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Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.66, n.2, p.374-380, 2014 Avaliação da atividade anti-helmíntica de extratos brutos de plantas da Floresta Amazônica e Mata Atlântica brasileira sobre Haemonchus contortus [Evaluation of the anti-helminthic activity of crude extracts from the Brazilian Amazon and Mata Atlântica plants against Haemonchus contortus] M.P.V. Cunha, A.F. Alves Neto, I.B. Suffredini*, L.J.C. Abel Universidade Paulista UNIP São Paulo, SP RESUMO No mundo todo, as verminoses são causa de considerável prejuízo econômico na criação de ovinos. As perdas estão relacionadas ao retardo na produção, custos com tratamentos profiláticos e, em casos extremos, à morte dos animais. O objetivo deste trabalho foi verificar a ação anti-helmíntica de extratos vegetais sobre nematoides como alternativa terapêutica no tratamento da verminose em ovinos. Extratos orgânicos e aquosos foram obtidos de plantas nativas da Floresta Amazônica e Mata Atlântica, e foram testados na concentração de 100μg/mL em ensaios de toxicidade in vitro contra ovos de Haemonchus contortus e de 200μg/mL contra suas larvas. Na concentração estabelecida, apresentaram significante atividade relacionada à inibição de eclosão de ovos; em particular, o extrato orgânico de folhas e frutos de Trichilia sp. e o extrato aquoso dos órgãos aéreos de Phyllanthus attenuatus. Os resultados in vitro sugerem que extratos aquosos e orgânicos dessas plantas podem oferecer novas alternativas de controle da verminose em ovinos a partir de produtos naturais. Palavras-chave: Haemonchus contortus, anti-helmínticos, Floresta Amazônica, extratos vegetais, controle parasitário ABSTRACT Helminthosis play a crucial role in small ruminant production leading to enormous economic losses particularly in areas where extensive grazing is practiced. It causes a loss of production through mortality, weight loss, reduced milk and wool production. Haemonchus contortus is a highly pathogenic small ruminant helminthes parasite, which is capable of causing acute diseases and high mortality. Therefore, there is an urgent need to seek alternative or complementary solutions to the control of parasitic nematodes of ruminants. The tropical forests concentrate the highest biodiversity in the world, particularly those located in Brazil, whose species richness is estimated to account for 20% of the total world richness and little is known about the chemical and pharmacological potentialities of Brazilian tropical forests. In this work, organic and aqueous extracts were tested on eggs and in the larval development test on Haemonchus contortus. The organic extract obtained from leaves and fruits of Trichilia sp. and the aqueous extract obtained from the aerial organs of Phyllanthus attenuates showed significant activity related to the inhibition of H. contortus egg eclosion. In vitro results suggest that both extracts, as well as eleven other active extracts, can offer alternatives in sheep worm control. Keywords: Haemonchus contortus, anti-helmintics, Amazon rain forest, plant extracts, parasite control INTRODUÇÃO A criação de ovinos tem desempenhado importante papel econômico na pecuária Recebido em 22 de outubro de 2012 Aceito em 1 de outubro de 2013 *Autor para correspondência (corresponding author) E-mail: [email protected] brasileira. No que diz respeito à participação no mercado mundial, a importação de carne ovina passou de 2,3 mil toneladas em 1992 para 14,7 mil toneladas em 2000, representando um crescimento acima de 600%. A importação de

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Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.66, n.2, p.374-380, 2014

Avaliação da atividade anti-helmíntica de extratos brutos de plantas da Floresta

Amazônica e Mata Atlântica brasileira sobre Haemonchus contortus

[Evaluation of the anti-helminthic activity of crude extracts from the Brazilian Amazon and Mata Atlântica

plants against Haemonchus contortus]

M.P.V. Cunha, A.F. Alves Neto, I.B. Suffredini*, L.J.C. Abel

Universidade Paulista – UNIP São Paulo, SP

RESUMO

No mundo todo, as verminoses são causa de considerável prejuízo econômico na criação de ovinos. As

perdas estão relacionadas ao retardo na produção, custos com tratamentos profiláticos e, em casos

extremos, à morte dos animais. O objetivo deste trabalho foi verificar a ação anti-helmíntica de extratos

vegetais sobre nematoides como alternativa terapêutica no tratamento da verminose em ovinos. Extratos

orgânicos e aquosos foram obtidos de plantas nativas da Floresta Amazônica e Mata Atlântica, e foram

testados na concentração de 100µg/mL em ensaios de toxicidade in vitro contra ovos de Haemonchus

contortus e de 200µg/mL contra suas larvas. Na concentração estabelecida, apresentaram significante

atividade relacionada à inibição de eclosão de ovos; em particular, o extrato orgânico de folhas e frutos de

Trichilia sp. e o extrato aquoso dos órgãos aéreos de Phyllanthus attenuatus. Os resultados in vitro

sugerem que extratos aquosos e orgânicos dessas plantas podem oferecer novas alternativas de controle

da verminose em ovinos a partir de produtos naturais.

Palavras-chave: Haemonchus contortus, anti-helmínticos, Floresta Amazônica, extratos vegetais, controle

parasitário

ABSTRACT

Helminthosis play a crucial role in small ruminant production leading to enormous economic losses

particularly in areas where extensive grazing is practiced. It causes a loss of production through

mortality, weight loss, reduced milk and wool production. Haemonchus contortus is a highly pathogenic

small ruminant helminthes parasite, which is capable of causing acute diseases and high mortality.

Therefore, there is an urgent need to seek alternative or complementary solutions to the control of

parasitic nematodes of ruminants. The tropical forests concentrate the highest biodiversity in the world,

particularly those located in Brazil, whose species richness is estimated to account for 20% of the total

world richness and little is known about the chemical and pharmacological potentialities of Brazilian

tropical forests. In this work, organic and aqueous extracts were tested on eggs and in the larval

development test on Haemonchus contortus. The organic extract obtained from leaves and fruits of

Trichilia sp. and the aqueous extract obtained from the aerial organs of Phyllanthus attenuates showed

significant activity related to the inhibition of H. contortus egg eclosion. In vitro results suggest that both

extracts, as well as eleven other active extracts, can offer alternatives in sheep worm control.

Keywords: Haemonchus contortus, anti-helmintics, Amazon rain forest, plant extracts, parasite control

INTRODUÇÃO A criação de ovinos tem desempenhado

importante papel econômico na pecuária

Recebido em 22 de outubro de 2012 Aceito em 1 de outubro de 2013

*Autor para correspondência (corresponding author)

E-mail: [email protected]

brasileira. No que diz respeito à participação no

mercado mundial, a importação de carne ovina

passou de 2,3 mil toneladas em 1992 para 14,7

mil toneladas em 2000, representando um

crescimento acima de 600%. A importação de

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http://dx.doi.org/10.1590/1678-41626313
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carne caprina também apresentou um

crescimento bastante significativo (EMBRAPA

CNPC, acessado em 2012).

Dentre os fatores que causam prejuízos na ovino

e caprinocultura, as verminoses causadas pelo

parasita Haemonchus contortus ocupam lugar de

destaque, uma vez que este é o nematódeo de

patogenia mais significante para pequenos

ruminantes (Jasmer e Mc Guire, 1996) e

altamente prevalente no Brasil (Amarante, 2001).

As consequências das infecções causadas por

esse parasita são o atraso de desenvolvimento

corporal dos cordeiros, a queda na produção e na

qualidade da carne e da lã (Ramos et al.,

2004) e a morte de animais jovens, nos casos

mais graves (Molento et al., 2004). Um dos

principais fatores ligados à eficiência do ciclo de

vida e infecção dos nematoides de ovinos

é a resistência a fármacos anti-helmínticos

atualmente empregados (Echevarria e Pinheiro,

1989). Por isso o uso de produtos naturais

aparece como alternativa terapêutica para o

tratamento de verminoses, (Githiori et al., 2006).

O emprego de plantas medicinais tem sido feito

há séculos pelos agricultores para o tratamento

do parasitismo e melhorar o desempenho

produtivo dos animais. No entanto, a evidência

científica sobre a eficácia antiparasitária da

maioria dos produtos vegetais é limitada, apesar

de sua ampla utilização. A validação científica

dos efeitos antiparasitários e possíveis efeitos

colaterais de produtos vegetais em ruminantes é

necessária antes da sua adoção como um novo

método para controle de parasitas (Githiori et al.,

2006). O Brasil abriga a maior biodiversidade do

planeta. Sua biota conhecida está entre 170 e 210

mil espécies de plantas, sendo que as descritas

representam apenas 49.520 espécies, embora seja

um número crescente (Capobianco, 2001). A

Floresta Amazônica e a Mata Atlântica

constituem cerca de 30% dos remanescentes de

florestas tropicais existentes sobre a superfície

terrestre, abrigando não somente a maior

diversidade biológica do planeta (Mittermeier et

al., 1999), como também alta variabilidade

genética expressa na forma de componentes

fitoquímicos (Hamann et al., 1991). Diante desse

contexto, verificamos a pertinência de se realizar

estudos relacionados ao potencial farmacológico

de plantas tropicais brasileiras, especificamente

da Mata Atlântica brasileira e da Floresta

Amazônica, como agentes anti-helmínticos.

Este trabalho tem como objetivo realizar ensaios

de identificação de extratos vegetais de plantas

brasileiras que sejam ativos contra ovos e larvas

de Haemonchus contortus, através de testes in

vitro.

MATERIAIS E MÉTODOS

Para a obtenção e preparo dos extratos, as plantas

foram coletadas em florestas brasileiras, após

obtenção de licenças de coleta e acesso aos

recursos genéticos emitidas pelo IBAMA e do

CGen (MMA) (12A/2008). As espécies foram

coletadas em igapó, florestas inundadas pelo Rio

Negro. Exemplares de cada espécie (exsicatas)

foram registrados e depositados no Herbário

UNIP (Suffredini et al., 2007a).

Diferentes órgãos de cada espécie foram

coletados (p.ex., órgãos aéreos, folhas ou

caule) e foram secos em estufa de circulação de

ar (Fanem), a 40oC. Depois, foram moídos

em moinho de facas (Holmes) e submetidos

à maceração, por 24 horas, com

diclorometano:metanol (1:1) (Merk), seguido de

uma segunda maceração, por mais 24 horas, com

água destilada Milli-Q (Millipore). Os extratos

aquosos foram liofilizados (Virtis) e os

orgânicos, rotaevaporados (Buchii), para depois

serem mantidos sob congelamento até o uso

(Suffredini et al., 2006).

Os extratos orgânicos foram diluídos em

dimetilsulfóxido 50% (DMSO 50%) e os

aquosos, em água. Foram preparados

inicialmente a uma concentração de 2mg/mL.

Depois, foram diluídos 10 vezes, utilizando-se

microplacas de 96 poços, sendo que 20µL de

cada solução inicial de extrato inicial foram

transferidos para cada um dos poços, e em

seguida, o volume final foi completado para

200µL de água destilada grau Milli-Q

(Millipore). Desse modo, cada extrato foi diluído

a 200µg/mL. Durante a realização do ensaio,

100µL do extrato diluído foram adicionados às

suspensões de ovos de H. contortus, resultando

em uma concentração final de extrato de

100µg/mL. Para a avaliação da atividade

dos extratos vegetais contra as larvas de H.

contortus, 30µL dos extratos vegetais diluídos à

concentração de 2mg/mL foram transferidos para

as placas contendo 270µL de suspensão de larvas

em meio de cultura, originando uma diluição

final de 200µg/mL. Como controle negativo,

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Cunha et al.

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foram utilizados DMSO 50%, água destilada e

como controle positivo, moxidectina dissolvida

em DMSO 50%, na concentração final de

100µg/mL.

Para a obtenção dos ovos de helmintos usados,

empregou-se uma versão adaptada do teste de

eclodibilidade, para determinação de resistência

anti-helmíntica, proposto por World Association

for the Advancement of Veterinary Parasitology

– WAAVP (Coles et al., 1992). Foram utilizados

ovinos criados em sistema semi-intensivo e com

status parasitológico de contagem média de

2.000 OPG (ovos por grama de fezes), segundo o

método de Gordon e Whitlock modificado (Ueno

e Gutierrez, 1983). Aproximadamente 10g de

fezes, coletadas diretamente da ampola retal,

foram acondicionadas em sacos plásticos e

encaminhadas imediatamente ao laboratório, à

temperatura ambiente. O material foi triturado

em graal contendo 150mL de solução salina

hiper-saturada e foi filtrado em tamises de

malhas de 250mn/μm (nº 60) e 180mn/μm (nº

80). O material obtido foi acondicionado em

tubos de centrífuga (1,4 x 9,8cm) e centrifugado

a 2.000rpm por dois minutos. Transferiu-se o

sobrenadante para outro tubo de centrífuga,

repetindo-se três vezes o último procedimento

para lavagens consecutivas com água destilada.

Na última lavagem, o sedimento foi mantido com

um pequeno volume de água destilada,

ressuspendido e transferido para tubos de ensaio

(1,8 x 10cm) em alíquotas de 200μL, de modo a

comporem uma suspensão com ovos de

helmintos, contados com auxílio de microscópio

óptico.

A análise do efeito dos extratos vegetais sobre o

desenvolvimento de ovos de helmintos, através

do teste de eclodibilidade (TE), foi realizada em

placas de 96 poços, contendo 100μL da

suspensão de ovos (equivalente a 100 ovos) por

poço, em que se adicionou igual volume do

tratamento (extrato vegetal) a ser estudado,

preparado de modo que a concentração final

resultante fosse 100µg/mL. As placas foram

vedadas com filme plástico e incubadas em

estufa à temperatura de 26±1ºC, por 48h,

umidade relativa de 100%. O tempo decorrido

entre a coleta de fezes e o início da incubação

dos ovos sob a ação dos extratos das plantas foi

de, no máximo, duas horas. Avaliou-se a ação

dos extratos vegetais sobre o desenvolvimento

dos ovos, após o período de incubação de 48h,

através de leitura em microscopia óptica, no

aumento de 100 vezes. Foram avaliados todos os

ovos presentes na amostra, de modo a classificá-

los de acordo com o estágio de desenvolvimento

em que se encontravam. Cada tratamento foi

feito em triplicata e os extratos que apresentaram

atividade foram testados posteriormente no

desenvolvimento larval.

O teste de desenvolvimento larval (TDL) foi

proposto por Demeler et al. (2010). Realizou-se

o ensaio em placa de 24 poços. Cada poço

recebeu 200μL de água destilada, 20μL de

suspensão contendo 100 ovos e 50μL de meio de

crescimento, que foi preparado a partir de uma

mistura na proporção de 2:2:1 de

levedura:extrato de Earle, anfotericina B (Sigma

A2942, 0.5mg/mL) e 1,5mg/mL de Escherichia

coli K12 liofilizada (suspensa em água destilada,

autoclavada). Após 24 horas da eclosão dos

ovos, foram adicionados 30μL de extrato vegetal,

totalizando um volume de 300μL. Incubou-se a

placa a 27°C por 7 dias. Após esse período, as

larvas viáveis foram contadas.

Os experimentos foram avaliados a partir da

análise de variância do tipo ANOVA de uma

entrada, seguida de comparações múltiplas entre

médias pelo teste Tukey, considerando-se

diferenças entre as médias significantes se

p<0.05 (GraphPad Prism 5.0).

RESULTADOS

A Tabela 1 relaciona os extratos vegetais que

apresentaram atividade contra ovos de

nematoides, fornece os dados botânicos

das espécies usadas para obtenção desses

extratos, assim como a parte do vegetal que foi

usada. ANOVA de uma entrada realizada

com os extratos orgânicos mostrou diferenças

significantes (F(79,160)=5,939; Χ2=0,7457;

p<0,001) entre tratamentos e controles, assim

como os extratos aquosos (F(74,150)=4,163;

Χ2=0,6725; p<0,001). A figura 1A mostra os

resultados do processo de triagem realizado para

os extratos orgânicos em comparação com os

grupos controle e a Figura 1B mostra os

resultados do processo de triagem realizado para

os extratos aquosos em comparação com os

grupos controle. Na Figura 1, estão representados

os resultados mais significantes obtidos com

extratos orgânicos e aquosos em comparação

aos grupos controle. Dos extratos testados,

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sete orgânicos e seis aquosos apresentaram

significância na capacidade de inibir a eclosão de

ovos em relação ao controle positivo. Os extratos

que interferiram com a eclosão dos ovos foram

testados no teste de desenvolvimento larval

(TDL) e, baseado na ANOVA de uma entrada,

nenhum extrato refletiu a eficácia anteriormente

observada para os ovos (F(11,12)=11.47;

Χ2=0,9131; p<0,001) (Fig. 1A).

Extratos ativos contraovos de Haemonchus contortus

c+ c- 26 34 47 81 86 87 90 10013

115

117

117

518

0

0

10

20

30

40

tratamento

co

nta

gem

do

s o

vo

s

A

Análise de extratos vegetais contralarvas de Haemonchus contortus

c+ c-N47

N81

N87

N15

1

N17

5N26

N86

N90

N10

0

N18

0

0

20

40

60

tratamentos

mero

de larv

as

B

Figura 1. A) Resultados da triagem de extratos orgânicos obtidos de diferentes órgãos de plantas

amazônicas contra ovos de Haemonchus contortus. B) Resultados da triagem de extratos aquosos obtidos

de diferentes órgãos de plantas amazônicas contra ovos de Haemonchus contortus.

DISCUSSÃO E CONCLUSÃO

O método proposto permitiu a análise biológica

de um número satisfatório de extratos vegetais e

pode ser considerado como uma das formas mais

rápidas e eficazes de se buscar produtos naturais

bioativos. Essa metodologia é frequentemente

usada na busca de extratos com atividade

antimicrobiana, antifúngica e antitumoral

(Younes et al., 2007), mas dados sobre a

aplicação desse método na busca de plantas com

atividade anti-helmíntica sobre nematódeos de

ovinos são escassos.

Dos extratos vegetais testados, sete extratos

orgânicos e seis aquosos apresentaram-se

significantemente eficazes na inibição dos ovos

de Haemonchus, na concentração de 100µg/mL.

Segundo a literatura consultada, não

existem dados publicados sobre a atividade

anti-helmíntica dessas espécies. Moxidectina

(2mg/mL), controle positivo utilizado, inibiu

100% a eclosão dos ovos. Os extratos

apresentaram desempenho promissor, quando

comparado com a moxidectina. Nessa análise, é

importante ressaltar que a moxidectina é um

composto ativo isolado, enquanto os extratos são

compostos por constituintes químicos de origem

diversa, que podem agir de modo isolado

ou em sinergismo, em relação à atividade

ovicida/larvicida (Rates, 2001). No presente

estudo, o extrato orgânico EB175, obtido de

Trichilia sp., apresentou atividade ovicida

significante. Os triterpenoides e limonoides

isolados de algumas Meliaceae são descritos

como potencialmente inseticidas contra

Spodoptera frugiperda (lagarta do cartucho)

(Sarria et al., 2011). Três extratos de plantas da

família Euphorbiaceae inibiram a eclosão de

ovos de modo significante, sendo dois aquosos,

Mabea nitida (EB90) e Phyllanthus attenuatus

(EB86), e um orgânico, Croton glandulosum

(EB87). Às diversas substâncias isoladas de

algumas plantas pertencentes a essa família são

atribuídas propriedades antimicrobiana (Brusotti

et al., 2011), antioxidante (Van Hong et al.,

2011), antidiabética (QI et al., 2010), antitumoral

(BALIGA et al., 2011) e anti-inflamatória

(Okokon et al., 2010). O extrato orgânico de

Tabernaemontana angulata (EB81), responsável

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por inibição significante dos ovos de

Haemonchus, apresentou como compostos

majoritários coronaridina e voacangina (Matheus

de Assis et al., 2009). Marie-Magdalene et al.

(2010) relatam a atividade anti-helmíntica de

Tabernaemontana citrifolia sobre Haemonchus

contortus. Suffredini et al. (2007b) descrevem os

extratos orgânicos de Caryocar microcarpum

(EB100) e Callophyllum brasiliense (EB47)

como citotóxicos a células tumorais. A presença

de cumarinas, xantonas, flavonoides e triterpenos

em C. brasiliense (Clusiaceae) é descrita como

responsável pela atividade citotóxica em várias

linhagens de células (Cechinel Filho et al.,

2009). No presente estudo, o extrato orgânico de

C. microcarpum (Caryocaraceae) e o extrato

aquoso de C. brasiliense inibiram de forma

significante a eclosão de ovos de Haemonchus. O

potencial anti-helmíntico de compostos isolados

de espécies pertencentes à família Annonaceae já

foi descrito em ensaios sobre nematódeos e

protozoários, assim como foi descrita a presença

de alcaloides e acetogeninas, compostos

isolados frequentemente associados à atividade

antiparasitária dessas plantas (Souza et al.,

2008). No nosso estudo, o extrato orgânico de

Guatteria riparia (EB151) foi responsável pela

inibição significante da eclosão de ovos de H.

contortus.

O extrato aquoso EB26, obtido de Aldina sp. e

de uma espécie não identificada da família

Myrtaceae (EB180) apresentaram atividade

ovicida significante. Não existem menções de

atividade biológica sobre nematódeos de

pequenos ruminantes relacionadas a essas plantas

na literatura. Porém, dados sobre atividades

farmacológicas diversas ocorrem. A comparação

da atividade relativa à inibição de eclosão de

ovos desses extratos na concentração de

100µg/mL com estudos semelhantes indica uma

potencial atividade anti-helmíntica dessas

plantas. Assis et al. (2003) relataram que o

extrato acetato de etila de Spigelia anthelmia,

responsável por 100% de atividade tóxica a ovos

de H. contortus na concentração de 50mg/mL,

inibiu em torno de 20% a eclosão de ovos na

concentração de 3,1mg/mL.

No teste de desenvolvimento larval realizado

com os extratos orgânicos e aquosos que

apresentaram maior índice de inibição de eclosão

de ovos, os resultados de inibição do

desenvolvimento e morte de larvas demonstram

ausência significante de atividade, quando

comparados à substância de referência.

De acordo com a literatura consultada,

concentrações diversas dos extratos devem ser

testadas. Costa et al. (2001), pesquisando a

atividade anti-helmíntica de extratos brutos

Azadirachta indica, apresentaram resultados de

inibição de ovos de H. contortus de 98,22% com

uma concentração de 3,12mg/mL e 17,7% de

inibição no desenvolvimento de larvas com o

mesmo extrato e igual concentração. Quando o

mesmo extrato foi empregado na concentração

de 50mg/mL, a inibição no desenvolvimento das

larvas aumentou para 87,1%. É importante

destacar que os testes realizados por esses

autores mostram um efeito inibitório de larvas

menor que o de eclodibilidade de ovos, quando

se usa a mesma concentração de extrato. A

inibição de 50% de eclosão de ovos foi

observada na concentração de 0,36mg/mL, já a

inibição no desenvolvimento de 50% de

larvas, na concentração de 98mg/mL. Dados

semelhantes também foram apresentados por Al-

Shaibani et al. (2008). No presente estudo, os

resultados de inibição de eclosão de ovos e de

desenvolvimento larval são superiores aos

encontrados na literatura, que descreve extratos

vegetais ativos em concentrações mais elevadas

dos que as utilizadas. Plantas que apresentaram

ação letal aos ovos ou larvas no presente estudo

necessitam de estudos mais aprofundados no que

diz respeito à identificação dos componentes

ativos presentes.

Com base nos resultados apresentados, os

extratos vegetais selecionados oferecem uma

oportunidade para a busca de novos compostos

com atividade anti-helmíntica. No entanto,

estudos mais detalhados são necessários para

avaliar os componentes ativos e os mecanismos

de ação dos extratos. Além disso, determinar

uma curva dose-resposta, avaliação dos efeitos in

vivo e toxicidade é necessário para validar seu

uso como uma alternativa terapêutica e pode

oferecer novas oportunidades de controle efetivo

e econômico das verminoses em ovinos.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos ao CNPq pela bolsa PIBIC de

MPC, à Fapesp pelo auxílio 2008/58706-8, à

CAPES e à Universidade Paulista pelo apoio.

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