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Palavras-chave: conselho de políticaspúblicas, criança, adolescente, participaçãopolítica, descentralização.

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Assistente Social.

Mestre em Desenvolvimento Regional,Universidade de Santa Cruz do Sul –UNISC/RS.

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Doutor em Ciência Política.

Professor do Depto. de Ciências Humanas,dos Programas de Pós-Graduação emDesenvolvimento Regional e de Direito daUniversidade de Santa Cruz do Sul –UNISC/RS.

�� This paper analyses the difficulties,

challenges and possibilities fordecentralization of public policies aimedat children and adolescents, focusing onthe action of the Municipal Council forChildren and Adolescents of Santa Cruzdo Sul, from 1990 to 2000. The councilincludes representatives of civil societyand of municipal and state governmentagencies. The analysis contemplates thetransformations in policies related tochildren and adolescents in Brazil sincethe Federal Constitution of 1988 and theenactment of the Statute for Children andAdolescents of 1990. The study revealsthat the main weaknesses and limitationsof the municipal council are associatednot only with outside variables (theeconomic, social and political context),but also with internal ones (legal factorsand the composition and operation of thecouncil).

Key words: public policy council,children, adolescent, political partici-pation, decentralization.

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particularmente aqueles previstos pelo Estatuto da Crian-ça e do Adolescente (ECA), os quais constituem uma for-ma de participação política relativamente recente no Bra-sil.1 A reflexão está apoiada num estudo de caso – o doConselho Municipal dos Direitos da Criação e do Adoles-cente do município de Santa Cruz do Sul, estado do RioGrande do Sul, nos anos de 1990 a 20002 .

Os conselhos de políticas públicas, entre outras for-mas, aparecem como uma forma de revitalização da polí-tica, diante do fracasso da política tradicional. A participa-ção alarga-se, entra na agenda social, através dos gruposque produzem e/ou buscam encaminhamentos mais ade-quados para tal agenda. Segundo Giddens (1994, p. 34),agentes individuais e coletivos, cientistas e pessoas co-muns, instituições, organizações e estruturas competemna construção da sociedade democrática.

O texto reflete as preocupações e indagações que osconselhos de direitos despertam e, sobretudo, a importân-cia desse espaço público para o desenvolvimento local eregional.

O desenvolvimento regional vem sendo afirmado comodiretriz central na estratégia dos governos nacional, esta-duais e municipais, na forma de potencialização da voca-ção local, estímulo aos investimentos nos sistemas locaisde produção, afirmação das culturas regionais, etc. Des-se modo, a análise das políticas públicas deve levar emconta as variadas características do ambiente local-regio-nal, mas articulando-as às características mais gerais dopaís e do mundo, considerando as profundas modifica-ções nos processos de trabalho, os hábitos de consumo,as inovações político-intitucionais, a crescente desigual-dade social, os processos de pobreza e exclusão social.Esses traços afetam a viabilidade de êxito das políticaspúblicas3 , particularmente aquelas voltadas ao “social”4

A aparição dos conselhos de políticas públicas se dáno contexto das importantes inovações ocorridas desde adécada de 1980, no país e no mundo, com a afirmação depráticas de descentralização e de participação da soci-edade civil nas decisões governamentais. Descentralizaçãoe participação constituem hoje princípios de ação apoia-dos pelos organismos internacionais e foram inscritos naConstituição de 1988 em grande parte como decorrênciada mobilização de influentes setores da sociedade civil.

A participação política dos cidadãos vem sendo afir-mada nas últimas décadas como condição indispensávelpara a construção de um regime democrático, com ênfa-se às iniciativas tomadas no plano local. Segundo Jacobi(1993, p. 26), como “um processo continuado da demo-cratização da vida municipal”.

Participação e descentralização são convergentes. Adescentralização carrega a possibilidade de ampliação doexercício dos direitos humanos, da autonomia dos gover-nos locais, de inclusão dos cidadãos na gestão pública, demelhor aplicação e distribuição dos escassos recursosexistentes e da ruptura dos padrões clientelísticos que his-toricamente dominam a ação estatal.

No caso das políticas da criança e do adolescente, adescentralização e participação popular estão assegura-das no seu marco fundamental, o ECA, que dá nova dire-ção às políticas voltadas à população infanto-juvenil e ori-enta a ação do conselho municipal, órgão deliberativo daspolíticas públicas do setor (PEREIRA, P. A., 1996). Inau-gura-se uma nova base ética em termos de legislação so-cial brasileira quando a Constituição Federal de 1988 as-sume no seu artigo 227, a prioridade absoluta para crian-ças e adolescentes (BRASIL, 1988).

O ECA representa um avanço não apenas pelo modode conceber a criança e o adolescente, mas pela proposi-ção abrangente de atenção a esse segmento da popula-ção, pelo reordenamento político-institucional proposto e,principalmente, porque traz a sociedade civil para a dis-cussão, decisão e controle das políticas de atenção à cri-ança e ao adolescente.

A área da criança e do adolescente não é apenas umsetor entre outros – ela atravessa todas as políticas e áre-as de atuação governamental e não-governamental, intro-duzindo espaços de ação e de luta no interior do fazerpúblico. Nesse exercício, o controle social é tarefa da so-ciedade, mas em sinergia com a ação do Estado, neces-sária para viabilizar a atenção aos direitos sociais.

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Por muito tempo, a política social da área no Brasil foiresponsabilidade assumida pela Igreja, através das santascasas de misericórdia e outros órgãos, e pelas famíliasricas, enquanto o Estado desresponsabilizava-se pela ques-tão social e investia em outros setores públicos, conside-rados mais importantes. Costa (1991) destaca que as ques-tões relativas à criança pobre tornaram-se uma preocu-pação pública na década de 1920, sendo que em 1927 oentão festejado juiz de menores Mello Matos elabora oprimeiro código legal referente aos menores, mas a inter-venção do Estado torna-se relevante apenas a partir dosanos 1930 (RIZZINI, 1997).

Nos anos 1940 origina-se um aparato institucional comoestratégia da política pública em âmbito nacional, atravésde programas e órgãos como o Serviço de Assistência aoMenor (SAM), destinado a combater a criminalidade in-fantil, e a Legião Brasileira de Assistência (LBA), paraassistência a mães e crianças na primeira infância.

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Depois da Constituição de 1946, com o fim do EstadoNovo, a sociedade civil recupera-se lentamente das res-trições impostas pelo regime autoritário, buscando resga-tar as conquistas obtidas anteriormente, principalmente,através do movimento da classe trabalhadora.

Na década de 1960, a história registra o retorno doautoritarismo, que centraliza o poder nas forças militares, coma repressão dos movimentos sociais, organizações partidári-as e classistas. A política do regime aprofunda o centralismodo Estado, através da criação de organismos específicos comoa FUNABEM (1964) e as FEBEMs (1969), que passam adefinir e executar as políticas públicas com base no Códigode Menores (1979). O Código de Menores, oriundo do regi-me militar, estrutura-se na “doutrina da situação irregular”,assentada na lógica política vigente, quando a produção dodireito é alimentada pela ideologia da compaixão-repressão.Esta lei submeteu as crianças e adolescentes em situação depobreza e risco à tutela do juiz. De maneira geral, foi formu-lada em bases centralizadoras e verticalizadas.

A pressão por mudanças manifesta-se no final dos anos1970, através da Igreja Católica e de movimentos sociais.O processo de abertura política na década de 1980 possi-bilitou a emergência de um novo enfoque no ordenamentodas políticas de atendimento às crianças e aos adolescen-tes, a abordagem socioeducativa. Este processo teve suaconcretização legislativa com a inserção do artigo 227 naConstituição Brasileira de 1988 e a sua expressa regula-mentação através do Estatuto da Criança e do Adoles-cente, em 1990. O novo estatuto apresenta um corpo dou-trinário completamente inovador, conhecido como dou-trina da proteção integral da infância, baseado em pre-ceitos internacionais aprovados pela Organização dasNações Unidas (ONU), em 1959.

A partir da promulga-ção da Constituição, ossetores e as entidades dasociedade civil envolvi-dos na defesa da crian-ça e do adolescente or-ganizaram-se no FórumNacional Permanente deEntidades Não-Gover-namentais de Defesados Direitos da Criançae do Adolescente (Fórum– DCA). O trabalho dasorganizações reunidasno Fórum – DCA con-tribuiu para a aprovaçãodo ECA nas duas casaslegislativas federais sem voto contra. A mobilização dasociedade civil foi decisiva para a legalização da sua par-ticipação na definição dos rumos das políticas públicas aserem adotadas doravante.

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A previsão da municipalização de uma série de servi-ços públicos, tratados como políticas públicas pela Consti-tuição de 1988, abrange o atendimento das crianças e dosadolescentes. Entendeu-se no processo constituinte que adescentralização administrativa é fundada na necessida-de de um controle social mais efetivo das políticas públi-cas, possível de maneira adequada em nível local.

Segundo Liberati e Cyrino (1993, p. 64),

[...] municipalizar significa trazer para a esfe-ra do Município determinadas decisões políti-cas e sua execução, bem como de programas eações, anteriormente centralizadas no poderfederal, contando com a participação de seto-res da sociedade organizada.

Desta forma, fica reconhecida a competência e a au-tonomia do poder municipal para resolver os assuntos deinteresse local. Diante desse pressuposto legal, entende-se que a sociedade não é mais mera expectadora e simativamente inserida na formulação, execução e controledas ações governamentais na área social.

No município de Santa Cruz do Sul, na década de 1980havia somente uma instituição da sociedade civil paraabrigamento de crianças e adolescentes abandonados ouvítimas de maus tratos, a Copame, que funcionava em situ-ação precária. A mobilização de um grupo de cidadãos e oapoio do poder público resultou em uma nova estrutura físi-ca e de recursos humanos, adequados a atender aoreordenamento institucional preconizado pelo ECA.

Além da Copame fo-ram criados o Centro So-cial da Assembléia deDeus, o Abrigo Mascu-lino – um projeto queteve o incentivo doJuizado Regional da In-fância e Juventude –, oAlbergue Municipal, oAbrigo Feminino e no-vas creches, a maiorparte de responsabilida-de do Executivo munici-pal. Iniciou-se uma novafase de implementaçãode políticas públicas,com maior iniciativa do

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cia e Juventude e da Promotoria de Infância e Juven-tude de Santa Cruz do Sul, situação comum em outroslocais: “Em muitos dos municípios, a atuação dos juizese/ou promotores públicos foi determinante para a cria-ção de Conselhos Municipais e Tutelares” (PILOTTI;RIZZINI, 1995, p. 329).

O COMDICA de Santa Cruz do Sul foi pioneiro naRegião do Vale do Rio Pardo e o quarto no Rio Grandedo Sul. Sua precocidade trouxe alguns entraves, tantodo ponto de vista da legislação como da aplicação prá-tica. Essas dificuldades levantadas através da pesqui-sa, não são uma exclusividade do órgão local e certa-mente podem ser encontradas em outros dos Conse-lhos da região, principalmente aqueles que tomaram alei deste como base.

Um elemento contextual importante no caso de San-ta Cruz do Sul foi o explosivo processo migratório nadécada de 1990, com grande impacto sobre os bens eserviços básicos, sobretudo a rede de saneamento, es-colas, creches, moradias, desemprego, área de lazer esaúde. O aumento populacional pode ser verificado peloaumento do número de bairros da cidade. Na décadade 1990, surgiram diversos novos bairros como: VilaNova,Vila Verde, Vila Harmonia, São Canisio, Corre-dor Rauber, Cintea e Loteamento Beckemkamp(WINCK, 2000). Em outros, houve uma grande expan-são, como no caso do Imigrante, Glória, Menino Deus,Margarida-Aurora, Belvedere, Bom Jesus, Santo An-tônio e Esmeralda.

O incremento da população não pode ser tomadocomo o condicionante principal das políticas públicasrelativas à criança e ao adolescente. Em tese, o muni-cípio de Santa Cruz do Sul, pela sua constituição social,econômica, política e cultural, apresenta um contextofavorável para desenvolvimento de políticas públicas.É o município mais rico da região do Vale do Rio Par-do. Está situado na região da industrialização ebeneficiamento do fumo, fator responsável pela privi-legiada posição que o município ocupa na região do Valedo Rio Pardo (71% do ICMS arrecadado) e no estado(sexta posição em arrecadação do ICMS). No entanto,a grande desigualdade social e as carências vividas poruma grande parcela de seus habitantes têm graves con-seqüências e criam enormes dificuldades para aimplementação de políticas públicas eficazes. As vári-as formas de violência (social, intrafamiliar, sexual,institucional) a que são submetidos crianças e adoles-centes são expostas diariamente no Conselho Tutelar,na Delegacia de Polícia, na Promotoria da Infância eda Juventude, no Juizado Regional da Infância e Ju-ventude e nas notícias da imprensa local. Esta situaçãoé a prova da violação dos direitos preconizados peloEstatuto e o flagrante de inexistência de proteção aossujeitos de direitos (FALEIROS, 1995).

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Definido nos artigos 88, 214 e 260 do ECA, o Conse-lho dos Direitos da Criança e do Adolescente é um órgãode caráter deliberativo, formulador das políticas públicas,controlador das ações relativas à criança e ao adolescen-te e gestor do Fundo. O Conselho tem como característi-ca definidora a paridade na sua composição entre o poderpúblico e a sociedade civil organizada. Politicamente re-presenta um movimento de ampliação da cidadania, aoinscrever as crianças e adolescentes como sujeitos nocampo do direito.

O Estatuto confere aos conselhos municipais a respon-sabilidade de viabilizar uma política pública para o segmen-to criança e adolescente, no âmbito municipal, o que signifi-ca propor projetos nesta área, deliberar e avaliar estas rea-lizações. Para a concretização de tais proposições é neces-sário que no local haja condições objetivas – organizaçõessociais voltadas ao atendimento da criança e do adolescen-te e representantes governamentais dispostos a compor oConselho – e subjetivas – que os representantes estejamcônscios e capacitados a assumir as atribuições.

A partir da instalação do COMDICA no município, todoe qualquer projeto, que implique no atendimento dos direi-tos da criança e/ou do adolescente necessita de SUA apro-vação para ser executado. De outra forma, poderá ocor-rer inconstitucionalidade formal (BRASIL, 1990, art. 90 e91). Na prática, os projetos para a população-alvo do ECApodem surgir de inúmeras fontes, mas devem ser aprova-dos pelo Conselho para sua execução. Esta forma de fun-cionamento do órgão é a efetivação do caráter deliberativo,determinado pela lei. As entidades e os programas de aten-dimento voltados à criança e ao adolescente devem estarcadastrados no Conselho, o qual tem o poder de concor-dar ou não com o seu funcionamento, bem como de con-trolar a execução dos seus programas.

Outra questão importante quanto à competência doConselho é o artigo 95 do ECA, que declara que as enti-dades que planejam e executam programas de proteção esocioeducativos destinados a crianças e adolescentes “se-rão fiscalizadas pelo Judiciário, pelo Ministério Público epelos Conselhos Tutelares”. Desta maneira, propositada-mente a legislação exclui o Conselho dessa atribuição.

Pontes Júnior (1993, p. 44-45) aponta algumas com-petências administrativas delegadas ao Conselho como ade presidir o processo de escolha dos membros do Con-selho Tutelar (ECA, art.139). Esta responsabilidade é de-corrente das diretrizes da Constituição que determina adescentralização político-administrativa no atendimento dosdireitos das crianças e dos adolescentes, “cabendo a co-ordenação e as normas gerais à esfera federal e a execu-ção dos respectivos programas às esferas estadual e mu-nicipal...” (BRASIL, 1988, art. 204, I). E o Estatuto, por

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sua vez, salienta que a municipalização constitui diretrizda política de atendimento (ECA, art.88, I). O presidentedo processo de escolha dos conselheiros tutelares é oConselho Municipal de Direitos, o qual deve estabeleceralgumas normas para tal procedimento, obedecendo asregras já estabelecidas pelos artigos 131 a 140 do ECA.

Dentro da sua competência administrativa, o Conselhoelabora seu Regimento Interno. Este, como todo ato admi-nistrativo, não pode exceder os limites da lei. Deve con-templar os mecanismos que garantem o pleno funciona-mento do Conselho. As instâncias do Conselho são: um Ple-nário, composto por todos os conselheiros, e uma Secreta-ria Executiva. Esta deve ter suas atribuições definidas noregimento interno e acompanhar a execução das delibera-ções daquele, e também servir de apoio administrativo àssuas atividades. Todas estas atividades, mais a gestão doFundo Municipal, através de tesoureiro e Conselho Fiscal,são competências administrativas, salientadas por PontesJúnior (1993) e explicitadas no Manual editado pelo Conse-lho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente-CEDICA (RIO GRANDE DO SUL, 1999).

A lógica constitucional e legal do Conselho é possibili-tar a participação ativa dos organismos sociais atuantesna defesa da criança e do adolescente, compartilhandocom os órgãos governamentais a responsabilidade deprotegê-los e zelar pelo seu desenvolvimento integral. Aexperiência, acumulada ao longo de mais de uma década,mostra que, para que a lei se torne um verdadeiro instru-mento de defesa da vida social, é necessário avançar noprocesso de organização social, na esfera municipal, paraa efetivação das ações dos Conselhos Municipais dosDireitos da Criança e do Adolescente, dos Conselhos Tu-telares e Fundos Municipais.

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A criação do Conselho Municipal é atribuição do Exe-cutivo Municipal, o qual elabora o projeto de lei e o encami-nha à Câmara de Vereadores para aprovação (BRASIL,1990, art. 88, parágrafo II). Nesse momento, a sociedadecivil, as organizações, a Promotoria da Infância e Juventu-de, o Juizado da Infância e da Juventude podem exercer aposição de motivar o Executivo para esta iniciativa legislativae também participar da elaboração do projeto, juntamentecom os segmentos organizados da sociedade.

Em Santa Cruz do Sul, o COMDICA foi criado logoapós a promulgação do ECA, através de Lei nº 2.333, de 3de dezembro de 1990, sem contar com a desejável partici-pação comunitária. A mesma lei criou o Fundo Municipal eo Conselho Tutelar de Santa Cruz do Sul. Uma rápida aná-lise da lei à luz da Constituição e do ECA mostra que hávários dispositivos que contrariam a lei maior, problemasque se refletem também no Estatuto do Conselho.

O artigo 5 define o COMDICA como “órgãodeliberativo e controlador das ações em todos os níveis”.Liberati e Cyrino (1998, p. 98) explicam a esse respeito oseguinte:

Considerando que o Conselho dos Direitos éórgão de deliberação de políticas de atendimentoe que tem a competência para inscrever os pro-gramas das entidades, conclui-se que tantoexercerá controle prévio quanto posterior (fis-calização) sobre tais programas. Até mesmo asalterações posteriores dos programas deverãoser feitas perante o Conselho.

As competências monitórias do Conselho são aquelasque visam a interferência no modo de atuação dos órgãosgovernamentais e não governamentais responsáveis peloatendimento direto da criança e do adolescente no âmbitomunicipal (BRASIL, 1990, art 90, parágrafo único).

No artigo 6 da lei municipal estão definidas outras com-petências do Conselho: formular a política municipal; de-finir as ações prioritárias, a captação e a aplicação derecursos; zelar pela execução dessa política; registrar asONGs de atendimento infanto-juvenil que mantenham pro-gramas classificados como de proteção ou socio-educativos.

A determinação de que as organizações e os progra-mas registrados no Conselho de Direitos sejam comuni-cados ao Conselho Tutelar e à autoridade judiciária darespectiva localidade – no caso o Juizado Regional da In-fância e da Juventude – não vem sendo cumprida. Até aconclusão da presente pesquisa, o COMDICA não ado-tou a sistemática de informar os órgãos acima referidossobre o registro das ONGs e dos programas.

O último parágrafo do artigo 6 da lei municipal deter-mina que a competência da administração do Fundo Mu-nicipal é de responsabilidade do COMDICA (BRASIL,1990, art. 88, parágrafo IV). Em realidade, o Fundo estávinculado à administração do governo municipal e vemsendo controlado pelo mesmo setor que administra as fi-nanças municipais, o que contraria a legislação federal.

O artigo 7 da lei em tela estabelece que o COMDICAé composto por 10 órgãos governamentais e 13 ONGs –relacionadas na própria lei –, as quais indicam um mem-bro titular com direito a voto e um suplente.5 O númerodesigual de organizações evidencia o desrespeito à exi-gência de paridade estabelecida pela lei federal. Além disso,o corpo da lei não deveria relacionar o nome das organi-zações não-governamentais, cuja ação deve ser autôno-ma e para permitir a rotatividade e flexibilidade própria deum conselho.

As 13 ONGs relacionadas na lei municipal (art.7) paracompor o COMDICA estão situadas na cidade de SantaCruz do Sul, sendo uma de esfera federal, quatro de es-

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fera estadual e as demais da municipal. Todas atuamcom a população pertinente, embora, algumas não ex-clusivamente com crianças e adolescentes. Uma novaredação do artigo 7 foi elaborada em 1992, pela Lei n.2.403, de 07/07/1992, dispondo que o Conselho passa aser composto pelos órgãos anteriormente relacionados(10 órgãos governamentais e 13 ONGs) e os que vierema ser aprovados pelo COMDICA. Em função disso, noano de 2002 o Conselho era composto por 32 organiza-ções – 16 governamentais e 16 não-governamentais –respeitando a paridade determinada pelo ECA. Mas, orevezamento das representantes da sociedade civil nãovem ocorrendo e a maioria das organizações com as-sento determinado pela lei municipal de 1990 permane-cem no Conselho desde sua criação.

Com relação ao número de conselheiros, existe umaorientação do CEDICA para que este número não sejademasiado grande, para evitar-se a dispersão e proble-mas na operacionalização e funcionamento.

O artigo 18 da lei municipal determina que os mem-bros do Conselho Tutelar serão eleitos pelo COMDICA.O processo eleitoral, conforme o artigo 19, será presididopor um juiz eleitoral e fiscalizado pelo Ministério Público.Mais tarde, a lei municipal n. 3.092, de 22/10/1997, atri-buiu ao artigo nova redação, excluindo o juiz eleitoral, es-tabelecendo o COMDICA como responsável pelas elei-ções, com a fiscalização do Ministério Público. No entan-to, segundo prevê o ECA, ao Conselho cabe tão somentea responsabilidade pelo processo de escolha dos conse-lheiros tutelares e não a definição da sua composição.Para atender a legislação federal, a opção é a eleiçãodireta dos conselheiros através de escolha popular – comoacontece em inúmeros municípios – ou a eleição feita porum fórum de representantes das organizações de crian-ças e adolescentes. A escolha dos membros do ConselhoTutelar de Santa Cruz do Sul, até a presente data, é feitapelos membros do COMDICA, o que fere os procedi-mentos democráticos e necessita de ampla discussão paraque o processo avance.

No seu conjunto, a lei municipal apresenta aspectossatisfatórios e aspectos superados, levando em conta quefoi elaborada rapidamente e sem a participação da socie-dade civil, tendo entrado em vigor em dezembro do mes-mo ano da aprovação do ECA (1990), quando a grandemaioria dos municípios gaúchos não tinham ainda nenhumconselho de direitos.

Quanto ao regramento interno do COMDICA, o Es-tatuto, com 29 artigos, foi aprovado em 1991 e devida-mente registrado no Cartório de Registros Especiais. Estedocumento determina a abrangência de atuação do ór-gão bem como denominação, sede, duração, fins, com-posição, competências, funcionamento da diretoria, daassembléia geral, do conselho fiscal e dos comitês quefazem parte do Conselho.

Durante dois anos, enquanto realizou esta pesquisa, aautora participou das reuniões do COMDICA e nuncahouve a manifestação do Conselho Fiscal, o qual inexistiunesse tempo. Algumas comissões foram formadas, massomente quatro tiveram funcionamento efetivo: a que re-alizou a Conferência Municipal (2001), a de estudos so-bre as medidas socioeducativas (liberdade assistida e pres-tação de serviços comunitários), a de eleições ecapacitação para conselheiros tutelares. Na formação decomissões para os trabalhos acima citados, alguns conse-lheiros se apresentam voluntariamente, geralmente osmesmos, enquanto a maioria constituía presença numéri-ca na assembléia.

De modo geral pode-se dizer que o Estatuto respeita alei municipal e carrega os mesmos entraves e limitaçõesdaquela. É necessária uma reformulação tanto da lei quantodo Estatuto, particularmente no que tange à indicação dasorganizações que compõem o Conselho, à ausência deparidade e ao fato dos membros do Conselho Tutelar se-rem eleitos pelo COMDICA.

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A análise dos aspectos legais na prática cotidiana doCOMDICA, apresentada antes, apoiou-se na observa-ção sistemática da autora, na condição de participantedas reuniões do Conselho por dois anos (2000 a 2002).Considerando as limitações do olhar subjetivo individual,procurou-se também trazer o olhar dos conselheiros, oque foi feito através da aplicação de 78 questionários e10 entrevistas.6

Para as 10 entrevistas, foram selecionados cinco re-presentantes de órgãos governamentais e cinco de orga-nizações não-governamentais. Cada par foi membro deuma gestão entre os anos de 1990 e 2000. Entre ospesquisados, 60,3% não participam mais do Conselho,enquanto 39,7% ainda são conselheiros.

Alguns dos principais resultados obtidos estão siste-matizados abaixo e são indicativos das dificuldades e con-quistas do COMDICA de Santa Cruz do Sul ao longo dasua primeira década de existência.

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Quanto ao respeito pela paridade no Conselho, há di-ferentes observações. Uma das entrevistadas, represen-tante de uma ONG, afirma que

[...] durante esses onze, doze anos deCOMDICA, nem sempre foi respeitada (a pari-dade), porque, inclusive hoje, nós temos proble-

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mas. Estamos com um desequilíbrio na questãoda paridade [...] as entidades não-governamen-tais estão extremamente envolvidas com oCOMDICA [...] nós temos tido problema nas go-vernamentais [...].

No entanto, existe genericamente uma intenção de res-peito à paridade, mantendo o mesmo número de represen-tantes governamentais e não-governamentais na composi-ção do Conselho, fato que demonstra um avanço, uma tenta-tiva de superar a prescrição estreita da lei municipal de 1990.

O entendimento dos conselheiros pesquisados acercado processo de definição das organizações que indica osintegrantes do COMDICA é largamente contrário à le-gislação municipal. Para 20% dos conselheirospesquisados, ela deve ser feita pelo próprio COMDICA,para 12,5% deve ser feita por lei municipal, enquanto para66,3% deve ser feita por um colegiado das próprias orga-nizações existentes no município. É uma posição que me-rece atenção, considerando que atualmente os conselhei-ros são indicados por suas organizações. O sentido dosconselhos de políticas públicas é o de funcionarem comoum colegiado, superando a centralização das decisões.Neste sentido, está colocado aos conselheiros o desafiode repensar as práticas vigentes no COMDICA ereestudar diversos entraves da lei municipal.

No quesito do prazo de permanência do conselheirono COMDICA, 42,9% defendem que a participação sejasem prazo determinado, 36,4% preferem o prazo de umagestão do COMDICA e 20,7% optam por outro prazo.Esses dados mostram que boa parte dos conselheiros con-corda com o que se tornou “tradição” na primeira décadade existência do Conselho. Por outro lado, mais da meta-de dos conselheiros pesquisados (51,7%) entende que devehaver um prazo máximo para a participação dos conse-lheiros, concordando com a rotatividade dos integrantes,

A composição é importante variável de estudo quandoo tema tem como objetivo conhecer o funcionamento deum Conselho de Direitos. Na composição analisa-se quemparticipa do Conselho. São verificadas as formas de com-posição previstas em lei bem como os mecanismos de sele-ção dos membros para o Conselho. A paridade doCOMDICA, embora nem sempre respeitada, conformerevelação dos pesquisados, hoje está na agenda dos conse-lheiros como ponto fundamental para seu funcionamento.

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A escolaridade dos 78 conselheiros pesquisados é a se-guinte: 26 membros possuem curso superior e pós-gradua-ção; 31, curso superior; 9, curso superior incompleto; e 12,ensino médio completo. Cabe ressaltar que mais que esco-laridade, o conselheiro deve ter domínio das políticas públi-cas. É absolutamente fundamental que tenha domínio téc-

nico a respeito das questões ligadas à criança e ao adoles-cente, à educação, assistência social, saúde e a outros te-mas pertinentes, incluindo as questões orçamentárias.

Quanto à formação prévia dos conselheiros ao iniciarsua participação no Conselho 52,6% afirmaram que nãotinham nenhum conhecimento das atribuições; 30,8% in-formaram que tinham formação média; 10,3% revelaramque sua formação era baixa e 6,4% disseram possuir altaformação. Isso significa que mais da metade iniciou suasatividades de conselheiro desconhecendo as finalidadesdo Conselho, sinalizando uma baixa qualificação prévia.

Uma entrevistada, representante de ONG, responden-do sobre os conhecimentos que tinha quando iniciou suaparticipação no COMDICA, faz uma afirmaçãoesclarecedora: “Nenhuma. Nenhuma mesmo. A gente foimais por vontade de fazer com que minha classe [...] seenvolvesse mais com os problemas da comunidade”.

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A participação pessoal do conselheiro nas reuniões,através de opiniões, questionamentos e outras formas foiconsiderada muito alta por 7,7% dos pesquisados; alta por30,8%; média por 46,2%; e baixa por 10,3%. A maioriados membros se faz presente nas reuniões.

Uma entrevistada, representante não-governamen-tal, fez a seguinte afirmação frente à questão da par-ticipação:

[...] a gente, que está participando das reuni-ões, vê que é feito alguma coisa, só que às ve-zes me sinto bastante inibida também, porque láeu represento uma instituição.

A dinâmica das reuniões do COMDICA foi avaliadapelos conselheiros nos questionários com base em três ca-tegorias: “participativas” teve a concordância de 37,2%,sugerindo que há um ambiente em que todos os membrosdispõem das mesmas oportunidades para expor suas opini-ões; “centralizadas por alguns conselheiros” foi a opção de34,9%, considerando que poucos membros de fato valem-se do direito do uso da palavra nas reuniões, contrapondo-seao silêncio da maioria; “centralizadas pelo presidente” foiassinalado por 27,9%, indicando que o presidente conduz asreuniões, inibe a maior parte dos demais conselheiros, toma apalavra a maior parte do tempo e obstaculiza a comunicaçãoentre os demais membros do grupo.

Esse problema não deve ser atribuído somente ao pre-sidente, mas ao conjunto dos conselheiros e à qualifica-ção desses para o seu posto. A falta de capacitação e deconhecimento da função também é um forte inibidor daparticipação efetiva nas discussões. Por outro lado, ofato dos conselheiros perceberem desta forma as reuni-ões do Conselho sinaliza que boa parte do grupo reco-

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nhece a importância dopapel democratizadordas relações e das deci-sões no campo das polí-ticas públicas.

A organização e ofuncionamento do pró-prio Conselho, inclusive arevisão do seu Regimen-to Interno, são atividadesinternas observadas atra-vés da variável compe-tência de autogestão.Quanto ao funcionamen-to do COMDICA, ob-serva-se que a partici-pação dos membros de modo geral deixa a desejar.A cen-tralização pode ser um dos elementos que contribui paraisso, juntamente com a baixa capacitação dos membros.

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Perguntados sobre a quem cabe estabelecer as diretri-zes das políticas de atendimento à criança e ao adolescenteno município, os resultados do questionário revelam que 6,1%entendem que a responsabilidade cabe ao governo munici-pal, 12,2% aos poderes públicos (governo, legislativo e judi-ciário), 15,9% ao COMDICA, 24,4% ao COMDICA e àsociedade civil e 32,9% ao COMDICA e ao governo.

Essas respostas externam que a maior parte dos con-selheiros não tem clareza sobre o poder legalmente con-ferido aos conselhos. Apenas 15,9% dos conselheirosindicou a opção afinada com o ECA: o COMDICA é oresponsável pela definição das políticas públicas muni-cipais da área da criança e do adolescente, e ele é cons-tituído por representantes do poder público e da socie-dade civil. Para que tenha legitimidade e força, unindoos recursos estatais com as energias da sociedade ci-vil, o ECA prevê que o Conselho deve ser paritário, nalinha da democracia participativa.

As entrevistas mostram aspectos relacionados ao en-tendimento que os conselheiros têm sobre as dificuldadesdo COMDICA formular as políticas públicas para a cri-ança e o adolescente no município. Outra entrevistada,representante governamental, indica dificuldades do Con-selho quanto à deliberação das políticas públicas:

Não, sempre não, não dá para dizer sempre. Amaioria dos assuntos foi deliberada, mas existi-am alguns assuntos que vinham sobre imposi-ções da legislação.

Baseado no pressuposto de que o COMDICA apre-senta dificuldades para estabelecer as diretrizes da políti-

ca de atendimento à cri-ança e ao adolescente nomunicípio, perguntou-seno questionário quem defato estabelece as políti-cas da criança e do ado-lescente. Para 33,8% ogoverno municipal esta-belece as políticas muni-cipais, 18,2% dizem nãosaber, 15,6% apontam oCOMDICA como o ór-gão que estabelece as di-retrizes e apenas, 9,1%consideram que não hápolítica definida.

Implícita na maior parte das respostas está a idéia deque existem de fato políticas públicas da criança e do ado-lescente em Santa Cruz do Sul. Uma minoria de 9,1%,todavia, entende que o que existe atualmente não podeser chamado propriamente de políticas públicas. Uma re-presentante de ONG, na entrevista, ao avaliar quem esta-belece as políticas, diz algo interessante:

Não, eu acho que nesse ponto ainda o nossoConselho está deixando a desejar. Ainda nãonos posicionamos dentro da nossa função. Aresponsabilidade é do Conselho e o Conselhotem feito assim, às vezes, olhos grossos, às ve-zes se omitindo. Nós ainda não temos uma polí-tica de atendimento à criança e ao adolescenteelaborada pelo Conselho Municipal do Direitoda Criança e do Adolescente.

Um Conselho precisa adotar uma política, o que supõeum planejamento bem elaborado. O planejamento e a pro-posição de uma política especial envolvem prazos, os quaisdevem ser perseguidos para que se possam alcançar re-sultados. A necessidade de interação entre as políticaspúblicas é um dos principais aspectos enfatizados hoje pelaliteratura, que possibilita maior eficiência e eficácia, evi-tando duplicação e desencontro de ações.

Diante disso, as competências decisórias relacionadasà formulação de políticas públicas que visem a promoçãodos direitos e garantias infanto-juvenis no município perma-necem no plano formal, sem eficácia real. Ou seja, o Conse-lho ainda não atingiu o nível de formulação de um verdadeiroplano, com previsão das políticas a serem implementadas edas verbas necessárias para execução. O COMDICA gereo Fundo e deve definir regras para o uso dos recursos arre-cadados. Nestes campos de ação, ele mostra-se concreta-mente limitado na sua atuação, desde a sua criação.

As competências monitórias, que visam a interfe-rência no modo de atuação dos órgãos governamentais

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e não-governamentais, responsáveis pelo atendimentodireto do segmento, são as mais aplicadas, já que oCOMDICA cadastrou as entidades situadas no muni-cípio e registrou os programas de atendimento propos-tos pelas mesmas. O controle dos projetos aprovadospelo Conselho pode ser realizado através do acompa-nhamento da execução dos mesmos, bem como da re-quisição da contabilidade dos recursos. Isto significaque a entidade que recebe verbas públicas deve efetu-ar a contabilidade e a prestação de contas dos recur-sos de forma clara, trazendo as informações para oConselho por escrito.

As competências executivas dizem respeito à práticaadministrativa de gerenciamento do Fundo Municipal e dacoordenação das eleições para o Conselho Tutelar. Atual-mente, o Conselho Fiscal e o tesoureiro não se fazem pre-sentes nas reuniões, não havendo informações sobre osvalores do Fundo e onde foram aplicados. A coordenaçãonão controla o fundo, nem presta conta aos demais con-selheiros, os quais aceitam passivamente tal situação. Hádificuldades no Conselho para realizar plenamente suascompetências, porque faltam recursos e autonomia.

O Conselho não conseguiu assumir o controle do Fun-do, deixando tudo por conta da secretaria municipal queadministra os recursos, fato que aponta a necessidadede constituição do Conselho Fiscal e de um tesoureirocom capacitação para tal função. Além disso, para res-peitar a lei federal, o Conselho deve deixar de eleger osconselheiros tutelares e tão somente coordenar o pro-cesso eleitoral.

As competências de autogestão, que são relativasao funcionamento do próprio Conselho, necessitam de ur-gente direcionamento, principalmente quanto à revisão doestatuto interno e à emissão e divulgação das decisões,através de Resoluções.

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Às interrogações, antes levantadas, foi acrescentadano questionário uma pergunta relativa à força políticaque atualmente o COMDICA detém. Os conselheirosque marcaram a resposta “sim” correspondem a 45,9 %dos questionados, ao passo que 28,4% negam a existên-cia de força política do Conselho, 14,9% assinalam quenão sabem e outros 10,8% reconhecem que é pouca aforça do Conselho. A insuficiente capacidade política doCOMDICA de elaborar e implementar as políticas dacriança e do adolescente no município é reconhecida,portanto, por mais da metade (54,1%) dos conselheirospesquisados. Um maior número (19) de representantesda sociedade civil acreditam na força política do Conse-lho, juntamente com os (15) representantes do governo,num total de 34 respostas, enquanto 40 dos pesquisados du-vidam da força política desse Conselho.

O reconhecimento da fragilidade política do Conselhopela maioria dos conselheiros aponta para duas possibili-dades. Uma, que o COMDICA não tem ou tem poucaautonomia diante do governo municipal. A outra, que éincapaz de cumprir sua função por limites mais amplosimpostos pela sociedade.

A análise desenvolvida nesse trabalho mostra que, di-ante das disposições democráticas do ECA e dos exem-plos de outros municípios e de outros conselhos, oCOMDICA de Santa Cruz do Sul tem, de fato, poucaforça política para cumprir com sua missão.

Há diversos indicativos de que a fragilidade política doCOMDICA tenha como contrapartida uma “prefeiturização”das políticas da área. Conselheiros pertencentes a ONGsmanifestam esse entendimento. A entrevista, de um repre-sentante não governamental, registra a seguinte opinião:

Desde que eu estou participando, esta é a ter-ceira diretoria e sempre, interessante, a direto-ria [...] era, a gente sabia que era, das mesmascores políticas do governo municipal e entãomuita gente cuida mesmo do que fala.

Aquela parte dos conselheiros que defende a existên-cia da força política do Conselho provavelmente não pos-sui um entendimento claro das funções deste órgão e confiaque as limitadas ações que vêm sendo desenvolvidas sãode fato autênticas políticas públicas.

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A relação do COMDICA com o governo municipal foiavaliada no questionário através de uma pergunta quecontinha cinco alternativas: “independência”, “parceria”,“dependência”, “conflito” e “outra”. A alternativa “par-ceria” recebeu 37,5% das respostas, sugerindo a existên-cia de um relacionamento cooperativo entre o COMDICAe o governo municipal. A maioria, 52,5%, porém, assina-lou a opção “dependência” para definir esta relação, en-quanto 2,5% reconhecem uma relação de conflito, 3,8%não sabem determinar qual é a relação e 3,8% acreditamna independência do Conselho.

O percentual de 52,5% de conselheiros que entendehaver dependência do COMDICA em relação ao gover-no municipal é mais um elemento para reforçar a avalia-ção da “prefeiturização” das ações do Conselho. O cru-zamento dos dados mostra que um maior número (61,0%)de representantes das ONGs percebem essa relação dedependência. Muitos conselheiros governamentais talvezestejam tão habituados com tal situação que nem conse-guem ter uma visão diferente sobre a relação.

Nas entrevistas, a percepção da dependência apareceem vários momentos. Outra entrevistada, representante

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governamental, diante da constatação de que é comum opresidente do COMDICA ser alguém vinculado ao go-verno municipal, afirma: “eu acho que é negativo alguémdo governo ser o presidente, acho que fica muito‘prefeiturado’”.

O Conselho funciona porque a administração munici-pal empresta sua estrutura e conduz o processo indireta-mente através de seus representantes e diretamente pelainjeção de recursos nos projetos que lhe interessam, alémdaqueles para os quais proporciona contrapartida por te-rem recebido verba do governo estadual ou federal, fatorque cria dependência.

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Além de avaliar a atuação do COMDICA, procurou-se averiguar alguns aspectos sobre alternativas de qualifi-cação do trabalho desenvolvido.

Perguntou-se como oCOMDICA deve se re-lacionar com as organi-zações não representa-das no Conselho, comtrês alternativas. A pri-meira – “convidá-las aparticipar de reuniões” –foi a mais assinalada,com 43,8%. A segunda –“informar as organiza-ções sobre suas ações”– chegou a 19,1%. A ter-ceira – “esclarecimentosobre o processo de ha-bilitação aos projetosapoiados por recursospúblicos” – obteve umpercentual de 24,7%. Provavelmente a primeira alternati-va foi a mais assinalada pelos conselheiros, considerandoque a participação deles próprios no Conselho se resumeà presença em reuniões ordinárias. Poucos membrosmostram-se disponíveis para desenvolver alguma tarefafora do seu expediente de trabalho ou participar de co-missões propostas pelo próprio Conselho como uma for-ma de dinamizar o trabalho.

A publicação e divulgação das ações deste Conselho éfundamental para garantia dos direitos propostos pelo ECA.Trata-se de órgão público, que deve congregar represen-tantes das várias organizações da área, e que deve funci-onar de forma colegiada e transparente.

Permitir o acesso de outras organizações da área, atra-vés de projetos para disputar os recursos públicos disponí-veis no Fundo Municipal, é o mínimo que o Conselho podefazer no exercício de procedimentos democráticos, buscandoa participação do maior número possível de organizações,

sem privilegiar as representadas no COMDICA. Aqui, re-toma-se a questão da divulgação das ações do órgão, danecessidade de interação mais ampla com a comunidade,para além do grupo representado no Conselho.

Os elementos analisados permitem comentar a variávelpenetração social. A projeção do Conselho comoformulador de políticas públicas na comunidade e como serelaciona com a sociedade local e o poder, demarcam suapenetração social. Primeiramente, cabe ressaltar, que oCOMDICA estabeleceu uma relação com os órgãos go-vernamentais e as ONGs de privilegiamento para aquelesque possuem assentos no órgão, discriminando a participa-ção de outros. Esses que fazem parte do Conselho, alémde participação através de conselheiros, são beneficiadoscom as verbas liberadas para execução de projetos.

A penetração social do Conselho junto ao conjunto dasorganizações municipais ainda não é o esperado, pois asrelações expressam um distanciamento, necessitando de

aproximação. Ainda nãohouve iniciativas impor-tantes para favorecer oacesso de todas as orga-nizações e de forma or-denada ao Conselho.

Os contatos com oCEDICA são insuficien-tes. São contatos even-tuais, quando o Conselholocal necessita de algu-ma informação ou paraenvio de projetos quepodem disputar verbasdo governo estadual,mais a participação dedois delegados nas Con-ferências Estaduais. Em-

bora o Conselho Estadual permita acesso aos seus recur-sos, a instância local se restringe às rotinas estabelecidas.Já o relacionamento com o Conselho Nacional –CONANDA, é apenas formal, sem proximidade.

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O ECA confere grandes responsabilidades aos Conse-lhos Municipais, que devem ser exercidos no sentido deviabilizar verdadeiras políticas públicas, ou seja, a partir deum diagnóstico do setor, estabelecer diretrizes e metas deação, definir responsáveis e prazos, a fim de atingir os resul-tados esperados. Além de um bom planejamento e uma ade-quada distribuição de tarefas, são necessários o monitoramentopermanente e a avaliação periódica dos resultados atingidos.

A análise dos aspectos legais e os dados colhidos apartir de entrevistas e questionários permitem afirmar que

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o COMDICA de Santa Cruz do Sul, no período de 1990-2000, enfrenta grandes dificuldades e fragilidades em bemcumprir suas tarefas. Verifica-se que existe uma relaçãode dependência do Conselho para com o governo munici-pal, que empresta sua estrutura e conduz o processo refe-rente à questão orçamentária. Esse fato é comum nosconselhos de políticas públicas no Brasil, conforme revelaa bibliografia, estando vinculado tanto ao perfil dos conse-lheiros quanto ao dos governantes.

Quanto à composição do COMDICA, a análise dos da-dos mostra que a representação das entidades da sociedadecivil é limitada, não possui uma base de sustentação forte esua força política é frágil diante do governo. A representaçãoda sociedade é formada por diversas entidades de serviços,principalmente de natureza assistencial e, geralmente, de di-fícil articulação, já que uma parte dos representantes aindadefende interesses particulares no Conselho. São tradicio-nais beneficiárias de verbas públicas e pretendem manterrelações amistosas com governo, sem comprometimento coma causa coletiva. Desta forma, não contribuem definitiva-mente com a dinamização do COMDICA.

Algumas dificuldades surgem neste processo, pois aparticipação mais ampla no poder é recente entre outrosfatores que atingem o desenvolvimento dos novos conse-lhos. Outra maneira do Conselho garantir a participação écoordenar as eleições dos conselheiros tutelares deixan-do que a eleição seja direta. Ou seja, os conselheiros de-vem ser eleitos pela comunidade.

O COMDICA tem a função de deliberar e controlaras ações em todos os níveis. Isso representa uma altera-ção fundamental na forma de se fazer política, novos ato-res sociais são envolvidos com poderes legais. O exercí-cio pleno das atribuições dos Conselhos contribui para aafirmação da democracia participativa, assim como paraa garantia da cidadania desta população.

Certas atribuições do Conselho, mal encaminhadas atéhoje, podem ser realizadas sem grandes dificuldades. En-tre elas, o tratamento a ser dado aos projetos apoiadospelo COMDICA. Há necessidade de cadastrar progra-mas, projetos e entidades com atuação na área determi-nada pelo ECA, com definição de uma metodologia paratal e oficiar as organizações para que façam seus regis-tros. Estes dados vão constituir um banco de dados, con-sistindo em um mapeamento dos serviços oferecidos pe-las diversas organizações do município.

Outra questão pendente de melhor solução é a com-posição: o assento cativo de determinadas ONGs e a indi-cação de representantes governamentais, nem semprehabilitados e interessados nas questões da criança e doadolescente, o que requer uma revisão indispensável. Hátambém necessidade de investir nas organizações não-governamentais como forma de ampliar e democratizar agestão do estado e garantir o status de direito e de políticapública da criança e do adolescente.

Os dilemas e fragilidades apontados no caso doCOMDICA de Santa Cruz do Sul mostram que a amplia-ção da participação popular prevista em lei está longe degarantir a democracia e a eficácia das políticas públicas.Contudo, há que reafirmar continuamente a importânciadesses mecanismos não só por aquilo que já foi realizado– e há muitas conquistas relevantes – como pelaspotencialidades que lhe são inerentes. A democratizaçãodas políticas públicas supõe um aprendizado constante porparte dos diversos atores sociais, e os Conselhos são umespaço fundamental desse aprendizado.

Recebido em 20.08.2003.Aprovado em 31.01.2005.

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1 O trabalho completo foi apresentado em março de2003 na forma de Dissertação de Mestrado noPrograma de Pós-Graduação em DesenvolvimentoRegional da UNISC, sob o título Políticas Públicasda Criança e do Adolescente: o COMDICA deSanta Cruz do Sul.

2 As principais referências para a presente pesquisa sãoos estudos de Raichelis (1998), Prá (1994) e González(2001).

3 Adotamos a concepção de política pública tal comoPotyara Pereira (1996, p. 130) a define, ou seja, comolinha de ação coletiva que concretiza direitos sociaisdeclarados e garantidos em lei. É mediante as políticaspúblicas que são distribuídos ou redistribuídos bens eserviços sociais, em resposta às demandas dasociedade. Por isso, o direito que as fundamenta é umdireito coletivo e não individual. Embora as políticaspúblicas sejam de competência do Estado, nãorepresentam decisões unilaterais do governo para asociedade, mas envolvem relações de reciprocidade eantagonismo entre essas duas esferas.

4 As políticas sociais são aquelas que se dedicam àdiminuição das desigualdades sociais, agindo sobreos meios mais aptos e menos assistencialistas a

garantir o acesso da população de baixa riquezasocioeconômica da nação (DEMO, 1975, p. 45).

5 Os representantes da esfera pública municipalgeralmente são indicados pelo prefeito municipal,enquanto os representantes da sociedade civil sãooriundos de organismos ou entidades privadas ou demovimentos comunitários organizados que atuem noatendimento de crianças e adolescentes. Osrepresentantes da sociedade civil devem ser escolhidosem foro próprio.

6 Na aplicação dos questionários buscou-se atingir omaior número possível de conselheiros. Os integrantesdo Conselho do ano 2002 receberam o questionáriodurante as reuniões. Os demais questionários ficarama cargo do Núcleo de Pesquisa Social da Universidadede Santa Cruz do Sul. A entrevista e o questionárioabordam aspectos como tempo de trabalho doconselheiro na sua organização, escolaridade,participação, conhecimento do funcionamento e dasatribuições do COMDICA, avaliação das políticaspúblicas e os principais problemas na área da criançae do adolescente em Santa Cruz do Sul.

Isabel Teresinha [email protected] Professor Wilke, 314 - apto. 101Edifício Firenzi – Bairro VerenaSanta Cruz do Sul – RSCEP: 96820-220

João Pedro [email protected]. Egon Francisco Knak, 129 – Bairro HigienópolisSanta Cruz do Sul – RSCEP: 96825-320

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