

24 Pateman Participacao e Teoria Democratica

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© Cambridge University Press, 1970 Traduzido do original em inglês Participation and Democratic Theory Revisão técnica: Anna Maria Quirino Preparação: Eliana Antoniolli Revisão: Ana Maria O. M. Barbosa Capa: Pinky Wainer

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Pateman, Carole Participação e teoria democrática/ Carole Pateman; tradução de

Luiz Paulo Rouanet. — Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

Bibliografia. 1. Autogestão 2. Democracia 3. Participação I. Título.

CDD-321.80

índice para catálogo sistemático: 1. Democracia: Ciência política 321.80

ÍNDICE

I. Teorias recentes da democracia e o "mito clássico " 9

II. Rousseau, John Stuart Mill e G.D.H. Cole: uma teoria participativa da democracia 35

III. O sentido de eficácia política e a

participação no local de trabalho 65

IV. "Participação" e "democracia" na indústria 93

V. Autogestão de trabalhadores na Iugoslávia 115

VI. Conclusões 137

Bibliografia 149

índice remissivo 157

Direitos adquiridos pela EDITORA PAZ E TERRA S.A. Rua do Triunfo, 177 01212 - São Paulo, SP Tel. (011) 223-6522 Rua São José, 90 -II2 andar, cj. 1111 20010 - Rio de Janeiro, RJ Tel. (021) 221-4066 que se reserva a propriedade desta tradução.

Conselho Editorial Antônio Cândido Fernando Gasparian Fernando Henrique Cardoso

1992 Impresso no Brasil / Printed in Brazil

92-0919

TEORIAS RECENTES DA DEMOCRACIA E O "MITO CLÁSSICO"

Nos últimos anos da década de 60, a palavra "participação" tornou-se parte do vocabulário político popular. Isso aconteceu na onda de reivindicações, em especial por parte dos estudantes, pela abertura de novas áreas de participação — nesse caso na esfera da educação de nível superior —, e também por parte de vários grupos que queriam, na prática, a implementação dos direitos que eram seus na teoria. Na França, "participação" foi uma das últimas palavras de ordem utilizadas por de Gaulle em campanhas políticas; na Grã-Bre-tanha, vimos a idéia receber a bênção oficial no Relatório Skeffing-ton sobre planejamento, e nos Estados Unidos o programa antipo-breza incluía fundos para o "máximo possível de participação" dos afetados por ela. O uso generalizado do termo nos meios de comuni-cação de massa parecia indicar que qualquer conteúdo preciso ou significativo praticamente desaparecera; "participação" era empre-gada por diferentes pessoas para se referirem a uma grande varie-dade de situações. A popularidade do conceito fornece uma boa razão para que se dedique alguma atenção a ele. Porém, mais impor-tante do que isso, a recente intensificação dos movimentos em prol de uma participação maior coloca uma questão crucial para a teoria política: qual o lugar da "participação" numa teoria da democracia moderna e viável?

É um bocado irônico que a idéia de participação tenha se tor-nado tão popular, particularmente entre os estudantes, pois entre os teóricos da política e sociólogos políticos a teoria da democracia mais aceita (aceita de maneira tão ampla que se poderia chamá-la de doutrina ortodoxa) é aquela na qual o conceito de participação as-

sume um papel menor, Na realidade, não apenas tem um papel menor, como nas teorias de democracia atuais um dado predomi-nante é a ênfase colocada nos perigos inerentes à ampla participação popular em política. Tais características derivam de duas preocupa-ções principais de teóricos atuais que escrevem sobre a democracia, sobretudo os norte-americanos. Primeira, sua convicção de que as teorias dos seus predecessores mais antigos (os chamados "teóricos clássicos"), que acalentavam o ideal do máximo de participação do povo, precisam de uma revisão drástica, quando não uma rejeição pura e simples. Segunda, uma preocupação com a estabilidade; do sistema político e com as condições ou pré-requisitos necessários para assegurar tal estabilidade; essa preocupação origina-se da com-paração que se faz entre "democracia" e "totalitarismo" enquanto as duas únicas alternativas políticas possíveis no mundo moderno.

Não é difícil descobrir de que modo a atual teoria democrática acabou por se implantar com esses fundamentos; sem o risco de uma simplificação excessiva pode-se dizer que ela resultou de um aconteci-mento intelectual do século XX, o desenvolvimento da sociologia polí-tica, e de um evento histórico, a emergência de Estados totalitários.

No início do século, a dimensão e a complexidade das socieda-des industrializadas e o surgimento de formas burocráticas de orga-nização, para muitos teóricos políticos de orientação empirista, pare-ciam levantar sérias dúvidas sobre a possibilidade de se colocar em prática o conceito de democracia do modo como ele era geralmente compreendido. Mosca e Michels foram dois dos teóricos mais co-nhecidos e influentes a defender semelhante tese. Mosca dizia que toda sociedade precisava de uma elite no governo e, em seus últimos escritos, combinava essa teoria da elite com um argumento a favor de instituições representativas. Michels, com sua famosa "lei de ferro da oligarquia" — baseada numa investigação sobre os partidos social-democratas alemães, que se dedicavam de maneira ostensiva aos princípios da democracia em suas próprias fileiras —, parecia mostrar que era necessário fazer uma escolha entre organização (aparentemente indispensável no século XX) e democracia, mas não ambas. Assim, embora a democracia, enquanto governo do povo por meio do máximo de participação de todo o povo, ainda possa ser um ideal, sérias dúvidas, postas em evidência em nome da ciência social,

parecem ter se levantado quanto à possibilidade de se colocar esse ideal em prática.

Entretanto, por volta da metade do século, muitas pessoas achavam que o ideal estava sendo questionado. A "democracia", de qualquer forma, ainda era o ideal; o que se tornara suspeita era a ênfase na participação e, com ele, a formulação "clássica" de teoria democrática. O colapso da República de Weimar, com altas taxas de participação das massas com tendência fascista e a introdução de regimes totalitários no pós-guerra, baseados na participação das massas, ainda que uma participação forçada pela intimidação e pela coerção, realçam a tendência de se relacionar a palavra "participa-ção" com o conceito de totalitarismo mais do que com o de democra-cia. O fantasma do totalitarismo também ajuda a explicar a preocu-pação com as condições necessárias à estabilidade num Estado democrático; outro fator nesse sentido era a instabilidade de tantos Estados no mundo pós-guerra, em especial as ex-colônias, que ape-nas em poucos casos mantiveram um sistema político democrático nos moldes ocidentais.

Se esse cenário provocou sérias dúvidas e reservas em relação às antigas teorias democráticas, então os fatos revelados pela expan-são da sociologia política no pós-guerra parecem ter convencido a maior parte dos teóricos atuais de que suas dúvidas estavam plena-mente justificadas. Os dados obtidos em amplas investigações empí-ricas sobre atitudes e comportamentos políticos, realizadas na maio-ria dos países ocidentais nos últimos vinte ou trinta anos, revelaram que a característica mais notável da maior parte dos cidadãos, princi-palmente os de grupos de condição sócio-econômica baixa, é uma falta de interesse generalizada em política e por atividades políticas. E mais: constatou-se que existem atitudes não-democráticas ou auto-ritárias amplamente difundidas também entre os grupos de condição sócio-econômica baixa. A conclusão esboçada (quase sempre por sociólogos políticos travestidos de teóricos de política) é a de que a visão "clássica" do homem democrático constitui uma ilusão sem fundamento e que um aumento da participação política dos atuais não-participantes poderia abalar a estabilidade do sistema democrá-tico, considerando-se a perspectiva das atitudes políticas.

Havia um outro fator a amparar o processo de rejeição das antigas teorias democráticas: o argumento, que agora se tornava fa-

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miliar, de que essas teorias eram normativas e "carregadas de valor", ao passo que a teoria política moderna seria científica e empírica, firmemente assentada nos fatos da vida política. Mas mesmo assim poder-se-ia questionar se a revisão da teoria democrática deveria ou não ter sido empreendida com tamanho entusiasmo por tantos escri-tores se esse mesmo problema do aparente contraste entre os fatos e atitudes da vida política e suas caracterizações em antigas teorias não tivesse sido abordado e respondido por Joseph Schumpeter. Seu prestigiado livro Capitalismo, socialismo e democracia (1943) de fato foi escrito antes da enorme quantidade de informação empírica agora disponível em política, mas mesmo assim Schumpeter consi-derou que os fatos mostravam a necessidade de uma revisão da teoria democrática "clássica" e forneceu tal teoria revisada. Mais do que isso: ele colocou em evidência uma definição nova e realista de de-mocracia, o que se revelou mais importante para as teorias posterio-res. Uma compreensão da essência da teoria de Schumpeter é vital para uma apreciação das obras mais atuais sobre teoria democrática, pois elas foram elaboradas dentro do parâmetro estabelecido por Schumpeter e basearam-se em sua definição de democracia.

O ponto de partida da análise de Schumpeter é um ataque à noção de teoria democrática enquanto uma teoria de meios e fins; democracia, afirma ele, é uma teoria dissociada de quaisquer ideais ou fins. "Democracia é um método político, ou seja, trata-se de um determinado tipo de arranjo institucional para se chegar a decisões políticas — legislativas e administrativas." Na medida em que se afirma uma "lealdade sem compromissos" à democracia, supunha-se que o método cumprisse outros ideais, por exemplo o de justiça.1

O procedimento adotado por Schumpeter na formulação de sua teoria democrática foi estabelecer um modelo daquilo que ele chamou de "doutrina clássica" da democracia para examinar suas deficiências e

l. Schumpeter, 1943, p. 242 (grifo de Schumpeter). Para convencer os leitores da validade de seu argumento, Schumpeter propunha um "experimento mental". Imaginem um país que, de modo democrático, perseguisse judeus, bruxas e cristãos; não aprovaríamos tal prática só porque decidiu-se por ela de acordo com o método democrático, portanto, a democracia não pode ser um fim. Contudo, como faz notar Bachrach, semelhante perseguição sistemática entraria em conflito com as regras de procedimento necessárias se quisermos chamar de "democrático" o método político do país (Bachrach, 1967, pp. 18-20). Schumpeter tampouco deixa claro por que deveríamos esperar que justamente esse método político nos levaria, por exemplo, à justiça.

depois propor uma alternativa. (Esse modelo e a crítica que Schumpeter fez a ele serão considerados depois.) Schumpeter pensava que "a maio-ria dos estudantes de política" concordaria com suas críticas e também com sua teoria revisada da democracia que "é bem mais verdadeira em relação à vida e ao mesmo tempo resgata muito do que os defensores do método democrático realmente entendiam por esse termo" (p. 269). Uma vez que a principal crítica de Schumpeter à "doutrina clássica" era que o papel central de participação e tomada de decisões por parte do povo baseava-se em fundamentos empiricamente irrealistas, em sua teoria revisada o ponto vital é a competição dos que potencialmente tomam as decisões pelo voto do povo. Por isso, Schumpeter apresentou a seguinte definição do método democrático como moderna e realista: "Aquele arranjo institucional para se chegar a decisões políticas, no qual os indivíduos adquirem o poder de decidir utilizando para isso uma luta competitiva pelo voto do povo" (p. 269). De acordo com essa definição, a competição pela liderança é a característica distintiva da democracia, permitindo que se diferencie o método democrático de outros métodos políticos. Por esse método qualquer pessoa, em princí-pio, é livre para competir pela liderança em eleições livres, de modo que as liberdades civis costumeiras são necessárias.2 Schumpeter compa-rava a competição política por votos à operação do mercado (econô-mico): à maneira dos consumidores, os eleitores colhem entre as políti-cas (produtos) oferecidas por empresários políticos rivais, e os partidos regulam a competição do mesmo modo que as associações de comércio na esfera econômica.

Schumpeter dedicou alguma atenção às condições necessárias para a operação do método democrático. Além das liberdades civis, eram requeridos tolerância para as opiniões de outros e "um certo tipo de caráter e de hábitos nacionais", e não se poderia confiar em que a operação do próprio método democrático fornecesse tais condições. Outra exigência era que "todos os interesses envolvidos" fossem vir-tualmente unânimes em sua lealdade aos "princípios estruturais da so-ciedade existente" (pp. 295-6). Contudo, Schumpeter não achava ne-cessário o sufrágio universal; ele pensava que as qualificações quanto à

2. Mesmo admitindo a liberdade em princípio, Schumpeter pensava que, na verdade, era necessária uma classe política ou dominante para fornecer candidatos à liderança (p. 291).

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propriedade, à raça ou à religião eram, todas, perfeitamente compatíveis com o método democrático.3

Na teoria de Schumpeter, os únicos meios de participação abertos ao cidadão são o voto para o líder e a discussão. Ele pontifica que as práticas usualmente aceitas (como "bombardear" representantes com cartas) são contrárias ao espírito do método democrático, pois, de fato, argumenta ele, trata-se de tentativas que os cidadãos fazem para contro-lar seus representantes, e isso constitui uma completa negação do con-ceito de liderança. O eleitorado "normalmente" não controla seus líde-res, a não ser quando os substitui por líderes alternativos nas eleições, de modo que "parece bom restringir nossas idéias sobre tal controle da maneira indicada em nossa definição" (p. 272). Na teoria de democracia de Schumpeter, a participação não tem um papel especial ou central. Tudo que se pode dizer é que um número suficiente de cidadãos parti-cipa para manter a máquina eleitoral — os arranjos institucionais — funcionando de modo satisfatório. A teoria concentra-se no número reduzido de líderes. "A massa eleitoral é incapaz de outra coisa que não seja um estouro de boiada", diz Schumpeter (p. 283), por isso seus líderes precisam ser ativos, possuir iniciativa e decisão, e a competição entre os líderes pelos votos constitui o elemento democrático caracterís-tico nesse método político.

É indubitável a importância da teoria de Schumpeter para as teorias democráticas posteriores. Sua noção de "teoria clássica", a caracterização que ele fez do "método democrático" e o papel da participação nesse método tornaram-se quase universalmente aceitos em textos recentes sobre teoria democrática. Um dos poucos pon-tos em que os teóricos atuais divergem de Schumpeter é a questão da necessidade de a democracia ter um "caráter democrático" básico, e daí saber se a existência desse caráter depende do funcionamento do método democrático. Vamos examinar quatro exemplos bem conhe-cidos sobre a teoria da democracia nos trabalhos recentes de Berel-son, Dahl, Sartori e Eckstein. A ênfase na estabilidade do sistema político é maior nessas obras do que na de Schumpeter, mas a teoria democrática comum a todas elas descende diretamente do ataque que este autor fez à teoria "clássica" da democracia.

No capítulo 14 de Votar (Voting, 1954), sob o título de "Teoria

3. (pp. 244-5) As teorias mais recentes não o seguem nesse ponto.

e prática democráticas", a orientação teórica funcionalista de Berel-son é bastante diferente da de Schumpeter, mas tem o mesmo obje-tivo.4 Ele se propõe a examinar as implicações para a teoria demo-crática "clássica" do "confronto" entre esta e a evidência empírica, fornecida em capítulos anteriores do livro. Com vistas a esse con-fronto, Berelson adota a estratégia de Schumpeter de apresentar um modelo da "teoria clássica" — ou, mais precisamente, um modelo das qualidades e atitudes que essa teoria supostamente exige dos cidadãos, tomados como indivíduos —, e este procedimento revela que "certas exigências, em geral tidas como necessárias para o bom funcionamento da democracia, não são encontradas no comporta-mento do 'cidadão médio'".5 Por exemplo, "espera-se que o cidadão democrático se interesse e participe dos assuntos políticos", contudo "em Elmira, a maioria da população vota, mas quase nunca revela um interesse constante" (1954, p. 307). Assim mesmo, apesar desta e de todas as outras deficiências na prática democrática, as democracias oci-dentais sobreviveram; portanto, deparamo-nos com um paradoxo:

Os eleitores isolados, hoje em dia, parecem incapazes de satisfazer as exigências de um sistema de governo democrático tal qual delineado pelos teóricos políticos. Mas um sistema de democracia deve ir ao encontro de certas exigências para que exista uma organização política. Os membros, tomados individualmente, podem não satisfazer a todos os padrões, mas assim mesmo o todo sobrevive e cresce (p. 312, grifos de Berelson).

De acordo com Berelson, a apresentação desse paradoxo per-mite que se veja o engano dos autores "clássicos", e que se constate o porquê de suas teorias não fornecerem um quadro preciso do fun-cionamento dos sistemas políticos democráticos existentes. Ele argu-menta que a teoria "clássica" concentra-se no cidadão isolado, igno-rando virtualmente o próprio sistema político; e, quando o leva em conta, considera as instituições específicas e não as "condições ge-rais para que as instituições funcionem como deveriam". Berelson

4. Ver também Berelson (1952). Para algumas críticas dos aspectos funcionalistas da teoria de Berelson, ver Duncan e Lukes (1963). 5. Berelson, 1954, p. 307. Assim como a maioria dos outros autores que falam da teoria

democrática "clássica", Berelson não diz em quais autores baseou seu modelo. No texto citado na nota anterior, ele observa, a propósito da série de atitudes das quais traça um esboço, que, "se todas não são exigidas em uma única teoria política da democracia, todas elas são encontradas em uma ou outra teoria" (1952, p. 314). Porém, de novo, nenhum nome é fornecido.

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arrola as seguintes condições, necessárias "para que a democracia política sobreviva": deve-se limitar a intensidade do conflito, restringir a taxa de câmbio, manter a estabilidade social e econômica, e é preciso que haja organização social pluralista, além de um consenso básico.6

Segundo Berelson, os teóricos anteriores também supunham que seria necessária uma cidadania politicamente homogênea numa democracia (homogênea quanto às atitudes e aos comportamentos). De fato o que se exige e o que se encontra é a heterogeneidade, felizmente. Tal heterogeneidade é necessária, pois espera-se que nosso sistema político desempenhe "funções contraditórias" e, assim mesmo, funcione. E funciona devido ao modo pelo qual as qualifica-ções e atitudes se distribuem entre o eleitorado; tal distribuição per-mite que as contradições se resolvam, ao mesmo tempo que se man-tém a estabilidade do sistema. Desse modo, o sistema revela-se igualmente estável e flexível, por exemplo, porque as tradições polí-ticas de grupos familiares e étnicos e a natureza duradoura das leal- dades políticas contribuem para a estabilidade, ao passo que "os elei-tores menos aptos a preencher os critérios individuais são os que mais contribuem quando medidos pelo critério coletivo da flexibili-dade... tais eleitores podem ser os que menos tomam partido e os menos interessados, mas cumprem uma função valiosa para o con-junto do sistema".7

Em suma, a participação limitada e a apatia têm uma função positiva no conjunto do sistema ao amortecer o choque das discor- dâncias, dos ajustes e das mudanças.

Berelson conclui argumentando que sua teoria não apenas é realista e descritivamente precisa, mas também inclui os valores que a teoria "clássica" conferia aos indivíduos. Ele diz que a atual distri-buição de atitudes do eleitorado "pode desempenhar as funções e

6. (1954, pp. 312-3) A conexão específica entre essas condições e a democracia não fica muito clara; as três primeiras aparentemente seriam uma exigência, de modo quase tautoló- gico, para a manutenção de qualquer sistema político. Berelson acrescenta que continuará explorando "os valores" do sistema político. O que ele faz, na verdade, é examinar as "exigências do sistema"; ver a seção que inicia na p. 313. 7. (1954, p. 316) É difícil descobrir por que Berelson chama os itens que ele cita de

"contraditórios". Sem dúvida devem ser difíceis de se obter empiricamente aos mesmo tempo, mas é possível haver (e não é ilógico esperar) estabilidade e também flexibilidade, ou existirem eleitores que expressem escolhas livres e autodeterminadas, ao mesmo tempo que fazem uso das melhores informações e orientações dos líderes (ver pp. 313-4).

incorporar os mesmos valores atribuídos por alguns teóricos a cada indivíduo, tanto no sistema quanto nas instituições políticas que o constituem"! Assim sendo, não deveríamos, pois, rejeitar o conteúdo normativo da velha teoria — que presumivelmente consiste da im-portância das atitudes que se exigem dos cidadãos isolados —, mas revisá-lo para se adequar à realidade presente.8

A teoria de Berelson fornece uma clara relação de parte dos principais argumentos de recentes obras sobre teoria democrática. Por exemplo, o argumento de que a moderna teoria de democracia deve ter uma forma descritiva e concentrar-se no sistema político vigente. Segundo esse ponto de vista, pode-se perceber que os altos níveis de participação e interesse são exigidos apenas de uma mino-ria de cidadãos e que, além disso, a apatia e o desinteresse da maioria cumprem um importante papel na manutenção da estabilidade do sistema tomado como um todo. Portanto, chega-se ao argumento de que essa participação que ocorre de fato é exatamente a participação necessária para um sistema de democracia estável.

Berelson não explicita quais as características necessárias para que um sistema político possa ser descrito como "democrático", uma vez que o máximo de participação de todos os cidadãos não é uma delas. Uma resposta a essa questão pode ser encontrada em dois estudos de Dahl, Uma introdução à teoria democrática (A Preface to Democratic Theory, 1956) e Hierarquia, democracia e negociação em política e em economia (Hierarchy, Democracy and Bargaining in Politics and Economics, 1956a), e tal resposta segue de perto a definição de Schumpeter.

Dahl não "confronta" teoria e fato do mesmo modo que Berel-son; na verdade, Dahl não parece estar muito seguro se existe ou não algo como uma "teoria clássica da democracia". No início de Uma introdução à teoria democrática, ele observa que "não há uma teoria democrática — existem apenas teorias democráticas".9 Em'um outro texto, no entanto, ele escreveu que "em alguns aspectos, pode-se demonstrar a invalidade da teoria clássica" (1965a, p. 86). Sem dú-

8. (1954, pp. 322-3) O ponto de exclamação refere-se evidentemente à passagem citada, que beira o total absurdo. 9. (1956, p. I) Todavia ele também se refere a pelo menos uma "teoria tradicional" (p. 131).

Em oposição a isso, contudo, ver Dahl (1966), onde ele diz que nunca houve uma teoria clássica da democracia.

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vida, Dahl encara as teorias que ele critica em Uma introdução à teoria democrática (a "madisoniana" e a "populista") como inade-quadas para os dias atuais; e sua teoria da democracia como poliar-quia — o governo das múltiplas minorias — é apresentada à guisa de uma substituição mais adequada para aquelas, enquanto uma teoria da democracia moderna e explicativa.

Dahl fornece uma lista das características que definem a demo-cracia, as quais, de acordo com o argumento de Schumpeter de que a democracia é um método político, constituem uma lista dos "arran-jos institucionais" centrados no processo eleitoral (1956, p. 84). As eleições funcionam como um ponto central do método democrático porque elas fornecem o mecanismo através do qual pode se dar o controle dos líderes pelos não-líderes; a "teoria democrática ocupa-se dos processos pelos quais os cidadãos comuns exercem um grau relativamente alto de controle sobre os líderes" (p. 3). Dahl, à seme-lhança de Schumpeter, enfatiza que não se poderia atribuir um peso maior à noção de "controle" do que o justificado pela realidade. Ele salienta a ênfase dada pelos textos políticos contemporâneos à idéia de que o relacionamento democrático é apenas uma das numerosas técnicas de controle social que de fato coexistem nas políticas demo-cráticas modernas, e essa diversidade deve ser levada em considera-ção numa teoria moderna da democracia (1956a, p. 83). Tampouco é o caso de se destacar uma teoria que exige o máximo de participação popular para exercer o "controle", uma vez que sabemos que a maio-ria das pessoas é desinteressada e apática em relação à política, e Dahl põe em evidência a hipótese de que uma porcentagem relativa-mente pequena de indivíduos, em qualquer forma de organização social, aproveitará as oportunidades de tomada de decisão.10 E, por-tanto, o "controle" depende do outro lado do processo eleitoral, da competição entre os líderes pelos votos da população; o fato de que o indivíduo pode transferir o seu apoio a um grupo de líderes para outro confirma que os líderes são "relativamente afetados" pelos não-líderes. E tal competição é o elemento especificamente demo-crático do método, e a vantagem de um sistema democrático (poliár- quico) comparado a outros métodos políticos reside no fato de ser possível uma ampliação do número, do tamanho e da diversidade das

10. (1956a, p. 87) Ver também 1956, pp. 81 e 138.

minorias que podem mostrar sua influência nas decisões políticas e no conjunto do caráter político da sociedade (1956, pp. 133-4).

A teoria da poliarquia também pode fornecer "uma teoria satis-fatória a respeito da igualdade política" (1956, p. 84). Mais uma vez, não se devem ignorar as realidades políticas. A igualdade polí- tica não deve ser definida como igualdade de controle político ou de poder, pois, como Dahl observa, os grupos de status sócio-econô- mico baixo, a maioria, estão separados dessa igualdade por uma "tripla barreira": sua inatividade relativamente maior; seu limitado acesso aos recursos e, nos Estados Unidos, a "simpática invenção de um sistema de verificações constitucionais de Madison" (1956, p. 81). Numa teoria da democracia moderna, a "igualdade política" refere-se à existência do sufrágio universal (um homem, um voto) com sua sanção por meio da competição eleitoral por votos e, mais importante, refere-se ao fato da igualdade de oportunidades de se ter acesso para influenciar aqueles que tomam as decisões por meio de processos intereleitorais, pelos quais diferentes grupos do eleitorado conseguem fazer com que suas reivindicações sejam ouvidas. Os representantes oficiais não apenas escutam os vários grupos, mas "esperam ser afetados de modo significativo se não apaziguarem o grupo, seus líderes ou seus membros mais vociferantes" (p. 145).

Outro aspecto particularmente interessante da teoria de Dahl é sua discussão quanto aos pré-requisitos sociais para um sistema po- liárquico. Um pré-requisito básico seria um consenso a respeito das normas, ao menos entre os líderes. (As condições institucionais ne-cessárias e suficientes para a poliarquia podem ser formuladas como normas — 1956, pp. 75-6.) Tal consenso depende de um "treina-mento social", o qual, por sua vez, depende da existência de um mínimo de acordo a respeito da escolha e das normas políticas, de modo que o aumento ou a diminuição de um dos elementos afeta os outros (p. 77). O treinamento social ocorre por meio da família, das escolas, das igrejas, dos jornais, etc., e Dahl distingue três tipos de treinamento: de reforço, neutro e negativo. Ele argumenta que "é razoável supor que esses três tipos de treinamento operam sobre os membros da maioria das organizações poliárquicas, se não todas elas, e talvez também sobre os membros de muitas organizações hierárquicas" (1956, p. 76). Dahl não diz em que consiste o treina-mento, nem fornece qualquer sugestão sobre qual provável tipo de

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treino é produzido por qual tipo de sistema de controle, mas ele afirma que sua eficácia dependerá das atuais e "mais profundas pre-disposições do indivíduo" (p. 82). É de se presumir que o treina-mento social "efetivo" seria aquele que desenvolvesse atitudes indi-viduais para apoiar as normas democráticas; por outro lado, Dahl diz que não é necessário um único "caráter democrático", como suge-rido por teóricos anteriores, porque isso não seria realista em face do "fato mais que evidente" de que os indivíduos pertencem, como membros, a vários tipos de sistemas de controle social. O que se exigem são personalidades que possam adaptar-se aos diferentes tipos de papéis nos diferentes sistemas de controle (1956a, p. 89), mas Dahl não fornece nenhuma indicação de como o treinamento para produzir esse tipos de personalidade auxilia o consenso sobre as normas democráticas.

Por fim, Dahl salienta um argumento a respeito dos possíveis perigos inerentes a um aumento da participação do homem comum. A atividade política constitui um pré-requisito da poliarquia, mas o relacionamento é algo extremamente complexo dentro dela. Os gru-pos de condição sócio-econômica baixa apresentam o menor índice de atividade política e também revelam com maior freqüência as personalidades "autoritárias". Assim sendo, na medida em que o au-mento da atividade política traz esse grupo à arena política, o con-senso a respeito das normas pode declinar, declinando por conse-guinte a poliarquia. Um aumento da taxa de participação, portanto, poderia representar um perigo para a estabilidade do sistema demo-crático (1956, cap. 3, ap. E).

O terceiro teórico da democracia cujo trabalho será discutido é um autor europeu, Sartori. Seu livro Teoria democrática (Democra- tic Theory, 1962) contém o que talvez seja a modalidade mais radical da revisão de antigas teorias de democracia. Basicamente, sua teoria revela-se uma extensão das teorias de Dahl sobre democracia en-quanto poliarquia, de forma que não será necessário repetir os deta-lhes do argumento, mas Sartori ressalta que não são apenas as mino-rias que governam e sim as elites (em competição). Um aspecto a se notar em sua teoria é a ênfase nos perigos de instabilidade e nos pontos de vista correlates a respeito da adequada relação entre a teoria democrática (o ideal) e a prática. Segundo Sartori, criou-se um abismo intransponível entre a teoria "clássica" e a realidade; "a in-

gratidão típica do homem de nossa época e sua desilusão com a democracia são reações a uma meta prometida e que não pode ser alcançada" (p. 54). Não obstante, é preciso ter cuidado para que não seja mal compreendido o exato papel da teoria democrática, mesmo depois de ela ter sido revista e reinterpretada. Uma vez que um sis-lenia democrático tenha sido estabelecido — como nos países oci-dentais da atualidade — o ideal democrático deve ser minimizado. lísse ideal é um princípio nivelador que mais agrava do que resolve o problema real nas democracias, o de "manter a verticalidade", isto é, a estrutura de autoridade e de liderança; maximizado como uma "exigência absoluta, o ideal democrático (revisado) levaria o sistema u "bancarrota" (pp. 65 e 96). Hoje, a democracia não deve ficar em guarda contra a aristocracia, como antes, mas contra a mediocridade e eontra o perigo de que tal mediocridade possa destruir seus próprios líderes, substituindo-os por contra-elites não-democráticas (p. 119).

O medo de que a participação ativa da população no processo político leve direto ao totalitarismo permeia todo o discurso de Sar-tori. O povo, diz ele, deve "reagir", ele não "age"; isto é, deve reagir às iniciativas e políticas das elites rivais (p. 77). Felizmente, é isso que o cidadão médio faz na prática, e um ponto muito interessante na teoria de Sartori é que ele faz parte dos raríssimos teóricos da demo-cracia que de fato colocam a questão: "Como podemos classificar a inatividade do cidadão médio?". Sua resposta é que não devemos classificá-la. Argumentos de que a apatia pode ser provocada pelo analfabetismo, pela pobreza ou pela insuficiência de informação foram refutados pelos fatos, assim como não foi constatada a suges-tão de que ela pode resultar da falta de prática democrática, pois "aprendemos que não se aprende a votar, votando". Sartori sustenta que a tentativa de encontrar uma resposta para essa questão é um esforço equivocado, uma vez que as pessoas só compreendem e se interessam de fato por assuntos dos quais têm experiência pessoal, ou por idéias que conseguem formular para si próprias, e nada disso é possível para o cidadão médio, em matéria de política. É preciso aceitar os fatos como eles são, porque tentar mudá-los poria em pe-rigo a manutenção do método democrático, e Sartori ainda argu-menta que a única maneira de se tentar mudá-los seria pela coação dos apáticos ou pela penalização da minoria ativa, mas nenhum dos dois métodos seria aceitável. Sartori conclui que a apatia da maioria

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"não é culpa de ninguém em particular, e que já é hora de parar de procurar bodes expiatórios" (pp. 87-90).

As teorias da democracia apresentadas até agora estavam mais preocupadas em mostrar que espécie de teoria é necessária para se considerar os fatos existentes em termos de atitudes e comportamen-tos políticos e, ao mesmo tempo, em não colocar em perigo os siste-mas democráticos vigentes ao criar expectativas irreais e potencial-mente desintegradoras. Eckstein, em seu livro Uma teoria de democracia estável (A Theory of Stable Democracy, 1966), con-centra sua atenção, como aponta o título, nas condições ou pré-requi-sitos necessários para que um sistema democrático mantenha-se es-tável no decorrer do tempo.

A definição de "democracia" utilizada por Eckstein é a do já conhecido sistema político onde as eleições decidem o resultado da competição por políticas e poder,11 mas, para esse sistema ser está-vel, a forma de governo deve assumir determinado tipo. A "estabili-dade" do sistema não se refere tanto à longevidade — que poderia acontecer por "acidente" —, mas à sobrevivência, em função de uma capacidade de ajuste à mudança, da realização de aspirações políti-cas e de fidelidades, mas isso também implica que a tomada de deci-sões políticas seja efetiva no "sentido básico da própria ação, de qualquer espécie de ação, na busca de objetivos compartilhados ou no ajuste às condições de mudança" (p. 228).

Eckstein assinala que um dos aspectos das relações sociais mais óbvios e imediatamente ligados ao comportamento político foi negligenciado pelos textos; isto é,

os padrões de autoridade nas relações sociais não-governamentais, dentro das famílias, das escolas, de organizações econômicas e simila-res... parece razoável que, se há algum aspecto da vida social que possa afetar diretamente o governo, tal aspecto consiste nas experiências com a autoridade que o ser humano tem em outras esferas da vida, em especial aquelas que moldam sua personalidade e aquelas às quais ele devota a maior parte de sua vida (p. 225).

II. Eckstein, 1966, p. 229. Eckstein não contrapõe explicitamente sua teoria em relação à teoria "clássica", no entanto pelo menos uma observação mostra que ele considera as teorias anteriores inadequadas. Ele diz que, hoje em dia, convém encarar o governo democrático de modo mais pessimista, sem tomar por base a afirmação de que os homens são democratas naturais, mas com base na combinação "calamitosamente improvável" das condições neces-sárias (pp. 285-6).

A primeira proposição de sua teoria, aplicável a qualquer método de governo, é que "um governo tenderá a ser estável se o seu padrão de autoridade for congruente com os outros padrões de autoridade da so-ciedade da qual faz parte" (p. 234). Eckstein observa que, nesse con-texto, "congruente" tem dois sentidos, aos quais vamos nos referir como o forte e o fraco. O sentido forte é o de "idêntico", equivalente na terminologia de Eckstein a "muita semelhança" (p. 234). Este não é o sentido aplicável a uma democracia porque tal situação de congruência de estruturas de autoridade não seria possível nesse sistema, ou, pelo menos, traria "as mais graves conseqüências disfuncionais". Determi-nadas estruturas de autoridade simplesmente não podem ser democrati-zadas, como, por exemplo, aquelas nas quais ocorre a socialização dos jovens (família, escola), pois, embora se "finja" que são democráticas, um fingimento excessivamente realista como esse produziria "seres hu-manos deformados e incompletos". De modo similar, pode-se "imitar" ou "simular" a democracia em organizações econômicas, mas mesmo isso, em exagero, levaria a "conseqüências que ninguém quer" e, além disso, "certamente sabemos que a organização econômica capitalista e até certos tipos de propriedade pública... militam contra a democratiza-ção das relações econômicas". Portanto, somente aquelas esferas que Eckstein assinala como as mais importantes para o comportamento po-lítico é que precisam ser necessariamente antidemocráticas (pp. 237-8). O sentido fraco de "congruência" é o de "semelhança gradual" — um sentido que torna "os requisitos dependentes mas não impossíveis de cumprir". Esse sentido não fica inteiramente claro, mas Eckstein afirma que alguns "segmentos" da sociedade estão mais próximos do governo que outros, tanto no sentido de serem "adultos" quanto no de serem "políticos". Haveria congruência no sentido fraco se (a) os padrões de autoridade aumentassem o grau de semelhança com o governo na me-dida em que estivessem mais "próximos" dele, ou (b) se existisse um alto grau de semelhança nos padrões "adjacentes ao governo" e se nos segmen-tos distantes houvessem se originado padrões funcionalmente apropriados, no sentido de uma imitação real ou ritual do padrão do governo.12

Aqui parece haver uma dificuldade teórica, pois só se pode atingir a estabilidade e evitar a "tensão" (um estado psicológico e

12. (pp. 238-40) (b) é a condição mínima para (o significado de) "congruência"; (a) considero que isto é o que Eckstein entende por "um padrão gradual numa adequada segmentação da sociedade" (p. 239).

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uma condição social semelhante ao que se entende por "anomia" quando se alcança a congruência. A tensão pode ser minimizada se existirem muitas oportunidades para que os indivíduos aprendam os padrões democráticos de atuação, em especial se as estruturas de autoridade democráticas forem aquelas mais próximas ao governo ou aquelas que envolvem as elites políticas, isto é, se a congruência no sentido fraco for atingida. Entretanto, Eckstein já havia dito que é impossível democratizar algumas das estruturas de autoridade mais próximas do governo.13 Contudo, isso realmente não é um problema para a teoria, pois o argumento de Eckstein diz que, para uma demo-cracia estável, o padrão de autoridade governamental deve se tornar congruente com a forma predominante de estrutura de autoridade na sociedade, ou seja, o padrão governamental não precisa ser "pura-mente" democrático. Ele precisa conter um "equilíbrio dos elemen-tos díspares" e revelar um "saudável elemento de autoritarismo". Eckstein também apresenta mais duas razões para existência deste último elemento: a primeira faz parte da definição de "estabilidade", a tomada de decisões efetiva só pode ocorrer se esse elemento auto-ritário estiver presente; e a segunda é psicológica, os homens sentem necessidade de líderes e de lideranças firmes (autoritários) e essa necessidade precisa ser satisfeita para que se mantenha a estabilidade do sistema (pp. 262-7).

A conclusão da teoria de Eckstein — que pode ser encarada como paradoxal, uma vez que se trata de uma teoria da democracia — é que, para um sistema democrático estável, a estrutura de autori-dade do governo nacional não precisa ser, necessariamente, pelo menos "de modo puro", democrática.

Pode se estabeler agora, em linhas gerais, uma teoria da democra-cia comum aos quatro escritores acima, e a muitos outros teóricos da democracia atuais. De agora em diante passarei a referir-me a ela como a teoria contemporânea da democracia. Essa teoria, de caráter empírico ou descritivo, concentra-se na operação do sistema político democrático

13. (pp. 254 e segs.) Como Dahl, Eckstein pouco fala a respeito do modo como se dá o "treinamento social". Uma vez que a maioria das pessoas não é politicamente muito ativa e que, portanto, não estará participando das estruturas de autoridade mais "congruentes" (aque-las "mais próximas" ao governo), essa maioria será socializada por meio de padrões não-de-mocráticos. Assim, a teoria de Eckstein apoia os argumentos daqueles que salientam os perigos inerentes à participação da maioria (não-democrática) para a estabilidade do sistema.

tomado como um todo e baseia-se nos fatos das atitudes e dos compor- tamentos políticos atuais, revelados pela investigação sociológica.

Nessa teoria, a "democracia" vincula-se a um método político ou uma série de arranjos institucionais a nível nacional. O elemento democrático característico do método é a competição entre os líderes (elite) pelos votos do povo, em eleições periódicas e livres. As elei-ções são cruciais para o método democrático, pois é principalmente através delas que a maioria pode exercer controle sobre os líderes. A reação dos líderes às reivindicações dos que não pertencem à elite é segurada em primeiro lugar pela sanção de perda do mandato nas eleições; as decisões dos líderes também podem sofrer influências de grupos ativos, que pressionam nos períodos entre as eleições. A “igualdade política", na teoria, refere-se ao sufrágio universal e à existência de igualdade de oportunidades de acesso aos canais de influência sobre os líderes. Finalmente, "participação", no que diz respeito à maioria, constitui a participação na escolha daqueles que tomam as decisões. Por conseguinte, a função da participação nessa teoria é apenas de proteção; a proteção do indivíduo contra decisões arbitrárias dos líderes eleitos e a proteção de seus interesses priva-dos. É na realização desse objetivo que reside a justificação do mé-todo democrático.

São necessárias certas condições para conservar a estabilidade do sistema. O nível de participação da maioria não deveria crescer acima do mínimo necessário a fim de manter o método democrático (máquina eleitoral) funcionando, ou seja, deveria manter-se no nível que existe atualmente nas democracias anglo-americanas. O fato de atitudes não-democráticas serem relativamente mais comuns entre os inativos significa que um aumento de participação dos apáticos enfraqueceria o consenso quanto às normas do método democrático, o que é mais uma das condições necessárias. Embora não haja exi-gência de um "caráter democrático" definido para todos cidadãos, o treinamento social ou a socialização necessários ao método demo-crático podem se dar dentro das estruturas de autoridade existentes, variadas e não-governamentais. Contanto que haja algum grau de congruência entre a estrutura de autoridade do governo e as estrutu-ras não-governamentais próximas a ele, a estabilidade pode ser man-tida. Como observou Bachrach (1967, p. 95), esse modelo de demo-cracia pode ser visto como aquele em que a maioria (não elites)

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obtém o máximo de rendimento (decisões políticas) dos líderes, com o mínimo de investimento (participação) de sua parte.

A teoria contemporânea da democracia conquistou um apoio quase universal entre os teóricos políticos atuais, mas não ficou intei-ramente a salvo das críticas, ainda que as vozes dos críticos se façam ouvir muito pouco.14 O ataque dos críticos dirige-se a dois pontos principais. Em primeiro lugar, eles argumentam que os defensores da teoria da democracia contemporânea não compreenderam a teoria "clássica"; ela não era em essência uma teoria descritiva, como eles sugeriam, mais uma teoria normativa, "um ensaio de preceitos" (Davis, 1964, p. 39). Examinarei brevemente essa questão. Em se-gundo lugar, os críticos afirmam que, na revisão da teoria "clássica", os ideais que ela contém foram substituídos por outros; "os revisio-nistas modificaram fundamentalmente o significado normativo da democracia" (Walker, 1966, p. 286).

Já foi enfatizado que a teoria contemporânea é apresentada como "livre de valores", como uma teoria descritiva. Dahl (1966), de fato, rejeitou explicitamente a acusação de que ele havia, juntamente com outros teóricos, produzido uma nova teoria normativa. Nesse aspecto, os críticos compreendem melhor a natureza da teoria con-temporânea do que o próprio Dahl. Taylor (1967) salienta que qual-quer teoria política destaca dos fenômenos considerados aqueles que precisam ser explicados e os que são relevantes para a explicação. Mais do que isso, no entanto, como mostrou Taylor, tal seleção sig-nifica que não apenas algumas dimensões são excluídas por serem irrelevantes — dimensões que podem ser cruciais para uma outra teoria —, mas que as dimensões escolhidas também sustentam uma posição normativa, uma posição implícita na própria teoria.

A teoria contemporânea da democracia não é uma mera descri-ção do modo como operam certos sistemas políticos. Ela implica que esse é o tipo de sistema que deveria ser valorizado, e inclui uma série de padrões ou critérios pelos quais um sistema político pode ser considerado "democrático". Não é difícil de constatar que para os

14. Praticamente qualquer texto recente sobre democracia fornece um exemplo da teoria contemporânea, mas pode-se ver, por exemplo Almond e Verba (1965), Lipset (1960), Mayo (1960), Morris Jones (1954), Milbrath (1965), Plamenatz (1958). Para exemplos de críticas da teoria contemporânea, ver Bachrach (1967), Bay (1965), Davis (1964), Duncan e Lukes (1963), Goldschmidt (1966), Rousseas e Farganis (1963) e Walker (1966).

teóricos considerados esses padrões são aqueles inerentes ao sistema democrático anglo-americano existente, e que com o desenvolvi-mento desse sistema já temos o Estado democrático ideal. Berelson, por exemplo, diz que o sistema político existente (americano) "não apenas funciona sob condições as mais difíceis e complexas, como o faz com distinção" (1954, p. 312). Dahl conclui o livro Uma introdu-ção à teoria democrática observando que, embora não tentasse de-terminar se o sistema descrito por ele seria desejável, ainda assim trata-se de um sistema que permite a todos os grupos ativos e legíti-mos serem ouvidos em alguma etapa do processo de tomada de deci-sões, "o que já é alguma coisa", e que é também "um sistema relati-vamente eficiente para reforçar o acordo, encorajar a moderação e manter a paz social" (1956, pp. 149-51). Obviamente, um sistema político que pode enfrentar e enfrenta questões difíceis desincum- bindo-se delas com distinção, que pode assegurar paz social e de fato assegura, é intrinsecamente desejável. Além disso, ao excluir algu-mas dimensões, a teoria contemporânea nos apresenta duas alterna-tivas: um sistema no qual os líderes são controláveis pelo eleitorado e devem prestar contas a ele, no qual o eleitorado pode escolher entre os líderes ou a elite em competição; ou um sistema no qual isso não ocorre ("totalitarismo"). A escolha, porém, é feita pela apresentação das alternativas; podemos escolher entre os líderes em competição, portanto o sistema que deveríamos ter é exatamente o que temos.

Dessa forma, os críticos estão certos quando afirmam que a teoria contemporânea não apenas tem o seu próprio conteúdo norma-tivo, mas implica que nós —pelo menos os anglo-saxões ocidentais — estamos vivendo no sistema democrático "ideal". Eles estão cer-tos também ao dizerem que o ideal foi rejeitado, na medida em que tal ideal, contido na teoria "clássica", diferiu das realidades existen-tes. Os críticos da teoria contemporânea concordam amplamente quanto à natureza desse ideal. Todos concordam que o máximo de participação por parte de todo o povo seria seu ponto central; de modo mais geral, como coloca Davis (1964), seria o ideal do "homem democrático racional, ativo e informado" (p. 29). Contudo, embora eles concordem quanto ao conteúdo desse ideal, apenas um dos críticos, Bachrach, toca de leve na questão crucial de saber se os teóricos da democracia contemporânea não estavam certos em rejei-tar aquele ideal, em função dos fatos empíricos disponíveis. Como

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assinalam Duncan e Lukes (1963, p. 160), a evidência empírica pode nos levar a modificar as teorias normativas sob certas circunstâncias, se bem que eles acrescentam que, no que concerne à modificação do ideal, "é preciso mostrar exatamente como e por que se tornou im-provável ou impossível atingi-lo. Isso não foi feito em lugar ne-nhum". Por outro lado, os críticos da teoria contemporânea também não mostraram como ou por que é possível atingir-se o ideal.15 Tal-vez Sartori esteja certo ao argumentar que é um engano procurar razões para a falta de interesse e de atividade em política por parte da maioria; talvez os teóricos da democracia contemporânea estejam certos ao salientarem a fragilidade dos sistemas políticos democráti-cos e a "improbabilidade calamitosa" de que a combinação certa de pré-requisitos para a estabilidade ocorra em apenas alguns poucos países, se tanto.

O motivo para que a natureza das críticas da teoria da democra-cia contemporânea seja inconclusiva reside no fato de que também os críticos aceitaram a formulação do problema feita por Schumpe- ter. Eles tendem a aceitar a caracterização da teoria "clássica" feita pelos escritores que eles estão criticando e, como eles, tendem a apresentar um modelo composto dessa teoria sem fornecer as fontes de onde ela derivou, ou tendem a referir-se indiscriminadamente a uma lista bem variada de teóricos.16 E, um ponto mais importante, eles não questionam a existência dessa teoria, embora discordem quanto a sua natureza. Do que nem os críticos nem os defensores se deram conta é que a noção de uma "teoria clássica da democracia" é um mito. Nenhum dos lados em disputa fez o óbvio, e o necessário: examinar em detalhes aquilo que os teóricos anteriores tinham de fato a dizer. Devido a isso, continua o mito da teoria "clássica", e o ponto de vista dos teóricos anteriores da democracia e a natureza de suas teorias são constantemente deturpados. Apenas quando o mito

15. Bachrach (1967) comenta por que deveríamos conservar o ideal, mas fornece apenas sujestões genéricas sobre como fazer para realizá-lo, e nenhuma evidência para mostrar se é ou não possível atingi-lo. 16. Duncan e Lukes são uma excessão, pois eles tomam J. S. Mill como seu exemplo de teórico "clássico". Walker, após objetar que em geral não se deixa muito claro quais os teóricos que se tem em vista, faz uma apresentação breve do que seria a teoria "clássica" baseando-se principalmente no artigo de Davis, o qual, depois de fornecer uma lista bem variada de escritores, não indica no texto de quais teóricos específicos ele tira seu material. Bachrach também refere-se de modo indiscriminado aos "teóricos clássicos".

tiver sido exposto poder-se-á enfrentar a questão de saber se a revi-são normativa da democracia é ou não justificável. É para o mito que nos voltamos agora.

A primeira coisa a fazer é definir quem são esses teóricos clás-sicos. É claro que existe uma grande variedade de nomes para esco-lher, e para fazer a escolha devemos começar pelo ponto de partida mais óbvio: a definição de democracia clássica de Schumpeter. Ele definiu o método democrático clássico como o "arranjo institucional para se chegar a decisões políticas, o qual realiza o bem comum, fazendo com que o próprio povo decida questões através da eleição de indivíduos, os quais devem reunir-se em assembléias para execu-tar a vontade desse povo" (1943, p. 250). Schumpeter refere-se à teoria "clássica" como uma teoria do "século XV111" e diz que ela se desenvolveu a partir de um protótipo em pequena escala; e também a chama de "utilitária" (pp. 248 e 267). Assim, tomando tais indica-ções como orientação, chegamos aos nomes de Rousseau, os dois Mill e Bentham, que de fato merecem o título de teóricos "clássicos" da democracia. Todavia, se a identificação da teoria de qualquer des-ses autores com a definição de Schumpeter parece duvidosa, con-cluir que a teoria de todos eles, assim como talvez a de outros auto-res, poderia se mesclar de alguma forma para divulgar a definição de Schumpeter seria mais curioso ainda. Schumpeter argumenta que, para que o método político "clássico" funcione, "cada um teria que saber, de modo absoluto, o que ele quer dizer... uma conclusão clara e imediata quanto às questões particulares teria que ser dedu-zida de acordo com as regras da inferência lógica... o cidadão exem-plar teria que realizar tudo isso por si próprio, independentemente dos grupos de pressão e propaganda" (pp. 253-4). Ele faz duas críti-cas principais à teoria "clássica" que são de particular relevância aqui. Em primeiro lugar, tal teoria é irrealista e exige do homem comum um nível de racionalidade simplesmente impossível. Schum-peter, antecipando Sartori, diz que apenas coisas experimentadas pelo homem comum, em seu cotidiano, são "reais" no sentido com-pleto da palavra, e a política em geral não pertence a essa categoria. Normalmente, quando o homem comum se depara com assuntos políticos, "perde completamente... a noção da realidade", e se des-loca para um nível mais baixo de desempenho mental assim que ingressa no campo da política". Em segundo lugar, Schumpeter ar-

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gumenta que a teoria "clássica" virtualmente ignora o conceito de liderança (pp. 258-61 e 270). Se a caracterização que esse autor faz da teoria "clássica", e o que ela exigiria do cidadão comum, estiver correta, então, sem dúvida, haveria uma boa dose de validade em suas críticas. Schumpeter, porém, não apenas faz uma falsa repre-sentação daquilo que os assim chamados teóricos clássicos tinham a dizer, como também não se dá conta que podem se encontrar duas teorias bem diferentes sobre democracia nos textos deles. Para sus-tentar tal discussão é preciso que se examine a obra dos quatro teóri-cos "clássicos". Por enquanto, apenas Bentham e James Mill serão brevemente abordados. As teorias de Rousseau e de J. S. Mill serão examinadas em detalhe no próximo capítulo.

Bentham e James Mill fornecem exemplos de autores de cujas teorias poder-se-ia extrair algo que se assemelhasse à defini-ção da teoria "clássica" de Schumpeter. Bentham, em seus últimos escritos, nos quais defendia o sufrágio universal, o voto secreto e parlamentos anuais, esperava que o eleitorado exercesse um certo grau de controle sobre os seus representantes. Ele desejava que tais representantes fossem chamados "deputados"; com esta palavra, dizia, "indica-se o óbvio, sendo essa a palavra apropriada",17 e as funções "locativa" e "alocativa" seriam as mais importantes para o eleitorado desempenhar. Na maior parte das questões, isso implica que o eleitorado tem uma opinião quanto às políticas que são de seu interesse e de interesse universal, e, portanto, uma opinião a respeito de quais políticas devem receber a aprovação de seus delegados. Para Bentham e Mill, o "povo" significava as "classes numerosas", o único grupo capaz de funcionar como um obstáculo à realização de interesses "sinistros" por parte do governo. Uma vez que o interesse do cidadão reside na segurança contra um mau governo, diz Bent-ham, esse cidadão tomará atitudes de acordo com isso e "quanto à gratificação de qualquer desejo sinistro à custa do interesse univer-sal, ele não pode esperar a cooperação e o apoio de um grande nú-mero de concidadãos".18 James Mill dizia que as simpatias do povo estão com alguns, mas "não com aquelas parcelas externas cujos interesses estão em competição com os deles".19

Em vista disso, talvez se possa inferir que os dois teóricos es-peravam que os eleitores tomassem cada decisão sem a influência da "propaganda", e que formassem suas opiniões pela lógica, como diz Schumpeter, mas nenhum dos dois autores tinha a expectativa de que ns opiniões se formassem no vácuo. De fato, Bentham dá bastante c n fase à opinião pública e à necessidade que o indivíduo tem de levá-la em consideração. Assinala uma vantagem que um eleitor tem numa democracia, qual seja: "ele não pode se relacionar com nin-guém sem travar contato com os que... estão prontos a comunicar a ele o que sabem, viram, ouviram ou pensaram. Os registros anuais... a descrição de todos os funcionários públicos... têm um lugar em sua mesa juntamente com o seu pão diário".20 Mill ressaltava a importância de se educar p eleitorado para um voto socialmente responsável e pensava que o principal aspecto dessa educação residia no fato de que as classes trabalhadoras, ao formarem suas opiniões, tomavam a "sábia e virtuosa" classe média como seu grupo de referência e, por isso, votariam de modo responsável. Tanto Mill quanto Bentham não viam o eleitorado da forma que Schumpeter lhes imputava.21 E o mais importante: a preocupação principal deles era mais com a es-colha de bons representantes (líderes), do que com a formulação das opiniões do eleitorado, enquanto tais. Bentham esperava que os cida-dãos menos capacitados para avaliar as qualidades morais e intec- tuais de um futuro representante pediriam o conselho dos competen-tes, e que o próprio representante, quando houvesse oportunidade, influenciaria seus eleitores com seu discurso; ele está lá para promo-ver o interesse universal. O eleitorado poderia escolher o melhor representante sem a necessidade de possuir os princípios "lógicos" sugeridos por Schumpeter. O fato de que Bentham e Mill tivessem a expectativa de que todo cidadão se interessasse por política, porque isto seria de seu mais alto interesse (e pensavam que ele pode ser educado para isso), não é incompatível com algum tipo de "influên-cia" sofrida, nem implica que cada cidadão tome uma decisão dis-creta a respeito de cada item de política, com base na evidência

17. Bentham, 1843, vol. IX, livro II, cap. V, §1, p. 155. 18. Idem, ibidem, vol. IX, livro I, cap. XV, §IV, p. 100. 19. Apud Hamburger, 1965, p. 54

20. Bentham, 1843, vol. IX, livro I, cap. XV, §V, p. 102. A respeito da importância da opinião pública na teoria de Bentham, cf. Wolin, 1961, p. 346. 21. Wolin, 1961, p. 332, enfatiza o papel das paixões assim como da razão nas teorias militaristas.

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lógica mais completa, em total isolamento de todas as suas outras decisões e das opiniões de outros.

Contudo, como já se notou, existe uma similaridade entre as teorias de James Mill e de Bentham e o que Schumpeter chama de "teoria clássica", por uma razão bem significativa. Assim como este último, Mill e Bentham ocupam-se quase exclusivamente com os "arranjos institucionais" nacionais do sistema político. A participa-ção do povo tem uma função muito reduzida, assegura que o bom governo, isto é, "o governo voltado para o interesse universal", se realize por meio da sanção da perda do mandato. Para Bentham e Mill, portanto, a participação tinha uma função apenas protetora; assegurava proteção aos interesses privados de cada cidadão (sendo o interesse universal uma mera soma dos interesses individuais). Suas teorias podem ser classificadas como "democráticas" porque eles pensavam que as "classes numerosas" somente eram capazes de defender o interesse universal e, em conseqüência, advogavam a par-ticipação (voto e discussão) de todo o povo.22 Outros teóricos, no entanto, sustentaram que a participação é necessária devido à sua função protetora, sem com isso afirmar que todo o povo deve parti-cipar. Não há nada de especificamente democrático numa tal visão da função da participação. Ela desempenha, por exemplo, um papel similar na teoria de Locke — que estava longe de ser um democrata (mesmo que Milbrath o tenha considerado um dos inequívocos "de-mocratas clássicos".23

Como vimos, os formuladores da teoria da democracia contem-porânea também encaram a participação exclusivamente como um dispositivo de proteção. Segundo eles, a natureza "democrática" do sistema reside em grande parte na forma dos "arranjos institucio-nais" nacionais, especificamente na competição dos líderes (repre-sentantes potenciais) pelos votos, de modo que os teóricos que sus-tentam tal visão do papel da participação são, antes de mais nada, teóricos do governo representativo. Sem dúvida, este é um aspecto

22. Hamburger (1962) oferece argumentos convincentes de que Mill não era favorável à restrição do sufrágio às classes médias, como se diz freqüentemente. 23. Milbrath, 1965, p. 143. Examinando a descrição que Milbrath faz da teoria de Locke, ele parece tê-lo confundido com Rousseau! Sobre esse aspecto da teoria política de Locke, ver Seliger (1968), caps. 10 e 11. Hegel também dá uma justificativa filosófica da participação em sua teoria política, e Burke admite que ela é necessária para o bom governo, mas nenhum desses autores inclui toda a população no eleitorado.

importante da teoria democrática; seria absurdo tentar negá-lo, ou questionar a contribuição de Bentham — ou de Locke — à teoria e à prática da democracia atual. Contudo, deve-se notar que a teoria do governo representativo não representa toda teoria democrática, como sugerem muitas obras recentes. A verdadeira importância da influência de Schumpeter é que ela dissimulou o fato de que nem todos os autores que gostariam de ser chamados de teóricos "clássi-cos" da democracia adotaram o mesmo ponto de vista a propósito do papel da participação. Nas teorias de J. S. Mill e Rousseau, por exemplo, a participação revela funções bem mais abrangentes e é fundamental para o estabelecimento e manutenção do Estado demo-crático, Estado esse considerado não apenas como um conjunto de instituições representativas nacionais, mas como aquilo que denomi-nei de sociedade participativa (o significado desse atributo tornar-se-á claro no próximo capítulo). Por isso, farei referências a teóricos, a exemplo de Rousseau, como teóricos da democracia participativa.

Devido a existência dessa diferença, não faz sentido falar de uma teoria "clássica" da democracia. Mesmo porque tais diferenças reforçam o mito clássico de que os críticos da teoria contemporânea da democracia nunca explicaram com exatidão qual o papel da parti-cipação nas teorias anteriores, ou porque lhe era atribuído um valor tão alto em algumas teorias. Isso só pode ser feito por um exame detalhado das teorias em questão. Davis (1964) dizia que a teoria "clássica" (ou seja, a teoria da democracia participativa) tinha um propósito ambicioso, "a educação de todo um povo até o ponto em que suas capacidades intelectuais, emocionais e morais tivessem atingido o auge de suas potencialidades e ele tivesse se agrupado, ativa e livremente, numa comunidade genuína", e que a estratégia para alcançar este objetivo seria por meio do uso da "atividade polí-tica e do governo com vistas à educação pública". Entretanto, mais adiante ele afirma que o "negócio pendente" da teoria democrática é "a elaboração de planos de ação e prescrições específicas que pro-porcionem uma esperança de progresso, no sentido de um Estado genuinamente democrático" (pp. 40-1). É justamente isso que se pode ver nas teorias do que se escrevem sobre a democracia partici-pativa: uma série de prescrições específicas e planos de ação neces-sários para se atingir a democracia política. E isto se efetua por meio da "educação pública", a qual, no entanto, depende da participação

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em muitas esferas da sociedade na "atividade política", entendida num sentido bastante abrangente.24

Até que a teoria da democracia participativa tenha sido exami-nada em detalhes e forem estabelecidas as possibilidades de sua rea-lização empírica, não podemos saber a dimensão nem que tipo de "negócio pendente" restou para a teoria democrática. O primeiro passo para essa tarefa é considerar a obra de três teóricos da demo-cracia participativa. Rousseau e John Stuart Mill são os dois primei-ros exemplos de teóricos "clássicos" da democracia, cujas teorias nos fornecem os postulados básicos de uma teoria da democracia participativa. O terceiro é G. D. H. Cole, um teórico político do século XX, que esboçou em seus primeiros escritos um plano deta-lhado de uma sociedade participativa na forma de um socialismo de guildas (Guild Socialism). Entretanto, esse plano é, em si, de impor-tância menor; a obra de Cole tem significado porque ele desenvolveu uma teoria da democracia participativa que não apenas incluía e am-pliava os postulados básicos, mas inseria-se no contexto de uma so-ciedade moderna, de grande escala e industrializada.

II

ROUSSEAU, JOHN STUART MILL E G. D. H. COLE: UMA TEORIA PARTICIPATIVA DA

DEMOCRACIA

Rousseau pode ser considerado o teórico por excelência da par- ticipação. A compreensão da natureza do sistema político que ele descreve em O contrato social é vital para a teoria da democracia participativa. Toda a teoria política de Rousseau apóia-se na partici-pação individual de cada cidadão no processo político de tomada de decisões, e, em sua teoria, a participação é bem mais do que um complemento protetor de uma série de arranjos institucionais: ela lambem provoca um efeito psicológico sobre os que participam, as-segurando uma inter-relação contínua entre o funcionamento das instituições e as qualidades e atitudes psicológicas dos indivíduos que interagem dentro delas. É a ênfase nesse aspecto da participação e sua posição no centro de suas teorias que constituem a contribuição distintiva dos teóricos da democracia participativa para a teoria de-mocrática como um todo. Embora Rousseau tenha escrito antes do desenvolvimento das instituições modernas da democracia, e mesmo que sua sociedade ideal seja uma cidade-Estado não industrial, é em sua teoria que se podem encontrar as hipóteses básicas a respeito da função da participação de um Estado democrático.1

A fim de entender o papel da participação na teoria política de Rousseau, é essencial que se compreenda bem a natureza de seu

24. Bachrach (1967, cap. 7) coloca-se a favor de uma ampla interpretação do termo "polí-tico", mas não se dá conta de que isso se relaciona aos argumentos dos teóricos anteriores. Assim, ele comete uma incorreção ao observar que, "ao salientar a importância da ampla participação na tomada de decisões políticas, [a teoria 'clássica'] não apresenta linhas de conduta realistas para o cumprimento de suas prescrições nas grandes sociedades urbanas" (p. 99).

l. O sistema político descrito em O contrato social não é uma democracia segundo o uso que Rousseau faz do termo. Para ele, "democracia" seria um sistema onde os cidadãos são executores de leis que eles mesmos fizeram, e, por esse motivo, seria um sistema próprio apenas para os deuses (livro III, cap. 4). Deve-se notar neste ponto que pelo fato de o sistema de Rousseau ser direto, e não representativo, não se ajusta à definição de teoria democrática "clássica" de Schumpeter.

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sistema político participativo ideal, uma vez que tal sistema foi ob-jeto de interpretações muito divergentes. Em primeiro lugar, Rous-seau afirmava que certas condições econômicas eram necessárias para um sistema participativo. Como é sabido, Rousseau defendia uma sociedade formada por pequenos proprietários camponeses, ou seja, defendia uma sociedade onde houvesse igualdade e inde-pendência econômica. Sua teoria não exige igualdade absoluta, como muitas vezes se afirma, mas destaca que as diferenças existen-tes não deveriam conduzir à desigualdade política. Em termos ideais, deveria existir uma situação em que "nenhum cidadão fosse rico o bastante para comprar o outro e em que nenhum fosse tão pobre que tivesse que se vender", e a exigência vital seria a de que todo homem possuísse alguma propriedade — o mais sagrado dos direitos do cidadão —, pois a segurança e a independência que ela confere ao indivíduo constituem a base necessária sobre a qual repousam sua igualdade e sua independência políticas.

Se existissem tais condições, os cidadãos poderiam agrupar-se enquanto indivíduos iguais e independentes, mas Rousseau também queria que a relação entre eles fosse de interdependência, algo neces-sário para se preservar a igualdade e a independência. Este argu-mento não é tão paradoxal quanto parece, porque a situação partici-pativa é tal que cada cidadão seria impotente para realizar qualquer coisa sem a cooperação de todos os outros, ou da maioria. Cada cidadão estaria, como coloca Rousseau, "em uma excessiva depen-dência da polis" (livro II, cap. 12, p. 69 da edição brasileira citada), ou seja, haveria uma dependência igual por parte de cada indivíduo em relação a todos os outros, vistos coletivamente como o soberano, e a participação independente constitui o mecanismo pelo qual essa interação é reforçada. O seu modo de funcionamento é ao mesmo te mpo simples e sutil. Pode-se ler O contrato social como uma elabo-ração da idéia de que as leis, e não os homens, devem governar, mas uma formulação ainda melhor do papel da participação é a de que os homens devem ser governados pela lógica da operação da

2. Rousseau, 1968, livro II, cap. II, p. 96, e 1913, p. 254. [A citação não corresponde; não foi possível localizar a passagem precisa, seja no Contrato social, seja em outras obras de Rousseau. Para a tradução dos trechos citados de Rousseau utilizou-se a existente da Editora Abril, "Os Pensadores", trad. de Lourival Gomes Machado, São Paulo, Abril Cultural, 1983. Em alguns casos optou-se por uma versão própria a partir do original em francês. (N.T.)]

situação política que eles mesmos criaram, e que essa situação cons-titui-se de tal forma que impossibilita "automaticamente" a existên-cia de governantes individuais. Isso acontece porque os cidadãos são iguais mas independentes, ou seja, não dependem de ninguém para votar ou opinar, de modo que na assembléia política nenhum cidadão precisa votar a favor de qualquer política que não seja de seu inte-resse ou do interesse dos outros. O indivíduo X não vai conseguir persuadir os outros a votarem em sua proposta que favorece apenas o próprio X. Em uma passagem significativa do Contrato social, Rousseau pergunta: "Por que é sempre certa a vontade geral e por que desejam todos constantemente a felicidade de cada um, senão por não haver ninguém que não se aproprie da expressão cada um e não pense em si mesmo ao votar por todos?".3 Em outros termos, a única política a ser aceita por todos é aquela em que os benefícios e encargos são igualmente compartilhados; o processo de participação assegura que a igualdade política seja efetivada nas assembléias em que as decisões são tomadas. O principal resultado político é que a vontade geral é, tautologicamente, sempre justa, (ou seja, afeta a todos de modo igual), de forma que os direitos e interesses indivi-duais são protegidos, ao mesmo tempo que se cumpre o interesse público. A lei "emergiu" do processo participatório, e é a lei, e não os homens, que governa as ações individuais.4

Rousseau considerava que a situação ideal para a tomada de decisões seria a que não contasse com a presença de grupos organi-zados, apenas indivíduos, pois os primeiros poderiam querer que prevalecessem suas "vontades particulares". A observação de Rous-seau a respeito de grupos resulta de modo direto daquilo que ele afirma acerca da operação do processo participatório. Reconhecia

3. Rosseau, 1968, livro II, cap. 4, p. 75 (p. 49, ed. bras.). Ver também à página 76 (p. 50, ed. bras.), "nessa instituição (a vontade geral) cada um necessariamente se submete às condições que impõe aos outros". 4. A propósito da definição "clássica" de Schumpeter, é um tanto errôneo dizer que os

cidadãos de Rousseau decidem "questões". O que eles fazem ao participar é fornecer a resposta adequada a um problema (ou seja, a vontade geral). Não haverá necessariamente uma resposta correta a uma "questão" do modo como entendemos o termo nas condições políticas atuais. Tampouco seria requerida uma habilidade de fazer "inferências lógicas". Bem ao contrário, o ponto central da situação participativa consiste em que cada indivíduo independente, mas interdependente, é "forçado" a admitir que existe apenas uma resposta correta para aplicar a palavra "cada" a si mesmo.

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ele que as "associações tácitas" ocorreriam inevitavelmente, isto é, que indivíduos não organizados estariam unidos por alguns interes-ses comuns, mas que seria muito difícil que tais associações tácitas obtivessem apoio para políticas que as favorecessem especialmente, devido à própria forma como se dá a participação (1913, p. 237). Caso fosse impossível evitar as associações organizadas dentro das comu-nidades, então, diz Rousseau, elas deveriam ser tão numerosas e de poder político tão igual quanto possível. Ou seja, a situação partici-pativa dos indivíduos se reproduziria com os grupos, e ninguém po-deria vencer à custa dos outros. Rousseau não diz nada, como se poderia esperar, a respeito da estrutura interna de autoridade de tais grupos, mas sua análise básica do processo participativo pode ser aplicada a qualquer grupo ou associação.

A análise da operação do sistema participativo de Rousseau esclarece dois pontos: em primeiro lugar, que, para Rousseau, a "par-ticipação" acontece na tomada de decisões; em segundo lugar, que ela constitui, como nas teorias do governo representativo, um modo de proteger os interesses privados e de assegurar um bom governo. Porém, a participação é também muito mais do que isso na teoria de Rousseau. Plamenatz (1963) disse que Rousseau "nos vira a cabeça... e nos faz considerar como a ordem social afeta a estrutura da perso-nalidade humana" (v. I, p. 440), e que a principal preocupação do autor era com o impacto psicológico das instituições sociais e políti-cas: que aspectos do caráter humano fazem com que se desenvolvam instituições específicas? Aqui, a principal variável é saber se a insti-tuição é ou não participativa, pois a função central da participaçãona teoria de Rousseau é educativa, considerando-se o termo "educação" em seu sentido mais amplo. O sistema ideal de Rousseau é conce-bido para desenvolver uma ação responsável, individual, social e política como resultado do processo participativo. Durante esse pro-cesso o indivíduo aprende que a palavra "cada" aplica-se a ele mesmo; o que vale dizer que ele tem que levar em consideração assuntos bem mais abrangentes do que os seus próprios e imediatos interesses privados, caso queira a cooperação dos outros; e ele aprende que o interesse público e o privado encontram-se ligados. A lógica de operação do sistema participativo é tal que o indivíduo

5. Rousseau, 1968, livro II, cap. 3, p. 73 (pp. 47-8, ed. bras.). Ver também Barry, 1964.

vê-se "forçado" a deliberar de acordo com o seu senso de justiça, de acordo com o que Rousseau chama de "vontade constante", pois seus concidadãos podem sempre resistir à implementação de deman- das não-eqüitativas. Como resultado de sua participação na tomada de decisões, o indivíduo é ensinado a distinguir entre seus próprios im-pulsos e desejos, aprendendo a ser tanto um cidadão público quanto privado.6 Rousseau também acredita que, por meio desse processo de aprendizagem, o indivíduo acaba por não sentir quase nenhum conflito entre as exigências das esferas pública e privada. Uma vez estabelecido o sistema participativo (e este é um ponto da maior importância), ele se torna auto-sustentável porque as qualidades exi-gidas de cada cidadão para que o sistema seja bem-sucedido são aquelas que o próprio processo de participação desenvolve e estimula; quanto mais o cidadão participa, mais ele se torna capacitado para fazê-lo. Os resultados humanos obtidos no processo de participação fornecem uma importante justificativa para um sistema participativo.

Outro aspecto do papel da participação na teoria de Rousseau é a estreita ligação entre participação e controle, e isto se vincula à noção de liberdade do autor. Aqui, não precisamos fazer uma discus-são completa a respeito do uso que Rousseau faz deste último con-ceito, basta dizer que ele está vinculado de maneira indelével ao processo de participação. Talvez as palavras mais famosas ou conhe-cidas de Rousseau refiram-se ao fato de que um homem pode ser "forçado a ser livre"; ele também definiu liberdade como "a obediên-cia à lei que alguém prescreve a si mesmo".7 As interpretações mais fantasiosas e sinistras a respeito da primeira frase não teriam sido possíveis se o conceito de liberdade de Rousseau tivesse sido colo-cado, de uma vez por todas, no contexto da participação, pois o modo

6. A criação de situações que "forcem" o indivíduo a aprender sozinho é a base da teoria da educação de Rousseau; ver as observações a respeito de Émile e de Nouvelle Héloïse em Shklar, 1964. Os outros métodos de ensinar a cidadania defendidos por Rousseau (por exemplo, as cerimônias públicas) parecem derivar de seu pessimismo e não constituem parte necessária da teoria. No máximo operam no mesmo sentido da participação, mas não a substituem. A instituição do legislador pode ser vista como uma resposta ao problema de qual seria o primeiro passo a ser dado numa situação participativa; já a natureza de auto-sustenta- ção do sistema político participativo, segundo os próprios argumentos de Rousseau, constitui ria uma excessão ao seu ponto de vista de que todos os governos tendem, no fim, a "degenerar". 7. Rousseau, 1968, op. cit., livro I, cap. 7, p. 64 (p. 368, ed. bras.) e livro I, cap. 8, p. 65 (p.

37, ed. bras.).

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pelo qual um indivíduo pode ser "forçado" a ser livre é parte consti-tuinte do mesmo processo pelo qual ele é "forçosamente" educado através da participação na tomada de decisões. Rousseau argumenta que, a menos que cada indivíduo seja "forçado" a agir de modo socialmente responsável através do processo participatório, não po-derá haver nenhuma lei que assegure a liberdade de todos, ou seja, não poderá existir nenhuma vontade geral ou qualquer tipo de lei justa que o indivíduo possa prescrever a si mesmo. Embora o ele-mento subjetivo no conceito de liberdade de Rousseau — o de que sob uma lei como essa o indivíduo vai se sentir sem restrições, vai se sentir livre — tenha sido bastante comentado, geralmente se esquece que aí também existe um elemento objetivo envolvido (o que não quer dizer que se aceite a definição de liberdade de Rousseau en-quanto obediência). Tanto a sensação de liberdade do indiví-duo quanto sua liberdade efetiva aumentam por sua participação na tomada de decisões, porque tal participação dá a ele um grau bem real de controle sobre o curso de sua vida e sobre a estrutura do meio em que vive. Caso seja necessário um sistema indireto, argumenta também Rousseau, a liberdade exigiria que o indivíduo exercesse uma boa dose de controle sobre os que executam as leis e sobre os representantes.8 Na introdução a sua recente tradução do Contrato social, Cranston critica Rousseau por nunca encarar, nessa obra, as instituições como uma ameaça à liberdade (Rousseau, 1968, p. 41). Tal crítica é um contra-senso. As instituições participativas do Con-trato social não podem ser uma ameaça à liberdade exatamente pela lógica de sua operação, pela inter-relação entre a estrutura de autori-dade das instituições e as orientações psicológicas dos indivíduos. Toda a argumentação de Rousseau diz que as instituições não-participativas (existentes) suscitam essa ameaça; na verdade, elas tornam a liberdade impossível — em toda a parte os homens estão "a ferros". As institui-ções ideais descritas no Contrato social são ideais porque Rousseau considera que seu funcionamento garante a liberdade.

Para Rousseau, a participação pode aumentar o valor da liber-dade para o indivíduo, capacitando-o a ser (e permanecer) seu pró-prio senhor. Como o restante da teoria de Rousseau, o conceito de "ser seu próprio senhor" foi bastante criticado, embora Craston faça

8. Ver Rousseau, 1968, livro III, cap. 18, p. 148, e 1953, pp. 192 segs.

uma observação nova, quando se refere a ele como o ideal de um lacaio e, talvez por isso, não merecesse uma consideração mais séria no entanto, trata-se de um desvirtuamento muito grande da idéia. Na oitava Carta da montanha, Rosseau diz que a liberdade consiste "moins à faire sa volonté qu'a n'être pas soumis à celle d'autrui; elle consiste encore à ne pas soumetre la volonté d'autrui à la nôtre. Quiconque est maître ne peaut être libre"(1965, vol. II, p. 234).* Ou seja, ninguém precisa ser senhor de ninguém; contudo, quando al- guém é dono de si mesmo e da própria vida, a liberdade é então salientada pelo controle sobre essa vida, exigida antes que se possa descrever o indivíduo como seu "próprio senhor". Em segundo lugar, o processo participatório assegura que, ainda que nenhum homem ou grupo seja senhor de um outro, todos são igualmente dependentes entre si e igualmente sujeitos à lei. O domínio (impes-soal) da lei, que se torna possível através da participação, e sua cone-xão com o fato de "ser próprio senhor" nos fornecem mais um indí-cio no que concerne à razão pela qual Rousseau pensa que os indivíduos irão aceitar conscientemente uma lei resultante de um processo participatório de tomada de decisões. Em termos mais ge-rais, torna-se possível agora visualizar uma segunda função da parti-cipação na teoria de Rousseau: ela permite que as decisões coletivas sejam aceitas mais facilmente pelo indivíduo.

Rousseau sugere ainda que a participação possui uma terceira função, a de integração — ela fornece a sensação de que cada cida-dão isolado "pertence" à sua comunidade. Em certo sentido, a inte-gração deriva de todos os fatores até agora mencionados. Por exemplo,

9. Rousseau, 1968, p. 42. A crítica mais comum à idéia de liberdade de Rousseau é que ela seria potencialmente "totalitária", ou pelo menos antilibertária, e que ela tem pouco a ver com a noção de liberdade "negativa", a qual, por sua vez, é vista com freqüência como a única forma de liberdade compatível com a democracia. Está implícita na presente discussão a rejeição da idéia de que existam duas concepções diferentes de liberdade e de que Rousseau é um defensor inequívoco da noção "positiva". Também rejeita o ponto de vista segundo o qual, ao falar de ser seu próprio senhor, Rousseau estaria se referindo apenas ao domínio do indivíduo sobre sua própria "natureza inferior". Este elemento está presente em Rousseau, mas sugerir que o conjunto de sua teoria consiste nisso é exatamente equivocado. Semelhante interpretação só se torna possível quando se ignora todo o contexto participatório da discussão de Rousseau sobre a liberdade. A respeito da interpretação criticada, ver especialmente Berlin, 1958; ver também Talmon, 1952. * "Menos em fazer a sua vontade do que em não estar submetido à de outro; ela consiste ainda em não submeter a vontade de outro à nossa. Quem quer que seja senhor não pode ser livre." (N.T.)

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a igualdade econômica básica significa que não existe uma divisão abrupta entre o rico e o pobre, não existem homens como aquele mencionado, com desaprovação, por Rousseau em Émile, que, per-guntado a que país pertencia, respondeu: "Pertenço ao país dos ricos" (1911, p. 313). Mais importante é a experiência da participa-ção na própria tomada de decisões, e a complexa totalidade de resul-tados a que parece conduzir, tanto para o indivíduo quanto para o sistema político como um todo; tal experiência integra o indivíduo a sua sociedade e constitui o instrumental para transformá-la numa verdadeira comunidade.

O exame que fizemos da teoria política de Rousseau nos pro-veu do argumento de que há uma intef-relação entre as estruturas de autoridade das instituições e as qualidades e atitudes psicológicas dos indivíduos; e do argumento relacionado a este, de que a principal função da participação tem caráter educativo. Tais argumentos for-mam a base da teoria da democracia participativa, que se tornará clara a partir da discussão das teorias de J. S. Mill e Cole. As teorias desses dois autores reforçam os argumentos de Rousseau quanto à par-ticipação, porém, de maneira mais interessante, a teoria da democracia participativa é retirada do contexto de uma cidade-Estado de proprietá-rios camponeses e colocada no de um sistema político moderno.

John Stuart Mill, em sua teoria social e política, assim como em outros assuntos, partiu de uma adesão fervorosa às doutrinas de seu pai e de Bentham, criticando-as severamente mais tarde, de tal modo que ele forneceu um excelente exemplo das diferenças entre as teo-rias do governo representativo e das democracias participativas. To-davia, Mill jamais rejeitou completamente esses primeiros ensina-mentos e, no final da vida, sua teoria política compunha-se de uma mescla das diversas influências que o haviam afetado. Ele nunca conseguiu sintetizá-las de uma maneira satisfatória — o que talvez seja uma tarefa impossível — e isso significa que existe uma pro-funda ambigüidade entre os fundamentos participativos de sua teoria e algumas de suas propostas mais práticas para o estabelecimento de seu "Estado idealmente melhor".

Ressonâncias da visão utilitária da função meramente protetora da participação podem ser encontradas na teoria política da maturi-dade de Mill. Diz ele, por exemplo, em Governo representativo (Representative Government) — o qual expressava os princípios

“nos quais estive trabalhando durante a maior parte da minha vida" —, que um dos maiores perigos para a democracia reside no "sinistro interesse dos que detêm o poder: trata-se do perigo de uma legislação classista... E uma das mais importantes questões a exigir considera-ção... é de que maneira fornecer garantias eficazes contra esse mal".10 Para Mill, no entanto, a noção de "bom governo" de Bentham resolve apenas parte do problema. Mill distinguia dois aspectos de um bom governo. O primeiro, "até que ponto ele promove a boa administração dos assuntos da sociedade por meio das faculdades morais, intelectuais e ativas que existem em seus vários membros", e esse critério para um bom governo relaciona-se ao governo visto como "uma série de arranjos organizados para o negócio público" (1910, pp. 208 e 195). Mill criticava Bentham por construir sua teoria política sobre a suposição de que tal aspecto constituísse a totalidade. No ensaio sobre Bentham, ele escreveu que tudo o que este poderia fazer seria

apenas indicar os meios pelos quais, em qualquer Estado de espírito nacional, os interesses materiais da sociedade podem ser protegidos;... (sua teoria) pode ensinar os meios de organizar e regular parte mera-mente"empresarial dos arranjos sociais... Ele cometeu o equívoco de supor que a parte empresarial dos assuntos humanos constituía a sua totalidade (grifos de Mill) (1963, p. 102).

Na avaliação de J. S. Mill, o aspecto meramente empresarial do governo é o menos importante; o fundamental é o governo em seu outro aspecto, qual seja, o de "uma grande influência atuando sobre a mente humana", e o critério a ser usado para julgar as instituições políticas sob essa perspectiva é "o grau em que elas promovem o avanço mental geral da comunidade, entendendo-se por isto o avanço em intelecto, em virtude e em atividade prática e eficiência" (1910, p. 195). Quanto a isso, a teoria de Bentham não tem nada a dizer. Mill encara o governo e as instituições políticas, em primeiro lugar e acima de tudo, como educativos no sentido mais amplo do termo. Para ele, os dois aspectos do governo estão inter-relaciona- dos, de forma que a condição necessária para o bom governo no sentido empresarial é a promoção do tipo correto de caráter indivi-

10. Mill, 1910, prefácio e p. 254. Para uma discussão desse "trabalhando", cf. Burns, 1957.

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dual, e, para tanto, são necessários os tipos corretos de instituições (1963, p. 102). Principalmente por essa razão, não porque uma tal forma de governo seria de interesse universal, é que Mill considera o governo popular e democrático "idealmente o melhor Estado". Assim, ele se posiciona contra um despotismo benevolente, o qual, se fosse capaz de ver tudo, poderia assegurar que o lado "empresa-rial" do governo estivesse sendo bem conduzido, pois, pergunta Mill, "que espécie de seres humanos pode ser formada sob tal regime? Que desenvolvimento seria conseguido, tanto por sua capacidade de pensar quanto por suas atividades, sob esse regime?... Suas capacida-des morais estão igualmente atrofiadas. Onde quer que a esfera de ação dos seres humanos esteja artificialmente circunscrita, seus sen-timentos acabam tacanhos e diminutos..." (1910, pp. 203-4).

Mill apenas vê a possibilidade de desenvolvimento de um tipo de caráter "ativo", de espírito público, no contexto de instituições populares, participativas. Encontramos aí, de novo, a asserção básica defendida pelos teóricos da democracia participativa da inter-relação e conexão existentes entre os indivíduos, suas qualidades e caracte-rísticas psicológicas, por um lado, e os tipos de instituições, por outro; a asserção de que a ação social e política responsável depende em larga medida dos tipos de instituições no interior das quais o indivíduo tem de agir politicamente. Como Rousseau, Mill considera que essas qualidades se desenvolveram pela participação que existia anteriormente, de modo que o sistema político tem um caráter de auto-sustentação.11 Mill também não considera necessário que os cidadãos devam realizar aqueles cálculos lógicos e racionais que Schumpeter afirmava necessários. Em Governo representativo, Mills observa que não seria uma forma de governo racional aquela que exigisse princípios "exaltados" de conduta para motivar os ho-mens, embora admita que existe um certo nível de sofisticação polí-tica e de espirituosidade pública nos países "avançados" aos quais essa teoria se dirige (1910, p. 253). Mill encara a função educativa da participação quase nos mesmos termos de Rousseau. Quando o indi-

11. Duncan e Lukes (1963, p. 160) notam o caráter de auto-sustentação do sistema, mas dizem que isto decorre da posse de direitos legais, os quais tornam os homens capazes de exercê-los, e portanto a se aproximarem da "autonomia moral". O argumento de Mill, claro, é de que o exercício, e não a posse, é que importa. Sem as instituiçes participativas, a mera posse de direitos legais provocaria poucos efeitos sobre o caráter.

víduo se ocupa somente de seus assuntos privados, argumenta, e não participa das questões públicas, sua "auto-estima" é afetada, assim como permanecem sem desenvolvimento suas capacidades para uma ação pública responsável. "O homem nunca pensa em qualquer inte-resse coletivo, em qualquer objetivo a ser buscado em conjunto com outros, mas apenas na competição com eles, e em certa medida à sua custa" (1910, p. 217). A "ocupação particular para ganhar dinheiro", da maior parte dos indivíduos, faz com que eles utilizem pouco suas faculdades e tende a "fixar a sua atenção e seu interesse exclusiva-mente sobre si mesmos, e sobre suas famílias, como apêndice de si mesmos, tornando-os indiferentes ao público... e egoístas e covardes, cm seu cuidado descomedido com seu conforto pessoal" (1963, p. 230). Toda a situação se modifica, no entanto, quando o indivíduo pode tomar parte nos assuntos públicos; neste caso, Mill, assim como Rousseau, via o indivíduo sendo "forçado" a ampliar seus ho-rizontes e a levar em consideração o interesse público. Em outros lermos, o indivíduo tem de "atender não apenas a seus próprios inte-resses; de se guiar, no caso de reivindicações conflitantes, por outro comando que não o de suas parcialidades privadas; de aplicar, a cada vez, princípios e máximas que têm como razão de existência o bem comum" (1910, p. 217).

Até aqui, a teoria de Mill mostrou-se mais um reforço do que um acréscimo à hipótese de Rousseau acerca da função educativa da participação. No entanto, há uma outra faceta da teoria de Mill que de fato acrescenta uma nova dimensão a essa hipótese, uma dimen-são necessária caso se queira aplicá-la a uma sociedade de larga escala. Já citei uma das análises que Mill faz da Democracia na América, de Tocqueville. Esse livro teve uma influência decisiva sobre a teoria política de Mill, em especial na parte concernente às instituições políticas locais.12 Mill ficou bastante impressionado com a discussão realizada por Tocqueville a respeito da centralização e dos perigos inerentes ao desenvolvimento de uma sociedade de mas-sas (perigos que agora foram divulgados por sociólogos modernos, também impressionados por essa análise). Na Economia política, Mill declara que "uma constituição democrática sem o apoio de ins-tituições minuciosamente democráticas e restrita ao governo central

12. Ver Mill, 1924, pp. 162-4, e Robinson, 1968, p. 106.

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não apenas deixa de proporcionar liberdade política como freqüente-mente cria um espírito exatamente contrário".1 Na crítica do volume 11 do livro de Tocqueville, Mill argumenta que de nada servem o sufrágio universal e a participação no governo nacional, se o indiví-duo não foi preparado para essa participação a um nível local; é neste nível que ele aprende a se autogovernar. "Um ato político que apenas se repete com o intervalo de alguns anos, e para o qual não teve o preparo nos hábitos cotidianos do cidadão, deixa seu intelecto e suas disposições morais inalteradas" (1963, p. 229). Em outras palavras, para que os indivíduos em um grande Estado sejam capazes de par-ticipar efetivamente do governo da "grande sociedade", as qualida-des necessárias subjacentes a essa participação devem ser fomenta-das e desenvolvidas a nível local.

Assim, para Mill, é a nível local que se cumpre o verdadeiro efeito educativo da participação, onde não apenas as questões trata-das afetam diretamente o indivíduo e sua vida cotidiana, mas onde também ele tem uma boa chance de, sendo eleito, servir no corpo administrativo local (1910, pp. 347-8). É por meio da participação a nível local que o indivíduo "aprende a democracia". "Não aprende-mos a ler ou a escrever, a guiar ou a nadar apenas porque alguém nos diz como fazê-lo, mas porque o fazemos, de modo que será somente praticando o governo popular em pequena escala que o povo terá alguma possibilidade de aprender a exercitá-lo em maior escala" (1963, p. 186).

Numa sociedade de larga escala o governo representativo será necessário, e justamente aqui surge uma dificuldade: será que as propostas práticas de Mill a respeito da representação são compatí-veis com o papel fundamental que ele confere à função educativa da participação em sua teoria? Em suas propostas práticas Mill não parece levar muito a sério seus próprios argumentos quanto à partici-pação, e em boa parte isso se deve a idéias a respeito do estado "natural" da sociedade que se encontram mescladas com o resto de sua teoria social e política.

Bentham e James Mill acreditavam que a educação, no sentido limitado, "acadêmico", do termo era o meio mais eficaz de assegurar a participação política responsável das "classes numerosas", e John

13. Mill, 1965, livro V, cap. XI, §6, p. 944.

Stuart Mill nunca realmente rejeitou esse ponto de vista. Uma das maiores preocupações de Mill era saber como conseguir um sistema político onde o poder estivesse nas mãos de uma elite — a elite educada (no sentido restrito). Um intelecto bem cultivado, pensava ele, usualmente vem acompanhado de "prudência", temperança e justiça, e em geral de todas as virtudes que são importantes em nosso relacionamento com os outros".14 Mill considerava como as "mais sábias e melhores" as pessoas que haviam recebido uma boa educa-ção (as "instruídas"), as quais, pensava, deviam ser eleitas para ocu-par cargos em todos os níveis políticos. Considerava que a democra-cia era inevitável no mundo moderno, e que portanto o problema era o de organizar as coisas de tal modo que as instituições políticas fossem compatíveis com o estado "natural" da sociedade, um estado em que "o poder mundano e a influência moral em geral fossem exercidos pelas pessoas mais adequadas que uma sociedade exis-tente pudesse fornecer", em que a "multidão" tenha fé na minoria "instruída" que governará.15 Deve-se observar que Mill não desejava uma situação onde a multidão fosse condescendente no sentido usual, irrefletido, da palavra. Com efeito, ele pensava que já havia passado o tempo em que tal coisa era possível; "o pobre saiu do seu estado de tutela... qualquer conselho, exortação ou orientação a serem dados às classes trabalhadoras, daqui por diante, precisam ser oferecidos a elas na condição de iguais e aceitos por elas de olhos abertos".16 A elite teria de prestar contas à maioria e era na concilia-ção do domínio da elite com a prestação de contas que Mill enxer-gava a "grande dificuldade" em política.17 Sua resposta ao problema dá margem à ambigüidade de sua teoria da participação.

Partindo-se da teoria de Mill sobre a função educativa da parti-cipação poder-se-ia esperar que sua resposta ao problema fosse no sentido de conferir o máximo de oportunidades às classes trabalha-doras para que elas participassem a nível local, de modo a desenvol-

14. Citado em Robson, 1967, p. 210). 15. Mill, 1963, p. 17. Mill compara esse estado com o atual, um estado de "transição", onde as velhas instituições e doutrinas foram "superadas" e a multidão perdeu a fé nos instruídos e está "sem um guia" (p. 3). 16. Mill, 1965, livro IV, cap. VII, §2, p. 763. 17. Ver Hamburger, 1965, p. 86. A ênfase de Mill na minoria instruída ilustra bem o quão equivocada era a acusação de Schumpeter de que os teóricos "clássicos" ignoravam a lide rança.

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ver as qualificações e habilidades necessárias que lhes possibilitas-sem acesso às atividades dos representantes, o que lhes permitiria controlá-los. Porém Mill não diz nada do gênero. Suas propostas práticas para se atingir um sistema político "natural", mas ideal, são bem diferentes. Mill distinguia o sistema ideal e a "verdadeira demo-cracia", que fornece representação às minorias (e para tanto Mill adotou entusiasticamente o esquema de representação proporcional de Hare). Mill não resolveu o problema de assegurar que sua elite educada tivesse uma influência preponderante; esse sistema ideal só poderia se efetivar sob um sistema de voto pluralista, baseado na realização educacional, "ainda que todos devam ter voz — afirmar que todos devam ter voz igual é uma proposição inteiramente dife-rente".18 Por isso, Mill rejeita o argumento de Rousseau de que para a participação efetiva é necessária a igualdade política. Mill implici-tamente também faz uso de uma definição de "participação" dife-rente da de Rousseau, pois ele não pensava que mesmo os repre-sentantes eleitos deveriam legislar, mas apenas aceitar ou rejeitar a legislação preparada por uma comissão especial indi-cada pela Coroa; a função própria dos representantes é a discussão (1910, pp. 235 e segs.).

Outra ilustração desse ponto é o comentário de Mill sobre a forma que deveria ter o sufrágio ideal. Diz ele que é "por meio da discussão política que o trabalhador manual, cuja ocupação é uma rotina e cujo modo de vida não o leva a entrar em contato com nenhuma variedade de impressões, circunstâncias ou idéias, aprende que as causas remotas e os acontecimentos que ocorrem em lugares bem distantes podem ocasionar grandes efeitos até em seus interes-ses pessoais" (1910, p. 278).

No que se refere às propostas práticas de Mill para se alcançar idealmente o melhor Estado político e sua definição implícita de participação, a seguinte questão poderia ser colocada: teria a partici-pação o efeito educativo que ele postulava? O ponto importante a respeito do paradigma rousseauniano de participação direta é que o processo participativo seria organizado de tal maneira que os indiví-duos estariam, por assim dizer, psicologicamente "abertos" a seus

18. Mill, 1910, p. 283. Em sua Autobiografia Mill admitiu que a proposta para um povo pluralista não encontrava apoio algum.

efeitos. Mas nada disso é encontrado em Mill. A maioria é estigmati-zada pelo sistema de sufrágio como politicamente inferior e não pode resistir à implementação de políticas desvantajosas; se uma elite predeterminada deve alcançar o poder político, por que motivo deveria a maioria se interessar pela discussão? Mill não parece se dar conta de qualquer inconsistência nos vários componentes de sua teo-ria, mas é difícil perceber de que forma a sua concepção de partici-pação pode vir a realizar-se. Mesmo com o sufrágio universal e com o poder de deliberação dos representantes, não haveria um ambiente educativo "tão forte" como aquele fornecido pelo sistema de partici-pação direta de Rousseau; o problema de como reproduzir o modelo cie Rousseau nas condições modernas vai ser examinado mais adiante. No momento, deve-se notar que o nível político local abor-dado por Mill, crucial do ponto de vista da educação, poderia propi-ciar a participação direta na tomada de decisões.

A ênfase nas instituições políticas locais não é a única extensão que Mill faz da hipótese sobre o efeito educativo da participação, mas antes de discutir esse outro aspecto é interessante notar que Mill concorda com Rousseau quanto às duas outras funções da participa-ção. Parte do argumento relativo à "complacência crítica" da multi-dão apóia-se na sugestão de que a participação auxilia no acolhi-mento das decisões, e Mill atribui um especial relevo à função integrativa da participação. Diz que através da discussão política o indivíduo "torna-se conscientemente um membro da grande comuni-dade" (1910, p. 279) e que sempre que ele tiver algo a fazer pelo público, torna-se capaz de sentir "que não apenas o seu bem-estar depende do bem-estar comum, mas que este depende de seu em-penho" (1963, p. 230).

Talvez o aspecto mais interessante da teoria de Mill seja uma ampliação da hipótese a respeito do efeito educativo da participação de modo a abranger uma área inteiramente nova da vida social — a indústria. Em suas últimas obras, Mill chegou a visualizar a indústria como outra área onde o indivíduo poderia ganhar experiência na administração dos assuntos da coletividade, exatamente como ele poderia fazer no governo local. Para Mill, o verdadeiro valor das várias teorias de socialismo e de cooperação que estavam sendo de-fendidas e às vezes implementadas, nessa época, residia em seu po-tencial como meios de educação. Como seria de esperar, ele descon-

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fiava dos esquemas de caráter centralista; conforme assinala Rob- son, Mill, nos Capítulos sobre o socialismo (Chapters on Socialism), dá a sua aprovação a "esses esquemas socialistas que dependem da organização voluntária em pequenas comunidades e os quais buscam uma aplicação nacional dos seus princípios através da automultipli- cação das unidades" (1968, p. 245). Em tal forma de organização, a participação generalizada poderia ser acomodada. Mill achava que formas cooperativas de organização industrial conduziriam a uma "transformação moral" dos que nela tomavam parte (também pen-sava que elas seriam mais produtivas, embora isso se devesse em parte à "transformação"). Uma organização cooperativa levaria, dizia ele, a uma "rivalidade amistosa" na busca do bem comum de todos; à elevação da dignidade do trabalho; a uma nova sensação de segurança e independência da classe trabalhadora; e à conversão da ocupação diária de cada ser humano em uma escola das afinida-des sociais e da inteligência prática.19 Do mesmo modo que a parti-cipação na administração do interesse coletivo pela política local educa o indivíduo para a responsabilidade social, também a partici-pação na administração do interesse coletivo na organização indus-trial favorece e desenvolve as qualidades que o indivíduo necessita para as atividades públicas. "Terreno algum", diz Mill, poderia ser mais propício para treinar o indivíduo a sentir "que o interesse cole-tivo lhe diz respeito" do que uma "associação comunista".20 Assim como ele considerava a democracia inevitável no mundo moderno, também achava que alguma forma de cooperação seria inevitável na indústria; agora que as classes trabalhadoras haviam saído do seu "estado de tutela", a relação empregador/empregado não poderia se sustentar a longo prazo, e alguma forma de cooperação deveria subs-tituí-la. Na Economia política, Mill discute qual a forma que ela poderia tomar, e chega à conclusão de que, se "o gênero humano continuar a se aperfeiçoar", ao final predominará uma só forma de organização, "não aquela que pode existir entre um capitalista, en-quanto chefe, e uma população trabalhadora sem voz na administra-ção, mas uma associação dos próprios trabalhadores em termos de igual-

19. Mill, 1965, livro IV, cap. VII, §6, p. 792. 20. Mill, 1965, livro II, cap. I, §3, p. 205. Mill usa a palavra "comunista" com menos rigidez do que hoje.

dade, com a propriedade coletiva do capital para conduzir as opera-ções, trabalhando-se sob a administração de pessoas eleitas e desti-tuídas por eles mesmos".21

Da mesma maneira que a participação no governo local é uma condição necessária para a participação a nível nacional, devido a seu efeito educativo ou "aperfeiçoador", assim também MU sugere que a participação no "governo" do local de trabalho teria o mesmo impacto. Essas implicações mais abrangentes dos argumentos de Mill, relativos à importância da educação, são usualmente negligen-ciados, embora tenham grande significado para a teoria democrática. Para que seja possível tal participação no local de trabalho, a relação de autoridade na indústria teria de transformar-se da habitual rela-ção de superioridade-subordinação (empresários e homens) em uma de cooperação ou de igualdade, com administradores (governo) elei-tos por todo o corpo de empregados, da mesma forma que são eleitos os representantes a nível local. Ou seja, as relações políticas na in-dústria (usando o termo "políticas" no sentido mais amplo) teriam de se democratizar. É possível ir além: o argumento de Mill £ respeito do efeito educativo da participação no governo local e no local de trabalho poderia ser generalizado de maneira a englobar o efeito da participação em todas as estruturas de autoridade ou sistemas políti-cos das "esferas inferiores". Justamente pelo fato de essa hipótese geral poder derivar de suas teorias é que me referi a esses autores como os teóricos da sociedade participativa. A sociedade pode ser vista enquanto um conjunto de vários sistemas políticos, cujas estru-turas de autoridade têm um efeito importante sobre as qualidades e atitudes psicológicas dos indivíduos que interagem dentro deles; assim, para o funcionamento de uma política democrática a nível nacional, as qualidades necessárias aos indivíduos somente podem se desenvolver por meio da democratização das estruturas de autori-dade em todos os sistemas políticos.

A esta altura também notamos que existe outra dimensão para essa teoria da participação. Excetuando-se sua importância como instrumento educativo, a participação no local de trabalho — um sistema político — pode ser encarada como a participação política por excelência. Assim sendo, a indústria e outras esferas fornecem

21. Mill, 1965, livro IV, cap. VII, §6, p. 775. Ver também §§2, 3 e 4.

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áreas alternativas, onde o indivíduo pode participar na tomada de decisões sobre assuntos dos quais ele tem experiência direta, coti-diana, de modo que quando nos referimos a uma "democracia parti-cipativa" estamos indicando algo muito mais amplo do que uma série de "arranjos institucionais" a nível nacional. Essa visão mais abrangente da democracia pode ser encontrada na teoria política de G. D. H. Cole, a qual passamos a examinar.

Uma discussão da teoria de Cole — e aqui estaremos conside-rando apenas seus primeiros escritos — apresenta um particular inte-resse não só porque a sua teoria se situa no contexto de uma socie-dade moderna, industrializada, mas porque se trata em grande parte de uma teoria de uma tal sociedade. As observações de Mill a res-peito da participação na indústria, ainda que esclarecedoras para nos-sos propósitos, eram periféricas em relação ao corpo principal de sua teoria social e política; para Cole, no entanto, é a indústria que possui a chave que abrirá a porta para uma forma de governo verdadeira-mente democrática. Em sua teoria do socialismo de guilda (Guild Socialism), Cole elaborou um esquema detalhado de como uma so-ciedade participativa poderia ser organizada e implantada, o que pos-sui considerável interesse intrínseco, embora nos preocupemos mais com os princípios subjacentes a esse esquema do que com o próprio texto. Outro aspecto significativo do trabalho de Cole desse período era a influência muito grande de Rousseau. Havia outras influências também, como a de William Morris e de Marx, por exemplo, mas Cole cita com freqüência Rousseau, cujo espírito perpassa sua obra, e muitos dos conceitos básicos de Cole derivam daquele autor. Esse é mais um motivo para examinar o trabalho de Cole. As discussões sobre teoria política de Rousseau em geral chegam à conclusão de que ela tem pouca relevância hoje em dia (e às vezes sugere-se que a influência exercida por ela foi positivamente perniciosa). Já afirmei que a teoria de Rousseau fornece o ponto de partida e o material básico sobre teoria participativa da democracia, e a teoria de Cole tenta transpor as análises da teoria de Rousseau para um cenário moderno.

A teoria social e política de Cole constrói-se sobre o argumento de Rousseau de que a vontade, e não a força, é a base da organização social e política. Os homens precisam cooperar em associações para satisfazer suas necessidades, e Cole começa examinar "os motivos que mantêm os homens juntos em uma associação" e os "modos

pelos quais os homens agem por meio de associações, suplemen-tando e complementando suas ações enquanto indivíduos isolados ou privados" (1920, pp. 6 e 11). Para transformar sua vontade em ação de um modo que não afete sua liberdade individual, Cole sus- lenta que os homens devem participar na organização e na regula-mentação de suas associações. A idéia de participação é central em sua teoria. "Suponho", diz ele, repetindo a crítica de Mill à teoria política de Bentham, "que o objeto da organização material não está na mera eficiência material, mas também essencialmente na auto-ex- pressão mais completa de todos os seus membros". Auto-expressão "envolve autogoverno", e isso significa que devemos "convocar a total participação da população para a direção comum dos assuntos da comunidade" (1920, p. 208). Isso, por sua vez, envolve a liber-dade mais completa de todos os membros, pois "liberdade é alcançar a perfeita expressão" (1918, p. 196). Cole diz também, novamente seguindo Rousseau, que o indivíduo é "mais livre onde ele coopera com seus iguais na feitura das leis".22

Cole produz uma teoria de associações. Sociedade, como defi-nida por ele, é um "complexo de associações que se mantêm unidas pelas vontades de seus membros".23 Se o indivíduo quiser se auto- governar, então ele não só tem de ser capaz de participar da tomada de decisões em todas as associações das quais ele é membro, como as próprias associações têm de ser livres para controlar seus próprios assuntos (Cole via na interferência do Estado o maior perigo aqui), e se elas quiserem se autogovernar, nesse sentido têm de ser basica-mente iguais em termos de poder político. Em O mundo do tra-balho (The Word of Labour), Cole afirma que a extinção de grupos na Revolução Francesa foi um acidente histórico devido aos privilégios que eles ocasionalmente possuíam, e acrescenta que "ao reconhecer que onde devam existir associa-ções específicas elas devem se igualar, Rousseau admite que o

22. Cole, 1919, p. 182. Entretanto, Cole não aceita que a liberdade consiste na obediência a essas leis; considera as leis "os andaimes da liberdade humana; porém, elas não fazem parte do edifício" (1918, p. 197). 23. Cole, 1920a, p. 12. Talvez se devesse notar que Cole não vê toda a vida do indivíduo encerrada nesses grupos. Boa parte de sua vida e alguns dos seus aspectos mais valiosos encontram expressão fora da associação; o indivíduo é "o eixo em torno do qual gira todo sistema de instituições. Pois apenas ele tem em si os vários objetivos das diversas instituições agrupados numa única personalidade" (1918, p. 191).

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princípio seria inevitável ao grande Estado. Podemos portanto consi-derar que a nova filosofia dos grupos exerce os verdadeiros princí-pios igualitários da Revolução Francesa" (1913, p. 23).

Essa teoria de associações liga-se à sua teoria da democracia por meio do princípio de função, "o princípio subjacente à organiza-ção social" (1920, p. 48). Cole pensava que "a democracia só é ver-dadeira quando concebida em termos de função ou propósito", e a função de uma associação baseia-se no propósito para o qual ela foi formada (1920a, p. 31). Toda associação que "se coloca qualquer objetivo superior à simplicidade mais rudimentar vê-se compelida a atribuir tarefas e deveres (e, com estes, poderes e uma parcela de autoridade) a alguns de seus membros, de maneira que o objetivo geral possa ser efetivamente perseguido" (1920, p. 104): ou seja, o governo representativo (no sentido mais abrangente deste termo) é necessário na maioria das associações. Na perspectiva de Cole, as formas de representação existentes são enganosas por dois motivos. Em primeiro lugar, por ter sido negligenciado o princípio de função, cometeu-se o engano de se pressupor que o indivíduo pode ser repre-sentado como um todo e para todos os propósitos, em vez de ser representado em relação a alguma função bem definida. Em segundo lugar, sob as instituições parlamentares existentes, o eleitor não faz uma escolha real do seu representante nem o controla; e, na verdade, o sistema nega ao indivíduo o direito de participar porque "ao esco-lher seu representante, o homem comum, de acordo com essa teoria, não tem outra opção exceto deixar que outros o governem". Por outro lado, o sistema de representação funcional implica "a partici-pação constante do homem comum no comando das partes da estru-tura da sociedade, as quais lhe dizem respeito diretamente, e que, por isso mesmo, ele tem maior probabilidade de compreender".

Assim, encontramos na teoria de Cole uma distinção entre a existência dos "arranjos institucionais" representativos a nível nacio-nal e a democracia. Para essa democracia, o indivíduo deve ser capaz de participar em todas as associações que lhe dizem respeito; em outros termos, é necessária uma sociedade participativa. O princípio democrático, diz Cole, deve se aplicar "não apenas ou principal-mente à esfera especial de ação social conhecida como "política",

24. Cole, 1920, p. 114; cf. também pp. 104-6.

mas a qualquer e toda forma de ação social, e, em especial, de modo tão integral na indústria e na economia quanto nos assuntos políti-cos" (1920a, p. 12). Tal noção está de fato implícita na "nova filoso-fia de grupos" que Cole construiu sobre a base lançada por Rous- seau, pois ela busca aplicar as análises de Rousseau a respeito das funções de participação para a organização interna de todas associa-ções e organizações. Para Cole, portanto, como para Mill, a função educativa da participação é crucial, e ele também enfatiza que os indivíduos e suas instituições não podem ser considerados isolada-mente. Ele observa, em Socialismo de guilda restaurado (Guild So- cialism Restated), que, se a teoria do socialismo de guilda em grande parte era uma teoria das instituições, isso não acontecia porque

ela acreditava que a vida dos homens está compreendida em seu meca-nismo social, mas porque o mecanismo social, seja bom ou ruim, em harmonia ou em discordância com os desejos e instintos humanos, é o meio seja de realizar, seja de entravar, a expressão da personalidade humana. Se o ambiente não faz o caráter em um sentido absoluto como pensava Robert Owen, ele dirige e desvia o caráter para formas diver-gentes de expressão (1920a, p. 25).

Como Mill, Cole sustentava que seria apenas pela participação a nível local e em associações locais que o indivíduo poderia "apren-der democracia". "O indivíduo não tem controle sobre o vasto meca-nismo da política moderna, não porque o Estado seja muito grande, mas porque o indivíduo não tem oportunidade alguma de aprender os rudimentos do autogoverno dentro de uma unidade pequena" (1919, p. 157). Na verdade, Cole quase não levou em consideração as impli-cações de seus próprios argumentos neste ponto; o fato de o Estado moderno ser tão grande é um motivo importante para capacitar o indi-víduo a participar nas áreas políticas "alternativas" da sociedade, um fato do qual os escritos de Cole mostram que ele estava bem consciente. O que interessa, no entanto, é que na visão de Cole a indústria fornecia a importantíssima arena para que se revelasse o efeito edu-cativo da participação; pois é na indústria que, excetuando-se o go-verno, o indivíduo mais se envolve em relações de superioridade e subordinação, e o homem comum gasta grande parte de sua vida no trabalho. Foi essa a razão para a declaração de Cole de que a resposta que a maioria das pessoas daria à pergunta "qual o mal fundamental

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em nossa sociedade moderna?" seria errada: "eles responderiam PO-BREZA, quando deveriam responder ESCRAVIDÃO" (1919, p. 34). Os milhões que receberam a alforria, que receberam formal-mente os meios de autogoverno, foram na verdade "treinados para a subserviência", e esse treinamento deu-se em grande parte durante sua ocupação diária. Cole argumentava que "o sistema industrial... em grande parte é a chave para o paradoxo da democracia política. Por que motivo a maioria é nominalmente suprema mas efetiva-mente impotente? Em boa parte porque as circunstâncias de suas vidas não os acostumam ou preparam para o poder ou para a respon-sabilidade. Um sistema servil na indústria reflete-se inevitavelmente em servidão política" (1918, p. 35). Apenas se o indivíduo pudesse se autogovernar no local de trabalho, apenas se a indústria fosse organizada sobre uma base participativa, esse treinamento para a servidão poderia transformar-se em treinamento para a democracia, e o indivíduo poderia ganhar familiaridade com os procedimentos democráticos e desenvolver as "características democráticas" neces-sárias para um sistema efetivo de democracia em larga escala.25

Para Cole, assim como para Rousseau, não poderia haver igual-dade de poder político sem uma quantidade substancial de igualdade econômica, e sua teoria nos oferece algumas interessantes indicações sobre a maneira de se alcançar a igualdade econômica daquela socie-dade ideal de camponeses proprietários de Rousseau na economia moderna. Segundo Cole, "a democracia abstrata das urnas" não en-volvia uma igualdade política real; a igualdade de cidadania implí-cita no sufrágio universal era apenas formal e obscurecia o fato de que o poder político era dividido com muita desigualdade. "Os de-mocratas teóricos", dizia ele, ignoravam "o fato de que grandes desi-gualdades de riquezas e de posição social, que resultavam em gran-des desigualdades de educação, poder e controle do ambiente, são necessariamente fatais para qualquer democracia verdadeira, seja em política ou em qualquer outra esfera ".26

25. Em todos os escritos de Cole sobre a necessidade da sociedade participativa está implícita a hipótese de que a participação terá um efeito integrativo. Isso aflui em várias de suas referências à "comunidade" e na importância que ele atribui às instituições participativas locais, onde os homens podem aprender o "espírito social". Na esfera industrial esta é a base da afirmação de que a nova forma de organização levaria à cooperação e à camaradagem em uma comunidade de trabalhadores, em vez do conflito habitual. Ver Cole, 1920, p. 169, e 1920a, p. 45. 26. Cole, 1920a, p. 14; ver também 1913, p. 421.

Uma das principais objeções de Cole à organização capitalista da indústria era que, nela, o trabalho era apenas mais uma mercado-ria, e desse modo era negada a "humanidade" do trabalho. Sob o sistema de socialismo de guilda, essa humanidade seria inteiramente reconhecida, o que significaria, "acima de tudo, o reconhecimento do direito... à igualdade de oportunidade e de posição social" (1918, p. 24). É este último aspecto que realmente importa; apenas com a equiparação da posição social poderia haver igualdade de inde-pendência, a qual, como vimos a partir da discussão da teoria de Rousseau, é crucial para o processo de participação. Cole pensava que haveria um avanço no sentido da equiparação de ganhos, sendo que a igualdade final resultaria da "destruição total da idéia de remuneração por tarefa" (1920a, pp. 72-3), mas a abolição das dife-renças de posição social desempenha um papel maior em sua teoria. Em parte, isso se daria através da socialização dos meios de produ- ção sob um sistema de socialismo de guilda, porque as classes teriam então que ser abolidas (por definição — Cole usa o termo no sentido marxista), no entanto outros dois fatores tinham mais importância (prática). Sob um sistema participativo não haveria mais um grupo de "administradores" e um grupo de "homens", sendo que estes não teriam controle sobre os assuntos da empresa, mas haveria um grupo de pessoas iguais que tomaria as decisões. Em segundo lugar, Cole acreditava que a organização participativa da indústria levaria à abo-lição do medo de desemprego do homem comum e, desse modo, à abolição da outra grande distinção de posição social: a desigualdade na segurança de manutenção do emprego.

Contudo, ainda que a teoria democrática de Cole dependa do estabelecimento dessa igualdade da posição social na indústria, ele era (apesar das críticas de Schumpeter a respeito) bem consciente do problema da preservação da liderança sob um tal sistema democrá-tico, e pensava que o princípio de função fornecia uma resposta a isso. Se a representação (liderança) fosse organizada em uma base funcional, então seria possível ter "representantes" em vez de "dele-gados". Estes pareciam necessários porque, ao que tudo indica, se-riam o único meio pelo qual o eleitorado conseguiria exercer o con-trole, uma vez que, "assim que os eleitores tivessem exercido seu direito de voto, sua existência enquanto grupo se eclipsaria até a época em que fosse necessária uma nova eleição". As associações

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funcionais, ao contrário, podem ter existência contínua, e assim con-seguem, o tempo todo, dar conselhos, criticar e, se for preciso, desti-tuir o representante. Elas têm também um mérito adicional pelo fato de que "não apenas o representante será escolhido para realizar um trabalho do qual conhece alguma coisa, mas será escolhido por quem também conhece algo a respeito".27

Embora Cole considerasse a "eficiência material" apenas como um dos objetivos da organização social e política, pensava que uma sociedade participativa seria superior também nesse aspecto. Sob condições de segurança e igualdade econômica, a motivação do lucro — a motivavação de "ganância e medo" — seria substituída pela motivação do trabalho livre, e os trabalhadores veriam que seus esforços seriam para o benefício de toda a comunidade. Cole pen-sava que existiam grande reservas insuspeitadas de energia e de ini-ciativa no homem comum que um sistema participativo traria à tona; o autogoverno era a chave para a eficiência. Os trabalhadores nunca seriam convencidos a dar o melhor de si "sob um sistema que, de qualquer perspectiva moral, é absolutamente indefensável".28

O que mais interessa a nossos propósitos, no plano específico de Cole para o autogoverno nas oficinas e em outras esferas, o socia-lismo de guilda, é que ele nos fornece uma noção bastante detalhada de como seria uma sociedade participativa. Cole o apresentou em várias versões, porém a teoricamente mais pluralista é encontrada no Socialismo de guilda restaurado, sobre o qual a seguinte apresenta-ção, bem breve, se baseia.29 A estrutura do socialismo de guilda se organizava, horizontal e verticalmente, dos pés à cabeça, e era parti-

27. Cole, 1920 a, pp. 110-3. Semelhante sistema responderia em parte às objeções freqüente mente levantadas quanto ao grau de "racionalidade" que um sistema democrático exige dos eleitores. Carpenter (1966) afirmou que Cole era impermeável aos conhecimentos de sua época sobre elementos irracionais do comportamento humano. Seja como for, Cole e outros teóricos da sociedade participativa adotavam o ponto de vista segundo o qual a "racionali dade" era, ao menos em parte, adquirida através do processo de participação. 28. Cole, 1919, p. 181, e 1920b, p. 12. Algumas críticas ao socialismo de guilda de um ponto de vista econômico podem ser encontradas em Glass (1966) e Pribicevic (1959). 29. Cole, 1920a. Um resumo do desenvolvimento do socialismo de guilda e uma discussão geral de sua teoria (Cole era apenas um dos envolvidos) podem ser encontrados em Glass (1966). Colocou-se em questão se o plano de Cole teria se revelado tão "pluralista" quanto ele pretendia. Ele pensava que, uma vez que o socialismo de guilda começasse a tomar forma, o Estado "definharia" gradualmente por falta de uma função real, mas argumentou-se que a sua Comuna Nacional, o novo órgão "coordenador", iria se tornar o Estado rebatizado em termos mais essenciais.

cipativa em todos os níveis e aspectos. A estrutura vertical devia ser de natureza econômica, pois de acordo com os bons princípios fun- cionalistas as funções políticas e econômicas deviam ser separadas na sociedade. Do lado econômico, a produção e o consumo eram lambem diferenciados.30 O que em geral se considerava como "guil-das" na verdade devia ser a unidade da organização no setor da pro-dução. Para a esfera econômica Cole também propunha o estabeleci-mento de cooperativas de consumidores, conselhos de utilidades (para abastecimento de gás, etc.), guildas cívicas para cuidar da saúde, educação, etc., e conselhos culturais para "expressar o ponto de vista cívico" — e alguns outros corpos ad hoc que poderiam prover o necessário em uma área específica. A oficina deveria ser o "bloco de construção" básico da guilda e, de modo similar, a unidade básica de cada conselho, entre outras coisas; devia ser pequena o bastante para permitir o máximo de participação de todos. Cada guilda elegeria representantes para os estágios mais altos da estrutura vertical, para as guildas e conselhos locais e regionais, e, no nível mais alto, para o Congresso de Guildas Industriais (ou o seu equivalente).

O propósito da estrutura (política) horizontal era dar expressão ao "espírito comunal da sociedade global". Cada cidade ou área rural teria a sua própria comuna, onde a unidade básica seria o bairro, novamente para permitir o máximo de participação dos indivíduos, e os representantes seriam eleitos a partir das guildas e demais corpos locais da comuna, com base nos bairros. A camada horizontal se-guinte seria composta por comunas regionais, reunindo a cidade, o campo e as guildas regionais, e no topo estaria a Comuna Nacional que, pensava Cole, seria um corpo de mera coordenação sem se constituir no prolongamento funcional, histórico ou estrutural do Es-tado existente.

Os prós e os contras mais precisos desse projeto específico não nos interessa aqui; como disse o próprio Cole, "os princípios por trás do socialismo de guilda são bem mais importantes do que as formas efetivas de organização imaginadas pelos socialistas de guilda" (1920c, p. 7), e é nesses princípios, os princípios subjacentes à teoria

30. Foi a respeito desta última divisão que Cole divergiu tanto dos coletivistas quanto dos defensores da cooperação, porque nenhum deles admitiu o direito do produtor ao autogo-verno, e dos sindicalistas porque eles não admitiam que os consumidores necessitassem de uma representação especial.

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da democracia participativa, e na questão de sua relevância empírica em nossa época que estamos interessados.

A grande diferença entre as teorias da democracia discutidas nesse capítulo e as teorias de autores que chamamos de teóricos do governo representativo dificulta a compreensão de como o mito de uma teoria "clássica" da democracia subsistiu por tanto tempo e foi tão vigorosamente difundido. As teorias da democracia participativa examinadas aqui não eram apenas tentativas de prescrição, como se diz freqüentemente; o que elas fazem é fornecer justamente os "pla-nos de ação e prescrições específicas" para movimentos no sentido de uma forma de governo (verdadeiramente) democrática que se su-geriu estar faltando. Entretanto, as críticas mais estranhas talvez sejam as de que esses teóricos anteriores não estavam preocupados, como coloca Berelson, com as "formações gerais necessárias para que as instituições (políticas) funcionassem como deviam", e a de que eles ignoravam o sistema político como um todo em suas obras. Está bastante claro que era exatamente com isso que eles se preocu-pavam. Embora a variável identificada como crucial nessas teorias, para o estabelecimento bem-sucedido e a manutenção de um sistema político democrático — as estruturas de autoridade das esferas não-governamentais da sociedade — seja exatamente a mesma que Ecks-tein aponta em sua teoria de uma democracia estável, as conclusões tiradas pelos teóricos da democracia mais antigos e pelos mais recen-tes são inteiramente diferentes. A fim de que possa ser efetuada uma avaliação dessas duas teorias da democracia, estabelecerei agora, brevemente (de modo similar à teoria contemporânea da democra-cia, acima), uma teoria participativa da democracia, retirada das três teorias que acabamos de discutir.

A teoria da democracia participativa é construída em torno da afirmação central de que os indivíduos e suas instituições não podem ser considerados isoladamente. A existência de instituições repre-sentativas a nível nacional não basta para a democracia; pois o má-ximo de participação de todas as pessoas, a socialização ou "treina-mento social", precisa ocorrer em outras esferas, de modo que as atitudes e qualidades psicológicas necessárias possam se desenvol-ver. Esse desenvolvimento ocorre por meio do próprio processo de participação. A principal função da participação na teoria da demo-cracia participativa é, portanto, educativa; educativa no mais amplo

sentido da palavra, tanto no aspecto psicológico quanto no de aquisi-ção de prática de habilidades e procedimentos democráticos. Por isso, não há nenhum problema especial quanto à estabilidade de um sistema participativo; ele se auto-sustenta por meio do impacto edu-cativo do processo participativo. A participação promove e desenvolve as próprias qualidades que lhe são necessárias; quanto mais os indiví-duos participam, melhor capacitados eles se tornam para fazê-lo. As hipóteses subsidiárias a respeito da participação são de que ela tem um efeito integrativo e de que auxilia a aceitação de decisões coletivas.

Em conseqüência, para que exista uma forma de governo de-mocrática é necessária a existência de uma sociedade participativa, isto é, uma sociedade onde todos os sistemas políticos tenham sido democratizados e onde a socialização por meio da participação pode ocorrer em todas áreas. A área mais importante é a indústria: a maio-ria dos indivíduos despende grande parte de suas vidas no trabalho e o local de trabalho propicia uma educação na administração dos as-suntos coletivos, praticamente sem paralelo em outros lugares. O segundo aspecto da teoria da democracia participativa é que as esfe-ras de atuação, como a indústria, poderiam ser vistas como esferas de atuação política por excelência, oferecendo áreas de participação adicionais ao âmbito nacional. Para que os indivíduos exerçam o máximo de controle sobre suas próprias vidas e sobre o ambiente, as estruturas de autoridade nessas áreas precisam ser organizadas de tal forma que eles possam participar na tomada de decisões. Uma outra razão para o papel central da indústria na teoria relaciona-se com a medida de substancial igualdade econômica exigida para que o indi-víduo tenha a independência e a segurança necessárias para a partici-pação (igual); a democratização das estruturas de autoridade da in-dústria, ao abolir a permanente distinção entre "administradores" e "homens", significaria um grande avanço no sentido de satisfazer essa condição.

As teorias da democracia contemporânea e participativa podem ser comparadas em cada detalhe importante, inclusive quanto à pró-pria caracterização de "democracia" e à definição de "político", que na teoria participativa não está confinado à esfera habitual do go-verno nacional ou local. Novamente, na teoria participativa, a "parti-cipação" refere-se à participação (igual) na tomada de decisões, e "igualdade política" refere-se à igualdade de poder na determinação

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das conseqüências das decisões, uma definição bastante diferente daquela fornecida pela teoria contemporânea. Por fim, a justificativa para um sistema democrático em uma teoria da democracia partici-pativa reside primordialmente nos resultados humanos que decorrem do processo participativo. Pode-se caracterizar o modelo participa-tivo como aquele onde se exige o input máximo (a participação) e onde o output inclui não apenas as políticas (decisões) mas também o desenvolvimento das capacidades sociais e políticas de cada indi-víduo, de forma que existe um "feedback" do output para o input.

Muitas das críticas feitas à chamada teoria da democracia "clássica" implicam que basta apenas estabelecer tal teoria para que fique óbvio que ela é irrealista e obsoleta. Em relação à teoria da democracia participativa isso não acontece; de fato, ela apresenta muitos aspectos que refletem alguns dos principais temas e orienta-ções da teoria política e da sociologia política recentes. O fato de ela ser um modelo de um sistema auto-sustentado, por exemplo, poderia torná-la atraente para muitos autores de textos políticos, os quais utilizem tais modelos, implícita ou explicitamente. Ainda, as seme-lhanças entre a teoria da democracia participativa e teorias de plura-lismo social recentes são bastante óbvias, embora estas em geral afirmem que apenas as associações "secundárias" deveriam fazer a mediação entre o indivíduo e o corpo político nacional, mas não dizem nada sobre a questão das estruturas de autoridade dessas asso-ciações.31 A definição ampla de "político" na teoria participativa também está de acordo com a prática na teoria política e na ciência política modernas. Dahl (1963, p. 6), um dos defensores da teoria da democracia contemporânea discutidos acima, definiu um sistema político como "qualquer padrão persistente de relacionamentos hu-manos que envolvam, de maneira significativa, poder, governo e autoridade". Todos esses elementos fazem com que se estranhe o fato de nenhum autor atual da teoria democrática demonstrar ter feito uma releitura de seus precursores à luz dessas preocupações. Qual-quer explicação disso incluiria, sem dúvida, uma menção à crença amplamente difundida de que (embora esses precursores sejam com freqüência taxados de "descritivos") os teóricos políticos "tradicio-nais", em especial os teóricos da democracia, estavam engajados

31. Cf.Eckstein, 1966, p. 191.

mim empreendimento já consagrado pelo uso e "carregado de valor", tendo portanto a sua obra, segundo esse ponto de vista, pouco inte- resse direto para o teórico político moderno, científico.

Qualquer que seja a verdade desta afirmação, pode-se agora tentar a realização da tarefa restante, ou seja, uma avaliação do rea-lismo empírico e da viabilidade da teoria da democracia participa- tiva: a concepção de uma sociedade participativa é uma fantasia utó-pica — e uma fantasia tão perigosa assim? A exposição da teoria levanta imediatamente várias questões de importância. Por exemplo, o problema da definição de "participação". É claro que, quando a participação direta é possível, a definição é relevante, mas não fica claro até que ponto o paradigma da participação direta pode se repe-tir em condições onde a representação está se tornando amplamente necessária, embora o indivíduo tivesse mais oportunidades de parti-cipação política numa sociedade participativa. Antes de se dar uma resposta à questão, entretanto, é preciso analisá-la com bastante cui-dado. A teoria da democracia participativa se sustenta ou cai por terra de acordo com duas hipóteses: a função educativa da participação e o papel crucial da indústria, e nossa atenção será concentrada nisso. O ponto principal da discussão nas duas teorias da democracia é se as estruturas de autoridade industrial podem ser democratizadas, mas, antes que tal questão possa ser enfrentada, uma outra ainda mais básica deve ser colocada. No próximo capítulo, começaremos por verificar se existe alguma evidência que sustente a ligação sugerida entre a partici-pação no local de trabalho e em outras esferas não-governamentais e a participação de um âmbito mais abrangente, nacional.

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Junto com as obras citadas no texto, a bibliografia contém mais algumas fontes às quais foram feitas referências.

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ÍNDICE REMISSIVO

Aas D., 95, 97 AlfordR.F.,70n.5 Almond G. A., 26 n. 14, 67-71, 138 Argyris,C.,74-5,76n.ll Autoritarismo: sua necessidade para Eckstein, 24,102-3, 113; personalidade autoritária, 11, 20, 88, 140; estruturas autoritárias: e atitudes individuais, 36, 37-9,44-7, 60-1, 67-91, 100-2,137, 139-40; democratização nas indústrias, 116-36, 141-2; Eckstein a procura de congruência, 23-4 Auty,R, 120 n.7, 123 n. 17, 131 n.34

Bachrach, R, 21 n.l, 26 n.14, 27, 28n.15el6.34n.21, 113n.31 Bader,E., 108-9, 111-2 Barry, B. M., 38 n.5 Bay,C.,26n.l4 Bell, D., 77, 96 n.l Bentham, J., 29,46, 53; criticado por J. S. MUI, 42-4; sobre a função da participação, 31-22; sobre o papel do eleitorado, 30-1 Berelson, B. R., 14, 17, 27; sobre as de-ficiências das "teorias clássicas", 15-6 Berlin, L, 41 n.9 Bilandzic, D., 131 n.33 Blauner, R., 73,77, 78, 80, 82, 86 Blum, F. H., 108 n.22, 109 n.23, 24 e 25, 110n.26e27, 111 n.28, 117n.4 Blumberg, R, 78 n.13, 81-2, 87, 88,

90, 91, 99 n.5, 101,120 n.9,121n. 12, 122 n.15,125 n.23 e 24,127 n.25, 131 n.34, 132 n.35, 134 n.41 Boston, R., 78 n. 13 Brown, W, 103 n.7 Burke, E., 32 n.23 Burns,J.H.,43n.lO

Campbell, A., 66 Carey,A.,89n.26 Carpenter, L. R, 58 n.27 Chamberlain, N. W, 103 n.8 Chandler, M. K., 103 n.8 Chinoy,E., 76 n. 11 Clegg, H. A., 99 Coates, K., 98 n.3 Coch,L., 82 n. 19 Cole G. H. D., 34,42,66, 83,112-3, 119,140, 141, 143-4; seu plano para o socialismo de guilda, 57-9; seu princí-pio de função, 54; sua teoria de asso-ciação, 53-4; sobre a eficiência econô-mica, 57-8,143; sobre a igualdade econômica, 56-8; sobre o efeito educa-tivo da participação, 55; sobre o con-trole invasivo, 83; sobre outras funções participativas, 56 n.25; sobre a igualdade política, 56-7; sobre a repre-sentação, 54, 58 Competência política, ver eficácia polí-tica Comuna na Iugoslávia, 121 n.13, 123

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