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EUA (Cosmopolitan, First National, Warner Bros.) 119 min. P&B Idioma: ingles / francês Direção: Michael Curtiz 1'ioduçào: Harry Joe Brown, Gordon llollingshead.Hal B. Wallis llotciro: Casey Robinson, baseado no llvio de Rafael Sabatini Imografia: Ernest Haller, Hal Mohr Música: Erich Wolfgang Korngold, Liszt Elenco: Errol Flynn, Olivia de Hlvllland, Lionel Atwill, Basil K.itlibone, Ross Alexander, Guy Klhbi'i'. Henry Stephenson, Robert U.in.it. Hobart Cavanaugh, Donald Meet. H'ssie Ralph, Forrester Harvey, 11.ink MiGlynn Sr., Holmes Herbert, David Torrence Indicação ao Oscar: Harry Joe Brown, ( Inn llollingshead, Hal B. Wallis ( Mien filme), Michael Curtiz (illii'lui). Casey Robinson (roteiro), l n i 1.1 orbstein (trilha sonora), Nlthan I cvinson (efeitos sonoros) CAPITÃO BLOOD (1935) (CAPTAIN BLOOD) Uma aventura exuberante por excelência dirigida pelo especialista Michael Curti/, Capitão B/ood tornou o australiano Errol Flynn, com seu charme divino, um astro da noite para o dia. Seu magnetismo animal impressionou enormemente Jack Warner, que lhe deu o papel depois que Robert Donat o desdenhou. Este é o primeiro de uma série de bem-sucedidos filmes românticos de capa e espada que Flynn fez em parceria com Olívia de Havllland, cuja beleza elegante era uma charmosa contrapartida à exuberân cia e ao sex appcal atlético dele. Flynn faz o papel de Peter Blood, um honrado médico irlandês do século XVII injustamente deportado para o Caribe, onde se torna escravo e lança comentários insolentes c olhares sugestivos para a requintada Sra. de Havilland. Liderando uma fuga, ele se torna um pirata, o vingativo justiceiro do alto-mar, e forma uma aliança conturbada com o covarde bucaneiro francês Basil Rathbone. Os ânimos esquentam quando eles brigam por conta do butim e da bela prisioneira (de Havilland), o que resul- ta em um duelo até a morte na primeira de suas muitas empolgantes lutas de espada nas telas. Copitòo B/ood tem tudo o que você pode querer de um filme de capa e espada: batalhas no mar; lâminas cintilantes; um herói destemido; uma heroína em perigo, porém corajosa; gargantas cortadas; chapéus emplumados; equívocos solucionados; homens balançando em mastros como ginastas; e uma empolgante trilha composta por Erich Wolfgang Korngold. Superdlvertldo. AE IUA (Ml,M) 132 min. P&B Direção: Frank Lloyd •toduçlo: Albert Lewin, Irving Thalberg Knti'iro: lalbot Jennings, Jules 11111 iiirian, baseado no livro de Charles NMIIIIKIII & James Hall Fotografia: Arthur Edeson Mdllca: Herbert Stohart, Walter tm 111.11111. Gus Kahn, Branislau Kaper rlenco: Charles Laugbton, Clark Gable, I I.MH hol rone, Herbert Mundin, Eddie 11.111, Dudley Digges, Donald Crisp, I ii'tiiy Stephenson, Francis Lister, '•piing Kyington, Movita, Mamo Clark, I'.VIIHI Russell, Percy Waram, David 1 IH o Oscar: Albert Lewin, Irving Thalberg (MII-IIIUI filme) Indicação ao Oscar: Frank Lloyd (diretor), Jules Furthman, Talbot Irnnings (roteiro), Clark Gable, 11.im hoi Tone, Charles Laughton (.ihn), Margaret Booth (edição), NatW. I Initon (trilha sonora) 0 GRANDE MOTIM (1935) (MUTINY ON THE BOUNTY) Sintetizando o espírito hollywoodiano clássico, O grande motim, de Frank Lloyd, é uma obra-prima do cinema de estúdio. A cenografia suntuosa, o caráter de relato de viagem e a moral central resultam em uma aventura de extraordinária beleza. Obviamente, para apreciar essas qualidades é preciso fazer vista grossa a um estilo de atuação há muito abandonado. E também ao fato de um elenco americano imbuir esta fábula moralizante Inglesa de um otimismo típico da era da Grande Depressão. Ainda assim, essas críticas pontuais servem para sustentar quão bem produzido é o filme, levando em conta o estilo dos estúdios MGM, que almejavam ao mesmo tempo lucro, esca- pismo e entretenimento da forma mais abrangente possível. No fim do século XVIII, no auge do controle do Império Britânico sobre sua Marinha, a tripulação do navio Bounty se amotina depois de meses de maus-tratos. Liderados por Fletcher Christian (Clark Gable), eles jogam o cruel capitão Bllgh (Charles Laughton) no mar, porém ele consegue voltar para terra em um esforço nada menos que espetacu- lar. No seu encalço, o Bounty segue para o Pacífico Sul, perseguido por várias com- plicações. Aqui, Gable aparece sem seu bigode, e os lábios carnudos de Laughton se agitam com rígida disciplina. Em meio a isso existe uma série de pequenas subtramas, embo- ra o filme talvez seja mais memorável como um marco primordial para a arte do dese- nho de produção. CC-Q

1001_Filmes_Para_Ver_Antes_de_Morrer_Parte_II_

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EUA (Cosmopolitan, First National,

Warner Bros.) 119 min. P&B

Idioma: ingles / francês

Direção: Michael Curtiz

1'ioduçào: Harry Joe Brown, Gordon

llollingshead.Hal B. Wallis

llotciro: Casey Robinson, baseado no

llvio de Rafael Sabatini

Imografia: Ernest Haller, Hal Mohr

Música: Erich Wolfgang Korngold, Liszt

Elenco: Errol Flynn, Olivia de

Hlvllland, Lionel Atwill, Basil

K.itlibone, Ross Alexander, Guy

Klhbi'i'. Henry Stephenson, Robert

U.in.it. Hobart Cavanaugh, Donald

Meet. H'ssie Ralph, Forrester Harvey,

11.ink MiGlynn Sr., Holmes Herbert,

David Torrence

Indicação ao Oscar: Harry Joe Brown,

( Inn llollingshead, Hal B. Wallis

( Mien filme), Michael Curtiz

(illii'lui). Casey Robinson (roteiro),

l n i 1.1 orbstein (trilha sonora),

Nlthan I cvinson (efeitos sonoros)

CAPITÃO BLOOD (1935)

(CAPTAIN BLOOD) Uma aventura exuberante por excelência dirigida pelo especialista Michael Curti/,

Capitão B/ood tornou o australiano Errol Flynn, com seu charme divino, um astro da

noite para o dia. Seu magnetismo animal impressionou enormemente Jack Warner, que

lhe deu o papel depois que Robert Donat o desdenhou. Este é o primeiro de uma série

de bem-sucedidos filmes românticos de capa e espada que Flynn fez em parceria com

Olívia de Havllland, cuja beleza elegante era uma charmosa contrapartida à exuberân

cia e ao sex appcal atlético dele.

Flynn faz o papel de Peter Blood, um honrado médico irlandês do século XVII

injustamente deportado para o Caribe, onde se torna escravo e lança comentários

insolentes c olhares sugestivos para a requintada Sra. de Havilland. Liderando uma

fuga, ele se torna um pirata, o vingativo justiceiro do alto-mar, e forma uma aliança

conturbada com o covarde bucaneiro francês Basil Rathbone. Os ânimos esquentam

quando eles brigam por conta do butim e da bela prisioneira (de Havilland), o que resul­

ta em um duelo até a morte na primeira de suas muitas empolgantes lutas de espada

nas telas. Copitòo B/ood tem tudo o que você pode querer de um filme de capa e espada:

batalhas no mar; lâminas cintilantes; um herói destemido; uma heroína em perigo,

porém corajosa; gargantas cortadas; chapéus emplumados; equívocos solucionados;

homens balançando em mastros como ginastas; e uma empolgante trilha composta

por Erich Wolfgang Korngold. Superdlvertldo. AE

IUA (Ml,M) 132 m i n . P&B

Direção: Frank Lloyd

•toduçlo: Albert Lewin, Irving Thalberg

Knti'iro: lalbot Jennings, Jules

11111 i i i r i a n , baseado n o livro de Charles

N M I I I I K I I I & James Hall

Fotografia: Arthur Edeson

Mdllca: Herbert Stohart, Walter tm 111.11111. Gus Kahn, Branislau Kaper

rlenco: Charles Laugbton, Clark Gable,

I I.MH hol rone, Herbert Mundin, Eddie

11.111, Dudley Digges, Donald Crisp,

I i i ' t i iy S t e p h e n s o n , Francis Lister,

'•piing Kyington, Movita, Mamo Clark,

I'.VIIHI Russell, Percy Waram, David

1 IH o

Oscar: Albert Lewin, Irving Thalberg

(MII-IIIUI filme)

Indicação ao Oscar: Frank Lloyd

(diretor), Jules Furthman, Talbot

Irnnings (roteiro), Clark Gable,

1 1 . i m hoi Tone, Charles Laughton

( . ihn) , Margaret Booth (edição), NatW.

I Initon (trilha sonora)

0 GRANDE MOTIM (1935)

(MUTINY ON THE BOUNTY) Sintetizando o espírito hollywoodiano clássico, O grande motim, de Frank Lloyd, é uma

obra-prima do cinema de estúdio. A cenografia suntuosa, o caráter de relato de viagem

e a moral central resultam em uma aventura de extraordinária beleza. Obviamente,

para apreciar essas qualidades é preciso fazer vista grossa a um estilo de atuação há

muito abandonado. E também ao fato de um elenco americano imbuir esta fábula

moralizante Inglesa de um otimismo típico da era da Grande Depressão. Ainda assim,

essas críticas pontuais servem para sustentar quão bem produzido é o filme, levando

em conta o estilo dos estúdios MGM, que almejavam ao mesmo tempo lucro, esca­

pismo e entretenimento da forma mais abrangente possível.

No fim do século XVIII, no auge do controle do Império Britânico sobre sua Marinha,

a tripulação do navio Bounty se amotina depois de meses de maus-tratos. Liderados

por Fletcher Christian (Clark Gable), eles jogam o cruel capitão Bllgh (Charles Laughton)

no mar, porém ele consegue voltar para terra em um esforço nada menos que espetacu­

lar. No seu encalço, o Bounty segue para o Pacífico Sul, perseguido por várias com­

plicações.

Aqui, Gable aparece sem seu bigode, e os lábios carnudos de Laughton se agitam

com rígida disciplina. Em meio a isso existe uma série de pequenas subtramas, embo­

ra o filme talvez seja mais memorável como um marco primordial para a arte do dese­

nho de produção. C C - Q

UMA NOITE NA OPERA (1935)

(A NIGHT AT THE OPERA) i a muito jovem, não tinha mais de 10 anos de idade, quando entrei em um cinema

na França para assistir a Uma noite na ópera - ou, mais precisamente, fui levado por

l l g u m adulto que sabia tão pouco quanto eu sobre os Irmãos Marx. Nessa idade, ler as

iidas ainda era muito difícil para m i m , especialmente com aquele sujeito de bigode

c charuto gritando palavras para a platéia como uma metralhadora enlouquecida. No

entanto, tive muito pouco tempo para me preocupar com esse problema: logo eu

(Stava deitado no chão, rindo tanto, de forma tão incontida e, se me permitem, tão

nhsofuta que passei a maior parte do filme lá, entre os assentos. Desde então, tive o

piazer de rever Uma noite na ópera diversas vezes, juntamente com o restante das obras

ilos Irmãos Marx. Tenho conhecimento tanto da cronologia quanto da diversidade de

'.eus filmes, e sempre fiquei impressionado com o grau de excelência de suas perfor­

mances. Porém ainda sinto - no meu íntimo e também na pele - a incrível força

inventiva e transgressora que este filme em particular transmite.

Uma noite na ópera continua sendo uma comédia poderosa e fascinante, não tanto

por suas cenas principais, como a da multidão que se junta numa cabine de navio,

quanto por seus momentos mais simples: uma única palavra ou gesto empregado com

uma incrível noção de ritmo. Há muito a dizer sobre a maneira como as armas transgres­

soras dos três irmãos iniciam uma crise num espetáculo de ópera. O quarto Irmão, o

escada Zeppo, é inútil nesse processo. Croucho, com sua avalanche de palavras econtor-

1 ionismo; Harpo, com seu silêncio sobrenatural e poder de destruição infantil: Chico,

com sua virtuosidade e "ethos estrangeiro" - todos servem para tumultuar uma ópera

baseada na repulsa à arte, à ganância e à corrupção. Esses elementos existem e são, sem

dúvida, interessantes, porém eles ficam atrás da seguinte característica, mais óbvia:

Uma noite na ópera foi, e continua sendo, um filme engraçadíssimo. J - M F

EUA(MGM)96min. P&B

Idioma: inglês / italiano

Direção: Sam Wood

Produção: IrvingThalberg

Roteiro: James Kelvin McCuInneSI,

George S. Kaufman

Fotografia: Merritt B. Gerstad

Música: Nacio Herb Brown, w.ihei

Jurmann, Bronislau Kapcr, H e r d e i i

Stothart

Elenco: Groucho Marx, Chico M.n •

Harpo Marx, Kitty Carlisle, Allan

Jones, Walter Woolf King, Slg Rumin,

Margaret Dumont, Edward Ke.uie,

Robert Emmett O'Connor

Inglaterra (Gaumont British) 86 min.

I'&B

Idioma: inglês

Direção: Alfred Hitchcock

i n . d m .10: Michael Balcon, Ivor Montagu

Hoteiro: Charles Bennett, baseado no

llvin dr John Buchan

•OtOgrafla: Bernard Knowles

Muvica: Jack Beaver, Hubert Bath

1 Irnco: Robert Donat, Madeleine ' II, I ucle Mannheim, Godfrey Ip.irle, I'eggy Ashcroft, John Laurie, I li'lcn Haye, Frank Cellier, Wylie w . i i M i n , Gus McNaughton, Jerry

VIM no, I'eggy Simpson

OS 39 DEGRAUS (1935)

(THE 39 STEPS)

v v -~~—

Após várias tentativas iniciais e alguns pequenos avanços, Os 39 degraus foi o primeiro

exemplo claro de excelência criativa dentro do período inglês de Alfred Hitchcock,

podendo ser considerado o primeiro filme completamente bem-sucedido de uma obra

que ganhava corpo com rapidez - tendo começado no fim da era muda, na época de Os

39 degraus ele já havia dirigido 18 filmes. Depois de alcançar sucesso de bilheteria e de

critica, Hitchcock solidificou ainda mais sua reputação de mestre do cinema ao

embarcar em uma série praticamente sem paralelos de thrillers cativantes e divertidos,

que se estenderia por várias décadas. E, de fato, é fácil notar que muitos de seus filmes

mais populares - Intriga internacional (1959), por exemplo - bebem na fonte desta

pérola do início de sua carreira.

Dentre suas várias conquistas notáveis, Os 39 degraus apresentou um elemento

hitcheockiano básico: a noção do homem errado, o espectador inocente acusado, per­

seguido ou punido por um crime que não cometeu.

(O diretor voltaria diversas vezes a esse tema, mais

abertamente no seu fi lme de 1956, O homem errado.)

Richard Hannay (Robert Donat), um canadense de fé­

rias na Inglaterra, conhece uma mulher que mais tarde

é assassinada sob circunstâncias misteriosas. A partir

daí, o personagem entra em uma trama de espiona­

gem envolvendo algo chamado de "os 39 degraus" e

percebe que, uma vez ciente disso, somente ele pode

evitar um desastre. Algemado a uma cúmplice femini­

na que o acompanha a contragosto (Madeleine Carroll),

Hannay precisa fugir da polícia e de um arquivilão com

um dedo a menos que o persegue, além de ter que re­

solver o mistério do título antes que seja tarde demais.

Como de hábito, em se tratando de Hitchcock, a

revelação do que são de fato "os 39 degraus" - e, na

verdade, toda a trama de espionagem - é quase peri­

férica diante da interação repleta de flertes entre os

protagonistas. Literalmente presos um ao outro em

uma provocativa paródia do casamento, Donat e

Carroll enchem seus diálogos belicosos de pequenas

indiretas - quando a perseguição lhes dá um tempo

para respirar, é claro - , transformando este thriller de

espionagem na mais improvável das histórias de amor.

O fi lme, como o relacionamento dos dois, segue em

um ritmo frenético, uma série ininterrupta de seqüên­

cias de ação e cenas de perseguição pontuadas por

diálogos espirituosos e um suspense cativante. JKl

A NOIVA DE FRANKENSTEIN (1935)

(BRIDE OF FRANKENSTEIN) 1 L idios da Universal tiveram de esperar quase quatro anos até James Whale

l i iulmente aceitar a oferta de dirigir a seqüência de Frankenstein, seu sucesso de

bilheteria de 1931. No entanto, a espera valeu muito a pena: sob o controle quase irres-

11 lio do diretor (o produtor, Carl Laemmle Jr., estava de férias na Europa durante a maior

1 da produção), A noiva de Frankenstein é uma surpreendente mistura de terror e

Comédia que acabou sendo, em muitos aspectos, superior ao original.

Apesar da relutância de Boris Karloff, foi decidido que o Monstro deveria ser capaz

(l( 111 onunciar algumas poucas palavras. Sua humanização aqui o deixa mais completo

I fiel ao romance de Mary Shelley, e dificilmente sua busca desesperada por uma

Companheira poderia ser mais tocante. De um modo geral, embora Isso tenha sido

mizado a pedido dos censores, A noiva de Frankenstein representa o Monstro como

.1 figura aos moldes de Cristo, levada a matar pelas circunstâncias e pelo medo que

Inspira na sociedade. Mesmo a monstruosa companheira feita especialmente para ele

, à primeira vista, repulsa pela sua aparência física. Sem dúvida, a noiva interpre-

i.iil.i por Elsa Lanchester continua sendo até hoje uma das mais impressionantes

• 11, i iuras já vistas nas telas: sua aparição - numa espécie de versão grotesca de uma

( 1 1 imônia de casamento - é ainda um dos pontos altos do gênero terror, com o corpo

mumificado; a voz sibilante, como um canto de cisne; e o estranho penteado egípcio

preto com mechas brancas.

A trama de A noiva de Frankenstein se sustenta em contrastes que fazem o espec-

i.nlor passar do terror para o pathos ou a comédia. O senso de humor peculiar de Whale,

que foi multas vezes definido como burlesco, é veiculado principalmente por Minnie

(una O'Connor), a empregada doméstica, c também pela atuação descaradamente

.i lrminada de Ernest Theslger, que interpreta a figura demoníaca do Dr. Pretorius.

O imenso interesse despertado por A noiva

1 I 1 ' Frankenstein deriva também da sua repre­

sentação das relações sexuais, considerada por

muitos, no mínimo, potencialmente transgres­

sora. A introdução de um segundo cientista

louco (Pretorius), que força o Henry Frankens-

tein de Colin Clive a gerar vida novamente,

enfatiza uma das implicações fundamentais e

perturbadoras do mito de Shelley: a (procria­

ção é algo alcançado apenas pelo homem.

Quatro anos depois, a própria obra-prima de

Whale deu à luz um "filho"; no entanto, o pai

da noiva não teve nada a ver com isso. FL

EUA (Universal) 75 min. P&B

Direção: James Whale

Produção: Carl Laemmle Jr., James

Whale

Roteiro: William Hurlbut, John L

Balderston

Fotografia: John J. Mescall

Música: Franz Waxman

Elenco: Boris Karloff, Colin Clivc,

Valerie Hobson, Elsa Lanchester,

Ernest Thesiger, Gavin Gordon,

Douglas Walton, Una O'Connor, E. [

Clive, Lucien Privai, O. P. Heggie,

Dwight Frye, Reginald Barlow, Mary

Gordon, Anne Darling

Indicação ao Oscar: Gilbert Kurlani

(som)

EUA (RKO) 101 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Mark Sandrich

Produção: Pandro 5. Berman

Roteiro: Allan Scott, Dwight Taylor

i mografia: David Abel

Música: Irving Bêrlin, Max Steiner

Elenco: Fred Astaire, Clnger Rogers,

I dward Everett Horton, Erik Rhodes, 1 IÍI Hlore, Helen Broderick

Indicação ao Oscar: Pandro S. I'•!'iiii.in (melhor filme), Carroll Clark,

v.in Nest Polglase (direção de arte),

living Berlin (música), Hermes Pan (coreografia)

0 PICOUIMO (1935) (TOP HAT) Não há nenhum clássico absoluto entre os musicais da década de 30 da dupla Fred

Astaire-Cinger Rogers - todos são, no geral, maravilhosos, embora tenham defeitos

cruciais - , mas O picolino é provavelmente o que chega mais perto disso. Sua trama

segue a fórmula básica da série de filmes: Fred Astaire se apaixona à primeira vista poi

Ginger, mas algum tolo mal-entendido (aqui, ela o confunde com seu amigo casado) .1

mantém hostil até os últimos instantes.

O diretor é o subestimado Mark Sandrich, cujo toque impecavelmente superficial

maximiza a sofisticada malícia tão essencial à série. O mais famoso número do filme é

"Top Hat", que conta com uma fantástica coreografia com bengalas entre Fred e um

coro de homens de cartola; porém o coração de O picolino está em dois grandes duetos

românticos: "Isn't It a Lovely Day" e "Cheek to Cheek", o primeiro passado em um co­

reto em Londres durante uma tempestade e o segundo, nos brilhantes canais da pueril

versão art déco de Veneza dos estúdios RKO. Essas danças, com sua progressão da

relutância para a entrega, são a principal arma que Fred usa para ganhar Ginger; porém

seria um erro interpretar esse processo como mera conquista sexual. Conforme o diver­

timento que Ginger esconde deixa claro, os dois personagens lidam com seus res­

pectivos papéis de galã apaixonado e moça que se faz de difícil com brincalhona Ironia,

ajudando a prolongar e intensificar um deliciosamente elegante jogo erótico. MR

1 rança (Pantheon) 40 min. P&B

Idioma: francês

Direção: Jean Renoir

Produção: Pierre Braunberger

Roteiro: Jean Renoir, baseado no

tonto de Guy de Maupassant

Fotografia: Jean Bourgoin, Claude

Renoir

Música: Joseph Kosma

Elenco: Sylvia Bataille, Georges St.

Saens, Jeanne Marken, André

d.ibriello, Jacques B. Brunius, Paul

lemps, Gabrielle Fontan, Jean Renoir,

Marguerite Renoir

UM DIA NO CAMPO (1936) (UNE PARTIE DE CAMPAGNE) Um dos mais poderosos e perturbadores recursos do cinema de ficção é o epílogo no

formato "anos depois", que geralmente nos leva, com uma amarga tristeza, do tempo

em que se passa a história, durante o qual tudo ainda era possível, para o destino

inescapável que se seguiu a ele. No final de Um dia no campo, de Jean Renoir, Henriette

(Sylvia Bataille) é mostrada em um casamento infeliz com o homem que era seu noivo

no início do fi lme, o Insosso balconista Anatole (Paul Temps). No entanto, entre esses

dois pontos, nada parece muito decidido ou resolvido.

Adaptado de um conto de Guy de Maupassant, o filme não foi concluído na forma

originalmente vislumbrada por Renoir. Ele permanece, contudo, uma pérola que se

sustenta por seus próprios méritos. A ação central se concentra na união ilegal de dois

aventureiros locais, Rodolphe (Jacques Bruníus) e Henri (Georges St. Saens), com

Henriette e sua mãe, Juliette (Jeanne Marken). Renoir constrói um soberbo diagrama de

contrastes entre esses personagens: Rodolphe e Juliette são lascivos, frívolos, enquanto

Henri e Henriette são sufocados por emoções sombrias. Assim, o que começou, nas

palavras de Henriette, como "uma espécie de vago desejo", que evoca tanto a beleza

quanto a crueldade da natureza, termina mal, à medida que "os anos passam, com seus

sábados e domingos iguais em sua melancolia". AM

TEMPOS MODERNOS (1936) (Ml)HFRN TIMES)

demos foi o último filme em que Charles Chaplin fez o papel de Carlitos,

e m que ele criara em 1914 e que lhe trouxe fama e carinho universais. Nesse

íeinpo, o mundo havia mudado. Quando Carlitos nasceu, o século XIX ainda

rnximo. Em 1936, com o mundo ainda sob os efeitos da Depressão, ele confron-

nsiedades que não diferem tanto daquelas do século XXI: pobreza, desemprego,

lura-greves, intolerância política, desigualdade econômica, a tirania das

N t l q u l i u s e os narcóticos.

iam os problemas que passaram a preocupar de fato Chaplin no decorrer de

i ie mundial de 18 meses de duração em 1931-1932, período em que observou a

i-iM ,io nacionalismo e os eleitos sociais da Depressão: o desemprego e ,1

11,,10. Em 1931, ele declarou numa entrevista a um jornal: "O desemprego é a

d questão... as máquinas devem beneficiar a humanidade, e não causat

Ifigrill.is e tirar dela o trabalho."

i rimando essas questões sob o foco da comédia, Chaplin transforma Carlitos em

milhões de peões de fábrica espalhados pelo mundo. Ele primeiro surge como

erário enlouquecido por seu trabalho monótono e desumano na esteira de uma

linha .lê produção e sendo usado como cobaia de uma máquina para alimentar os tra-

i e s enquanto eles exercem suas funções. Casualmente, Carlitos encontra um

r.iiihciro na sua batalha nesse novo mundo: uma jovem (Paulette Goddard) cujo pai

MI em uma greve e que se une a Chaplin. Os dois não são rebeldes nem vítimas,

u Chaplin, mas "apenas duas almas vivas em um mundo de autômatos",

i i i época do lançamento de Tempos modernos, os filmes falados já existiam havia

uma década. Chaplin cogitou usar diálogos e chegou até a preparar um roteiro,

ni.e. leionheceu, no f im das contas, que Carlitos dependia da pantomima do cinema

l i n um momento, no entanto, sua

" I ouvida, quando, ao ser contratado co-

M garçom cantante, ele improvisa uma can-

i.aii e m uma maravilhosa embromação de

Italiano.

cbldo em quatro "atos" - cada qual

•Ufvalente a uma de suas antigas comédias

dr dois rolos - , Tempos modernos mostra

1 hiplln ainda em seu ápice, imbatível como

1 i i a i l o r de comédias visuais. O filme resiste,

m i mínimo, como um olhar sobre a sobrevi-

• I I . i a humana nas circunstâncias indus-

111 a s . econômicas e sociais do século XX e,

1 llvez, do século XXI. DR

EUA (Charles Chaplin, United Artists)

87 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Charles Chaplin

Produção: Charles Chaplin

Roteiro: Charles Chaplin

Fotografia: Ira H. Morgan, Roland

Tot he roh

Música: Charles Chaplin Elenco: Charles Chaplin, Paulette Goddard, Henry Bergman, Tiny Sandford, ehester Conklin, Hank Mann, Stanley Blystone, AI Ernest Garcia, Richard Alexader, Cecil Reynolds, Mira McKInney, Murdock MacQuarrle, Wilfred Lucas, Edw.ml LeSaint, Fred Malatesta

EUA (RKO) 103 min. P&B

Direção: George Stevens

Produção: Pandro S. Berman

Roteiro: Erwin Gelsey, Howard

Lindsay, Allan Scott, baseado no

ronto "Portrait of John Garnett", de

Llwin Gelsey

Fotografia: David Abel

Música: Jerome Kern, Dorothy Fields

Elenco: Fred Astaire, Ginger Rogers,

Victor Moore, Helen Broderick, Eric

Wore, Betty Furness, Georges Metaxa

Oscar: Jerome Kern, Dorothy Fields

(música)

Indicação ao Oscar: Hermes Pan

(coreografia)

RITMO LOUCO (1936) (SWING TIME) Uma fantasia de música e dança. Ritmo louco, de George Stcvens, é um espetai iiln

audiovisual que gira em torno dos bastidores de um musical. Certamente um marcol

para os meados da década de 30, o filme é também uma prévia do que a parceria entio

Fred Astaire e Ginger Rogers ainda levaria às telas.

Idealizado por Pandro S. Berman, o lendário produtor da RKO, Ritmo louco coni.i .1

história de Lucky Garnet, um renomado sapateador noivo da simpática, porém deslnle

ressante Margaret Watson (Betty Furness). Quando ele é forçado a arranjar um vultoso

dote para manter seu noivado, os planos matrimoniais do casal são colocados em sus

penso para que Lucky possa correr atrás da fortuna na cidade de Nova York. Uma vez I I ,

ele conhece Penny (Ginger Rogers), seu verdadeiro amor, e daí em diante o filme engen

dra uma série de contratempos até permitir que os dois caiam um nos braços do outro,

Naturalmente, há várias cenas de mal-entendido, algumas viradas nâo-trágicas n.i

trama e um final feliz, a despeito dos breves instantes de tristeza e angústia. No entan­

to, o propósito do filme é, inegavelmente, apresentar seus números musicais, muitos

dos quais fazem parte do cânone do gênero. Jerome Kern escreveu as músicas, com .1

maioria das letras a cargo de Dorothy Fields. Seus esforços combinados formam os ali

cerces da trilha sonora, embora a puia energia, a vivacidade e a alegria de Astaire e Ro­

gers sejam o que faz cada número brilhar com o acréscimo de movimento e sapateado.

Dentre os pontos altos estão os dois solos de Lucky em "The Way You Look lo

night", um clássico dos clubes noturnos, e "Never Gonna Dance", uma canção triste que

soa irônica, dada a célebre capacidade do ator de andar no ar. Dois duetos enriquecem

esta pintura cinematográfica em "Waltz in Swing

Time", com Astaire e Rogers, e, é claro, a famosa

performance da dupla em "A Fine Romance". Po­

rém a canção "Bonjangles of Harlem" pode ser

considerada o ápice do filme: nela, Lucky começa

sua performance dentro de um coro de fundo,

com o rosto pintado de preto. Definitivamente

uma homenagem às suas origens - ainda que

também um exemplo antiquado e potencialmen­

te ofensivo de história cultural - , o número cresce

até um clímax em que um Astaire triplicado dança

com projeções dele mesmo. C C - 0

l.'f,

IRENE, A TEIMOSA (1936) (MV MAN GODFREY) i n u m u m dos mestres do género das sofisticadas comédias de salão, Gregory La Cava

pnili n.io ter tido a consciência social mais pulsante da Hollywood da década de 30. No

o, seu talento para a sátira de cunho social c político fica claro em filmes como

>ver the White House (1933), S/ic Married Hcr lioss (1935) e, principalmente, Irene, a

i, sua obra mais notável. Produzido no fim da Depressão, este clássico das

is escrachadas apresenta o mendigo Godfrey (William Powcll) sendo contratado

iiordomo, como parte de uma brincadeira feita por um grupo de figurões da Park

Alguns diálogos afiados depois, ele assume total controle da casa dos ricaços,

1.1 a bela Irene (Carole Lombard), revela que o amante Idiota da mãe (que é

1 llamado de "protege" por conta do Código de Produção) é um vigarista e ajuda o pai

i . i l i i ir.rnto a evitar a falência e uma prisão por fraude.

1 i iv is ivelmente, a trama revela que o próprio Godfrey estava apenas se fazendo

r 1 „11 por mendigo quando o grupo de ricaços o encontrou para poder se casar com a

ilite dos seus sonhos. No entanto, a essa altura a classe dominante já desfilou

• li 11 iif• da câmera como um bando de idiotas narcisistas c infantis. Sem dúvida, esse foi

los motivos do sucesso do filme entre as platéias da época. Irene, a teimosa perde

ouço da sua acidez na segunda metade, quando os ingredientes de contos de

issumem o controle e terminam o filme com uma mensagem boba: o dinheiro

ludo! Porém mesmo então ele consegue cativar através da pura Inteligência do

leiro espirituoso, escrito pelo romancista Eric Hatch em parceria com Morrie

ni. Ele carrega a marca de um legítimo grande filme ao não ter uma só linha de

1 ruim ou um personagem fraco que seja. Às vezes, o ritmo de La Cava é de uma

<' ini idade impressionante, levando duelos verbais alucinados a quase todas as cenas e

IH ih/ando uma economia narrativa de forma tão natural que o filme poderia servir de

1'ii iniiipo para o cinema clássico de Hollywood. Embora tenha estreado quase 70 anos

Irene, a teimosa ainda se sustenta de forma notável e poderia facilmente ser re-

fllmado para qualquer tipo de público. MT

EUA (Universal) 94 min. P&B

Direção: Gregory La Cava

Produção: Gregory La Cava, Charles l<

Rogers

Roteiro: Eric Hatch, Morrie Rysklnd,

baseado no livro de Eric Hatch

Fotografia: Ted Tetzlaff

Música: Charles Previn, Rudy

Schrager

Elenco: William Powell, Carole

Lombard, Alice Brady, Gail Patrick,

Eugene Pallette, Alan Mowbray, J is in

Dixon, Molly, Mischa Auer, Carlo,

Robert Light, Pat Flaherty

Indicação ao Oscar: Gregory 1.1 ( , iv , i

(diretor), Eric Hatch, Morrie Rysklnd

(roteiro), William Powell (ator),

Mischa Auer (ator coadjuvante),

Carole Lombard (atriz), Alice Brady

(atriz coadjuvante)

1-7

EUA (Columbia) 115 min. P&B

Direção: Frank Capra

Produção: Frank Capra

Roteiro: Clarence Budington Kelland.

Robert Rlskin

Fotografia: Joseph Walker

Música: Howard Jackson

Elenco: Gary Cooper, Jean Arthur,

George Bancroft, Lionel Stander,

Douglas Dumbrllle, Raymond

Walburn, H. B. Warner, Ruth

Donnelly, Walter Catlett, John Wray

Oscar: Frank Capra (diretor)

Indicação ao Oscar: Frank Capra

(melhor filme), Robert Rlskin

(loteiro), Gary Cooper (ator), John P.

I Ivadary (som)

0 GALANTE MR. DEEDS <1936) (MR. DEEDS GOES TO TOWN) Este filme Inventou a comédia escrachada e solidificou a visão do diretor amerlca

Frank Capra da vida americana, tendo por base uma cidade pequena e valores tradlcI

nais contra a sofisticação egoísta da cidade grande.

Longfellow Deeds (Gary Cooper) é um poeta de Vermont cuja vida muda quando

recebe a herança de um tio multimil ionário. Os advogados de seu tio (acostumado

fraudar contas em benefício próprio) tentam convencê-lo a mantê-los no empir

Porém, depois de uma série de desventuras e uma viagem a Manhattan, Deeds se i n

vence de que o dinheiro não lhe fará bem e tenta repassá-lo a uma comunidade 111

para fazendeiros desapropriados. Os advogados o levam ao tribunal, afirmando que

está louco. Um elemento essencial para a subseqüente libertação de Deeds é Ba

Bennett (Jean Arthur), uma repórter que a princípio explora a ingenuidade do calpl

para escrever matétlas cruéis sobre o "Homem Cinderela". Babe, no entanto, é tran

formada pelo idealismo de Deeds, e seu testemunho coloca o tribunal a favor dele.

Repleto de momentos cômicos brilhantes (Deeds tocando tuba para clarear

idéias, oferecendo donuts para os cavalos), O galante Mr. Deeds é uma ode ao antima

riallsmo e à vida simples do campo no melhor estilo Henry David Thoreau. RBP

A DAMA DAS CAMÉLIAS (1936)

(CAMILLE) i.r. camélias, de George Cukor, é um dos triunfos do início do cinema sonoro,

IH 1111' para as atuações fabulosas dos protagonistas Greta Garbo e Robert Taylor,

In l o m o apoio dos habilidosos coadjuvantes do estúdio Lionel Barrymore e

l ln i iv 1 i.iniell. Cukor evoca na medida certa a Paris da metade do século XIX para tornar

l i e .1 estilização melodramática daquela que é, talvez, a mais famosa peça

l i escrita, adaptada para o teatro por Alexandre Dumas Filho, a partir de seu

•••li.il romance. Com seus diálogos espirituosos e sugestivos, o roteiro dá vida

IHt prisunagens do escritor para uma platéia americana de outra era.

ler i te Gautier (Garbo), que é chamada de Camille por conta de sua paixão

lias, é uma "cortesã" que se apaixona pelo seu "companheiro", Armand

i.iylor), herdeiro de uma família Influente. O relacionamento dos dois, que

nideria ser legitimado por conta do passado duvidoso dela, precisa terminar, o

! 1 e m duas cenas famosas e adoradas por atrizes de todas as épocas. Primeiro,

Armand convence Camille de que ela deve desistir de seu filho para que este

r.uir a carreira diplomática. Com o coração partido, ela rejeita Armand com a

de que não se interessa mais por ele. Armand volta mais tarde para descobri-la

leito de morte, no qual ela falece enquanto ele chora copiosamente. O Breen

( l l l l i e , M",ponsãvel pela aplicação do reacionário Código de Produção da época, tam-

e ler se sensibilizado com a história, exigindo o corte de apenas uma cena na

MI lomântico, tecnicamente "ilícito", troca juras de amor eterno. RBP

EUA (MGM) 109 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: George Cukor

Produção: David Lewis, Bernard H.

Hyman

Roteiro: Zoe Akins, baseado no livro

e na peça A dama das camélias, de

Alexandre Dumas Filho

Fotografia: William H. Daniels. Kail

Freund

Música: Herbert Stothart, Edward

Ward

Elenco: Greta Garbo, Robert Taylor,

Lionel Barrymore, Elizabeth Allan,

Jessle Ralph, Henry Danlell, Leu

Ulric, Laura Hope Crews, Rex

0'Malley

Indicação ao Oscar: Greta Garbo

(atriz)

SABOTAGEM (1936)

(SABOTAGE) p d I liichcock tinha acabado de fazer um filme chamado O agente secreto, baseado

nus escritos por W. Somcrset Maugham; portanto, seu próximo projeto, baseado

. i n c e homônimo de Joseph Conrad, teve que ser reintítulado Sabotagem. Oskar

Ika é o Sr. Verloc, um sinistro agente de uma nebulosa potência estrangeira que

I ui.i atos de sabotagem. Diferentemente do romance original, Verloc e sua esposa

11 Sldney) são donos de um pequeno cinema, o que permite a Hitchcock se divertir

hm < 1 .indo acontecimentos da narrativa aos filmes que passam na tela.

•iiliotagem possui duas seqüências memoráveis. Na primeira, Stevie (Dcsmond

Mei), irmão mais novo da Sra. Verloc, é enviado pelo marido desta para entregar uma

1.1 de filme. Sem que Stevie saiba, ela contém uma bomba programada para explodir

' 1 1 1 , . À medida que acompanhamos Stevie por Londres, uma série de contratempos

Itrtsa e a bomba acaba explodindo enquanto ele está sentado em um ônibus.

1.111 nck se arrependeu disso mais tarde, julgando que se tratava de uma violação do

• li i . i in do diretor com o espectador - não causar mal a um personagem com o qual

nu levado a simpatizar - , embora tenha acabado fazendo a mesma coisa em Psicose

i i . i i ) . De qualquer forma, a morte de Stevie engendra a segunda seqüência brilhante:

• HSSlnato por vingança de Verloc por sua mulher. EB

Inglaterra (Gaumont British) /(> iiiin

P&B

Idioma: inglês

Direção: Alfred Hitchcock

Produção: Michael Balcon, Ivoi

Montagu

Roteiro: Charles Bennett, Ian Hay,

Helen Simpson, E. V. H. Emmett,

baseado no livro O agente secreto, de

Joseph Conrad

Fotografia: Bernard Knowles

Música: Louis Levy

Elenco: Sylvia Sidney, Oskar

Homolka, John Loder, Desmond

Testerjoyce Barbour, Matthew

Boulton, S. J. Warmington, William

Dewhurst

EUA (Samuel Goldwyn) 101 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: William Wyler

Produção: Samuel Goidwyn, Merrltt

Hulburd

Roteiro: Sidney Howard, baseado no

livro de Sinclair Lewis

Fotografia: Rudolph Maté

Elenco: Walter Huston, Ruth

( hatterton, Paul Lukas, Mary Astor,

David Nlven, Gregory Gaye, Maria

Ouspenskaya, Odette Myrtil, Spring

Hylngton, Harlan Briggs, Kathryn

Marlowe, John Payne

Oscar: Richard Day (direção de arte)

Indicação ao Oscar: Samuel

doldwyn, Merritt Hulburd (melhor

Ulme), William Wyler (diretor), Sidney

Howard (roteiro), Walter Huston

(ator), Maria Ouspenskaya (atriz

coadjuvante), Oscar Lagerstrom

(som)

FOGO DE OUTONO (v.m (DODSWORTH) A cativante adaptação de William Wyler do romance de Sinclair Lewis sobre a desintegiai,Au

do casamento de um casal americano rico representa o auge da produção clnematogialli .1

inteligente de Hollywood. Walter Huston interpreta o personagem do título original, um

magnata da indústria automobilística que, depois de vender seu negócio, precisa em .11.11

os desafios de uma aposentadoria opulenta e decide fazer uma grande viagem pela Euiiipj

com sua esposa, Fran (Ruth Chatterton). Eles deixam os Estados Unidos para conhecer I

cultura e o refinamento do velho continente. Na Europa, os dois descobrem que desejam

coisas diferentes da vida, embora ambos, cada um ao seu modo, queiram protelar a

velhice. Fran começa a flertar com os playboys que rondam o meio dos ricos e sofisticado*,

mostrando-se cada vez mais impaciente com a postura inflexivelmente americana e

provinciana de Dodsworth. Ele, por sua vez, não consegue se reconciliar com Fran e tem

medo desesperado de se tornar inútil. Durante a viagem, eles conhecem Edith Cortrlghl

(Mary Astor), uma americana expatriada que encontrou uma nova maneira de viver sem

perder o vigor, c pode oferecer uma solução para Dodsworth.

Os aspectos mais extraordinários do filme são sua complexidade moral e seu tom

agridoce. Wyler tem o cuidado de não retratar Fran apenas como vilã. Somos levados .1

compreender tanto o marido quanto a mulher e a sentir empatia pelos dois. Alguns dos

momentos mais pungentes de Fogo de outono se dão quando Fran percebe que a vida que

ela vinha tentando criar está desmoronando ao seu redor. Huston, que foi indicado para o

Oscar de Melhor Ator, está Impecável nesse papel abrangente. Seu personagem começa

como um confiante magnata que se fez sozinho e se transforma em um senhor de idade,

deprimido e mais reflexivo. Huston transmite essas mudanças em uma atuação introspec

tiva e desoladora. Astor, David Nivcn multo jovem e cheio de vida, e Maria Ouspenskaya

estão maravilhosos em papéis coadjuvantes. Na época atual, em que o todo o clnemão

americano parece estar voltado para as preferências de garotos de 14 anos, Fogo de outono

é um lembrete bem-vindo de que Hollywood um dia fez filmes para adultos. RH

DAQUI A CEM ANOS (1936) (IIIliMGS TO COME)

para as telas de Will iam Cameron Menzies das especulações de H. G. Wells

inlm H luiuro do mundo depois que uma desastrosa Segunda Guerra Mundial arrasa a

> ' européia talvez seja o primeiro filme de ficção científica de verdade. Antes

nas Metrópolis (1926), de Fritz Lang, traz a mesma visão do futuro como

ncia das mudanças tecnológicas e da evolução política resultante delas. No

' i filme de Lang não oferece, como aqui, uma análise detalhada do novo curso

loria pode vir a tomar. Na realidade, poucos filmes de ficção científica se

fMem i i | i . i m , como Daqui a cem anos, em mostrar uma profecia fictícia dentro de uma

111 rigorosamente histórica. Isso talvez se dê pelo fato de o próprio Wells ter

H roteiro, baseando-se em idéias presentes em sua popular obra História

( W W r - . u l .

1 m i o Wells quanto Menzies não se interessaram em criar uma narrativa sustentada

onagens (todos os protagonistas representam Idéias importantes), de modo

1 muitos, o filme parece frio e desinteressante, uma Impressão exacerbada pelo

1 rama abranger um século inteiro da História. A segunda guerra européia dura

I onsegue destruir a maior parte do mundo, que retorna a algo parecido com

I' ii mi i h , m o sem lei do começo da Idade Média. O progresso humano, no entanto, é

el, graças ao fato de que o elemento intelectual e racional do homem sempre se

11 1 iiperlor ao seu impulso inato para a autodestruição. Assim, Derqui rr cem anos

uma interpretação mais otimista da teoria de Freud sobre o eterno conflito

e Tanatos, amor e morte, nas relações humanas. Como muitos escritores

. Wells vê o futuro marcado significativamente pelo controle do homem sobre

H e . As seqüências finais do filme, como em Metrópolis, são dominadas pelas

de uma cidade futurista. É na maneira como Menzies Ilda com esses aspectos

<tii|i MI eh micos e de desenho de arte do filme que está sua mais importante e reveladora

1 i initllniição. Apesar da narrativa em episódios, Daqui a cem anos é visualmente espe-

1 H um precursor de outras obras de ficção científica que imaginam um futuro

entre elas Blade Runner, o caçador de andróides, de Ridley Scott.

II da presença de atores bem conhecidos (incluindo Raymond Massey, Cedric

h l e e Ralph Richardson), 0 que é mais notável neste filme incomum é seu com

11 com uma filosofia histórica e com a natureza humana. Ele retrata as ansie-

esperanças da Inglaterra da década de 30 com perfeição, prevendo de forma

I m i e o ataque que recairia sobre Londres apenas quatro anos depois do seu lan-

RBP

Inglaterra (London) 100 min. P&B

Direção: William Cameron Menzies

Produção: Alexander Korda

Roteiro: H. G. Wells, baseado no seu

livro The Shape of Things to Coma

Fotografia: Georges Périnal

Música: Arthur Bliss

Elenco: Raymond Massey, Edward

Chapman, Ralph Richardson,

Margaretta Scott, Cedric Hardwicke,

Maurice Braddell, Sophie Stewart,

Derrick De Mamey, Ann Todd, Pearl

Argyle, Kenneth Villiers, Ivan Brandi,

Anne McLaren, Patricia Hi I Hard,

Charles Carson

França (Cinéas) 85 min. P8tB

idioma: francês

Direção: Sacha Guitry

Produção: Serge Sandberg

Koteiro: Sacha Guitry

Fotografia: Marcel Lucien

Música: Adolphe Borchard

Elenco: Sacha Guitry, Marguerite

Moreno, Jacqueline Delubac, Roger

Duchesne, Rosine Deréan, Elmire

V,nu ici, Serge Grave, Pauline Carton,

I ichel, Pierre Labry, Pierre Assy, Henri

l'Ieifcr, Gaston Dupray

LE ROMAN D'UN TRICHEUR 1 1 9 3 5 )

(A HISTÓRIA DE UM TRAPACEIRO) Apontado por muitos como a obra-prima de Sacha Guitry (embora seja rivalizadu pui

Les Per/es de la Couronne, de 1937), este tour de force de 1936 pode ser consideradi >

espécie de veículo para o tipo especial de inteligência arredia do roteirista / diretor /

ator. Depois da seqüência dos créditos que nos apresentam o elenco e a equipe, Ir H11

man d'un Tricheur entra em um flashback que conta como o herói do título (inlrt

pretado pelo próprio Guitry) aprendeu a se beneficiar de trapaças no decorrer da vida

Um cineasta notoriamente anticinemático cuja primeira paixão foi o teatro, Gulliv,

no entanto, tinha talento para extravagâncias cinematográficas quando se tratava dl

adaptar suas peças (no caso, seu romance Memoirs d'un Tricheur) para as telas Li

Roman d'un Tricheur pode ser visto como um filme mudo cheio de vigor e de uma inven­

tividade estllosa, que tem como narrador o personagem de Guitry. François Truffam \c

impressionou a ponto de chamar o diretot de irmão francês de Ernst Lubitsch, emhni 1

Guitry difira claramente desse mestre do romance continental no sentido de que sul

própria personalidade sempre se sobrepõe à dos seus personagens. JS

f u a (MGM) 115 min. P8cB

Direção: Victor Fleming

Produção: Louis D. Lighton

Hotciro: Marc Connely, John Lee

M.1I1111, Dale Van Every, baseado no

I IVI I I de Rudyard Kipling

Fotografia: Harold Rosson

Musica: Franz Waxman

Elenco: Freddie Bartholomew,

Spencer Tracy, Lionel Barrymore,

Melvyn Douglas, Charley Grapewin,

Mil key Rooney, John Carradine,

I in .11 O'Shea, Jack La Rue, Walter

Klngsford, Donald Briggs, Sam

M i Daniel, Bill Burrud

Oscar: Spencer Tracy (ator)

Indicação ao Oscar: Louis D. Lighton

(melhor filme), Marc Connely, John

1 r r Malrin, Dale Van Every (roteiro),

I I i i i i i V l T O n (edição)

MARUJO INTRÉPIDO (1937)

(CAPTAINS COURAGEOUS) Rudyard Kipling, que morreu em 1936, não viveu o bastante para ver três de seus livros

adaptados para o cinema no ano seguinte, entre eles Marujo intrépido, o empolgante

épico infantil de Victor Fleming. Freddie Bartholomew interpreta Harvey Cheyne, um

menino rico mimado que, depois de tomar seis sorvetes, cal do transatlântico no qual

ele e o pai (Melvyn Douglas) estão viajando. Ele tem a sorte de ser resgatado por um

barco pesqueiro vindo de Gloucestet, cuja tripulação, que inclui o bem-intencionado

Manuel Fidélio (SpencerTracy), pouco se impressiona com sua riqueza e "posição". Hu­

milhado, Harvey tem que se virar sozinho, porém, sob a atenciosa tutela de Manuel, ele

aprende o valor do trabalho duro e do sucesso merecido. Antes de poderem voltar a tet-

ra firme, no entanto, Manuel morre em um acidente. Uma vez em terra, Harvey é rece­

bido pelo pai, mas prefere ficar com os pescadores. Contudo, depois de um tocante

funeral para seu amigo morto, pai e filho se reconciliam.

O astro infantil Bartholomew está excelente em um papel que exige que ele seja

tanto detestável quanto Irresistível. E Spencet Tracy, com o cabelo enrolado e o rosto

maquiado para ficar moreno, faz uma ótima Imitação de um marinheiro português.

Com humor, pothos e uma moral Interessante, este é um dos melhores fi lmes Infantis

já produzidos em Hollywood. AM

CANÇÃO DA NOITE (1937)

(YEBANGESHENG) B " i a n c e O fantasma da ópera, de Caston Leroux, inspirou uma série de filmes.

I onçâo da noite, de Ma-Xu Weibang, realizado em Xangai no ano de 1936, é indiscutivel-

nte um dos mais Inspirados de todos. Ma-Xu (1905-1961) começou no cinema como

desenhista de créditos, tornando-se em seguida desenhista de produção, ator e, por

Inn, diretor. Quando a era muda chegou ao fim, já contava com seis fi lmes. Canção da

fe/te foi seu segundo filme sonoro.

Canção da noite estabelece sua atmosfera sombria e sinistra desde o começo, com

I I hegada dos membros de uma companhia de ópera itinerante a um teatro caindo aos

pedaços, que eles descobrem estar abandonado e se deteriorando desde a suposta

1 le no local da grande estrela da ópera Song Danping, 10 anos antes. O jovem astro

d.i companhia está ensaiando sozinho no teatro quando ouve uma bela voz, que o

j|uda a cantar sua música. É, obviamente, o fugitivo Song Danping, agora terrlvelmen-

| l desfigurado, que se revela e conta sua história trágica, mostrada em flashback. Seu

o físico lhe foi infligido por ordem de um cruel senhor feudal, furioso com o amor

(eSong pela sua filha. Desde então, ele se esconde no teatro, esperando um cantor que

possa assumir seu papel e desempenhar sua grande criação operistica. O jovem cantor

I 1 olhldo para a tarefa, servindo também de mensageiro para a paixão perdida de

g, Li Xiaoxia, enlouquecida pela tristeza.

A diferença revolucionária entre esta versão e as versões ocidentais da obra de

I i i i i u x é que, aqui, o Fantasma deixa de ser uma ameaça sorrateira para se tornar um

protagonista empático e benevolente. Em todas as demais adaptações, a protegee do

1,miasma é uma cantora, de modo que ele é motivado pela inveja sexual que sente do

n o i v o dela. Mudando o s e x o desse personagem, Ma-Xu desenvolve relações mais com

pli ase ambíguas. Song vê o jovem como um substituto de si mesmo no seu amor por

II Xiaoxia, sentindo ciúmes no lugar dela ao descobrir que o rapaz tem uma namorada.

Tudo isso se passa em cenários de atmosfera rica, com o uso magistral de luz e

•., 1111 bra claramente Inspirado pelo cinema expressionista alemão. Um importante

elemento para o enorme sucesso do filme está nas canções, que são, até hoje, clássicos

populares na China. Em 1941, Ma-Xu foi obrigado a realizar uma seqüência, Ye Ban Ce

lheng Xu li, e o filme Inspirou duas refilmagens feitas em Hong Kong, Mid-Nightmare

[1962) e The Phanton Lover (1995). DR

China (Xinhua) 123 min. P&B

Idioma: mandarim

Direção: Ma-Xu Weibang

Produção: Shankun Zhang

Roteiro: Ma-Xu Weibang

Fotografia: Boqing Xue, Xingsan Yu

Música: Xinghal Xian (canção)

Elenco: Menghe Gu, Ping Hu, Shan

Jin, Chao Shi

França (R.A.C.) 114 min. P8cB

Idioma: francês / alemão / inglês

Direção: Jean Renolr

Produção: Albert Pinkovitch, Frank

Rollmer

Roteiro: jean Renolr, Charles Spaak

Fotografia: Christian Matras

Música: Joseph Kosma

Elenco: Jean Cabin, Dita Parlo, Pierre

I resnay, Erich von Stroheim,Julien

Carette, Georges Péclet, Werner

Florian, Jean Dasté, Sylvain Itklne,

Gaston Modot, Mareei Dalio

Indicação ao Oscar: Frank Rollmer,

Albert Pinkovitch (melhor filme)

Festival de Veneza: Jean Renoir

(contribuição artística), Jean Renoir,

indicação (Troféu Mussolini)

A GRANDE ILUSÃO (1937)

(LA GRANDE ILLUSION) Às vezes, somente diante dos horrores da guerra percebemos as coisas que todos temos

em comum. Essa ironia humanista é o conceito central por trás de A grande ilusão, a obra

prima de Jean Renoir, um filme que se passa durante a Primeira Guerra Mundial e enxerga

leviandade e fraternidade em um campo de prisioneiros alemão. O tenente Marechal

(Jean Gabin) e o capitão De Boeldieti (Pierre Fresnay) são dois oficiais franceses que lidam

com seus homens da melhor forma que a situação permite, sob o olhar vigilante do

educado comandante alemão von Rauffenstein (Erich von Stroheim). Eles desenvolvem

uma imagem espelhada na sociedade arlstrocática, que se baseia na honra e na ordem,

um sistema protocolar de respeito mútuo baseado por sua vez em anos de tradição.

No entanto, isso é apenas um oásis - ou, mais especificamente, uma mitagem - em

meio a um conflito devastador. Daí o título do filme: a grande ilusão é que, de alguma

forma, a classe e a formação desses oficiais os coloca acima da banalidade da guerra, na

qual as balas não sabem diferenciar uma linhagem da outra. Eles cavam Incansavelmente

um túnel para fugir, sem pensar que, assim que voltatem à liberdade, a falsa camarada­

gem incentivada pelo cárcere voltará a dar lugar à dura realidade da vida.

Um dos mais pungentes aspectos de A grande ilusão é a sensação de que os perso­

nagens centrais compreendem multo bem essa verdade, porém, subconscientemente,

desejam que as coisas sejam diferentes. Fica claro que o melancólico comandante de

von Stroheim gostaria de estar se socializando com os oficiais franceses sob outras

circunstâncias menos críticas. No campo de prisioneiros, Rosenthal (Matcel Dallo) é um

dos companheiras. Lá fora, é apenas um judeu, um chocante lembrete dos horrores

iminentes da Segunda Guerra Mundial. Os alemães proibiriam A grande ilusão durante

sua ocupação da França, tamanha a eficiência da sempre atual visão humanista do

fi lme. O fato de esta extraordinária obra de Renoir, com todos os seus personagens

memoráveis, temas instigantes e diálogos cativantes, ter corrido o risco de se perder

para sempre por conta de seu ponto de vista político é uma prova contundente do

poder do cinema e da capacidade da ficção de transmitir os tipos de verdades

profundas e orientações morais que usamos - e das quais necessitamos - para guiar

nossas vidas. JKI

STELLA DALLAS, MAE REDENTORA (1937)

(STELLA DALLAS) Itello Dallas, mãe redentora, de King Vidor, oferece um retrato vibrante e comovente de

i mulher proletária forte o bastante para se sacrificar em prol de uma melhor

io para sua filha na sociedade. O famoso romance de Olive Higgins Prouty já havia

ilmado com sucesso em 1925. Porém, ao contrário da versão muda de Henry King,

•dor tem a vantagem de contar com Barbara Stanwyck no papel de protagonista.

stanwyck interpreta Stella como uma mulher inabalável, glamourosa e inteligente.

I In il entender por que o bcm-succdido Stephen Dallas (John Boles) se interessa por ela

quando decide abandonar sua família c seguir seu caminho sozinho. No entanto,

I o depois do nascimento de Laurel (Anne Shirley), a filha dos dois, Stephen resolve

vuliar para sua antiga namorada. Stella cria Laurel sozinha, devotando a vida à felicida­

de da filha; contudo, na adolescência, Lautel se vê atraída pelo estilo de vida mais

In uoso do pai e passa a querer viver com ele. A princípio, Stella resiste à mudança, po-

l e i n acaba por ceder, forçando a filha a partir, fingindo estar entregue à bebida e não

mais desejar a companhia dela. Laurel se muda para a casa do pai e logo se casa com

Um playboy em uma cerimônia grandiosa que sua mãe, com lágrimas escorrendo pelo

insto, acompanha da rua, por uma janela.

Stella segue adiante; no entanto, jamais atravessará novamente a barreira social

que a separa de Laurel. Uma história tocante e sincera que, sob a direção firme de Vidor,

nunca resvala no sentimentalismo barato. RBP

EUA (Samuel Coldwyn) 105 min. P&11

Idioma: inglês

Direção: King Vidor

Produção: Samuel Coldwyn, Merrill Hulburd

Roteiro: Joe Bigelow, Harry Waj',s!.ill

Gribble, Sarah Y. Mason, Gertrude

Purcell, Victor Heerman, baseado no

livro de Olive Higgins Prouty

Fotografia: Rudolph Maté

Música: Alfred Newman

Elenco: Barbara Stanwyck, John

Boles, Anne Shirley, Barbara 0'Nell,

Alan Hale, Marjorie Main, George

Walcott, Ann Shoemaker, Tim Heli.

Neila Walker, Bruce Satterlec, Jiininv

Butler, Jack Egger, Dickie Jones

Oscar: Barbara Stanwyck (atii/). A n n e

Shirley (atriz coadjuvante)

A VIDA DE EMILE ZOLA 11937)

(THE LIFE OF EMILE ZOLA) A vida de Emile Zola, de Will iam Dieterle, é o sucessor de sua cinebiografia A história de

1 unis Pasteur, que alcançou grande sucesso ao trazer o ator Paul Muni em outra trama

sobre os esforços que um ftancês de princípios e esclarecido faz para superar pre-

1 onceitos. O filme começa com Zola lutando para se estabelecer como escritor, até a

publicação de Nana, seu sensacional romance sobre uma prostituta. Depois de alcançar

0 sucesso, o autor está preparado para gozar uma velhice próspera quando é visitado

pela esposa de Alfred Dreyfus, um oficial do Exército ftancês falsamente acusado de

servir de espião para os alemães e levado para a Ilha do Diabo. A história perturba a

1 onsciêncla de Zola e - em uma longa passagem feita sob medida para Muni - ele lê em

voz alta seu famoso artigo "J'Accuse" ("Eu acuso") pata o editor de um jornal. Em uma

seqüência de montagem dinâmica típica da Warner Brothers, a equipe do jornal se

reúne em volta dele para escutar, as prensas cospem o artigo e as pessoas correm para

comprar o jornal.

A vido de Emile Zola ganhou o Oscar de Melhor Filme c sua seriedade latente é

impressionante. Embora Dreyfus tenha sido vítima de anti-semitismo, a palavra "judeu"

não é dita em nenhum momento. Evidentemente, a Warner Brothers temia que, em 1937

- com a escalada do anti-semitismo na Europa - , filmes sobre sentimentos anti-semitas

pudessem inflamar o mesmo preconceito que foram feitos para denunciar. EB

EUA (Warner Bros.) 116 min. P&B

Direção: William Dieterle

Produção: Henry Blanke

Roteiro: Norman Reilly Raine, I leni

Herald, Geza Herczeg, baseado no

livro de Matthew josephson

Fotografia: Tony Gaudio

Música: Max Steinet

Elenco: Paul Muni, Gale Sondergaard,

Joseph Schildkraut, Gloria Holden.

Donaid Crisp, Erin O'Brien-Monie.

John Litel, Henry O'Nelll, Morris

Carnovsky, Louis Calhem, Ralph

Morgan, Robert Battat

Oscar: Henry Blanke (melhor f i lme)

Heinz Herald, Geza Herczeg, Norman

Reilly Ralne (roteiro), Paul Muni

(ator), Anton Crot (direção de arte),

Russell Saunders (assistente de

diretor), Max Steiner (música),

Nathan Levlnson (som)

I i i a (r.iumount) 91 min. P&B

1.fi.,111,1: jngles

nlrecao: Leo McCarey

I' imliic.io: Leo McCarey, Adolph

lukoi Rotciro: Vina Deimar, baseado no

II v n 1 I lie Years Are So Long, de

Josephine Lawrence

loiografia: William C. Mellor

Mn'.ica: George Antheil, Victor 1 i',, Sam Coslow, Leo Robin, Jean •1 l l W . I I I /

llltico: victor Moore, Beulah Bondi, I ,iy Balnter, Thomas Mitchell, Porter

1 i l l . Barbara Read, Maurice Musi ovitch, Elisabeth Risdon, Minna

bell, Ray Mayer, Ralph Remley, I OUlse Beavers, Louis Jean Heydt, ticne Morgan

A CRUZ DOS ANOS (1937)

(MAKE WAY FOR T0M0RR0W) Nesta singular obra-prima de um dos maiores diretores americanos, Victor Moore e

Beulah Bondi interpretam Bark e Lucy Cooper, um casal de Idosos que se encontra

diante de um desastre financeiro e é forçado a se entregar à mercê dos seus filhos cie

meia-idade. A primeira atitude dos filhos é separar os dois para que possam dividir ,i

Inconveniência de hospedá-los. Aos poucos, a auto-estima e a dignidade dos idosos é

dilapidada, até se submeterem a um acordo pelo qual um deles ficaria em uma casa de

repouso em Nova York e o outro Iria para a Califórnia.

A direção de Leo McCarcy cm A cruz dos anos supera qualquer elogio. Todas as

interpretações são expansivas e naturais e a generosidade que McCarey dispensa aos

seus personagens não conhece limites. Ele demonstra uma rara noção de quando cortar

do casal central para revelar as atitudes das outras pessoas, sem sugerir que a

compaixão deles é condescendente ou que a sua Indiferença é cruel, e sem nos forçar às

lágrimas ou à indignação (o que seria uma forma de penalizá-los). Não há nada de

artificial na maneira como McCarey lida com a história, portanto não há como escapar

de sua pungência.

Dois exemplos bastam para Ilustrar a extraordinária elegância do filme. Durante a

dolorosa seqüência em que a presença de Lucy, sem querer, atrapalha a tentativa de sua

nora de reunir amigos para jogar bridge em sua casa, ela recebe uma ligação de Bark.

Por ela falar multo alto ao telefone - uma das várias características irritantes que

McCarey e a roteirista Vina Delmar não hesitam em dar ao casal de Idosos - , os

convidados interrompem seu jogo de cartas para ouvir. Suas reações (não enfatizadas,

apenas mostradas) são uma mistura de Irritação, desconforto e tristeza.

A última parte do filme, que se concentra na breve reunião e derradeiro Idílio do

casal em Manhattan, é sublime. McCarey nos revela a compaixão dos estranhos (um

vendedor de carros, uma guardadora de casacos, um gerente de hotel, um cantor de

banda), mas jamais nos impõe as reações deles através de contraplanos supérfluos.

Enquanto Isso, Lucy e Bark são constantemente mostrados juntos dentro dos mesmos

planos. Com sua dedicação apaixonada ao universo íntimo dos dois, A cruz dos anos é

verdadeira e profundamente tocante. C f u

BRANCA DE NEVE E OS SETE ANÕES (1937)

(SNOW WHITE AND THE SEVEN DWARVES) tranca de Neve eos sete anões começa com um zoom lento para um enorme castelo, no

qual a Rainha má faz ao espelho a pergunta Imortal: "Espelho, espelho meu, existe

liguem mais bela do que eu?" A resposta, obviamente, é s im: sua imaculada rival Bran-

i .1 de Neve, que logo se torna alvo da vaidade da Rainha. Como na clássica história dos

Irmãos Cr imm na qual Branca de Neve é baseado, somos Imediatamente Impelidos a

mundo mágico e por vezes assustador. Contudo, na época, Hollywood considerou

i primeira Incursão de Walt Disney na animação de longa-metragem uma loucura.

Buem agüentaria assistir a 90 minutos de desenho animado?

I desnecessário dizer que Branca de Neve respondeu a essa pergunta retórica

i M i n a n d o - s e um dos maiores sucessos da história do cinema e consolidando a posição

1.1 Disney como o maior estúdio de animação do mundo. Na verdade, superar limites

ira um dos objetivos declarados de Walt Disney. Eleja havia quebrado a barreira do som

nos desenhos animados com Stecimboat Willy c, alguns anos mais tarde, deu cor às ani­

mações. Branca de Neve foi simplesmente o passo seguinte em termos artísticos e

financeiros: longas-metragens significavam maior bilheteria.

nspirando-se livremente na história dos Irmãos Cr imm, Disney soltou sua equipe

de animadores cm cima do material, dando a ela bastante liberdade no desenvolvl-

nto desta grande Inovação criativa. O filme é salpicado de gags, mas também é

repleto de emoção, alcançando uma sublime combinação de belas imagens e canções

duradouras, como "Whistle Whllc You Work" e "Someday My Prlnce Will Come", esta

ultima praticamente um clássico. Branca de Neve também é responsável pela primeira

1 rilha sonora a ser lançada comercialmente.

É Impossível superestimar o impacto de Bronca de Neve. O filme não só estabeleceu

de forma permanente a Disney como um dos maiores estúdios do mundo como tam­

bém fez a animação evoluir a tal ponto que somente com o advento da computação

gráfica pode-se afirmar que ela alcançou outros patamares. Um triunfo criativo, este

li lme inspirou centenas de imitações, criou um império e continua sendo até hoje o

nodelo-padrão para quase todos os longas de animação produzidos. JKl

EUA (Walt Disney) 83 min.

Technicolor

Idioma: inglês

Produção: Walt Disney

Roteiro: Ted Sears, Richard Creedon

Fotografia: Maxwell Morgan

Música: Frank Churchill, Leigh Harline, Paul J. Smith

Elenco (vozes): Roy Atwell, Stuart

Buchanan, Adriana Caselotti, Eddie

Collins, Pinto Colvlg, Marion

Darlington, Billy Gilbert, Otis Harlan,

Lucille La Verne, James McDonald,

Scotty Mattraw, Moroni Olsen, l l . i n v

Stockwell

Oscar: (prêmio honorário - uma

estatueta, sete estatuetas em

miniatura)

Indicação ao Oscar: Frank Churchill,

Leigh Harline, Paul J. Smith (músli •')

EUA (Columbia) 91 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Leo McCarey

Produção: Leo McCarey, Everett

Klskin

Roteiro: Vina Delmar, baseado na

peça de Arthur Richman

lotografia: Joseph Walker

Música: Ben Oakland, George Parrish

l l t n c o : Irene Dunne, Cary Grant,

Ralph líellamy, Alexander D'Arcy,

1 ei il Cunningham, Molly tamont,

I slher Dale, Joyce Compton, Robert

Allen, Robert Warwick, Mary Forbes

Oscar: teo McCarey (diretor)

Indicação ao Oscar: Leo McCarey,

I vnett Riskin (melhor filme), Vina

I iclmar (roteiro), Irene Dunne (atriz),

Ralph Bellamy (ator coadjuvante), Al

( la ik (edição)

CUPIDO E MOLEQUE TEIMOSO (1937)

(THE AWFULTRUTH) Diz a lenda que Cupido é moleque teimoso, de Leo McCarey, foi feito à base de mult l

improvisação. Esta lenda combina perfeitamente com o ethos do próprio filme, no qual

espontaneidade, gaiatice e a capacidade de rir de seus próprios "atos" (assim como dt

se ver pelos olhos da pessoa que está olhando para você naquele momento) sau

essenciais para seu espetacular e cálido senso de humor, assim como para sua especu

lação sobre como fazer um casamento dar certo.

No entanto, a estrutura do roteiro, independentemente da abordagem, é satisfató­

ria. Ele começa com uma ruptura: Jerry (Cary Grant) e Lucy (Irene Dunne), culpando se

mutuamente de infidelidade, mentiras e - o que é piot - falta de confiança, decidem se

divorciar. Lucy leva metade do filme - que, nesse melo-tempo, acompanha seu flerte

com Dan (Ralph Bellamy) - pata perceber que ainda ama Jerry. Porém chega a hora de

ele se envolver com alguém, uma "herdeira inconseqüente". Assim que todas essas

apostas são encerradas, o filme se torna um road movie cujo destino é uma cabana na

floresta - com duas camas e 30 minutos restando para o divórcio ser definitivamente

decretado.

Aqui, McCarey aperfeiçoa cada ingrediente da comédia romântica, desde a oposi­

ção entre nova-iorquinos e sulistas até o papel dos jogos, canções e danças como forma

de revelar os sentimentos e princípios dos personagens. Repleto de coadjuvantes es­

plêndidos e de maneirismos inspirados, Cupido é moleque teimoso também possui um

momento de pungente seriedade, quando Jerry c Lucy se lembram do voto de casa­

mento informal que fizeram ("Do fundo do meu coração, eu sempre te amarei").

De todos os gtandes filmes, este talvez seja o mais difícil de se descrever em pala­

vras. Isso pode ser explicado em grande parte pelas suas pequenas piadas verbalmente

sutis, nas quais frases comuns são distorcidas pelo timing, ritmo e tom de voz. Acima

de tudo, o filme é um monu­

mento à pura e adorável simpa­

tia de suas estrelas. A M

0 DEMÔNIO DA ARGÉLIA (1937)

(PÉPÉ LE MOKO) 1 1 demônio da Argélia foi o filme que consolidou o estrelato de Jean Cabin e definiu sua

I" r.ona das telas como a de um sujeito durão e malandro que, embora abertamente

1 i n i i o , possui um velo romântico que causará sua derrocada. No papel de Pépé, um

1'..mister parisiense expatriado que se tornou um manda-chuva na Casbah (a parte

Irabe de Argel), ele gosta do poder que tem, mas sente nostalgia de Paris. Quando uma

bela turista francesa (Mircille Balln), a personificação de sua desejada terra natal, cha­

m a sua atenção, a tentação se torna forte demais. No entanto, fora da Casbah ele fica

vulnerável, pois lá um incansável policial (Lucas Cridoux) está à espreita.

A capacidade que o diretor jullen Duvlvier tem de evocar toda uma atmosfera cria

Uma visão vibrante (embora romantizada) da Casbah, um exótico labirinto de becos

•ripeantes, repleto de detalhes pungentes. Pegando emprestados motivos dos clássl-

COS de gângsters de Hollywood, mas temperando-os com um agourento romantismo

1: .111 lês, O demónio da Argélia prefigura o gênero nolr. Imagens de barras, grades e cercas

1 recorrentes no filme, frisando o aprisionamento de Pépé dentro de seu pequeno

Irudo. O filme é permeado por um clima de anseio, de sonhos de juventude perdidos e

de desejos que jamais poderão ser saciados. Esse fatalismo o levou a ser proibido du-

i.mte a guerra pelo regime de Vichy; no entanto, sua recepção calorosa após essa

ausência temporária serviu apenas para confirmar seu status de clássico. Pl<

França (Paris) 90 min. P&B

Idioma: francês

Direção: Julien Duvivier

Produção: Raymond Haklm, Robeil

Hakim

Roteiro: jacques Constant, Jullen

Duvivier

Fotografia: Mare Fossard, Jules

Kruger

Música: Vincent Scotto, Mohamcd

Ygerbuchen

Elenco: Jean Cabln, Mireille Balln,

Gabriel Gábrio, Lucas Gridoux, Gllbfitl

Gil, Line Noro, Saturnin Fabre,

Fernand Charpin, Mareei Dalio,

Charles Granval, Gaston Modoi, Ren4 Bergeron, Paul Escoffier, Roger legils,

Jean Témerson

EZEBEL(1938) 1 1 segundo mais famoso retrato de Hollywood de uma mimada bela do Sul, Jezebel

ofereceu a Bette Davis o veículo perfeito para seus talentos como atriz em um papel

marcante. Davis Interpreta Julie Marsden, a mais cobiçada debutante da Nova Orleans

de 1850, uma sociedade regida por códigos de comportamento inflexíveis que a jovem

1 onsidera sufocantes. Noiva de Preston Dillard (Henry Fonda), um nortista, Julie não

1 ermina seu relacionamento com Buck Cantrell (George Brent), um honrado cavalheiro

do Sul e a figura mais compassiva da história. Logo em seguida, Preston deixa Nova

orleans para voltar para o Norte; quando retorna à cidade, está casado com outra

mulher. Por petulância, Julie causa um duelo em que Buck é assassinado, o que a

1 ransforma em pária, até para sua própria família. No entanto, ela se redime através de

um heróico sacrifício durante uma epidemia de febre amarela, quando acompanha

1'reston, que se encontra muito doente, à ilha miserável onde as vítimas da enfer­

midade estão confinadas.

Will iam Wyler faz uso de um orçamento generoso e de um meticuloso desenho de

arte nesta intrigante evocação do período. Um estudo de personagem multo mais

1 ompleto do que E o vento levou (1939), Jezebel também foge do "mito do Sul agrário"

que é tão proeminente naquele fi lme. Jezebel mostra uma Nova Orleans decadente,

sem negros felizes e dominada por uma elite latifundiária agarrada a sua Invejosa Idéia

de honra. RBP

EUA (First National, Warner Bros.)

103 min. P&B

Direção: William Wyler

Produção: Henry Blanke, Hal Ii Wallis, William Wyler

Roteiro: Clements Ripley, Abem

Finkel john Huston, Robert Km kntr,

baseado na peça de Owen Davis

Fotografia: Ernest Haller

Música: Al Du bin, Max Steimel, 11.111 v

Warren

Elenco: Bette Davis, Henry Fonda,

George Brent, Margaret Lindsay,

Donald Crisp, Fay Bainter, Richard

Cromwell, Henry O'Neill, Sprlti]',

Byington, John Lltel, Gordon Oliver,

Janet Shaw, Theresa Harris, Maig.uet

Early, Irving Pichel

Oscar: Bette Davis (atriz)

Indicação ao Oscar: Hal B. Wallis,

Henry Blanke (melhor filme), I ,iy

Bainter (atriz), Ernest Haller

(fotografia), Max Steiner (músll 1)

EUA (First National, Warner Bros.)

102 min. Technicolor

Idioma: Inglês

Direção: Michael Curtis, William Keighley

Produção: Henry Blanke, Hal B. Wallls

Roteiro: Norman Reilly Raine, Seton I.

Miller '

Fotografia: Tony Gaudio, Sol Polito

Música: Erich Wolfgang Korngold

I lenço: Errol Flynn, Olivia de

Havllland, Basil Rathbone, Claude

Ralns, Patric Knowles, Eugene

IMllette, Alan Hale, Melville Cooper,

Ian Hunter, Una O'Connor, Herbert

Mundln, Montagu Love, Leonard

Wlllcy, Robert Noble, Kenneth Hunter

Oscar: Carl Jules Weyl (direção de

irte), Ralph Dawson (edição), Erich

Wnllf.ang Korngold (música)

Indicação ao Oscar: Hal B. Wallis,

Hrmy Blanke (melhor filme)

AS AVENTURAS DE ROBIN HOOD 1 1933)

(THE ADVENTURES OF ROBIN HOOD) Quer seja considerado capa e espada, romance de época ou comédia histórica, Al

aventuras de Robin Hoodé simplesmente a melhor produção do seu gênero já realizada.

Com o rei Ricardo nas Cruzadas, o reino é governado por seu irmão corrupto, John,

interpretado por Claude Rains, um tirano irascível que escuta gemidos vindos da

câmara de torturas e reflete: "Ah, mais reclamações dos nossos amigos saxãos sobre ir .

novos impostos." Sir Guy de Glsbourne, o aliado menos divertido porém mais mortífero

de John, é encarnado pelo incomparavelmente desumano Basil Rathbone com uma

malícia cortante.

A dama mais bela da região é Marian, a absurdamente encantadora Olivia de

Havllland, com sua pele em tons de Technicolor. No entanto, é o despossuído fora-da-

leí Robin de Locksley que dá vida à trama de intrigas, com o cavanhaque faceiro !

charme australiano de Errol Flynn fazendo dele um raro herói que pode ser um bem-

humorado vigarista em um momento e no outro sacar um punhal, tornando-se um

ousado rebelde ("Normando ou saxão, que diferença faz? É a injustiça que eu odeio, não

os normandos") e um romântico escalador de sacadas.

A velocidade do ritmo deste filme e a quantidade de elementos que ele comporta

são verdadeiramente impressionantes: a trama é tão complexa quanto uma comédia

shakespeariana. As batalhas, com suas espadas se chocando e flechas sendo arremes­

sadas, são deliciosas, e a história termina como todas deveriam terminar: com o bem

ttiunfando e os amantes juntos. K N

IUA (I iist National) 97 min. P&B

Direção: Michael Curtlz

Produção: Samuel Bischoff

Roteiro: Rowland Brown, John

Wexley, Warren Duff

lotografia: Sol Polito

Musica: Max Steiner

Elenco: James Cagney, Pat O'Brien,

Humphrey Bogart, Ann Sheridan,

(.eiiige Bancroft, Billy Halop, Bobby

lordan, Leo Gorcey, Gabriel Dell,

Huntz Hall, Bernard Punsly, Joe

Downing, Edward Pawley, Adrian

Morris. Frankie Burke

Indicação ao Oscar: Michael Curtiz

(iluelor), Rowland Brown (roteiro),

1 an. . . ( agney (ator)

ANJOS DE CARA SUJA (1938) (ANGELS WITH DIRTY FACES) Os filmes de Michael Curtiz pregam responsabilidade social e Anjos de cara suja é seu

mais poderoso sermão. Rocky e Jerry, dois amigos que moravam em um bairro barra-

pesada de Nova York, se tomam um famoso gangster (James Cagney) e um padre

engajado (Pat O'Brien), respectivamente. Uma gangue de adolescentes idolatra Rocky,

até o padre Jerry convencer seu amigo condenado a "se acovardar" na sua execução. Ao

sustentar sua missão didática, o visual e o estilo de interpretação do filme são inflama­

dos e explícitos ao ponto da caricatura. Na verdade, a atuação de Cagney, com sua

postura arrogante e ombros erguidos, serviu de modelo para Impressionistas como

Frank Gorshin e Rich Little.

Curtiz pode ser um moralista, mas não é um moralista simplório. A capitulação f i ­

nal de Rocky é aflitiva, e o diretor não a torna mais palatávcl. Rocky é um rebelde caris­

mático, e o padre Jerry é um carola chato, porém o filme deixa poucas dúvidas sobre

qual desses caminhos é o melhor para o bem comum. O angustiante clímax, um pesa­

delo de detalhes horripilantes e sombras expressionistas à medida que Rocky é arrasta­

do choramingando para a cadeira elétrica, ainda mantém seu poder de enfurecer espec­

tadores que não concordam com o rígido ponto de vista moral do filme. No entanto,

para o padre Jerry esse tipo de atitude é, na melhor das hipóteses, sentimentalista e, na

pior delas, irresponsável. Amém. MR

OLYMPIA (1938)

OLYMPIA-PARTEI : ÍDOLOS DO ESTÁDIO (OLYMPIA 1 . TEIL - FEST DER VÖLKER)

OLYMPIA-PARTE 2: VENCEDORES OLÍMPICOS (OLYMPIA 2. TEIL - FEST DER SCHÖNHEIT)

imentário épico de Leni Riefenstahl sobre as Olimpíadas de

ii Berlim é às vezes criticado por seu viés político. Patrocinado por Hitler, o filme

Contém, de fato, algumas sequências que patecem apoiar a noção de superioridade

i iuna". Ainda assim, a cineasta recebeu uma medalha de ouro pela sua obra do

i i i ê Olímpico em 1948, muito depois de o sonho de Hitler de um Reich de mil anos

i i i se desintegrado. Não se pretende negar com isso que Olympia seja propangadista;

stahl jamais teria recebido o incrível financiamento e o apoio necessátio se o

resultado não fosse útil politicamente. Em muitos aspectos, no entanto, Olympia

.tende a política. No geral, ele é mais uma ode às proezas atléticas e à poesia do

1 H i p o humano em movimento.

Poucos cineastas demonstraram o interesse estético de Riefenstahl pela forma

Ir.11.1 e pelo movimento, e a façanha que a realização deste documentário representa

limais foi igualada. Filmar os jogos e supervisionar o imenso trabalho de pós-produção

exigiria um esforço hercúleo hoje em dia. No fim da década de 30, isso foi feito com

1 i | iúpamentos primitivos. Apesar da mensagem abertamente política (a abertura

ipanha a condução da tocha da Grécia à Alemanha como se ela fosse uma espécie

de jornada sagrada), o filme é um triunfo artístico, prava não só do talento e da visão

pessoais de Riefenstahl como também da energia e habilidade da sua equipe de

assistentes, que chegou a várias centenas.

Preparativos colossais foram necessários. Torres de ferro para as câmeras e platafor­

mas para os travelings foram construídas no estádio e a Alemanha foi varrida de cabo a

rabo em busca dos melhores profissionais. Quase 250 horas foram filmadas e a monta-

em (incluindo o acréscimo de efeitos sonoras c música) foi supervisionada pessoal­

mente por Riefenstahl. A edição, na melhot tradição do cinema de documentário

alemão, possui um ritmo magistral, com

ortes belamente executados e a medida

1 erta de variação nas provas repetitivas

(como as competições de atletismo), para

nantet o interesse visual. As alegações de

Riefensthal de Inocência política podem

soar pouco convincentes, porém Olympia

possuí um outro lado, mais duradouro. Em

poucas palavras, é o mais comovente tegis-

iro cinematográfico sobre o esporte e a

competição física já produzido. FIESP

Alemanha (IOC, Olympia Film, lohls)

118 min. e 107 min. P&B

Idioma: alemão

Direção: Leni Riefenstahl

Produção: Leni Riefenstahl

Roteiro: Leni Riefenstahl

Fotografia: Wilfried Basse, Werner

Bundhausen, Leo De Lafrue, Wallet

Frentz, Hans Karl Gottschalk, Willy

Hamelster, Walter Hege, Carl

Junghans, Albert Kling, Ernst

Kunstmann, Guzzi Lantschnei, 1 IttO

Lantschner, Kurt Neubert, Erich

Nitzschmann, Hans Scheib, Hugo < >

Schulze, Károly Vass, Willy / ie lke.

Andor von Barsy, Franz von Friedl,

Heinz von Jaworsky, Hugo von

Kaweczynski, Alexander von I aj'.i 11 in

Música: Herbert Windt, Waliei

Gronostay

Elenco: David Albritton, Jack

Beresford, Henri de Balllet-Latuui,

Philip Edwards, Donald Finlay,

Wilhelm Frick, Josef Goebbels,

Hermann Göring, Ernest Harper,

Rudolf Hess, Adolf Hitler, Cornelius

Johnson, Theodor Lewald, Luz Long, John Lovelock, Ralph Metcalle.

Seung-yong Nam, Henri Nannen,

Dorothy Odam, Martinus Osemlaip.

Jesse Owens, Leni Riefenstahl, Julius

Schaub, Fritz Schiigen, Kee chung

Sohn, Julius Streicher, Forrest Inwns,

Werner von Blomberg, Augusi v m i

Mackensen, Glenn Morris, Conrad

von Wagenheim

Festival de Veneza: Leni Rlefenitlhl

(Troféu Mussolini - melhor filme)

I I

A MULHER DO PADEIRO 0938) (LA FEMME DU BOULANGER)

lï.inça (Marcel Pagnol) 133 min. P&B

Idioma: francês

Direção: Marcel Pagnol

Produção: Leon Bourrely, Charles

Pons

llotciro: Marcel Pagnol, baseado no

livro A mulher do padeiro, de Jean

Giono

fotografia: Georges Benoît

Musica: Vincent Scotto

Elenco: Raimu, Ginette Leclere,

Robert Vattier, Robert Bassac,

leniand Charpin, Edouard Delmont,

1 harles nlavette, Marcel Maupi,

M.iximilienne, Alida Rouffe, Odette

Roger, Charles Moulin, Yvette

Fourn 1er, Charblay, Julien Maffre

Orson Wells considerava Raimu um dos maiores atores de sua época e A mul / ic

padeiro mostra que ele tinha razão. Dirigido por Mareei Pagnol e baseado em um rO 11

mance de Jean Giono, o filme conta a história de Almable Castanier, um padeira 1I1

meia-idade (Raimu) em um pequeno vilarejo na Provença. Quando sua jovem mulhri

Aurèlie (Ginette Leclere) o abandona por um belo pastor, o atormentado padclio

desiste de fazer pães e, sem eles, o vilarejo pára. Um padre católico, um professor

esquerdista, um senhor de terras e todos os habitantes do vilarejo deixam de lado suai

antigas rixas e se juntam para trazer de volta a esposa desgarrada. A vida volia ao

normal e todos ficam felizes.

A partir de um material tão simples, Pagnol criou uma pérola cômica e uma oln.i

prima humanista. Com seu habitual grupo de atores - Raimu, Fernand Charpin, Robei 1

Vattier e outros - , Pagnol dá vida a uma galáxia de personagens que é ao mesmo tempo

engraçada e comovente. Seu toque leve e o talento dos atores transcendem os estéreo

tipos grosseiros (o aristocrata mulherengo, o professor pedante, a velha rabugenta, o

marido chifrudo), criando um mundo em que o papel de cada personagem é definido '

com clareza. A Provença de Glono e Pagnol é conservadora e patriarcal (a esposa não

tem multa voz), mas é um mundo no qual valores fundamentais compartilhados poi

todos - aqui representados pelo pão, um símbolo tanto para o cristianismo quanto

para o paganismo - cimentam a coesão social.

A atuação majestosa de Raimu alterna, sem esforço aparente, teatralidade cômica e

realismo minimalista, transformando seu cômico marido traído em um herói trágico.

Raimu, ele mesmo do Sul da França, era um ator de teatro sublime, muito à vontade com

os floreios de linguagem e a impostação inflamada do vernáculo marselhês. Sua moder

nidade cinematográfica, no entanto, está na habilidade de mudar, numa questão de

segundos, para um tom mais brando em determinados momentos, causando um impac­

to emocional extraordinário, conforme ilustrado pela cena mais famosa do filme. Quan­

do a esposa arrependida retorna, Raimu a recebe de volta como se nada tivesse acon­

tecido, porém desabafa com a gata vira-lata, "Pomponnette", usando as palavras mais

intensas e comoventes. Nesse momento de alta comédia, desafio qualquer pessoa a não

chorar. O título pode ser A mulher do padeiro, mas o filme é, sem dúvida, de Raimu. GV

LEVADA DA BRECA (1938) (BRINGING UP BABY)

i da breca, o ápice das comédias escrachadas, foi o primeiro de um contrato de

< i l i lmes que Howard Hawks fez com a RKO em 1937. Baseando-se de forma pouco

promissora em um conto sobre um jovem casal e seu leopardo de estimação, as f l lma-

stouraram o prazo em 40 dias, c também o orçamento. Ele arrecadou tão pouco

quando lançado em 1938 que Hawks foi despedido da RKO e Katharine Hepburn teve

Que pagar para rescindir o próprio contrato. À frente do seu tempo, seu ritmo alucinado

I diálogos espirituosos irresistíveis estabeleceram novos padrões para todas as futuras

i iimédias do gênero.

Cary Grant, no auge da sua comicidade, é o Dr. David Huxley, um belo e avoado

p.ileontologista que passa os dias montando um esqueleto de brontossauro enquanto

ui. isado pela sua noiva dominadora. Faltando apenas um osso para terminar o pro-

|tto de quatro anos do museu, Huxley consegue arruinar uma importante reunião em

campo de golfe com um rico patrocinador em potencial. Lá, conhece Susan Vance

(Hepburn). Tão bonita e cabeça-de-vento quanto ele, ela rouba sua bola de golfe; depois

ilr.so, o mundo de Huxley nunca mais volta ao normal. Fazendo de tudo para evitar que

l ie se case com outra garota, Vance usa Baby, o leopardo amestrado enviado para ela da

América do Sul pelo seu irmão, para distrair o paleontologista. Quando o cachorro da

família enterra o precioso osso de Huxley, o casal é preso.

Os risos em Levada da breca são autênticos, a ponto de mascararem quase totalmente

lua habilidosa análise das expectativas de gênero, do sexo e do casamento na década

1 le 30. A censura suspeitou de tal forma dos significados mais profundos e possivelmente

•exuais do roteiro que questionou se a procura de Huxley pelo seu "osso perdido" não

laria referência à perda da masculinidade. A cena em que Huxley veste o roupão feminino

emplumado de Vance não ajudou a afastar essa Idéia ao conter uma das primeiras cita­

ções da palavra "gay" com outro significado que não o de "extremamente feliz". Os críti-

i os podem ter odiado, as platéias podem ter passado longe dele e o Oscar pode não tê-lo

lavorecido na época, mas Levada da breca riu por último dos seus detratores. Continua

sendo uma das verdadeiras obras-primas de espirituosidade em celulóide. K K

EUA (RKO) 102 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Howard Hawks

Produção: Howard Hawks, ( l i l l Reid

Roteiro: Hagar Wilde, Dudloy Nu holl

Fotografia: Russell Metty

Música: Roy Webb

Elenco: Katharine Hepburn, 1 .11 v

Grant, Charles Ruggles, W.ihei

Catlett, Barry Fitzgerald, May RoblOfl

Fritz Feld, Leona Roberts, George

Irving, Tala Birell, Virgínia Walker,

John Kelly

M I

I UA (Walter Wanger) 96 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: John Ford

Produção: Walter Wanger, John Ford

Hoteiro: Ernest Haycox, Dudley

Nichols

lotografia: Bert Clennon

Música: Louis Gruenberg, Richard

llagcman, W. Franke Harling, John

I lipoid, Leo Shuken

I lortCO: Claire Trevor, John Wayne,

Andy Devine, John Carradine, Thomas

Mite hell, Louise Piatt, George

II.111110ft, Donald Meek, Berton

• l i n n lull, Tim Holt, Tom Tyler

O i c a r : Thomas Mitchell (ator

. oidjuvante)

imlu .H.10 ao Oscar: Walter Wanger

i n . Hu 11 tilme), John Ford (diretor),

Men Gli-nnon (fotografia), Alexander

i i i l i i l inll (direção de arte), Otho

r. Dorothy Spencer (edição),

RI, haul llageman, W. Franke Harling,

lohn Lelpold, Leo Shuken (música)

NO TEMPO DAS DILIGENCIAS (1939)

(STAGECOACH) A década de 30 não foi uma das melhores para os faroestes. Depois de alguns fracasso',

que custaram caro, como A grande jornada (1930) e ümarron (1931), os grandes estúdios

de um modo geral deixaram o gênero para produtotes pés-de-chlnelo de filmes B. John

Ford não fazia um filme desse estilo havia mais de uma década quando escalou John

Wayne e Claire Trevor para uma história sobre uma viagem de diligência através de um

perigoso território indígena. Ao tentar vendê-lo para o produtor David O. Selznick, Ford

descreveu No tempo das diligências como um "faroeste clássico", um ponto acima das

produções B que o próprio Wayne vinha fazendo. Isso significava, entre outras coisas,

tornar o filme mais interessante pata a platéia feminina. Assim, Ford e o roteirista

Dudley Nichols acrescentatam ao roteiro original de Ernest Haycox uma história de

amor mais elaborada e o nascimento de uma criança. Isso, no entanto, não foi

suficiente para Selznick, que rejeitou o projeto.

Não que No tempo das diligências economize nos attativos mais tradicionais do

gênero. A última parte do fi lme é repleta de ação, Incluindo uma troca de tiros entte

Wayne c o bando de Plummer e um empolgante ataque de índios enquanto a diligência

dispara pelo deserto. A seqüência é enriquecida por um excelente trabalho de duble de

Yaklma Canutt, que, no papel de um dos apaches do ataque, salta em cima de um dos

cavalos da diligência, leva um tiro e tem que cair entre os cascos dos animais e passar

por debaixo das rodas.

Esta foi a segunda chance de Wayne de alcançar o estrelato depois do fracasso de

A grande jornada, e ele a agarrou com unhas e dentes. Desde sua enttada em cena, de

pé no deserto acenando para a diligência, ele Impressiona como Ringo Kid, que fugiu da

cadeia para se vingar dos Plummers, os assassinos de seu pai e seu irmão. Contudo, a

aparição de Wayne é postergada enquanto Fotd explora a personalidade dos demais

passageiros. Cada um é esboçado com habilidade e de forma memorável: Dallas (Claire

Trevor), a garota despudorada que é expulsa da cidade junto com o bêbado Doe Boone

(Thomas Mitchell) pelas senhoras puritanas defensoras da lei e da ordem; Peacock

(Donald Meek), um tímido vendedor de uísque; Hatfield (John Carradine), um jogador

do Sul; Mrs. Mallory (Louise Platt), a esposa grávida de um soldado de cavalaria; e

Garcwood (Berton Churchill), um banqueiro que esl 1 fugindo com os

ativos do seu banco. Do lado de fora da diligência estão Buck (Andy

Devine), o corpulento cocheiro, e Curly (George Bancroft), o xerife

local. A interação entre os membros desse estranho grupo permite a

Ford explorar um de seus temas pteferidos, as superiores qualidades

morais daqueles que a sociedade "respeitável" tejelta.

No tempo das diligências foi o primeiro filme que Ford rodou no

Monument Valley, uma paisagem de imponentes colinas de arenito na

fronteira de Utah com o Arizona. À medida que a pequena diligência

segue pela vastidão do deserto, a fragilidade dos seus ocupantes é

duplamente enfatizada quando a câmera se move na direção de um

grupo de índios que observa seu progresso. Ford não tenta apresentar

os índios como indivíduos; eles são apenas uma força da natureza.

O ótimo desempenho de bilheteria do filme ajudou a restabele­

cer o gênero faroeste. EB

lapão (Shochiku) 143 min. P&B

Idioma: japonês

Direção: Kenji Mizoguchi

Notciro: Matsutarõ Kawaguchi,

t 1 >.111k, 11a Yoda, baseado no livro de

'.liulu Muramatsu

Fotografia: Yozô Fuji, Minoru Miki

Música: Shirô Fukai, Senji Itô

1 lanço: Shõtarô Hanayagi, Kôkichi

l.ik,i<ln, Gonjurô Kawarazaki, Kakuko

Mini, lokusaburo Arashi, Yoko

1 iim-mura

CRISÂNTEMOS TARDIOS (1939)

(ZANGIKU MONOGATARI) No século XIX, um ator de teatro Kabukl preguiçoso e sem talento nascido em urr

família famosa se apaixona pela ama-seca do seu irmão. Contrária à união dos dois,

família dele a expulsa de casa. Ele a segue e ela devota sua vida a ajudá-lo a desenvolvi

sua arte, arruinando sua saúde no processo. No f im, ela morre em casa enquanto el

alcançando finalmente o reconhecimento como ator, lidera sua trupe em um triunf

desfile de barco por Osaka.

Crisântemos tardios é um dos filmes essenciais de Kenji Mizoguchi, uma obra de

fascinante elegância e rigor formal, além de um poderoso ataque às estruturas soci.u-.

que impõem o papel de vítimas martirizadas às mulheres. Os planos longos de Mlzo

guchi conduzem lentamente a narrativa, acomodando a inexorável lógica dos aconteci

mentos em estruturas mais amplas e complexas. O filme dá ao espectador tempo paia

reflexão e Interiorização, à medida que os personagens, reconhecendo seus papéis

dentro das relações de poder, reagem com medo, horror, tristeza ou revolta aos acon

teclmentos. A narrativa, com sua ênfase em jornadas metafóricas - as migrações da

trupe de atores e a jornada do herói rumo à excelência artística - , permite a Mizoguchi

criar um duplo filtro metafórico. Para ele, cinema e teatro são máquinas para destilar a

beleza e a conquista de uma compreensão trágica. C f u

I UA (MGM) 93 min. P&B

Direção: Busby Berkeley

Produção: Arthur Freed

Hoi i-iro: Jack McCowan, Kay Van

HI per

I ntografia: Ray June

Música (canção): Harold Arlen, Nació

Herb Brown, Richard Rodgers

I lenco: Mickey Rooney, Judy Garland,

( h,ules Winninger, Guy Kibbee, June

1'ieisser, Grace Hayes, Betty Jaynes,

I singlas McPhail, Rand Brooks, Leni

1 v n i i . I rciiry Hull, Barnett Parker, Ann

•I maker, Margaret Hamilton,

losepli Crehan

Indicação ao Oscar: Mickey Rooney

(.inn), Roger Edens, George E. Stoll

(iiiiisif a-trllha)

SANGUE DE ARTISTA (1939)

(BABES IN ARMS) Busby Berkeley, principal colaborador dos então decadentes musicais que giravam em

torno de espetáculos da Warner Brothers, realizou Sangue de artista logo depois de Ir

para a MGM, mais interessada em adaptações de livros. Seu sucesso gerou três outros

filmes no mesmo estilo, voltando a reunir Berkeley com os ídolos adolescentes Mlckey

Rooney e Judy Garland.

O filme se concentra no conflito de gerações, tal como entendido pela MGM e nos

padrões de 1939. Para resolver esse conflito, ele segue em duas direções, apresentando

ao mesmo tempo uma reminiscência nostálgica do quase extinto entretenimento tra­

dicional (representado pelos minstrel shows, em que atores brancos pintavam o rosto de

preto, e pelo vaudevllle) - praticado pelos pais dos adolescentes - e a necessidade des­

tes de assumirem o lugar dos pais sob os holofotes. Essa tensão explode no mais i m ­

pressionante número do filme: "Babes In Arms". Rooney lidera um Impetuoso grupo de

jovens com tochas nas mãos por becos sinuosos até um playground onde cantigas de

ninar surgem como contraponto à canção principal e uma fogueira flamejante simbo­

liza a imolação das coisas infantis. Esses adolescentes tão apaixonados tendem a ficar

um pouco melosos de vez em quando, de modo que Sangue de artista se beneficia da

presença mais sisuda de June Preisser, como uma arrogante, ainda que amável, ex-es-

trela infantil, e de Margaret Hamilton, no seu melhor estilo Bruxa Má, como uma ve­

lhota que quer meter todos os artistas pestinhas em uma escola profissionalizante. MR

A MULHER FAZ O HOMEM (1939)

(MR. SMITH GOES TO WASHINGTON) do Frank Capra ao sistema de governo americano foi considerada tão incisiva em

enuncia da corrupção de alto escalão que algumas pessoas em Washington

li li iram que A mulher faz o homem não deveria ser lançado em um mundo à beira da

cm 11,1. Para mostrar como funciona o sistema, Capra precisou demonstrar como ele

se corrigir. O republicanismo (e não a democracia) é salvo no filme graças aos

os heróicos de um idealista fetrenho, que, na melhor tradição do individualismo

1 ti lefferson (do qual é homônimo), se recusa a obedecer a chefes de partido, que

r 1 ;am a planejar sua ruína. Envergonhado, o político governísta de fala mansa esca-

I.11I" pata desacreditá-lo publicamente confessa a armação.

lames Stewart está petfeito como Jcfferson Smith, cuja malot qualificação para o

' 111 '.o é o fato de ele ser Incorrigivelmente humilde, um homem que passa seu tempo

• lie liando um grupo de jovens escoteiros. No entanto, sua simplicidade não se traduz

liotice ou covardia. Primeiro, Smith convence uma mulher cínica (Jean Arthur),

1 niivocada para ficar de olho nele, da sua virtude e sensatez. Em seguida, depois de

1 n u problemas ao propor, inocentemente, a construção de um acampamento para j o ­

v e n s n o exato local que a "máquina política" quer usar para seu esquema de corrup-

le se defende contta acusações falsas em um discurso de várias horas que o deixa

quase Incapaz de falar o u continuar de pé. Quem desempenha um papel essencial na

trajetória de Smith da irrelevância à desgraça e daí para a retaliação é o petsonagem do

M.idor Joseph Paine (Claude Rains). Ao conttário do líder político Impiedosamente

"i iupto Jim Taylor (Edward Arnold), Paine é um homem que acredita no sistema

imericano, mas que foi seduzido por uma política de concessões e clientelismo. Smith

MI pode ser salvo attavés da conversão de Paine. O discurso de Smith também só se faz

piissível por conta da peculiar lei americana da obstrução dos trabalhos, conhecida

I i i i o fillbuster, que permite ao indivíduo - não a um grupo, o que é muito simbólico -

liberdade de expressão ilimitada dentro de regras preestabelecidas. Assim, Smith

' nnsegue contra-atacar o grupo que o condenaria, garantindo sua defesa.

Um impressionante exemplo de americanismo, o filme de Capra é repleto de mo­

mentos memotáveis, entre eles a seqüência que acompanha a turnê do senador recém-

' liegado pelos monumentos de Washington, incluindo o Lincoln Memorial. RBP

EUA (Columbla) 125 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Frank Capra

Produção: Frank Capra

Roteiro: Lewis R. Foster, Sidney

Buchman

Fotografia: Joseph Walker

Música: Dimitri Tiomkin

Elenco: Jean Arthur, James siew.n 1

Claude Rains, Edward Arnold, c.nv

Kibbee, Thomas Mitchell, Eugene

Pallette, Beulah Bondl, H. B. W ir, Harry Carey, Astrld Allwyn, Ruth

Donnelly, Grant Mitchell, Pónei ll.ill

Pierre Watkin

Oscar: Lewis R. Foster (roteiro)

Indicação ao Oscar: Frank Capra (melhor filme), Frank Capra (dlretOI I Lewis R. Foster e Sidney Buchin.in

(roteiro), James Stewart (ator), Claudl Ralns (ator coadjuvante), Harry 1 i r c y (atot coadjuvante), Lionel Banks

(direção de arte), Gene Havlkk.

Al Clark (edição), Dimitri Tiomkin

(música), John P. Livadary (som)

lUA (MCM) íoi min.

Idioma: inglês

Direção: Victor Fleming

Produção: Mervyn LeRoy, Arthur

Freed

Roteiro: Noel Langley, Florence

Ryerson, Edgar Allan Woolf, baseado

no livro de L. Frank Baum

lotografia: Harold Rosson

Música: Harold Arien, E. Y. Harburg,

I a'orge Bassman, George E. Stoll,

Herbert Stothart

Mcnco: Judy Garland, Frank Morgan, Riy Holger, Bert Lahr, Jack Haley, Brille Burke, Margaret Hamilton, I harley Grapewin, Pat Walshe, Clara l l i n d l c k

Oscar: Herbert Stothart (música),

Harold Arien, E. Y. Harburg (canção)

Indicação ao Oscar: Mervyn LeRoy

(melhor filme), Harold Rosson

(lotografia), Cedric Gibbons, William

A, Horning (direção de arte),

A, Arnold Gillespie (efeitos especiais),

I louglas Shearer (efeitos sonoros)

I estival de Cannes: Victor Fleming,

Indli ação (Palma de Ouro)

O MAGICO DE OZ (1939)

(THE WIZARD OF OZ) Baseado no romance infantil homônimo de L. Frank Baum, escrito no fim do século XIX, es

te clássico eterno é um dos grandes contos de fadas do cinema, sendo também um musi­

cal de primeira grandeza e o filme que fez Judy Garland deixar de ser apenas uma talentosa

atriz mirim para se transformar em uma estrela atemporal e Icônica. Embora não tenha

obtido lucros vultosos quando lançado, talvez por ter sido uma produção caríssima, O

mágico de Oz conquistou várias gerações. Como A felicidade não se compra (1946), sua

popularidade foi impulsionada na década de 50 por conta de suas exibições natalinas na

televisão, que o tornaram um dos filmes mais queridos de todos os tempos.

Junto com seu cãozinho Totó, a Dorothy Gale de Garland (com os seios presos por

uma cinta para parecer mais jovem) é arrancada de um Kansas em tons de sépia por um

tornado e vai parar na Terra de Oz (representada nas cores vibrantes do Technicolor). Lá,

sua casa cai em cima de uma bruxa, que morre esmagada e cujos sapatos de rubi mágicos

lhe são dados de presente por Gllnda, a Bruxa Boa (Billie Burkc). Dorothy então segue pela

Estrada de Tijolos Amarelos em direção à Cidade Esmeralda para encontrar o caminho de

volta para a fazenda da qual antes queria escapar. O tema "Não há lugar como o lar", que

serve para o roteirista manter todos os personagens concentrados nas suas respectivas

jornadas, sempre pareceu um pouco forçado (por que alguém quereria abandonar as ma­

ravilhas de Oz para voltar para o Kansas?). Ele entra em contradição com a interpretação

estraga-prazeres de que o filme Inteiro é um sonho delirante no qual Dorothy trans­

formou todos que ela conhece na vida real em seus amigos c inimigos da Terra de Oz.

O filme tem vários esplendores: a magnífica trilha de Harold Arlcn e E. Y. Harburg (que

vai desde a assobiável "Over the Rainbow", passando pela alegria contagiante de "Off to

See the Wizard" e "Ding-Dong, the Witch is Dead", até a cômica "lf I Only Had a Braln"); a

incrível cenografia da MGM; centenas de Munchkins estridentes e macacos voadores; a

gag do "cavalo que muda de cor" e as atuações perfeitas de todo o elenco. Há também

uma série de momentos inesquecíveis: O Espantalho de Ray Bolger sendo desmembrado

enquanto o Homem de Lata de Jack Haley lamenta: "Bem, você está por todo lado"; o

Leão Medroso de Bert Lahr tentando ser assustador ("Vou lutar com

você com uma pata nas costas"); a morte da Bruxa Má de Margaret

Hamilton depois de levar um balde d'água na cara ("Estou der­

retendo, estou derretendo!"); Frank Morgan saindo de trás da cortina

("Eu sou um homem muito bom, mas sou um péssimo mago").

Como em E o vento levou, também produzido pela MGM em

1939, os créditos pela direção de O mágico de Oz vão para o pro­

fissional Victor Fleming, porém o filme é na verdade fruto da arte

dos produtores, com Mervyn LeRoy harmonizando todos os diver­

sos elementos de uma fi lmagem problemática: Buddy Ebsen foi

escalado como Espantalho e depois passou a Interpretar o Homem

de Lata, até descobrlr-se que ele era alérgico à maquiagem; um

número de dança inteiro foi cortado e arquivado até aparecer em

Era uma vez em Hollywood (1974); além do boato de que os anões

escalados para o papel dos Munchkins eram Incontroláveis. Melhor

fala: "Corações nunca vão ser práticos até serem feitos de material

inquebrável." KN

EUA (Universal), 94 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: George Marshall

Produção: Islin Auster, Joe Pasternak

Roteiro: Felix Jackson, baseado no

livro de Max Brand

intografia: Hal Mohr

Música: Frederick Hollander, Frank skinner, Ralph Freed

Elenco: Marlene Dietrich, James

Stewart, Mischa Auer, Charles

Winninger, Brian Donlevy, Allen Jenkins, Warren Hymer, Irene Hervey, Una Merkel, Billy Gilbert, Samuel S. Hinds, Jack Carson, Tom Fadden,

Virginia Brissac, Edmund MacDonald

ATIRE A PRIMEIRA PEDRA (1939)

(DESTRY RIDES AGAIN) Como a maioria das comédias de faroeste, Atire a primeira pedra, de George Marshall,«

uma sátira às convenções do heroísmo masculino. Destry (interpretado por J,

Stewart no seu melhor estilo "Ah, droga!"), xerife da ingovernável cidade de Bottlencc k,

prefere leite a uísque e se recusa a portar uma arma. Isso o torna especialmente na

ressante para a artista de saloon Frenchy, com Marlene Dietrich obviamente repetindo

o papel que a tomou famosa em O anjo azul. Dietrich canta alguns números musi, al

provocantes no Last Chance Saloon, incluindo o famoso "See What the Boys in the Bai l

Room Will Have". Em outro caso de clichê às avessas, a habitual cena de "luta nO

saloon" se dá entte duas mulheres, com Frenchy e Lily Belle (Una Merkel) se atracandi

em uma briga feia.

Frenchy, que antes gostava de Kent (Brian Donlevy), se apaixona por Destry, lidera

as mulheres da cidade na última batalha contra os bandidos e então se joga na frentl

de Destry para levar um tiro que era para ele. Uma história divertida, conduzida poi

mãos habilidosas e com um espírito bastante difetente do romance original de Ma-

Brand - o mais prolífico dos escritotes de faroeste - , que já havia sido filmado em 193?

com Tom Mix no papel principal e o seria novamente em 1954, com Audie Murphy. EB

PARAÍSO INFERNAL (1939) (ONLY ANGELS HAVE WINGS) Imlidi.i Howard Hawks já tivesse lidado com a camaradagem masculina em profissões

(especialmente a aviação) em filmes de ação do i n í c i o da década de 30, como A

ia da madrugada, Delirante e Heróis do or, este drama de 1939 indica uma

ii iunação no seu estilo, ao imprimir uma marca pessoal em um gênero melodra-

lii.li li o para estabelecer o tom herólco-cômico-romântlco que ele buscaria mais tarde

Ki aventura na Martinica, Onde começa o inferno e Cl Dorado. Atenção às cantorias

•Ml giupo, às brincadeiras entre amigos, à divisão das tarefas domésticas, aos apelidos

t folocas, à divertida afetação compartilhada pelos sujeitos "durões" e ao verniz de

1 l i i l . i n o que mascara sentimentos sinceros.

Paraíso infernal possui extraordinárias, empolgantes e arriscadas seqüências de vôo

rui especial uma arriscada aterrissagem seguida de decolagem no altiplano andino - ,

0 coração do filme está no solo, onde acompanhamos a união de um grupo que

1 torno do heróiCeoff Carter (Cary Grant). Uma cabeça mais alto do que sua

1 • I• 111> 1' e sem deixar dúvidas de que é a estrela, Ceoff comanda um serviço de correio

ia América do Sul, inspirando um grupo de veteranos de guerra traumatizados,

is e vagabundos a saltar sobre os Andes em aviões obsoletos. A showgirl Bonnie

1 i c (Iran Arthur) se vê presa no campo de aviação: a princípio, fica aterrorizada com a

l l ltude ostensivamente machona dos pilotos quando um deles é morto em um acidente

i"i' porém aos poucos passa a ver o lado sensível deles e acaba se juntando a Geoff em

mimada interpretação da música "The Peanut Vendor".

I ssencialmente uma novela com testosterona, o filme conta com um grupo de pes-

M v a r i a d a s " mostrando seu valor em momentos de crise e alterna diálogos engraça­

dos e picantes e cenas de ação aérea que funcionam até hoje. Além de contar t a m b é m com

it imo elenco de apoio de rostos conhecidos: Richard Barthelmcss (tentando apagar

.1 reputação de covarde por ter abandonado um avião em queda e deixado seu

mei mico para trás), Thomas Mitchell (que esconde dos companheiros que está ficando

' ida vez mais cego com a idade), Noah Beery jr., Slg Ruman e Rita Hayworth (como o tipo

• I' mulher com o qual os homens não deveriam se meter, mas geralmente se metem). KN

í 4

4SF*

EUA (Columbia) 121 min. P&B

Direção: Howard Hawks

Produção: Howard Hawks

Roteiro: Jules Furthman, Howard

Hawks

Fotografia: Joseph Walker

Música: Dimitri Tiomkin, Manuel

Alvarez Maciste

Elenco: Cary Grant, Jean Arthur,

Richard Barthelmess, Rita Hayworth,

Thomas Mitchell, Allyn Joslyn, Slg

Ruman, Victor Killan, John Carroll,

Don "Red" Barry, Noah Beery Jr.,

Manuel Maciste, Milisa Sierra, l.urln

Villegas, Pat Flaherty

Indicação ao Oscar: Joseph Walkei

(fotografia), Roy Davidson (efeitos

especiais), Edwin C. Hahn (efeitos

sonoros)

I',1

tUA (Selznlck) 222 min. Technicolor

Idioma: inglês

Direção: Victor Fleming, George

Cukor

Produção: David O. Selznick

Moleiro: Sidney Howard, baseado no

llvio de Margaret Mitchell

Fotografia: Ernest Haller, Ray

Rennahan, Lee Garmes

Musica: Max Steiner

Elenco: Clark Gable, Vivien Leigh,

I eslle Howard, Olivia de Havilland,

rhomas Mitchell, Barbara O'Neill,

I velyn Keyes, Ann Rutherford, George

Reeves. Fred Crane, Hattie McDaniel,

I isc ,11 I'olk, Butterfly McQueen,

Vu hn |ory, Everett Brown

Oscar: William Cameron Menzies

(jiieinio honorário - uso de cor), David

< » '.elznick (melhor filme), Victor

I Inning (diretor), Sidney Howard

(inleiio), Vivien Leigh (atriz), Hattie

M. 11.miei (atriz coadjuvante), Lyle R.

wheelei (direção de arte), Ernest Haller,

r IV Rennahan (fotografia), Hal C. Kern,

Iami". I. Newcom (edição), Don

Mii-.gi.ive (prêmio de inovação técnica)

Indicação ao Oscar: Clark Gable

(•tor), Olivia de Havilland (atriz

ÍOldjuvante), Max Steiner (música),

Humus T. Moulton (som). Jack

I osgrove, Fred Albin, Arthur Johns

(eleitos especiais)

E 0 VENTO LEVOU (1939)

(GONE WITH THE WIND) O best-seller sobre a Guerra Civil de Margaret Mitchell foi agarrado pelo megalom

produtof David O. Selznlck, que resistiu à sugestão de escalar Basil Rathbone como Rhell

Butler em favor da única escolha que os fãs aceitariam: Clark Gable. Depois de u ( l f ]

talentos no país inteiro e de uma briga de foice em Hollywood envolvendo cada prougo

nista feminina em potencial da cidade, Selznlck conttatou a inglesa Vlvien Leigh pj i*

Interpretar Scarlett 0'Hara. Insistindo em que cada detalhe fosse suntuoso, Selznii k IISHII

pelo menos três diretores (Sam Wood, George Cukor c Victor Fleming), botou fogo um

cenários que haviam sobrado de King «ong para encenar o incêndio de Atlanta, conii.iiiiu

figurantes suficientes para reencenar a Guerra Civil e aguardou o Oscar para ser aclamado,

Concebido desde o Início para ser o maior de todos os filmes de Hollywood, £o ventt

levou permaneceria por décadas a fio como a principal referência para os épicos cinema­

tográficos. Embora o filme seja monumental o bastante para estar além de qualque

crítica, a maioria das cenas verdadeiramente excelentes está na primeira metade, eu

grande parte dirigida por Cukor, que trouxe seu talento para o desenvolvimento de pet

sonagens e nuances ao material empregando um ótimo ritmo épico. Fleming, por sua

vez, mais conhecido por dirigir cenas de açáo vigorosas, acabou ficando com os trechos

mais novelescos, à medida que o casamento dos protagonistas entra em crise, sofrendo

altos e baixos durante o pós-guerra. Estes, no entanto, são bem menos cativantes do

que o romance dilacerado pela guerra e conturbado que os uniu.

O que move a trama é o coração indeciso de Scarlett, que Leigh intetpteta como

ftívola e depois como empedernida: ela é tão apaixonada pelo galante Ashley Wilkes

(Leslle Howard) que se casa com vários bobalhões medíocres (e malfadados) quando ele

escolhe ficar com a mais feminina (e malfadada) Mclanie (Olivia de Havilland). Rhett

Butler, mais ptagmático do que idealista, entra em cena e ela se sente atraída por ele

quando a guerra destrói o estilo de vida sulista. Os dois se casam depois de Scarlett ter

jurado nunca mais passar fome e manter Tara, a fazenda de seu pai, funcionando ape­

sar dos estragos da guerra. Ela só percebe que ama Rhett de verdade quando ele a

rejeita, gerando o clássico final em aberto em que o personagem de Gable vai embora

("Francamente, minha querida, estou pouco me lixando") e ela jura

conquistá-lo de volta ("Amanhã é um novo dia").

Como O nascimento de uma nação (1915), E o vento levou maquia

boa patte de uma história complexa, mostrando apenas escravos

felizes e obedientes e retratando o envolvimento de Ashley em uma or­

ganização nos moldes da Ku Klux Klan durante o pós-guerra como algo

genuinamente heróico (embora malfadado). Contudo, o ritmo do filme

é quase Irresistível e as seqüências de Selznlck estão entre as mais

emblemáticas da história do cinema: o zoom out a partir de Scarlett

enquanto ela cuida dos feridos, enchendo de cinza a tela com soldados

mutilados; a câmera que corre por entre as chamas enquanto Atlanta

pega fogo; Gable carregando Leigh escada acima para sombras sen­

suais. Adornado com o exuberante Technicolor de 1939 - os vestidos em

tons pastel e as paixões em vermelho vivo - e com a retumbante trilha

de Max Stelner, este filme ainda pode ser considerado, com justiça, a

última palavra em termos de cinema hollywoodlano. K N

Trança (Sigma, Vauban) 93 min. P&B

Idioma: francês

Direção: Mareei Carne

Roteiro: Jacques Prévert, Jacques Viot

Fotografia: Philippe Agostini, André

K.K , Albert Viguier, Curt Courant

Música: Maurice Jaubert

Elenco: Jean Gabin, Jules Berry,

A i l r i i y , Mady Berry, René Cénin,

Arthur Devère, René Bergeron,

Bem and Blier, Mareei Pérès,

i .r imaine Lix, Gabrielle Fontan,

|.i< quês Baumer, Jacqueline Laurent

Festival de Veneza: Mareei Carne

fTroféu Mussolini - melhor filme)

TRÁGICO AMANHECER (1939)

(LEJOURSE LEVE) Embora não tenha sido o primeiro filme a usar fusões para marcar flashbacks, li

amanhecer, de Mareei Carne, foi considerado tão Inovador em 1939 que os produlnim

insistiram em que uma mensagem fosse colocada antes do título para desfazer qu.ilqiiiM

confusão: "Um homem cometeu um assassinato. Preso em um quarto, ele recorda 1 uniu

se tornou um assassino."

O assassino é François (Jean Gabin), um peão de fábrica comum que foi levado 1

cometer o assassinato pela própria vít ima, um ator de vaudeville amoral e manipul.idiii

chamado Valentln (Jules Berry). O destino deles está ligado ao de duas mulheres: t

mundana e sensual Clara (Arletty), que abandona Valentin para se envolver (oin

François, e a pura e idealizada Françoise (Jacqueline Laurent), que François ama, mas qiit j

foi corrompida pela sua associação com outro homem.

Dentre a extraordinária série de clássicos que a parceria de Carne com o r o t e l r l s t í

Jacques Prévert geraria (alguns deles são Caís das sombras [1938], Os visitantes da nollf

[1942] e, em posição de destaque, O boiílevaíd da crime [i94S|}, l iui/ i io amanhecer pode

ser considerado o mais Influente. Certamente ensaia temas ao quais a dupla voli.m

mais tarde em O boulevard do crime. Embora o filme apresente seus temas a l e g o r i a ,

com discrição, François representa claramente o proletariado francês, e Trágico

amanhecer dá voz ao desespero daqueles que apoiavam a Frente Popular no fim d l

década de 30 à medida que o Estado abolia as reformas socialistas de cunho progres-sls-

ta e a ameaça do fascismo ganhava vulto. Quando um amigo de François grita da mui

tldão reunida diante do seu prédio que ainda há esperança, ele retruca: "Está acabado, |.i

não existe François... já não existe mais nada."

O clima fatalista de alienação existencial do filme e sua atmosfeia

austera e claustrofóblca foram, sem dúvida, os precursores do clima e

da forma do filme nolr americano. Na verdade, a RKO refilmou Trágico

amanhecer com Henry Fonda e Vincent Price sob o título Noite eterna,

em 1946 (o estúdio tentou destruir todos os traços do original - e, feliz­

mente, fracassou - , sendo Noite eterna que praticamente desapareceu

no tempo). Da mesma forma, o romântico bronco de Gabin antecede

suas contrapartes americanas, como John Carfield e Humphrey Bogart,

como um leõnico herói proletário. Trágico amanhecer é. provavelmente,

a obra prima do realismo poético francês. T C h

GUNGA DIN (1939)

u n i ' pura história de aventura de Hollywood vem, estranhamente, de um poema de

Niiily.iul Kipling, que forneceu aos roteiristas Ben Hecht e Charles MacArthur apenas a

i h ifera e o personagem menor do título.

lis famoso registro de uma série de produções da década de 30 que louvam o

is ingleses como sustentáculos do fatdo do homem branco, Congo Din conta a

I de três soldados profissionais (Cary Grant, Douglas Fairbanks Jr. e Victor

i 1 Jen) na índia. A princípio, o trio parece estar prestes a se separar, com a proximi-

i) casamento de um deles - um destino pior do que a morte neste mundo de

1 exclusivamente masculinos. Felizmente, uma terrível ameaça à comunidade

I i.uda a aparecer na forma de uma seita fanática que pratica sacrifícios humanos,

11» Iugues. Duas seqüências de batalha se seguem, encenadas com maestria por

riis. No clímax do filme, os três sargentos são aprisionados durante um confronto

I Bi tugues, sendo usados como isca pelo cruel líder destes para atrair o regimento

na armadilha. No entanto, Gunga Din (Sam Jaffe) praticamente tessuscita para

na corneta e alertar a tropa, que então massacra os fanáticos. O trio volta a se

lll com seu regimento e juntos celebram o heroísmo do seu companheiro morto.

I I iio com o que era um grande orçamento para a época, Cungn Din é um banquete

olhos, um dos mais impressionantes filmes de ação já feitos - e o maior de

M o s os filmes sobre a camaradagem masculina. RBP

EUA (RKO) 117 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: George Stevens

Produção: George Stevens

Roteiro: Ben Hecht, baseado no

poema de Rudyard Kipling

Fotografia: Joseph H. August

Música: Alfred Newman

Elenco: Cary Grant, Victor McLaglen,

Douglas Fairbanks Jr., Sam Jaffe,

Eduaido Ciannelli, Joan Fontaine,

Montagu Love, Robert Coote, Abner

Biberman, Lumsden Hare Indicação ao Oscar: Joseph H. August

(fotografia)

NIN0TCHKA<1939) A mais charmosa e bem-humorada comédia de costumes européia traz Greta Garbo em

no papel cômico. Passada na Paris da década de 20, a trama de Ninotchka gira em

1 11 da tentativa do governo soviético de recuperar jóias inestimáveis da grão-

duquesa exilada Swana (Ina Claire). Três burocratas arrogantes falham nessa missão e

em seduzidos pelos luxos e liberdades da sociedade ocidental. Assim, Ninotchka

11 lio) fica responsável por recuperar o tesouro através do amante da grão-duquesa, o

lulor e charmoso Leon (Melvyn Douglas).

No final, Ninotchka só consegue recuperar as jóias ao retornar para Moscou e

i com Leon, que logo a segue até a Rússia. Embora estejam apaixonados, ela se

a a trair seu país e Leon recorre a subterfúgios pata fazê-la viajar até Istambul,

• n i I r ela o encontra e os dois decidem se casar. Os temas políticos do filme não devem

ivados a sério e servem de pano de fundo para uma seqüência cômica atrás da

Dutra. A mais memorável delas talvez seja a tentativa de Ninotchka de fazer as

• aventes de um banheiro feminino de uma boate chique de Paris entrarem em greve.

Uglas está perfeito no papel do apaixonado e auto-indulgente Leon, mas o filme

1 1 lence a Garbo, em seu último grande papel no cinema. RBP

EUA (Loew's, MGM) 110 min. P8.B

Idioma: inglês

Direção: Ernst Lubitsch

Produção: Ernst Lubitsch

Roteiro: Melchior Lengyel, C.11.1111 • •.

Brackett, Walter Reisch, Billy Wlldei

Fotografia: William H. Daniels

Música: Werner R. Heymann

Elenco: Greta Garbo, Melvyn

Douglas, Ina Claire, Bela Lugosi, sig

Ruman, Felix Bressart, Alexandei

Granach, Gregory Gaye, Rolfe Sedan.

Edwin Maxwell, Richard Carie

Indicação ao Oscar: Sidney Franklin

(melhor filme), Melchior Lengyci,

Charles Brackett, Walter Reisch, Billy

Wilder (roteiro), Greta Garbo (atriz)

França {Les Nouvelles Editions

Françaises) no min. P&B

Idioma: francês

Direção: Jean Renoir

Produção: Claude Renoir

Roteiro: Carl Koch j e a n Renoir

Fotografia: Jean-Paul Alphen, Jean

Hachelet, Jacques Lemare, Alain

Renoir

Música: Roger Désormières

Elenco: Nora Gregor, Paulette Dubost,

Mila Parély, Odette Talazac, Claire

G e r a r d , Anne Mayen, Lise Elina, Marcel

l'.ilio, Julien Carette, Roland Toutain,

( .asion Modot, Jean Renoir, Pierre

Magnier, Eddy Debray, Pierre Nay

A REGRA DO JOGO (1939)

(LA RÈGLE DU JEU) Depois do grande sucesso de A grande ilusão (1937) e A besta humana {1938), Jean Reuoli,

juntamente com seu Irmão Claude e três amigos, fundou sua própria produtora, I N

Nouvelles Editions Françaises. O primeiro projeto a ser anunciado pela NEFfoI uma adapta

çâo e atualização da peça Les caprices de Marianne, de Alfred de Musset; quando lhe pedi

ram para descrever como seria seu filme, Renoir respondeu: "Uma descrição exata da bui

guesia do nosso tempo." Este é o filme que acabou recebendo o nome de A regra do jogo.

Depois de completai um vôo transatlântico em tempo recorde, o aviador Andif

Jurieux (Roland Toutain) anuncia pelo rádio sua decepção com o fato de uma certa pes

soa não estar no aeroporto para recebê-lo. Essa "pessoa" é Christine (Nora Gregor), uma

austríaca casada com o colecionador de aviões Robert de la Cheynlest. Octave (inter

pretado pelo próprio Renoir), amigo e confidente tanto de André quanto de Christine,

convence Robert a convidat André para uma festa em La Collnière, sua luxuosa casa de

campo, como forma de ele salvar sua reputação. Robert, por sua vez, espera que a

presença de André distraia Christine enquanto ele se acerta com Geneviève (Mila

Parély), sua amante de longa data. Isso é o que está acontecendo entre os "pattões". Do

lado dos "criados", temos Lisette (Paulette Dubost), empregada de Christine e casada

com Schumacher (Gaston Modot), o caseiro de La Colinière, que chama a atenção de

Marceau (Julien Carette), um ladrão que é contratado por Robert como criado. O roteiro

de Renoir irá amarrar as várias aventuras amorosas de patrões e criados, conduzindo

por f im ao tiro "acidental" que atinge André, que é sacrificado para que uma ordem

social corrupta possa permanecer intacta.

Um estilo de filmar que favorece a profundidade de campo e uma câmera em mo

vimento constante alcança aqui seu auge, à medida que Renoir reforça a atmosfera

teatral dominante tanto dentro quanto fora de cena. A maioria das atuações é impe­

cável: Dallo como Robert, Carette como Marceau, Dubost como Lisette, Modot como

Schumacher. Durante anos, críticos desmereceram a atuação de Gtcgor como Christine,

se perguntando por que tantos homens no filme são apaixonados por ela - porém

talvez essa seja exatamente a questão. Renoir se escalou corajosamente como Octave,

em uma representação devastadora de um homem que preenche o vazio de sua vida

servindo de intermediário para os casos amorosos de outtas pessoas.

Um desastre cometcial quando lançado no verão de 1939, A regra do

J j j jogo foi montado e temontado, mas sem sucesso; logo depois do come-

J H ço da guerra naquele outono, foi proibido 1 orno sendo um pei igo .1 mora

I da população. A partir do fim da década de 40 e no decorrer dos anos 50,

a lenda do filme foi mantida viva pot André Bazin e seus discípulos da

Cahiersdu Cinema, que afirmavam que, juntamente com Cidadão Kane, A

regra do jogo foi o precursor do cinema moderno; ainda assim, o filme era

conhecido apenas na sua forma radicalmente encurtada (88 minutos).

Em 1956, passou por uma restauração que lhe devolveu quase por com­

pleto a duração original (113 minutos), mas ainda falta uma cena, e de­

pois foi apresentado em 1959 no Festival de Veneza. O resto é história do

cinema, com o fi lme sendo finalmente aclamado internacionalmente

como a obra-prima que de fato é. RP

EUA (Samuel Coldwyn) 103 min. P&B

Idioma: Inglês

Direção: William Wyler

Produção: Samuel Coldwyn

Itotciro: Ben Hecht, Charles

M.u Arthur, baseado no livro de Emily

Rrontè *

fotografia: GreggToland

M Ú s k a : Alfred Newman

1 I tnco: Merle Oberon, Laurence

lllvler, David Niven, Flora Robson,

Donald Crisp, Geraldine Fitzgerald,

Hugh Williams, Leo G. Carroll, Miles

M.inder, Cecil Kellaway, Cecil

Humphreys, Sarita Wooton, Rex

Downing, Douglas Scott

Oscar: Gregg Toland (fotografia)

Indicação ao Oscar: Samuel Goldwyn

(ini'lhoi filme), William Wyler (diretor),

Hen Hecht, Charles MacArthur

(inii'lio), Laurence Olivier (ator), 1 liraldlne Fitzgerald (atriz coadjuvante),

Allied Newman (música), James Basevi

(dlirçáo de arte)

0 MORRO DOS VENTOS UIVANTES (1939)

(WUTHERING HEIGHTS) A versão cinematográfica de Will iam Wyler de O morro dos ventos uivantes, de Emily

Brontc, é um incomparável conto gótico sobre uma paixão indestrutível, frustrada pelai

circunstâncias sociais e pela desgraça. Um viajante solitário, Dr. Kenneth (Donald

Crlsp), ao atravessar os pântanos do Norte da Inglaterra, passa a noite em Wuthering

Helghts, onde uma criada idosa lhe conta a trágica história de Heathcliff (Laureim-

Olivier), o atual dono da casa. Um cigano errante, ele é adotado pelos Earnshaws e

criado com seus dois filhos legítimos. Heathcliff está sempre na companhia da jovem

Cathy (Merlc Oberon) e é alvo da zombaria de Hindley, seu Irmão esnobe. Edgar Linton

(David Niven), um vizinho rico, se apaixona por Cathy e ela descarta Heathcliff, que vai

para a América. Cathy o esquece e acaba se casando com Edgar. Heathcliff retorna 1

Inglaterra como um homem rico. No entanto, furioso com a traição de Cathy, casa-se

com a irmã de Edgar (Geraldine Fitzgerald), maltratando a pobre mulher como uma

forma de vingança. Cathy é infeliz com Edgar e adoece; porém, antes de ela morrer, os

ex-amantes gozam de uma breve união.

O monólogo de Heathcliff sobie a vida que eles terão juntos é um dos momentos

mais pungentes de toda Hollywood. São as atuações de Olivier e de Oberon como os

amantes malfadados, tendo como pano de fundo a brutalidade proibitiva dos pântanos

criados em estúdio, que tornam este filme tão notável. RBP

I U A (i olumbia) 92 min. P&B

Idioma: inglês

Dlicção: Howard Hawks

Produção: Howard Hawks

Roteiro: Ben Hecht, Charles

Mat Arthur

1 litografia: Joseph Walker

Música: Sidney Cutner, Felix Mills

rlenco: Cary Grant, Rosalind Russell,

Ralph Bellamy, Gene Lockhart, Porter

Hall. Ernest Truex, Cliff Edwards,

(l.uence Kolb, Roscoe Karns, Frank

l inks, Regis Toomey, Abner

Blberman, Frank Orth, Helen Mack,

|0hn I malen

JEJUM DE AMOR (1940)

(HIS GIRL FRIDAY) O clássico folhetim de Ben Hecht e Charles MacArthur The Front Page já havia sido

filmado com sucesso antes e o seria novamente depois desta brilhante versão de 1939,

roteirizada por Hecht e Charles Lederer. No entanto, o astuto e espirituoso diretor

Howard Hawks se compraz com uma simples modificação que é um toque de mestre: a

transformação do super-repórter Hildy Johnson em mulher. E, voilò, jejum de amor se

torna a mais afiada guerra dos sexos da história das comédias românticas escrachadas.

A cintilante Rosalind Russell é a debochada repórter estrela que seu editor e ex­

orando (Cary Grant, no papel do Inescrupuloso e agressivamente charmoso Walter

Burns) não pode perder no melo de uma matéria quente sobre um assassinato. Quando

ela anuncia que vai pedir demissão para se casar com um sujeito quadrado e submisso

(Ralph Bellamy), a incredulidade e a decepção de Walter o fazem trabalhar a mil por

hora. Segundo os cálculos do ardiloso Walter, Hildy não conseguirá resistir a uma

última grande história, e ela logo se vê envolvida até o pescoço com uma rebelião em

um presídio e um escândalo de corrupção. Grant e Russell entram em duelos verbais de

uma velocidade estonteante em uma trama que chega às raias da caricatura, com um

grande leque de personagens de redação de jornal - mascadores de chicletes, fumantes

Inveterados e jogadores de póquer - fazendo um cínico coro para os dois. Teatral e

estiloso, Jejum de amor é incomparável em seu tlming cômico e falta de papas na

língua. AE

Itl BECCA, A MULHER INESQUECÍVEL (i940) (Ml BECCA) i u m u n t o surpreendente que, apesar da sua longa e prolífica carreira e das várias

"cs que receberia, apenas Rebccca, a mulher inesquecível, seu primeiro filme

mo, tenha tendido a Alfred Hitchcock um Oscar de Melhor Filme. No entanto,

vez sirva mais para indicar o poder de persuasão do produtor David O. Selznick.

olhendo os louros do sucesso de £ o vento levou, de 1939, Selznick agarrou a

npni 1 unidade de trabalhar com Hitchcock, casando o diretor com a história de

l.mi asmas gótica de Daphné du Maurier.

11 .ibalhando com um grande orçamento, Hitchcock transformou a mansão Man-

drrley ela mesma em um personagem - o que mais tatde serviria de inspiração para a

Imp mente Xanadu de Cidadão Knnc. A suntuosa propriedade à beira-mar é o cenário

lenso romance entre Joan Fontaine e Laurence Olivier. Ele é um rico viúvo que

Corteja a inocente Fontaine; ela, por sua vez, jamais questiona sua sorte em encontrar

u n e m tão bom. Eles se casam depois de um namoro relâmpago, porém, à

i i " lu la que o relacionamento se aprofunda. Fontaine é cada vez mais atormentada

pilo espírito da esposa morta - Rebecca. Será o fantasma apenas um delírio da sua

Imaginação, fruto de uma paranóia, ou alguma força mais nefasta em ação? E o que a

'aa Danvers, uma criada suspeita, tem a ver com os estranhos acontecimentos, se é

i p i e tem algo a ver com eles?

Rebecca marcou a promissora chegada de Hitchcock à América. Na verdade, ironi-

iinente, o fi lme derrotou no Oscar o último filme inglês do diretor. Correspondente

geiro. Aqui, todos os seus traços autorais são usados à perfeição: temos a som-

l n i a e misteriosa história antes da história, as suspeitas mal contidas, o romance de

• 1 1 1 1 1 0 de fadas condenado pelo passado invasivo e, é claro, a sensação crescente de

trilçâo. No entanto. Rebccca carece do tom jocoso que é a matca registtada de

heock e o filme nâo possui senso de humor. Essa falta de leveza pode set creditada

e m grande parte à natureza ininterruptamente lúgubre e gótica do romance melo-

ilt.imático de du Maurier. A inocente Fontaine é quase levada à loucura pelos segredos

que se arrastam em Mandetley, porém Hitchcock fica mais que feliz em deixar a tensão

. rescer e crescer até o apavorante desfecho. JKl

EUA (Selznick) 130 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Alfred Hitchcock

Produção: David O. Selznick

Roteiro: Joan Harrison e Philip

MacDonald, baseado no livro de

Daphne du Maurier

Fotografia: George Barnes

Música: Franz Waxman

Elenco: Laurence Olivier, Joan

Fontaine, George Sanders, Judith

Anderson, Gladys Cooper, Nigel

Bruce, Reginald Denny, C. Auhiev

Smith, Melville Cooper, Florence

Bates, Leonard Carey, Leo G. Carroll,

Edward Fielding, Lumsden Hare,

Forrester Harvey

Oscar: David O. Selznick (melhor

filme), George Barnes (fotogralia)

Indicação ao Oscar: Alfred Hitchcot k

(ditetor), Robert E. Sherwood, Joan

Harrison (roteiro), Laurence Oliviei (ami),

Joan Fontaine (atriz), Judith Antler

(atriz coadjuvante), Lyle R. Wheelet (direção de arte), Hal C. Kem (edição), Jack Cosgrlve, Arthur Johns (efeltOI especiais), Franz Waxman (músii a)

T U A (Walt Disney) 120 min. technicolor

Idioma: ingles

Direção: Ben Sharpsteen (supervisor)

Produção: Walt Disney, Ben

sharpsteen

Koteiro: Joe Grant, Dick Huemer

I otografia: James Wong Howe,

M.ixwell Morgan

Música não original: Bach,

Beethoven, Dukas, Mussorgsky,

St hubert, Stravinsky, Tchaikovsky

Elenco: Leopold Stokowski (maestro,

1 )M|iiestra da Filadélfia}, Deems

raylor (narrador), Julietta Novis

(solista)

Oscar: Walt Disney, William E. Garity,

I N. A. Hawkins (prémio honorário),

1 eopold Stokowski & associados

(prémio honorário)

FANTASIA (1940)

Embora hoje em dia seja lugar-comum, criar imagens para interpretar música efl

revolucionário quando este audacioso marco da animação e da gravação de som n u

estéreo foi concebido e realizado pelos estúdios Walt Disney para aclamação e esp. inin

universais. Agraciadas pelo astro da música clássica Leopold Stokowski na regência dl

Orquestra da Filadélfia, as oito abrangentes seqüências de Fantasia compreendem um

concerto com desenhos ambiciosos, divertidos, portentosos e experimentais que

acompanham obras de Tchaikovsky, Mussorgsky e Schubert, entre outros.

Mesmo em telas IMAX, a tecnologia de exibição escolhida para a mais recente das

várias restaurações, regravações e relançamentos de aniversário da Disney do seu

estimado marco da animação de 1940 (acrescentado com razoável sucesso de cinco na

vos segmentos na produção atualizada de Fontosin 2000), o filme pode decepcionai

pois ainda é uma experiência descaradamente kitsch, por mais impressionante c

inovador que seja. Os filhos do pós-guerra que o assistiram à base de alucinógenos na

juventude talvez sejam os que mais gostam dele hoje em dia. Contudo, existem

algumas seqüências mágicas que resistiram ao tempo, o que faz sentido em um filme

realizado por 60 animadores trabalhando com nada menos do que 11 diretores (sob a

supervisão de Ben Sharpsteen).

Mais assistívels são as abstrações à frente do seu tempo em cima da música de

Bach, nas quais o som multicanal é perfeitamente sincronizado aos desenhos e parece

alçar vôo da tela. Mickey Mouse, mais encantador do que nunca como o Aprendiz de

Feiticeiro tentando desesperadamente conter as vassouras auto-replicantes conjuradas

por ele para fazerem suas tarefas; os cogumelos chineses dançarinos; um adorável coral

de paquidermes de cílios pestanejamos; os hipopótamos de tutu saltitando elegan

temente e fugindo de crocodilos usando gorros ao som de "A dança das horas" - tudo

Isso ainda é uma diversão. Se juntarmos tudo, temos uma doce hora de grandeza.

Contudo, em meio a esses momentos, há seqüências que não envelheceram tão bem.

As fadas saltitantes que estão nuas mas que, por uma questão de bom gosto, não têm

órgãos sexuais, o aparentemente interminável declínio dos dinossauros ao som da

"Sagração da primavera", de Stravinsky, e o absurdo de vulgaridade a que a "Pastoral"

de Beethoven foi submetida (centauros perseguindo, enamorados, centauros fêmeas

tímidas c de aparência pubescente, todas com penteados estilo joan Crawford) perdem

feio no quesito credibilidade. AE

NÚPCIAS DE ESCÂNDALO h m o i

( IHE PHILADELPHIA STORY) ptação de 1 9 4 0 de George Cukor da farsa teatral de Philip Barry é o clássico

1 estável de todas as comédias pastelão sofisticadas. Katharine Hepburn estrelou

I pri 1 na Broadway e diz-se que o dramaturgo Philip Barry baseou a protagonista na

lu putação à época. Depois de ela ter deixado a RKO não exatamente em bons ter-

0 público via Hepburn como mandona e masculinizada, certamente longe do

Ideal lemlnino do fim da década de 3 0 .

Na cena de abertura, agora famosa por sua fúria praticamente sem diálogos, a herdel-

I I n u y Lord (Hepburn) observa seu recém-dlvorciado marido playboy Dexter Haven (Cary

1 i i.nii) colocar alguns dos seus pertences no carro e bater com um taco de golfe em sua

le raiva. Numa tentativa de provar que ela não é Impossível de se amar, Tracy planeja

ir com um homem respeitável embora Insosso, na mansão da família, quando

volta com dois repórteres a reboque, Mike Connor (James Stewart) e Llz Imbrie

lussey), especificamente para arruinar o casamento. Mais radiante do que nunca,

Hepburn se supera em üm papel que exige um timing cômico impecável, assim como

ibilldade genuína. Suas cenas com Stewart no jardim à noite, antes do seu fatídico

1 iniento, capturam a essência da atração impetuosa que eles sentem um pelo outro.

Hepburn foi a responsável por Núpcias de escândalo ser como é. Ela detinha os direitos

do projeto, que então vendeu sabiamente para a MGM sob a condição de que repetisse o

pipel principal e pudesse escolher o diretor e o elenco. Ela queria Clark Gable como Dexter

SpencerTracy como Mike, porém, por problemas de agenda, nenhum dos dois estava

disponível. No lugar deles foram escalados Grant, que já havia sido seu parceiro nas telas

• N i ires ocasiões anteriores, e Stewart. O diretor George Cukor conseguiu fazer a imagem

pública negativa de Hepburn funcionar a seu favor através da personagem, suscitando

lalxão por uma mulher tão bonita e tão incompreendida. O filme foi um enorme

1 ,so, com um roteiro ganhador do Oscar que misturava comédia com crítica social. Em

1 peça foi refilmada, com o acréscimo de números musicais, como Alta sociedade. Kl<

EUA (MGM) 1 1 2 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: George Cukor

Produção: Joseph L. Manklewic/

Roteiro: Donald Ogden Stewart,

baseado na peça de Philip Barry

Fotografia: Joseph Ruttenberg

Música: Franz Waxman

Elenco: Cary Grant, Katharine

Hepburn, James Stewart, Ruth

Hussey, John Howard, Roland Young,

John Halliday, Mary Nash, Virgínia

Weldler, Henry Daniell, Lionel Pape,

Rex Evans

Oscar: Donald Ogden Stewart

(roteiro), James Stewart (ator)

Indicação ao Oscar: Joseph L.

Mankiewicz (melhor filme), Geoige

Cukor (diretor), Katharine Hepburn

(atriz), Ruth Hussey (atriz

coadjuvante)

EUA (Fox) 128 min. P8<B

Idioma: inglês

Direção: John Ford

Produção: Nunnally Johnson, Darryl

F. Zanuck

Uoteiro: Nunnally Johnson, baseado

no livro de John Steinbeck

Fotografia: Gregg Toland

lltrtco: Henry Fonda, Jane Darwell,

liihn ( arradine, Charley Grapewin,

Dorrls Howdon, Russell Simpson,

Oi Z. Whitehead, John Qualen, Eddie

( mill,in, Zeffie Tilbury, Frank Sully,

11.ink Darien, Darryl Hickman, Shirley

Mills, Roger Imhof

Oscar: John Ford (diretor), Jane

Darwell (atriz coadjuvante)

indicação ao Oscar: Darryl F. Zanuck,

Nunnally Johnson (melhor filme),

Nunnally Johnson (roteiro), Henry

I mula (ator), Robert L. Simpson

(edii,ao), Edmund H. Hansen (som)

AS VINHAS DA IRA (1940) (THE GRAPES OF WRATH) Poucos filmes americanos da década de 30 lidaram com o sofrimento e os transtornos

da Depressão. Hollywood, em sua grande maioria, deixou que outras mídias, como o

teatto, a literatura e a fotografia, documentassem o desastre nacional. O tomance d l

John Steinbeck As vinhas da ira, publicado em 1939, foi baseado em uma pesquisa

rigorosa, em que o autot seguiu famílias agricultoras desalojadas de Oklahoma na sua

jornada até as lavoutas da Califórnia em busca de trabalho.

Apesar das objeções dos conservadores que controlavam o estúdio, Darryl Zanuck

comprou os direitos do livro para a 20th Century Fox. Ele sabia que John Ford era o

homem certo para dirigir o filme, com sua sensibilidade para com o povo americano <•

sua história. Ford também se identificava com o que há de mais doloroso no suplício da

família Joad - não a pobreza aguda, mas o trauma psicológico de quem é arrancado do

seu lar, jogado na estrada, desenraizado. Em uma cena memorável, a Mãe (Jane Dar­

well) queima os pertences que não pode levat consigo na noite anterior ao dia em que

precisam abandonai a fazenda.

Para o papel do protagonista Tom Joad, Ford escalou Henry Fonda, que pouco

tempo atrás havia esttelado A mocidade de Lincoln (1939) e Ao rufar dos tambores (1939),

dois outros filmes sobre a história da América, também dirigidos por Ford. Dentre os

outtos membros da Sociedade Anônima John Ford presentes aqui estão Russell

Slmpson como o Pai, John Qualen como o amigo Mulcy e John Carradinc como o pastor

itinerante. E, para o posto de cinegraflsta, Ford fez uma escolha inspirada. Gregg Toland

capturou de forma brilhante o olhar documental das fotografias que haviam sido

titadas da tragédia por fotógrafos contratados pelo governo, como Dorothea Lange. Em

nenhum momento isso fica mais patente do que na seqüência em que a família Joad

chega a um acampamento de sem-terra, com a câmera detendo-se nos rostos soturnos

dos ocupantes e nos batracos caindo aos

pedaços em que eles vivem.

Embora As vinhas da ira não deixe de

mostrar a enormidade do sofrimento dos

seus protagonistas, há uma importante di­

vergência em relação ao livro. No romance

de Steinbeck, a família a princípio encontta

condições mais favoráveis em um acampa­

mento do governo, porém, no f im, se vê

reduzida a salários de fome. No filme, ela

chega ao mesmo acampamento mais tarde,

de modo que seu progresso se dá em uma

curva ascendente, marcada pela última fala

da Mãe: "Nós somos o povo... jamais deixa­

remos de existir." EB

A VIDA E UMA DANÇA o 9 4 0 )

(DANCE, GIRL, DANCE) lonhecem Lucille Ball apenas por conta de sua popular série de tevê da década

rir ',n deveriam conferir seu trabalho neste A vida é uma dança, o clássico camp de

1 1 liy Arzner. No papel de "Bubbles"/ "Tlger" Lily White, Ball praticamente rouba o

la dedicada bailarina de Maureen 0'Hara, que é forçada a trabalhar como

ia de boate pata não passar fome.

A vida é uma dança traz a batida história da vida no mundo sótdido das dançarinas

dos olhos de Judy 0'Brian (0'Hara), uma aspirante a bailarina incentivada por

HL mentora, Madame Basilova (a sempre camp Maria Ouspenskaya), que infelizmente

pelada por um caminhão antes de sua protegida poder revelar seu talento,

lubbles ofetece a Judy uma vaga de escada no seu número de dança. Pouco depois,

10 suporta mais e grita furiosamente para uma platéia só de homens: "Podem

açam valer seus cinqüenta centavos!" Muitos considetatam isto uma postura

I' " m i s t a por parte de Arzner, anos-luz antes de esse tipo de atitude virar moda. Não

Obstante, é de Ball que Arzner retira mais graça e é impossível esquecer Lucy dançando

I111I.1 hula ou cantando a plenos pulmões "Jitterbug Bite".

Se você acha brigas de camarim e uma pitada de mulheres um espetáculo diver

•ntão não deixe de ver A vida é uma dança. Como diria Bubbles: "Olha só, garota,

11111 . 10 calo na sarjeta; sempre escolho bem onde cair." Ironicamente, Ball ainda viria a

'.ei ,1 dona do estúdio que produziu este filme: a RKOI D D V

EUA (RKO) 90 min. P&B

Idioma: inglês

Produção: Harry E. Edlngton, Erich

Pommer

Roteiro: Tess Slesinger, Frank Davis, baseado no argumento de Vlckl Baum

Fotografia: Russell Metty, Joseph II .

August

Música: Chet Forrest, Edward Waid.

Bob Wright

Elenco: Maureen O'Hara, Louis Hayward, Lucille Ball, Virginia I leid. Ralph Bellamy, Maria Ouspenskaya, Mary Carlisle, Katharine Alexander, Edward Brophy, Walter Abel, Harold Huber, Ernest Ttuex, Chester (lute, Lorraine Ktueger, Lola Jensen

PINOQUIO (1940) (PINOCCHIO) Alguns dos mais sombrios elementos da fábula italiana original de Carlo Collodl foram,

naturalmente, descartados assim que Disney pôs as mãos na história. Porém apenas

mis. O encanto duradouro deste Pinóquio em desenho animado prova que nem

nulas as altetações feitas pelo estúdio na história de um boneco de madeira que ganha

oram necessariamente pata piot, e muitos dos detalhes mais assustadores dela

Kintinuam presentes. O clássico ainda consetva muito de seu horror à medida que

i inóquio encara os perigos das pressões alheias que o distraem do seu objetivo de se

iar um menino de verdade. Guiado (mas nem sempre conduzido) pelo Grilo Falante,

•na "consciência" na forma de inseto, ele precisa aprender não só a ser responsável,

' nino a ter coragem e amor durante sua inconscientemente subversiva jornada em

'liieção à vida.

Como segundo longa-mettagem da Disney (depois de Branca de Neve), Pinóquio

mostrou que o mundo inexplotado da animação era prenhe de possibilidades, resul-

i.indo em criações encantadoras e etéreas, como a luminosa Fada Azul, e seqüências

impressionantes, como a escapada da amaldiçoada Ilha dos Prazeres e o empolgante

encontro com a Baleia, apropriadamente batizada de Monstro. Acrescentem-se a isso

1 anções já clássicas como "When You Wish Upon a Star" e não é de se espantar que

1'inóquio tenha permanecido um padrão de excelência a partir do qual tantos filmes de

animação são julgados. JKl

EUA (Walt Disney) 88 min. Technicolor

Idioma: inglês

Direção: Hamilton Luske, Ben Sharpsteen

Produção: Walt Disney

Roteiro: Aurelius Battaglia, baseado

no livro de Cario Collodl

Música: Leigh Harline, Paul J . ' ih Ned Washington

Elenco (vozes): Dickie Jones, Don

Brodie, Walter Catlett, Frankie Dai ro.

Cliff Edwards, Charles Judels,

Christian Rub, Evelyn Venable

Oscar: Leigh Harline, Paul J. Smith,

Ned Washington (música), Leigh

Harline, Ned Washington (canção)

i'UA (Loew's, MGM) loo min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Frank Borzage

Produção: Frank Borzage

Poleiro: George Froeschel, Hans

Rameau, Claudine West, baseado no

livro de Phyllis Bottome

lotografia: William H. Daniels

Musica: Branislau Kaper, Eugene

Zador

tlenco: Margaret Sullavan j a m e s Stewart, Robert Young, Frank Morgan, Robert Stack, Bonita (a.invllle, Irene Rieh, William T. Orr, Maria Ouspenskaya, Gene Reynolds, Russell Micks, William Edmunds,

I hei Dale, Dan Dailey, Granville Bales

TEMPESTADES DALMA ( m o ) (THE MORTAL STORM) Um dos poucos filmes antlnazistas produzidos por Hollywood antes de Pearl Harboi.

Tempestades d'alma, de Frank Borzage - uma obra detalhista e apaixonada na sua con

denação do regime - , começa no dia em que Adolf Hitler se torna chanceler da Alema­

nha. O dia também calha de ser o sexagésimo aniversário do professor Viktor Roth

(Frank Morgan), um admirado professor de ciências de uma universidade no Sul do país.

O filme mostra a consolidação da Alemanha nazista através da destruição do "não

ariano" Roth e sua família: sua esposa, seus enteados arianos, que se tornam nazistas

fanáticos, e sua filha, Freya (Margaret Sullavan).

Borzage retrata o nazismo como uma forma de loucura à qual muitos homens - e

apenas uma mulher, pelo que vemos - sucumbem, como se por contágio ou predls

posição natural (o filme não analisa as raízes socioeconómicas do regime fascista), mas

com o qual, através de alguns indivíduos, a humanidade remanescente entra em conflito.

A magnífica cena final situa o conflito dentro do personagem interpretado por Robert

Stack. Sozinho na casa do padrasto, ele caminha por seus cômodos vazios. A câmera o

ultrapassa, explorando o espaço Imerso em sombras, com uma trilha sonora feita de

diálogos de cenas anteriores; ouvimos os passos do jovem à medida que ele sai da casa.

Tempestades d'alma é uma das maiores histórias de amor do cinema americano. A

abordagem pungente e sutil de Borzage da relação entre Freya e Martin (James Stewart)

está de acordo com o compromisso do diretor, que o acompanhou por toda a carreira,

com o poder transcendente do amor - um idealismo ao qual as atuações admiráveis de

Sullavan e Stewart mantêm-se fiéis. Pouco antes de os amantes seguirem para o

desfiladeiro que cruza a fronteira austríaca, a mãe de Martin (Maria Ouspenskaya) os

faz celebrar sua união bebendo de uma taça cerimonial de vinho. Essa cena é uma das

mais brilhantes de toda a carreira de Borzage.

O produtor não creditado Victor Saville

afirmou ter dirigido boa parte do filme,

uma declaração que foi multo repetida, po­

rém refutada por vários dos principais

membros do elenco e da equipe. Sem dúvi­

da alguma. Tempestades d'alma representa

plenamente o estilo, a filosofia e as preo­

cupações de Frank Borzage. C f u

0 GUARDA (1940) (THE BANK DICK) 1 por W. C. Fields sob o pseudônimo de "Mahatma Kane Jeeves", o que dá a

u n h-la das suas ambições, e dirigido pelo amigável guarda de tránsito Eddie Cllne -

• ni" i i.ibalho era abrir caminho para Fields ficar à vontade para pôr em prática todas as

liossincraslas - , O guarda mostra o astro no habitual papel de um resmungão

Inolenslvo, porém melindrado, que só quer ser deixado em paz, mas que é forçado por

undo enlouquecido a reagir a vários chatos que acabam com o seu sossego.

i j-.bert Sousè, um rabugento de quem todos tiram vantagem e que só quer passar a

ios bares enchendo a cara em paz, é importunado por sua pavorosa mulher (Cora

WMlicrspoon), sua medonha sogra (Jessie Ralph), sua filha adolescente irritante (Una

i el), seu noivo idiota (Grady Sutton) c pelo próprio capeta do seu filho mais novo,

sistem em que ele faça algo de útil. Quando frustra acidentalmente um assalto a

i' un o ao trombar com o ladrão, ele ganha o emprego de segurança uniformizado e o

In Ito de causar problemas em uma sucessão de esquetes absolutamente perfeitos

• i levam de encontro a policiais arrogantes (Franklin Pangborn como um inspetor de

I' s distraído), bandidos barra-pesada (um suposto ladrão é afugentado em uma

leqüência de perseguição de carros hilária que rivaliza com qualquer pastelão mudo) e

' lumes abusados.

Como em todos os melhores filmes de Fields

IH Sa C/ft [1934] e Never C/ve a Sucker an Even Rreak

| I I 11|), a premissa aqui é apenas uma desculpa para

unia sucessão de esquetes em estilo vaudeville nos

quais ele é confrontado com parceiros que são ex-

1 'n i ricos demais para serem chamados de escadas,

m e , ao mesmo tempo cruéis demais para serem ví-

1 imas. Algumas das seqüências cômicas de O guar-

1/11 (como, por exemplo, um trecho no qual Sousè de

U u m a forma se vê sentado na cadeira do diretor

' iiipianto o filme está sendo rodado) se passam

inulto longe do banco, porém os suntuosos saguões

de mármore, com seus ricaços interesseiros que

levam o troco quando Sousè fica rico e "se regene-

1.1". são o cenário ideal para suas travessuras e anar­

quia. Fields era um raro comediante que conseguia

I I I engraçado estrangulando uma criança pequena,

e esta pérola de 74 minutos está entre suas obras-

pnmas. K N

EUA (Matty Fox, Universal) 74 min.

P&B

Idioma: inglês

Direção: Edward F. Cline

Produção: Jack J. Cross

Roteiro: W. C. Fields

Fotografia: Milton R. Krasner

Música: Charles Previn

Elenco: W. C. Fields, Cora

Witherspoon, Una Merkel, Evelyn Del

Rio, Jessie Ralph, Franklin Pangborn,

Shemp Howard, Dick Pu reel I, Grady

Sutton, Russell Hicks, Pierre Walkin.

Al Hill, George Moran, Bill Wolfe, J.n V

Norton

i n 1 ,

IUA (Mercury, RKO) 119 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Orson Welles

Produção: Orson Welles, Richard

Baer, George Schaefer

Roteiro: Herman J. Manklewicz,

oison Welles

rotografia: GreggToland

Música: Bernard Herrmann, Charlie

Barnet, Pepe Gufzar

tlcnco: Orson Welles, Joseph Cotten,

Dorothy Comingore, Agnes

Moorehead, Ruth Warrick, Ray

( ollins, Ersklne Sanford, Everett

•.lame, William Alland, Paul Stewart,

1 leorge Coulouris, Fortunio

Uonanova, Gus Schilling, Philip Van

/ . n u l l , Georgia Backus, Harry

Shannon

Oscar: Herman J. Mankiewicz, Orson Welles (roteiro)

Indicação ao Oscar: Orson Welles (melhor filme), Orson Welles (diretor), Orson Welles (ator), Perry I etguson, Van Nest Polglase, A. Roland Fields, Darrell Silvera (direção DE .iite), Gregg Toland (fotografia), Robert Wise (montagem), John

Aalberg (som)

CIDADÃO KANE (194D (CITZEN KANE)

ORSON W hLLES

Desde 1962, a freqüentemente citada lista dos melhores filmes de todos os tempos feita

pelos críticos da revista Sight and Sound coloca Cidadão Kane, a extraordinária estréia no

cinema de Orson Welles, em primeiro lugar. Em 1998, o American Film Institute o

considerou o melhor filme já produzido. Ele também ganhou ptêmios de Melhor Filme do

New York Fllm Critics Circle e do National Board of Revlew, além de tet conquistado o Oscar

de Melhor Roteiro. A lenda de Cidadão Kane foi em parte alimentada pelo fato de que

Welles tinha apenas 24 anos de idade quando o realizou, mas também pelas óbvias com­

parações entre o personagem-título e o magnata da imprensa William Randolph Hearst,

que moveu mundos e fundos para impedir a produção do filme e, quando não conseguiu

evitar que fosse distribuído, tentou difamá-lo. No entanto, desconsiderando a ridícula

pretensão de se eleger qualquer filme que seja como "o melhor de todos os tempos",

Cidadão Knneé uma obra de tremendo interesse e impottãncia por vários motivos.

O filme conta uma grande história: Charles Foster Kane (interpretado de forma

brilhante pelo próprio Welles) nasce pobre, mas enriquece por conta de uma mina de

outo herdada pela mãe. Na juventude, começa a etguet um império populista jor­

nalístico e radiofônico, casando nesse íntetim com a sobrinha de um presidente ame­

ricano e concorrendo a governador. No entanto, todas as suas ambições de poder são

frustradas e, à medida que este lhe escapa, Kane se torna cada vez mais violento com

as mulheres da sua vida; primeiro com sua esposa, depois com sua amante. Ele morre

praticamente sozinho em seu castelo reconstruído, porém inacabado, ansiando pela

simplicidade da sua infância. Fiel às tradições do populismo do New Deal, Cidadão Kane

exalta o ideal americano de que o dinheiro não pode comprar felicidade, mas de uma

maneira extremamente prosaica, quase ao estilo de Dlckens.

Mais Importante do que o enredo é o fato de o filme começar com a morte de Kane e

com sua enigmática última palavra: "Rosebud". Um grupo de intrépidos repórteres tenta

descobrir seu significado e entrevista uma série de conhecidos do magnata. O filme não só

é contado em flashback, como cada personagem só conhece o homem através de uma

determinada perspectiva, que é apresentada consecutivamente. A complexidade narrativa

» s do f i l m e - e m b o r a nunca viole a continuidade e a causa­

lidade clássicas de Hollywood - é um extraordinário tour

de force, responsável em grande parte pela afirmação de

Paulino Kael de que a verdadeira genialidade do filme

não está nas mãos do garoto-prodígio Welles, mas nas

do roteitista Herman J. Mankiewicz.

O verdadeiro poder do fi lme, no entanto, está na

fotografia: Gregg Toland desenvolveu uma técnica de

profundidade de campo em que o primeira plano, o

central e o último ficam todos em foco ao mesmo

tempo, permitindo que o olho do espectador se fixe

em qualquer parte da Imagem. Essa técnica foi critica­

da à época por violar as regras da fotografia holly-

woodiana clássica, pelas quais a boa fotografia deveria

ser invisível. Contudo, a fotografia de Cidadão Kane é

impactante e inesquecível. M K

EUA (Paramount) 97 min. P&ß

Idioma: inglês

Direção: Preston Sturges

Produção: Paul Jones

Itoteiro: Monckton Hoffe, Preston

Slurgcs

lotografla: Victor. Milner

Música: Clara Edwards, Sigmund

Krumgold

Elenco: Barbara Stanwyck, Henry

onda, Charles Coburn, Eugene

i i l l r i t r , William Demarest, Eric Blore,

Melville Cooper, Martha O'Driscoll,

l.ini't Beecher, Robert Greig, Dora

1 I,• 11H-nt, Luis Alberni

Indicação ao Oscar: Monckton Hoffe (iulciio)

A S T R Ê S N O I T E S D E E V A I I M D (THE LADY EVE) As três noites de Evo é uma comédia escrachada clássica e um perfeito exemplo do cinema de

Preston Sturges, refletindo a visão que o roteirista e diretor tem do romance como a maloi

de todas as trapaças. O roteiro é repleto de falas extraordinárias, os diálogos são rápidos e Si

pirituosos e a trama oferece uma Inteligente variação da velha e conhecida guerra dos sexi >

O filme começa em um cruzeiro marítimo onde a rica, sofisticada e sedutora Jean

Harrington (Barbara Stanwyck) tenta seduzir o Ingênuo especialista em cobras Charles

"Hopsie" Pike (Henry Fonda) para lhe roubar a fortuna conquistada com sua cervejaria,

a Pike's Ale. Em uma virada na trama altamente Inverossímil mas ao mesmo tempo

deliciosa, a ação passa para a mansão de Hopsie em Connecticut, onde Jean reaparece

como uma herdeira inglesa, Lady Eve Sldwlch. Ela seduz novamente Hopsie e o faz se

casar com ela, com a Intenção de largá-lo logo em seguida como vingança por ele tê-la

abandonado antes. Porém, no fim das contas, o tiro sai pela culatra quando ela se

apaixona de fato por ele.

Em As três noites de Eva, Sturges consegue driblar boa parte das restrições impostas

pela censura. Tecendo inúmeras referências à história bíblica da Queda do Paraíso, ele

enfatiza a sexualidade de uma maneira que poucos cineastas da época teriam ousado.

As crês noites de Eva foi refilmado em 1956 como (o consideravelmente inferior) O otário

e a vigarista, com Mitzi Gaynor e David Niven. R d e

0 L O B I S O M E M ( m n (THE WOLF MAN)

llgura do homem-lobo - a versão cinematográfica bípede do arquétipo do

lobisomem, que personifica de forma dramática a dicotomia Jekyll/Hyde (superego/id)

I existe em todos nós - assumiu o status de protagonista pela primeira vez em O

i 'jnem de Londres (1935), com Henry Hull no papel reprlsado décadas depois por Jack

Me hulson em Lobo (1994). Logo c m seguida, Curt Siodmak concluiu o roteiro para o que

m u 1 o último clássico de terror da Universal Pictures - depois de Drócti/a (1931),

iiste/n (1931) e A múmia (1932) - O lobisomem, dirigido por George Waggner. Nesta

que ainda é a mais reconhecida e estimada versão do mito, Lon Chaney Jr. interpreta

1 awicnce Talbot, um galês educado nos Estados Unidos que deseja apenas se curar da

•aia irreprimível (quando a lua está cheia) llcantropia.

O rei da maquiagem Jack Plerce desenvolveu para Chaney uma complexa fantasia

• li H-lo de iaque que se tornaria modelo de incontáveis máscaras de Halloween. O que

distingue a trama de Siodmak de outras histórias de lobisomem é a ênfase velada na

•iieigla sexual reprimida como mola propulsora das transformações de Talbot cm

noites de lua cheia. Conforme explica a cigana Malc-

v.i (Maria Ouspenskaya): "Mesmo um homem puro

de 1 oração e que faz suas orações toda noite pode se

tornar u m lobo quando a mata-lobos desabrocha e a

In/ de outono brilha no céu."

Somente na década de 40, o sucesso do filme de

Waggner gerou outros quatro filmes de lobisomem

lendo à frente Chaney. Desde então, dezenas de

Imitações, releituras e paródias se seguiram a ele. SJS

EUA (Universal) 70 min. P&B

Direção: George Waggner

Produção: Jack J. Cross, George

Waggner

Roteiro: Curt Siodmak

Fotografia: Joseph A. Valentine

Música: Charles Prevln, Hans J. Salt-

Frank Skinner

Elenco: Claude Rains, Warren

William, Ralph Bellamy, Patrlc

Knowles, Bela Lugosl, Maria

Ouspenskaya, Evelyn Ankers, J. M.

Kerrigan, Fay Helm, Lon Chaney Jr.,

Forrester Harvey

EUA (First National, Warner Bros.)

101 min. P8tB

Idioma: inglês

Direção: John Huston

Produção: Henry Blanke, Hal B. Wallis

Roteiro: John Huston, baseado no

livro de Dashlell Hammett

lotografia: Arthur Edeson

Música: Adolph Deutsch

i lenco: Humphrey Bogart, Mary

Altor, Gladys George, Peter Lorre,

Bllton MacLane, Lee Patrick, Sydney

Greenstreet, Ward Bond, Jerome

i nw.in, Elisha Cook jr., James Burke,

Murray Alper, John Hamilton

Indicação ao Oscar: Hal B. Wallis

(melhoi filme), John Huston (roteiro),

Sydney Greenstreet (ator

i oadjuvante)

O FALCÃO MALTES ( m i ) (THE MALTESE FALCON)

M A R y

Em 1941, o grande romance de detetive de Dashiell Hammett já havia rendido dual

adaptações passáveis para o cinema. Primeiro com o filme homônimo de 1931, com Kl

cardo Cortez como Sam Spade, e depois com Satan Met a Lody, de 1935, com Warrefl

Will iam no papel. John Huston, tendo experiência de escritor, escolheu o livro do

catálogo de obras compradas pela Warner Brothers e confiava de tal forma na força do

material que seu roteiro consiste essencialmente em uma transcrição dos diálogos de

Hammett. Ele teve a sorte de ter nas mãos um elenco simplesmente impecável e

comedimento suficiente para não cair no exagero.

Muitas vezes considerado o fundador do gênero noir, O falcão maltês é contido 1111

uso de sombras simbólicas - que são guardadas para o final, quando a porta do ele

vador as lança na forma de barras de cela de prisão no rosto da dissimulada heroína - e

se passa quase por inteiro em quartos de hotel impessoalmente bem arrumados e

escritórios a quilômetros de distância do glamour maltrapilho de À beira do abismo

(1946) ou Até a vista, querida (1944). Humphrey Bogart, evoluindo de papéis de vilão

para heróis românticos durões, é Sam Spade, um detetive particular de São Francisco.

Ele é um homem de negócios bem alinhado que está disposto a encontrar o assassino

do seu parceiro e frustrar os planos de um grupo de aventureiros traiçoeiros. Estes se

tornaram tão obcecados em sua procura pelo fabuloso pássaro Incrustado de jóias do

título que cometem o erro fatal de supor que todos são tão corruptos e gananciosos

quanto eles. A ptincípio, Mary Astor pode parecer um pouco matrona demais para uma

femme foto/e, mas, curiosamente, sua estranha elegância de terninhos bem-compor-

tados e penteados mais bem-comportados ainda combina com uma mulher que tem

sempre um álibi na manga. O Kaspar Gutman tagarela, obeso e narcisista de Sydney

Greenstreet e o Joel Cairo educado, triste, perfumado c resmungão de Peter Lorre - uma

espécie de o Gordo e o Magro do crime - são um clássico imortal do cinema,

juntamente com o eterno fracassado / bode expiatório Elisha Cook Jr. como Wilmer, o

capanga Irritadinho que está fadado a sempre ficar fora da jogada.

A reputação de Hammett é sustentada pelo fato de ele tet acrescentado um certo

realismo social às histórias de mistério americanas, com detetives particulares que são

profissionais de verdade em vez de superlnvestigadores. Ele

também era viciado em tramas tão doentias e bizarras

quanto as do teatro jacobiano: o clímax de O falcão maítês

possuí não só a hilária surpresa de que o pássaro negro -

pelo qual todos se dispuseram a matar e conspirar - é, na

verdade, uma farsa como também o momento clássico em

que o detetive admite amara assassina, mas ainda assim a

deixará ser arrastada para a cadeia. Enquanto outros gran­

des diretores de Hollywood seguiam suas próprias visões, o

melhor de Huston - desde O tesouro de Sierra Madre (1948),

passando por O segredo das jóias (1950), Cidade das ilusões

(1972) e Wise Blood (1979), até Os vivos e os mortos (1987) -

está em suas adaptações fiéis de romances clássicos me­

nores. K N

H U M P H R E Y

B O G A R T

A S T O R

I UA (W.irner Bros.) 134 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Howard Hawks

ProduçSo: Howard Hawks, Jesse L l.r.ky, Hal B. Wallis

itiiiciro: Harry Chandlee, Abem Finkel,

I in Huston, Howard Koch

loiografia: Sol Polito t

Mn-.il ,K Max Steiner

1 linco: Gary Cooper, Walter Brennan,

10.1 it I L'slie, George Tobias, Stanley

Ridges, Margaret Wycherly, Ward Bond,

Noah Beery Jr., June Lockhart

OlCir: Gary Cooper (ator), William

1 |l limes (edição)

i h . I k . iç. ío ao Oscar: Jesse L Lasky, Hal B.

Willis (melhor filme), Howard Hawks

(diretor), Harry Chandlee, Abem Finkel,

|0hn I lii'.ion, Howard Koch (roteiro),

W.ilici Brennan (ator coadjuvante),

Marga rei Wycherly (atriz coadjuvante),

•.ill I'oliio(fotografia),John Hughes,

1 red M. MacLean (direção de arte), Max

Stelnei (musica), Nathan Levinson (som)

SARGENTO Y O R K 0 9 4 1 ) (SERGEANT YORK) Sargauo York exalta o bom combate da Primeira Guerra Mundial no momento em qui

os Estados Unidos se preparavam para entrar na Segunda. Um subtexto beligerante In .1

claro em todo o filme, porém ele é facilmente assimilado pelo conjunto de valorei

morais do protagonista do título.

Alvin York, conforme caracterizado por Gary Cooper, usa gírias caipiras e fala com

sotaque do interior. Sua transformação de um fazendeiro cheio de energia da

Tennessee em um pacifista cristão e, por f im, em herói de guerra exalta uma série de

convenções hollywoodianas, como mães santificadas e líderes bondosos. Clichê? Sein

dúvida. Porém a importância desta pérola do cinema está em ter tornado Gary Coopei

um astto, se não em rettatar de forma honesta a guerra de trincheiras meses antes de

Pearl Harbor.

O fato de não haver uma melhor contextualização da Primeira Guerra Mundial faz

todo o sentido aqui. Sargento York está intetessado apenas na coragem e no sacrifício.

Qualquer outra coisa sabotaria sua postulação da defesa da liberdade como o mais

nobre dos objetivos. Enaltecendo as virtudes bíblicas ao mesmo tempo que mostra

tiroteios exttaordinários, o filme mistura, sem cetimônia, camaradagem, romances

castos e trocas de socos. Resumindo, temos o mundo de Hawks perfeitamente trans­

posto para uma cinebiografia que capricha nos valores intetioranos e economiza no

conflito violento que tornou o Alvin York da vida real famoso. G C -0

I UA (Wall Disney) 64 min.

Technicolor

Direção: Ben Sharpsteen

Produção: Walt Disney

H e l e n o : o ito Englander, baseado no

llvui de Helen Aberson

Múlli -e 1 rank Churchill, Oliver W.ill.lie

I lein o (vozes): Herman Bing, Billy

l l t t l her, I dward Brophyj im

1 . 1 1 Ii.iel, Hall johnson Choir, Cliff

I dw.iids, Verna Feiton, Noreen

1 i lmmll l , sterling Hoiloway, Malcolm

1 lui in11. Harold Manley, John

Ml 1 el lh, lony O'Neil, Dorothy Scott,

• 11 111 selby, Billy Sheets, Charles

Muhle.. Margaret Wright

Oncar: I rank Churchill, Oliver Wallace

(nill'.li a)

u n i e .,, an ao Oscar: Frank Churchill,

lied Washington (canção)

IrMlv.il de Cannes: Walt Disney

lui. Hun piodução de animação)

DUMBO (1941) Mesmo nos dias de hoje, as animações dos estúdios Disney se voltam com freqüência

para contos de fadas tradicionais e célebres histórias folclóricas em busca de

Inspiração. No entanto, o quatto longa-metragem de animação da produtora, Dumbo,

como o subseqüente Bambi, tem suas origens em um livro relativamente modesto, o

que aparentemente livrou os animadores do habitual romantismo no estilo príncipe-

salva-princesa.

Dumbo ainda é banhado em sentimentalismo, porém os protagonistas antro-

pomorflzados - Dumbo, o elefantinho de circo rejeitado, cujas orelhas gigantes e jeito

trapalhão o tornam alvo de zombaria, e Tlmothy, seu experiente companheiro roedor -

se prestam a momentos de ação divertidamente caótica e também a algumas seqüên­

cias circenses executadas com criatividade. Contudo, duas cenas no decorrer da busca de

Dumbo por seu amor-próprio se destacam de todo o testo: a alucinação protopsicodélica

do elefante cor-de-rosa e o encontra terno e angustiante de Dumbo com sua mãe equi­

vocadamente "enjaulada". Raras vezes um filme de animação foi tão inventivo, co­

movente e vivo quanto nesses dois trechos, que são acompanhados por canções igual­

mente memoráveis. O triunfo final de Dumbo sobre as adversidades, assim como sua

reunião com a mãe, podem estar subentendidos desde o início, porém a estrutura emo­

cional do filme é tão bem construída que os desafios mirabolantes encarados pelo pobre

elefante servem justamente para dar mais intensidade ao desfecho entemecedor. J K l

O ULTIMO REFUGIO mu (HIGH SIERRA) 0 i i í i i i i i o refúgio, de Raoul Walsh, é um marco do gênero gângster, uma virada na

m i i i . i de Humphrey Bogart e um exemplo de filme de ação existencialista. Como

M u n i ' , esquecidos (1939), a obra anterior de Walsh, O último refúgio é um filme de gangs-

lei cm forma de elegia, atípico dentro desse período dominado pelo Código de Produ-

11 conta do seu retrato compassivo do gângster como um proscrito fora de época.

I I nsano Roy Earle (Bogart) mostra estar acima dos marginais e hipócritas que encon-

I I I em ambos os lados da lei ao liderar um roubo malfadado a um hotel, cometer a

tolice de perseguir uma garota respeitável (Joan Leslie) e encontrar brevemente na

pi-r.onagem também proscrita de Ida Lupino uma melhor companheira.

Em contraste com seus contemporâneos John Ford. Howard Hawks, Frank Capra e Mi-

' li.u'1 Curtiz, que frisavam o valor de uma comunidade ou grupo, Walsh deu mais peso ao

i i n o , inconformismo e qualidades anti-sociais dos seus heróis. A visão de O último

refúgio de uma sociedade moralmente rígida é de uma mordacidade extraordinária,

1I1 .inçando seu auge na seqüência em que Roy é rejeitado de forma humilhante por sua

piinceslnha insossa de classe média em favor de seu namorado arrogante e conformista.

Depois de uma década interpretando quadrados c marginais, Bogart conseguiu seu

papel mais substancioso até então em O último refúgio. Em O falcão maltês, seu outro

Ulme importante de 1941, Bogart é expansivo, presunçoso, dominador. Aqui, no univer­

so de Walsh, sua atuação mais sutil cria uma persona claramente diferente: soturno, re­

l v a d o e tenso, com os ombros encurvados e gestos econômicos, enfatizando a na­

tureza retraída do personagem. Mesmo nas cenas mais íntimas com sua alma-gêmea

i.irie (Lupino), Walsh coloca objetos e barreiras entre os amantes para frisar seu

isolamento fundamental.

O último refúgio começa e termina no elevado pico do monte Whitney, que surge em

lodo o fi lme, sua presença hipnotizadora conduzindo o herói a o seu destino solitário.

Um outro personagem do submundo diz a Roy: "Você se lembra do que Johnny Dillinger

lalou sobre sujeitos como você e ele? Ele disse que vocês estavam apenas correndo em

direção à morte. É, isso mesmo: apenas correndo em direção à morte!" A ótima cena de

perseguição de carros na qual os policiais seguem Roy pela montanha fatal acima - um

espetacular desfecho para o estilo tenso e movimentado do filme - traduz essas palavras

para a linguagem visual dinâmica do cinema de ação em seu auge. MR

EUA (Warner Bros.) 100 min, P& B

Idioma: inglês

Direção: Raoul Walsh

Produção: Mark Hellinger, II.il 11

Wallis

Roteiro: John Huston, baseado no

livro de W. R. Burnett

Fotografia: Tony Gáudio

Música: Adolph Deutsch

Elenco: Ida Lupino, Humphrey

Bogart, Alan Curtis, Arthur Kennedy,

Joan Leslie, Henry Hull, Hen 1 y l i . i v e i ' , ,

Jerome Cowan, Minna Gombell,

Barton MacLane, Elisabeth R i s d n n ,

Cornel Wilde, Donald MacBride, Paul

Harvey, Isabel Jewell

F IIA (iMi.imount) 90 min. P&B

D l r t Ç l o : Preston Sturges

Produção: Paul Jones, Buddy G.

DeSylva, Preston Sturges

Roteiro: Preston Sturges

•OtOfrafla: John F. Seitz

Musica: Charles Bradshaw, Leo

S l l l l k e n

Elenco: Joel McCrea, Veronica Lake,

[Oben Warwick, William Demarest,

i.inklln Pangbom, Porter Hall, Byron

nulgcr, Margaret Hayes, Robert

Irilg, Lire Blore, Torben Meyer, Victor

'ulcl. Richard Webb, Charles R.

Moore, Almiia Sessions

CONTRASTES HUMANOS (1941) (SULLIVAN'S TRAVELS) Preston Sturges foi um dos primeiros autores do cinema americano e, com sua persona

lidade claramente moderna (a melhor amiga de sua mãe era Isadora Duncan; ele passo

a juventude zlguezagueando pelo Atlântico; um batom "à prova de beijos" e um teletip

estão entre suas invenções patenteadas), ele foi responsável por uma enxurrada de

filmes na década de 40, hoje considerados clássicos. Esses filmes são conhecidos por sua

sofisticada espirltuosidade verbal, comédia física agitada e pela maneira carinhos

como retratam seus excêntricos personagens coadjuvantes, que roubam as cenas

Porém a obra de Sturges faz uma sólida exploração das possibilidades e perspectivas d

escalada - e ocasionalmente da derrocada - social. Neste Contrastes humanos, qu

talvez seja seu melhor e mais complexo filme, Sturges mistura de forma brilhante humor

com uma crítica social mordaz, revelando mais uma vez - como em O homem que se

vendeu (1940), Natal em julho (1940) e As três noites de Eva (1941) - que a Identidade social

é um conceito altamente Instável, capaz de passar por transformações hiperbólicas

através de métodos prosaicos como disfarces, mal-entendidos e auto-engano.

John L. Sullivan (Joel McCrea) é um diretor hollywoodlano infalível que se especia­

liza em entretenimento leve, à maneira de comédias acessíveis como seu filme de 1939

chamado Ants In Your Pants (Formigas nas calças). Ingênuo e amparado por uma equip-

solíclta que não está interessada em ver seu ganha-pão mudar de gênero ou tornar-se

multo ambicioso em suas pretensões cinematográficas, Sully ainda assim pretend

dirigir uma crítica social épica sobre os tempos difíceis da Depressão na América, qu

se chamaria O Brother, Where Art Thou? (um título fictício que seria usado pelos Irmãos

Coen em seu filme de 2000 E aí, meu irmão, cadê você?, em uma inteligente homena­

gem a Sturges). Para pesquisar seu tema, que envolve coisas desagradáveis, como

sofrer privações e preconceito racial, Sully insiste em se disfarçar de mendigo e cruzar o

país para experimentar "a vida real" na própria pele.

Uma vez na estrada, uma série de aventuras, encontros (aquele com a Ingênua

azarada personagem de Verônica Lake sendo o de maior destaque) e percalços - algun

hilários, outros surpreendentemente pungentes - se dão antes de Sully

acabar aceitando sua verdadeira vocação para cineasta popular com um

dom para fazer as pessoas rirem. A lição aqui é que a seriedade exagerada

e a profundidade forçada são multo menos úteis para as massas do que o

bom e velho humor, com seu poder de ajudar as pessoas a esquecerem

seus problemas, ainda que momentaneamente.

É impossível negar que Contrastes humanos possui um aspecto auto­

biográfico, com Sturges afirmando o valor daquilo que ele próprio fazia de

melhor - comédias inteligentes com o poder de animar seus espectadores-

ao mesmo tempo que arrasa a pretensão dos cineastas mais sisudos e

"socialmente comprometidos" de Hollywood. Comentários pessoais à parte,

no entanto, o tour de force em forma de roteiro reúne um fabuloso leque de

gêneros, incluindo comédia pastelão, ação, melodrama, documentário

social, romance, musical e filme de prisão. Embora não tenha conquistado

uma só indicação ao Oscar, Contrastes humanos é o mais extraordinário filme

da carreira de um dos maiores cineastas americanos. SJS

lUA (I ox) 118 min. P8cB

Idioma: inglês

irliri ,u>: loliii Ford

Produção: Darryl F. Zanuck

ii no: Philip Dunne, baseado no

Ir Richard Llewellyn

i ningi.ilia: Arthur C. Miller

Minie a: Allied Newman

I lento: Waller Pldgeon, Maureen I I i l e a . Auna Lee, Donald Crisp, Roddy MeDowall, John Loder, Sara Allg I, Harry Fitzgerald, Patrie

I- nowles, Morton Lowry, Arthur • l i ie l i l - , . Aun E. Todd, Frederick

W i n lurk. Richard Fraser, Evan S. Evans

,n i i.myl I. Zanuck (melhoi

Filme), |ohn Ford (diretor), Donald

I lisp (ator coadjuvante), Richard Day,

N.un.ni luían , Thomas Little (direção

de .mc), Arthur C. Miller (fotografia)

in.li, a, ao ao Oscar: Philip Dunne

(uilelin), Sara Allgood (atrlz

Oldjuvante), James B. Clark (edição),

a l l ied Newman (música), Edmund H.

Hansen (som)

COMO ERA VERDE MEU VALE ( 1 9 4 1 )

(HOW GREEN WAS MY VALLEY) Embora John Ford seja obviamente mais famoso por seus faroestes, ele também tinha

uma predileção por tudo que envolvesse a Irlanda. Não que esta adaptação, ganhadoi.i

do Oscar, do romance de Richard Llewellyn tenha sido ttansportada pelo Mar da Irlanda

de sua ambientação nos vales mlneradores do País de Gales; em vez disso, o filme 4

imbuído do mesmo tipo de nostalgia das necessidades excêntricas da vida em família nu

Velho Continente que caracterizava Depois do vendaval, de 1952. O País de Gales de Ford,

na verdade, é tanto um país Imaginário quanto o era sua amada Irlanda (pelo menos na

maneira como é representada na tela ou invocada em palavras). Isso explica por que a

vila mineradora belamente projetada de Richard Day, mesmo com o excruciante nível de

detalhe aplicado à sua construção nos terrenos da Fox, parece mais uma representação

onírica de um arquétipo daquela região do que um vilarejo de verdade.

Isso, no entanto, combina perfeitamente com o clima de nostalgia que alimenta Como

era verde meu vale do início ao fim. A história é narrada por um homem que reflete sobre

sua infância já longínqua, na qual, como o caçula (Roddy McDowall) da família Morgan, ele

observava o pai (Donald Crlsp) e seus quatro irmãos subirem a pé diariamente a colina a

caminho da mina. Ele se lembta não só das dificuldades - as arriscadas condições de

trabalho, a ameaça da pobreza, o frio e a fome - e das mortes trágicas como também do

senso de comunidade caloroso e temo que imperava nas vidas tanto da família quanto da

vila como um todo. Contudo, essa unidade feliz se perdeu para sempre quando cortes sa­

lariais acarretaram greves e conflitos entre os patriarcas amáveis, porém tradicionais, e os

filhos (ligeiramente) mais militantes, o que resultou na partida dos filhos pata a Terra

Prometida da America - onde m a i s ? - , em busca de trabalhos mais bem remunerados.

O filme todo é permeado por recordações agridoces: da morte do pai, da inocência

infantil, do país de origem e de um pai rígido, porém justo. Ford, sem dúvida, idealiza o

mundo que retrata, entretanto, é isso que o torna tão eficaz. Sim, o filme é feito para

arrancar lágrimas, repleto de clichês (os mlneradores nunca param de cantar) e os

sotaques são uma esttanha mistura de todas as partes do Reino Unido e da Irlanda -

mas os sonhos não são sempre assim? GA

E^C3 E 1

•ff ,3̂ '̂ iSr, ,3̂ '̂ iSr,

MULHER DE VERDADE <1942) (THE PALM BEACH STORY) <•'<•-1v Vallee tem a melhor atuação de sua carreira como o milionário gentil e franzino

I n h i i D. Hackensacker III nesta brilhante comédia escrachada de 1942, que é ao mesmo

tempo singela e mordaz. Claudette Colbert, esposa de um arquiteto ambicioso, porém

•.em um tostão (Joel McCrea), viaja para a Flórida e acaba sendo cortejada por

Hackensacker. Quando McCrea chega, ela o convence a fingir ser seu irmão. Para

Completar, temos algumas criações inesquecíveis de Sturges, como o Rei das Salsichas

1 1 Dudley), os alucinadamente destrutivos membros do Ale and Quall Club, a irmã

B e d a de Hackensacker (Mary Astor) e seu namorado europeu de origens obscuras.

0 personagem de Hackensacker talvez seja a coisa mais próxima de um auto-retrato em

l i i i m a de paródia no cânone de Sturges, no entanto, Mulher de verdade é imbuído de

1 amanha sabedoria irônica e humor que transcende sua natureza pessoal. O papel foi

1 ito para Vallee depois que Sturges o viu em um musical, percebeu que a platéia ria toda

vc/ que ele abria a boca e concluiu que aquele homem era hilário sem nem ao menos saber

disso. Essa inconsciência da própria graça exercia um papel fundamental no conceito de

Comédia de Sturges, que incluía também a ingenuidade da platéia e dos próprios

personagens. A frenética seqüência de abertura "entrega" o final-surprcsa da trama antes

de os espectadores começarem a entender o que está acontecendo. Conforme o crítico

laines Harvey notou muito bem: "Neste filme, sempre que a realidade se toma um pro­

blema - no caminho para a Penn Station, por exemplo, quando um taxista interpretado por

1 i.ink Faylen concorda em levar Colbert até lá de graça - , ela é simplesmente revogada" JRos

EUA (Paramount) 8 8 min. P 8 t B

Idioma: inglês

Direção: Preston Sturges

Produção: Paul Jones

Roteiro: Preston Sturges

Fotografia: Victor Milner

Música: Victor Young

Elenco: Robert Dulley, Frank Faylen,

Claudette Colbert, Joel McCrea, Mary

Astor, Rudy Vallee, Slg Arno, Robei 1

Warwick, Arthur Stuart Hull, rorben

Meyer, Jimmy Conlin, Victor Potcl,

William Demarest, Jack Norton,

Robert Creig, Roscoe Ates, Dewev

Robinson

A ESTRANHA PASSAGEIRA (1942)

(NOW, VOYAGER) O fato de A estranha passageira, de Irving Rappcr, ter conservado sua popularidade pode

ser explicado pelos despudorados crescendos emocionais do filme, pelo carisma de sua

estrela e, especialmente, pelo prazer - por mals perverso que ele seja - que retiramos de

ver a transformação de Bette Davis de um patinho feio em um cisne (sua atuação lhe

tendeu uma Indicação ao Oscar).

Um dos melodramas americanos clássicos e o precursor dos filmes de "trans-

lormação", A estranha passageira conta a complexa história da solteirona Charlotte Vale

(Davis), a filha inacreditavelmente desleixada (basta olhar para as sobrancelhas grossas

e para os óculos dela) de uma matriarca opressora de Boston. O psiquiatra Dr. Jaquith

(Claude Rains) salva Charlotte mandando-a para um sanatório, onde sua cura é ante­

cipada quando o médico quebra de forma teatral seus óculos (que mulher "normal"

precisa deles?) e dá-se seu renascimento (ao som da trilha dramática de Max Stelner)

como a estrela de cinema Bette Davis: deslumbrante desde as sobrancelhas feitas até

suas sapatilhas bicolores. Essa borboleta recém-saída do casulo decide viajar e se apai­

xona por Jerry Durance (Paul Henreld), um homem casado; o romance deles é contado

em grande parte através do uso expressivo dos cigarros, que sugerem o sexo que não

vemos na tela. A trama se desenrola maravilhosamente a partir daí, terminando com a

decisão de não buscar mais que amizade com a célebre, embora misteriosa, fala de

Charlotte: "Oh, Jerry, não vamos almejar a Lua. Nós temos as estrelas." M O

EUA (Warner Bros.) 117 min. PBcB Idioma: inglês

Direção: Irving Rapper

Produção: Hal B. Wallis

Roteiro: Casey Robinson, baseado no

livro de Olive Hlggins Prouty

Fotografia: Sol Polito

Música: Max Steiner

Elenco: Bette Davis, Paul Henreld,

Claude Rains, Gladys Coopei, Bonltl

Granville, John Loder, Ilka Chase, I ee

Patrick, Franklin Pangborn, Katharine

Alexander, James Rennie, Maiy

Wiekes

Oscar: Max Steiner (música)

Indicação ao Oscar: Bette Davis

(atriz), Gladys Cooper (atriz

coadjuvante)

I i m (Warner Bros.) 102 min. P&B

Idioma: inglês / francês / alemão

Direção: Michael Curtiz

Produção: Hai B. Wallis, Jack L.

W a m e l

Roteiro: Julius J. Epstein, Philip C.

i pitein, Howard Koch, baseado na

" -i <lr Murray Burnett e Joan Alison

Iningrafia: Arthur Edeson

Múllca: M. K. Jerome, Jack Scholl,

Max Stelner

i lenço: llumphrey Bogart, Ingrid lieignian, Paul Henreid, Claude Rains,

ad Veidt. Sydney Creenstreet, Pelei l n i l e , S. Z. Sakall, Madeleine I r l i c i u , Dooley Wilson, Joy Page, lohn D u a l e n , Leonid Kinskey, Curt hui', c Dooley Wilson Oicar: Hai B. Wallis (melhor filme),

lel Curtiz (diretor), Julius J. i piteln, Philip c. Epstein, Howard Km h (roteiro)

Indicação ao Oscar: Humphrey BOgarl (ator), Claude Rains (ator (Oldjuvante), Arthur Edeson (fotografia), Owen Marks ( Hagem), Max Stelner (música)

CASABLANCA 1 1 9 4 2 1

O mais querido de todos os ganhadores do Oscar de Melhor Filme, este romântico

melodrama de guerra sintetiza a febre da década de 40 por exotismos de estúdio, t nu 1

os terrenos da Warner transformados em um Norte da África fantástico que parece

muito mais autêntico do que qualquer outro lugar meramente real poderia ser. Casablmi, ,1

também conta com mais atores cult, falas passíveis de citação, clichês instantâneos e

descaramento hollywoodiano do que qualquer outro filme da era de ouro do cinema.

O Rick de Humprey Bogart ("De todas as espeluncas que servem gim..."), vestindo

ternos brancos ou sobretudo com cinto, e a lisa de Ingrld Bergman ("Eu sei que jamais

terei forças para deixá-lo novamente"), com seus figurinos mais apropriados para um

estúdio do que para uma cidade no meio do deserto, flertam em um café-cassino en­

quanto aquela canção inesquecível ("As Time Goes By") soa ao fundo, transportando-os

de volta para uma vida mais simples antes de a guerra arruinar tudo. Contudo, a melhor

interpretação fica por conta de Claude Rains, como o cínico, porém romântico, chefe de

polícia Renault ("Reúna os suspeitos de sempre"), um Irônico observador dos absurdos

da vida que é ao mesmo tempo um sobicvivente oportunista c o mais verdadeiro

romântico do filme - merecendo plenamente seus últimos e famosos instantes ("Louis,

acho que este é o começo de uma bela amizade"), que mostram que ele, e não lisa, é o

parceiro ideal para o herói recém-comprometido-com-a-liberdade de Rick.

O extenso elenco de coadjuvantes também é memorável: Victor Laszlo, o tcheco

patriota de Paul Henreid, liderando a escória do continente em uma empolgante execução

da Marselhesa que abafa a cantoria nazista e restaura o fervor patriótico até dos mais

ardorosos colaboracionistas e parasitas; o vigarista Ugarte de Peter Lorre, admitindo

timidamente que confia em Rick por ele o desprezar; o vilão nazista Major Strasser de

Conrad Veidt, tentando fazer uma ligação que jamais conseguirá completar; o leal Sam de

Dooley Wilson, dedilhando seu piano e trocando olhares com os protagonistas; Carl, o obe­

so mordomo de S. Z . Sakall, um austro-húngaro deslocado e suarento apesar do ventilador

de teto; e o Improvável empresário ãrabc-ltallano Ferrari de Sydney Greenstreet, acocorado

no que parece um tapete mágico com seu barrete. Mesmo os figurantes foram escalados de

forma brilhante, acrescentando à atmosfera viva, sedutora e povoada de um filme que,

mais do que qualquer outro, seus fãs desejam habitar, um impulso que serve de com­

bustível para Sonhos de um sedutor, a charmosa homenagem de Woody Allen.

Curtiz conta uma história complicada e cheia de truques - que sofre com

um excesso de explicações e é estruturada em torno de um flashback no

meio do filme, que se passa em Paris e quebra boa parte das regras de roteiro

- com tão pouco alarde e tanta segurança que o conjunto parece Impecável,

apesar de ter sido supostamente reescrito dia a dia para que Bergman não

soubesse até a fi lmagem da cena final se ela iria partir no avião com Henreid

ou ficar com Bogey. Sua grandeza duradoura como cult se deu por conta des­

sa postura, mas também pela sua rara sensação de incompletude: realizado

antes do fim da guerra, ele ousa deixar seus personagens literalmente no ar

ou no meio do deserto, fazendo com que seus espectadores originais - e os

muitos que descobriram o filme no decorrer dos anos - ficassem se pergun­

tando o que teria acontecido com aquelas pessoas (cujos problemas mes­

quinhos não passam de "um monte de feijões") nos turbulentos anos que se

seguiram. K N

I UA (Knmaine) 99 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Ernst Lubitsch

Produção: Alexander Korda. Ernst

I nbltsch

Roteiro: Melchior Lengyel, Edwin

Justus Mayer

Ilitografia: Rudolph M a t e

Musica: Werner R. Heymann, Miklós Rózsa

I lenco: Carole Lombard, Jack Benny,

Robert Mack, Felix Bressart, Lionel

/Mwill, Stanley Ridges, Sig Ruman,

Ibm i lugan, Charles Halton, George

I v i m , Henry Victor, Maude Eburne,

Hllllwell Hobbes, Miles Mander

hulii ação ao Oscar: Werner R. 1 • i n . i n n (música)

SER OU NAO SER < 1 9 4 2 )

(TO BE OR NOT TO BE) "O que ele fez com Shakespeare nós estamos fazendo com a Polônia", brinca um

coronel alemão referindo-se a um ator de teatro exagerado na ultrajante comédia de

humor negro de guerra de Ernst Lubitsch. Em uma era em que nada é sagrado ou sério

demais para ser satirizado, é difícil Imaginar a controvérsia que cercou originalmente a

escrachada farsa antinazista brilhantemente espirituosa e hilária de Lubitsch.

Lubitsch era um judeu alemão que se estabeleceu nos Estados Unidos na década de

20 e realizou uma série de comédias arrasadoras e de estilo inimitável. Mesmo assim, o

diretor hesitou quando Melchior Lengyel - que concebeu Ninoichka (1939), também

dirigido por ele - surgiu com esta idéia sobre uma trupe de atores que se fingem de

membros da Gestapo para salvar membros da Resistência polonesa. No entanto, o

diretor acabou por acreditar - e esperar - que os americanos se preocupariam mais

com a Polônia se ele pudesse estimular a compaixão deles através do riso, aplicando o

famoso Toque de Lubitsch (com um roteiro sofisticado de Edwin Justus Mayer) aos

nazistas e seus adversários.

O comediante Jack Benny, em seu momento mais brilhante, interpreta Josef Tura, o

vaidoso ator-diretor de uma companhia de teatro eternamente em conflito com sua vo

lúvel esposa Maria, a atriz principal do grupo, interpretada pela deliciosa Carole Lombard

(que aceitou o papel contra a vontade de seu marido Clark Gable e foi tragicamente

assassinada antes do lançamento do filme). Depois dessa

batalha na guerra dos sexos, os Turas têm coisas mais impor­

tantes para se preocupar - como a invasão da Polônia - e se

envolvem em espionagem. O tom muda a partir de uma trai­

ção e volta a mudar quando a trupe briguenta de Tura põe

suas divergências de lado e bola uma audaciosa farsa para

resgatar Maria e seu admirador - o herói da Resistência inter­

pretado por Robert Stack - do quartel-general da Gestapo.

Este já foi considerado por muitos o filme mais engra­

çado de Lubitsch, justamente por ser o mais sério deles -

prova disso é Sou ou não sou, a refllmagem de Mel Brooks de

1983, que, apesar de engraçado, não compartilha da mesma

urgência de se realizarem proezas desesperadas em uma

época perigosa. Os momentos sarcásticos (como a imitação

perversa que Tom Dugan faz de Hitler) não ofuscam a essên­

cia da sátira, que é o olhar do filme sobre o mal de que ho­

mens comuns são capazes quando sentem o gosto do poder,

ou sua mensagem de que mesmo atores egoístas podem

fazer algo de bom quando agem como seres humanos. AE

A MARCA DA PANTERA (1942)

(CAT PEOPLE) O i I ilmes de terror produzidos pela Val Lewton/RKO na década de 40 são um ponto alto

nero, obras célebres pela aura sutil de medo em vez de efeitos especiais repugnan-

h". A marca da pantera, dirigido por Jacques Tourneur, apresenta a história trágica de

In II 1, a mulher-felina que teme destruir aqueles que mais ama.

Ollie Reed (Kent Smith) vê a bela e sexy Irena Dubrovna (Simone Simon) dese­

nhando uma pantera negra no zoológico. O breve romance dos dois leva ao casamento,

in . is sinais de problemas não tardam a surgir, Irena parece obcecada por grandes felinos

I " I I V E seus gritos ("como os de uma mulher") à noite. No entanto, quando Ollie leva

gatinho para casa para lhe dar de presente, ele rosna e bufa. "Estranho", fala o dono

1I.1 loja de animais para Ollie, "gatos sempre percebem quando há algo de errado com

n i n a pessoa."

O que há de errado com Irena permanece essencialmente ambíguo e essa é a força

do filme. Será ela uma jovem reprimida com medo de consumar seu casamento, con-

loime sugere seu psiquiatra (Tom Conway), ou uma herdeira das malévolas bruxas

adoradoras de Satã de seu vilarejo natal na Sérvia? Irena teme que emoções fortes como

luxúria, ciúme ou raiva libertem a pantera assassina que vive dentro dela. De fato, essas

, inoções fogem ao seu controle: em uma cena ela arrasa seu afetuoso analista e, em

mitra seqüência assustadora, ela persegue sua rival Alice (Jane Randolph), que trabalha

com Ollie e também o ama.

A marca da pantera não vai matá-lo de medo; por outro lado, também não exagera

na abordagem sexual como a risível refllmagem de

I982, de Paul Schrader, com suas cenas de bondage e

violência gráfica. O filme é assustadoramente eficaz,

especialmente no uso de luz e sombra. Em uma cena

merecidamente famosa, Irena segue Alice até uma

piscina subterrânea, forçando-a a nadar em pânico

enquanto ouvem-se sons misteriosos e sombras bru­

xuleiam em reflexos líquidos de luz.

Embora um tanto datado, A marca da pantera

conta com diálogos afiados. Alice provoca simpatia

o r n o "o novo tipo de mulher" - inteligente, inde­

pendente, respeitável e amorosa. Ollie é provavel­

mente dócil demais para merecer o amor de uma

mulher do seu tipo. É Irena quem domina a atenção e

permanece na cabeça do espectador, um dos mons­

tros mais dignos de compaixão do cinema de horror

(como Bóris Karloff no papel da criatura de Frankens­

tein). Simon está encantadora - um pouco "exagera­

da" com seu rosto de gata, doce, triste e inconscien­

temente perigosa. CFr

EUA (RKO) 73 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Jacques Tourneur

Produção: Vai Lewton, Lou L. Ostrow

Roteiro: DeWitt Bodeen

Fotografia: Nicholas Musuraca

Música: Roy Webb

Elenco: Simone Simon, Kent Smith, Tom Conway, Jane Randolph, Jack

Holt

INI

I I M (Mercury, RKO) 88 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Orson Welles, Fred Fleck

Produção: Jack Moss, George

Si haefer, Orson Welles

Itoieiro: Orson Welles, baseado no

H i e de Booth Tarkington

I nio|;rafia: Stanley Cortez

M i e . i i . i : Bernard Herrmann, Roy

W e h l ,

I Irnco: Joseph Cotten, Dolores

I OStello, Anne Baxter, Tim Holt,

Ag • Moorehead, Ray Collins,

I i J m e s.inford, Richard Bennett,

I irson Welles (narrador)

Indll ação ao Oscar: Orson Welles

(1111 • 111 o I filme), Agnes Moorehead

(.ii uz I oadjuvante), Stanley Cortez

(Inlugiafia), Albert S. D'Agostino, A.

Roland fields, Darrell Sllvera (direção

de . n i e )

SOBERBA ( 1 9 4 2 )

(THE MAGNIFICENT AMBERSONS) O contrato sem precedentes de dois filmes que Orson Welles assinou com a RKO Plctuies

em 1940 lhe permitia liberdade criativa total, porém dentro de orçamentos limitados

Soberba é o multas vezes ignorado segundo filme desse contrato. Ele foi iniciado após

tétmino de Cidadão Kane (1941), mas antes de a ira de William Randolph Hearst "arruinar

a carreira de Welles como cineasta hollywoodlano. O desejo de Welles de levar

romance The Ambersons, de Booth Tarkington (ele também escreveu Alice Adam;

Monsieur Beaucaire e os contos de Penrod- todos adaptados para o cinema), para as tela

era obviamente um projeto mais pessoal do que Kane. Ele já havia realizado uma

adaptação do livro com o Mercury Theatre, que foi apresentada pelo tádio.

Baseado no mundo da alta burguesia da virada do século que Welles recordava da

própria infância. Soberba conta a história de George Amberson Minafer (Tim Holt), o ta

lentoso, porém detestável, rebento de uma família aristocrata que recebe o castigo qu

todos desejam para ele. Além dos demais paralelos, o prenome omitido de Welles er

George. Como isso deve ter parecido não só autobiográfico como, à medida que o film

era feito, tettivelmente profético, deve-se dat o crédito a Welles por seu ego te

permitido que Holt, um caubói juvenil em um raro papel sério (que só repetiria em

O tesouro de Sierra Madre, de 1948), fosse escalado como protagonista.

Os primeiros 70 minutos revelam o gênio criativo, chegando a supetat Kane. O fil

me começa com uma charmosa, porém mordaz, palestra sobre costumes masculinos

natrada por Welles e demonstrada por Joseph Cotten, e então recria o mundo confuso

tacanho, vívido e estranho dos Ambersons, que é destruído aos poucos pelo século X

- simbolizado, com perspicácia, pelo automóvel - e por suas próprias fraquezas ocul­

tas. Trabalhando com o fotógrafo Stanley Cortez em vez de Gtegg Toland, Welles engen

dra um fi lme que é tão visualmente impactante quanto Kane, mas que também trans

mlte uma nostalgia mais terna e melancólica de passeios de trenó e cartões de visita

mesmo mostrando como as injustiças de uma sociedade de classes condenam pessoa

decentes a uma vida de miséria. O empresário Eugene (Cotten) perde seu amor, a bem-

nascida Isabel (Costello), para um palerma de uma família de renome, porém

é incapaz de se dissociar da magnificência dos Ambersons, mesmo à medida

que o tempo os reduz a frangalhos.

Enquanto Cidadão Kane é composto por uma série de cenas memoráveis.

Soberba é um todo impecável: exemplo disso é a seqüência de baile em que

a câmera rodopia por entre os dançarinos, coletando pedaços da trama e de

diálogos, seguindo um elenco numeroso e submetendo-se à música e à

história. É uma ttagédia que a versão original de Welles tenha sido tirada de

suas mãos - confessadamente, enquanto ele estava no Brasil se divertindo e

não tetornando ligações - e editada. Nos últimos 10 minutos, o elenco se

torna inexpressivo enquanto se attasta por um final feliz enxertado por

alguma outra pessoa (provavelmente pelo montador Robert Wise). É como

um bigode pintado no rosto da Mona Lisa, embota a refllmagem de 2002 de

Alfonso Arau, que se atém ao fim original de Welles, não tenha sido multo

bem recebida: a mágica era obviamente Impossível de set repetida. K N

I U A (Warner Bros.) 126 min. P&B

I d i o m a : ingles

Direção: Michael Curtiz

Produção: William Cagney, Hal B.

Wil l is , Jack L Warner

Kotclro: Robert Buckner, Edmund

|usc|ih 1

Fotografia: James Wong Howe

Musica: George M. Cohan, Ray

Hllndorf , Heinz Roemheld

rlenco: James Cagney, Joan Leslie,

W.iliei Houston, Richard Whorf, Irene

Manning, George Tobias, Rosemary

Dei .imp. Jeanne Cagney, Frances

ford, George Barbier, S. Z. Sakall,

W.iliei Catlett, Douglas Croft, Eddie

Fey h . Minor Watson

Oicar: James Cagney (ator), Ray

Hllndorf , Heinz Roemheld (música),

I 1 Mi 1 evinson (som)

Indli i ç l o ao Oscar: Jack L. Warner,

1 III I: Wallis, William Cagney (melhor

lil ). Michael Curtiz (diretor),

Knlir 11 Buckner (roteiro), Walter

Houston (ator coadjuvante), George

Anny (edição)

A CANÇÃO DA VITORIA (1942)

(YANKEE DOODLE DANDY) Seria extremamente fácil formular uma perspectiva pós-moderna, pollticamenir

correta e sofisticada para classificar A canção da vitória como propaganda ultranacln

nalista. De fato, esta cinebiografia na forma de extravagância musical, que detalha a

vida do patriota showman George M. Cohan - um americano de origem irlandesa e o

primeiro artista a receber a Medalha de Honra do Congresso - , é repleta de números

musicais sentimentais e simplistas, caracterizados invariavelmente pelo estilo de dan

ça sem ginga, exaltado e Impetuoso que era a marca registrada de Cohan, e que defen

dem através de suas letras as mais rígidas instituições americanas, como, por exemplo,

"Grand Old Flag", "Give My Regards to Broadway", "Over There" e a canção do título

original. O filme é um flashback - contado por um modesto Cohan a Franklin Delano

Roosevelt - que termina com uma propaganda descarada da intervenção dos Estados

Unidos na Segunda Guerra Mundial: "Eu não me preocuparia com este país se fosse o

senhor. Vai ser moleza. Em que outro lugar do mundo um cara normal como eu pode

chegar e bater um papo com o presidente?"

Contudo, uma leitura tão cínica assim cometeria a terrível falha de Ignorar algo

surpreendente, tocante e grandioso que atravessa A canção da vitória como um rio

límpido: a magnífica sinceridade de James Cagney no papel principal. Isso fica claro no

seu jeito de sorrir sem acanhamento para frisar suas idéias; no seu tom de voz tranqüilo

e civilizado; no extraordinário virtuosismo da sua dança - com seu estilo persuasivo e

original - , que é de um atletismo incansável e ao mesmo tempo infantil, brincalhona e

lindamente absurda; e em algo que é raro vermos hoje em dia, uma vez que um

distanciamento alienado tomou conta das atuações de Hollywood: a total e apaixonada

crença de Cagney em tudo o que faz. A direção de Michael Curtiz jamais o ofusca, a

fotografia em preto-e-branco exuberante

de James Wong Howe jamais deixa de mos­

trar cada nuance da sua postura e expres­

são com uma iluminação bem articulada.

E, quando seu pai sapateador (Walter

Houston) está morrendo, com Georgie ao

lado do seu leito de morte, Cagney se

rende a um sincero arroubo emocional que

o leva às lágrimas. Na verdade, nos Impor­

tamos tanto com aquele homem que es­

quecemos que estamos diante de uma

interpretação. Cagney se torna Cohan.

Mais do que nunca, ele se torna o espírito

otimista na tela. MP

MESHES OF THE AFTERNOOIM (1943)

i imagem famosa do clássico de vanguarda Mesfies of the Aftemoon (Malhas da

tarde) mostra Maya Deren, diretora e estrela do fi lme, em uma janela, com folhas de

refletidas liricamente no vidro: ela olha para fora, pensativa, as mãos na vidraça.

I v . . i imagem foi metamorfoseada diversas vezes - em Anna Karina em uma janela de

iiiniel futurista (Alphavllk [1965]); em Annette Bening em uma cela acolchoada (A

pn-Mioniçõo [1998]); em Caroline Ducey cm seu apartamento branco e reluzente

(líninance [1999]). Seja qual for sua mutação, a Imagem continua sendo uma

11'piesentação vívida, onírica e aterrorizante do confinamento feminino.

Meshes faz parte daquela vertente da vanguarda americana que compreende um

tipo especial de história, a jornada surrealista de uma figura através de uma paisagem

i m constante mutação. Deren, trabalhando a partir de suas próprias fantasias c f i l ­

mando na sua própria casa, deu um salto intuitivo que conferiu ao filme sua reper­

cussão duradoura. Sua visão de Los Angeles liga esse Impulso mitopoético a uma

atmosfera que é protonolr em seu uso da arquitetura e design de interiores, isso sem

mencionar o clima de medo e ameaça.

Este foi um dos primeiros filmes a fazer a relação Indelével entre a experiência

gótica de uma mulher que se despedaça - estllhaçando-se em múltiplas personali­

dades, atormentada por visões, resvalando por entre realidades alternativas - c os

espaços ensolarados do seu lar, no qual cada pequena faceta, desde a escadaria da sala

de estar até a faca de pão na mesa da cozinha, é realçada. Para Deren, é o cotidiano

doméstico que tece as malhas que aprisionam e traumatizam as mulheres.

Dentre as muitas artes com as quais Deren se envolveu, a dança tem um lugar de

destaque. Em Meshes, sua extraordinária linguagem corporal se une à coreografia dos

rituais comuns, outra combinação que influenciou por décadas o cinema "feminino".

Deren usava seus movimentos como meio de impulsionar a montagem, sugerindo

formas rítmicas e criando objetos pictóricos: neste fluxo de projeções oníricas, ela é a

única âncora existente.

Ainda assim, apesar de todo o seu movimento, o último plano de Meshes revela que

essa heroína moderna provavelmente nem saiu da sua cadeira na sala de estar. No

entanto, o que ela Imaginou consegue destruí-la. Esta é uma história sobre um desejo

de morte, sobre um sonho que mata. A M

EUA 18 min. Mudo P8cB

Direção: Maya Deren, Alexander

Hammid

Roteiro: Maya Deren

Fotografia: Alexander Hammid

Música: Teljl Ito (acrescentada et

1952)

Elenco: Maya Deren, Alexander

Hammid

Inglaterra (Crown) 8o min. P8cB

Idioma: ingles

Direção: Humphrey Jennings

Produção: Ian Dalrymple

Fotografia: C. M. Pennington-

i i hauls

Música: William Alwyn

tlcnco: Philip Dickson, George

Cravett, rred Griffiths, Johnny

Houghton, Loris Key

FIRES WERE STARTED (1943)

Uma versão mais longa do clássico de guerra de Humphrey Jennings foi exibida antes do

lançamento sob um título mais cativante - / Was a Fireman (Eu era um bombeiro) . mi l

não combinava com a visão resolutamente coletivista da Inglaterra sob ataque. Em 194;,

Flres Were Started (Os Incêndios começaram) foi considerado um "documentário" e

comparado a um cinema de tradição mais comercial - aclamado como mais autêntku ,ln

que o filme de ficção dos estúdios Ealing sobre o mesmo tema: The Beíls Co Down. Hojl

em dia, seu uso de atores não profissionais, que eram bombeiros de verdade, interpre

tando personagens fictícios em uma história atquetípica sobre um dia de plantão e um

incêndio sob a lua cheia ("uma lua de bombeiro") parece muito mais um exemplo de neo

realismo ou até mesmo de cinema não-hollywoodiano. Algumas imagens de arquivo de

cinejornais são usadas, mas o quartel de bombeiros é um cenário e o fogo consiste em

efeitos especiais. O filme possui uma credibilidade tosca que às vezes é ajudada pela

inépcia de alguns atores - embora as reações à morte trágica do membro mais adora

velmente cockney da equipe pareçam forçadas ("Jacko bateu as botas") e a Injeção de

moral ("Saia dessa") perca para o "Quem é Joe?" de Paraíso infernal (1938).

No elenco estão Fred Griffiths, que virou ator profissional e fez muitos filmes como

coadjuvante, e - no papel do novato da equipe - William Sanson, que se tornou um

escritot de contos interessantemente assustadores. O filme é a síntese do livro Mith offhe

Blitz, de Angus Calder, com seu grupo composto de várias classes sociais, que chega a ser

até multicultural (há um chinês), se esforçando para fazer seu trabalho. Não há sinal de

pomposidade entte os bem articulados burocratas ou entre os telefonistas cujas funções

são tão vitais para combater os incêndios quanto os próprios bombeiros (um momento

muitas vezes parodiado é aquele em que um telefonista se desculpa pela intetrupção

depois de se jogar para debaixo da mesa quando uma bomba explode).

O final eletrizante, no qual um incêndio é controlado antes de alcançat um navio de

munições, oferece ação e suspense. No entanto, Jennings patece menos instigado por

ele do que pelo dia-a-dia, capturado com perspicácia, no qual ele mostra os homens

cantando em volta do piano, jogando sinuca, treinando, fazendo ttabalhos braçais e, no

geral, agindo como pessoas de verdade. K N

T H E M A N I N G R E Y (1943) ma inglês talvez seja mais famoso por seus dramas realistas, porém uma

ante segunda tradição sua é a do melodrama de costumes, do qual The Man in

i homem de cinza) é provavelmente o melhor exemplo e um dos fi lmes mais po-

pulares já realizados pelos estúdios Cainsborough. A trama é bastante esquecível,

endo duas jovens cujas vidas se cruzam de forma Interessante. Clarissa (Phyllis

,) se casa com o marquês de Rohan (James Mason), que a trata com cruel indifc

porém sua amiga Hesther (Margaret Lockwood) a apresenta a outro patife, o

Itfi ido e imoral Rokeby (Stewart Cranger). Logo as duas trocam de parceiros, mas t u -

do termina mal, com Clarissa morrendo tragicamente e o marquês enlouquecido es-

pjn .indo Hesther até a morte.

No entanto, a trama, retirada de um romance barato de Lady Elcanor Smith, não era

o das atenções do diretor Leslie Arllss. Calvert e Lockwood apresentam desempe-

nhi is de uma intensidade sutil como protagonistas, com seus cabelos respectivamente

e pretos em contraste, e Mason está sorrateiro o suficiente no papel de marquês.

A vrtdadelra estrela do filme, entretanto, é a produção de arte. A Inglaterra da Regência

I nssuscltada com fidelidade com sua elaborada decoração de Interiores e mobília

peia, além das roupas elegantes e ricas em detalhes tanto dos atores quanto das

in i/es. O visual luxuoso de The Man In Grey estabelece um contraste perfeito com sua

ação do lado oculto e sombrio da vida aristocrática, com os elementos góticos da

história causando um oportuno frisson no já cativado espectador. RBP

Inglaterra (Gainsborough) 116 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Leslie Arliss

Produção: Edward Black

Roteiro: Leslie Arliss, Margaret

Kennedy

Fotografia: Arthur Crabtree

Música: Cedrlc Mallabey

Elenco: Margaret Lockwood, James

Mason, Phyllis Calvert, Stewart

Granger, Helen Haye, Raymond

Lovell, Nora Swinburne, Martlta

Hunt, Jane Gill-Davis, Amy Veness,

Stuart Lindsell, Diana King, Beatili c

Varley

C O R O N E L B L I M P - V I D A E M O R T E (1943) (THE LIFE AND DEATH OF COLONEL BLIMP) 1 live Wynne-Candy (Roger Livesey) é um veterano tanto da Guerra dos Boers quanto da

limeira Guerra Mundial, duplamente reformado, que acredita que todos os conflitos

la vida podem ser encarados com honra e decoro. Ele não percebe que o mundo mudou

sua volta e que suas regras de comportamento antiquadas talvez não se apliquem

mais ao cenário da Segunda Guerra Mundial; no entanto, com a teimosia de um bom

.oldado, ele se agarra com firmeza a esses princípios e segue adiante.

Michael Powell e Emeric Pressburger realizaram Coronel Bllmp - vida e morte no

auge da Segunda Guerra, quando Londres estava sendo bombardeada todas as noites

pelos alemães. Uma comédia de costumes talvez não pareça a melhor maneira de abor­

dar os acontecimentos no calor do momento, porém a dupla Powell / Pressburger volta

.1 acertar aqui, revelando de forma delicada a terrível verdade da guerra moderna com

elegância e humor. O fato de eles contarem a história através de três romances também

ajuda, à medida que Livesey corteja Deborah Kerr (em três papéis diferentes) ao longo

dos anos. Tudo conspira para uma das conquistas mais ambiciosas não só dos diretores

• orno de todo o cinema inglês. JKI

Inglaterra (Independent. An her.)

163 min. Technicolor

Idioma: inglês

Direção: Michael Powell, Emeric

Pressburger

Produção: Michael Powell, Enteiii

Pressburger, Richard Vernon

Roteiro: Michael Powell, Emeric

Pressburger

Fotografia: Georges Périnal

Música: Allan Gray

Elenco: James McKechnie, Neville

Mapp, Vincent Holman, Roget

Livesey, David Hutcheson, Spencct

Trevor, Roland Culver, James Knighl,

Deborah Kerr, Dennis Arundell, I sivid

Ward, Jan Van Loewen, Valentine

Dyall, Carl Jaffe, Albert Lieven

IUA (RKO) 69 mm. P&B

Idioma: inglês

Direção: Jacques Tourneur

Produção: Vai Lewton

Kotciro: Inez Wallace, Curt Siodmak

lotografia: J. Roy Hunt

Música: Roy Wetfo

I l t n c o : James Ellison, Frances Dee,

l o i n C o n w a y , Edith Barrett, James

Bell, Christine Cordon, Theresa

Harris, Sir Lancelot, Darby Jones, Jeni

A MORTA-VIVA (1943)

(I WALKED WITH A ZOMBIE) A morta-viva, segundo filme de terror da dupla Val Lewton / Jacques Tourneur, ttansfere

a história do livro Jane lyre para as índias Ocidentais, onde uma jovem enfermeiia

(Frances Dee) descobre que a esposa aparentemente catatônica (Christine Cordon) de

seu patrão foi transformada através do vodu em um zumbi. Envolvido por uma canção

que permeia a trama de fundo ("Shame and Sorrow in the Family"), este é um filme

extraordinariamente sinistro.

A heroína Betsy Connell (Dee) sucumbe a uma atmosfera sobrenatural evocada

primorosamente, embora se esforce para compreender a cultura dos nativos, que

outros filmes desdenhariam como supersticiosa. Aqui, no entanto, eles acabam se

mostrando mais em sintonia com o que está acontecendo do que os supostamente

civilizados personagens brancos. Como em muitos dos filmes de Lewton, a seqüência

mais memorável é uma caminhada noturna, em que Dee conduz a morta-viva loira

através das plantações de cana, topando com uma inesquecível criatura esbugalhada

da Ilha (Darby Jones). A morta-viva faz uso do folclore caribenho e de estranhas ima­

gens religiosas (um busto de São Sebastião) para apimentar um imbróglio romântico,

que termina com todas as partes infelizes e com o vilão sendo atraído para as ondas no

encalço de sua amada zumbi. Mais distante de Bela Lugosi em O cadáver desaparecido,

impossível. K N

I UA (RKO) 71 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Mark Robson

Produção: Vai Lewton

Roteiro: DeWitt Bodeen, Charles

O'Neal

lotografia: Nicholas Musuraca

Musica: Roy Webb

I lenço: Tom Conway, Jean Brooks,

Isabel Jewell, Kim Hunter, Evelyn

(rent, Irford Cage, Ben Bard, Hugh

i taumont, Chef Milani, Marguerita

•viva. I llsabeth Russel

A SÉTIMA VITIMA (1943)

(THE SEVENTH VICTIM) Talvez o melhor da série de excelentes filmes de hotror da RKO produzidos por Val Lewton

na década de 40, A sétimo vítima é de uma modernidade surpreendente e poeticamente

fatalista. Mary Cibson (Klm Hunter), uma órfã ingênua, vai a Manhattan em busca de sua

estranha Irmã mais velha Jacqueline (Jean Brooks, com uma Inesquecível peruca de

Cleópatra) e descobre que ela se envolveu em uma seita de elegantes adoradores do diabo

que agora querem levá-la ao suicídio por ter traído o culto.

O diretor Mark Robson encena várias seqüências de suspense extraordinárias - dois

satanistas tentando se livrar de um cadáver em um metrô lotado; Brooks sendo perse­

guida pela cidade por figuras sinistras e pelas suas próprias neuroses - e se permite

toques estranhamente artísticos que afastam este filme de terror da tradicional bru­

xaria, levando-o em direção a algo muito próximo da angústia existencial. A sétima

vítima é repleto de aspectos que devem ter sido chocantes em 1943 e ainda são inco-

muns até hoje: um bando de personagens lésbicas (nem todas antipáticas), uma

heroína que acaba se mostrando tão calculista quanto os vilões e um final desespera-

dor que contrapõe uma mulher moribunda (Elizabeth Russel) vestida para sair à rua

pela última vez a Jacqueline, no limite de suas forças, trancando-se em um quarto de

hotel sombrio para se enforcar. K N

CONSCIÊNCIAS MORTAS (1943)

(THE OX-BOW INCIDENT) I Onsciíncias mortas é um filme-chave na história dos faroestes, um dos muitos

produzidos em 1940 que mostraram que o gênero - que anteriormente gozava de baixo

prestígio cultural - poderia abordar questões importantes. Em 1885, numa cidadezinha

iln estado de Nevada, se espalha o boato de que um rancheiro local teria sido assassina-

do por ladrões de gado. Enquanto o xerife está fora da cidade, um grupo de linchadores

le reúne e captura dois estranhos de passagem por lá. Apesar de se proclamarem

inocentes, os homens são enforcados. Logo em seguida, os responsáveis descobrem que

I I rancheiro não está morto e que os verdadeiros ladrões haviam sido presos.

Este fi lme conciso (de apenas 75 minutos de duração) traz uma bela quantidade de

1 relas. Henry Fonda é um caubói local, apresentado de Início como um inconseqüente

biigâo de saloon, mas que acaba ficando contra os linchadores. As três vítimas são

nterpretadas por Dana Andrews, um homem de família claramente inocente; Anthony

• iii lnn, um andarilho mexicano; e Francis Ford, irmão do mais ilustre John, um velho

senil. Frank Conroy está excelente como um ex-major confederado violento que força o

próprio filho a ajudar nos enforcamentos, e Jane Darwell, famosa como a Mãe em

As vinhas da ira, de John Ford, é uma implacável velha criadora de gado.

Consciências monas defende de forma incisiva o cumprimento da leí como base da

1 ivillzação. Além de Fonda, as únicas pessoas que resistem à histeria dos linchadores

são um comerciante (Harry Davenport) e um pastot negro (Lelgh Whipper), cujos moti ­

vos para protestar são maiores do que os dos demais, por ter visto o próprio irmão ser

linchado. No f im, quando a verdade é revelada, Fonda enche os linchadores de vergo­

nha ao ler em voz alta uma carta escrita pelo personagem de Andrews para a esposa.

Darryl Zanuck, presidente da 20th Century Fox à época, Insistiu em que o fi lme

íosse rodado em cenários de estúdio para baratear os custos. Na verdade, os espaços

reduzidos dão a Consciências mortos uma intensidade maior do que a que poderia ter

sido alcançada através das vastas paisagens típicas dos faroestes. O roteiro é baseado

no primeiro romance de Walter Van Tilburg Clark, natural de Nevada, que teria outra

obra sua, The Track of the Cot, também filmada por William Wellman. EB

EUA (Fox) 75 min. P8<B

Idioma: inglês

Direção: William A. Wellman

Produção: Lamar Trotti

Roteiro: LamarTrotti, bascule nu

livro de Walter Van Tilburg (lark

Fotografia: Arthur C. Miller

Música: Cyril J. Mockridge

Elenco: Henry Fonda, Dana Andrewl, Mary Beth Hughes, Anthony Qi William Eythe, Harry Morgan, Jane Darwell, Matt Brlggs, Harry Davenport, Frank Conroy, Man Lawrence, Paul Hurst, Victor Klllan, Chris-Pin Martin, Willard Robertson, Leigh Wbipper

Indicação ao Oscar: Lamar Tint 11

(melhor filme)

IUA (skiil).ill. Universal) 108 min. P8cB

Itlloma: ingles

Dlrcclo: Alfred Hitchcock

' in .10: j.u k H. Skirball

unh'in iidon McDonell, Thornton

Wllili'i

Inlngi.ifia: loseph A. Valentine

M I C K 1 : Dlmltrl Tiomkin

1 I I - I H I I : [ru'sa Wright, Joseph Cotton,

Mil 1 miuli l c:arey, Henry Travers,

.1 ( nllinge, Hume Cronyn,

w.ill.11 r I I I K I , Edna May Wonacott,

1 h,iilcs Hales, Irving Bacon, Clarence

"I e, lanel Shaw, Estelle Jewell

Imlli acao ao Oscar: Cordon

Mi l iniiell (roteiro)

A SOMBRA DE UMA DÚVIDA 1 1943)

(SHADOW OF A DOUBT) Quando entrevistado pelo admirador e famoso acólito François Truffaut, Alfred Hitchcock

se referiu a A sombra de uma dúvida como seu filme favorito. É também uma de suas

obras mais ostentosas, um singelo estudo de personagem que se passa no coração dos

subúrbios. Embora esse coração dos subúrbios de Hitchcock ainda seja corrompido por

assassinatos e traições, ele dá mais ênfase ao ritmo de suspense tradicional do que a

seqüências complexas, abastecendo a história com medidas iguais de humor e mistério.

Charlie (Teresa Wright) fica entusiasmada quando seu tio e xará Charlie (interpretado

com uma petfeição servil por Joseph Cotton) vem fazet uma visita a ela e à sua mãe

doente. Potém ela logo suspeita de que seu adotado tio Charlie é na verdade um serial

ki/Jer- "O Assassino da Viúva Alegre" - fugindo do seu último assassinato. Ao se tornar al­

vo de suas suspeitas, o tio não parece interessado em deixar para trás nenhum ponto sem

nó, mas sua sobrinha não sabe como conciliar o amor que sente por ele com seus medos.

Hitchcock filmou A sombra de uma duvido em locação, na pequena cidade de Santa

Rosa, na Califórnia, o que serviu para desfazer a tênue ilusão dos subúrbios como

lugares tranqüilos e seguros e mostrá-los como o ninho de segredos que são na

realidade. O roteiro, escrito por Thornton Wilder com sugestões de Alma Reville, esposa

de Hitchcock, tem um prazer perverso em destruir noções preconcebidas da vida pacata

das cidades pequenas. O filme é também apimentado por várias referências a gêmeos

e à dicotomia bem e mal, confrontando a confiável e inocente Charlie com seu tio

perigoso e falso.

A trilha de Dimitri Tiomkin mantém o suspense nas alturas, especialmente com sua

valsa "A viúva alegre", que simboliza a culpa do tio Charlie e é o aterrorizante tema que

representa os impulsos terríveis que ele mal consegue disfarçar ou reprimir. Uma dupla

de vizinhos enxeridos também ofetece comentários contínuos, discutindo as várias

maneiras e métodos para se cometer um assassinato e acobertá-lo em seguida. O fato

de um assassino de verdade estar escondido na porta ao lado é uma generosa fonte de

humot Irônico. Os vizinhos continuam tagatelando sobre várias possibilidades de

homicídio enquanto Charlie tenta resolver seus sentimentos contraditórios pelo tio

antes que ele o faça permanentemente pata ela. J K l

BSESSAO (1943) (OSSESSIONE) Uma das grandes especulações que se pode fazer sobre a história do cinema gira em

torno de Obsessão, de Luchino Visconti: e se este tivesse sido o filme a anunciar a

chegada de um novo e empolgante movimento cinematográfico vindo da Itália, em vez

de Roma, cidade aberta, de Rosselllni, em 1945? Sem dúvida teria sido interessante, mas,

infelizmente, jamais saberemos o que teria acontecido, pois, uma vez que o roteiro de

Visconti foi claramente Inspirado no livro O destino bate à porta, de James M. Caln, o

escritor e seus editores Impediram que ele fosse exibido cm telas americanas até 1976 -

data de sua estréia, com imenso atraso, no Festival de Cinema de Nova York. Caln aca­

bara de morrer e provavelmente nunca viu o fi lme; uma pena, pois teria descoberto a

melhor adaptação de sua obra para o cinema.

Massimo Cirotti é Gino Costa, um andarilho suarento de camiseta que arranja um

emprego em um restaurante de beira de estrada cujo dono é Bragana (Juan de Landa),

um corpulento fã de ópera. Bragana tem uma esposa, Giovanna (a radiante Clara

Calamai, a primeira escolha de Rossellinl para o papel de Anna Magnanl em Roma, cidade

aberta), e logo ela e Gino estão um nos braços do outro, fazendo planos para fugir.

Atendo-se à história de Caln, Visconti é imensamente ajudado pela pura química entre

Calamai e Girottl; todas as descrições de Cain de corpos ardentes e desejo animal são re­

presentadas em Obsessão com uma intensidade quase assustadora. Conseqüentemente,

todo o Imperativo econômico para o subseqüente assassinato fica, de certa forma, em

segundo plano. Visconti também não evita as conotações obviamente homossexuais da

relação de Gino com "lo Spagnolo" (Elio Marcuzzo), um artista de rua espanhol com o

qual ele pega a estrada por um tempo, o que é um tanto extraordinário, considerando-se

que o filme foi realizado sob o regime fascista.

Uma cena que certamente teria encantado Cain - ele mesmo filho de um cantor de

ópera - é a competição local de cantores de ópera da qual Bragana participa. Uma figu­

ra grosseira e de certa forma inigualável - multo distante do tolo convencido de Cecil

Kellaway na versão hollywoodiana de 1946 do romance, dirigida porTay Garnett - , ele

ganha vida subitamente ao soltar a voz em uma ária, com um floreio final que leva a

audiência reunida a aplaudi-lo de pé. Obsessão poderia ter sido o grande exemplo da

junção do filme nolr americano com o realismo italiano; em vez disso, continua sendo

uma espécie de elo perdido entre os dois movimentos. RP

Itália (ICI) 142 min. P&B

Idioma: italiano

Direção: Luchino Visconti

Produção: Libero Solaroli

Roteiro: Luchino Visconti, Mario

Alicata

Fotografia: Domenico Scala, Aldo Tonti

Música: Guiseppe Rosati

Elenco: Clara Calamai, Massimo

Glrotti, Dhia Cristiani, Elio Mau 1 1 / / 0 ,

Victorio Duse, Michele Riccardlnl,

Juan de Landa

D l

EUA (MCM) 113 min. Technicolor

Idioma: inglês

Direção: Vincente Minnelli

Produção: Rogers Edens, Arthur Freed

Roteiro: Irving Brecher,

I red I. Finklehoffe, baseado no livro

tie Sally Benson

Fotografia: George J. Folsey

Música: Ralph Blane, Hugh Martin, N,K io Herb Brown, Arthur Freed, George E. Stoll

I lenco: Judy Garland, Margaret

O'Brien, Mary Astor, Lucille Bremer,

I eon Ames, Tom Drake, Marjorle

. " i n n . Harry Davenport, June

101I I ia 11, Henry H. Daniels Jr., Joan

1 i I I , Hugh Marlowe, Robert Sully,

1 hill Wills, Gary Gray, Dorothy Raye

Indicação ao Oscar: Irving Brecher,

I led I. Finklehoffe (rotelroj, George J.

Folsey (fotografia), George E. Stoll

i i i n e . u a), Ralph Blane, Hugh Martin

I, am, ,10)

A G O R A S E R E M O S F E L I Z E S <1944) (MEET ME IN ST LOUIS) Uma garotinha chamada Tootie (Margaret O'Brien), chorando e furiosa, sal de dentro d l

casa e corre para a neve. Uma vez lá, começa a destruir seus adorados homens de neve

- um símbolo de tudo o que é estável e teconfottante na sua existência familiar - c

uma energia e virulência extremamente perturbadoras. Quem imaginaria que Judy

Garland cantando "Have Yourself a Merry Little Christmas" teria um efeito tão

devastador na frágil psique de uma criança, ou na nossa?

Agora seremos felizes, de Vincente Minnelli, é um dos musicais mais incomuns e

emotivos da história de Hollywood. Ele mistura os dois gêneros dos quais Minnelli era

mais adepto - o musical e o melodrama -, chegando até, em seus momentos mais

sombrios (como a seqüência dedicada aos horrores do Halloween), a quase se tornar

um filme de terror. Ele é também um filme que, tanto na época quanto agora, se

permite ser interpretado de formas totalmente contrastantes: ou como uma celebração

perfeitamente inocente e ingênua dos valores familiares, ou como uma reflexão sobre

tudo que destrói a unidade familiar por dentro. Em outras palavras: seria ele um

entretenimento reconfortante e escapista que admite ser problemático para poder

desobsttuir e reforçar o status quo ou - quase à sua própria revelia - um gesto sub­

versivo no coração do sistema hollywoodlano, um grito de raiva incontida como o

massacre de Tootie da sua tribo imaginária de homens de neve?

S im, estou falando sobre o mesmo filme em que Garland observa apaixonada seu

vizinho e canta "The Boy Next Doot" e - em um ponto alto espetaculat - rodopia com

um monte de passageiros coloridos enquanto canta "The Trolley Song" ("Zing, zing,

zing went my heartstrings..."). O projeto de Minnelli é discretamente ambicioso: ele não

pretendia apenas contar a história de uma adorável família "comum" - e dos desafios

que ela enfrenta com estoicismo - , mas também esboçar a história de uma audaciosa

sociedade do século XX, definida por acontecimentos como a Feira Mundial.

A sensibilidade artística de Minnelli - a sexualidade dele pode ser tanto uma ques­

tão em aberto quanto um segredo escancarado, dependendo de qual história de Holly­

wood você consulta - estava em sintonia com os anseios femininos e com a ansiedade

masculina, e um excesso de ambos torna este musical inexoravelmente dramático. O

patriarcado surge na forma estúpida e rabugenta de Leon Ames, que tenta afirmar

bravamente sua autoridade em face de uma família esmagadoramente feminina. A

série de namorados das garotas também precisa ser instigada, manipulada e informada

de seu verdadeiro destino conjugal.

Quanto aos desafios estéticos de um musical, Minnelli e seus colaboradores

conseguiram praticamente Integrar canções e dança a um fluxo de incidentes extra­

vagantes, dignos de um conto de fadas. Canções começam como frases jogadas,

faladas ou cantaroladas na rua ou diante de uma porta e somem de repente quando

uma intriga surge na trama.

Sob a elegante demonstração de estilo cinematográfico e o verniz civilizado das

boas maneiras, apenas Tootie é capaz de expressar emoções selvagens e indomadas -

como "Under the Bamboo Tree", seu exótico dueto com Judy, indica com jovialidade. A M

ig

UMA AVENTURA NA MARTINICA m m ) (TO HAVE AND HAVE NOT) Co-rotelrizado por dois ganhadores do Prémio Nobel, Ernest Hemingway e William

Faulkner, a partir do livro homônimo de Hemingway, Uma aventura na Martinica foi

praticamente improvisado pelo diretor Howard Hawks e por seu elenco incomparável. Um

dos muitos filmes realizados depois do sucesso de Humphrey Bogart em Casablanca

(1942), esta obra ainda mais romântica tem como núcleo um caso amoroso que ameaça

jogar a Segunda Guerra para escanteio. Hawks, que descobriu Lauren Bacall antes de

Bogart, sentiu-se traído pelo casamento das estrelas, porém foi ele o principal respon­

sável pela criação dos personagens que o casal acabaria interpretando na vida real.

Passado na Martinica durante o regime de Vichy - e nâo em Cuba, como no roman­

ce - , Uma aventura na Martinica traz novamente Bogart como um expatriado ianque que

se envolve com as Forças Francesas Livres e acaba se comprometendo com a causa

aliada. A eletricidade genuína que faísca entre Bogie e a estreante Bacall - como a garota

que entra em sua vida e assume o controle dela - conduz a um final picante e otimista

que deixa o espectador com uma sensação de alegria maior do que a resignação

melancólica de Casablanca. Ao contrário de Rick (Bogart) e lisa (Ingrid Bergman) no filme

anterior, que priorizam o bem comum em detrimento do amor, Harry e Slim salvam-se

mutuamente do isolacionismo e conseguem manter seu relacionamento porque estão

dispostos a trabalhar juntos para vencer a guerra. Hawks não teria paciência com uma

mulher que achasse que sua única função era oferecer uma vida doméstica feliz para o

herói, de modo que torna a Sllm de Bacall tão Intrépida e corajosa quanto o Harry de

Bogart - não apenas um caso amoroso, mas uma parceira.

Hawks enche cada cena de Uma aventura na Martinica com momentos deliciosos:

diálogos amorosos hilários, porém sensuais, entre os protagonistas ("Você sabe assobiar,

não sabe?"); Walter Brennan fornecendo alívio cômico ao perguntar: "Você já foi picado por

uma abelha morta?"; Hoagy Carmichael cantando "Hong Kong Blues" e acompanhando

uma Lauren Bacall de voz rouca (ou a voz seria de Andy Williams?) em "How Little We

Know"; e Bogie vociferando com um tom de voz típico de um democrata sabe-tudo.

Quando John Huston ficou sem um final para Paixões em fúria, Hawks lhe deu o clímax do

tiroteio em um barco do romance de Hemingway que nunca chegou a incluir no filme. KN

nil

1 H A (w.iinei Bros.) 100 min. P&B

Idioma: inglés

nlieiao: Howard Hawks

I lucau: Howard Hawks, Jack L.

w I

Rotclro: Jules Furthman, baseado no

u n í i' dc Ernest Hemingway

lotografia: Sidney Hickox

Música: Hoagy Carmichael, William

I av.1,1 ranz Waxman

1 I i : I lumphrey Bogart, Walter

i'.i• n i i . i i i , Lauren Bacall, Dolores

Mm.in, Hoagy Carmichael, Sheldon

1 1 ' n i i . i i d , Walter Szurovy, Marcel

1 lallo, Waller Sande, Dan Seymour,

Aldn N.idl

LAURA (1944) i 1 homens a adoram. As mulheres a admiram. No entanto, a encantadora Laura Hunt

(Cene Tierney), uma jovem designer, não monopoliza Laura mais do que Ann (Judith

Anderson), sua fria amiga socialite; Shelby (Vincent Price), seu dissimulado pretenden-

te; ou o detetive durão Mark McPherson (Dana Andrews), que, em busca do assassino

da protagonista, se apaixona por seu fantasma. Porém o autor/radialista perversa­

mente servil Waldo Lydecket (Clifton Webb) nos fascina pot completo, adotando Laura

1 0 sua protegida, tornando-a famosa, para em seguida obcecarse por sua vida co­

mo uma aranha que a tivesse prendido em sua teia.

Se este Laura de Otto Preminger nos intriga com sua discordante mistura de estilos

noir, psicodrama, melodrama e thtillet - em alguns breves momentos ele se torna

monumental. Urna cena particularmente notável: Ann explicando a Laura por que é ela

quem deveria ficar com Shelby ("Somos ambos fracassados"); ou o encontro romântico

u,i delegacia quando, ao apagar as luzes ofuscantes de Interrogatório, Mark vê o

verdadeiro esplendor da personagem de Tierney. Contudo, nada supera a atitude

venenosa de Lydecker ao brindar Laura com a traição de Shelby: "Vou ligar para ele", diz

ela ansiosamente; "Ele não está lá", rettuca com acidez Waldo. "Está jantando com Ann,

nao sabia?" Ele não só se encontra fascinado pela sua vida como a toma pata si, no que

ulvez seja o primeiro exemplo no cinema de um homem que deseja ser uma mulher. MP

EUA (Fox) 88 min. P8<B

Idioma: inglês

Direção: Otto Preminger, Rouben

Mamoulian

Produção: Otto Preminger

Roteiro: Jay Dratler, Samuel

Hoffenstein, Elizabeth Reinhardt,

baseado no livro de Vera Caspary

Fotografia: Joseph LaShelle, Lucicn

Ballard

Música: David Raksin

Elenco: Gene Tierney, Dana Andrew..

Clifton Webb, Vincent Price, Judiili

Anderson, Cy Kendall, Grant Mitchell

Oscar: Joseph LaShelle (fotognili.i)

Indicação ao Oscar: Clifton Webb

(ator coadjuvante), Otto Premingei

(diretor), Jay Dratler, Samuel

Hoffenstein, Elizabeth Relnli.inli

(roteiro), Lyle R. Wheeler, Leland

Fuller, Thomas Little (direção de arte)

IDA (mc;m) 114 min. p&B

Direção: George Cukor

Piodução: Arthur Hornblow Jr.

Itotciro: John Van Druten, Walter

Rllli h, John L. Balderston, baseado na

p l ç i Anrjcl Street, de Patrick Hamilton

I litografia: Joseph Ruttenberg

Música: Bronislau Kaper

1 Itni Ol 1 liarles Boyer, Ingrid Bergman,

Joseph Cotten, Dame May Whltty,

Angela l ansbury, Barbara Everest, Emil

K.inieau, Edmund Breon, Halliwell

llobbes, Tom Stevenson, Heather

1 Ii.in her, Lawrence Grossmith

Oscar: Ingrid Bergman (atriz), Cedric

i aillions. William Ferrari, Edwin B. Willis.

Paul lluldschlnsky (direção de arte)

Indicação ao Oscar: Arthur Hornblow

Ii (melhor filme), John L. Balderston,

Wallis Uelsen, John Van Druten

(iiilclio), Charles Boyer (ator), Angela

1 imbury (atriz coadjuvante), Joseph

Unnenberg (fotografia)

A MEIA-LUZ (1944) (GASLIGHT) A versão hollywoodlana de George Cukor da história de amor gótica filmada ante

Mormente na Inglaterra é carregada de uma atmosfera ameaçadora, com um arreplanir

enredo de thrlller. Paula Alqulst (Ingrid Bergman) se vê cortejada pelo charmoso,

embora estranhamente possessivo, Gregory Anton (Charles Boyer), que parece mais

Interessado na casa de Paula em Londres do que na própria mulher tímida. Anton acaba

se mostrando um ladrão esperto que, cerca de 10 anos antes, matara a tia de Paula em

uma tentativa fracassada de roubar suas jóias Imensamente valiosas. Enquanto revista

sistematicamente sua casa à noite, ele faz de tudo para convencê-la, e aos demais, que

ela está enlouquecendo. O que pretende é subjugá-la por completo para poder ficar

livre para vasculhar a casa. O plano de Anton, no entanto, é descoberto por Brian

Cameron (Joseph Cotten), que, ao se apaixonai pela mulher que vê sendo maltratada e

ameaçada, Intervém bem a tempo para salvá-la do pior.

Apesar de a trama de À meia-luz ser um tanto rala, Cukor extrai bons desempenhos

de todo o elenco, incluindo a estreante Angela Lansbury como a criada atrevida que,

como tudo e todos na casa, parece estar tramando contra sua dona. Com seu clima de

perseguição e paranóia, À meia-luz é um elegante representante da série de filmes noir

realizados à época por Hollywood. RBP

Inglaterra (Two Cities) 135 min.

I n hnicolor

Idioma: Inglês / francês

Direção: Laurence Olivier

Produção: Dallas Bower, Filippo Del

(.liullce, Laurence Olivier

Roteiro: Dallas Bower, Alan Dent,

baseado na peça de William

Shakespeare

lotografia: Jack Hildyard, Robert Krasker

Musica: William Walton

f lenco: Felix Aylmer, Leslie Banks,

RobeM Helpmann, Vernon Greeves, I 1 1.1I111 ase, Griffith Jones, Morland

¡1 h i .mi. Nicholas Hannen, Michael

W .uie, I aurence Olivier, Ralph Truman,

I I i i i -s i Ibesiger, Roy Emerton, Robert

Newinn, Freda Jackson

Oicar: Laurence Olivier (prêmio

honorário)

Indicação ao Oscar: Laurence Olivier

(inellioi filme), Laurence Olivier (ator),

Paul sheriff, Carmen Dillon (direção

de arte), William Walton (música)

HENRIQUE V (1944) (HENRY V) Henrique V foi considerado pelo governo Inglês uma propaganda patriótica ideal

durante a guerra. Laurence Ollvier, que servia na Aviação Naval britânica, foi dispensado

para atuar nele e - depois que Will iam Wyler recusou o projeto - dirigi-lo. Buscando

preservar tanto o engenho teatral Inato de Shakespeare quanto as alturas protocine-

matográficas alcançadas pela sua Imaginação, Ollvier acerta ao enquadrar o filme

dentro de uma apresentação da peça no próprio Globe Theatre. Na abertura de Henrique

V, a câmera paira por sobre uma maquete extraordinariamente detalhada de Londres,

alcançando a agitação e libertinagem da platéia reunida no Globe e adentrando um

espetáculo extravagante - expandindo-se em seguida para o espaço cinematográfico à

medida que a ação se transfere para a França.

O filme inteiro joga com diferentes níveis de estllização, desde as cenas na corte

francesa - que pegam emprestadas das pinturas em miniatura medievais suas cores

delicadas e perspectiva naíf - até o realismo das cenas de batalha, Inspiradas no

dinamismo exuberante de Alexandre Nevsky (1938), de Sergel Eisenstein. O ritmo do tex­

to de Shakespeare, discretamente adaptado para se encaixar no contexto da guerra - os

três traidores ingleses foram cortados, por exemplo - , é sustentado pelo vigor da atua­

ção de Ollvier e pela trilha arrebatadora de Will iam Walton. Henrique V é o primeiro

filme que consegue ser ao mesmo tempo genuinamente shakespeariano e plenamente

cinematográfico. PK

IVAN, O TERRÍVEL - PARTES 1 E 2 (1944) (IVAN GROZNYJ I E II)

Eisenstein é um daqueles nomes que surgem inevitavelmente quando se estuda

teoria do cinema e estética cinematogtáfica. Especialmente famoso pela dramática

ência da escadaria de Odessa em O encouraçado Potemkin (1925), o diretor russo

I ' .1 mais uma vez seu imenso talento com Ivan, o Terrível. Este épico natra a vida do

despótico czar e foi concebido originalmente como uma trilogia, cujas fi lmagens

"çaram no início da década de 40 a pedido de Stalin. Eisenstein, no entanto,

guiu concluir apenas as partes 1 e 2 por conta de sua motte prematura. A primeira

parte foi lançada em 1945, ao passo que a segunda foi censutada pelo governo. Stalin

viu em Ivan, o Terrível uma ctítica ao seu próprio despotismo e, conseqüentemente,

proibiu o fi lme. A parte 2 foi finalmente lançada em 1958, após a motte tanto de

II nstein quanto de Stalin.

Ivan, o Terrível conta a história da ascensão e queda do mais famoso czar da Rússia,

Ivan IV, responsável pela unificação do país no fim da Idade Média. O primeiro filme co­

meça com a coroação de Ivan (Nikolai Chcrkasov) c seu plano para derrotar os boiardos.

1 la se concentra na instauração do poder de Ivan e mostta sua aprovação pelos c a m -

I I I meses. A segunda parte narra as maquinações dos boiardos na sua tentativa de as­

sassinar Ivan e revela a progressiva crueldade do czar, que cria sua própria polícia para

manter o país sob controle. Ivan descobte os planos contta ele e derrota seus inimigos,

assinando-os. As atuações são particularmente encenadas: Eisenstein faz uso

extensivo de doses exttemos e parece mais preocupado com a reação dos personagens

is acontecimentos do que com os acontecimentos em si. Na parte 2 há um curioso

uso de cenas em duas cores em um filme que é quase completamente preto-e-btanco.

Alexandre Nevski (1938) e Ivan, o Terrível são os únicos filmes falados de Eisenstein.

'.c os compararmos aos filmes mudos que ele dirigiu

na década de 20, veremos não só uma mudança de

estilo, graças essencialmente à chegada do som,

1 o r n o também uma mudança nos próprios temas

narrados. Aqui, Eisenstein renuncia à representação

das lutas do proletariado que está no âmago dos

seus fi lmes anteriores, voltando-se em vez disso pa­

ta uma história épica, ligada a um passado "seguro"

que não envolve críticas abertas a acontecimentos

políticos contemporâneos. Cfe

URSS (Alma Ata) 100 min. P8<B

Idioma: russo

Direção: Sergel M. Eisenstein

Produção: Sergei M. Eisenstein

Roteiro: Sergei M. Eisenstein

Fotografia: Andrei Moskvin, Eduaul

Tisse

Música: Sergei Prokofiev

Elenco: Nikolai Cherkasov, Lyudiiiila

Tselikovskaya, Serafima Blrman,

Mikhail Nazvanov, Mikhail Zharov,

Amvrosi Buchma, Mikhail Kuznelsov.

Pavel Kadochnikov, Andrei AbrikolOV,

Aleksandr Mgebrov, Maksim

Mikhajlov, Vsevolod Pudovkin

PACTO DE SANGUE (1944) (DOUBLE INDEMNITY)

I UA (I'.ii.iniount) 107 min. P&B

lilnnn.i: 1111.1 (1 s

Dlirçáo: Hilly Wilder

I lução: Joseph Sistrom

Kotclro: Billy Wilder, Raymond I handler, baseado no livro Indenização dupla, de James M. Cain. I otograf la: John F. Seitz MÚ1I1 a: Miklós Rózsa Elenco: Fred MacMurray, Barbara Stinwyi k, lidward C. Robinson, I'mir-i II,ill,Jean Heather,Tom Powers, Byron Barr, Richard Gaines, Fortúnio Bon a nova, John Philliber Indicação ao Oscar: Joseph Sistrom [melhoi filme), Billy Wilder (diretor), Raymond chandler, Billy Wilder (totelro). Barbara Stanwyck (atriz), Inliii I seitz (fotografia), Miklós Rôzsa (música), Loren L. Ryder (som)

Adaptado pelo diretor Bllly Wilder e pelo escritor Raymond Chandler do romance de

detetive de James M. Caln, Pacto de sangue é o filme noir arquetípico, a história de uma

mulher desesperada e de um homem ganancioso, de um assassinato por dinheiro sujo e

de uma traição repentina e violenta. Ainda assim, possui um romantismo estranho e

evocativo ("Como eu poderia saber que um assassinato às vezes pode ter cheiro de

madressilva?") e tetmina, extraordinariamente para 1944, com uma confissão não só de

assassinato como também de amot entre dois homens. A última fala, dirigida pelo

moribundo Fred MacMurray ao Inconsolável Edward G. Robinson, é: "Eu também te amo."

Um homem ferido entra mancando à noite no escritório de uma agência de seguros de

Los Angeles. Acomoda-se diante de sua mesa para ditar suas observações confessionais

sobre "o contrato Dietrlchson". Ele se apresenta como "Walter Neff, vendedor de seguros,

35 anos, solteiro, sem cicatrizes visíveis - isto é, até agora há pouco". MacMurray passou

toda a sua carreira, primeiro na Paramount, depois na Disney e por fim em seriados de tevê,

fazendo o papel de bom sujeito, cordial, sempre sorrindo, sempre amigável; duas vezes

(sua outra mudança de estilo, também pata Wilder, pode ser vista em Se meu apartamento

falasse) ele se esconde atrás de seu sorriso, interpretando maravilhosamente um completo

patife, seu queixo rachado suarento e com a barba por fazer, sua conversa mole de

vendedor um disfarce para Intenções luxuriosas, desonestas e homicidas. A isca que instiga

este joão-ninguém a sair da linha aparece recém-saída de um banho de sol, envolvida em

uma toalha reveladora e ostentando uma totnozeleira. Visitando uma falsa mansão

espanhola no Los Feliz Boulcvard a propósito de uma renovação de seguro de automóvel,

Neff conhece a Sra. Phyllis Dietrichson (Barbara Stanwyck) c não resiste a passat cantadas

nela. Neff volta atrás quando ela petgunta inocentemente se é possível fazer um seguro

contta morte acidental para seu marido mais velho (Tom Powers) sem que ele saiba disso.

Neff pensa a respeito e, depois de um encontro amoroso com Phyllis em seu apartamento,

concorda cm participar do plano de assassinato.

O casal faz o Sr. D. assinar uma apólice que paga o dobro caso a morte ocorra em um

trem, e então arma para que o cadáver seja encontrado nos trilhos. Entra em cena Barton

Keyes (Robinson), um investigador de seguros tenaz cujo único

ponto fraco é sua devoção a Neff. Keyes trabalha no caso,

descartando suicídio em um brilhante discurso sobre a impro-

babilidade de alguém se suicidar pulando de um trem. Em se­

guida, chega à conclusão de que a destemida loura é a assassi­

na e tenta enconttar seu parceiro no crime. Keyes não precisa

se esforçar muito, pois as pressões que se seguem ao assas­

sinato começam a desunlt Neff e Phyllis à medida que os dois

tentam não entrar em pânico e passam a suspeitar de traições

adicionais mútuas. Naquela mansão sufocante e sombria, com

"Tangerine" tocando no rádio e o cheiro de madressilva no ar,

os amantes se crivam de balas e Neff foge mancando para se

confessar. Keyes se reúne a ele e, para sua tristeza, pega o fim

da história. Neff pede quatro horas para poder fugir para o

México, mas Keyes sabe que é impossível: "Você nunca vai

chegar à fronteira. Não consegue nem chegar ao elevador." KN

IH

lUA (RKO) 95 min. P&B

ldlom,i: inglês

OlrcçSo: Edward Dmytryk

Piodução: Sid Rogell, Adrian Scott

Roteiro: John Paxton, baseado no

am e Adeus, minha adorada, de

Raymond Chandler

I litografia: Harry J. Wild

MOlIca: Roy Webb

Elenco: Dick Powell, Claire Trevor,

Anne Shirley, Otto Krueger, Mike M . i/uikl. Miles Mander, Douglas Walton. Donald Douglas, Ralf H.uolde, Esther Howard

ATE AVISTA, QUERIDA (1944) (MURDER, MY SWEET/ FAREWELL MY LOVELY) A primeira adaptação para o cinema de Adeus, minha adorada, de Raymond Chandlei,

foi The Falcon Takes Over, de 1942, no qual Philip Marlowe, o detetive partlculai d l

Chandler, foi substituído pelo Investigador gentleman de George Sanders. Quando I

reputação de Chandler aumentou, a RKO descobriu que já detinha os direitos cinemato

gráficos para esta adaptação mais fiel, na qual o ex-crooncr Dick Powell surpreendeu

com seu jeito durão e irônico e romantismo ferido como a primeira encarnação

adequada em celulóide de Marlowe. O filme ganhou outro nome porque se imaginou

que as platéias o tomariam por um romance de guerra sentimentalólde, embora o

título do romance fosse mantido na Inglaterra, onde Chandler era o mais respeitado.

O livro é um dos vários romances protagonizados por Marlowe que Chandler

elaborou a partir de diversas novelas anteriores, mais cruas, o que explica por que a

trama possui tantos fios que acabam se interligando através de coincidências estra­

nhas e improváveis. Até a vista, querida começa com Marlowe vendado e sendo inter­

rogado pelos policiais - o que restringe boa parte dos comentários em primeira pessoa

de Chandler - à medida que flashbacks conduzem o protagonista através de um

mistério que começa com o ex-detento "Moose" Malloy (Mlke Ma/urki) contratando o

detetive para localizar sua ex-namorada que o delatou, mas pela qual ele ainda é

apaixonado. A história dá uma reviravolta quando ele é também contratado por Helen

Grayle (Claire Trevor), uma furtiva vampe da alta sociedade, para resgatar uma certa pe­

dra de jade roubada e se livrar de um "consultor psíquico" chantagista (Otto Krueger).

Nenhum outro filme sintetiza com tanta perfeição as delícias do gênero noir, com o

diretor Edward Dmytryk desfilando sombras, chuva, alucinações induzidas por drogas

("Um lago negro surgiu") e explosões repentinas de violência dentro de um emaranhado

de armadilhas na trama, bandidos que são mestres na vigarice, femmes fatales que não

valem nada, capangas com cérebro de gorila, policiais exaustos e médicos charlatões. O

Marlowe de Powell - acendendo um fósforo no traseiro de mármore de um Cupido e

jogando amarelinha no piso da mansão de um milionário - chega mais perto do tom de

insolência juvenil d e Chandler do que as leituras mais bem conhecidas do papel de

Humphrey Bogart ou Robert Mltchum. Como sempre no caso de Chandler, a vilã acaba

se mostrando a mulher mais forte da trama - quando a leviana Velma de Moose e a

Insinuante assassina Helen se revelam a mesma pessoa. K N

A BATALHA DE SAN PIETRO (1945)

(THE BATTLE OF SAN PIETRO) ido para o exército como filme de propaganda, A batalha de San Pietro, de John

Huston, continua sendo o melhor documentário de guerra já feito, apesar das mudan-

1 pelas quais passou para eliminar material considerado perturbador demais para

adores civis. O filme detalha a tomada de uma cidade italiana localizada em uma

Colina dos seus tenazes e bem entrincheirados defensores alemães, uma batalha que

< Ultou às tropas americanas mais de mil baixas.

Ainda que a inconcluslvidadc da batalha sugira um erro estratégico americano

, 1 1 da narração patriótica do diretor), o principal objetivo de Huston era retratar a

iência de guerra através do ponto de vista daqueles que a lutam e não se preo-

I upam com as conjecturas mais abrangentes de vitória ou derrota. A equipe de Huston

• aptura o horror e o caos do combate: soldados americanos sendo feridos; a dor e o so-

Ininento dos civis; o tédio e a campanha das tropas distantes de casa; o custo inevi-

I da "vitória", medido pelo enorme número de sacos com corpos amontoados em

I imlnhões; e as fileiras e fileiras de covas provisórias cavadas para recebe los.

O filme acabou sendo lançado para o público americano apenas depois da vitória

final na Europa, tarde demais para exercer alguma Influência na opinião pública sobre

1 guerra. A batalha de San Pietro é o tributo de John Huston aos homens corajosos com

>s quais ele conviveu, assim como um tratamento gráfico c pungente da batalha e das

nas conseqüências, cujas poucas imagens de arquivo e seqüências encenadas não

diminuem o efeito geral de autenticidade e objetividade. RBP

EUA (U.S. Army) 33 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: John Huston

Produção: Frank Capra

Roteiro: John Huston

Fotografia: Jules Buck

Música: Dimitri Tiomkln

Elenco: John Huston (narração)

QUANDO FALA 0 CORAÇÃO (1945)

(SPELLBOUND) Quando fala o coração, de Alfred Hitchcock, apresenta uma trama em forma de quebra-

labeça intrigante e promissora. Um amnésico Gregory Peck, ao descobrir que não é

quem pensa ser, convoca a Dra. Constance Peterson (Ingrid Bcrgman) para ajudá-lo a

descobrir sua verdadeira identidade, assim como o destino do indivíduo que ele apa­

rentemente está personificando. No entanto, fascinado pela novidade da psicanálise,

Quando fala o coração concentra-se um pouco demais no subconsciente e não o

bastante no suspense de fato. Este, porém, é um dos "fracassos" mais interessantes de

Hitchcock, notável por suas atuações, desenho de produção e música, mas não exa­

tamente por seu mistério central.

Apesar disso, Hitchcock teve a esperteza de convocar (com bastante deferência) o

artista surrealista Salvador Dali para conceber as famosas seqüências de sonho do f i l ­

me, vislumbradas por Peck em estado de hipnose. Essas visões assustadoras e alucina­

das de jogos de cartas, olhos e paisagens estranhas são até hoje louvadas com justiça

como mini-obras de arte por sl mesmas. Igualmente inovadora foi a trilha sonora

ganhadora do Oscar de Mlklós Rózsa, a primeira a incorporar o zumbido eletrônico do

teremim, cuja sonoridade sinistra e ondulante se tornou uma pedra angular de muitos

filmes do gênero. Embora o roteiro de Ben Hecht exagere um pouco na conversa fiada

psicanalítica, Quando fala o coração serviu para apresentar o interesse cada vez maior

de Hitchcock no subconsciente. JKl

EUA (Selznlck) 111 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Alfred Hitchcock

Produção: David O. Selznlck

Roteiro: Angus MacPhail, Ben l lei hl

Fotografia: George Barnes

Música: Miklós Rózsa

Elenco: Ingrid Bergman, Gregory

Peck, Michael Chekhov, Leo C.

Carroll, John Emery, Steven Gn. iv .

Paul Harvey, Donald Curtis, Rhonda

Fleming, Norman Lloyd, Wallai e Fordi

Bill Goodwin, Art Baker, Regis

Toomey, Irving Bacon

Oscar: Miklós Rózsa (música)

Indicação ao Oscar: David O. Selznll í

(melhor filme), Alfred Hitchcock

(diretor), Michael Chekhov (ator

coadjuvante), George Barnes

(fotografia), Jack Cosgrove (efeltO!

especiais)

. u n

I UA (Wamel Bros.) m min. P&B

Idloma: ingles

Dltri.to: Michael Curtiz

Producäo: Jerry Wald j a c k L Warner

ÜOtilro: Ranald MacDougall, baseado

i .Hu e de James M. Cain

l oiogi .ifin: I inest Malier

M u i l o : Max Steiner

tlenco: Joan Crawford, Jack Carson,

.' i' I I I iv ' . n i i i , Eve Arden, Ann Blyth,

r- • Bennett, Lee Patrick, Moroni

' iKr i i , vnl. i Ann Borg, Jo Ann

M.iiluwi'

Otcar: joan Crawford (atriz)

Inillc .n,.»o no Oscar: Jerry Wald

ll i"i Minie), Ranald MacDougall

(rottlro). iveArden (atriz

i N d J U V i n t e ) , Ann Blyth (atriz

I d j u v a n t e ) , Ernest Haller

l l l i l U . i l l i l )

ALMA EM SUPLICIO (1945)

(MILDRED PIERCE) Tiros estouram na noite e um homem moribundo arqueja: "Milidred!" Em um flashback

clássico que remonta à gênese da obsessão e do assassinato, a assassina confessa

Mildred Pietce (Joan Crawford no papel ganhador do Oscar que ressuscitou a carreira

estagnada da atriz de 41 anos) explica em um interrogatório policial como batalhou como

dona-de-casa, garçonete e confeiteira até se totnar uma próspera dona de restaurante

para satisfazei as exigências de sua filha Veda (Ann Blyth) por coisas luxuosas. Quando as

duas são fatidicamente seduzidas por um cafajeste de fala mansa e dissimulado (Zachary

Scott), a transigência sufocante e neurótica da possessiva Mildred e os desejos precoces

da Ingrata Veda resultam inevitavelmente em traição sexual e ódio.

Um típico filme para mulheres da década de 40 e uma novela doméstica fervilhan-

te, o filme de Mlchael Curtiz, adaptado por Ranald MacDougall de um romance surpre­

endentemente perverso de James M. Ca In (famoso por Pacto de sangue e O destino bate

à porta), é também um filme noir esplendidamente cruel, que devasta o ideal da época

de devoção materna e tortas de maçã da mamãe. Mildred é inteligente, ambiciosa e

obstinada, qualidades respeitadas e recompensadas pela ética americana. Porém, aos

poucos, ela se distancia do seu honesto, porém fracassado, marido (Bruce Bennett) e, à

medida que favorece a insolente Veda em detrimento da sua mais doce filha caçula,

deixando a morte da criança para trás aparentemente sem pensar duas vezes, começa­

mos a notar um aspecto pouco saudável - e talvez até patológico - da sua compulsão.

Nunca o melodrama foi tão convincente. Mesmo para aqueles que são geralmente

desestimulados por Crawford, com seus traços duros e ombros quadrados, sua atuação

intensa e incontida como Mildred é tragicamente doentia e cativante. Blyth, de apenas

17 anos, está sarcastlcamente sensacional como a femme fatale desdenhosa. Curtiz é

um diretor que impôs sua personalidade em filmes de todos os gêneros. A forma ma­

gistral como ele dispõe do seu elenco (que conta com coadjuvantes excelentes como

Eve Arden, Jack Carson e Lee Patrick) e os diversos elementos técnicos - as alternâncias

expressivas dos subúrbios ensolarados para pesadelos sombrios de Ernest Haller, o

fotógrafo ganhador do Oscar por E o vento levou, e a trilha sonora dramática de Max

Steiner - são inebriantes. AE

fiança (Pathé) 190 min. P&B

Idioma: francês

Direção: Mareei Carné

Piodução: Raymond Borderie,

I icd Orain

Roteiro: Jacques Prévert

fotografia: Marc Fossard,

Noger Hubert

Música: Joseph Kosma,

M.niiii e Thiriet

I I t n c o : Arletty, Jean-Louis Barrault, l'Irne Brasseur, Pierre Renoir, Maria I l iares, Gaston Modot, Fabien Loris, M.m e! Pérès, Palau, Etienne Decroux, l i n e M.uken, Marcelle Monthil, Louis I lincncie, Habib Bengalia, Rognoni, M . I K ri Herrand

Indicação ao Oscar: Jacques Prévert (llltt'iio)

0 BOU LEVAR D DO CRIME (1945)

(LES EIMFANTS DU PARADIS) Desde sua triunfante estréia na recém-libertada França em 1945, O boulevard do crime

manteve seu posto de um dos maiores filmes franceses de todos os tempos. He

representa o auge do gênero muitas vezes chamado de "realismo poético" (embora "ro

mantismo pessimista" talvez seja o termo mais adequado) e também da parceria que o

levou à perfeição - a do roteirista Jacques Prévert e do diretor Mareei Carne. Eles faziam

uma dupla peculiar: Prévert gregário, passional, altamente comprometido polltlcamen

te e um dos melhores poetas populares franceses do século; Carne circunspecto, rabu

gento, reservado, um perfeccionista frio. Ainda assim, juntos eles criaram uma magia

cinematográfica que nenhum dos dois conseguiria alcançar depois de separados. O

boulevord do crime foi seu último sucesso.

O filme ficou cerca de 18 meses em produção e envolveu a construção do maior

cenário de estúdio da história do cinema francês - a rua de meio quilômetro, reprodu

zida nos mínimos detalhes, representando o "boulevard do crime", a região que

comportava os teatros de Paris nas décadas de 1830 e 40. Este teria sido um empreen­

dimento intlmidador na mais favorável das épocas; na França da guerra, sob ocupação

nazista, foi algo praticamente heróico. Transporte, materiais, figurinos e película eram

escassos. Os co-produtores Italianos se retiraram quando a Itália capitulou. O produtor

francês original teve que se afastar quando passou a ser Investigado pelos nazistas. Um

dos atores principais, um proeminente simpatizante do nazismo, fugiu para a

Alemanha depois do Dia D e teve que ser substituído no último minuto. Alexandre

Trauner, o brilhante cenógrafo, e o compositor Joseph Kosma, ambos judeus, foram

obrigados a trabalhar escondidos e transmitir suas idéias através de intermediários.

Apesar de tudo isso, O boulevard é um êxito total com toda a riqueza e comple­

xidade de um grande romance do século XIX. As cenas de multidão que se passam no

boulevard agitado e exuberante distribuem seus 1.500 figurantes em uma ruidosa

profusão, enchendo cada canto da tela com detalhes vivos. Uma ousada afirmação da

cultura teatral francesa em uma época em que o país estava conquistado e ocupado, o

filme oferece uma reflexão em várias camadas sobre a natureza da farsa, da fantasia e

da representação. Cada diálogo é realçado; cada ação, encenada de forma magistral. Os

três protagonistas masculinos são todos artistas performátlcos: Lemaítre, o grande ator

dramático (Pierre Brasseur); Debureau, o grande mímico (Jean-Louis Barrault); e La-

cenaire, o dramaturgo fracassado que se torna um mestre do crime dândi (Mareei

Herrand). Todos são personagens históricos reais. A mulher que os três amam, a grande

horizontaie Garance (Arletty em seu maior papel no cinema), é fictícia - menos uma

mulher real do que um ícone do feminino eterno, evasiva e infinitamente desejável.

Embora tenha mais de três horas, O boulevard não parece nem um minuto longo

demais. Uma celebração do teatro como a maior arte popular do século XIX (como o

cinema o foi no século XX), ele mistura farsa, romance, melodrama e tragédia em uma

narrativa irresistível. Carne foi, acima de tudo, um grande diretor de atores, e o filme

oferece um banquete de excelentes atuações, além da sua espitituosldade, graça,

paixão e de uma sensação generalizada de efemeridade - a melancolia que está por trás

de toda a arte romântica. PK

ROMA, CIDADE ABERTA (1945)

(ROMA, CITTÀ APERTA) .iderado o estopim de uma revolução estética no cinema, Roma, cidade aberta, de

i selllni, foi a primeira grande obra do neo-realismo italiano e conseguiu explodir as

venções do "cinema dos telefones brancos" do regime de Mussolini, em voga na

Itália no começo da década de 40. O filme de Rossellini sobre a Resistência Italiana foi

rito na época da luta subtetrãnea contra os nazistas. Lembrando a fórmula de

i Isenstein do "filme coral", ele conta a história de um grupo de patriotas escondidos no

apartamento de um litografo chamado Francesco (Francesco Grandjaquet). O

• nmunista que lidera o grupo, Manfredi (Marcello Pagliero), é perseguido pela Gestapo

• linalmente capturado e executado. Pina (Anna Magnani), esposa de Francesco, e Don

Pietro (Aldo Fabrizi), um padre de boa índole, morrem também, tentando ajudar

Manfredi a escapar. Potém é a solidariedade de Roma enquanto cidade que antecipa a

vitória final contra os Invasores.

A escassez de recursos técnicos e financeiros acabou se mostrando uma virtude de

Romo, cidade aberta, que foi fi lmado em um estilo documental. Ao mostrar pessoas

irais em locações reais, o filme trouxe uma lufada de ar fresco para o cinema do

Ocidente. A liberdade de movimentos da câmera e a autenticidade dos personagens,

aliados a uma nova maneira de se contat uma história, foram algumas das qualidades

que transformaram o filme na revelação do Festival de Cannes de 1946, em que tecebeu

a Palma de Ouio. O neo-realismo logo se tornou o modelo estético pata diretores

interessados em uma descrição vívida da História e da sociedade.

Um dos aspectos mais impressionantes de Roma, cidade aberta é a abordagem de

Rossellini do drama de cada personagem. Alguns dos heróis do filme permanecerão

para sempre nos corações dos espectadores. Quem é capaz de esquecer a visão de Pina,

grávida, correndo por entre as balas, ou do bom padre alvejado diante dos olhos apavo­

rados das crianças? Embora possa pender para o melodramático, a história é tão como­

vente hoje em dia quanto na época. Não é de surpreender que, depois desse papel,

Magnani tenha se tornado uma das maiores atrizes do cinema Italiano. D D

Itália (Excelsa, Mlnetva) 100 min P818

Idioma: italiano / alemão

Direção: Roberto Rossellini

Ptodução: Giuseppe Amato, Ferruccio

De Martino, Roberto Rossellini

Fotogtafia: Ubaldo Arata

Roteiro: Sergio Amidei,

Federico Fellini

Música: Renzo Rossellini

Elenco: Aldo Fabrizi, Anna M. 11 •. 11.1111.

Marcello Pagliero, Maria Mir hl,

Harry Feist, Francesco Gi. i i idj . iqi iri

Indicação ao Oscar: Sergio Amldel,

Federico Fellini (roteiro)

Festival de Cannes: Roberto

Rossellini (Palma de Ouro)

11 ia (Paramount) 101 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Billy Wilder

Produção: Charles Brackett

Roteiro: Charles Brackett, Billy

Wilder, baseado no livro de Charles R.

lackson

fotografia: John F. Seitz

M i e . i , .1: Miklós Rózsa

Elenco: Ray Milland, Jane Wyman,

Phillip Ferru, Howard Da Silva, Doris

1 lowllng, Frank Faylen, Mary Young,

Anita sharp-Bolster, Lillian Fontaine,

11.ink Orth, Lewis L. Russell, Clarence

Muse

Oscar: Charles Brackett (melhor

filme), Wily Wilder (diretor), Charles

hi.ii kelt, Billy Wilder (roteiro), Ray

Milland (ator)

Indie ação ao Oscar: John F. Seltz

(luiogiafla), Doane Harrison (edição),

Miklns Rózsa (música)

lestival de Cannes: Billy Wilder

palma de Ouro), Ray Milland (ator)

FARRAPO HUMANO (1945)

(THE LOST WEEKEND) Antes de Farrapo humano, bêbados em Hollywood eram em sua maioria figuras

cômicas; na verdade, caricatas: bufões adoráveis cambaleando, fazendo piadas com a

voz arrastada e passando cantadas em garotas bonitas. Billy Wilder e Charles Brackeli.

seu co-roteirista habitual, ousatam fazer algo diferente, criando a primeira abordagem

adulta, inteligente e impiedosa do cinema americano da terrível degradação do

alcoolismo. Mesmo hoje em dia, algumas cenas são quase dolorosas demais de assistir.

Ray Milland, em um papel que definiu sua carreira e lhe rendeu seu primeiro Oscar,

interpreta Don Birnam, um escritor nova-iotquino lutando contra seu vício e final­

mente sucumbindo a ele no espaço de um longo e calotento fim de semana de verão na

cidade. Assim como fizera com Fred MacMurray em Pacto de sangue (1944), Wildei

deslinda e explora avidamente a insegutança por trás da persona cinematográfica

afável de Milland. Em vez de deixar que nos distanciemos e julguemos Birnam com

uma compaixão imparcial, Wilder nos empurra junto com ele para o abismo. Somos

obrigados a acompanhá-lo à medida que ele abdica de todos os seus escrúpulos, mos

trando-se disposto a mentir, trair e roubar para arranjar dinheiro para beber, até que, de

forma tetrivelmente inevitável, acaba no Inferno de uma ala de alcoólatras de um

hospital público gritando de horror diante das alucinações do delirium tremens.

Algumas partes do filme foram rodadas em locações em Manhattan, e Wilder apro­

veita ao máximo as ruas secas e banhadas de sol, fi lmadas por seu diretor de fotografia

John F. Seitz para parecerem áridas e vulgares, como se estivessem sendo vistas através

do olhar turvo e autodepreciativo de Birnam. Em uma seqüência inesquecível, o escri­

tor, que se rebaixa a ponto de tentar penhorar sua máquina de escrever para conseguir

dinheiro para bebida, atravessa toda a poeirenta 3rd Avenue arrastando a máquina

pesada - apenas para descobrir que é Yom Kippur e todas as lojas de penhores estão

fechadas. Mais angustiante ainda é a cena em uma boate em que Birman sucumbe à

tentação e tenta roubar dinheiro da bolsa de uma mulher - apenas para ser pego e

humilhantemente jogado para fora enquanto o pianista lidera a clientela em um coro

que canta "Somebody Stole Her Purse" ("Alguém roubou a bolsa dela") à melodia de

"Somebody Stole My Gal". A trilha de Miklós Rózsa faz uso magisttal do teremim, o

antigo instrumento eletrônico cuja sonoridade sinistra e oscilante evoca

perfeitamente a visão de mundo embriagada e fora de controle de Birnam.

A censura do Código de Produção impôs um final feliz, embora Wilder

e Brackett tenham conseguido evitar algo muito absurdamente animadot.

Mesmo assim, a Paramount estava convicta de que o filme seria um fra­

casso, com a alarmada Indústria de bebidas oferecendo ao estúdio 5

milhões de dólares para que ele fosse enterrado de vez. Os adeptos da Lei

Seca, por outro lado, estavam em polvorosa, afirmando que ele encorajaria

o hábito de beber. Apesar de tudo. Farrapo humano foi um grande sucesso

de crítica e de público. "Foi depois dele", afirmou Wilder, "que as pessoas

começaram a me levar a sério." Nenhum outro filme posterior sobre o

alcoolismo, ou sobre qualquer outra forma de vício, conseguiu evitat uma

mesura a Farrapo humano. Pl<

lUA (I'KC) 67 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Edgar C. Ulmer

1'indução: Leon Fromkess, Martin

M I K iney

Uotelro: Martin Goldsmith, baseado

no livro de sua autoria

Fotografia: Benjamin H. Kline

M i r . i i .1: Leo Erdody, Clarence Gasklll,

llnitny McHugh

Elenco: Tom Neal, Ann Savage,

1 I.nulla Drake, Edmund MacDonald,

Hm Ryan, Esther Howard, Pat

1 ILR.LMHL

CURVA DO DESTINO (1945)

(DETOUR) "O destino ou alguma outra força misteriosa pode mexer comigo ou com você sem

nenhum motivo especial." Um dos maiores filmes B já produzidos, Curva do destino não

tenta ir além dos seus orçamento e cronograma de fi lmagem apertados. Em vez disso,

se aproveita da sua própria simplicidade, apresentando um mundo em algum lugar

entre a ficção pu/p e o existencialismo, no qual a vida tem valores de produção baixos e

duração curta.

Um músico de jazz maltrapilho (Tom Neal) que viaja de carona pelos Estados Unidos

vê sua vida se transformar em um inferno quando um motorista cai morto, Incrimi-

nando-o. Ele se envolve com uma mulher vulgar (Ann Savage) que o leva à degradação e

ao assassinato, culminando em uma briga Inesquecível em um quarto de hotel barato

na qual Savage acaba com um fio de telefone enrolado em volta do pescoço.

Edgar C. Ulmer, um expressionista alemão suando a camisa em produções baratas,

era um cineasta mais pretensioso do que seus admiradores gostariam de admitir,

porém esta é uma das verdadeiras obras-primas da época em que ele passou nas trin­

cheiras da classe Z. Os astros desconhecidos (Neal, um fracassado na vida real, mais

tarde cumpriu pena por assassinato) são resolutamente desprovidos de glamour e os

cenários de estúdio, beiras de estrada anônimas e paisagens retroprojetadas evocam

um mundo saindo do controle - no qual os desdobramentos Impulsionados por

coincidências de um roteiro mal amarrado de filme B podem sugerir a influência malig­

na de um destino impiedoso. K N

Inglaterra (Rank, The Archers)

•IJ mln. P&B

Iriloma: ingles

Dlrccao: Michael Powell, Emeric

Pirssburger

1'iodiicao: George R. Busby, Michael

Powell, Emeric Pressburger

ROttlro: Michael Powell, Emeric

rirssburger

lotografia: Erwln Hllller

ivi ir .ua: Allan Gray

l l r n c o : Wendy Hiller, Roger Livesey,

.rii ige Carney, Pamela Brown, Walter

ludd, ( aptain Duncan MacKenzie,

1 1 s.idler, Flnlay Currie, Murdo

- I m m i m u i , Margot Fitzslmmons,

iptaln C. W. R. Knight, Donald

- 1 1 . 1 1 ban. John Rae, Duncan

liuyrc, Jean Cadell

SEI ONDE FICA 0 PARAÍSO (1945)

(IKNOW WHERE l'M GOING) Sei onde fica o paraíso se destaca como uma das mais perfeitas da série de obras-primas

delirantes realizadas pela dupla Mlchael Powcll e Emeric Pressburger na década de 40.

Joan Webster (Wendy Hiller), muito sexy com seus terninhos, é uma jovem inglesa prá­

tica, típica do pós-guerra, que viaja para as ilhas Hébridas para se casar com um

milionário velho o bastante para ser seu pai. No entanto, sua obstinada caça ao ouro é

atrapalhada por um bando de escoceses estranhos que trama para que ela caia nos

braços de seu amor predestinado: Torquil MacNeil (Roger Livesey), um herói de guerra

local sem um tostão.

Além de serem os únicos cineastas capazes de chamar impunemente um herói ro­

mântico de "Torquil", Powell e Pressburger vão contra a visão cínica de ilhéus escoceses

conspiradores e beberrões de Alegrias a granel (1949), dos estúdios Ealing, apresentando

um grupo tão trapaceiro quanto, mas que trabalha por uma boa causa. A inflexibilidade

urbana de Joan é logo desarmada por um monte de lendas celtas envolvendo o

redemoinho da região, que representa os deuses e permite um empolgante clímax de

resgate no mar. Em um elenco de apoio enorme, Pamela Brown está especialmente

memorável como Catriona Pottis, uma nativa sinistramente encantadora. KN

/ IDAS (1946) (THE BEST YEARS OF OUR LIVES) Hoje em dia este épico doméstico sobte três veteranos da Segunda Guerra Mundial

retornando para a vida civil, de 172 minutos de duração e premiado nove vezes com o

Oscar, é considerado datado. Críticos mordazes como Manny Farber e Robert Warshow

foram bastante desdenhosos em relação a ele quando de seu lançamento - embora

aparentemente por opiniões políticas opostas. Farber o viu como uma bobagem liberal

valendo-se de uma abordagem conservadora, enquanto Warshow o avacalhou através

de uma perspectiva mais marxista. Seu diretor, William Wyler, e sua fonte literária, o

lomance de MacKinlay Kantor, não estão nem um pouco em moda atualmente. O

veterano no elenco, Harold Russell, que perdeu as mãos na guerra, foi alvo de reflexões

indignadas de Warshow sobre masculinidade tolhida e até mesmo de piadas infames

do humorista Terry Southern muitos anos depois. Por tudo isso, eu o chamaria de o

melhor filme americano sobre o retorno de soldados para casa que já vi - o mais tocan­

te e o que cala mais fundo. Ele serve de testemunha de seu tempo e dos seus

contemporâneos como poucos outros longas de Hoolywood, e a fotografia de Gregg

loland, que explora bem a profundidade de campo, é um de seus melhores trabalhos.

Parte do que é tão incomum sobre Os melhores anos de nossas vidas enquanto filme

hollywoodiano é o seu senso de distinção de classe - a maneira como os destinos e

carreiras de veteranos bem de vida (Match), de classe média (Russell) e proletários

(Andrews) são sobrepostos. Confessadamente, o fato de todos se encontrarem em um

bar cujo dono é Hoagy Carmichael tem algo de atdil sentimental, porém o relativo

apagamento das fronteiras de classe no serviço militar que é brevemente transferido

para a vida civil também tem seu lado plausível. As limitações de Russell como ator

também foram usadas como argumento contra o filme, no entanto o fato de o aceitar­

mos como o veterano de guerra deficiente que ele era soa como uma verdade muito

mais importante e documental que, nesse caso, suplanta os interesses da ficção. As

cenas entte ele e sua noiva (fictícia) são arrebatadoras tanto por sua ternura quanto pot

sua honestidade. Poucas passagens no cinema americano se igualam a elas. JRos

EUA (Samuel Goldwyn) 172 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: William Wyler

Produção: Samuel Goldwyn

Roteiro: Robert E. Sherwood, baseado

no livro Glory for Me, de MacKinlay

Kantot

Fotografia: Gregg Toland

Música: Hugo Friedhofer

Elenco: Myrna Loy, Fredric March,

Dana Andrews, Teresa Wright,

Virginia Mayo, Cathy O'Donnell.

Hoagy Carmichael, Harold Russell,

Gladys George, Roman Bohnen. Ray

Collins, Minna Gombell, Waliei

Baldwin, Steve Cochran, Dorothy

Adams

Oscar: Harold Russell (prêmio

honorário), Samuel Goldwyn (melhOI

filme), William Wyler (diretoi). RODil 1

E. Sherwood (roteiro), Fred rir Man Ii

(atot), Harold Russell (ator

coadjuvante), Daniel Mandell

(edição), Hugo Friedhofe! (músli 1)

Indicação ao Oscar: Gordon Sawyei

(som)

DESENCANTO (1946) (BRIEF ENCOUNTER)

Inglaterra (Cineguild, Rank) 86 min. I T . li

Idioma: inglês

Direção: David Lean

1'iodução: Noel Coward, Anthony

Havelock-Allan, Ronald Neame

Roteiro: Anthony Havelock-Allan,

I livld I ran, Ronald Neame, baseado

• l i peça Still Life, de Noel Coward

Intografla: Robert Krasker

Musica não original: Rachmanlnoff

I Itnco: Celia Johnson, Trevor Howard,

Stanley Holloway, Joyce Carey, Cyrill

Raymond, Everley Cregg, Marjorle

Mars

Indicação ao Oscar: David Lean

(dlirioi), Anthony Havelock-Allan,

David Lean, Ronald Neame (roteiro),

| ella Inlinson (atriz)

Irstival de Cannes: David Lean

(Palma de Ouro)

Os épicos imponentes da maturidade de David Lean às vezes ameaçam ofuscar os rela

tlvamente modestos primeiros trabalhos do diretor. Porém concentrar-se demais no

puro espetáculo de Lawrence da Arábia e Doutor jivago significaria ignorar algumas das

maiores façanhas de Lean. Afinal, apenas um cineasta de primeira grandeza poderia

dirigir Lawrence da Arábia, e este mesmo domínio da forma está patente nos seus

filmes anteriores, embora em escala muito menor.

Lean já havia dirigido três adaptações da obra de Noel Coward quando iniciou Desencan­

to, baseado na peça de um ato do autor chamada Still Life. Contudo, a brevidade da peça o

forçou a expandir o material e, durante o processo, ele ampliou também seu próprio

vocabulário cinematográfico. Contado em flashback, Desencanto acompanha o caso amo­

roso platônico entre a dona-de-casa Laura (Celia Johnson) e o médico Alec (Trevor Howard).

que se conhecem por acaso em uma estação de trem. Há obviamente uma conexão entre os

dois, porém ambos sabem que o romance não pode ir além de alguns almoços furtivos.

Ao elaborar um dos mais eficazes arranca-lágrimas da história do cinema, Lean

realizou uma série de avanços formais que lhe deram rapidamente a reputação de mais

do que um mero seguidor de Noel Coward. Para começar, ele retirou a história da

estação de trem, acrescentando mais detalhes ao romance malfadado. Explorou

também todo o aparato cinematográfico à sua disposição; a i luminação, por exemplo,

se aproxima do visual grave de suas adaptações posteriores de Dickens, tornando o

mais simbólica possível a estação escura e esfumaçada. Os efeitos sonoros também

são bem utilizados (especialmente o de um trem acelerando), assim como a música,

que incorpora o "Concerto para piano n 9 2" de Rachmanlnoff como tema do filme.

No entanto, o mais importante é a utilização por parte de Lean de ciosos freqüentes

nos olhos de Johnson, que contam melhor uma história do que muitos roteiros. Ela e

Howard estão excepcionais nesta que é a mais triste das histórias, cada movimento dos

dois prenhe de significado e os diálogos impecáveis repletos de emoções profundas.

Um olhar furtivo, um dedo acariciando a mão do outro e um riso compartilhado são

praticamente tudo que é permitido a esses amantes desventurados, e Johnson e

Howard transmitem belamente essa triste certeza. JKl

PAISA (1946) (PAISÀ)

1 ik|uer um que vá assistir a Paísá sem saber do seu status como obra-prima do neo-

n.il ismo pode ser perdoado por desistir logo no começo: imagens de arquivo da

i .inipanha americana na Itália, música ao estilo hollywoodiano, maus atotes vociferando

Ordens militates. É apenas no final do primeiro dos seis episódios independentes que o

I I I ilo improvisado de Roberto Rossellini começa a operar sua mágica dura: logo depois

que uma bala mata abruptamente um soldado que está contando sua história de vida,

vemos o cadáver do seu companheiro, morto pelos alemães e desprezado pelos

americanos sobreviventes que o tomam por um "carcamano sujo".

A crônica de 1943-46 de Rossellini é marcada pela devastação, brutalidade e incom-

ensão em todos os níveis. Um americano não percebe que uma prostituta é a m u -

Iher que ele amou seis meses atrás; um menino de rua fica amigo de um soldado negro

alcoólatta e rouba seus sapatos assim que ele cai no sono; a imagem final do filme -

inesquecivelmente desoladota - mostra a execução Impiedosa de uma fileira de

guerrilheiros.

Rossellini desenvolve uma estrutura à altura dessa sucessão de acontecimentos,

baseando-se em elipses surpreendentes na trama, diálogos conflitantes em diversas

línguas e uma apresentação dos horrores rigorosamente não-sentimental. Poiso

ocaliza natrativas pessoais dentro do pesadelo histórico da guetra. A M

Itália (Foreign Film, OFI) 120 min. P I n

Idioma: italiano/ inglês / alemão

Direção: Roberto Rossellini

Produção: Mario Conti, Rod E. Gcigci,

Roberto Rossellini

Roteiro: Alfred Hayes, Federico

Fellini, Sergio Amldei, Marcello

Pagliero, Roberto Rossellini

Fotografia: Otello Martelll

Música: Renzo Rossellini

Elenco: Carmela Sazio, Robei! Van

Loon, Benjamin Emmanuel, Hamld

Wagner, Merlin Berth, Dots Johnson.

Alfonsino Pasça, Maria Miclii, <..u

Moore, Harriet Medln, Renzo Avan/n,

William Tubbs, Dale Edmonds,

Cigolani, Allen Dan

Indicação ao Oscar: Alfred I layei,

Federico Fellini, Sergio Amldei,

Marcello Pagliero, Roberto Rossellini

(roteiro)

0 DESTINO BATE A SUA PORTA (1946) (THE POSTMAN ALWAYS RINGS TWICE) Lana Turner jamais esteve tão atraente como no papel de Cora Smith, que se casa com

um homem mais velho insosso (Cecil Kellaway) pata escapat da pobreza, mas que,

profundamente insatisfeita, sucumbe à sua atração por Frank Chambers (John

Carfield), um jovem andarilho. Como muitos fi lmes nolr, o relacionamento do casal

malfadado depende de um crime, o assassinato do marido de Cora. Com a ajuda de um

advogado inescrupuloso, a dupla é inocentada. No entanto, eles não conseguem

encontrar a felicidade, pois Cora é morta em um acidente de carro e Frank é executado

por este "crime".

Os enquadramentos claustrofóbicos de Tay Garnett enfatizam o aprisionamento

dos amantes mortais e a mise-en-scène melancólica e proibitiva do filme é o cenário

perfeito para sua trama sinistra. Com seu figurino branco e glamourizada pela i lumi­

nação, Turner se torna o centro visual da história, baseada no romance de James M.

Cain publicado na década anterior. Cora não é uma femme fatale c o m u m . Seus

sentimentos por Frank são verdadeiros, e não uma manipulação ardilosa.

O destino bote à sua porta reflete a cultura da Depressão de 1930, com muitas de

suas cenas se passando em um restaurante de beira de estrada que mantém sua

respeitabilidade por um fio, um símbolo pungente de desenraizamento e falta de

oportunidades. A narrativa em flashback combina com o pessimismo onipresente dos

fi lmes noit, dos quais este é, com justiça, um dos mais célebres exemplos. RBP

EUA (MGM) i l3min.P8(B

Idioma: inglês

Direção: Tay Garnett

Produção: Carey Wilson

Roteiro: Harry Ruskln, basisidi

livro de James M. Cain

Fotografia: Sidney Wagner

Música: George Bassman

Elenco: Lana Turner, John Garfleld,

Cecil Kellaway, Hume Cronyn. Leon

Ames, Audrey Totter, Alan Reed. Jell

York

I H A (I ox) 97 min. P&B

idioma: inglês

Direção: John Ford

ProducSo: Samuel C. Engel, Darryl F. . ' .nun k

fotografia: Joseph MacDonald

Roteiro: Samuel C.'Engel, Sam i i l l i i i . i n

MÚflca: Cyril J. Mockridge

Elenco: Henry Fonda, Linda Darnell,

« 1 1 ini Mature, Cathy Downs, Walter

I r a n nan, r im Holt, Ward Bond, Alan

Miiwln.iy, John Ireland, Roy Roberts,

lane Harwell, Grant Withers, J. Farrell

M.II I lonald, Russell Simpson

PAIXÃO DE FORTES ( m e ) (MY DARLING CLEMENTINE) Embora Sem lei, sem alma, A hora da pistola. Massacre de pistoleiros, Tombstone A

justiça está chegando e Wyatt Earp sejam todos mais "historicamente precisos" (seja

qual for o valor disso), a versão romântica e em ritmo de balada de John Ford dessa

velha história continua sendo o filme sobre Wyatt Earp, Doe Holliday e o OK Corral.

Wyatt (Henry Fonda), um pacífico criador de gado, chega à cidade infernal de

Tombstone e recusa o emprego de xerife, embora seja o único homem que ousa intervir

para acabar com a confusão armada por um índio bêbado. Quando ladrões de gado

assassinam um de seus Irmãos, ele trava uma conversa fordiana com a lápide do jovem

antes de assumir sua responsabilidade e colocar o distintivo. Ao limpar a cidade, Earp

torna a comunidade segura para os cidadãos que gostam de ir à igreja e dançar quadrilha

e que vinham se escondendo nas sombras durante o domínio do cruel Old Man Clanton

(Walter Brennan) e seu bando de filhos assassinos. Contudo, apesar de todo o esplendor

do Monument Valley (um cenário típico, acrescido de um cacto pitoresco) e da

Integridade moral rígida de Fonda, há um porém na cruzada vencida apenas à custa da

vida de Doe Holliday (Victor Mature), um fora-da-lei nobre que foi despachado a tiros e

pela tuberculose juntamente com os maus elementos. Esse tema sombrio retornaria

mais tarde em O homem que matou o facínora (1962), a revisão desiludida de Ford desse

subgênero do faroeste em que um homem coloca ordem na cidade.

Mature tem fama de ser inexpressivo,

porém sua Interpretação aqui como o cirur-

gião-pistolelto tuberculoso é comovente e

tem um quê de espirittiosidade amarga. O

herói de Fonda empertiga-se lentamente,

erguendo-se com uma graça de inseto em

uma cena de dança comunitária (uma das

marcas registradas de Ford) e sendo retrata­

do de forma memorável em perfeito equilí­

brio na varanda, com a cadeira apoiada em

duas pernas e uma das botas contra um pilar.

Como sempre no Velho Oeste de Ford, as

emoções do elaborado tiroteio do último ro­

lo são estimuladas por elementos cômicos,

como o bêbado shakespeariano que precisa

ser arrastado por Doe no meio de seu "Ser ou

não ser" e as complicações românticas com a

radiante Chihuaha (Linda Darnell) e a profes­

sora primária Clementine (Cathy Downs). Po-

rém, no fim das contas, o filme é ditado tan­

to por sua melancolia ou pela beleza arreba­

tadora das paisagens quanto por seu carátet

de animada matinê de sábado de bangue-

bangue. K N

EUA (Haig, International, RKO)

95 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Orson Welles

Produção: 5am Spiegel

Koteiro: Anthony Veiller, Victor

luv,is, Decla Dunning

fotografia: Russell Metty

Música: Branislau Kaper

I lenco: Edward C. Robinson, Loretta

Young, Orson Welles, Philip Merivale,

Richard Long, Konstantin Shayne,

Byron Keith, Billy House, Martha

Wculwofth Indicação ao Oscar: Victor Trivas

(roteiro) I estival de Veneza: Orson Welles,

Indli ação (Leão de Ouro)

0 ESTRANHO o 9 4 6 ) (THE STRANGER) O filme menos conhecido de Orson Welles como diretor, O estranho foi um projeto de

médio orçamento que ele aceitou do produtot Sam Spiegel para provar que conseguiria

fazer um "filme dentro dos padrões, comercial". Representante de uma série de thrllleis

realizados imediatamente após a guerra sobre a perseguição de criminosos nazistas

(dentre outros exemplos estão Acossado [1945] e Interlúdio [1946]), este filme remete à

reputação antifascista conquistada por Welles com sua famosa montagem de Júlio

César e chega até a encontrar eco em um romance que ele considerou filmar antes de

decidir que Cidadão Kane (1941) seria seu projeto de estréia: The Smiler With a Knife, o

livro de mistério anterior à guerra de Nicholas Blakc sobre o fascismo inglês.

Wilson (Edward G. Robinson), designado como investigador do governo, persegue o

carismático nazista Ftanz Klndler - que é supostamente o inventor dos campos de

extetmínio - até uma pequena cidade universitária em Connecticut. Kindler está f in­

gindo ser o professor de história Charles Rankin e acaba de se casar com Mary (Loretta

Young), a filha de um juiz da Suptema Corte. Menos complicado do que o triângulo

político-amoroso de Interlúdio, o filme se estrutura sobre um tema parecido, à medida

que Wilson tenta persuadir Mary a delatar seu marido

cruel, antes de se tornar uma variante daqueles

thrillcrs populares na década de 40 (como À meia-luz

[1944] e Inspiração trágica [1947]), no qual um esposo

malvado planeja assassinar sua mulher inocente.

Welles interpreta um vilão übermensch convincen­

te entregando-se em um diálogo em que afirma que

"Marx não era alemão, ele era judeu", sua podridão

destilando-se no mundo insignificante da cidadezinha

pitoresca à medida que dá vazão a seu hobby obsessi­

vo, consertando um relógio antigo. O estranho ainda

tem a força visual de Welles, porém, em 1946, os filmes

noir já haviam absorvido seu amor pelas sombras e

pelo grotesco, de modo que ele acaba se misturando

ao outras representantes do gênero.

O filme se torna especialmente melodtamático no

clímax, que se dá no topo de uma escada sabotada na

torre do relógio. Kindler é encurralado como King Kong

e morto por um boneco mecânico das engrenagens do

relógio, que o empala com sua espada estendida - o t i ­

po de violência explícita justificável em um filme holly-

woodiano de 1946, se o vilão fosse um nazista não-ar-

rependido. Antecipando David Lynch pot décadas,

Welles estabelece uma atmosfera amigável de cidade­

zinha do interior e a subverte, com filósofos de

fatmácia que roubam no jogo de damas e rainhas do

baile que se casam com fascistas. K N

A BELA E A FERA ( m e ) (LA BELLE ET LA BÊTE) |e ni Cocteau nunca se intitulou um cineasta, per se. Ele se considerava um poeta; o

i n u m a era apenas um das multas formas de arte que abraçou no decorrer de sua

i 111 ei ra. No entanto, mesmo que Cocteau se visse como um poeta em vez de um

"mero" cineasta, sua versão brilhante e visionária desta história folclórica clássica cer-

I,miente provou que os dois títulos não se excluíam mutuamente. Além disso, o fato

que, de todos os seus projetos, o onírico A bela e a fera continue sendo sua obra mais

.¡dorada revela não apenas sua imensa versatilidade e talento como também a pereni­

dade e aceitação em massa do cinema acima de todos os seus formatos de preferência.

De fato, Cocteau abordou A bela e a fera - apenas seu segundo longa-metragem -

t o m plena consciência do alcance da mídia e impulsionado por uma série de com­

promissos. Por um lado, seus colegas esperavam que ele colocasse o cinema francês de

volta no mapa depois do atraso cultural maciço causado pela ocupação alemã; o filme

deveria ser, na prática, uma afirmação nacional dos propósitos da comunidade artística

francesa. Por outro, Cocteau também estava sendo rechaçado pelos críticos, que o

a i usavam de elitismo artístico e de estar fora de contato com os gostos do público.

Poderia ele produzir uma obra comercial que fosse bem recebida pelas massas?

Com esses dois desafios e m mente, Cocteau abordou a fábula centenária d e " A Be­

la e a Fera" como uma válvula de escape para seus Impulsos criativos mais exóticos e

lantásticos. Na verdade, a estrutura relativamente direta da história original encorajava

esse tipo de experimentação. Quando seu pai é aprisionado por uma Fera aparen­

temente monstruosa (Jean Marals) em um castelo remoto, a filha, a Bela (Josette Day),

se oferece para ficar no seu lugar. Porém a barganha da Fera é mais do que parece: ele

diz à Bela que pretende desposá-la. Potém ela precisa ver além das aparências e desco­

brir o bom coração do seu pretendente peludo antes de tomar sua decisão.

Cocteau Instaura essa corte em um castelo mágico - que se prova cenário para uma

série de belos efeitos. A Bela não se limita a andar pelos corredores; ela desliza por eles.

Velas não são sustentadas por candelabros tradicionais, mas agarradas por braços

afixados às paredes. Espelhos são transformados em portais l íquidos, chamas

queimam e se extinguem por vontade própria e estátuas ganham vida. O castelo serve

tanto como metáfora para a personificação do processo criativo quanto como desculpa

para várias imagens freudianas. Uma vez que a Bela não pode exatamente consumar

seu relacionamento com a Fera antes de ele se transformar, Cocteau a faz acariciar

facas e descer longos corredores para revelar seus desejos subconscientes.

Entretanto, a maior façanha de Cocteau foi tornar a Fera monstruosa ao mesmo

tempo convincente e cativante. Com Marals enterrado debaixo de uma maquiagem

complexa, a bondade da Fera precisa ser transmitida através de atos e gestos, revelando

assim a humanidade que jaz literal e figurativamente sob a pelagem e as presas. Na ver­

dade, a representação de Marals é tão bem-sucedida que, na estréia do filme, quando a

Fera finalmente se transforma no singelo Príncipe e ele e a Bela vivem felizes para sem­

pre, a atriz Creta Carbo exclamou sua famosa frase: "Quero minha fera de volta!" JKl

França (DisCina) 96 min. P&B

Idioma: francês

Direção: Jean Cocteau

Produção: André Paulvé

Roteiro: Jean Cocteau, Jeanne Marie

Leprince de Beaumont

Fotografia: Henri Alekan

Música: Georges Auric

Elenco: Jean Marals, Josette Day, Mlla Parély, Nene Germon, Michel Am lui

Raoul Marco, Marcel André

IUA (I list International, Warner),

i i | nun. P&B

Iriloma: ingles

Dlrccao: Howard Hawks

Pmducäo: Howard Hawks, Jack L

Wamel

KOtllro: William Faulkner, baseado

im Iivin de Raymond Chandler

lotografia: Sidney Hickox

M n s i i , i : Max Steiner

I l im 0! I lumphrey Bogart, Lauren li i l l lohn Ridgely, Martha Vickers,

I »niolhy Malone. Peggy Knudsen, Regis loomey, Charles Waldron, i Harles l>. Brown, Bob Steele, Elisha

I i i . fouls Jean Heydt

A BEIRA DO ABISMO ( w b ) (THE BIG SLEEP) Diz-se que, quando o diretor Howard Hawks pediu ao romancista Raymond Chandlei

para expllcat as várias traições, viradas e surpresas reveladas presentes no seu livro O

sono eterno, a famosa e honesta resposta do escritor foi a seguinte: "Não faço a menor

idéia." Isso não significa que as diversas reviravoltas da trama não sejam importantes

para o livro, ou que a presença delas seja apenas um caos arbitrário. Em vez disso, o

mistério notavelmente confuso de Chandler apenas complica mais uma história já

complicada de corrupção na cidade de Los Angeles, contaminando ainda mais uma lista

aparentemente interminável de personagens soturnos.

Portanto, não deveria causar surpresa que Hawks tenha feito a gentileza de transferir

o foco da sua adaptação do investigado pata o investigador, no caso Humphtey Bogart no

papel do detetive particular durão Philip Marlowc. Aproveitando-se do sucesso do filme

Uma aventura na Martinica, de 1944, Hawks reuniu Bogart com Lauten Bacall e enfatizou

a química palpável dos dois. Quando estão juntos na tela, a história de detetive fica em

segundo plano (eles se casatam seis meses após o término das filmagens). Hawks

explorou aquela tensão sexual, actescentando cenas extras com a dupla e frisando os

diálogos cheios de indiretas e particularmente ligeiros (cm especial aquele sobre cavalos

e selas), tendo em vista que se tratava da era do Código de Produção.

E quanto ao mistétio? Felizmente, a investigação central, por mais confusa que

seja, ainda dá prazer de se assistir Matlowe faz as vezes de guia à Virgílio, descendo até

os recônditos mais escuros e sujos de Hollywood para desvendar uma ttama de

assassinato/chantagem que envolve pornógrafos, ninfomaníacas e um bando de ca­

pangas que mal têm tempo de revelar mais

detalhes da história (e pistas falsas) antes de

levarem um tiro.

O título do livro, O sono eterno, é uma re­

ferência à morte e, de fato, a morte permeia

também o filme. Esta é uma obra-prima noir

que carece de muitos dos princípios tradicio­

nais do gênero. Há várias femmes fatales,

mas nenhum flashback: i luminação chia-

roscuro, mas nenhuma narração. E, o que é

mais importante, o Marlowe de Bogart não

parece petdido em um mundo de mentiras e

traições, e sim plenamente confiante e no

controle a todo momento. Ele é um anti-

herói singular, frio diante da crueldade, i m ­

passível diante da libertinagem vulgar e

sempre interessado em um rosto bonito. JKl

OS ASSASSINOS (1946) (THE KILLERS) * I primeiros 10 minutos do filme noir clássico de Robert Siodmak reproduzem o conto

de 1927 de Hemingway quase literalmente: dois assassinos Invadem uma vila

adormecida para matar o recluso Swede (Burt Lancaster), que não oferece resistência.

iaisando da imaginação, os rotelristas Anthony Velller c John Huston Inventam

Rlordan (Edmond O'Brien), um dedicado investigador da companhia de seguros, que

desvenda o passado de Swede: um ex-pugilista que se envolveu com uma mulher de

leputação duvidosa (Ava Gardner), um roubo e uma traição.

Cidadão Konc fragmentou sua narrativa cm flashbacks relatados por diferentes

narradores: Os assassinos leva a Idéia um passo além ao misturar a ordem cronológica

ilos flashbacks. O processo de montagem desse quebra-cabeça reforça a ligação

lecíproca entre o espectador e Rlotdan. À medida que mergulha no passado de Swede.

0 infatigável Riordan sente a emoção de vivet através do outro uma vida de filme noir

sem sofrer as conseqüências. A relação entre ele e o mundo ilícito de Swede se torna

análoga àquela do espectador com o filme - um conceito que é cristalizado quando,

logo antes do embate final, a silhueta de Riordan senta-se em primeiro plano como se

estivesse na primeira fileira de um cinema. Os assassinos é não só um excelente filme

noir, mas também uma teflexão sobre por que gostamos do gênero, que nos oferece

uma escapatória da segurança monótona, levando-nos em direção ao perigo e à

perdição, mas a uma distância segura. MR

EUA (Mark Hellinger, Universal)

105 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Robert Siodmak

Produção: Mark Hellinger

Roteiro: Anthony Veiller, baseado no

conto de Ernest Hemingway

Fotografia: Elwood Bredell

Música: Miklós Rózsa

Elenco: Burt Lancaster, Ava Gaidnei,

Edmond O'Brien, Albert Dekker, Sam Levene, Vince Barnett, Virginia Christine, Jack Lambert, Charles D. Brown, Donald MacBride, Charles McGraw, William Conrad, John Huston

Indicação ao Oscar: Robert Slodmal (diretor), Anthony Veiller (roteiro), Arthur Hilton (edição), Miklós Rôzsi (música)

NESTE MUNDO E NO OUTRO (1946) (A MATTER OF LIFE AND DEATH) A fantasia de 1946 de Michacl Powell e Emeric Pressburgcr Neste mundo e no outro (que

ganhou o título Stairway to Heaven [Escada para o céu] no mercado americano) foi feita

pata ser um filme-propaganda para melhorar as relações estremecidas entre a Inglater­

ra e os Estados Unidos. O filme, no entanto, supera seu propósito inicial, tornando-se

uma história atemporal sobre o romance c a bondade humana que é ao mesmo tempo

visualmente empolgante e verbalmente divertida.

Quando está prestes a pular do seu avião em chamas para a morte certa, um piloto

da Segunda Guerra Mundial (David Nlven) se apaixona pela voz de uma operadora de

rádio americana (Kim Hunter). Ele acorda na praia, acreditando estar no Céu. Ao des­

cobrir que está vivo, aproveita a oportunidade para se apaixonar pela garota americana

em pessoa. Porém os poderes divinos cometeram um erro, e o Condutor Celestial 71

(Marins Corlng) é enviado para lhe dizer a verdade e levá-lo ao Paraíso, que é onde ele

deveria estar. A cenografia excepcional de Alfred Junge eleva o filme para além de suas

já impressionantes intenções e roteiro engenhoso, intercalando-se com desenvoltura

entre a Terra (filmada em Technicolor) e o preto-e-branco etéreo do Céu. Além do uso de

imagens congeladas e decorações cênicas de tirar o fôlego, o trabalho de câmeta inclui

uma tomada por detrás do globo ocular que receberia a aprovação de Salvador Dali. K K

Inglaterra (The Archers, Independem

Rank) 104 min. P&B & Technicolor

Idioma: inglês

Direção: Michael Powell, Emerli Pressburger

Produção: George R. Busby, Mii l inel

Powell, Emeric Pressburger

Roteiro: Michael Powell, Emeric

Pressburger

Fotografia: Jack Cardiff

Música: Allan Gray

Elenco: David Niven, Kim Hunter,

Robert Coote, Kathleen Byron,

Richard Attenborough, Bonar

Colleano, Joan Maude, Marlus

Goring, Roger Livesey, Robert AI kins.

Bob Roberts, Edwin Max, Betty is it Ma

Abraham Sofaer, Raymond Massey

hil ' . l .Herra (Cineguild, Rank) 118 min.

P8tB

Idioma: inglês

Direção: David Lean

Produção: Anthony Havelock-Allan, Ronald Neame

Heleno: Anthony Havelock-Allan,

Divld i ean, Ronald Neame, baseado

rio livro de Charles Dickens

lotografia: Guy Green

Música: Walter Goehr, Kenneth I'akeluan

Elenco: John Mills, Anthony Wager,

Valerie Hobson, Jean Simmons,

Bernard Miles, Francis L. Sullivan,

1 Inlay ( urrie, Martita Hunt, Alec

Guinness, Ivor Barnard, Freda

|ai kson, Eileen Ersklne, George

Hayes. Hay Petrie, John Forrest

Oscar: John Bryan, Wilfred

Shlngleton (direção de arte), Guy

1 ,ieen (fotografia)

Indicação ao Oscar: Ronald Neame

(melhoi fllme), David Lean (diretor),

David Lean, Ronald Neame, Anthony

1 lavelock Allan (roteiro)

GRANDES ESPERANÇAS ( m e ) (GREAT EXPECTATIONS) Filmado em 1946 na esteira dos bem-sucedidos Desencanto e Uma mulher do outro n i n e

do, esta é a primeira adaptação de David Lean dos romances de Charles Dickens; O/ivei

Twist viria em seguida em 1948. Assumindo a obra-prima literária como um desafio

cinematográfico em todos os sentidos da expressão, Lean explora e se aproveita dn

amplo horizonte emocional da história e a torna também uma jornada arrebatadora e

de um visual hipnotizante. O resultado é a melhor adaptação da literatura já reaIí/. 1,1.1

assim como um dos maiores filmes Ingleses de todos os tempos.

Grandes esperanças traz elementos de muitos filmes de terror, começando em um

vasto pântano que leva a um cemitério abandonado. Essa cena de abertura era tão

essencial que Lean, que tinha uma idéia precisa de como deveria ser o visual do filme,

substituiu o fotógtafo original Robert Krasker por Guy Green. Aqui, o jovem herói Pip é

ameaçado por um prisioneiro fugitivo feroz e desesperado chamado Magwitch (Finlay

Currie), que exige comida e uma lima para poder se livrar de suas correntes. Mais tarde,

Pip é levado à mansão decrépita da igualmente decrépita e amargurada Miss Havisham

(Martita Hunt). Abandonada no altar muitos anos atrás, ela ainda veste os restos do seu

vestido de noiva e anda por entre os restos empoeirados, apodrecidos e infestados de

ratos do fatídico banquete de recepção. Seu plano macabro é transformar sua pupila, a

jovem e bela Estella (Jean Simmons), em um instrumento de vingança contra todos os

homens. Isso inclui Pip, que se apaixona por ela. A situação dele muda quando um

benfeitor misterioso financia a mudança de Pip para Londres e sua transformação em

um refinado gentleman. Dividindo um flat com Herbert Pocket (Alec Guiness em seu

primeiro papel importante), o Pip adulto (John Mills) se torna um esnobe que acredita

que Miss Havisham é sua benfeitota e que Estella está destinada a ser sua esposa.

Qualquer leitor acostumado com Dickens sabe que não é bem assim.

Houve quem sustentasse que Mills, de 38 anos de Idade, era velho demais para

interpretar um personagem que tinha de 20 para 21, conforme estabelecido pelo romance.

Contudo, o fato é que Pip precisa apenas ser testemunha do drama encenado ao seu

redor, em vez de um participante ativo do seu próprio destino. Lean, que passou sete anos

como montador antes de dirigir seu primeiro longa, sabia muito bem disso e cerca Mills

de um elenco de apoio sólido, porém cheio de vida. Algumas cenas são

puro encanto, como a visita de Pip à casa de Wemmick (Ivor Barnard), o

assistente de seu advogado, onde nosso herói conhece seu pai ancião e

ligeiramente senil, que se chama "Velho P" - abreviação de "velho pai" - ,

um termo que alguns ainda usam para se referir aos seus próprios pais.

Embora não seja essencial para a trama, essa cena é de uma ternura e graça

memoráveis, trazendo consigo um bocado de charme dickensiano.

Apesar de antigo, Grandes esperanças não perdeu nada de sua

grandiosidade ou pungência. Tendo conquistado a quinta posição na

lista dos melhores filmes ingleses de todos os tempos do British Film

Institute, ele foi premiado em duas categorias do Oscar - Melhor Direção

de Arte e Melhor Fotografia em Preto-e-Btanco - , além de ter sido

indicado para os prêmios de Melhor Direção, Melhor Fllme e Melhor Ro­

teiro Adaptado. Em termos de alcance, visão e coerência, este continua

sendo o maior de todos os filmes baseados na obra de Dickens. KK

;|H

I IM (RKO, Vanguard) 101 min. P&B

Idiomas: inglês / francês

Direção: Alfred Hitchcock

Produção: Alfred Hitchcock

Roteiro: Ken Hecht

fotografia: Ted Tetzlaff

Musica: Roy Webb

Elenco: Cary Crant, Ingrid Bergman,

• laude Rains, Louis Calhern,

i eopoldlne Konstantin, Reinhold

'•' hünzel, Moroni Olsen, Ivan

Friesau I i . Alex Minotis

Indli IçSo ao Oscar: Ben Hecht

(lolclio), Claude Rains (ator

• oidjuvante)

INTERLÚDIO (1946) (NOTORIOUS) Embora o produtor David O. Selznick tenha reunido a equipe bem-sucedida do drama

psicanalítico Quando fala o coração (1945), que Incluía o diretor Alfred Hitchcock, a

estrela Ingrld Bergman e o roteirista Ben Hecht, e supervisionado (com sua habitual

avalanche de memorandos) a produção desta história de espiões cheia de classe e

romance, ele acabou vendendo todo o pacote para a RKO c deixou Hitchcock produzir a

sl mesmo. Até mesmo David Thomson, o biógrafo de Selznick, admite que a qualidade

do filme se deve ao fato de Selznick não ter estado lá para arruinado.

Perto do fim da Segunda Guerra Mundial, o cordial superespiãoT. R. Devlln (Cary Grant)

recruta Alicia Huberman (Ingrid Bergman) - uma jovem sem perspectivas que se afastou

do pai, um traidor condenado - para se Infiltrar em um grupo de nazistas exilados na Ar­

gentina. Alicia se aflige quando sente que Devlln a está usando para a causa e é impelida a

levar sua missão a extremos ao se casar com o quase paternal Alexander Sebastian (Clau­

de Ralns), um fascista. Dentro da mansão fria e luxuosa de Sebastian, Alicia passa a ser

odiada pelo verdadeiro poder entre os vilões exilados: a mãe sufocadora e monstruosa de

Sebastian (Madame Konstantin), que é o tipo de criatura que a Sra. Bates teria se tornado

se tivesse sido deixada viva. Em uma festa - na qual um mecanismo de suspense clássico

é utilizado quando o champanhe acaba, obrigando um criado a descer para a adega, onde

a angelical Alicia e o demoníaco Devlln estão bisbilhotando -, Hitchcock revela seu detalhe

mais elegante, embora tópico: garrafas de vinho cheias de urânio sendo usadas para criar

uma bomba atômica nazista. O resultado é um momento aflitivo de descoberta, quando

Sebastian é levado a cter que sua mulher é apenas infiel, e nâo uma espiã.

O intenso drama triangular de Interlúdlo nos força constantemente a mudar a m a ­

neira como nos sentimos a respeito dos três protagonistas, com Rains chegando a

mostrar um heroísmo bizarro no f im. O filme é também um romance suntuoso, com

Grant e Bergman realizando o que era, até aquele momento, o beijo em dose mais

longo do cinema. Fotografado de forma magnífica por Ted Tetzlaff em um pteto-e-

branco resplandecente e com seus astros mais belos (e Inspirados) do que nunca, o

último rolo é extremamente agonizante, com a mãe monstruosa supervisionando o

lento envenenamento de Alicia. K N

NARCISO NEGRO ( i r o ) (BLACK NARCISUS) A afirmação de David Thomson de que Narciso negro é "um caso raro, um filme inglês

irótlco sobre as fantasias sexuais de freiras" provavelmente não faz jus a ele. Baseado

COm muita fidelidade no tomance de Rumer Godden, de 1939, o filme acompanha um

ueno grupo de Irmãs que são presenteadas com uma construção bem no alto do

Himalaia, a qual tentam transformar em uma escola de freiras e em um hospital. A

1 DIISTRUÇÃO arejada foi no passado um harém e ainda é enfeitada por murais explícitos,

10 passo que uma criada hindu tagarela remanescente da época de devassidão prevê

alegremente que as irmãs sucumbirão à atmosfera do local.

Em um nível, Narciso negro é um relato em tom casual dos ftacassos do império:

aquelas cristãs sensíveis chegam com boas intenções, potém encontram-se numa

mação absurda, ensinando apenas alunos que são pagos pelo marajá local para

assistir a aulas que não significam nada para eles e prestando atendimento hospitalar

apenas em casos simples - uma vez que, se fracassarem em salvar um paciente, o

hospital seta fechado como se fosse amaldiçoado. Os diretores Powell e Pressburger

vêem o humor por trás da frustração das freiras, percebendo um conflito cultural sem,

contudo, desdenhar tanto o ponto de vista racional quanto o primitivo, divertindo-se

com a ironia de que os personagens mais religiosos são também os mais sensíveis

(quando deveriam tender a toda sorte de crenças infundadas), enquanto os ateus são

os mais inclinados a superstições.

A irmã Clodagh (Deborah Kerr), que c promovida muito jovem, tenta manter a missão

unida como um oficial inexperiente em um filme de guerra, sendo atirada

para junto do ardoroso e mal-afamado Mr. Dean (David Farrar), estimu­

lando, assim, o ciúme homicida da mais reprimida das freiras, a irmã Ruth

(Kathleen Byton). À medida que as obsessões começam a agir, o filme se

torna mais surreal, com o exotismo de estúdio resplandecendo sob a

vívida fotografia em Technicolor de Jack Cardiff e Kerr e Byron tremendo

sob suas toucas como freiras apaixonadas. Um dos mais surpreendentes

momentos do cinema inglês é a "tevelação" da irmã Ruth sem o hábito -

com um vestido encomendado por correio e batom vetmclho vivo -,

transformada em uma harpia que tenta empurrar Clodagh de cima de um

precipício enquanto toca o sino do convento. O filme conta ainda com

um Sabu quase adulto (o Mowgli da versão de 1942 de O livro da selva) e

uma jovem Jean Simmons (com um caracol incrustado de jóias no natiz)

como os sensuais inocentes que dão mau exemplo. K N

Inglaterra (Independem, Rank, The

Archers) 100 min. Technicolor

Idioma: inglês

Direção: Michael Powell, Emeric

Pressburger

Produção: George R. Busby, Michael

Powell, Emeric Pressburger

Roteiro: Michael Powell, Emeric

Pressburger, baseado no livro de

Rumer Godden

Fotografia: Jack Cardiff

Música: Brian Easdale

Elenco: Deborah Kerr, Sabu, David

Farrar, Flora Robson, Esmond Knighl,

Jean Simmons, Kathleen Byron. Jennv

Laird, Judith Furse, May Hallati. I ddle

Whaley Jr., Shaun Noble, Nancy

Roberts, Ley On

Oscar: Alfred Junge (direção de . 1 1 1 r).

Jack Cardiff (fotografia)

EUA (Liberty, RKO) 130 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Frank Capra

Roteiro: Philip Van Doren Stern,

Frances Goodrich

Elenco: James Stewart, Donna Reed, Lionel Barrymo/e, Thomas Mitchell, Henry Travers, Beulah Bondl, Frank Laylen, Ward Bond, Gloria Grahame, H. B. Warner, Frank Albertson, Todd Karns, Samuel S. Hinds, MaryTreen, Virgínia Patton

Indicação ao Oscar: Frank Capra (melhor filme), Frank Capra (diretor), James Stewart (ator), William I lornbeck (edição), John Aalberg (som)

A FELICIDADE NAO SE COMPRA ( i r o ) (IT'S A WONDERFUL LIFE) Depois de celebrar o homem comum em clássicos da década de 30 como Acoimou

naquela noite, A mulher faz o homem e Do mundo nada se leva, o primeiro filme de I i.ml-

Capra realizado no pós-guerra enaltece, sem o menor pudor, a bondade das pessoas 1 o

muns e o valor dos sonhos humildes, mesmo que eles não se tornem realidade. Baseado

em The Createst Cift, um conto escrito em um cartão de Natal por Philip Van Doren. g

vital protagonista do fi lme, um jovem sobrecarregado de responsabilidades, foi quase

recusado pelo cansado de guerra James Stewart. Lançado em 1946 sob críticas confll

tantes, ele foi, não obstante, Indicado a cinco prêmios Oscar (incluindo Melhor Filme e

Melhor Ator), porém não venceu em nenhuma categoria. Hoje em dia, especular se ele

era um fi lme que precisava ser assistido várias vezes para ser apreciado plenamente ou

se foi apenas produzido na época errada é irrelevante. Na década de 60, o copyright dele

expirou, o que permitiu a circulação a baixo custo de uma versão de "domínio público"

e exibições freqüentes na tevê. Reprisado à exaustão por volta das festas de fim de ano,

ele se tornou o baluarte das "sessões para toda a família". Depois de consolidado como

uma pedra de toque emocional para várias gerações, canais públicos de televisão, em

1970, cristalizaram sua reputação de qualidade exibindo-o em contraste com a progra

mação comercial obtusa e materialista da época de festas.

George Bailey (Stewart), um homem desengonçado e de bom coração, cresce na

pequena cidade de Bedford Falis, em Connecticut, mas sonha em viajar pelo mundo. O

dever, no entanto, está sempre entrando no caminho para frustrar esse sonho. Sua

perda de liberdade é aliviada apenas pelo seu casamento com Mary (Donna Reed), a bel­

dade local, e posteriormente por sua jovem família e por seu próprio senso de filantropia

ao ajudar os trabalhadores da cidade a comprarem suas próprias casas. Por f im, ao se ver

forçado a recorrer à poupança da família, que Mr. Potter (raras vezes Lionel Barrymore

esteve tão detestável), o ganancioso banqueiro da cidade, ameaça confiscar, George

sente-se tão pressionado que tenta o suicídio saltando de uma ponte. No entanto, um

milagre acontece: um anjo chamado Clarence (Henry Travers)

é enviado do Céu para mostrar a George o que teria sido da

cidade caso seu desejo se realizasse e ele jamais tivesse

vivido. Somente depois de George se convencer do próprio

valor seu suicídio será desfeito, a cidade voltará ao normal e

Clarence, um anjo de segunda classe, ganhará suas asas.

Quase 60 anos depois, A felicidade não se compra continua

sendo um dos mais queridos filmes de fim de ano por conta

de sua mensagem otimista e clima amedrontador de "o que

teria acontecido se...". Assistido no cinema, sem as distrações

das festividades, ele se revela mais uma comédia escrachada

deliciosa, repleta de comentários ligeiros e incisivos sobre o

amor, o sexo e a sociedade. A grande qualidade dessa brin­

cadeira se deve especialmente à participação não creditada no

roteiro de Dorothy Parker, Dalton Trumbo e Clifford Odets. O

filme era um dos favoritos de Capra e Stewart e ambos expres­

saram profundo descontentamento quando ele se tornou

vítima precoce da febre da colorização. KK

EUA (Columbia) no min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Charles Vidor

Produção: Virginia Van Upp

Roteiro: Jo Eisinger, E. A. Ellington

lolografia: Rudolph Maté

Musica: Doris Fisher, Allan Roberts,

Hugo Friedhofer

i lenco: Rita Hayworth, Glenn Ford,

i ge Macready, Joseph Calleia, Steven Geray, Joe Sawyer, Gerald M e i n , Robert E. Scott, Ludwig Donath, Donald Douglas

GILDA (1946) "As estatísticas mostram que existem mais mulheres no mundo do que qualquer oulia

coisa", dispara o herói cínico Johnny Farrell (Glenn Ford), acrescentando, com peculiai

aversão, "exceto insetos!" Ainda assim, essa misoginia coexiste, no filme de Charles

Vidor, com a própria - e bela - Gilda (Rita Hayworth). Uma personagem que é ao mesmo

tempo completamente apática e dona de uma Ironia magistral, cuja canção-assinatura

"Put the Blame on Mame" - ao som da qual ela faz um sttip-tease extraordinariamente

sensual envolvendo a retirada apenas das suas luvas de veludo que vão até os cotovelos

- é uma exposição mordaz de como as mulheres são responsabilizadas pela destruição

causada por homens que ficam obcecados por elas.

Johnny, um jogador durão que parece ligeiramente desconfortável no seu smoking,

torna-se o gerente de um cassino em Buenos Aires, trabalhando para Ballin Mundson

(George Macready), um magnata inexptesslvo que carrega uma bengala que é na

verdade uma espada, espia seus clientes e sócios attavés de uma sala de controle na

casa de jogos e é o vértice de um triângulo amoroso que impulsiona a trama. Ford e

Hayworth, ambos atores limitados, potém cativantes e fotogênicos, têm atuações

definitivas arrancadas deles como dentes, e Macready se diverte como o complexo

vilão. Como afirmam os cartazes: "Nunca houve uma mulher como Gilda!" K N

I.UA ((liarles Chaplin, United Artists),

iza, min. P&B

Idioma: inglés

Dlrcçâo: Charles Chaplin

Pioduçào: Charles Chaplin

Itoteiro: Charles Chaplin

I otografia: Roland Tothetoh

Música: Charles Chaplin

Elenco: Charles Chaplin, Mady

i iniell, Allison Roddan, Robert Lewis,

Audrey Betz, Martha Raye, Ada May,

liobel í Isom, Marjorie Bennett,

i lelene Heigh, Margaret Hoffman,

Maiilyn Nash, Irving Bacon, Edwin

Mills, Virginia Brissac

Imlicaçâo ao Oscar: Charles Chaplin

MONSIEUR VERD0UX (1947)

Charles Chaplin comprou a idéia da sua comédia mais negra (por s mil dólares) de

Orson Welles, cujo plano original era fazer um documentário sobre o lendário assassino

em série de esposas francês Henri Désiré Landru. Chaplin deu à história uma

abordagem sócio-satírica nova e mordaz, em resposta à paranóia crescente dos anos da

Guerra Fria. Verdoux (Chaplin), um pequeno-burguês tranqüilo e charmoso, só adota

sua profissão lucrativa de se casar com viúvas ricas e assassiná-las mais tarde, quando

a depressão econômica Impossibilita que ele ganhe a vida honestamente como caixa

de banco. Quando é finalmente levado à justiça, sua defesa consiste em que, enquanto

o assassinato privado é condenado, a matança pública - na forma da guerra - é glori­

ficada: "Um assassinato transforma uma pessoa em vilã - milhões, a transformam em

herói. Os números santificam." Esses não etam sentimentos populares na América de

1946, e Chaplin se viu cada vez mais na mira da Direita - uma caça às bruxas que

resultou na sua partida definitiva dos Estados Unidos em 1952.

Verdoux, acompanhado pela animada canção-tema (Chaplin, como sempre, com­

pôs sua própria trilha), é um personagem rico e vívido. A economia rígida do pós-guerra

obrigou Chaplin a trabalhar mais rápido e com multo mais planejamento do que em

filmes anteriores. O resultado é uma de suas narrativas mais bem construídas, que ele

mesmo considerou, sem modéstia, "o filme mais Inteligente e brilhante da minha

carreira". DR

I JGA DO PASSADO (1947)

(OUT OF THE PAST) I m uma praia de Acapulco, com o mar brilhando por entre as redes de um pescador, o

detetive Jeff Markham (Robert Mitchum) beija Kathy Moffat (Jane Creer), a mulher que ele

foi pago para encontrar para o gângster Whlt Sterling (Kirk Douglas), seu ex-namorado.

Kathy senta-se ao lado de Jeff e revela que sabe que ele foi enviado para encontrá-la. Ela

Confessa tet atirado em Whit, mas nega ter roubado seus 40 mil dólares. Pede que Jeff

acredite nela. Inclinando-se para beijá-la, ele quase sussurra: "Querida, eu não me importo."

Fuga do passado, de Jacques Tourneur, uma adaptação do romance Build My Cailows

lligh, de Daniel Malnwaring, talvez seja a obra-prima do gênero noir. Todos os elementos

estão lá: a mulhet mentirosa, mas tão bonita que você é capaz de perdoar quase qualquer

(olsa que ela faça, ou pelo menos morrer ao seu lado; o passado amargo que vem à tona

novamente e destrói o personagem principal; o detetive particular, um homem Inteligente

e experiente que comete o erro de sucumbir à paixão mais de uma vez. Mitchum per-

sonifica perfeitamente essa figura. Como Humphrey Bogart, ele possui uma interioridade

calma, que transmite independência e confiança. Como um dos personagens diz a seu

lespelto: "Ele apenas se senta e fica dentro de si mesmo." Porém, ao contrário do cauteloso

r.ogart, Mitchum literalmente mergulha no personagem de Jeff, com uma tranqüilidade

* arregada que torna sua vulnerabilidade não só verossímil como também trágica.

Será a paixão de Kathy por Jeff verdadeira? Apesar da sua Incapacidade de suportai

dificuldades por ele e da sua atitude fatalista em relação ao amor, será que ela o ama de

lato? Por outro lado, a paixão de Jeff por ela é sincera? Embora ligue para a polícia para

! ransformar a escapada final deles em uma armadilha, estará ele se rendendo a seus

encantos novamente? Esta é a pergunta que Ann (Virgínia Huston), a namorada caipira de

leff, faz a Kid (Dickic Moore), o companheiro surdo-mudo de Jeff, no final do filme. Kld faz

que sim com a cabeça. Estará ele dizendo a verdade? Sentimos que esse gesto livrará Ann

de qualquer outro relacionamento futuro com o mundo mortífero de Jeff. Porém isso

significa que seja uma mentira? fuga do passado, como muitos dos filmes noir, nos deixa

com os enigmas de desejos fatais, com as ambigüidades de amores envoltos em medo. T C

EUA (RKO) 97 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Jacques Tourneur

Produção: Warren Duff

Roteiro: Daniel Mainwarlng, bascat

no seu livro Build My Gallows lliiili

Fotografia: Nicholas Musuraca

Música: Roy Webb

Elenco: Robert Mitchum, Jane Cree

Kirk Douglas, Rhonda Fleming, Richard Webb, Steve Brodie, Virgini Huston, Paul Valentine, Dickie Moore, Ken Niles

EUA (Fox) 104 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Joseph L. Mankiewicz

Produção: Fred Kohlmar

Roteiro: R.A. Dick, Philip Dunne,

baseado no livro de R. A. Dick

Fotografia: Charles Lang

Música: Bernard Herrmann

Elenco: Gene Tierney, Rex Harrison,

1 ieorge Sanders, Edna Best, Vanessa

Hiown, Anna Lee, Robert Coote,

Natalie Wood, Isobel Elsom, Victoria

Horne

indicação ao Oscar: Charles Lang

(lotografia)

0 FANTASMA APAIXONADO (1947)

(THE GHOST AND MRS. MUIR) Uma história de fantasma romântica, suave e nada assustadora, O fantasma apaixonada

brinca jovialmente com a idéia de almas que se encontram através dos tempos e dfl

poder libertador da imaginação. Gene Tierney, com sua beleza tristonha sendo finalmen

te bem utilizada, interpreta uma jovem e bela viúva que aluga um chalé assombrado no

topo de um penhasco. Rex Harrison, um dos atores preferidos do diretor Joseph l .

Mankiewicz, interpreta o fantasmagórico capitão naval que se torna seu guia e mentol

- e cujas memórias ele a encoraja a publicar sob seu nome. A relação dos dois, carinhosa,

porém - por motivos óbvios - jamais consumada, sustenta o charme sutil do filme e lhe

acrescenta um toque picante. A atuação rabugenta de Harrisson e a representação

levemente antipática de George Sanders como o pretendente de Tierney evitam que a

fantasia tesvale para a extravagância e mantêm o sentimentalismo sob controle.

Apesar das restrições da censura da época, o roteiro elegante de Philip Dunne faz

um engenhoso ttabalho de insinuação através do vocabulário malicioso do capitão. O

fantasma apaixonado também se beneficia da fotografia translúcida de Charles Lang e

de uma das ttilhas sonoras mais sutis e líricas de Bernard Herrmann. O filme foi

lembrado com carinho suficiente para gerar uma bem-sucedida série de televisão no

fim da década de 6o. PK

Inglaterra (Two Cities) 116 min. P&B

Idioma: inglês

Direção: Carol Reed

Produção: Carol Reed, Phil C. Samuel

Roteiro: R. C. Sherrlff, baseado no

livro de F. L. Green

Fotografia: Robert Krasker

Música: William Alwyn

Elenco: James Mason, Robert

Newton, Cyril Cusack, Peter Judge,

William Hartnell, Fay Compton, Denis

u'Dea, W. G. Fay, Maureen Delaney,

I Iwyn Brook-Jones, Robert Beatty,

Dan O'Herlihy, Kitty Kirwan, Beryl

Measor, Roy Irving, Kathleen Ryan

Indicação ao Oscar: Fergus

McDonnell (edição)

O CONDENADO mi) (ODD MAN OUT) A crônica de Carol Rced sobre um soldado republicano irlandês é representada como um

sonho expressionista febril. James Mason, no papel de Johnny McQueen, interpreta o

líder de um grupo antibritânico que planeja um roubo que ajudará a financiar sua causa.

Na noite do crime, Johnny mata um homem, leva também um tifo e precisa fugir das

autoridades, que armaram uma operação em toda a cidade para capturá-lo juntamente

com seus parceiros. O filme inteiro se passa no decorrer do resto da noite, enquanto

Johnny tenta se refugiar e Kathleen (Kathleen Ryan), sua namorada, tenta encontrá-lo.

Johnny descobre que aqueles nos quais confiava - ou que pensava apoiarem sua

causa - jamais se arriscariam por ele. Isso o obriga a se manter em constante movimen­

to, à medida que é rejeitado por uma pessoa atrás da outra. Cada uma tem um motivo

para não ajudá-lo ou usá-lo em benefício próprio. Quando seu ferimento piora, Johnny

se torna delifantemente filosófico e começa a entender que está essencialmente sozi­

nho no mundo. A trilha do filme e sua fotografia preto-e-btanco sombria aumentam a

atmosfeta generalizada de incerteza moral. A maneira como O condenado rompe as

amarras do gênero do th ri I ler político e se toma uma reflexão comovente, séria e po­

derosa sobre a existência social continuará surpreendendo platéias por muito tempo. RH

LADROES DE BICICLETAS (1948) (LADRI Dl BICICLETTE) Aninnio Ricci (Lamberto Maggiorani), um desempregado na Roma do pós-guerra, con-

segue um emprego de colador de cartazes de cinema depois que sua mulher penhora as

milpas de cama da família para tirar sua bicicleta do prego. Porém, assim que ele começa

.1 irabalhar, a bicicleta é roubada. Com Bruno (Enzo Staiola), seu filho pequeno, a

ii buque, ele cruza a cidade tentando recuperá-la, deparando-se no caminho com vários

ISpectos da sociedade romana, incluindo algumas das mais agudas diferenças sociais.

Esta obra-prima é geralmente considerada - e com justiça - uma das peças-chave

do realismo italiano. O crítico francês André Bazin também o reconheceu como um dos

i i indes filmes comunistas já feitos. O fato de ter recebido o Oscar de Melhor Filme Es-

11.1 ngeiro em 1949 sugere que ele não foi visto dessa forma nos Estados Unidos à época.

Mímicamente, a única coisa que chamou a atenção dos censores americanos foi uma

- ena em que o garotinho urina na rua. Para alguns defensores da teoria autoral, ele per­

deu um pouco do seu poder por não ter derivado de uma só mente. Uma colaboração

entre o roteirista Cesare Zavattini, o diretot Vittorio De Sica, atores amadores e muitos

outros, a produção é tão carregada de um espírito coletivo que é quase Inútil tentar

separar os méritos.

Ladrões de bicicletas contém o que talvez seja a maior representação do relaciona­

mento entre pai e filho da história do cinema, repleto de oscilações e gradações

'«agressivas em termos de respeito e confiança entre os dois personagens, além de ser

inpressionantemente desolador. Ele também tem seus momentos de comédia à

( haplin, como o comportamento conttastante de dois menininhos almoçando no mes­

mo restaurante. Se comparado a um filme como A vida é bela, ele dá uma Idéia de como

0 cinema comercial mundial e sua relação com a realidade foram Infantilizados no

decorrer do século passado. JRos

Itália (De Sica) 93 min. P&B

Idioma: italiano

Direção: Vittorio De Sica

Produção: Giuseppe Amato, Vittorio

De Sica

Roteiro: Cesare Zavattini, Oreste Blancoll, Suso d'Amico, Vittorio De Sica, Adolfo Francl, Gerardo Guerrieri, baseado no livro Ladri di 8/cfc/ette, de Luigl Bartolini.

Fotografia: Carlo Montuori Música: Alessandro Cicognini Elenco: Lamberto Maggiorani, I n/u Staiola, Lianella Carell, Gino Saitamerenda, Vittorio Antonuccl, Giulio Chlari, Elena Altieri, Carlo Jachino, Michele Sakara, Emma Druettl, Fausto Guerzoni Oscar: Giuseppe Amato, Vittoiio De Sica (prémio honorário - melhoi filme estrangeiro)

indicação ao Oscar: Cesare Zavattini (roteiro)

EUA (Rampart, Universal) 86 min.

P&B

Idioma: Inglês

Direção: Max Ophüls

Produção: John Houseman

Roteiro: Howard Koch, Stefan Zweig,

baseado no livro Brief einer

tltickannten, de Stefan Zweig

Fotografia: Franz Planer

Música: Daniele Amfltheatrof

Elenco: Joan Fontaine, Louis Jourdan,

Mady Christians, Marcel Journet, Art

'anitli, Carol Yorke, Howard Freeman,

lohn dood, Leo B. Pessln, Erskine

Sinford, Otto Waldls, Sonja Bryden

CARTA DE UMA DESCONHECIDA <1948) (LETTER FROM AN UNKNOWN WOMAN) Stefan Brand (Louis Jourdan), um pianista de Concetto dândi e cavalheiresco na Viena .l .

virada do século XIX para o XX, volta para casa depois de mais uma noite de dissipação.

Sua criada muda lhe entrega uma carta. É de uma mulhet, e suas primeiras palavi.e. o

deixam estarrecido: "Quando você estiver lendo Isso, eu estarei morta..."

O que se desenrola a partir dessa abertura extraordinária pode ser considerado com

justiça não só o melhor fi lme do diretor Max Ophüls e uma grande conquista demui de

gênero muitas vezes injustamente difamado do melodrama como também um doi

maiores filmes da história do cinema. Ele é, por si só, uma das poucas obras que podem

ser apontadas como perfeitas até os mínimos detalhes.

Adaptado de forma extraordinária da novela de Stefan Zweig por Howard Koch, este

filme é a apoteose da ficção de "amor malfadado", valendo-se de um flashback para aconi

panhara paixão platônica da jovem Lisa Brendl (Joan Fontainc) por Stefan, Ophüls nosole

rece um tetrato vívido e pungente de um amot que jamais deveria ter acontecido. A idéia

romântica e ingênua que Lisa faz dos artistas misturada à indiferença com que Stefan ve ai

mulheres como objetos geta uma tragédia sombria. A compreensão Intuitiva de Ophüls da

desigualdade dos papéis de gênero na sociedade ocidental do século XX é surpreendente.

Ophüls constrói uma obra belamente equilibrada. Ao mesmo tempo em que

incentiva uma identificação com o sofrimento de Lisa, e com os sonhos de toda uma

sociedade alimentada pela cultura popular (um pano de fundo que serviria para filmes

posteriores), Corto de limo desconhecida é uma crítica mordaz c devastadora ao mito e

â ideologia do amor romântico. Nossa compreensão da história fica sujeita às

mudanças sutis de atmosfera e ponto de vista.

De forma implacável e hipnótica, a mise-en-scène de Ophüls retira os véus de

ilusão que envolvem Lisa. Quando não são os cenários que revelam as condições banais

de realidade por trás desses vôos de imaginação, a câmera sugere - em enqua-dramen-

tos sutis e movimentos ligeiramente destacados do mundo da história - uma pers­

pectiva independente que ilude os personagens.

O filme é um triunfo não só em tetmos de um estilo significa­

tivo e expressivo, mas também de uma estrutura narrativa plane­

jada. Através da narração pungente de Lisa, décadas são interligadas

e anos-chave são saltados engenhosamente, gtaças ao ajustamento

de detalhes organizados como motivos, que se concentram em

gestos repetidos (como uma flor que é dada), diálogos (referências

ao passar do tempo são onipresentes) e objetos-chave (a escada que

leva ao apartamento de Stefan). Quando Ophüls atinge um chavão

de Hollywood - a aparição fantasmagórica da jovem Lisa finalmente

evocada na memória de Stefan - , o clichê é gloriosamente trans­

cendido e lágrimas sobem aos olhos mesmo daqueles espectadores

modernos que resistem a esse tipo antiquado de "novela".

Carta de uma desconhecida é de uma riqueza inesgotável,

uma obra que levou uma miríade de cinéfilos a tentar desvendar

seus temas, padrões, sugestões e ironias. No entanto, nenhuma

quantidade de análise cuidadosa será capaz de extinguir a emo­

ção sublime e dilacerante evocada por esta obra-prima. A M