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ESCRITAS Vol.6 n.2 (2014) ISSN 2238-7188 p. 72-92
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OS ESTÁDIOS DA MEMÓRIA: O RELATO DA PRISÃO
POLÍTICA CHILENA NA OBRA DE JORGE
MONTEALEGRE
THE STADIUMS OF MEMORY: THE ACCOUNT OF
THE CHILEAN POLITICAL PRISON IN THE WORK
OF JORGE MONTEALEGRE.
Maurício Marques Brum*
RESUMO
Este artigo analisa a memória Frazadas del Estadio Nacional (2003), livro
do escritor chileno Jorge Montealegre. A narrativa da obra mescla relatos da
sua experiência pessoal como prisioneiro político na ditadura de Augusto
Pinochet e notas factuais sobre o Estádio Nacional de Santiago como centro
de detenção nos primeiros dois meses após o golpe de 11 de setembro de
1973. Procuro analisar a elaboração do texto frente ao contexto em que foi
publicado – o 30º aniversário do golpe –, suas diferenças em relação a
testemunhos escritos previamente, e também a inclusão de Frazadas del
Estadio Nacional na construção de uma memória coletiva sobre a repressão
vivida no Estádio, num momento em que aquelas experiências estavam sendo
revisitadas pelos chilenos.
PALAVRAS-CHAVE: Ditadura militar chilena, Jorge Montealegre,
memória e testemunho, prisão política.
ABSTRACT
This paper analyzes the book Frazadas del Estadio Nacional (2003), a
memoir by the Chilean writer Jorge Montealegre. In his work, the narrative
merges accounts of his personal experience as a political prisoner during
Augusto Pinochet’s dictatorship and factual notes on the National Stadium of
Santiago as a detention center, used in the first two months after the coup
d’état of September 11, 1973. My aim is to analyze the development of the
text framed by the context in which it was published – the 30th anniversary of
the coup – its differences towards previously written testimonies. Also,
Frazadas del Estadio Nacional is included in the building of a collective
memory of the repression lived in the stadium, at a time when those
experiences were being revisited by the Chileans.
KEYWORDS: Chilean military dictatorship, Jorge Montealegre, memory
and testimony, political prison.
* Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS). Bacharel em Comunicação Social pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM/RS).
Endereço: Rua Lopo Gonçalves, 455/403-A, Cidade Baixa, Porto Alegre-RS (CEP 90.050-350).
E-mail: mauribrum@gmail.com.
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Introdução
Lançado em Santiago do Chile em 2003, por ocasião do 30º aniversário do golpe
de Estado de 11 de setembro, Frazadas del Estadio Nacional foi a primeira memória da
repressão publicada pelo escritor Jorge Montealegre após o final da ditadura em seu
país. Narrando sua experiência majoritariamente em primeira pessoa, o autor relata o
cotidiano e o sofrimento vivido como prisioneiro político no Estádio Nacional. Principal
recinto esportivo da capital chilena, usado sobretudo para partidas de futebol, o Estádio
foi convertido em centro de detenção improvisado nos primeiros dois meses após o
estabelecimento do regime de Augusto Pinochet, até ser totalmente desocupado em
meados de novembro de 1973, quando os detidos foram libertados ou – na maior parte
dos casos – transferidos para penitenciárias comuns ou campos de prisioneiros políticos
estabelecidos em regiões ermas do país.
Ainda que Jorge Montealegre não tenha sido libertado no momento de
desocupação do Estádio, com seu período de encarceramento estendendo-se até a
metade de 1974 – do Estádio Nacional foi levado ao campo de concentração de
Chacabuco, instalado nos desertos do norte –, sua intenção explícita na obra não é fazer
um relato de toda a experiência na prisão. O recorte do texto está limitado apenas aos
dias passados nos vestiários e arquibancadas do Estádio, destacando o dia-a-dia ali
dentro e, particularmente, suas recordações sobre o imediato pós-golpe na vivência do
jovem de 19 anos que então era. Ao longo da narrativa, a obra vai se dividindo de forma
mais clara entre capítulos francamente memorialísticos, nos quais são contadas suas
lembranças da época do levante militar, com outros trechos menos intimistas, em que
são elucidados – por vezes com o auxílio de documentos – acontecimentos posteriores
relacionados ao Estádio Nacional em particular e à ditadura chilena como um todo.
Neste artigo, busco analisar o relato contido em Frazadas del Estadio Nacional
frente ao contexto em que a obra foi publicada, discutindo seu papel como parte da
recuperação e da construção da memória da repressão política diante de uma efeméride
que reabriu o interesse do público comum no tema, como foram os 30 anos do golpe.
Efeméride esta que, como veremos, era marcada por um detalhe extra que aumentava a
sua importância: tratava-se do primeiro aniversário redondo após o afastamento
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definitivo de Pinochet do cotidiano político do Chile. Parte das reflexões sobre as visões
e intenções do autor a respeito da obra serão apoiadas em uma entrevista que realizei
com Jorge Montealegre em julho de 2012.1
A Generación NN: dos textos apócrifos à saída do anonimato
Jorge Montealegre tinha apenas 19 anos quando foi preso, quase três semanas
após o golpe de Estado de 11 de setembro de 1973. Estudante secundarista do último
ano, ele havia inclusive prestado o serviço militar obrigatório até pouco tempo antes do
levante, sendo dispensado por suas opiniões políticas identificadas com os partidos de
esquerda: “o clima interno, dos oficiais, era claramente golpista. E evidentemente
agressivo com aqueles que manifestávamos uma opinião distinta” (MONTEALEGRE,
11 set. 2012). Sua filiação política, que havia provocado a dispensa do Exército,
também foi o pretexto para que o levassem a interrogatórios e a uma detenção que –
logo ficou evidente – se estenderia por tempo indeterminado.
Montealegre não era um militante de destaque e tampouco pertencia às fileiras
do Partido Socialista (PS) ou do Partido Comunista (PC), as principais siglas da
coligação que elegera Salvador Allende presidente em 1970: o jovem estudante estava
ligado à Izquierda Cristiana (IC), uma pequena dissidência do oposicionista Partido
Democrata Cristão (PDC), a qual havia passado a integrar a coalizão allendista já com o
governo em andamento. Se o fato de pertencer à IC conferia-lhe uma ilusória
tranquilidade, parecendo indicar que estava menos propenso a sofrer violências do que
aquelas infligidas a membros de partidos maiores e tradicionalmente mais visados, a
falta de uma estratégia da IC para proteger seus militantes (como a que existia, por
exemplo, no PC, acostumado a períodos de clandestinidade2) o deixou sem esconderijo.
1 Uma versão traduzida dessa entrevista foi publicada no jornal virtual Sul21, de Porto Alegre, em 11 de
setembro de 2012, por ocasião dos 39 anos do golpe no Chile. Ao longo deste artigo, quando me referir
às respostas de Montealegre, usarei o texto dessa versão. 2 Em décadas anteriores, o Partido Comunista do Chile havia passado dez anos clandestino, em função da
Ley de Defensa Permanente de la Democracia (apelidada pelos militantes esquerdistas de “Ley
Maldita”), aprovada em 1948, durante o governo de Gabriel González Videla, que havia contado com o
apoio do próprio PC durante as eleições. A lei colocou os comunistas na clandestinidade, provocando
uma série de cassações no país. Pablo Neruda, até então senador pelo PC, foi um dos políticos que
perdeu o cargo e se viu obrigado a partir para o exílio – no Canto General, publicado originalmente no
México em 1950, Neruda dedica diversos poemas a denunciar a “traição” de González Videla. A “Ley
Maldita” vigorou até 1958.
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Preso primeiro no Estádio Nacional e depois em Chacabuco, Jorge Montealegre
começou a escrever no cárcere, sobretudo poesia, embora o texto de Frazadas... esteja
constituído em prosa. Já no exílio, em Roma, publicaria em 1974 – numa edição
mimeografada – uma coletânea de poemas intitulada justamente Chacabuco, um
testemunho precoce dos dias passados no campo de concentração, escrito com o
propósito de denunciar as privações da prisão. Muitos daqueles versos se tornariam
representativos da experiência de outros prisioneiros levados àquele campo, que
passaram a endossá-los em suas memórias: os versos de Montealegre apareceram em
mais de um testemunho escrito por companheiros da prisão política, mas
costumeiramente saíam impressos como fragmentos apócrifos, sem qualquer
identificação do autor.
A repetição dessa escrita sem atribuição, constituindo um texto insistentemente
anônimo, levou Montealegre a cunhar o termo Generación NN para se referir a
escritores chilenos em situação semelhante à sua. A denominação referia-se a autores
que ainda eram muito jovens no momento de sua estreia na literatura com textos sobre a
prisão política e que, pela repressão vigente na época, acabaram vendo seus nomes se
tornarem menos conhecidos do que seus trabalhos, os quais eram reproduzidos a
contrapelo:
A esa generación [de poetas jóvenes que vivieron en carne y hueso la
dictadura militar], Jorge Montealegre, el poeta chileno, la llamó ‘Generación
NN’. La sigla ‘NN’ alude a non nomine en latín, o sea una expresión irónica
pero a la vez atinada: los poetas de esa generación fueron, según el régimen
dictatorial, un grupo sin importancia3 (TINAJERO, 2010, p. 450).
A escolha do non nomine para identificar essa geração literária não era um
simples arroubo de latinismo: tratava-se de uma referência a um dos detalhes que, com
o tempo, passaria a simbolizar as violações de direitos humanos cometidas pela ditadura
de Augusto Pinochet no Chile. “NN” também era a inscrição presente nas cruzes de
metal colocadas sobre as sepulturas de corpos não identificados no Cemitério Geral de
3 “Essa geração [de poetas jovens que viveram em carne e osso a ditadura militar], Jorge Montealegre, o
poeta chileno, chamou de ‘Geração NN’. A sigla ‘NN’ faz alusão à expressão latina non nomine, ou
seja, uma expressão irônica mas ao mesmo tempo atinada: os poetas dessa geração foram, segundo o
regime ditatorial, um grupo sem importância” (tradução livre).
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Santiago – normalmente utilizadas em tumbas destinadas a indigentes, essas cruzes
acabaram se tornando um disfarce comum para túmulos de prisioneiros políticos
executados pelo regime que, enterrados em segredo, permaneceriam nas listas de
desaparecidos até seus restos mortais serem descobertos após a redemocratização.
Nesse sentido, Frazadas del Estadio Nacional representa, também, uma espécie
de saída do anonimato para um dos principais autores dessa geração “sem nome”, num
incentivo a que outros autores fizessem o mesmo, compartilhando suas memórias por
escrito, desta vez sem temores de revelar quem estava por trás das palavras. Embora seu
trabalho fosse bem conhecido do público chileno no momento do lançamento desse
livro, Jorge Montealegre ainda não havia publicado nenhum relato sobre a prisão desde
os tempos de Chacabuco, uma obra lançada na Itália, sem edição formal e com tiragem
reduzida, que praticamente só circulou entre exilados. A narrativa de 2003 acabou sendo
seu primeiro testemunho inédito a respeito da repressão a ser publicado no Chile,
quebrando a antiga situação algo clandestina de seus textos prévios.
Talvez para não deixar que aquela voz antes silenciada se perdesse, desde o
início Jorge Montealegre deixa clara sua intenção de tentar recuperar os sentimentos e
pensamentos do jovem que era na época do golpe. Esbarra, contudo, na dificuldade de
concretizar tal intento quando procura revisitar uma memória que já está a trinta anos de
distância: “Yo no soy esse lolo golpeado y enmudecido. ¿Yo no soy o ya no soy? Han
pasado treinta años y bordeo los cincuenta. Me perturba el recuerdo sin imágenes de ese
chiquillo que sigue bajo la frazada4” (MONTEALEGRE, 2003, p. 13. Grifos do autor).
A frazada (substantivo feminino que se refere aos cobertores felpudos utilizados
no inverno) mencionada no trecho e também no título da obra é uma presença recorrente
na narrativa. Referência explícita aos cobertores entregues aos prisioneiros no Estádio –
um dos únicos objetos que mantinham consigo durante todo o tempo –, a frazada age
simultaneamente como símbolo das vexações e do desamparo naquele contexto (os
prisioneiros eram levados para o interrogatório com a cabeça tapada pelo cobertor), mas
também de um raro conforto no duro cotidiano do cárcere.
4 “Eu não sou esse jovem golpeado e emudecido. Eu não sou ou já não sou? Passaram-se trinta anos e
tenho quase cinquenta. Perturba-me a recordação sem imagens desse garoto que segue sob o cobertor”
(tradução livre).
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Se recuperar integralmente a voz do garoto silenciado e anônimo de 1973 parece
uma tarefa impossível tanto tempo depois, o autor procura se aproximar disso através da
contemplação de quem revisita a própria memória com um olhar amadurecido após três
décadas. Ao longo do livro, ficará gradativamente mais nítido que Montealegre não
procura apenas recordar ou revelar o que viveu, mas interpretar as relações entre os
prisioneiros e sua luta cotidiana contra a desumanização, encontrando desta forma
significados que não costumavam ser atribuídos a narrativas anteriores que, embora
contassem com alguns elementos semelhantes, foram compostas numa situação em que
realizar a denúncia era considerado prioritário.
O testemunho como necessidade
Frazadas del Estadio Nacional, na sua condição de memória de um
sobrevivente, soma-se a uma série de relatos similares, registros em primeira pessoa na
forma de uma narrativa escrita, que têm sido produzidos em distintos lugares cujos
indivíduos passaram por experiências traumáticas. A vontade – ou, mesmo, a aparente
necessidade – de prestar tal testemunho mobilizou autores de variados contextos5os
quais, por mais diferenças que guardam entre si, conservam em comum um ponto
fundamental: a recordação de épocas marcadas pela repressão (política, cultural,
étnica...) e pelo sofrimento, vividos em um passado que pode ser ainda muito recente ou
já mais distanciado no tempo no momento em que o texto vem a público. Como
comenta Jaime Ginzburg:
Segmentos sociais excluídos por forças repressoras, muitas vezes, tiveram suas
vivências relatadas por discursos oficiais de modos distorcidos, restritivos ou
manipulados. Grupos reificados pela escravidão, por preconceitos e por
violência institucional, muitas vezes, não tiveram a devida oportunidade de
apresentar seus pontos de vista sobre as transformações históricas. Tratados
como objetos do conhecimento oficial, muitas vezes foram reduzidos a
resíduos de si mesmo, tendo suas vivências ocultadas ou esquecidas, pelas
narrativas contadas em linguagem autoritária por governos repressores e
instituições disciplinares hostis (GINZBURG, 2008, p. 200).
5 Poderíamos citar, à guisa de exemplo, testemunhos como É isto um homem?, de Primo Levi (1988),
sobre a perseguição nazista; First They Killed My Father, de Loung Ung (2000), a respeito dos dias do
Camboja sob Pol Pot; a mescla de memória e estudo acadêmico sobre a prisão política argentina,
realizada por Flávio Koutzii (1984), em Pedaços de morte no coração. No caso chileno, além das obras
mencionadas neste artigo, destaco ainda o relato Estadio Nacional, de Adolfo Cozzi (2008).
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No Chile, a escrita – ou recopilação – de memórias sobre o golpe de Estado de
11 de setembro a e repressão que a ele se seguiu começaram a ser feitos ainda em 1973.
Um dos trabalhos mais precoces desse tipo é o livro Chile en la hoguera (1974), do
jornalista chileno Camilo Taufic, obra publicada em Buenos Aires cujo texto sobre o
imediato pós-golpe está baseado fortemente em relatos – em geral anônimos – de
perseguidos políticos que haviam se exilado e puderam ser ouvidos pelo autor. No
entanto, como a própria obra de Taufic demonstra, esses textos sobre as violências do
regime de Augusto Pinochet quase que invariavelmente eram escritos por exilados, e só
circulavam fora do país. O mesmo aconteceu com Chacabuco, o livro de poemas de
Jorge Montealegre em que se descrevia o cotidiano no campo de concentração:
elaborado em Roma, jamais ganhou reedição em solo chileno.
Em Santiago, desta maneira, prevaleceu a narrativa oficial do regime recém-
instaurado. Enquanto no exílio começavam a se reproduzir, das mais diversas formas,
memórias escritas por indivíduos que haviam passado pela prisão política de Pinochet,
no Chile era outra versão que começava a ganhar corpo: antes mesmo do final do ano, o
governo militar havia lançado o Libro Blanco del cambio de gobierno en Chile (1973),
obra destinada a justificar o golpe. Valendo-se de documentos (muitos deles forjados,
como se comprovou posteriormente), o Libro Blanco pretendia explicar, aos olhos dos
chilenos e do mundo, a necessidade de uma intervenção militar, “comprovando” o
envolvimento de Salvador Allende com um plano de “autogolpe” cujo fim último seria
instaurar uma ditadura socialista. O golpe executado pelas Forças Armadas, assim, teria
sido preventivo e, nas ocasiões em que exigiu derramamento de sangue, este não teria
vindo de outros que não os “extremistas”, geralmente abatidos – segundo o regime – em
confrontos nos quais os dois lados estavam armados. Nos jornais chilenos que não
foram fechados após o 11 de setembro, a elaboração de um discurso do golpe necessário
e da reconstrução relativamente pacífica encontrava-se em pleno vapor. Apenas dez dias
após a derrubada de Allende6, o vespertino La Segunda comentava, em uma nota sobre
6 Note-se que, neste mesmo 21 de setembro, o diário El Mercurio (ao qual pertencia o La Segunda)
publicou uma nota confirmando o suicídio de Salvador Allende durante o ataque ao Palácio de La
Moneda, na manhã do golpe (cf. Bruno Serrano, 2013, p. 21). O suicídio foi comprovado por comissões
investigadoras que atuaram após a redemocratização e levou inclusive testemunhas a se manifestarem
no sentido de afirmar sua veracidade (cf. Soto, 2008). Na época da ditadura, entretanto, o discurso de
legitimação do regime militar havia deixado a esquerda tão ressabiada que a informação do suicídio de
Allende foi considerada falsa por muitos chilenos, para quem essa versão procurava esconder um
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uma conferência de imprensa da Junta Militar com a presença de repórteres
estrangeiros:
Los corresponsales extranjeros, en un número de aproximadamente 200
personas, se han mostrado un poco desilusionados con el proceso que vive
Chile. Ellos esperaban encontrar a nuestro país sumido en un reguero de
sangre y sin embargo, se han encontrado con una nación que inicia su
reconstrucción y ya ha logrado en muy pocos días la tranquilidad de los
chilenos7 (La Segunda, 21 set. 1973, p. 24).
Diante desse discurso de autolegitimação que não pretendia alcançar apenas o
público nacional, mas também os observadores estrangeiros ainda incertos com o
caráter do novo regime, os primeiros testemunhos escritos por exilados tiveram um
importante papel de denúncia naquele momento, mesmo que não pudessem circular no
Chile e nem provocar repercussão imediata entre os compatriotas de seus autores.
Seria equivocado pensar, no entanto, que a escrita desse tipo de memória só se
efetua com o objetivo de trazer à tona alguma “grande revelação” até então
desconhecida pelo leitor ou, igualmente, denunciar um fato ocultado – ou silenciado –
de forma deliberada pelas mãos repressoras e pela censura do governo vigente, como
ocorre nas ditaduras. É isto um homem?, a memória de Primo Levi sobre a prisão
durante o genocídio judeu cometido pelo regime nazista, é um exemplo clássico de
testemunho cujo aparecimento não se deve à motivação de denunciar. Logo no prefácio
de sua memória sobre Auschwitz, uma das mais conhecidas e citadas a respeito do
Holocausto, o italiano comenta que seu texto, publicado originalmente em 1947 e
portanto posterior aos julgamentos de Nuremberg, “nada acrescenta, quanto a detalhes
atrozes, ao que já é bem conhecido dos leitores de todo o mundo com referência ao tema
doloroso dos campos de concentração. Ele não foi escrito para fazer novas denúncias”
(LEVI, 1988, p. 7. Grifo nosso).
Mesmo com este alerta presente ainda nas primeiras páginas, a importância do
relato de Primo Levi não é questionada no rol de testemunhos sobre os campos de
assassinato frio cometido pelos militares ou, ainda, uma heroica morte de Salvador Allende durante uma
troca de tiros com os oficiais que invadiam o palácio. 7 “Os correspondentes estrangeiros, em um número de aproximadamente 200 pessoas, mostraram-se um
pouco desiludidos com o processo que vive o Chile. Eles esperavam encontrar nosso país sumido em
um regueiro de sangue e, no entanto, encontraram uma nação que inicia sua reconstrução e já conseguiu
em muitos poucos dias a tranquilidade dos chilenos” (tradução livre).
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concentração nazistas. O que para ele poderia ser justificado como um “sereno estudo” a
respeito de certos “aspectos da alma humana” talvez não se distancie muito da
explicação encontrada por Jorge Montealegre para seu testemunho sobre o Estádio
Nacional de Santiago, escrito também depois de grande parte das atrocidades haver sido
formalmente investigada e revelada ao conhecimento público. Montealegre, afinal,
revisita aspectos da vida do cárcere que, embora também abordem o horror das
execuções e torturas, não deixam de contemplar traços do cotidiano que surgiriam como
detalhes menores e pouco capazes de chamar a atenção num texto composto (e lido)
com o objetivo de formalizar uma denúncia através da literatura.
Frazadas del Estadio Nacional foi publicado no ano de 2003, décadas depois de
virem a público as primeiras edições de relatos sobre o encarceramento, as torturas e as
execuções presenciadas no principal centro esportivo de Santiago. Mesmo sem fazer
novas denúncias, entretanto, Jorge Montealegre somou seu testemunho ao conjunto de
memórias escritas sobre aquele recinto, o que – independentemente da postura do texto
no sentido de reafirmar ou dar um novo significado às narrativas existentes – por si só
constitui uma contribuição aos trabalhos prévios, uma vez que traz uma nova reflexão
pessoal. Márcio Seligmann-Silva argumenta que os testemunhos não podem ser lidos
apenas por seu conteúdo racional e objetivo, existindo também uma carga emocional e
subjetiva, a que o autor chama “auricular”, que impele o sobrevivente a contar a história
em questão desde seu ponto de vista particular:
Por um lado o testemunho deve ser visto como atestação (que se quer objetivo
e super-visual, reprodutor do real – testemunho como testis, vinculado à
racionalidade mais formalista) e, por outro lado, ele tem também um elemento
fundamental, mais sutil, que eu denomino de ‘auricular’, que é mais subjetivo e
emocional. O testemunho mais auricular tem como figura paradigmática o
superstes, ou seja, a voz de um sobrevivente que atravessa uma experiência
radical, escapa da morte e é impelido a verbalizar sua história, percebendo e
desafiando os limites de sua própria narrativa. Todo testemunho de certa
maneira é composto por uma teia desses dois elementos, o que se quer
plenamente racional e objetivo, e o viés mais subjetivo e emocional. A cultura
precisa criar espaços para os testemunhos: eles podem pôr em processo o
trabalho de elaboração dos traumas da sociedade, da violência que a constitui
(SELIGMANN-SILVA, 2013, p. 129).
Com sua alternância entre trechos mais intimistas, recuperando os momentos
vividos em 1973 (inclusive detalhes de sua vida antes da prisão), com capítulos menos
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memorialísticos, nos quais são comentados outros acontecimentos relacionados ao
Estádio Nacional, Jorge Montealegre parece deixar ainda mais explícita em seu texto
essa transição entre um elemento e outro do testemunho. Compare-se, por exemplo, as
duas referências ao Estádio reproduzidas abaixo, a primeira relacionando sua
experiência pessoal – e uma busca por recuperar seu sentimento ao entrar ali como
prisioneiro – e a outra, no capítulo imediatamente seguinte, limitando-se a relatar a
história do recinto até o momento do golpe:
Con las manos en la nuca y la barbilla resentida, llegué a la Recepción del
campo de prisioneros más grande de Chile. […] Estaba en el Estadio Nacional.
El mismo estadio donde había visto jugar el Santos, el equipo de Pelé, y me
había reído con los muñecos gigantes de los clásicos universitarios8
(MONTEALEGRE, 2003, p. 41).
El Estadio Nacional fue inaugurado el 3 de diciembre de 1938, días antes de
que Arturo Alessandri dejara la Presidencia de la República. […] Desde
entonces y hasta 1973, por la tribuna del Estadio pasaron ocho presidentes
constitucionales, desde don Arturo Alessandri hasta el doctor Salvador
Allende9 (MONTEALEGRE, 2003, p. 42).
Está claro, entretanto, que essa amálgama não se dá apenas no nível mais
evidente que acabamos de comentar. Mesmo dentro do que parece ser puramente
memória individual há aspectos tributários de relatos anteriores de outros ex-
prisioneiros e de construções efetuadas ao longo dos trinta anos de revelações e
memórias publicadas entre os acontecimentos vividos e a escrita de Frazadas del
Estadio Nacional. Como argumenta Maurice Halbwachs, “é muito comum atribuirmos
a nós mesmos, como se apenas em nós se originassem, as ideias, reflexões, sentimentos
e emoções que nos foram inspirados pelo nosso grupo” (2006, p. 64).
Ou, para usar os termos de Michael Pollak:
Quais são, portanto, os elementos constitutivos da memória, individual ou
coletiva? Em primeiro lugar, são os acontecimentos vividos pessoalmente. Em
8 “Com as mãos na nuca e o queixo ressentido, cheguei à Recepção do maior campo de prisioneiros do
Chile. [...] Estava no Estádio Nacional. O mesmo estádio onde havia visto jogar o Santos, o time de Pelé,
e onde havia rido com os bonecos gigantes dos clássicos universitários” (tradução livre). A referência aos
bonecos gigantes remete a uma velha tradição, agora desaparecida, de realizar apresentações artísticas
antes dos confrontos entre as equipes de futebol da Universidade do Chile e da Universidade Católica. 9 “O Estádio Nacional foi inaugurado em 3 de dezembro de 1938, dias antes de que Arturo Alessandri
deixasse a Presidência da República. [...] Desde então e até 1973, pela tribuna do Estádio passaram oito
presidentes constitucionais, desde dom Arturo Alessandri até o doutor Salvador Allende” (tradução livre).
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segundo lugar, são os acontecimentos que eu chamaria de ‘vividos por tabela’,
ou seja, acontecimentos vividos pelo grupo ou pela coletividade à qual a pessoa
se sente pertencer. São acontecimentos dos quais a pessoa nem sempre
participou mas que, no imaginário, tomaram tamanho relevo que, no fim das
contas, é quase impossível que ela consiga saber se participou ou não
(POLLAK, 1992, p. 201. Grifo do autor).
Novamente, a comparação poderia ser feita entre Frazadas... e o outro trabalho
do próprio Montealegre: Chacabuco, de 1974, tinha franco caráter de acusação e, mais
do que isso, pelo ineditismo com que foi escrito, possuía influências muito menores de
outros testemunhos escritos desde então – muitos dos quais ainda sequer existiam. É
provável, como reconhece o próprio autor, que aquele texto original estivesse afetado
pelo discurso político da época, mas estava consideravelmente menos informado pelas
construções memorialísticas a respeito da prisão que foram sendo elaboradas conforme
os antigos detidos foram recuperando a liberdade e partindo para o exílio. Frazadas del
Estadio Nacional, por outro lado, é de 2003, editado a trinta anos do golpe e a treze do
fim do regime de Augusto Pinochet, um momento em que Jorge Montealegre tinha
menos intenção de denunciar do que de refletir sobre o que havia ocorrido no Estádio
Nacional. Em tal reflexão, também estavam incorporados muitos dos relatos produzidos
e lidos nesse intervalo de três décadas:
[Chacabuco] é um livro com uma função de denúncia, que está tingido pelo
presente da época e pelo meu entorno, que está relacionado à solidariedade
internacional, também a uma certa reivindicação partidária. Há uma linguagem
muito da época, e portanto uma série de coisas que não corresponderiam a um
testemunho publicado hoje em dia. Hoje, com o tempo que passou, é o
momento da reflexão, de chegar a conclusões, de conectar o passado com
outras situações. Mais do que fazer a denúncia, porque boa parte do que foi
denunciado em seu momento, que tinha que ser denunciado, já foi confirmado.
As comissões da verdade, a Comissão Rettig [1991], a Comissão Valech
[2004], as determinações judiciais, já confirmaram que essas denúncias eram
certas. Ainda que continuemos perguntando por desaparecidos. Mas o grosso
das denúncias das violações aos direitos humanos foram confirmadas, e não há
muito sentido em fazer a denúncia hoje em dia. Esse livrinho, em 1975, foi
uma absoluta novidade, porque não se sabia o que havia acontecido
(MONTEALEGRE, 11 set. 2012).
Memórias sobre o Estádio Nacional publicadas previamente, como Escribo
sobre el dolor y la esperanza de mis hermanos (197610), de Luis Alberto Corvalán
10 Este livro foi publicado originalmente em 1976, na Bulgária, onde Corvalán havia se exilado. Corvalán
Castillo, que morreu no exílio em decorrência de complicações cardíacas causadas pela tortura a que foi
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Castillo, ou Un viaje por el infierno (198411), de Alberto Gamboa, já haviam realizado o
intento de denúncia, relatando, tanto no exílio quanto no Chile ainda governado por
Pinochet, suas experiências enquanto encarcerados naquele recinto. Trabalhos mais
amplos de recompilação de testemunhos, como os três volumes de Chile: la memoria
prohibida (AHUMADA et al., 1989) percorreriam o mesmo caminho no sentido de
promover revelações. De maneira similar, as comissões da verdade montadas pelo
governo chileno após a redemocratização se dedicaram, desde a década de 90, a
investigar os crimes de Estado cometidos após 1973, produzindo relatórios que, apesar
das criticadas incompletudes, ajudaram na elucidação de questões antes obscuras.
É desta forma que, se a vontade do autor de externar e “verbalizar” o que viveu
tem força numa obra como a de Jorge Montealegre, que procura fazê-lo numa
construção intimista, isso não necessariamente vem da busca – realizada por outros
anteriormente – de oferecer uma “verdade” que fosse até ali desconhecida: seu texto
pode nascer da intenção de fornecer uma nova interpretação a uma realidade já exposta
ao conhecimento público.
(Re)construir uma memória do Estádio Nacional
Quando Frazadas del Estadio Nacional foi lançado em Santiago, o Chile
recordava o 30º aniversário do golpe de Estado. Não era simplesmente mais uma
efeméride relacionada à sublevação militar: era um aniversário redondo, ocasião que
costumeiramente se coloca como “condensadora” de um número maior de versões e
memórias do período (CARVALHO e CATELA, 2002, p. 198), por meio de reflexões,
publicações de livros, realização de congressos acadêmicos temáticos, aproximando
também o público leigo das discussões, através da realização de eventos
memorialísticos abertos à população e da produção, por parte da imprensa e da mídia
submetido durante os dias de prisão política, era filho de Luis Alberto Corvalán Lepe, secretário-geral
do Partido Comunista Chileno à época do golpe. A obra não ganharia edição chilena até o ano de 2007,
quando foi publicada em Santiago sob o título Viví para contarlo. 11 O testemunho de Gamboa havia sido publicado originalmente em 1984, em quatro livretos
comercializados no Chile, que vivia um período de abrandamento da censura prévia aos meios de
comunicação e publicações literárias e artísticas. Un viaje por el infierno só voltou a ser editado no país
em 2010, em volume único reunindo os textos dos quatro fascículos originais.
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eletrônica, de reportagens e documentários especiais revisitando os acontecimentos que
se quer recordar.
Mais do que esse interesse típico provocado por datas redondas, o 11 de
setembro de 2003 foi o primeiro aniversário do golpe com essa característica a se passar
num Chile em que Augusto Pinochet não era mais uma figura efetivamente ativa na
cena da política cotidiana do país. Convém recordar que sua presença não se encerrou
com o final da ditadura, e por mais de uma década após sua saída da presidência o
general havia permanecido como comandante-em-chefe do Exército, cargo que só
deixou em 1998 e, depois disso, ainda exerceu a função de “senador vitalício12”, até
renunciar em julho de 2002. Se a presença do ex-ditador no dia-a-dia ainda havia
causado resquícios de temores durante a transição para a democracia, intimidando
iniciativas mais amplas de recuperação da memória, essa situação estava se modificando
sensivelmente no 30º aniversário do golpe. O desaparecimento de Pinochet do cotidiano
político, a crescente debilidade de sua saúde (ele faleceria em 2006) e o fechamento do
cerco dos tribunais internacionais quanto às violações de direitos humanos cometidas
por seu governo tornavam aquele um momento extremamente propício para publicar
testemunhos novos e reaver os que haviam tido pouco destaque nos tempos de
repressão.
O livro de Jorge Montealegre é escrito nesse contexto. Em linhas gerais, naquela
altura já se sabia o que havia ocorrido no Estádio Nacional, e existiam denúncias e
testemunhos anteriormente publicados, embora com pouca difusão dentro do Chile. Um
relato precoce como o de Luis Alberto Corvalán Castillo, publicado no exílio ainda nos
anos 70 e com um tom claramente de denúncia – a edição original incluía a transcrição
de suas acusações diante da comissão internacional encarregada de investigar os crimes
da ditadura chilena – só ganharia edição no Chile em 2007. Mesmo quando não eram
lançados no exílio, porém, esses textos tinham pouca circulação. O testemunho de
Alberto Gamboa, por exemplo, foi publicado originalmente em Santiago num contexto
de abrandamento da censura, em 1984, sob a forma de quatro livretos distintos. Pela
situação política do país, o texto buscava um tom menos de acusação e mais de
12 O mandato vitalício no Senado, atribuído aos ex-presidentes da República, foi criado pela Constituição
Chilena de 1980, aprovada durante a ditadura e vigente até hoje. O cargo, no entanto, foi extinto após as
reformas constitucionais de 2005. Na prática, apenas Augusto Pinochet e Eduardo Frei Ruiz-Tagle
(presidente entre 1994 e 2000) exerceram os “mandatos vitalícios”.
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conciliação. Mesmo assim, os fascículos dificilmente foram encontrados nas bancas de
jornais na época de lançamento, pois eram recolhidos com frequência por agentes do
regime13. Un viaje por el infierno, de Gamboa, também só ganharia uma reedição
muitos anos após vir a público pela primeira vez – o livro seria republicado em 2010.
Deste modo, a escrita de textos memorialísticos – e a produção de outros
trabalhos valendo-se de testemunhas vivas, como documentários em vídeo – a partir dos
anos 90, ajudaram a consolidar uma memória visual e literária mais clara sobre a
repressão ocorrida em recintos como o Estádio Nacional. O vídeo-documentário Estadio
Nacional, de Carmen Luz Parot14, comumente considerado uma produção
cinematográfica definitiva sobre a repressão vivida naquele local, é de uma data tão
recente como 2001. Terrorismo de Estadio, de Pascale Bonnefoy Miralles, uma das
obras jornalísticas mais completas sobre o recinto, só seria publicado em 2005. Não é
casualidade que diversos testemunhos publicados ainda durante a ditadura (como os já
citados trabalhos de Corvalán Castillo e Gamboa) somente tenham ganhado edições
chilenas – e, com isso, maior destaque dentro do país – após a virada do século.
Nesse sentido, e mesmo sem ser pioneiro, Frazadas del Estadio Nacional
acabou se tornando um dos primeiros testemunhos de fôlego escritos nesse novo
período aberto após a virada do século, que reforçou o interesse nas temáticas da
repressão. Essa condição rapidamente converteu o livro num clássico sobre o Estádio,
capaz de influenciar decisivamente a construção da memória sobre o recinto. Márcio
Seligmann-Silva recorda que “a memória existe no plural”, ou seja, “na sociedade dá-se
constantemente um embate entre diferentes leituras do passado, entre diferentes formas
de ‘enquadrá-lo’” (2003, p. 67). E, como argumenta Michael Pollak, “uma vez rompido
o tabu, uma vez que as memórias subterrâneas conseguem invadir o espaço público,
reivindicações múltiplas e dificilmente previsíveis se acoplam a essa disputa de
memória” (1989, p. 5).
No caso de Jorge Montealegre, essa reivindicação um tanto inesperada diz
respeito à forma como sua memória é organizada na narrativa escrita, preocupada não
apenas em descrever os horrores e temores de alguém encarcerado, às vésperas de uma
13 Cf. Alberto Gamboa (2010). 14 Outro importante trabalho de Luz Parot sobre a ditadura, o documentário El derecho de viviren paz,
sobre a vida e obra do cantor popular Víctor Jara (executado pelo regime na primeira semana após o
golpe), também é recente – estreou em 1999.
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tortura aparentemente inescapável – e sem saber seu destino posterior –, mas também
deixar um registro do companheirismo cotidiano do cárcere, da tentativa dos
prisioneiros de, apesar de tudo, manter sua condição humana. Para Montealegre, era
importante demonstrar que, apesar da quebra institucional vivida pelo país e dos
sofrimentos representados pela imposição do cárcere a milhares de cidadãos chilenos
cujo único “crime” muitas vezes era estar filiado a um partido de esquerda, a
individualidade e sensibilidade dos prisioneiros políticos não havia se perdido:
[Não] se sabia como os presos políticos vivíamos um processo de resiliência e
resistência, porque se contava da tortura, se contava tudo aquilo, mas pouco se
sabia que escrevíamos poesia, que alguns desenhavam, que havia humor, que
nós sobrevivíamos também construindo um novo cotidiano em que
enfrentávamos a adversidade de uma maneira positiva e comunitária. Disso se
sabia muito pouco porque, bom, a prioridade [durante a ditadura] era denunciar
a brutalidade da Junta Militar e os delitos. Para mim sempre interessou
reivindicar essa outra parte da prisão política, a parte “positiva”, digamos
assim, da prisão política. Porque se cresce na prisão política, se aprende na
prisão política. Há uma fraternidade que vale a pena contar, e é parte da prisão
política (MONTEALEGRE, 11 set. 2012).
A preocupação de Montealegre não era inédita. Sua tentativa de descrever
aspectos cotidianos do cárcere também se fez presente em alguns dos testemunhos mais
antigos, mesmo naqueles publicados durante a ditadura chilena. No entanto, ressalte-se
uma vez mais, esse registro ficou sem grande destaque no momento da publicação
original de memórias que saíram antes da volta à democracia, pois acabavam como
detalhes menores da narrativa. A denúncia foi, por muito tempo, a prioridade, e é nesse
sentido que Frazadas del Estadio Nacional se diferencia de modo notável: graças ao
contexto em que foi escrita, a obra de Montealegre está marcada principalmente pela
busca de recuperar essas experiências individuais, sem dar margem para que o relato
delas seja minimizado por uma necessidade premente – que já não existia – de fazer
revelações para contestar as versões da ditadura. O tom de pessoalidade cotidiana
permeia a narrativa, como na menção à casa que habitava antes do golpe:
Le tenía apego a ese hogar. Mis primos, um matrimonio joven, me brindaban
uma hospitalidade fraterna. Magda, con elementos muy sencillos, hacía de la
casa um lugar alegre y hermoso. Martín, intelectual agudo y de excelente
humor, orientó naturalmente mi interés por el periodismo y el humor gráfico.
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Me sentí aprendiendo con ellos. Además, comprendían mi actividad política y
mi necesidad de seguir estudiando15 (MONTEALEGRE, 2003, p. 28).
Cotidiano este que será subitamente interrompido pelos acontecimentos de 11 de
setembro, alterando as expectativas de imediato:
El toque de queda duró 42 horas, hasta el mediodía del jueves 13 de
septiembre. Ese día solo pudimos salir de la casa desde las 12 hasta las 16
horas. Y salir de la casa era salir a un país distinto16 (MONTEALEGRE, 2003,
p. 21).
En un solo día los militares se tomaron todo el poder. Sin contrapeso. Salí a
caminar. Deambulé como reconociendo la Ciudad. Había una atmosfera
desconocida. Antes, habría ido al partido. Era mi segunda casa. En ella pasaba
casi todo el día. Ahí estaban mis amigas y mis amigos. Ahora no sabía adónde
ir, salvo caminar en redondo para volver a mi casa ignorando hasta cuándo
sería mi casa17 (MONTEALEGRE, 2003, p. 24).
Nesse matiz, o livro se divide em cinco partes principais, que recuperam fases
distintas e sucessivas: na primeira (“Días de Escuela”), descreve a vida às vésperas do
golpe e a sucessão de fatos até ser levado ao Estádio Nacional; na segunda (“Frazadas
del Sueño”), narra o cotidiano na prisão, iniciando o relato de experiências “positivas”,
no sentido da ajuda mútua entre os companheiros de cárcere, que será mais explorado
na parte seguinte (“El Pan Nuestro”). Montealegre cita, por exemplo, a “infiltração” de
colegas leais nas chamadas “esquadras de serviço”, na qual os militares usavam alguns
prisioneiros para auxiliar na distribuição de alimentos, correspondência, limpeza, entre
outros:
La infiltración de la escuadra de servicio, como una tarea política, convirtió a
estos compañeros en correos internos o en “espías” que fueron muy
importantes para enterarse de que tal o cual compañero también estaba preso y
15 “Eu tinha apego a esse lar. Meus primos, um casal jovem, brindavam-me com uma hospitalidade
fraterna. Magda, com elementos muito simples, fazia da casa um lugar alegre e bonito. Martín,
intelectual agudo e de excelente humor, orientou naturalmente meu interesse pelo jornalismo e pelo
humor gráfico. Senti-me aprendendo com eles. Além disso, compreendiam minha atividade política e
minha necessidade de seguir estudando” (tradução livre). 16 “O toque de recolher durou 42 horas, até o meio-dia da quinta-feira, 13 de setembro. Nesse dia
pudemos sair de casa desde às 12 até às 16 horas. E sair de casa era sair a um país distinto” (tradução
livre). 17 “Em um só dia os militares tomaram todo o poder. Sem contrapeso. Saí a caminhar. Deambulei como
se estivesse reconhecendo a Cidade. Havia uma atmosfera desconhecida. Antes, teria ido ao partido. Era
minha segunda casa. Nela passava quase todo o dia. Aí estavam minhas amigas e meus amigos. Agora
não sabia aonde ir, salvo caminhar em círculos para voltar à minha casa ignorando até quando seria
minha casa” (tradução livre).
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que, a través de esta escuadra, se le podía hacer llegar alguna ayuda. […] En la
confianza que se establecía entre el suboficial a cargo y “su” escuadra de
servicio, [Luis Alberto Corvalán Castillo] pudo conseguir que aumentaran las
raciones18 (MONTEALEGRE, 2003, p. 110).
Mesmo com as vexações da prisão sendo descritas nesses momentos anteriores
do livro, o testemunho mais pungente do sofrimento fica reservado para a quarta parte
(“Bajo la Frazada”), com a recordação em primeira pessoa do dia em que foi levado
para a tortura, descrevendo, por exemplo, a agonia de ouvir os companheiros enquanto
esperava a sua vez – com o cobertor sobre a cabeça – de ser interrogado:
Más allá de la frazada todo era un misterio. Nadie sabía de quién era la mano
que hurtaba el reloj, o la bota que golpeaba sorpresivamente las costillas o la
bayoneta que hostigaba. En cambio, sí sabíamos de quiénes eran los gritos, los
llantos, los quejidos y los silencios que retumbaban. Era el sufrimiento de
alguno en particular, también habitante del Estadio: cualquiera de nosotros. Era
un compañero torturado que además les servía de instrumento de tortura para
quienes estábamos obligados a escuchar y ponernos en su lugar19
(MONTEALEGRE, 2003, p. 134).
Por fim, na quinta parte (“De la Frazada al Saco de Dormir”), o livro passa
para os últimos dias do encarceramento no Estádio Nacional, a expectativa de liberdade
e a decepção daqueles que, como Jorge Montealegre, ainda deverão passar por
Chacabuco.
O autor toma a decisão deliberada de não se deter em qualquer descrição da vida
em Chacabuco, ou de pormenorizar detalhes a respeito do campo que eventualmente
sejam mencionados ao longo do livro. Com efeito, em mais de uma memória escrita por
ex-prisioneiros políticos que passaram pelo campo de concentração, Chacabuco
costuma ser lembrado como uma fase menos violenta do que a detenção no Estádio 18 “A infiltração na esquadra de serviço, como uma tarefa política, converteu esses companheiros em
correios internos ou em “espiões” que foram muito importantes para inteirar-se de que tal ou qual
companheiro também estava preso e que, através dessa esquadra, podia-se fazer chegar a ele alguma
ajuda. [...] Na confiança que se estabelecia entre o suboficial encarregado e “sua” esquadra de serviço,
[Luis Alberto Corvalán Castillo] conseguiu que aumentassem as rações” (tradução livre). Nessa
passagem, Montealegre cita Corvalán Castillo, que já referimos neste trabalho, o qual infiltrou-se numa
esquadra com o objetivo declarado de ajudar os colegas de cárcere, conquistando, para tanto, a
confiança do militar encarregado de seu setor. 19 “Mais além do cobertor tudo era um mistério. Ninguém sabia de quem era a mão que furtava o relógio,
ou a bota que golpeava de surpresa as costelas ou a baioneta que fustigava. Por outro lado, sabíamos,
sim, de quem eram os gritos, os prantos, as lamúrias e os silêncios que retumbavam. Era o sofrimento
de algum em particular, também habitante do Estádio: qualquer um de nós. Era um companheiro
torturado que também servia de instrumento de tortura para aqueles que estávamos obrigados a escutar e
nos colocarmos em seu lugar” (tradução livre).
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Nacional. Se as vexações e privações seguiam parte do dia-a-dia, as torturas e
execuções já eram muito menos frequentes e indiscriminadas do que antes, uma vez que
o próprio governo militar começava a ultrapassar a fase de “liberar” o país do “jugo
marxista”,20 dando início a sua consolidação no poder – com a tentativa de projetar uma
imagem mais aceitável e justificável perante a comunidade internacional.
A escolha de Montealegre por ignorar, em Frazadas..., a experiência de
Chacabuco, ajuda a compor uma memória em que o campo de concentração não
corresponderia somente a um “segundo momento” em relação ao Estádio Nacional, mas
também a um espaço que deveria ser caracterizado de maneira distinta nas
representações e no imaginário da repressão. Centralizando a narrativa no Estádio, o
autor o reconstrói como um momento definitivo da prisão política, colocando-o como
uma fase em que o terror e as dúvidas sobre o futuro eram maiores do que em qualquer
etapa que se seguiu – e, mesmo assim, incapazes de destruir a tentativa cotidiana dos
prisioneiros de preservar a dignidade.
Considerações finais
Observado frente ao contexto em que foi publicado, Frazadas del Estadio
Nacional demonstra que, mesmo sem caráter de denúncia – uma vez que esta já havia
sido feita anteriormente, tanto na literatura quanto por comissões investigadoras do
governo –, permanece a importância do testemunho pessoal sobre uma época e um
recinto marcados pela repressão política e pela violência do Estado. Favorecido por um
momento propício à recordação dos acontecimentos relacionados ao golpe de Estado no
Chile – o 30º aniversário da sublevação militar, em 2003 –, o texto de Jorge
Montealegre alcançou também um destaque maior do que relatos anteriores. Esses
trabalhos prévios, geralmente escritos no exílio, podem ser considerados pioneiros e
tiveram a função de comprovar, no exterior, as suspeitas de que a Junta Militar cometia
sistemáticas violações de direitos humanos. Entretanto, não conseguiram repercutir na
sociedade chilena à época em que vieram a público, já que só podiam circular no país
clandestinamente, quando chegavam a tanto.
20 Termos utilizados pela Junta Militar em seu “Bando Número 1”, a carta lida na manhã do golpe de
Estado de 11 de setembro de 1973.
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Ao mesclar, na narrativa, suas memórias sobre a época do golpe com capítulos
em que recupera acontecimentos (ou descobertas) posteriores ligados ao Estádio
Nacional e à ditadura, o autor compõe um panorama sobre a memória construída a
respeito do Estádio naqueles trinta anos. Não pretende, com isso, fazer uma acusação
nova sobre a repressão, mas refletir sobre o que ocorreu – Jorge Montealegre tenciona
analisar os reflexos do golpe e da ditadura sobre a sociedade chilena mas, também, e
mais especificamente, ponderar sobre a forma como essas lembranças persistem
naqueles que compartilharam da experiência de encarceramento que ele vivenciou. Mais
do que isso, Frazadas del Estadio Nacional contribui na moldagem dessa memória, e
sugere que o período passado no Estádio deve ser estabelecido como um momento
distinto daquele vivido em outros recintos utilizados mais tarde pelo regime de
Pinochet, como o campo de Chacabuco. O Estádio, com sua violência ainda
desconhecida e acachapante, era também um estádio no sentido de estado, um estágio
prévio a outros momentos da repressão, cada qual com características próprias:
Nos llevábamos el Estadio en el recuerdo. Y no es fácil deshacerse de él. Sigue
aquí adentro. El Estadio es una palabra que siempre tendrá eco en las galerías
de la memoria. Ese Estadio Nacional que también es un estadio en el sentido
de situación, etapa, estado. Un momento de nuestra historia. Un estadio
personal y colectivo que en mi caso fue un túnel para pasar a otros estadios: el
barco Andalién, el campo de prisioneros Chacabuco; las camas provisorias de
la libertad condicional; el exilio, y un retorno silencioso en 1979. Estadios en
mi biografía. Ninguno comparable con ese estadio del Estadio21
(MONTEALEGRE, 2003, p. 176).
O Estádio que, mesmo sendo uma memória “donde nadie envejece y los dolores
no prescriben ni pueden ser indultados22” (idem, ibid.), ainda merecia ter seu “outro
lado” recordado, que a obra de Montealegre busca reivindicar: aspectos pouco notados
mesmo quando presentes nos testemunhos feitos durante a ditadura,como o
companheirismo entre os perseguidos políticos e a tentativa comum de estabelecer uma
21 “Levávamos o Estádio na recordação. E não é fácil desfazer-se dele. Segue aqui dentro. O Estádio é
uma palavra que sempre terá eco nas galerias da memória. Esse Estádio Nacional que também é um
estádio [ou estágio] no sentido de situação, etapa, estado. Um momento de nossa história. Um estádio
pessoal e coletivo que no meu caso foi um túnel para passar a outros estádios: o barco Andalién, o
campo de prisioneiros Chacabuco; as camas provisórias da liberdade condicional; o exílio, e um retorno
silencioso em 1979. Estádios em minha biografia. Nenhum comparável com esse estádio do Estádio”
(tradução livre). 22 “Onde ninguém envelhece e as dores não prescrevem nem podem ser indultadas” (tradução livre).
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rotina mais humana e menos brutal no cárcere. Uma lembrança recuperada, entre outros
motivos, para dar um novo significado a essas memórias. Para que, por exemplo, o
cobertor (a frazada que dá título ao livro) não fosse somente um objeto colocado sobre a
cabeça no caminho até as sessões de tortura, mas também um símbolo de solidariedade
entre os violentados pelo regime militar – solidariedade como aquela manifestada entre
dois prisioneiros políticos que, numa noite fria no Estádio, decidiram dividir a manta
para suportar mais uma jornada aguardando a liberdade.
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