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© Francisco Carrapiço, Biologia Celular Práticas 2006/7 1 PLASTOS Breve Introdução Histórica Os plastos, nomeadamente os cloroplastos, foram descritos pela primeira vez por Antoni van Leeuwenhoek (1632-1723) numa carta datada de 13 de Julho de 1685 relatando as suas observações: "I have depicted the leaves at such a magnitude that you can see the globules ("tiny spots of different size") that lay within them. Actually, there are much more of these spots than I could depict in the drawing; they are much smaller and not given in the right proportion. After cutting the leaf, those thin globules showed the very beautiful lightgreen color my eyes have ever seen. Some of them were darkgreen and their color were the black color of wax alike. Fig. BE is the part of the stem and the radix within which only very few green globules could be observed" In (http://www.euronet.nl/users/warnar/leeuwenhoek.html) Desenhos efectuados por Antoni van Leeuwenhoek relativos à observação de cloroplastos em folhas de plátano (Acer platanoides) (http://www.euronet.nl/users/warnar/leeuwenhoek.html) Mas foi apenas em 1883 que Andreas Schimper (1856-1901) introduz o termo cloroplasto, defendendo que os mesmos proliferavam através divisão, sugerindo igualmente a sua origem simbiótica: “If it can be conclusively confirmed that plastids do not arise de novo in egg cells, the relationship between plastids and the organisms within which they are contained would be somewhat reminiscent of a symbiosis. Green plants may in fact owe their origin to the unification of a colourless organism with one uniformly tinged with chlorophyll”. In (Schimper, A. (1885) "Untersuchungen über die Chlorophyllkörner und die ihnen homologen Gebilde," Jahrbücher für wissenschaftliche Botanik, 16: 1-247, 202.) Ulteriormente, em 1905, Constantin Merezhkowsky (1855-1921) publica o artigo “Uber Natur und Ursprung der Chromatophen im Pflanzenreich” (Sobre a Natureza e Origem dos Cromatóforos no Reino Vegetal) onde, pela primeira vez, argumentos científicos coerentes são apresentados no sentido de que os plastos teriam tido origem a partir de cianobactérias de vida livre. (Merezhkowsky, C. (1905). Uber Natur und Ursprung der Chromatophoren im Pflanzenreiche. Biol. Centralbl. 25: 593-604, 689-691) Em 1967, Lynn Margulis (1938-) publica na revista Journal of Theoretical Biology o artigo “On the Origin of Mitosing Cells”. Neste artigo, é apresentada uma teoria da origem da descontinuidade entre células procarióticas e eucarióticas. Mitocôndrias, corpos basais dos flagelos e cloroplastos são considerados terem derivado de células com vida livre, sendo a célula eucariótica vista como o resultado da evolução de simbioses primitivas. Este trabalho veio a constituir a base da teoria endossimbiótica sequencial. (Sagan, L. (1967). On the Origin of Mitosing Cells. J. Theor. Biol. 14: 225-274.)

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PLASTOS Breve Introdução Histórica Os plastos, nomeadamente os cloroplastos, foram descritos pela primeira vez por Antoni van Leeuwenhoek (1632-1723) numa carta datada de 13 de Julho de 1685 relatando as suas observações: "I have depicted the leaves at such a magnitude that you can see the globules ("tiny spots of different size") that lay within them. Actually, there are much more of these spots than I could depict in the drawing; they are much smaller and not given in the right proportion. After cutting the leaf, those thin globules showed the very beautiful lightgreen color my eyes have ever seen. Some of them were darkgreen and their color were the black color of wax alike. Fig. BE is the part of the stem and the radix within which only very few green globules could be observed" In (http://www.euronet.nl/users/warnar/leeuwenhoek.html)

Desenhos efectuados por Antoni van Leeuwenhoek relativos à observação de cloroplastos em folhas de plátano (Acer platanoides) (http://www.euronet.nl/users/warnar/leeuwenhoek.html) Mas foi apenas em 1883 que Andreas Schimper (1856-1901) introduz o termo cloroplasto, defendendo que os mesmos proliferavam através divisão, sugerindo igualmente a sua origem simbiótica: “If it can be conclusively confirmed that plastids do not arise de novo in egg cells, the relationship between plastids and the organisms within which they are contained would be somewhat reminiscent of a symbiosis. Green plants may in fact owe their origin to the unification of a colourless organism with one uniformly tinged with chlorophyll”. In (Schimper, A. (1885) "Untersuchungen über die Chlorophyllkörner und die ihnen homologen Gebilde," Jahrbücher für wissenschaftliche Botanik, 16: 1-247, 202.) Ulteriormente, em 1905, Constantin Merezhkowsky (1855-1921) publica o artigo “Uber Natur und Ursprung der Chromatophen im Pflanzenreich” (Sobre a Natureza e Origem dos Cromatóforos no Reino Vegetal) onde, pela primeira vez, argumentos científicos coerentes são apresentados no sentido de que os plastos teriam tido origem a partir de cianobactérias de vida livre. (Merezhkowsky, C. (1905). Uber Natur und Ursprung der Chromatophoren im

Pflanzenreiche. Biol. Centralbl. 25: 593-604, 689-691) Em 1967, Lynn Margulis (1938-) publica na revista Journal of Theoretical Biology o artigo “On the Origin of Mitosing Cells”. Neste artigo, é apresentada uma teoria da origem da descontinuidade entre células procarióticas e eucarióticas. Mitocôndrias, corpos basais dos flagelos e cloroplastos são considerados terem derivado de células com vida livre, sendo a célula eucariótica vista como o resultado da evolução de simbioses primitivas. Este trabalho veio a constituir a base da teoria endossimbiótica sequencial. (Sagan, L. (1967). On the Origin of Mitosing Cells. J. Theor. Biol. 14: 225-274.)

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Principais Tipos de Plastos Cloroplastos- plastos que apresentam coloração verde, devido à presença de pigmentos clorofilinos, particularmente clorofias a e b. Estão localizados nos órgãos clorofilinos da planta (folhas e caule). Não existem na epiderme, à excepção das células estomáticas. Apresentam geralmente sistema tilacoidal estruturado em grana e intergrana.

A B C Elodea canadensis: A- aspecto geral da planta (angiospérmica), B- fotografia de plastos de mesófilo da folha; C- plastos corados com solução de Lugol em que são visíveis os grãos de amido. Cromoplastos- plastos que contêm pigmentos corados – carotenóides (carotenos e xantofilas) – amarelos ou alaranjados e avermelhados. Apresentam desorganização total ou parcial do sistema tilacoidal. Os carotenos e as xantofilas estão localizados em gotículas lipídicas.

Pyracantha sp.: cromoplastos observados em células do fruto. Amiloplastos- plastos que apresentam o estroma quase ou mesmo totalmente preenchido por amido. Estão localizados em células de caules subterrâneos (tuberculos) ou de raízes tuberculosas.

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Solanum tuberosum: amiloplastos observados em células do tuberculo (batata). Leucoplastos- plastos que não apresentam cor (não pigmentados). Estão localizados em células das raízes, bolbos, tuberculos ou na epiderme de órgãos aéreos – caules e folhas -. Frequentemente são visíveis localizados à volta do núcleo.

Tradescantia sp : leucoplastos observados em células da epiderme da face abaxial da folha. Note-se a disposição destes organitos à volta do núcleo. Cloroplastos – estrutura Nas plantas terrestres (musgos e plantas vasculares), este organito apresenta uma morfologia e estrutura características. Observado em microscopia óptica apresenta a forma de um pequeno disco lenticular, de 3 a 10 µm de diâmetro e 2 µm de espessura, de cor verde devido à presença de clorofila. Quando observado em microscopia electrónica, o cloroplasto caracteriza-se, pela existência de uma dupla membrana que constitui o invólucro cloroplastidial, o qual isola do citoplasma um espaço interior denominado estroma. Este invólucro é formado por duas membranas concêntricas - as membranas externa e interna - de 60 Å de espessura. Entre estas duas membranas existe um compartimento denominado espaço intermembranar com a espessura variável de 100 a 200 Å. No estroma é evidente a presença de membranas de 70 Å espessura que constituem sacos achatados - os tilacóides - os quais estão frequentemente agrupados e empilhados formando os grana (singular granum). Os tilacóides estão ligados entre si por uma rede de membranas - as lamelas estromáticas - as quais se estendem de um granum ao próximo. Além dos dois compartimentos

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anteriormente referidos, existe um terceiro que corresponde à cavidade limitada pelas membranas tilacoidais. Este compartimento tem a designação de espaço intratilacoidal. O estroma é constituído por uma substância fundamental finamente granular onde, além das membranas tilacóidais, existem diversas inclusões. Entre elas, as mais importantes são os plastoglóbulos (inclusões lipidicas ricas em plastoquinona), grãos de amido, ribossomas, diversas moléculas de RNA e fibrilhas de DNA agrupadas em diversos nucleóides. Este compartimento é igualmente rico em proteínas, das quais a grande maioria são enzimas, como é o caso da ribulose-1,5-difosfato carboxilase/oxigenase (RuBisCO). O DNA cloroplastidial é formado por uma molécula circular com duas cadeias de polinucleótidos complementares, apresentando um comprimento que varia entre os 43 e os 55 µm e com um peso molecular compreendido entre os 85 e os 110 milhões de Dalton. A presença de ácidos nucleicos e a existência de enzimas envolvidas na cópia e exploração da informação dos cloroplastos, confere a estes organitos características de semi-autonomia, idênticas às das mitocôndrias. Refira-se, no entanto, que o equipamento enzimático associado a cada genoma celular (nuclear, cloroplastidial e mitocondrial), assim como a informação existente em cada um desses genomas é diferente e específico.

A B A- Cloroplastos observados através de microscopia de contraste interferencial em protonema de Bryum capillare (musgo); B- Diagrama dum cloroplasto.

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Cloroplastos observados em microscopia electrónica de transmissão. Note-se a estrutura típica em grana e intergrana